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Lanna 2001- gestão de bacias

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36
Instrumentos de Planejamento e Gestão Ambiental para a
Amazônia, Cerrado e Pantanal � Demandas e Propostas
METODOLOGIA DE GERENCIAMENTO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS
Ministro do Meio Ambiente
José Sarney Filho
Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
Hamilton Nobre Casara
Diretor de Gestão Estratégica
Rômulo José F. Barreto Mello
Coordenador do Programa de Educação Ambiental e Divulgação Técnico-Científica
José Silva Quintas
Coordenador do Projeto de Divulgação Técnico-Científica
Luiz Cláudio Machado
As opiniões expressas, bem como a revisão do texto, são de responsabilidade do autor.
Edições IBAMA
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
Diretoria de Gestão Estratégica
Programa de Educação Ambiental e Divulgação Técnico-Científica
Projeto de Divulgação Técnico-Científica
SAIN Avenida L/4 Norte, s/n
70800-200 - Brasília-DF
Telefones:(061) 316-1191 e 316-1222
e-mail: editora@ibama.gov.br
http:\\www.ibama.gov.br
Brasília
2001
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Instrumentos de Planejamento e Gestão Ambiental para a
Amazônia, Cerrado e Pantanal � Demandas e Propostas
METODOLOGIA DE GERENCIAMENTO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS
2001
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Ministério do Meio Ambiente
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais - DITAM
Sér. meio ambiente debate, 36
4
Série Meio Ambiente em Debate, 36
Projeto gráfico
Denys Márcio
Capa
Fátima Feijó
Diagramação
Iramir Souza Santos
Oldenyr da Silva Lima
Bibliotecária responsável
Sonia M. L. N. Machado
Criação, arte-final e impressão
Edições IBAMA
Resposável pela Elaboração e Coordenação
Divulgação de desenvolvimento de tecnologias ambientais /DITAM
Mirian Laila Absy
L292i Lanna, Antonio Eduardo
Instrumentos de planejamento e gestão ambiental para a Amazônia, cerrado e
pan tana l : demandas e p ropos ta s : me todo log ia de ge renc iamen to de bac ia s
hidrográficas / Antonio Eduardo Lanna. � Brasília : Ed. IBAMA, 2001.
 59p. � (Série meio ambiente em debate ; 36)
Inclui bibliografia.
ISSN 1413-25883
1. Gestão ambiental. 2. Recursos hídricos. 3. Bacia hidrográfica. 4. Amazônia. 5. Cerrado.
6. Pantanal. I. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. II.Título.
III. Série.
CDU (2.ed.) 502.35
CATALOGAÇÃO NA FONTE
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENIVÁVEIS
5
Sér. meio ambiente debate, 36
Ministério do Meio Ambiente
Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais - DITAM
Coordenação Geral
Miriam Laila Absy
Concepção e Direção Editorial
Miriam Laila Absy
Redação e Pesquisa
Santin Gravena
Equipe Técnica que Participou da Elaboração do Documento
Gustavo Henrique M. F. Araújo
Leonides Lima
Lúcio Lima da Mota
Raul Laumman
Remy F. Toscano Neto
�Não há nada mais difícil de empreender, nem mais incerto de
sucesso, nem mais perigoso de manejar, do que iniciar uma nova
ordem de coisas. Por que o reformador tem inimigos em todos
aqueles que lucram com a velha ordem, e apenas timidos
defensores em todos aqueles que lucrariam com a nova. Esta
timidez surge parcialmente do medo de seus adversários, que tem
a lei a seu favor; e parcialmente da incredulidade do ser humano,
que não acredita verdadeiramente em qualquer coisa nova até
que tenha uma real experiência com ela.�
Maquiavel (1513). O Príncipe
Sumário
1 - INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 9
2 - CONCEITUAÇÃO .................................................................................................... 11
3 - BASE DOUTRINÁRIAS ............................................................................................ 15
3.1 Desenvolvimento sustentável e o Gerenciamento de
bacias hidrográficas ............................................................................................ 17
3.1.1 O conceito de desenvolvimento sustentável ............................................... 17
3.1.2 Sobre a quantificação do �capital natural� ................................................. 21
3.1.3 Negociação social ou arbítrio do poder público? ....................................... 22
3.2 Integração dos instrumentos: Zoneamento ecológico-econômico
Estudo de impacto ambiental e gerenciamento de bacias hidrográficas ............... 24
3.3 Marcos referências para a gestão ambiental ........................................................ 25
4 - MODELOS DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HÍDRICOS .............................. 27
4.1 Modelo burocrático ............................................................................................ 27
4.2 Modelo econômico-financeiro ............................................................................ 28
4.3 Modelo sistêmico de integração participativa ...................................................... 30
