Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
TEOLOGIA 1. A NATUREZA DA TEOLOGIA Uma proposta de definição: o conteúdo da fé cristã conforme apresentado em exposição ordenada pela comunidade cristã. A. O Conteúdo da fé cristã Desde seus primórdios a comunidade cristã tem um compromisso profundo com a doutrina ou com o ensino. A primeira coisa que se disse acerca dos cristãos primitivos era que “se dedicavam ao ensino dos apóstolos” (At 2:42). Em todo o NT há muitas referências à importância da doutrina. V., e.g., Ef 4:14; 1Tm 1:3; Tt 2:10. A teologia trata da verdade. Isso significa, em primeiro lugar, uma explicação fiel e precisa do conteúdo da fé cristã. O centro da teologia é Deus. Sua relação com o Universo e o homem. A palavra “teologia” deriva de theos e logos, aquela significando “Deus” e esta, “palavra”, “fala”, “discurso”; portanto, “palavra acerca de Deus”, “fala acerca de Deus”, “discurso acerca de Deus”. (…) a teologia não trata outro assunto senão o próprio Deus: seu ser e atributos. (…) não só a Deus, mas também a todas as suas relações com o mundo e o homem. B. Em exposição ordenada A teologia não é apenas doutrina, mas a articulação de relações e ligações entre várias doutrinas. A preocupação é que “toda a vontade de Deus” seja apresentada de maneira compreensível e ordenada. A teologia é uma disciplina intelectual. É uma “logia” e, portanto, a reflexão sobre certa área do conhecimento e a ordenação dela. É um modo de amar a Deus com todo o entendimento (Mt 22.37) e, assim, um trabalho mental de amor que procura apresentar da maneira mais convincente possível os caminhos de Deus com o homem. A teologia, por conseguinte, é “fé em busca do entendimento”. C. Pela comunidade cristã Quando a comunidade cristã procura estabelecer seu entendimento básico – seus ensinos – de maneira ordenada, isso é teologia. (…) embora a teologia seja uma função da comunidade cristã, ela muitas vezes desempenha sua tarefa teológica por meio de assembleias, concílios e comissões especiais particularmente dedicadas à elaboração dos fundamentos da fé cristã. II. A FUNÇÃO DA TEOLOGIA A. Clarificação É importante estabelecer com a maior clareza possível o que afirma a comunidade cristã. Isso serve basicamente para as pessoas da comunidade que precisam ser instruídas na fé. B. Integração A teologia deve ajudar tudo, integrando uma verdade com outra. C. Correção A teologia serve como corretivo para desvios da verdade. (…) a maior parte das heresias que têm afligido a igreja tem surgido não de oponentes de fora, mas de equívocos em seu interior. Às vezes isso se deve à ênfase exagerada em certa doutrina que assim fica inflada de modo desproporcional à sua devida importância. Além disso, uma heresia pode começar como uma falha honesta na compreensão de certa verdade que, porém, mantida por algum período, torna- se cada vez mais distorcida. A crítica de Jesus contra os fariseus e escribas é oportuna: “Vocês negligenciam os mandamentos de Deus e se apegam às tradições dos homens” (Mc 7:8). D. Declaração Outra função da teologia é fazer conhecido publicamente o que defende a comunidade cristã. E. Desafio Há diferenças de doutrina dentro de várias comunidades cristãs, chegando com frequência a separá-las umas das outras. O desafio também pode ser visto de outra maneira, a saber, explorar as áreas da verdade cristã que ainda não foram suficientemente esquadrinhadas. III. O MÉTODO DA TEOLOGIA A. Buscar a direção do Espírito Santo É só por meio da orientação contínua do Espírito Santo que se pode realizar o trabalho teológico. “Quando o Espírito da verdade vier, ele os guiará a toda a verdade” (Jo 16:13) O Espírito Santo, além disso, foi prometido não só para estar com os cristãos, mas também nos cristãos: “ele vive com vocês e estará em vocês” (Jo 14:17). Assim, a comunidade cristã possui o Guia em seu interior, o Mestre, como uma presença residente. “Vocês têm uma unção que procede do Santo, e todos vocês têm conhecimento” (1 Jo 2:20). Tudo isso significa que o trabalho da teologia, ainda que seja feito no nível da reflexão, explicação e articulação da verdade cristã, não está