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UNIVERSIDADE PAULISTA INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE FARMÁCIA LICÍNIO AMARAL DA SILVA A atividade citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos em células tumorais - uma revisão Ribeirão Preto 2017 UNIVERSIDADE PAULISTA INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE FARMÁCIA LICÍNIO AMARAL DA SILVA A atividade citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos em células tumorais - uma revisão Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Paulista - UNIP, como parte dos requisitos necessários para obtenção do título de bacharel em Farmácia. Orientador: Prof. Dr. Júlio Cézar Borella Ribeirão Preto 2017 AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE. FICHA CATALOGRÁFICA LICÍNIO AMARAL DA SILVA A atividade citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos em células tumorais - uma revisão Aprovado em: _____/_____/_____ Banca Examinadora ______________________________________________ Profª. Ms. Márcia Regina Medeiros Malfará ______________________________________________ Profª. Dra. Ana Paula Landi Librandi ______________________________________________ Prof. Dr. Waldemar Galante Júnior Ribeirão Preto 2017 DEDICATÓRIA À minha família: À minha esposa Milene, que com palavras não consigo descrever o quanto significa para mim. Pela sua mediação, me trouxe o equilíbrio para balancear as idéias concorrentes apostas que habitavam em meu pensamento, sendo fundamental, central, em minhas tomadas de decisões. Guardo-lhe o mais profundo agradecimento, meu eterno amor, por ter aceitado a privação da minha companhia em função dos estudos e do trabalho, concedendo-me a oportunidade de me realizar ainda mais. Obrigado pelo seu respeito e amor, por existir e estar comigo. Ao meu pai Manoel e minha mãe Helena, enquanto pessoas igualmente belas e admiráveis em essência foram a peça inicial de grande importância para as bases da edificação de minha educação, de minha vida, por constituírem estímulos e atitudes que bem influenciaram minha pessoa impulsionando-me a buscar vida a cada momento, a buscar meus sonhos, a traçar metas e estabelecer prioridades para atingir meus objetivos. À minha irmã Maria Licineide e ao meu irmão Lionilson, pela nossa infância, pela cumplicidade no olhar, pelas fantasias e sonhos, pelas nossas conquistas, pela atenção, dedicação, apoio, segurança, carinho e amor, por todos os momentos e por tudo que vocês representam para mim. Agradecimentos "Enquanto os rios correrem para o mar, os montes fizerem sombra aos vales e as estrelas fulgirem no firmamento, deve durar a recordação do benefício recebido na mente do homem reconhecido." (Publio Marón Virgílio) A Deus, Nosso Senhor, pelo dom da vida, pela dádiva da vida, pela graça, pela força. Ao meu Orientador, Prof. Dr. Júlio Cézar Borella, pela orientação, atenção, compreensão e paciência, muito obrigado. À Profª. Ms. Márcia Regina Medeiros Malfará, pela dedicação e paciência, obrigado. Ao coordenador do curso, Prof. Dr. Wilson Roberto Malfará, por sua dedicação incondicional, consideração e apresso. Ao mestrando Elves Obede dos Santos Nunes, pela força, incentivo, entusiasmo e apoio. Meus sinceros agradecimentos. Aos meus colegas e amigos, Léia, Fran, Jéssica, Carlos e Ezequiel que tanto me ajudaram e contribuíram na minha formação acadêmica, obrigado. Epígrafe “Para fazer face a situações assim, que me convencem deminhaimpotência, tenho aplicado, com vitória, uma estratégia queminha longa existência me fez aprender: entrego o problema ouentrego a mim mesmo, confiando na providência divina, e,portanto, predisposto a aceitar o que vier como resposta, e,numa prova de amor e fé, agradeço a Deus, antecipadamente,pela resposta que Ele achar melhor, seja qual for. Entrego, confio, aceito e agradeço!” (José Hermógenes de Andrade Filho) RESUMO O câncer é responsável pela alta taxa de morbidade e mortalidade no mundo, sendo a segunda causa de morte, perdendo para as doenças cardiovasculares. Atualmente, o tratamento das neoplasias malignas depende do estágio da doença e são utilizadas abordagens combinadas ou individuais, tais como excisão cirúrgica, radioterapia e quimioterapia. Alguns fármacos utilizados no tratamento do câncer tiveram sua origem a partir de produtos naturais; paclitaxel e alcaloides da Vinca como vincristina e vimblastina são exemplos de agentes anticâncer derivados de espécies como Taxus brevifolia e Catharanthus roseus respectivamente. Um grupo de compostos que vem despertando interesse na última década são os esteroides cardiotônicos, especialmente os cardenolídeos. Esses compostos são metabólitos secundários existentes em algumas famílias de plantas e apresentam essa denominação devido sua ação inibitória na bomba Na+/K+-ATPase e também em razão dos efeitos sobre a musculatura cardíaca. Por este motivo, cardenolídeos como digoxina, digitoxina e ouabaína são clinicamente empregados no tratamento da insuficiência cardíaca congestiva e em algumas arritmias atriais. Nos últimos anos, inúmeros estudos relataram a potencial atividade citotóxica, antiproliferativa, antitumoral e anticâncer frente algumas linhagens de células tumorais humanas de alguns tipos de cardenolídeos. Compostos como a convalotoxina (CON), a digitoxigenina monodigitoxosídeo (DGX) e o glucoevatromonosídeo (GEV) são exemplos de cardenolídeos que possuem atividade citotóxica em algumas linhagens de células tumorais humanas, porém a linhagem celular A549 (câncer de pulmão) é uma das mais sensíveis, apresentando efeitos antiproliferativo, antimigratório e anti- invasivo. Há ainda, três compostos à base de cardenolídeos em estudo para o tratamento do câncer: o AnvirzelTM , PBI-05204 e UNBS1450. Esses produtos estão sendo submetidos a estudos farmacológicos. Palavras-chave: cardenolídeos, câncer, apoptose, atividade citotóxica, bomba de sódio e potássio ABSTRACT Cancer is the second leading cause of morbidity and mortality worldwide after cardiovascular diseases. Currently the treatment of malignant neoplasms depends on the stage of the disease and it consists of the use of combined or individual approaches such as surgical excision, radiotherapy and chemotherapy. Some drugs used in the treatment of cancer had their origins from natural products; paclitaxel and Vinca alkaloids like vincristine and vinblastine are examples of anticancer agents derived from species like Taxus brevifolia and Catharanthus roseus respectively. In the last decade a group of compounds that has been arousing interest are the cardiotonic steroids, especially the cardenolides. These compounds are secondary metabolites existing in some plant families and it has this denomination due to its inhibitory action on the pump Na+/K+-ATPase and also because of the effects on the cardiac muscles.For this reason, cardenolides like digoxin, digitoxin and ouabain are clinically used in the treatment of congestive heart failure and in some atrial arrhythmias. Over the last few years several studies reported the potential cytotoxic activity, antiproliferative, antitumor, and anticancer against some human tumor celllines of some types of cardenolides. Compounds such as convallotoxin (CON), digitoxigenin monodigitoxoside (DGX) and glucoevatromonoside (GEV) are examples of cardenolides that have antiproliferative activity in some human tumor cell lines, however one of the most sensitive cell line is the A549 (lung cancer), showing antiproliferative, antimigratory, and anti-invasive effects. There are also three cardenolide-based compounds being studied for the treatment of cancer: AnvirzelTM, PBI-05204 and UNBS1450. These products are undergoing pharmacological studies. Keywords: cardenolides, cancer, apoptosis, cytotoxic activity, sodium and potassium pump. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Características de células tumorais...........................................................25Figura 2: Fases da carcinogênese: iniciação, promoção e progressão....................27 Figura 3: Cânceres mais incidentes em todo o mundo ............................................28 Figura 4: Da esquerda para a direita: Catharanthus roseus (A), vincristina e vimblas- tina (B), Taxus brevifolia (C) e paclitaxel (D), respectivamente.................................30 Figura 5: Estrutura básica de um cardenolídeo........................................................32 Figura 6: Estrutura básica de um bufadienolídeo .....................................................33 Figura 7: Esquema de membrana das cadeias α e β da Na+/K+-ATPase ................34 Figura 8: Diferentes mecanismos de morte celular programada ..............................39 Figura 9: Processo de autofagia...............................................................................40 Figura 10: Proteínas envolvidas na sinalização da necroptose................................41 Figura 11: Espécies da família Apocynaceae...........................................................43 Figura 12: Estrutura química do glucoevatromonosídeo ..........................................45 LISTA DE QUADROS Quadro 1: Características das três principais vias de morte celular e as formas de detecção....................................................................................................................37 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Principais sítios de incidência de câncer previstos para o biênio 2016/2017.. ...............................................................................................................29 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS A549: linhagem de células de tumor pulmonar humano APF: antiproliferativa ATP: adenosina trifosfato CI50: concentração que inibe 50% da proliferação celular CON: convalotoxina DGX: digitoxigenina monodigitoxosídeo DNA: ácido desoxirribonucléico GEV: glucoevatromonosídeo HSV-1: Herpes Simplex Virus tipo 1 HSV-2: Herpes Simplex Virus tipo 2 ICC: insuficiência cardíaca congestiva INCA: instituto Nacional do Câncer MEC: matriz extracelular Na+/K+-ATPase: bomba de sódio e potássio ATPase NCCD: Comitê de Nomenclatura em Morte Celular RIP-1: proten kinase 1 RNA: ácido ribonucléico TNFR: receptor do fator de necrose tumoral SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................14 2. OBJETIVOS .......................................................................................................18 2.1 Objetivo geral .............................................................................................19 2.2 Objetivos específicos ................................................................................19 3. JUSTIFICATIVA..................................................................................................20 4. METODOLOGIA.................................................................................................22 5. DESENVOLVIMENTO/RESULTADOS ..............................................................24 5.1 Fisiopatologia do câncer ...........................................................................25 5.1.1 Processo de carcinogênese......................................................................26 5.1.2 Epidemiologia do câncer...........................................................................28 5.1.3 Tratamento do câncer ...............................................................................29 5.1.4 Produtos naturais e agentes antineoplásicos............................................30 5.2 Cardenolídeos e bufadienolídeos.............................................................31 5.2.1 Fontes naturais de esteroides cardioativos...............................................31 5.2.2 Estruturas químicas de cardenolídeos e bufadienolídeos.........................32 5.2.3 Principal mecanismo de ação dos glicosídeos cardiotônicos....................33 5.2.4 Demais atividades farmacológicas de cardenolídeos ...............................34 5.3 Atividade anticâncer de cardenolídeos....................................................35 5.3.1 Vias de morte celular e alvos terapêuticos no câncer...............................36 5.3.2 Ação citotóxica em células tumorais .........................................................41 5.3.3 Atividade antiproliferativa frente a linhagens de células tumorais.............42 5.3.4 Cardenolídeos naturais e semi-sintéticos mais promissores ....................44 6. CONCLUSÃO.....................................................................................................46 REFERÊNCIAS ..................................................................................................48 1 INTRODUÇÃO 15 O câncer ou neoplasia maligna é um conjunto de mais de 100 doenças que apresentam crescimento descontrolado de células tumorais, podendo disseminar-se para qualquer região do corpo dando origem a novos tumores (BRASIL/INCA, 2017; LEMKE; WILLIAMS, 2008). Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o câncer é a segunda causa de morte no mundo com cerca de 14,1 milhões de novos casos em 2012 e 8,2 milhões de mortes relacionadas à doença. A estimativa para as próximas décadas é de 22 milhões de casos novos. Com 190 mil óbitos/ano, o câncer é a segunda causa de morte no Brasil. Para o biênio 2016/2017 são estimados cerca de 600 mil casos novos, sendo que os principais tipos de cânceres afetarão pele (não melanoma), próstata e mama. Outros tipos de neoplasias malignas acometerão cólon, pulmão, estômago, colo do útero e cavidade oral (BRASIL/INCA, 2016). A origem ou processo de formação de uma neoplasia maligna, bem como sua manutenção e evolução é chamada de carcinogênese ou oncogênese (BABA; CÂTOI, 2007; HANAHAN; WEINBERG, 2011). Em geral, ocorre de forma lenta, podendo levar vários anos para que uma célula neoplásica origine um tumor detectável, evento esse que passa por vários estágios, a saber: iniciação, promoção e progressão (TALAVIYA, 2011; BRASIL/INCA, 2017). No primeiro estágio, a iniciação, ocorre uma reação entre o agente cancerígeno e o DNA, podendo haver uma susceptibilidade genética. No segundo estágio, ou seja, a promoção ocorre de forma lenta, evento este que pode durar meses ou até mesmo anos para ocorrer. Neste estágio, mudanças nos hábitos de vida podem influenciar para que o câncer não se desenvolva. O último estágio, a progressão, ocorre a