5 - HISTÓRICO DAS ENTIDADES DE GERENCIAMENTO
DE RECURSOS HÍDRICOS ...................................................................................... 37
5.1 Entidades casuísticas de gerencimento de bacias hidrográficas ............................ 37
5.2 Superintendências de desenvolvimento de bacias hidrográficas .......................... 38
5.3 Entidades sistêmicas de gerenciamento de bacias hidrográficas ........................... 39
5.4 Programas de manejo ou ordenação de bacias hidrográficas ............................... 41
6 - A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA DE GERENCIAMENTO
DE RECURSOS HÍDRICOS ...................................................................................... 45
7 - CONCLUSÕES ........................................................................................................ 51
8 - RECOMENDAÇÃOES ............................................................................................. 55
9 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 57
1 - INTRODUÇÂO
Este documento final, em uma primeira etapa, estabelece as bases do desenvolvimento
sustentável, sob a ótica da economia ambiental. Através dele são apresentados critérios gerais
de análise de projetos e instrumentos de intervenção a serem colocados à disposição do poder
público para conciliação entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental. Em
uma segunda etapa é realizada uma análise retrospectiva dos modelos de gerenciamento de
bacias hidrográficas, buscando qualificá-los quanto as possibilidades de atenderem às exigências
estabelecidas pelos critérios gerais de análise e mecanismos de intervenção previamente citados.
Conclui-se que um modelo de gerenciamento de bacia hidrográfica eficiente no atendimento
das demandas do desenvolvimento sustentável terá que adotar uma visão sistêmica das
intervenções que permita o seu planejamento estratégico. Além disto, há necessidade de criação
de instâncias de participação, na forma de colegiados de bacia, que viabilizem e tornem efetiva
a negociação social através da qual serão transacionados os objetivos de desenvolvimento
econômico e de proteção ambiental, e foram ainda estabelecidos os padrões desejáveis de
qualidade ambiental que se constituirão em metas de planejamento estratégico para a bacia
hidrográfica.
 Através de um histórico das experiências mundiais e brasileiras de gerenciamento de
bacias hidrográficas verifica-se que, a rigor, este gerenciamento é realizado de forma parcial :
ou esta pacialidade é temática, ao gerenciar unicamente o recurso hídrico, ou é espacial, ao
gerenciar os recursos de água e solo de pequenas bacias hidrográficas. Nota-se também que
nas regiões de interesse do estudo poucas iniciativas de gerenciamento estão sendo
desenvolvidas, a não ser as dos Estados da Bahia e de Minas Gerais, no que diz respeito à
implantação de sistemas de gerenciamento de recursos hídricos.Nos demais Estados são
encontradas iniciativas isoladas de manejo de pequenas bacias hidrográficas.
O quadro apresentado, se analisado em conjunto com os dados levantados pelos
demais estudos temáticos e metodológicos, serve de pano de fundo para o estabelecimento
de algumas conclusões sobre as demandas e recomendações para implantação do
gerenciamento de bacias hidrográficas na região.
Sempre que for apropriado, o texto remete o leitor a itens pertinentes constantes nos
documentos aprovados pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, a Rio 92, em notas de rodapé.
Sér. meio ambiente debate, 36
10
11
Sér. meio ambiente debate, 36
2 - CONCEITUAÇÃO
Serão a seguir apresentados para discussões posteriores alguns conceitos sugeridos
para uniformização de termos. É importante a advertir que são sugestões preliminares, sujeitas
a criticas e aprimoramentos.
A Gestão ambiental é uma atividade analítica e criativa voltada à formulação de
princípios e diretrizes, ao preparo de documentos orientadores e projetos, à estruturação de
sistemas gerenciais e a tomada de decisões que tem por objetivo final promover, de forma
coordenada, o inventário, o uso, o controle e a proteção do ambiente.
Fazem parte da Gestão Ambiental :
a. Política ambiental: Trata-se do conjunto consistente de princípios doutrinários
que conformam as aspirações sociais e/ou governamentais no que concerne a
regulamentação ou modificação no uso, controle e proteção do ambiente.
b. Planejamento ambiental: Estudo prospectivo que busca, na sua essência, adequar
o uso, o controle e a proteção do ambiente às aspirações sociais e/ou governamentais
expressas, formal ou informalmente em uma política ambiental, através da
coordenação, compatibilização, articulação e implementação de projetos de
intervenções estruturais e não-estruturais. De forma mais resumida, o planejamento
ambiental visa a promoção da harmonização da oferta e do uso dos recursos
ambientais no espaço e no tempo.
c. Gerenciamento ambiental: Conjunto de ações governamentais destinado a
