Buscar

Roteiro - Aula 3

Prévia do material em texto

1 
www.g7juridico.com.br 
 
 
 
MAGISTRATURA E MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAIS 
Direito Penal 
Cleber Masson 
Aula 03 
 
 
ROTEIRO DE AULA 
 
 
4. Direito Penal do Inimigo 
[...] 
4.3. Efeitos da aplicação do Direito Penal do inimigo 
O Direito Penal do Inimigo é retrospectivo, pois se baseia na culpabilidade do agente, como juízo de reprovabilidade, 
aplicável sobre os cidadãos (Direito Penal do autor). Possui viés autoritário, por suprimir os direitos e garantias dos 
cidadãos. Por meio dele, se propõe a chamada antecipação da tutela penal. Já no Brasil, a punibilidade é possível a 
partir do momento em que o sujeito pratica atos de execução do crime (Direito Penal do fato). O Brasil pune o crime 
consumado e o crime tentado. A antecipação da tutela penal é a punição de atos preparatórios: o Direito Penal do 
Inimigo pune atos preparatórios, para evitar um dano maior. 
No Direito Penal Brasileiro e no Processo Penal Brasileiro adota-se o sistema do livre convencimento motivado, da 
persuasão racional ou da liberdade de prova. O Juiz pode absolver ou condenar o réu utilizando qualquer prova, desde 
que o faça fundamentadamente, respeitando-se os direitos e garantias previstos na Constituição e nas leis. No Direito 
Penal do Inimigo, admite-se o emprego da tortura como forma de obtenção da confissão, considerando-se lícita a 
prova assim extraída. Essa autorização derivaria do princípio da proporcionalidade: de um lado, há a integridade física 
e moral de um sujeito que quer destruir o Estado; de outro, há bens jurídicos de pessoas inocentes. 
O Direito Penal do Inimigo defende o fortalecimento, a ampliação dos poderes da Polícia. Então, é contra a chamada 
reserva de jurisdição: tudo o que a Polícia deve fazer deverá ser solicitado anteriormente ao Juiz. Para Jakobs, isto 
somente tornaria o trabalho burocrático, dificultando a apuração dos crimes e favorecendo o inimigo. O Judiciário 
deveria fazer um controle apenas posterior, de averiguação de abusos, e não prévio. 
 
4.4. A terceira velocidade do Direito Penal 
O Direito Penal do Inimigo também é conhecido como a “terceira velocidade do Direito Penal”. Isto porque se aplica a 
pena de prisão (até mesmo aquela por tempo indeterminado) e, ao mesmo tempo, é extremamente célere, já que 
suprime direitos e garantias. 
 
4.5. O Direito Penal do Inimigo no Brasil 
 
2 
www.g7juridico.com.br 
É possível aplicar, no Brasil, o Direito Penal do Inimigo? Na forma proposta por Jakobs, a resposta é não: o art. 5º, 
caput, da CRFB/88, consagra o princípio da isonomia formal e material. Se todos são iguais perante a lei, não há como 
dividir as pessoas em dois grupos (cidadãos e inimigos). Além do mais, diversos incisos do art. 5º da CF vedam a 
tortura, tratamento desumano ou degradante, consagram a ampla defesa, o devido processo legal, etc. Tudo isto vai 
contra o Direito Penal do Inimigo. 
Há quem identifique reflexos do Direito Penal do Inimigo no Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), que visa afastar 
indivíduos com alta periculosidade de locais que permitam formar alianças criminosas dentro dos presídios, colocando 
em risco a própria segurança e a dos demais. Caracteriza-se pelo isolamento (cela individual), tempo reduzido de 
banho de sol, e visitas limitadas por semana. A despeito das críticas, o STJ já se pronunciou algumas vezes sobre o 
RDD, afirmando ser constitucional, com isso firmando não se tratar de resquício do Direito Penal do Inimigo. 
Todavia, é indiscutível que, no plano informal, o Direito Penal do Inimigo existe no Brasil. Exemplos: grupos de 
extermínio, chacinas, execuções sumárias. É o Estado aplicando este Direito Penal de uma forma clandestina. É o 
chamado Direito Penal Subterrâneo: trata-se dos crimes cometidos por agentes públicos na clandestinidade, muitas 
vezes apoiados pela sociedade, mas supostamente de desconhecimento do Estado. 
Todavia, há situações em que o Direito Penal do Inimigo acaba existindo formalmente no Brasil. Exemplo: caso do 
Carandiru. 
 