disseminação e expansão, processo este irreversível que se dá até surgirem manifestações clínicas (TALAVIYA, 2011). Atualmente, o tratamento do câncer pode ser realizado por três linhas de abordagens diferentes: cirurgia, radioterapia e quimioterapia, além de técnicas inovadoras como a fototerapia dinâmica e imunoterapia, podem ser utilizadas como coadjuvante (DE ALMEIDA et al., 2005; BORGHAEI; SMITH; CAMPBEL, 2009). Há no mercado vários fármacos antineoplásicos, onde a maioria introduzida na terapêutica nas últimas décadas teve sua origem em produtos naturais (COSTA- LOTUFO et al., 2010). Trabalhos recentes indicaram que 49% de um total de 175 medicamentos anticâncer introduzidos nos mercados da América do Norte, Europa e Japão, entre 1940 e 2014, eram derivados de produtos naturais (NEWMAN; 16 CRAGG, 2016). Segundo Gullo e colaboradores (2006), 60% dos novos fármacos usados para o tratamento de câncer e 75% para doenças infecciosas são oriundos de fontes naturais. No campo da oncologia, um dos mais importantes antineoplásicos é paclitaxel, extraído da Taxus brevifolia Nutt, Taxaceae, que despertou grande interesse a partir da década de 80, porém acreditava-se não ser possível seu uso terapêutico devido à sua estrutura complexa e à relativa escassez da sua fonte natural, problema comum encontrado quando se trata de produtos naturais (JULSING et al., 2006). Em 1994, o paclitaxel foi totalmente sintetizado por Holton e Nicolau, partindo- se de precursores e análogos que utilizaramrotas semi-sintéticas que recentemente foram otimizadas tornando um método eficiente de obtenção em escala industrial (VIEGAS et al., 2006). Dos novos agentes anticancerígenos de origem vegetal descobertos nos últimos 50 anos, destacam-se também a vimblastina e a vincristina, alcaloides da Vinca, isoladas da espécie Catharanthus roseus L., Apocynaceae, utilizados no tratamento de leucemias, linfomas, cânceres de testículos, mama, pulmão e sarcoma de Kaposi (BRANDÃO et al., 2010; UNNATI et al., 2013). Esteroides cardiotônicos tais como cardenolídeos, são compostos encontrados na natureza e têm a capacidade de agir inibindo a enzima Na+/K+- ATPase, e portanto, são utilizados no tratamento da insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e como antiarrítmico (WEN et al., 2016). São encontrados em algumas famílias vegetais, entre elas, Apocynaceae e Plantaginaceae (RATES; BRIDI, 2007). Estudos recentes evidenciaram que espécies da família Apocynaceae (Alstonia angustiloba, Calotropis gigantea, Dyera costulata, Kopsia fruticosa e Vallaris glabra) apresentam atividade anticancerígena, antipalúdica, antiproliferativa e são utilizadas na medicina popular para tratar enfermidades gastrintestinais, febre, malária, diabetes, lepra, disenterias, parasitoses, úlceras, tumores e dor de ouvido (WONG et al., 2011). Glicosídeos cardiotônicos como a digoxina e o deslanosídeo, são velhos fármacos utilizados no tratamento de algumas cardiopatias, contudo, observou-se uma baixa incidência do aparecimento de câncer em pacientes tratados com esses fármacos dessa classe (MIJATOVIC et al., 2007), e a partir do final da década de 60 surgiram as primeiras evidências da atividade citotóxica in vitro e antitumoral in vivo 17 desses compostos frente às células tumorais (SHIRATORI, 1967; PRASSAS; DIAMANDIS, 2008). Segundo De Oliveira e colaboradores (2013), a ação antitumoral de glicosídeos cardiotônicos tem sido observada em linhagens de células tumorais a saber: TK-10 (adenocarcinoma renal), MCF-7 (adenocarcinoma de mama), UACC- 62 (melanoma maligno) e K-562 (células leucêmicas), onde observou-se apoptose em concentrações não tóxicas, sendo que o mecanismo conhecido de ação desses compostos até o momento é a inibição da enzima Na+/K+-ATPase. Os efeitos citotóxicos de dois glicosídeos cardiotônicos, o monodigitoxosídeo digitoxigenina (DGX) e a convalotoxina (CON), foram estudados recentemente com quatro linhagens de células tumorais humanas, onde ambos exibiram efeitos antiproliferativos, porém a linhagem de célula tumoral do câncer de pulmão foi a mais sensível à ação desses compostos. Investigou-se efeitos antiproliferativo, antimigratório e anti-invasivo desses cardenolídeos que apresentaram baixa toxicidade para as células saudáveis (SCHNEIDER, 2016). Diante do exposto sobre o dilema que é o câncer, esse trabalho teve como objetivo desenvolver pesquisa bibliográfica buscando avaliar o nível de conhecimento que se tem sobre o efeito citotóxico e antiproliferativo dos principais cardenolídeos, relacionando os compostos mais promissores. 2 OBJETIVOS2 OBJETIVOS2 OBJETIVOS 19 2.1 Objetivo geral Desenvolver pesquisa bibliográfica no sentido de avaliar o nível de conhecimento que se tem a respeito da atividade citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos frente algumas linhagens de células tumorais humanas e identificar os compostos mais promissores. 2.2 Objetivos específicos Levantamento do nível de conhecimento relativo aos principais cardenolídeos, bem como sua atividade citotóxica em algumas linhagens de células tumorais; Levantamento do nível de conhecimento relativo ao mecanismo de ação de cardenolídeos relacionado com a atividade citotóxica e antiproliferativa. 3 JUSTIFICATIVA3 JUSTIFICATIVA3 JUSTIFICATIVA 21 A busca por novas moléculas farmacologicamente ativas derivadas de produtos naturais é cada vez mais expressiva com o passar dos anos. O número de fármacos derivados de plantas, fungos, insetos, organismos marinhos e bactérias são consideráveis. Substâncias bem conhecidas, como morfina, paclitaxel, pilocarpina, digitoxina e quinina são empregadas nas mais diversas especialidades médicas, o que têm contribuído para o tratamento de várias doenças. No entanto, velhos fármacos tais como glicosídeos cardiotônicos, especialmente os cardenolídeos, que são empregados há séculos para tratar algumas cardiopatias, continuam sendo instrumento de novas pesquisas devido outra propriedade peculiar a esse grupo de compostos: citotoxicidade frente algumas linhagens de células tumorais. A idéia de pesquisar na literatura e buscar entender o mecanismo de ação citotóxica e antitumoral surgiu da observação dessa nova propriedade dos glicosídeos cardiotônicos. Sendo assim, o interesse pelo tema proposto neste projeto partiu da importância que se faz em entender os mecanismos de ação de cardenolídeos frente algumas linhagens de células tumorais. Diante disto, este estudo tem grande importância social e acadêmica, pois traz informações relevantes sobre o progresso das pesquisas com glicosídeos cardiotônicos, especificamente, cardenolídeos. Por fim, o projeto teve o intuito de reunir informações sobre o que existe de mais recente com relação ao nível de conhecimento sobre a ação citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos, bem como buscar relacionar os compostos mais promissores. 