regular o uso, controle e proteção do ambiente, e a avaliar a conformidade da situação
corrente com os princípios doutrinários estabelecidos pela política ambiental.
As ações governamentais são refletidas e orientadas por leis, decretos, normas e
regulamentos vigentes. Como resultado destas ações, ficará estabelecido o que é denominado
por modelo de gerenciamento ou de gestão ambiental, entendido como a configuração
administrativa adotada na organização do Estado para gerir o ambiente. Um modelo que vem
sendo amplamente utilizado, adota a bacia hidrográfica como unidade administrativa de
planejamento e intervenção ao invés de serem adotadas unidades de caráter político-
administrativo como Estados, Municípios, etc.
d. Sistema de gerenciamento ambiental: Conjunto de organismos, agências e
instalações governamentais e privadas, estabelecidos com o objetivo de executar a
política ambiental através do modelo de gerenciamento ambiental adotado e tendo
por instrumento o planejamento ambiental. No caso brasileiro, este sistema é
estabelecido pelo Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA).
Em resumo, uma gestão ambiental eficiente deve ser constituída por uma política
ambiental, que estabeleça as diretrizes gerais, por um modelo de gerenciamento ambiental
que estabeleça a organização legal e administrativa e por um sistema de gerenciamento
ambiental, que articule instituições, e aplique os instrumentos legais e metodológicos para o
preparo e execução do planejamento ambiental.
Sér. meio ambiente debate, 36
12
Podem ser identificadas três dimensões no Gerenciamento Ambiental:
1- Relaciona-se ao contexto sócio-econômico e diz respeito ao gerenciamento do uso
dos recursos;
2- Relaciona-se ao contexto biofísico, natural ou do ecossistema e refere-se ao
gerenciamento da oferta dos recursos ambientais;
3- Relaciona-se à compartibilização das duas gestões anteriores, e ocorre no contexto
político, legal e administrativo, sendo aqui referida como gerenciamento institucional.
A Figura 1 ilustra a inter-relação entre os gerenciamentos da oferta e a do uso dos
recursos ambientais. A identificação destas dimensões tem propósito operacional. Os recursos
ambientais, como solo, vegetação, e água, têm usos alternativos, promovidos por diferentes
setores sócio-econômicos que estabelecem seus planos setoriais de gerenciamento. A
coordenação da oferta destes recursos ambientais para os diferentes setores sócio-econômicos
carece igualmente de gerenciamento, tanto para resolver conflitos inter-setoriais, ou seja, entre
demandas, como conflitos intergeracionais, ou seja, entre o uso pelas gerações presentes e
pelas gerações f uturas. Os diversos gerenciamentos da oferta dos recursos ambientais não
podem ser realizados de forma isolada já que o uso de um recurso pode diminuir a oferta de
outro e/ou aumentar a demanda sobre o mesmo. É o caso típico da vinculação entre os
recursos solo e água : o uso do solo pode aumentar a demanda por água e, em paralelo,
diminuir sua disponibilidade, e vice-versa.
Para promover a compatibilização entre as diversas demandas e ofertas de recursos
ambientais a sociedade deve tomar decisões políticas e estabelecer sistemas jurídico-
administrativos adequados, o que leva à terceira dimensão do gerenciamento ambiental. A
complexidade de considerar em um espaço geográfico demasiadamente amplo estas três
dimensões, determina a busca de uma delimitação geográfica mais restrita que contenha a
maioria das relações causa-efeito, sem se tornar de complexa operacionalidade. Em geral,
existe uma tendência em adotar a bacia hidrográfica como a unidade ideal de planejamento e
intervenção devido ao papel integrador, físico, econômico e natural, dos recursos hídricos. Da
projeção das três dimensões anteriores do gerenciamento ambiental sobre a unidade
geográfica de uma bacia hidrográfica, surge o gerenciamento das intervenções na bacia
hidrográfica ou, como é usualmente denominado, o gerenciamento de bacias hidrográficas,
objeto deste estudo
1
.
1 Esta concepção ampla do gerenciamento de bacias hidrográficas está em sintonia com o Principio 4 da Declaração do Rio,
Artigo 4 (e) da Convenção-Quadro sobre Modificações Climáticas e com o Artigo 10 (a) da Convenção sobre Diversidade
Biológica e Capítulos7 (d) e 10 (a) da Agenda 21.
13
Sér. meio ambiente debate, 36
Os conceitos apresentados e a tripla dimensão do gerenciamento ambiental nem
sempre tem sido adequadamente entendidos e considerados nas iniciativas brasileiras de
aperfeiçoamento administrativo, legal e metodológico. Diante disto são freqüentemente
estabelecidas confusões e decisões equivocadas que este projeto poderá contribuir para
superar. Uma delas diz respeito ao conceito de gerenciamento de bacia hidrográfica. Este
gerenciamento deveria ser considerado como resultado da adoção da bacia hidrográfica como
unidade de planejamento e intervenção do gerenciamento ambiental. No entanto, ele tem
 