5. A quarta velocidade do Direito Penal 
A teoria é criação do penalista argentino Daniel Pastor. Esta quarta velocidade é o que Pastor chama de 
“neopunitivismo” ou “panpenalismo”. Neopunitivismo é uma nova forma de punir. Panpenalismo é um Direito Penal 
absoluto, totalitário. 
Trata-se de um Direito Penal mais arbitrário, mais autoritário até mesmo do que o Direito Penal do Inimigo. É aplicado 
para antigos chefes de Estado pela prática de crimes de guerra. 
Viola-se o princípio da reserva legal e também o princípio da anterioridade. Viola-se também o princípio do juízo 
natural, pois são criados tribunais de exceção (tribunais “ad hoc”) para efetuar os julgamentos. O Direito Penal de 
quarta velocidade ofende o sistema acusatório, em que as funções de acusar, defender e julgar são exercidas por 
pessoas e órgãos diferentes. 
No Brasil, houve quem falasse de Direito Penal de quinta velocidade, em relação àquele de presença maciça das forças 
policiais nas cidades, mas a teoria não encontrou adoção na doutrina ou jurisprudência. 
 
 
LEI PENAL 
 
1. TEMPO DO CRIME 
 
O estudo do tempo do crime está ligado à aplicação da lei penal no tempo. Em relação ao tempo do crime, há três 
teorias (i) atividade; (ii) resultado; e (iii) ubiquidade ou mista. O tema é tratado pelo art. 4º do CP: 
“Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o 
momento do resultado.” 
 
O Código Penal, portanto, adota a teoria da atividade. Considera-se praticado o crime no momento da conduta, pouco 
importando o momento do resultado. A teoria da atividade só tem relevância para os crimes materiais/causais/de 
resultado (aqueles em que o tipo penal contém conduta e resultado e exige a produção deste último para a 
consumação). Nos crimes formais e de mera conduta, a consumação se dá com a prática da conduta. 
 
A primeira e mais importante consequência da teoria da atividade diz respeito à imputabilidade do agente, a qual deve 
ser analisada no momento da conduta. 
 
3 
www.g7juridico.com.br 
 
Cuidado! No tocante à prescrição (termo inicial da PPP), o CP adota, como regra, a teoria do resultado (art. 111, I): 
 
“Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: 
I - do dia em que o crime se consumou.” 
 
Súmula nº 711/STF: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, 
se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência”. 
 
Crime permanente é aquele em que a consumação se prolonga no tempo, pela vontade do agente. O agente 
dolosamente mantém a situação contrária ao Direito Penal. De acordo com a Súmula nº 711/STF, aplica-se para todo 
crime permanente a lei vigente na data de sua cessação, mesmo que seja mais grave, pois o delito também foi 
praticado depois da entrada em vigor da lei mais grave. 
 
A súmula também se aplica ao crime continuado (CP, art. 71), aplicando-se a teoria da ficção jurídica, que considera o 
crime continuado como apenas um crime, para fins de aplicação da pena, aplicando-se a lei vigente quando do último 
ato executado, ainda que se trate de norma mais grave. 
 
 
 
2. LUGAR DO CRIME 
 
Há também três teorias: (i) atividade; (ii) resultado; e (iii) ubiquidade ou mista. Esta última (da ubiquidade) foi adotada 
pelo art. 6º do CP: 
 
“Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, 
bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado.” 
 
LUTA: lugar → ubiquidade; tempo → atividade. 
 
O fundamento da adoção da teoria da ubiqüidade é a soberania dos países afetados pelo crime. Se o crime atinge 
interesses de dois países, um deles não pode privar o outro do direito de processar e julgar o criminoso. 
 