lidando com a verdade como se ela fosse estranha ou externa. Esse é o mesmo Espírito que “sonda todas as coisas, até mesmo as coisas mais profundas de Deus” (1 Co 2:10), e que, portanto, sonda as verdades profundas da fé cristã. Mas quanto mais a direção do Espírito Santo, o Espírito da verdade, é buscada e seguida, tanto mais adequada é o desenvolvimento do trabalho da teologia. B. Confiança nas Escrituras As Escrituras do AT e do NT são inspiradas por Deus e devem receber plena confiança ao se desenvolver a tarefa da teologia. As palavras de 2 Tm 3:16,17 são bem adequadas: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino [doutrina], para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra”. De acordo com essa declaração, a totalidade das Escrituras é “soprada por Deus” e, assim, dada diretamente por Deus. Assim, existe na Escritura uma autoridade que não pertence a pensamentos ou palavras humanos, não importa quanto são guiados pelo Espírito Santo. Devem-se observar mais algumas questões importantes: 1. Há uma grande necessidade de um conhecimento crescente das Escrituras – de todas elas. O ideal é que haja um conhecimento instrumental das línguas originais. Uma tradução interlinear é valiosa, especialmente quando usada em conjunto com léxicos. Comparar várias versões é também útil na obtenção de uma perspectiva mais completa. É importante, além disso aprender tudo o que for possível acerca do pano de fundo, composição e formas literárias da Bíblia e, com isso, saber como estudá-la e compreendê-la melhor. Questões como o contexto histórico e cultura, o propósito de determinado livro e o estilo da escrita (e.g., história, poesia, parábola, alegoria) são essenciais para a compreensão a fim de se chegar à devida interpretação. Além disso, é importante não ler a passagem isolada, mas vê-la em seu contexto mais amplo e, se o significado não é claro, compará-la com outras passagens que possam lançar mais luz. Todo o campo da hermenêutica – a saber, os princípios da interpretação bíblica – exige compreensão plena para que se realize um trabalho teológico sério. As palavras do próprio Jesus são de importância crucial: “se vocês permanecerem firmes na minha palavra verdadeiramente serão meus discípulos E conhecerão a verdade, e a verdade os libertará” (Jo 8:31,32) 2. Nunca podemos ir além da Escritura na busca da verdade. Paulo ordena aos coríntios: “Aprendais a não ir além do que está escrito [i.e., a Escritura]” (1 Co 4:6). Isso fala contra qualquer fonte extrabíblica como tradição, visão pessoal ou suposta nova verdade apresentada como algo complementar ou superior ao que está registrado nas Escrituras Sagradas. Além disso, precisamos considerar as palavras que alertam contra interpretações individuais e distorções das Escrituras. Em 2 Pedro, lemos primeiro, que “nenhuma profecia da Escritura provém de interpretação pessoal” (1:20). Um alerta semelhante é dado por Pedro acerca das cartas de Paulo e “as demais Escrituras” que “os ignorantes e instáveis torcem, como também o fazem […] para a própria destruição deles” (2 Pe 3:16). C. Familiaridade com a história da igreja Para que a teologia consiga realizar adequadamente seu trabalho, é também necessária uma familiaridade com a história da igreja. Isso significa que as afirmações dos concílios da igreja, seus credos e confissões contêm a maneira pela qual ela tem, em várias épocas, expressado sua doutrina. Os escritos dos pais da igreja primitiva, de teólogos reconhecidos (os “doutores” da igreja), de comentaristas bíblicos de renome e, assim, o pensamento cristão ao longo dos séculos – tudo isso é proveitosopara a teologia. O período da igreja primitiva com seus escritos pós-apostólicos e patrísticos e também os concílios ecumênicos representando a igreja inteira são especialmente importantes. O Credo apostólico, o Credo niceno, o Credo de Calcedônia. As confissões que brotaram da Reforma como a de Augsburgo (luterana) e Westminster (Reformada), ainda que não ecumênicas, são também muito importantes. As formulações católicas romanas, como os decretos do Concílio de Trento e dos concílios Vaticano I e II representam