 
 
 
GERENCIAMENTO DO USO 
 
DOS RECURSOS AMBIENTAIS 
 
 
DIMENSÕES DO 
 
GERENCIALMENTO 
 
AMBIENTAL 
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CLIMA 
 
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OUTROS 
 
 
Sér. meio ambiente debate, 36
14
sido as vezes, confundido, com o gerenciamento de um único recurso ambiental, a água,
quando realizado no âmbito de uma bacia hidrográfica, ou com o gerenciamento de recursos
hídricos. No entanto, este gerenciamentobusca a harmonização da demanda e da oferta da
água em uma bacia, situando-se, portanto, como é mostrado na Figura 2, na projeção da linha
correspondente a este recurso, sobre a unidade espacial da bacia hidrográfica selecionada.
Confundir um com o outro significa estabelecer uma redução temática ao gerenciamento de
bacias hidrográficas.
Por outro lado, o gerenciamento de bacias hidrográficas é também confundido com
um de seus instrumentos, qual seja, o ordenamento ou manejo de bacias hidrográficas que,
no seu sentido mais moderno, diz respeito a promoção de melhorias de uso dos recursos
naturais em uma bacia hidrográfica, geralmente de pequenas dimensões, com a participação
da comunidade. Como estabelecido, o gerenciamento de bacia hidrográfica, trata-se de uma
dimensão do gerenciamento ambiental que extrapola, em muito, os limites mais restritos do
instrumento comentado. Confundir um com o outro, significa estabelecer-se uma redução
conceitual, política, administrativa e geográfica ao gerenciamento de bacias hidrográficas.
15
Sér. meio ambiente debate, 36
3 - BASES DOUTRINÁRIAS
 
