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Capítulo 2 9 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. 22 Sinais e Sintomas Neurológicos JosØ Antonio Levy Lœcia Iracema Z. de Mendonça CAP˝TULOCAP˝TULO Podemos classificar os sintomas neu- rológicos em: motores (fraqueza muscular, movimentos involuntários, incoordenação), sensitivos (dor e parestesias), vertigem e per- da da audição, comprometimento da visão, distúrbios do nível de consciência (síncope e coma) e das funções cognitivas (afasia, apraxia, agnosia, amnésia, delirium e demên- cia). Evidentemente para cada sintoma exis- tem sinais, podendo ser eles patognomônicos ou não. FRAQUEZA MUSCULAR Usamos o termo paralisia ou plegia quan- do existe perda total da contratilidade mus- cular e paresia, quando existe apenas diminuição desta contratilidade ou seja, uma fraqueza muscular. Se existe déficit motor em um hemicorpo por uma única lesão, como, por exemplo, um acidente vascular cerebral (AVC), o paciente ficará hemiplégico ou he- miparético; se tivermos o déficit motor nos dois hemicorpos devido a dois AVC, um de cada lado, usaremos os termos diplegia ou diparesia, se tivermos o déficit motor nos qua- tro membros por uma lesão na medula cervi- cal o paciente será tetraplégico ou tetraparé- tico, se tivermos o déficit de um membro por lesão das raízes do plexo cervical ou lombos- sacro teremos uma monoplegia ou monopa- resia; em um déficit dos membros inferiores por uma lesão medular ou da cauda eqüina teremos uma paraplegia ou paraparesia cru- ral. Se a lesão estiver localizada nos neurônios motores inferiores (via final comum), nas células da ponta anterior da medula ou dos núcleos motores dos nervos cranianos ou no axônio dessas células, a paralisia ou paresia serão flácidas, sendo acompanhadas, como vimos, de hipotonia, arreflexia e atrofia mus- cular conforme o explanado no capítulo an- terior; se ao contrário, a lesão estiver situada nos neurônios motores superiores, ou nos axônios dessas células, ou seja, nos neurôni- os do trato piramidal, que se encontram pre- dominantemente na área motora primária do córtex cerebral, além do déficit motor, tere- mos sinais de liberação, como, espasticidade ou seja, hipertonia elástica, hiper-reflexia, au- tomatismo medular e sincinesias, poderemos encontrar ainda dois sinais muito importan- tes da propedêutica neurológica, quais sejam o sinal de Babinski e o sinal do canivete. 10 Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. SINAL DE BABINSKI Na estimulação cutânea da planta do pé com um estilete em condições normais temos como resposta a flexão plantar dos artelhos, quando no entanto esse estímulo provocar a dorsiflexão, teremos o sinal de Babinski, o qual pode acompanhar-se de abertura em leque dos quatro últimos artelhos. Essa resposta inverti- da ou seja, o sinal de Babinski é devida a um aumento do campo receptivo para esta dorsi- flexão, o qual nos indivíduos normais se limi- ta à superfície plantar do grande artelho. SINAL DO CANIVETE Ao se distender nos casos de lesão pirami- dal, um músculo passivamente, procurando por exemplo, abrir o ângulo entre o braço e o an- tebraço, distendendo o bíceps, inicialmente verificamos dificuldade; no entanto, quando o grau de tensão provocado pelo examinador for muito forte, vencendo o limiar dos órgãos ten- díneos (sensibilidade profunda), a resistência cessa e o movimento passivo se torna fácil. Comparativamente é como se abríssemos a folha de um canivete, onde, como sabemos, o movimento difícil no início se torna fácil. Este sinal é explicado por serem os limiares sensitivos dos órgãos tendíneos, maiores que os limiares dos fusos musculares; quando então, esse limiar for ultrapassado teremos a inibição do reflexo da tração muscular em um mecanismo de defesa que tem como fi- nalidade proteger o músculo de um estiramento excessivo. Se no entanto essa lesão dos neurônios motores superiores for aguda, como, por exem- plo, numa seção da medula por arma de fogo ou em um AVC, os sinais de liberação não vão aparecer imediatamente; de início teremos a fase chamada de choque e apenas depois de algum tempo, variável de dias ou semanas co- meçam a aparecer os sinais de liberação. Várias estruturas cerebrais e do tronco ce- rebral dão origem a tratos com função motora além do trato piramidal; esses outros tratos motores influenciam o tono muscular, através de sua ação sobre os motoneurônios da via fi- nal comum situados nas pontas anteriores da medula e nos núcleos motores dos nervos cra- nianos. Nas lesões cerebelares e do núcleo ru- bro (síndrome de Claude) são observadas hipotonia e reflexos pendulares. O sistema ex- trapiramidal relacionado ao controle dos mo- vimentos automáticos tem ainda importantes funções na regulação do tono muscular, parti- cularmente relacionados com as posturas e o equilíbrio, completando o papel desempenha- do pelo cerebelo. A moléstia de Parkinson, a mais conhecida entre as afecções dos núcleos da base é devida à deficiência de dopamina sintetizada nas células da substância negra; a hipertonia verificada é plástica, denominada de rigidez. Nessa rigidez os músculos têm tendência a fixar-se em cada posição assumida pelo pa- ciente e isto explica o fenômeno da roda den- teada observada em especial nos cotovelos. Se o examinador flexiona lenta e passivamente o cotovelo do paciente, em virtude dos múscu- los tenderem a se fixar nas várias posições, temos a sensação que na articulação existirá um mecanismo com rodas denteadas, poden- do-se sentir a passagem de cada dente da en- grenagem. Na rigidez descerebrada que pode ser pro- vocada experimentalmente por uma transec- ção no tronco cerebral em qualquer nível entre o núcleo rubro e o núcleo vestibular de Dei- ters, teremos rigidez dos músculos extensores dos quatro membros e dos extensores da cabe- ça. Na rigidez de decorticação teremos espas- ticidade dos extensores dos membros inferiores e dos flexores dos membros superiores e na clínica podemos vê-la em lesões piramidais bilaterais em níveis rostrais ao mesencéfalo, e nos primatas encontramos este quadro extir- pando experimentalmente o córtex cerebral. As posturas em decorticação e descerebração são sinais importantes na propedêutica neurológi- ca nos estados de coma, pois denotam o nível das lesões no tronco cerebral. Capítulo 2 11 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. MOVIMENTOS INVOLUNTÁRIOS Ocasionados por lesões dos núcleos da base do cérebro (caudado, putâmen, globo pá- lido, subtalâmico de Louis e substância negra), os movimentos involuntários existem em vá- rias afecções neurológicos que afetam esses núcleos ou suas vias aferentes ou eferentes. Dentre os movimentos involuntários ou hipercinesias, as quais desaparecem durante o sono, sendo agravados pela fadiga e emoção devemos considerar tremores, movimentos coréicos, balismo, atetose e distonia. TREMORES Definidos como oscilações mais ou menos rítmicas de uma parte do corpo ao redor de um ponto fixo, podem ser normais ou patológicas. Os primeiros decorrem durante os estados hiperadrenérgicos, como no medo. As patolo- gias sistêmicas podem também produzir tre- mores como a tireotoxicose. Entre os tremores patológicos temos o tremor de ação, o parkin- soniano, o cerebelar e o tremor rúbrico. O tre- mor de ação essencial ou familiar é o mais freqüente envolvendo principalmente os mem- bros superiores e, o que é mais raro, a cabeça, a mandíbula e membros inferiores; sua fre- qüência varia entre 5Hz e 7Hz, sendo sua ex- tensão de alguns milímetros e sua característica o aparecimento apenas durante o movimentos ou na manutenção de uma postura, desapare- cendo de imediato quando o paciente fica re- laxado; seu surgimento se dá na vida adulta principalmente, existindo controvérsias quan- to ao seu mecanismo. O tremor parkinsoniano é grosseiro, tem freqüênciade 4Hz a 5Hz, envolvendo os de- dos, as mãos e os braços, os lábios e a língua e os membros inferiores, atingindo raramente os pés; ocorre quando o membro está em repou- so e desaparece com o movimento voluntário; esse tremor geralmente é uma das manifesta- ções da síndrome parkinsoniana, podendo ocorrer como um fenômeno isolado em um indivíduo idoso. O tremor intencional o qual é acompanha- do de incoordenação, indica comprometimen- to do cerebelo ou de suas vias, ao contrário do parkinsoniano não ocorre quando o mem- bro está em repouso e nem no início de um movimento voluntário, característica esta que o distingue do tremor essencial que aparece após a primeira metade e especialmente no fi- nal do movimento. No chamado erroneamente tremor rubro, observado nas lesões que acometem as vias que ligam os núcleos denteados do cerebelo, rubros e talâmicos, o movimento é de ampla extensão dos braços e do tronco, sempre que estas regiões são ativadas, começando a partir do instante inicial do movimento voluntário e continuando até que o corpo fique completa- mente relaxado, sendo chamado por alguns de tremor ou bater asas. HIPERCINESIAS A coréia se caracteriza por movimentos arrítmicos do tipo contração rápida, afetando várias partes do corpo, recebendo nome de hemicoréia quando for limitado