outras formulações doutrinárias significativas. A maioria das igrejas protestantes tem algum tipo de declaração doutrinária e pode ser útil tomar conhecimento de algumas. Seria um erro lamentável desconsiderar quase dois mil anos de história da igreja ao se empreender o trabalho da teologia. Isso não significa que algumas dessas formulações estejam no mesmo nível de autoridade que as Escrituras. D. Consciência do cenário contemporâneo Quanto mais a teologia é informada daquilo que está ocorrendo na igreja e no mundo, tanto mais relevante e oportuno será o escrito teológico. Vivemos numa era de comunicação multimídia – televisão, rádio, imprensa -, e isso exige especialização cada vez maior para que a mensagem fique clara. O homem moderno, tanto dentro como fora da igreja, é tão bombardeado por informações esparsas, propagandas, conversas de vendedor etc. Que não é fácil refletir sobre a verdade cristã ou tomar tempo para uma reflexão teológica séria. Há necessidade de escritos teológicos muito melhores e mais contemporâneos. Em segundo lugar, a teologia precisa ter consciência do estado de espírito da época. Também, diz-se com frequência que vivemos numa “era de ansiedade”. Há ansiedade sobre as relações humanas, segurança econômica, saúde e proximidade da morte, a situação do mundo – e agora tudo é encoberto pela possibilidade iminente de aniquilação nuclear. Além da ansiedade, pode-se pensar em outros males como solidão, estresse e tensão, confusão, até um senso de vida sem sentido para muitos. Há respostas, e é urgentemente importante declarar quais são algumas delas. Em terceiro lugar, há a necessidade de consciência daquilo que Deus está fazendo no nosso tempo. (…) muitos dos “sinais dos tempos” apontam para a presença e atividade de Deus. Sem dúvida, há muita coisa negativa: por exemplo, humanismo e ateísmo, feitiçaria e ocultismo, imoralidade e bestialidade – tudo está aumentando. (…) há também um quadro muito promissor de ressurgimento evangelical, atividade missionária cada vez maior e reavivamento espiritual. (…) a renovação contemporânea, que possui raízes profundas na realidade do Espírito Santo, representa um movimento sem precedentes do Espírito de Deus desde os tempos do NT. E. Crescimento na experiência cristã Primeiro: a tarefa da teologia exige que tudo seja feito numa atitude de oração. Só numa atmosfera de comunhão persistente com Deus é realidade possível falar de Deus e de seus caminhos. A oração “no Espírito” é particularmente importante, pois por ela, como diz Paulo, a pessoa “pronuncia mistérios no Espírito” (1 Co 14:2) Segundo: deve haver um senso cada vez mais profundo de reverência. É de Deus que a teologia fala. Deus é aquele que deve se adorado em santa disposição, aquele de quem o nome deve ser honrado, aquele cuja própria presença é um fogo consumidor. Há o perigo sempre presente de, ao discursar sobre coisas santas, a pessoa tornar-se irreverente e displicente. Terceiro: exige-se uma pureza de coração cada vez maior “Bem-aventurados os puros de coração, pois verão a Deus” (Mt 5:8) Ora, ele deve ver para escrever, e não se pode ver com olhos turvos e coração impuro. Quarto: a teologia deve ser feita num espírito de amor crescente. O Grande Mandamento, “Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento” (Mt 22:37). Para a comunidade cristã, os que conhecem o amor de Deus e Cristo Jesus - “Deus tanto amou o mundo que deu...” (Jo 3:16) -, esse amor cada vez mais intenso faz da teologia uma resposta, uma oferta de louvor e ação de graças. A teologia, se for verdadeiro discurso sobre Deus, é um discurso de amor. Quinto, e da maior importância: todo o trabalho de teologia deve ser feito para a glória de Deus. “Aquele que busca a glória de quem o enviou [o Pai], este é verdadeiro; não há nada de falso a seu respeito” (Jo 7:18). Mesmo assim, o alvo da comunidade em cada expressão teológica, tanto de modo coletivo como por meio de seus especialistas, não deve ser a glória própria, mas dar glória constante a Deus. Síntese da: TEOLOGIA SISTEMÁTICA – Uma perspectiva pentecostal de J. RODMAN WILLIAMS. Editora Vida acadêmica.
Compartilhar