Crimes à distância versus crimes plurilocais: 
 
Os crimes que afetam os interesses de dois ou mais países são os chamados crimes à distância (ou de espaço 
máximo). São aqueles,portanto, em que a conduta e o resultado ocorrem em países diversos. 
 
Como o agente pode ser processado, julgado e cumprir penas em dois países, o CP traz regra para evitar o bis in idem 
(art. 8º). A pena cumprida no estrangeiro é abatida da pena a ser cumprida no país: 
 
“Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, 
quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas.” 
 
Crimes plurilocais (ou de espaço mínimo) são aqueles em que conduta e resultado ocorrem em comarcas diversas, 
porém dentro do mesmo país. O problema não é de soberania, e sim de competência. O tratamento do tema está 
contido no art. 70, caput, do CPP: 
 
“Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, 
no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.” 
 
Nos crimes plurilocais o CPP adota, como regra geral, a teoria do resultado. A competência é do local em que o crime 
se consumou. 
 
 
4 
www.g7juridico.com.br 
Nos crimes dolosos contra a vida, quando plurilocais, a jurisprudência consagra a teoria da atividade, em razão da (i) 
produção de provas (as testemunhas do crime, por exemplo, encontram-se no local de sua prática); e (ii) por conta da 
própria razão de existir do Tribunal do Júri: a sociedade, abalada pelo crime, julga quem violou a lei penal. 
 
 
3. LEI PENAL EM BRANCO 
(ou lei penal cega ou aberta) 
 
3.1. Conceito 
 
A norma penal incriminadora é formada por um preceito primário e por um preceito secundário. Preceito primário é a 
definição da conduta criminosa; preceito secundário é a pena cominada em abstrato. 
 
Na norma penal em branco o preceito secundário é completo: a pena foi devidamente cominada. Mas o preceito 
primário é incompleto, ou seja, depende de complementação. 
 
 
3.2. Espécies 
 
a) Homogênea ou lato sensu 
 
A lei penal é complementada por outra lei. Em outros termos, o complemento tem a mesma natureza jurídica, a 
mesma origem, da norma penal a ser complementada. A lei penal em branco homogênea pode ser 
 
a.1. homovitelina, quando tanto a lei penal quando seu complemento encontram-se no mesmo diploma legislativo 
(exemplo: CP, art. 304): 
 
CP, “Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 
297 a 302: 
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.” 
 
a.2. heterovitelina, quando a norma penal em branco e seu complemento estão contidos em diplomas legislativos 
diversos. 
CP, “Art. 169 - Apropriar-se alguém de coisa alheia vinda ao seu poder por erro, caso fortuito ou 
força da natureza: 
Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa. 
Parágrafo único - Na mesma pena incorre: 
I - quem acha tesouro em prédio alheio e se apropria, no todo ou em parte, da quota a que tem 
direito o proprietário do prédio;” [o sentido do termo tesouro previsto neste dispositivo é 
complementado pela definição trazida pela legislação civilista – pelo Código Civil] 
 
b) Heterogênea, stricto sensu ou fragmentária 
 
A lei penal é complementada por um ato administrativo. Este ato, portanto, tem natureza jurídica diversa da lei. Isso 
não viola o princípio da reserva legal, o qual se contenta com a descrição, pela lei, do conteúdo mínimo da conduta 
criminosa. 
 
Exemplo: 
 
Lei 11.343/2006 (Lei de Drogas): 
“Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, 
oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a 
consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com 
determinação legal ou regulamentar. 
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e 
quinhentos) dias-multa.” 
 
5 
www.g7juridico.com.br 
 
c) Ao avesso ou inversa 
 
O preceito primário (conduta criminosa) é completo, mas o preceito secundário depende de complementação. Em 
outras palavras, há o crime, mas falta a pena. Assim, obrigatoriamente seu complemento será outra lei, em 
decorrência do princípio da reserva legal. Exemplo: art. 1º da Lei nº 2.889/1956 (genocídio = crime contra a 
humanidade, contra a diversidade). 
 