a um hemi- corpo. Quando esses movimentos atingem ape- nas a parte proximal dos membros, sendo mui- to violentos e rápidos, temos o balismo, o qual atinge apenas um hemicorpo e que é devido à lesão do núcleo subtalâmico de Luys do lado oposto. Na distonia os movimentos são lentos, for- çando a região do corpo em que ocorrem a assumir posturas anômalas; durante o movi- mento ocorre hipertonia que pode ser seguida de hipotonia nos intervalos; o distúrbio pode ser observado em membros, tronco, região cervical e face. A atetose se caracteriza por movimentos lentos e sinuosos; assim, nos membros temos atitudes de flexão e supinação que se alternam com extensão e pronação, e nos intervalos dos movimentos os membros afetados se mantêm rígidos; a atetose pode ser generalizada ou res- trita a um grupo de músculos cervicais e cra- nianos. 12 Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. ATAXIA Caracterizada por dissinergia ou seja, in- coordenação ou incapacidade para coordenar os músculos na execução dos movimentos ou mesmo para manter uma atitude, pode ser de- vida a uma lesão cerebelar ou de suas vias, ou a comprometimento da sensibilidade profun- da consciente. Neste último caso (ataxia sen- sitiva), a coordenação vai depender muito do uso da visão, pois essa visão pode informar ao paciente a posição de seus vários segmentos corporais. Na lesão cerebelar ou de suas vias, ao contrário, de nada vai adiantar o auxílio visual. Assim, na ataxia cerebelar na prova índex nariz por exemplo, todo movimento de colocar a ponta do dedo indicador na ponta do nariz deixa de ser harmônico; os vários seg- mentos do membro superior não têm uma movimentação coordenada até o movimento se completar; no entanto, mesmo sem o auxí- lio da visão o cérebro reconhece perfeitamen- te a posição exata dos vários segmentos dos membros superiores, uns em relação aos ou- tros, assim como em relação ao resto do cor- po. Na ataxia sensitiva os músculos terão movimento coordenado se o paciente souber sua situação e a de seus vários segmentos no espaço, o que pode ser conseguido com o au- xílio da visão, que então substitui a sensibili- dade profunda consciente que está prejudicada pela lesão (ver no Capítulo 1: Músculos sinér- gicos e antagônicos). A incoordenação é verificada também nos equilíbrios estático e dinâmico; assim, oscila- ções durante a marcha e tendência a alargar a base de sustentação caracterizam a lesão cere- belar (marcha ebriosa); essas oscilações são observadas também na postura estática, levan- do o paciente a afastar os membros inferiores e alargar a base de apoio; em caso de ataxia sensitiva o paciente se mantém equilibrado apenas pelo controle visual, o paciente tende- rá a cair ao fechar os olhos (sinal de Romberg). DORES E PARESTESIAS É importante definirmos os termos empre- gados para as alterações da sensibilidade. A dor pode ser definida como sensação desagradável associada a lesão tecidual ver- dadeira ou potencial e mediada por fibras ner- vosas que vão atingir o cérebro, no qual sua percepção consciente pode ser modificada por vários fatores. PARESTESIAS São sensações anormais, geralmente não desagradáveis, espontâneas ou não. ALODÍNIAS São sensações de dor resultante de estímulo não-nocivo aplicado à pele normal; por exem- plo, a simples passagem de um algodão na pele ser sentida como dor. ANALGESIA É a perda da sensibilidade à dor, nesse caso um estímulo nocivo como, por exemplo, o es- petar com uma agulha não é sentida como dor. ANESTESIA DOLOROSA É a sensação de dor sentida em uma área anestesiada. CAUSALGIA É uma síndrome de dor e queimação manti- da após lesão traumática de um nervo periférico, associada com disfunção vasomotora e moto- ra, a qual apresenta alterações tróficas tardias. HIPERALGESIA Consiste em aumento da excitabilidade a uma estimulação nociva, a qual se deve a uma baixa do limiar à dor. HIPERESTESIA Consiste da excitabilidade aumentada à estimulação não-nociva, excluindo, no entan- to, os estímulos sensoriais. Capítulo 2 13 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. HIPERPATIA Síndrome dolorosa caracterizada por rea- ção dolorosa excessiva e retardada, especial- mente à estimulação repetitiva, a qual se deve à baixa do limiar nociceptivo. HIPOALGESIA Sensibilidade diminuída à estimulação nociva. HIPOESTESIA Sensibilidade diminuída à estimulação, excluindo os estímulos especiais. Outros termos que também devem ser co- nhecidos são: LIMIAR DA DOR A menor intensidade do estímulo que per- mita ao indivíduo perceber a dor. Nociceptor Receptor de preferência sensitivo