22 4 METODOLOGIA4 METODOLOGIA4 METODOLOGIA 23 O presente trabalho foi desenvolvido a partir da realização de revisão de literatura para busca de informações sobre a atividade citotóxica e antiproliferativa de cardenolídeos em células tumorais. Para isso, foi feito um levantamento entre os anos de 2000 e 2017 nas bases de dados da PubMed, Scielo, Lilacs e Medline, utilizando como palavras-chave: “cardenolídeos”, “câncer”, “apoptose”, “atividade citotóxica” e “bomba de sódio e potássio”.Somando-se aos conteúdos encontrados nos mais diversos tipos de artigos, revistas e monografias, foram utilizados também livros da área que trouxeram informações relevantes sobre o assunto. 5 DESENVOLVIMENTO/RESULTADOS5 DESENVOLVIMENTO/RESULTADOS5 DESENVOLVIMENTO/RESULTADOS 25 5.1 Fisiopatologia do câncer A palavra câncer, deriva do termo grego “caranguejo”, karkinos, e teve sua origem diante da observação feita por Hipócrates, por volta de 400 a.C., de uma massa (tumor) com vasos sanguíneos inchados que a contornava, lembrando um caranguejo (MUKHERJEE, 2012). O termo se refere especificamente a vários tumores malignos caracterizados pelo crescimento e proliferação de células transformadas (células malignas), que apresentam alta capacidade de invadir tecidos e órgãos adjacentes, evento este denominado metástase (DE ALMEIDA et al., 2005). A célula tumoral possui características peculiares, entre elas, a aceleração do ciclo celular, alterações nos seus genes, crescimento invasivo, alta mobilidade, quimiotaxia e secreção de fatores líticos, além de morfologicamente apresentar núcleo grande, com tamanho e forma irregulares, nucléolo proeminente e pouco citoplasma que se evidencia intensamente colorido ou às vezes excessivamente pálido (BABA; CÂTOI, 2007). Células neoplásicas apresentam metabolismo desorganizado levando a alteraçõesdo ciclo celular e genômicas, aumento da motilidade celular, quimiotaxia, mudanças na superfície celular, secreção de fatores líticos, potencial proliferativo ilimitado, auto-suficiência para os sinais de crescimento, resistência aos sinais antiproliferativos e apoptóticos, fuga do sistema imune, fenótipos de estresse metabólico, proteotóxico, mitótico, oxidativo e de danos ao DNA, angiogênese, invasão tecidual e capacidade de provocar metástase (figura 1) (LUO; SOLIMINI; ELLEDGE, 2009). Figura 1: Características de células tumorais Fonte: LIMA (2016) 26 Alterações celulares, bem como mutações no DNA aparecem normalmente com uma freqüência de um em cada 20 milhões de genes por divisão celular. Baseando-se nisso,as populações humanas no mundo todo apresentariam freqüências semelhantes de câncer, contudo isso não ocorre, o que leva a acreditar que fatores hereditários e/ou ambientais podem interferir na incidência do câncer em algumas populações. No entanto, presume-se que algumas populações apresentam genes susceptíveis ao câncer e que fatores ambientais contribuem para maior incidência do mesmo (HEJMADI, 2010). Conclui-se que o fato dos genes estarem distribuídos de forma heterogênea nas populações, não explica as diferenças de taxas de incidência de câncer no mundo. O exemplo disso é a incidência de câncer de estômago entre os japoneses que é de seis a oito vezes maiores que entre os norte-americanos. Porém, filhos de imigrantes japoneses que se vivem na América do Norte, apresentam taxas de incidência de câncer de estômago comparáveis as dos norte-americanos. Assim sendo, acredita-se que o risco de desenvolver câncer de estômago está relacionado ao forte fator ambiental associado à bactéria Helicobacter pylori. Cânceres de mama, fígado e boca têm sido associados ao uso excessivo de álcool; os cânceres de pulmão, boca e garganta estão relacionados ao tabagismo na mesma proporção entre homens e mulheres. (HEJMADI, 2010; SCHNEIDER, 2015). 5.1.1 Processo de carcinogênese A Carcinogênese, ou seja, a formação do câncer é o processo inicial ao aparecimento de uma neoplasia maligna, que ocorre lentamente, podendo levar vários anos para que uma célula cancerosa se prolifere e dê origem a um tumor (BRASIL/INCA, 2017). Este processo tem vários estágios antes de chegar ao tumor: iniciação, promoção e progressão (figura 2) (ALMEIDA et al., 2005). O primeiro estágio da carcinogênese, a iniciação, se dá com a ação de um agente oncoiniciador no DNA cromossômico, provocando modificações em alguns dos seus genes que podem ser reparados ou reproduzidos. Os mecanismos e as possibilidades de reparação são complexos e a curto e longo prazo, são desconhecidas. As células nessa fase encontram-se com seu material genético alterado, contudo, ainda não é possível detectar clinicamente um tumor. Neste 27 processo, os fatores cancerígenos (vírus oncogênicos, radiação, substâncias químicas, entre outros) têm uma ação genotóxica irreversível e os mecanismos de reparação não ocorrem. São exemplos de substâncias químicas carcinógenas: sulfato de dimetila, metilnitrossuréia, cloreto de vinila, aflatoxinas, dimetilnitrosamina e benzopireno. (DE ALMEIDA et al., 2005; BABA; CÂNTOI, 2007; SCHNEIDER, 2015). A promoção é o segundo estágio da carcinogênese, onde as células estão geneticamente alteradas e sofrem ação de agentes cancerígenos denominados oncopromotores. A célula “iniciada’’ é capaz de sofrer crescimento autônomo. A promoção do tumor é, em grande parte, e talvez até mesmo totalmente, associada a fatores epigenéticos, que alteram, direta ou indiretamente, a expressão do DNA genômico (DE ALMEIDA et al., 2005; BABA; CÂTOI, 2007; OLIVEIRA et al., 2007). O terceiro e último estágio da carcinogênese é a progressão e é caracterizado pela multiplicação celular descontrolada; nessa etapa, o câncer já está instalado e evolui até o surgimento das primeiras manifestações da doença (BRASIL/INCA, 2017).A progressão é caracterizada por irreversibilidade, instabilidade genética, crescimento mais rápido, invasão, metastização e mudanças nas características bioquímicas, metabólicas e morfológicas das células. A angiogênese, como ocorrência epigenética, é essencial para a progressão neoplásica. A aquisição de um fenótipo angiogênico precede o desenvolvimento de características que contribuem para a malignidade e sua inibição atrasa o desenvolvimento neoplásico (OLIVEIRA et al., 2007). Figura 2: Fases da carcinogênese: iniciação, promoção e progressão Fonte: Adaptado de OLIVEIRA et al., 2007 28 5.1.2 Epidemiologia do câncer Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) o câncer está entre as principais causas de morbidade e mortalidade no mundo com cerca de 14,1 milhões de casos novos em 2012e 8,2 milhões de mortes relacionadas a esta enfermidade, sendo que 60% dos casos novos e 70% das mortes ocorreram em países em desenvolvimento e a projeção para as próximas duas décadas é que o número de casos novos atinja a marca dos 22 milhões. O câncer de pulmão é a neoplasia malignamais comum em todo o mundo, correspondendo a 13%, ou seja, 1,8 milhões do número total de novos casos diagnosticados em 2012. Em segundo lugar está o câncer de mama (somente mulheres) entre o mais comuns com quase 1,7 milhão de novos casos e emterceiro o câncer colorretal com quase 1,4 milhão de novos casos em 2012 (figura 3)(WCRF, 2012). Figura 3: Cânceres mais incidentes em todo o mundo Fonte: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/02/160204_gch_graficos_cancer_fn De acordo com dados do projeto Globocan, nas regiões da América Latina e Caribe, a estimativa foi de 1,1 milhões de novos casos de câncer em 2012, dos quais os mais incidentes foram