“Art. 1º Quem, com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou 
religioso, como tal: 
a) matar membros do grupo; 
b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo; 
c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a 
destruição física total ou parcial; 
d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; 
e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo; 
 
Será punido: 
Com as penas do art. 121, § 2º, do Código Penal, no caso da letra a; 
Com as penas do art. 129, § 2º, no caso da letra b; 
Com as penas do art. 270, no caso da letra c; 
Com as penas do art. 125, no caso da letra d; 
Com as penas do art. 148, no caso da letra e;” 
 
Lembre-se: havendo norma penal em branco ao avesso, o complemento obrigatoriamente será uma outra lei penal. 
Não há espaço para os atos administrativos, em decorrência do princípio da reserva legal. 
 
d) De fundo constitucional 
 
Norma penal em branco de fundo constitucional é aquela em que o complemento está contido na Constituição 
Federal. Exemplo: art. 121, § 2º, VII, do CP. 
 
“Art. 121 – Matar alguém: 
[...] 
§ 2° Se o homicídio é cometido: 
VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes 
do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em 
decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, 
em razão dessa condição:” 
 
e) Ao quadrado 
 
Na norma penal em branco ao quadrado o complemento da norma também precisa de complementação. Exemplo: 
art. 38 da Lei nº 9.605/1998: 
 
“Art. 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em 
formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:” 
 
O que é floresta? O que é preservação permanente? O complemento está no art. 6º da Lei nº 12.651/2012 (Código 
Florestal): 
 
“Art. 6º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando declaradas de interesse social 
por ato do Chefe do Poder Executivo, as áreas cobertas com florestas ou outras formas de 
vegetação destinadas a uma ou mais das seguintes finalidades:” 
 
O art. 6º do Código Florestal pode ser complementado por ato do Chefe do Poder Executivo. 
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art121%C2%A72
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art129%C2%A72
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art270
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art125
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/Decreto-Lei/Del2848.htm#art148
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#art142
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#art144
 
6 
www.g7juridico.com.br 
 
4. LEI PENAL NO TEMPO 
 
4.1. Introdução 
 
No Direito Penal vigora o princípio da continuidade das leis: depois da sua criação, a lei permanece em vigor até ser 
revogada por outra lei. Em outras palavras, lei só se revoga por outra lei. 
 
Desuso não revoga lei. O costume, por mais consolidado que seja, também não revoga lei. 
 
Decisão judicial, ainda que proferida pelo STF em sede de controle concentrado de constitucionalidade, também não 
revoga lei. Somente retira a sua eficácia. 
 
4.2. Conflito de leis penais no tempo: Direito Penal intertemporal 
 
O conflito ocorre quando uma nova lei penal entra em vigor, revogando a anterior. A revogação pode ser total 
(absoluta → ab-rogação) ou parcial (→ derrogação). 
 
Direito Penal intertemporal é o conjunto de normas que solucionam o conflito de leis penais no tempo. No direito 
intertemporal há uma regra geral: tempus regit actum (Aplica-sea lei penal que estava em vigor na data em que o fato 
foi praticado). 
 
Por outro lado, há exceções, que dizem respeito à lei penal benéfica. Trata-se de cláusula pétrea, prevista no art. 5º, 
inciso XL, da Constituição Federal, abordado no próximo tópico. 
 
4.3. Lei penal benéfica: retroatividade e ultratividade 
 
A lei penal benéfica é um direito fundamental do ser humano, previsto na própria Constituição: a lei penal não 
retroage, salvo para beneficiar o réu (art. 5º, XL). 
 
A retroatividade é a aplicação da lei penal para fatos passados. 
 
A ultratividade é a aplicação da lei penal benéfica para o futuro. Ou seja, a lei continua aplicável, mesmo depois de 
revogada (caso o fato tenha sido praticado enquanto estava em vigor). 
 
A lei penal benéfica pode se manifestar em duas situações: 
 
- Abolitio criminis 
- Novatio legis in mellius 
 
Essas duas hipóteses serão mais detidamente estudadas em próxima aula. 
 
---

Continue navegando