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USO DA LÍNGUA COMO INSTRUMENTO DE PODER E DOMINAÇÃO Por Elmo Jackson Trindade Este ensaio teórico tem por objetivo refletir sobre a intencionalidade que envolve o uso da língua portuguesa no contexto histórico de dominação e colonização do Brasil pelos portugueses, bem como, sobre o uso da língua falada e escrita em nossos dias especialmente no domínio dos meios de comunicações de massa. Destaca-se a língua no processo de colonização do Brasil, que resultou na extinção de muitas línguas indígenas, revelando o poder destrutivo que ocorreu com a chegada dos portugueses no país (CASTILHO, 2001). O autor enfatiza que havia mais de um milhão de indígenas e, aproximadamente, 300 línguas espalhadas no território; sendo os Tupinambás as tribos que habitavam o litoral e que foram, processualmente, dizimadas, restando hoje em torno de 200 mil índios que falam 170 línguas. Neste sentido, existia uma intencionalidade de poder e dominação, o que torna a língua opressora, pois , oferece uma estrutura a serviço do domínio de uma nação. Historicamente quando uma nação conquistava a outra, a língua do conquistador devia ser imposta ao conquistado, mesmo sendo por meio das armas. No Brasil, a língua do colonizador sobrepujou à dos colonizados, o que justifica a extinção de muitas línguas indígenas pela ocupação portuguesa em todo território brasileiro. Este legado do Brasil colonial perdura até os nossos dias, e os diferentes usos da fala em uma mesma língua aparecem nos distintos níveis social, econômico e cultural, cuja adequação gramatical requer o acesso à língua como “instrumento de Poder” (PERINE, Mario 2004). Este fato é característico das sociedades capitalistas, em que o ingresso ao poder é obtido por meio do acesso ao falar culto, pois este tem um caráter de poder, fruto de um sistema de poder que visa à continuidade. Nesse sistema fica evidente a relação de dominação entre a norma culta e suas variantes, que cumpre com as exigências das demandas sócio-capitalistas. Com a ascensão do capitalismo e da revolução industrial o uso do sistema linguístico ocupa, cada vez mais, o status de competência comunicativa. Nesta perspectiva, é fundamental a reflexão sobre o tema desse Ensaio teórico fim de compreender que no cotidiano das relações interpessoais permeia um sistema comunicacional com uma intencionalidade operante que envolve relações de poder e dominação. O acesso à língua como instrumento de poder De certa forma é inevitável conceber a língua como não tendo um caráter dominativo. Esta afirmação encontra respaldo nas relações sócio- históricas religiosas e políticas, nas quais ocorreu o que foi considerado “massa de manobra” (GNERRE, 1998), quando na Idade Média , no auge de uma educação puramente religiosa com visão teocêntrica, a bíblia era escrita ou em latim ou na língua culta de cada país, e noventa e cinco por cento da população não sabia ler nem escrever, ou seja, as pessoas ficavam à margem do conhecimento, manipuladas por um poder, conforme afirma o autor, “Os casos mais evidentes de afirmação do poder da língua são discursos políticos, sermão de igreja, aula” (GNERRE, 1998, p. 6). No caso do Brasil, a relação do acesso à língua com dominação e poder originou-se no período http://www.blogger.com/ colonial, quando o português se sobrepõe às mais de 300 línguas indígenas (CASTILHO, 2001). Sem uma determinada história literária e cultural o indígena começou a ceder espaço ao português, obviamente, a cultura também é transplantada (ELIA, 2000). Trata-se de um “ato humano, social, histórico, ideológico, que tem consequências e repercussões na vida de todas as pessoas”(ANTUNES, 2007, p. 21). A literatura nesse período colonial refletia o sistema dominativo, cujos textos literários escritos cumpriam o papel de uma dominação que perdurou, de forma mais nítida, até a ascensão romântica, na qual a literatura brasileira estava amadurecida, havia senso de liberdade, indianismo, nacionalismo e desejo de uma língua própria, um português “brasileiro”. (acho que um ponto-final ficaria mais interessante nessa parte) não obstante, a língua estava sendo usada como instrumento para perpetuar a presença da dominação Portuguesa. Assim, a língua e a dominação impuseram o predomínio de um povo sobre o outro, pois ao defender suas fronteiras geográficas, defendiam, às vezes de forma violenta, a identidade linguística desses territórios conquistados, “ao lado da conquista de novas terras se instala a imposição de uma nova língua” (ANTUNES, 2007, p. 20), logo, a sujeição não acontece apenas no campo político, mas no econômico e social. Atualmente este fenômeno pode ser exemplificado com a imposição e dominação da língua americana e seu impacto no estio de vida daqueles que a adota. Numa sociedade, fala-se de um modelo, normativo, padrão, modelo que, segundo os puristas, possibilitaria condições de ascensão social. No entanto, apenas partes ou minoria teriam acesso à determinada norma. “A língua padrão consiste em um sistema comunicativo ao alcance de uma parte reduzida dos integrantes de uma comunidade” (GNERRE, 1998. p. 6). De onde se segue que, de forma clara, determinado grupo, tendo certa importância econômica, elege seu falar como padrão linguístico e serve de modelo para a sociedade como um todo. Como exemplo tem-se o sudeste do Brasil com a ascensão econômica da região e sua importância política para a nação, a variedade linguística usada chega a ser associada a um padrão nacional. Desse ponto de vista, mesmo com valor cultural na sociedade, os grupos linguísticos perdem a importância quando analisadas as condições econômicas do grupo social, assim, o poder nas relações exercidas nas sociedades economicamente influentes sobre as demais são gigantescas. Essa relação entre língua e poder pode ser vista já nos sermões do Padre Vieira, quando defendia a pregação do evangelho numa língua acessível ao povo e condenava o uso do latim nos mesmos sermões pregados pela igreja. Apenas parte da população, que era letrada, compreendia o latim (VIEIRA, 1965).A linguagem fica envolta numa relação de autoridade, não apenas no contexto ideológico, mas de forma social. Assim, cria- se a luta de classe entre aqueles que percebem o “domínio” da norma culta. “A linguagem é expressão de registro dos valores e sentimentos contraditórios de exploradores e explorados.” A Linguagem escravizada: língua, história, poder e luta de classes (CARBONI; MAESTRI, 2003). Em meados do século XX, o mundo percebeu a ascendência da globalização e do capitalismo. Com a vitória dos Estados Unidos na 2ª guerra, a queda do socialismo da URSS, a guerra fria, a influência do imperialismo americano e dos países europeus sobre as nações em desenvolvimento, todo esse contexto histórico e político permitiu a observância da língua como símbolo da escravidão ideológica, principalmente o inglês. Há mais de meio século o inglês configura-se como idioma universal, ou seja, a língua passa a ser ensinada nas escolas, nas universidades e utilizada no comércio, enfim, a língua é globalizada.Quando se adota uma língua, adota-se também a cultura, aspecto que remete à dominação observada no século de colonização, em que o português foi imposto como língua oficial, reprimindo mais de 300 idiomas indígenas e outras centenas de línguas africanas. Os meios de comunicação e o uso da língua como instrumento de poder Vimos até agora as relações de poder e dominação entre a sociedade e a esfera da norma culta padrão, dominação vista principalmente nos meios de comunicação. No Jornal Nacional, por exemplo, as informações são camufladas numa variedade linguística técnica, em que a maior parte da população, com baixo nível escolaridade, tem pouco proveito. “A linguagem pode ser usada para impedir a comunicação de informações para grandes setores da população” (GNERRE,1998, p. 21). O autor destaca que se a televisão e o radio alcançam uma enorme difusão, a comunicação de noticias e informação fica restrita a grupos reduzidos entre os que têm acesso aos instrumentos de comunicação. Neste