os cânceres de próstata de mama. 29 Com 190 mil óbitos/ano, o câncer é a segunda causa de morte no Brasil. Para o biênio 2016/2017 são estimados cerca de 600 mil casos novos, sendo que os principais tipos de cânceres afetarão pele (não melanoma), próstata e mama (Tabela 1). Outros tipos de neoplasias malignas acometerão cólon, pulmão, estômago, colo do útero e cavidade oral (BRASIL/INCA, 2016). Tabela1: Principais sítios de incidência de câncer previstos para o biênio 2016/2017 Fonte: BRASIL/INCA (2016) 5.1.3 Tratamento do câncer Atualmente, o tratamento do câncer pode ser realizado por três linhas de abordagens diferentes: cirurgia, radioterapia e quimioterapia, que podem ser empregadas separadamente ou em conjunto, além de técnicas inovadoras como a fototerapia dinâmica e a imunoterapia (BORGHAEI; SMITH; CAMPBEL, 2009; DE ALMEIDA et al., 2005;). Os fármacos usados para o tratamento do câncer são classificados conforme seu modode ação. Muitos deles exercem atividade sobre as células no processo de divisão, os quais são denominados de fármacos ciclo-celular específicos (antimetabólitos, alcaloides e hormônios), enquanto que outros têm capacidade de induzir morte em células que não estão em estado de proliferação, denominados fármacos ciclo-celular não específicos (complexos de platina, antibióticos e agentes alquilantes diversos) (SCHNEIDER, 2015). 30 5.1.4 Produtos naturais e agentesantineoplásicos Os produtos naturais extraídos de plantas, fungos, bactérias e outros organismos, são utilizados em formulações farmacêuticas, tanto na forma pura, como na forma de extratos (GRANADA et al., 2009). Muitas substâncias utilizadas na terapêutica antineoplásica são derivadas de produtos naturais. Uma revisão de fármacos anticâncer lançados nos mercados farmacêuticos da América do Norte, Europa Ocidental e Japão de 1940 a 2006 mostrou que aproximadamente 49% de um total de 175 medicamentos anticâncer aprovados pelas agências regulatórias dos respectivos países, eram direta ou indiretamente derivados de produtos naturais (NEWMAN; CRAGG, 2012; SCHNEIDER, 2015). Os fármacos derivados de produtos naturais, empregados na clínica oncológica, desempenham um papel importante. Como exemplos podem ser citados os alcaloides da Vinca, vimblastina e vincristina, isolados de Catharanthusroseus L., Apocynaceae, usados no tratamento de leucemias, linfomas, cânceres de testículos, de mama, de pulmão e sarcoma de Kaposi; e o paclitaxel, obtido de TaxusbrevifoliaNutt.,Taxaceae, é significativamente ativo contra cânceres de ovário, mama e pulmão (figura 4) (UNNATI et al., 2013). Figura 4: Da esquerda para a direita: Catharanthus roseus (A), vincristina e vimblastina (B), Taxus brevifolia (C) e paclitaxel (D), respectivamente. (A) (B) (C) (D) Fonte: Adaptado de DE ALMEIDA et al., 2005 31 5.2 Cardenolídeos e bufadienolídeos Os cardenolídeossão glicosídeos cardiotônicos que estão distribuídos em algumas famílias vegetais, tais comoApocynaceaee Plantaginaceae(RATES; BRIDI, 2007), enquanto que os bufadienolídeos são esteroides cardioativos encontrados tanto em família de vegetais (Crassulaceae, Hyacinthaceae, Iridaceae, Melianthaceae, Ranunculaceae e Santalaceae) quanto de animais tais como sapos (Rhinella, anteriormente Bufo), cobra (Rhabdophis tigrinus) e um artrópode (Photinus) (HUTCHINSON et al., 2007). 5.2.1 Fontes naturais de esteroides cardiotônicos As plantas têm a capacidade de sintetizar e armazenar agentes biologicamente ativos, dos quais alguns se tornaram fármacos largamente utilizados na quimioterapia contra o câncer. Uma das famílias de plantas com conhecido potencial anticancerígeno é a Apocynaceae, representada principalmente pelos gêneros Catharanthus, Nerium, Strophanthus, Apocynum e Thevetia (RAMOS-SILVA, et al., 2017). Os principais metabólitos das espécies dessa família são triterpenoides, iridoides, alcaloides e cardenolídeos, conhecidos por uma ampla gama de atividades biológicas e farmacológicas, tais como propriedades cardioprotetoras, hepatoprotetoras, neuroprotetoras, antiinflamatórias, anticancerígenas e antimaláricas (CHAN; WONG; CHAN, 2016). De acordo com Wen e colaboradores (2016), foram isolados e catalogados até o presente momento 109 cardenolídeos a partir da família Apocynaceae, onde cerca de um quarto desses agentes naturais tem atividade sobre células cancerosas através de diferentes vias de sinalização. Quanto aos bufadienolídeos, mais de 250 moléculas diferentes foram identificadas em espécies vegetais e animais até o momento. Eles estão presentes nas secreções de glândulas mucosas e fluidos corporais de sapos do gênero Rhinella, sendo que esses compostos não ocorrem somente na forma de geninas, 32 mas várias ligações no C-3 são conhecidas, a saber, sulfatos, ésteres dicarboxílicos e aminoácidos (BALDO, 2015). 5.2.2 Estruturas químicas de cardenolídeos e bufadienolídeos Os cardenolídeos são compostos constituídos por umnúcleo esteroidal, uma porção lactona (conjuntamente denominados deporção aglicona ou genina) e uma porção osídica ligada ao núcleofundamental. Estes compostos são formados a partir daciclização doesqualeno que origina o núcleo esteroidal, ociclopentanoperidrofenantreno. O anel pentagonal lactônico éinsaturado na posição α,β insaturada do C-17β. A porção açúcar égeralmente ligada ao carbono 3β do núcleo esteroidal. Noscardenolídeos, os anéis A/B e C/D se apresentam na conformação cis,enquanto os anéis B/C encontram-se fusionados na conformação trans (figura 5) (CARVALHO, 2012). Figura 5: Estrutura básica de um cardenolídeo Fonte: SCHNEIDER (2015) Nos cardenolídeos, os açúcares estão comumente ligados à aglicona, especificamente ao C-3 do anel esteroidal. Os mais comuns são: digitoxose, oleandrose, diginose, fucose, tevetose, digitose (todos são 2-desoxioses), ramnose e glicose (RATES; BRIDI, 2007). Esses açúcares ligados à sua estrutura molecular conferem à molécula maior solubilidade, facilitando a absorção e distribuição desses compostos no organismo, mesmo que as geninas sejam absorvidas mais 33 rapidamente e menos metabolizadas que os heterosídeos. A parte glicosídica dos cardenolídeos não é responsável pelo efeito cardiotônico dos glicosídeos cardíacos, mas influencia na farmacodinâmica e farmacocinética, visto que suas configurações ajudam na afinidade de ligação ao sítio ligante da proteína receptora (RATES; BRIDI, 2007; PRASSAS; DIAMANDIS, 2008). Os Bufadienolídeos são esteroides cardioativos poliidroxilados com 24 carbonos, que se apresentam na forma livre ou conjugada com sulfatos, ésteres dicarboxílicos e aminoácidos na posição C-3, apresentando um anel lactônico duplamente insaturado com grupo 2-pirrol ligado ao C-17 do núcleo ciclopentanoperidrofenantreno (figura 6) (DE SOUSA et al., 2017). Figura 6: Estrutura básica de um bufadienolídeo Fonte: MACHADO (2014) 5.2.3 Principal mecanismo de ação dos glicosídeos cardiotônicos A Na+/K+-ATPase é uma enzima que está presente na membrana plasmática da maioria dos seres eucariotos superiores com a função biológica de regulação da entrada e saída de íons Na+e K+; essa proteína de membrana é um heterodímero composto por duas subunidades: α – catalítica e β – reguladora (GARÇON, 2007). Na subunidade α localizam-se os sítios de ligação dos íons Na+, K+, ATP e esteroide cardiotônico; a subunidade β é essencial para o funcionamento da enzima e sua integração com a membrana plasmática, além de possuir alguns sítios de glicolisação necessários à atividade da enzima (figura 7) (MIJATOVIC et al., 2007). 