a estí- mulos nocivos ou potencialmente nocivos. VERTIGEM Este termo deve ser reservado aos distúr- bios da harmonia espacial entre o organismo e o meio ambiente, determinando sensação sub- jetiva de rotação do corpo do paciente em tor- no de si mesmo ou de deslocamento de objetos vizinhos, podendo esta rotação ou deslocamen- to ocorrer segundo vários planos no espaço; essas características sempre indicam compro- metimento orgânico ou funcional do aparelho vestibular ou de suas vias neuronais periféri- cas ou centrais. PERDA DE AUDIÇÃO E BARULHO NOS OUVIDOS Na surdez de condução de interesse para os otorrinolaringologistas está prejudicada a audição do som por via aérea, nesse caso as lesões estão situadas nos ouvidos externo ou médio. Na surdez de percepção estão prejudi- cadas tanto a audição aérea como a óssea, na qual o som é percebido pela vibração óssea produzida, por exemplo, por um diapasão co- locado na mastóide; as lesões ocorrem no ou- vido interno ou no nervo auditivo. A utilização do potencial evocado auditivo permite detec- tar alterações da transmissão do estímulo so- noro através dos núcleos cocleares do tronco cerebral e de suas conexões com a área auditi- va primária do lobo temporal. O barulho nos ouvidos pode assumir várias formas (sinos, zumbidos, assobios, sibilos, ti- que-taques, cachoeira etc.); temos dois tipos de barulhos, o tipo tonal que é subjetivo e o atonal muito mais raro e que pode ser ouvido pelo examinador e pelo paciente, consistindo este último tipo em ruídos conduzidos aos ou- vidos a partir de estruturas proximais como por exemplo em malformações arteriovenosas. COMPROMETIMENTO DA VISÃO É relativamente freqüente em afecções neurológicas, chamados de forma errônea de nervos ópticos (segundo par craniano) que partem da retina, são, na verdade, constituin- tes do sistema nervoso central enão do siste- ma nervoso periférico como acontece também com o primeiro par craniano. As manifesta- ções oculares não retinianas são especialmen- te de interesse do oftalmologista, embora possam ter significado neurológico como por exemplo acontece com o anel de Kaiser-Flei- sher, o qual é devido a depósito de cobre, ca- racterístico da doença de Wilson. Dentre as manifestações que aparecem nas lesões dos trajetos visuais que ligam a retina até o córtex calcarino no lobo occipital, onde se situam as áreas receptivas primárias da visão, devemos considerar os escotomas e a cegueira mono- cular das afecções do segundo par craniano, as hemianopsias bitemporais do comprometi- mento do quiasma ósseo, as hemianopsias ho- mônimas das lesões retroquiasmáticas do trato óptico ou do trato genículo calcarino e as 14 Capítulo 2 © Direitos reservados à EDITORA ATHENEU LTDA. quadrantopsias das lesões dos lobos occipital ou temporal no qual se situa a radiação ópti- ca que liga o corpo geniculado lateral à fissu- ra calcarina. Embora a medida da acuidade visual seja determinada pelo oftalmologista ela deve tam- bém ser pesquisada ainda que de modo gros- seiro pelo neurologista. A diminuição (ambliopias) e a perda (amaurose) da acuida- de visual que interessam ao neurologista são encontradas geralmente em casos de hiperten- são intracraniana, em algumas doenças dege- nerativas desmielinizantes e infecciosas do sistema nervoso. O exame do fundo de olho faz parte do exame neurológico de rotina e nele podemos encontrar atrofia óptica dependente de lesão do nervo óptico (atrofia óptica pri- mária), quando então a pupila se apresenta to- talmente ou em um setor, de cor branca, mas com os limites nítidos; na atrofia óptica secun- dária que aparece em princípio quando existe edema de papila, a cor é de tonalidade acin- zentada e seus limites são inicialmente menos nítidos. O edema de papila ou estase papilar se caracteriza pelo intumescimento da papila, em geral secundário à hipertensão intracrani- ana; nesse caso as veias estão ingurgitadas e o pulso venoso ausente, e às vezes podem ser observadas hemorragias. O exame do fundo de olho permite ainda verificar o estado das artérias e veias, dado importante na hipertensão arterial, na hemor- ragia meníngea e nas tromboses venosas reti- nianas; corioidites e corriorretinites podem também estar presentes em várias moléstias neurológicas como na toxoplasmose; na do- ença de Tay Sachs ou idiotia amaurótica fami- liar existe caracteristicamente no centro da fávea ou mácula, uma mancha cor-de-cereja e na doença de Kern-Sayre (oftalmoplegia plus ou síndrome óculo craniossomática) existe re- tinite pigmentar.
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