sentido, é necessário um alto grau de conhecimentos técnico- político para a compreensão dos códigos linguísticos de alto nível produzidos pelos meios de comunicação. É notório o bloqueio da informação por parte das grandes emissoras e jornais do País, podemos dizer que elas controlam a informação, como diz “a linguagem constitui o arame farpado mais poderoso para bloquear a acesso ao poder” (GNERRE, 1998, p. 22) e, neste sentido, as maiores indústrias de comunicação de nosso país levam a informação a menor parcela da população.A maneira como são transmitidas informações no Jornal Nacional, e em outros meios de comunicação, apenas aumenta a injustiça social no Brasil. O que falamos e escrevemos está muito além da simples reunião de sons que expressam significados, mostra a ideologia, a política e a história contidas nas diversas linguagens. Sendo assim: O que está em jogo é a transformação da sociedade como um todo, pois enquanto vivemos numa estrutura social cuja existência mesma exige desigualdades sociais dos marginalizados é, senão hipócrita e cínica, pelo menos de uma boa intenção paternalista e ingênua (BAGNO, 2003, p. 71). O pensamento do autor (BAGNO) remete-nos à questão para além da informação jornalística, mostra um preconceito claro e desmedido, transmitido por meio da linguagem. Nisso, continuamos a ter a maior parte da população desinformada, excluída e à margem de seus direitos. Dessa forma, é manifesto a não erudição e o total desconhecimento da língua e de todas as suas variantes. Em um país onde o analfabetismo ainda campeia, alheio a qualquer cultura literária. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), no seu artigo 2°, dispõe que a educação constitui um “dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1996). Se a Lei reza sobre o desenvolvimento pleno do educando e do cidadão, e a cidadania, como pode uma gramática, a normativa, não ser falada pela maior parte da população? A gramática normativa, tal como ela é, mostra-se como instrumento de poder desde a sua formação em meados do século XVII, quando meia dúzia de intelectuais transcreveu padrões numa realidade distante da população iletrada. Vimos à exclusão linguística e social contida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, como também nas Leis federais, quando os cidadãos são considerados iguais perante a lei, mas não na letra da lei, na base do mesmo código onde ela é redigida. “Os cidadãos, apesar de declarados iguais perante a lei, são na realidade, discriminados já na base do mesmo código em que a lei é redigida” (GNERRE, 1998, p. 23). Considerações finais O ensaio possibilitou a reflexão sobre a intencionalidade que envolve o uso da língua e seu poder de dominação em nosso país, especialmente no âmbito dos meios de comunicações de massa, que veiculam informações manipuladas e, com isso, mantém a alienação de boa parte da população que não tem acesso à educação para a cidadania. Portanto, a reflexão contida neste texto poderá servir como incentivo à realização de pesquisas mais aprofundadas sobre o tema. Referências ANTUNES, Irandé. Muito Além da Gramática: por um ensino de línguas sem pedras no caminho. São Paulo: Parábola Editorial, 2007. BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: O que é Como se Faz. 25 ed. São Paulo: Loyola, 2003. BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de dezembro de 1996. CARBONI, F.; MAESTRI, M. A linguagem escravizada: língua, história, poder e luta de classes, 2ª ed. São Paulo: Expressão popular, 2003. CASTILHO, Ataliba. O português do Brasil. In: ILARI, Rodolfo. Linguistica românica, 5ª ed. São Paulo: Ática, 2001. ELIA, Silvio. A língua portuguesa no mundo. São Paulo: Ática, 2000. GNERRE, M. Linguagem, escrita e poder. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. PERINE, Mario A. A língua do Brasil amanhã e outros mistérios. São Paulo: Parábola, 2004. VIEIRA, Antonio. Sermão da Sexagésima: sermões escolhidos, v. 2, São Paulo: Edameris, 1965.
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