34 Figura 7: Esquema de membrana das cadeias α e β da Na+/K+-ATPase Fonte: GARÇON (2007). A bomba Na+/K+-ATPase é responsável por desenvolver atividades no equilíbrio eletrolítico celular através da inclusão de íons K+e na exclusão de íons Na+ através da membrana celular na estequiometria de 3:2 utilizando a energia da hidrólise de um ATP. No entanto, uma nova função lhe foi atribuída recentemente: atua como transdutor de um sinal entre os meios extra e intracelular e sua atividade pode influenciar a migração, comunicação e proliferação celular, inclusive a apoptose, constatou-se que a sobrevivência da célula não é viável em casos de supressão total da atividade da bomba de sódio (PRATSCHER et al., 2008). Os glicosídeos cardiotônicos são utilizados para fins medicinais há séculos, sendo até hoje empregados para o tratamento da insuficiência cardíaca congestiva (ICC), por serem fármacos com ação inotrópica positiva sobre o músculo cardíaco, aumentando sua contratilidade. O principal representante dessa classe de fármacos é a digoxina, que em conjunto com o deslanosídeo, são os cardenolídeos comercializados no mercado farmacêutico brasileiro (BRASIL, 2008). Além da sua indicação tradicional na ICC, seu uso é recomendado nas seguintes situações: profilaxia e tratamento de arritmias como fibrilação atrial e taquicardia atrial paroxística e choque cardiogênico (RATES; BRIDI, 2007). 5.2.4 Demais atividades farmacológicas de cardenolídeos Os glicosídeos cardíacos são empregados há anos no tratamento de algumas cardiopatias, porém investigações recentes da ação desses compostos 35 em outras situações patológicas apontam novas possibilidades terapêuticas para esse grupo de substâncias. (PRASSAS; DIAMANDIS, 2008; CARVALHO, 2012). Investigações relacionadas à ação antiviral dos cardenolídeos, concluíram que eles apresentam efeito inibitório do vírus herpético humano tipo I (HSV-1), induzido pela digoxina (HARTLEY et al., 2006), ouabaína (DODSON et al., 2007) e digitoxina (SU et al., 2008). Segundo Hartley e colaboradores (2006), a digoxina possui atividade antiviral para outros tipos de vírus DNA (HSV-2, vírus da varicela zoster, citomegalovirus, e adenovirus); já Hoffmann (2008) identificou atividade do mesmo fármaco para vírus RNA (vírus influenza, vírus da doença de New Castle e vírus da estomatite vesicular). Ainda, mais recentemente, Bertol e colaboradores (2011) propuseram o mecanismo de ação de um tipo de cardenolídeo, o glucoevatromonosídeo (GEV), isolado da Digitalis lanata que inibiu a replicação do HSV-1. Outra linha de investigação com cardenolídeos que vem crescendo é com relação à atividade antitumoral. Sabe-se que a sua primeira evidência de inibição da proliferação de células tumorais aconteceu no final da década de 60; contudo, após esse período os estudos se limitaram à ação cardiotônica, bem como seu emprego nas doenças cárdicas (PRASSAS; DIAMANDIS, 2008). 5.3 Atividade anticâncer de cardenolídeos Importantes estudos indicam o potencial antitumoral promovido por cardenolídeos. No entanto, só nos últimos dez anos houve um aumento significativo da quantidade de estudos observando a ação de cardenolídeos frente o crescimento de células tumorais (NEWMAN et al., 2007). Um marco para os estudos que se seguiram sobre o potencial citostático, antitumoral e anticâncer dos cardenolídeos iniciou-se com Stenkvist e colaboradores(2001) em um estudo epidemiológico e retrospectivo onde observaram que pacientes com câncer de mama tratadas simultaneamente com glicosídeos carditônicos, apresentaram baixa taxa de mortalidade para esse tipo de câncer em relação às pacientes que não fizeram o uso do fármaco. Ainda, no mesmo ano, Haux e colaboradores (2001), publicaram um estudo com 9.271 36 pacientes que faziam uso da digitoxina, onde foi estabelecida uma correlação positiva das altas concentrações plasmáticas desse fármaco e risco diminuído de leucemia e cânceres do trato urinário. Vários são os relatos da atividade antiproliferativa, bem como dos efeitos apoptóticos provocados por estes compostos em linhagens celulares de cânceres de mama, próstata, pâncreas, pulmão, rins, além de leucemias, neuroblastomas e melanomas. O mecanismo pelo qual estes compostos exercem tais efeitos ainda não foi completamente elucidado, mas vários estudos vêm sendo realizados com este objetivo (PRASSAS; DIAMANDIS, 2008). 5.3.1 Vias de morte celular e alvos terapêuticos no câncer De acordo com recomendações da NCCD (Comitê de Nomenclatura em Morte Celular) a categorização da morte celular deve seguir critérios baseados em características morfológicas e enzimáticas, aspectos funcionais ou características imunológicas (KROEMER et al., 2009). Para confirmar a morte celular devem ser realizados ensaios que identifiquem os eventos bioquímicos e as alterações morfológicas decorrentes. Apesar do recente debate sobre os diferentes tipos de morte celular e suas características, do ponto de vista terapêutico, faz-se necessário abordar a questão de maneira prática, buscando avaliar se o objetivo final é alcançado, ou seja, a morte das células tumorais (KREUZALER; WATSON, 2012). Para caracterizar a morte celular devem ser realizados ensaios que identifiquem os eventos bioquímicos e as alterações morfológicas decorrentes. Os principais tipos de morte celular, bem como as características morfológicas e bioquímicas estão resumidos no Quadro 1. 37 Quadro 1: Características das três principais vias de morte celular e as formas de detecção Fonte: Adaptado de CARVALHO (2012) Ainda que a apoptose seja o principal mecanismo de morte celular investigado em resposta às terapias citotóxicas, outros tipos de morte celular devem ser considerados, com o mesmo propósito de induzir a morte de células tumorais e prevenir a proliferação e possível invasão de outros tecidos. Vários são os fatores determinantes do tipo de morte celular induzida por um determinado agente. Estes fatores incluem o tipo celular, o genótipo da célula, o microambiente em que ela se encontra, o tipo de dano induzido pelo agente, bem como a dose utilizada (TAN; WHITE, 2008). No decorrer da última década, com o aprofundamento dos estudos sobre apoptose foram identificados diversos eventos de evasão à apoptose, o que acarretou na descoberta de outras vias de morte celular, independentes da apoptose (KREUZALER; WATSON, 2012). Desta maneira, e tendo em vista que a 38 evasão à morte celular é uma das características clássicas do câncer (HANNAH; WEINBERG, 2011), a compreensão de outros tipos de morte celular se faz necessária na busca por novas abordagens que superem, principalmente, a resistência à apoptose, induzida por determinados fármacos (TAN; WHITE, 2008). a) APOPTOSE: o termo apoptose (do grego: apo - separação e ptosis - queda) faz alusão à queda das folhas das árvores no outono, já que este é um exemplo de morte celular programada (INDRAN et al., 2011).A apoptose é um mecanismo essencial para diversos processos fisiológicos, incluindo a renovação das células normais, o desenvolvimento apropriado do organismo, o funcionamento do sistema imunológico e também o desenvolvimento embrionário (HEJMADI, 2010). Durante esse processo, a célula sofre alterações morfológicas características desse tipo de morte celular. Essas alterações podem incluir retração celular, perda de aderência com a matriz extracelular (MEC) e células vizinhas, condensação da cromatina, fragmentação do DNA e formação dos corpos apoptóticos (KROEMER, MARTIN 2005). São vários fatores que determinam o tipo de morte celular induzida por agentes específicos; esses fatores incluem o tipo celular, o genótipo, o microambiente em que se encontra e o tipo de dano que o agente causa, bem como a dose utilizada (TAN; WHITE, 2008). Na última década, com o aperfeiçoamento dos estudos, foram identificados diversos eventos de evasão à apoptose, o que acarretou na descoberta deoutras vias de morte celular, independentes (KREUZALER; WATSON, 2012). Assim sendo, tendo em vista que a evasão à morte celular é uma das características clássicas do câncer, a compreensão de outros tipos de morte celular se faz necessária na busca por novas abordagens que superem principalmente, a resistência à apoptose, induzida por determinados fármacos (HANNAH; WEINBERG, 2011; TAN; WHITE, 2008). Portanto, atualmente está bem definido que a apoptose não é o único mecanismo de morte celular programada e implicada na eliminação de células malignas. Além da apoptose, nove processos distintos foram relatados por contribuírem para a eliminação de células aberrantes no organismo humano. De acordo com a dependência da ativação de caspases, eles podem ainda ser divididos em dois subgrupos (figura 8) (ORLIKOVA; DICATO; DIEDERICH, 2013). 39 O primeiro grupo de mecanismos independentes de caspases inclui necrose regulada, mitose catastrófica, entose, partanatos e netose. Por outro lado anoikis, piroptose e cornificação representam mecanismos de morte celular, onde a ativação de caspases é uma das características bioquímicas mais importantes na supressão da sobrevivência celular (GALLUZZI, et al., 2012; ORLIKOVA; DICATO; DIEDERICH, 2013). Figura 8: Diferentes mecanismos de morte celular programada Fonte: SCHNEIDER (2015) b) AUTOFAGIA: a autofagia (do grego auto- próprio e fagia - alimentar-se) é um processo que envolve a degradação e a reciclagem de organelas citoplasmáticas e de proteínas (KATSUYA; SATOSHI; HIROYASU, 2009). Esse mecanismo pode ser ativado por fármacos antitumorais, toxinas, hipóxia ou ainda privação nutricional. Nesse processo, pode ocorrer uma maciça vacuolização citoplasmática com aumento do fluxo autofágico causando a morte celular, e tal evento é chamado de “morte celular autofágica” (HEJMADI, 2010). Porém, a autofagia pode mediar diferentes processos, tanto os de sobrevivência como os de morte celular. Assim como a apoptose, este processo representa uma resposta celular fisiológica importante que, geralmente opera em níveis basais nas células, mas pode ser fortemente induzido em certos estados de estresse celular, sendo o 40 mais óbvio deles a deficiência de nutrientes (figura 9) (HANAHAN; WEINBERG, 2011). Figura 9: Processo autofagia Fonte: CARVALHO (2012) c) NECROSE: o termo necrose derivado “necros” do kernel grego, que significa “morto” e refere-se à morte acidental de células expostas a agressões ambientais ou genéticas (SYNTICHAKI; TAVERNARAKIS, 2002). A necrose é um tipo de morte celular desencadeada em resposta a um grande dano ou estresse físico, e é um processo não regulado de destruição celular traumática, caracterizada pela inflamação e ruptura celular e conseqüente liberação de dos componentes intracelulares. Nos seres humanos, a morte celular necrótica é um evento geralmente decorrente de infecções, inflamações ou isquemia, exposição à toxinas, mudanças externas de temperatura, privação de nutrientes, na produção energética e no equilíbrio do pH, os quais são essenciais na manutenção da homeostase celular (OKADA; MAK, 2004; SYNTICHAKI; TAVERNARAKIS, 2002). A resposta inflamatória resultante provoca ativação da defesaimunológica e como a 41 inflamação crônica está envolvida na promoção da formação do tumor, a indução de necrose pode ser uma alternativa nas células tumorais não-responsivas à apoptose (TAN; WHITE, 2008). Outrotermo que representa alternativa de morte celular é a necroptose. Este termo, necroptose, foi cunhado pela primeira vez em 2005, e refere-se à ocorrência de necrose como um evento programado e não somente passivo. Esta via vem sendo caracterizada nos últimos anos e já se sabe que está envolvida na patogênese de diversas doenças, tais como injúria isquêmica, neurodegeneração e infecção viral. A ativação da necroptose se dá por meio de receptores de morte comuns à apoptose, como TNFR1 e é desencadeada pela atividade das quinases RIP1 e RIP3, sendo regulada pela caspase-8 e por inibidores de apoptose. O resultado celular envolve desintegração das membranas mitocondrial, lisossomal e plasmática e, portanto, pode serconsiderada como um potencial alvo terapêutico alternativo a ser explorado (figura 10) (VANDENABEELE, 2010; KREUZALER; WATSON, 2012). Figura 10: Proteínas envolvidas na sinalização da necroptose Fonte: CARVALHO (2012) 5.3.2 Ação citotóxica em células tumorais Uma das investigações crescentes com cardenolídeos se refere ao seu potencial como agente antitumoral (SCHNEIDER, 2015). As primeiras evidências da ação citotóxica in vitro e in vivo de cardenolídeos em células tumorais foram 42 relatadas por Shiratori (1967), na década de 60. Outro estudo epidemiológico conduzido por Stenkvist e colaboradores (1980) em que pacientes com câncer de mama fizeram uso concomitante de heterosídeos cardiotônicos para seus problemas cardíacos, teve taxa de mortalidade inferior à das pacientes que não utilizaram tais fármacos. Estes relatos iniciais fizeram com que se retomassem posteriormente vários estudos sobre a atividade antiproliferativa de extratos vegetais contendo cardenolídeos, de cardenolídeos semi-sintéticos e de cardenolídeos isolados de várias espécies de plantas, bem como dos possíveis efeitos provocados por estes compostos em linhagens celulares de cânceres de mama, próstata, pâncreas, pulmão, rins, leucemias, neuroblastomas e melanomas (CHANG et al., 2013; JUNCKER et al., 2009; MIJATOVIC et al., 2007; NEWMAN et al., 2007; PONGRAKHANANON; CHUNHACHA; CHANVORACHOTE, 2013; ROCHA et al., 2014; SLINGERLAND et al., 2013). Atualmente, há três produtos à base de cardenolídeos em estudo para o tratamento do câncer. Esses compostos estão sendo submetidos a ensaios clínicos em fase I, a saber, o Anvirzel™, um extrato aquoso liofilizado de Nerium oleander (espirradeira); o PBI-05204, outro extrato de Nerium oleander, mas produzido por extração com CO2 supercrítico; e o UNBS1450, um cardenolídeo semi-sintético derivado do 2-oxovuroscharina, extraído de Calotropis procera (SLINGERLAND et al., 2013). 5.3.3 Atividade antiproliferativa de cardenolídeos frente a linhagens de células tumorais A proliferação crônica é possivelmente a característica fundamental das células cancerosas. Os tecidos normais têm um controle cuidadoso na produção e liberação de sinais que promovem através do ciclo celular a divisão e crescimento celular, garantindo assim a homeostase, bem como sua manutenção e funcionamento normal (HANAHAN; WEINBERG, 2011). Diversos estudos apontam a atividade antiproliferativade produtos naturais em linhagens de células tumorais. Um trabalho realizado por Wong e colaboradores (2011) investigou a atividadeantiproliferativa de extratos de folhas 43 de dez espécies da família Apocynaceae:Allamanda cathartica, Alstonia angustiloba, Calotropis gigantea, Catharanthus roseus, Cerbera odollam, Dyera costulata, Kopsia fruticosa, Nerium oleandre e Vallaris glabra. Os extratos com inibição de crescimento positivo foram testados adicionalmente contra seis linhas de câncer humano (MCF-7, MDA-MB-231, HeLa, HT-29, SKOV-3 e HepG2) utilizando seis diferentes concentrações de extratos(figura 11). Figura 11: Espécies da família Apocynaceae Fonte: WONG (2011). Das 10 espécies da família Apocynaceae estudadas, os extratos de A. angustiloba, C. gigantea, C. roseus, N. oleander, P. obtusa e V. glabra apresentaram atividade APF positiva. Extratosde C. gigantea e V. glabra inibiram o crescimento de todas as seis linhagens de células do câncer humano. Contra as células de câncer de mama, MCF-7 e MDA-MB-231, os extratos de C. gigantea e N. oleander foram mais potentes comparáveis aos fármacos padrões xanthorrhizol, curcumina e tamoxifeno. Todos os quatro extratos de N. oleander foram eficazes contra células MCF-7. Com atividade APF de amplo espectro, os extratos de folhas dessas três espécies são, portanto, promissores candidatos a drogas anticancerígenas. Esta atividade APF de amplo espectro foi relatada pela primeira vez neste estudo e isso requer uma investigação mais aprofundada sobre seus compostos bioativos. Um composto com potente atividade antiproliferativa é o promissor INBS1450, um cardenolídeo semi-sintético derivado da 2’’-oxovuruscharina, extraído da Calotropis procera (SLINGERLAND et al., 2013). Quimicamente, o 2’’- oxovuroscharina é um cardenolídeo com um anel diidrotiazol, isolado de um arbusto tropical, Calotropis procera (Aiton) W. T., Asclepidaceae, que apresentou inibição da bomba Na+/K+-ATPase (QUAQUEBEKE et al., 2005). 44 O UNBS1450 é um composto derivado do 2’’-oxovoruscharina por redução dos grupamentos formila e hidroximetila que mostrou um perfil de citoxicidade in vitromais potente quando comparado ao composto que o originou. Ele também apresentou atividade APF in vitro com valores de IC50 entre 10 a 50 nM em 58 linhagens de células tumorais humanas de 11 tipos histológicos diferentes (QUAQUEBEKE et al., 2005). O UNBS1450 ainda promoveu a quebra dos filamentos de actina, bem como afetou várias vias de sinalização através de ligação à bomba Na+/K+-ATPase (MIJATOVIC et al., 2007). Este composto entrou para ensaio clínico de fase I na Comunidade Européia para tratamento de pacientes com linfoma e tumores sólidos (PAN; CHAI; KINGHORN, 2012). 5.3.4 Cardenolídeos naturais e semi-sintéticos mais promissores Cardenolídeos são metabólitos secundários encontrados na natureza e assim denominados em razão de sua ação inibitória da enzima Na+/K+-ATPase (PRASSAS, I.; DIAMANDIS, 2008). Por esta razão, alguns tipos de cardenolídeos são fármacos clinicamente utilizados para o tratamento da ICC e algumas arritmias atriais (RATES; BRIDI, 2007). Contudo, nos últimos anos, vários estudos relataram a atividade citotóxica, antitumoral e antiproliferativa de alguns glicosídeos cardiotônicos. Um recente estudo feito por Carvalho (2012), onde foi realizado uma triagem citotóxica com 64 cardenolídeos diferentes em linhagem de célula tumoral humana A549 (câncer de pulmão), onde composto, o mais promissor, foi selecionado para investigação do seu mecanismo de ação através de vários ensaios. O composto eleito foi o glucoevatromonosídeo (GEV), que apresentou toxicidade para células tumorais, sendo que para a avaliação de seu mecanismo de ação uma série de ensaios foi realizada. Inicialmente, ele provocou o bloqueio do ciclo celular na fase G2/M, o que foi atribuído à diminuição da expressão da proteína ciclina B1, necessária para a progressão do ciclo celular. A indução de morte celular, não ocorreu por apoptose ou necrose, sendo provavelmente por autofagia, processo observado com a marcação de partículas acídicas, características deste tipo de morte celular. A citotoxicidade promissora do GEV foi investigada e confirmada sua indução de morte celular independente de apoptose em linhagens de células A549. 45 O GEV é apontado, ainda, como um dos cardenolídeos mais promissores identificados até o momento que pôde ser isolado da Digitalis mariana ssp. heywoodii. Tanto o GEV quanto seu isômero o neo-glucoevatromonosídeo apresentaram atividade contra o carcinoma de células renais e linhagens celulares de câncer de próstata (figura 12) (MUNKERT et al., 2017). Figura 12: Estrutura química do cardenolídeo glucoevatromonosídeo Fonte: CARVALHO (2012). Outro estudo avaliou os efeitos citotóxicos de dois cardenolídeos, adigitoxigenina monodigitoxosídeo (DGX) e a convalotoxina (CON), onde foram selecionadas quatro linhagens de células tumorais humanas para se realização dos testes. Ambos os compostos apresentaram atividade antiproliferativa em todas as linhagens de células tumorais, contudo a linhagem celular A549 foi a mais sensível, apresentando efeitos antiproliferativo, antimigratório e anti-invasivo para estes dois cardenolídeos, onde finalmente, este trabalho fornece os primeiros insights sobre os efeitos desses compostos nos principais passos de metástase de câncer de pulmão (SCHNEIDER et al., 2016). 6 CONCLUSÃO6 CONCLUSÃO6 CONCLUSÃO 47 Esteroides cardiotônicos, especialmente os cardenolídeos, são substâncias empregadas no tratamento da insuficiência cardíaca congestiva (ICC) e em algumas arritmias atriais há séculos; seu modo de ação está diretamente relacionado à inibição da enzima Na+/K+-ATPase. Contudo, além dessa indicação terapêutica tradicional, eles apresentam também importante atividade citotóxica, antiproliferativa e antitumoral, tornando-se instrumento de inúmeras investigações na última década. Seu mecanismo de ação citotóxica ainda não está bem elucidado, no entanto, os estudos indicam que induzem apoptose, necrose e/ou autofagia em células tumorais, eventos estes responsáveis por seu efeito antitumoral. Entre os cardenolídeos mais promissores investigados até o momento, estão a digitoxigenina monodigitoxosídeo (DGX), a convalotoxina (CON) e o glucoevatromonosídeo (GEV) que apresentaram importante citotoxicidade para células tumorais, além de atividades antiproliferativa, anti-migratória e anti-invasiva. Há ainda, atualmente, três produtos à base de cardenolídeos em estudo para o tratamento do câncer; o Anvirzel™, o PBI-05204, e o UNBS1450. Todos esses compostos estão sendo submetidos a estudos farmacológicos. REFERÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊNCIAS 49 BABA, A. I.; CÂTOI, C. Comparative Oncology. Bucharest: The Publishing House of the Romanian Academy, 2007. 150 p. BALDO, M. A. 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