GERENCIAM ENTO DE BACIA 
 
HIDROGRÁFICA: 
 
GERENCIAM ENTO DO USO 
 
DOS RECURSOS AM BIENTAIS 
 
 
GERENCIALM ENTO AM BIENTAL 
 
EXECUTADO SOBRE A 
 
UNIDADE DE PLANEJAM ENTO 
 
DA BACIA HIDROGRÁFICA 
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ÁGUA 
 
GERENCIAM ENTO RECURSOS 
HÍDRICOS 
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VEGETAÇÃO 
 
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OUTROS 
 
 
Figura 2 - O gerenciamento de recursos hidrícos no contexto do gerenciamento de bacia
hidrográfica
Existe uma dificuldade básica em realizar esta revisão devido à confusão mencionada
no capítulo anterior e ao fato de que, a rigor, não existem experiências sobre gerenciamento
de bacias hidrográficas na amazônia, pantanal e cerrado. Podem ser encontradas iniciativas
que atendem parte dos requisitos para o gerenciamento. Exemplos são os programas de
micro-bacias, limitados mais ao ordenamento ou manejo de bacias hidrográficas. E, também,
tentativas mais abrangentes, mas com diversos graus de maturação, para implementar sistemas
de gerenciamento ambiental e de gerenciamento de recursos hídricos, geralmente restritas a
tentativas de reformulação do arcabouço legal e administrativo.
Sér. meio ambiente debate, 36
16
Diante disto, foi adotada como estratégia de abordagem o conhecimento destas
experiências, complementado pela busca de modelos de gerenciamento ambiental e dos
recursos hÍdricos
factiveis de adoção nos biomas considerados. Devem ser considerados como
integrantes desta experiência os dispositivos das Constituições Estaduais e de suas
regulamentações que tratam do ambiente como um todo e dos recursos hídricos em particular.
Também deverão ser buscadas as alternativas institucionais que os estados estão adotando
para tratamento do tema.
A consideração destas questões demanda reflexões mais gerais relacionadas ao
desenvolvimento e a proteção ambiental que deverão formar um pano de fundo para destacar
e posicionar adequadamente o tema. Esta reflexão será realizada no próximo item, tendo por
base texto inédito de Lanna e Cánepa (1992).
3.1 - Desenvolvimento sustentável e o gerenciamento de bacias hidrográficas
Dois conceitos tem sido debatidos com grande ênfase em discussões recentes
relacionadas ao meio ambiente em geral e aos recursos hídricos em particular: o
desenvolvimento sustentável e o gerenciamento de bacias hidrográficas. O primeiro, em
discussões mais amplas que tratam da conciliação entre a proteção do ambiente e o
desenvolvimento econômico, ou a viabilização do desenvolvimento econômico no longo
prazo. O segundo conceito tem marcado as discussões orientadas na busca de alternativas
gerenciais para conciliação destes objetivos anteriores, através da adoção da bacia hidrográfica
como unidade ideal de planejamento e intervenção. Obviamente, existe uma forte interrelação
entre ambos e, portanto, necessidade de se buscar uma visão integrada, que demonstre as
formas com que um gerenciamento competente de bacias hidrográficas poderá conduzir ao
desenvolvimento sustentável. Mais do que isto, as necessidades criadas pelo paradigma de
desenvolvimento sustentável servem para criticar os modelos vigentes e propostos de
gerenciamento de bacias hidrográficas e, a partir dai, estabelecer orientações para a busca de
alternativas gerenciais mais eficientes.
3.1.1 - O Conceito de desenvolvimento sustentável
A reflexão a ser apresentada sobre o conceito de desenvolvimento sustentável é
apoiada nos ensinamentos da Economia Ambiental, conforme apresentados por PEARCE &
TURNER (1990) e BARBIER, MARANDYA & PEARCE (1990). Segundo esta ótica, os atuais
modelos econômicos de uso dos recursos ambientais apresentam dois tipos de problemas:
a) deseconomias externas, ou seja, efeitos colaterais negativos do uso dos recursos
ambientais que atingem a terceiros, incluindo as gerações futuras, conseqüentes à
diminuição da diversidade biológica, degradação de ecossistemas, perdas de solo,
incrementos da poluição hídrica e do solo, de cheias e estiagens, etc;
b) comprometimento das próprias atividades antrópicas correntes, com uma
�internalização� parcial das deseconomias externas nos seus próprios causadores,
resultando em estacionamento ou em perda de produtividade na atividade de
uso dos recursos ambientais
17
Sér. meio ambiente debate, 36
A solução deste problema poderá ser considerada dentro de duas óticas: a jurídica e
a econômica. Na ótica jurídica, seriam estabelecidos limites às deseconomias externas, cuja
obediência seria estimulada por penalização dos infratores conjugada por monitoramento e
polícia ambiental. O nível admissível de deseconomia externa seria estabelecido por
negociação social, através da representação popular direta ou indireta (parlamentos) ou
arbitrado pelo poder público responsável. Seria buscado, assim, um equilíbrio entre a
promoção do desenvolvimento econômico de curto e médio prazos, e o comprometimento
dos recursos ambientais e, por conseqüência, as possibilidades de manutenção do
desenvolvimento econômico no longo prazo. Para avaliar se os projetos pretendidos geram
um nível admissível de deseconomias externas é realizado um estudo de impacto ambiental
visando a sua contabilização.
As soluções econômicas procuram estabelecer, via mercado, através da imposição de
preços, taxas e subsídios, o mesmo equilíbrio buscado pela aplicação dos instrumentos legais.
Na solução econômica tradicional a abordagem se processa em duas etapas. Na primeira, é
realizada uma análise custo-beneficio visando a estabelecer a rentabilidade social do
empreendimento. Para tanto, é necessário deduzir, do valor dos benefícios privados, o valor
das deseconomias externas geradas, se for possível quantificá-las. Isto dá margem a realização
dos mesmos estudos de impacto ambiental anteriores. Ao mesmo tempo, é ampliado o
horizonte de tempo do fluxo de caixa associado, de forma a serem avaliados os efeitos de
longo prazo na atividade econômica.
Na segunda etapa, é estudada a correção das externalidades, especialmente a sua
�internalização�
2
, ou seja, fazer com que os seus causadores as considerem em seu processo
produtivo e, desta forma, adeqüem suas atividades. Isto pode ser executado pela aplicação do
�princípio poluidor-pagador� no qual são estabelecidos preços públicos para os recursos
ambientais de propriedade do Estado, ou aplicados tributos sobre s eu uso ou comercialização.
Este seriao caso da cobrança pela poluição da água ou do a r. Uma situação que pode ocorrer
neste caso é a seguir exemplificada. Suponha um empreendimento instalado em uma região
é o responsável direto por um grande número de empregos e pela arrecadação de impostos.
Seu produto é comercializado em um mercado competitivo. Por isto, a aplicação do princípio
poluidor-pagador, ao aumentar os custos de produção, poderá inviabilizar a colocação do
produto no mercado e, portanto, funcionamento do empreendimento. Para a região não é
interessante o fechamento do empreendimento devido às conseqüências econômicas e sociais.
Para evitar isto, uma das alternativas é a aplicação do princípio beneficiário-pagador pelo
qual são concedidos subsídios aos empreendedores para que adotem alternativas mais
eficientes sobre os pontos de vista econômico ou ambiental, sendo que tais subsídios
oneram a comunidade beneficiada. Exemplo poderia ser encontrado na concessão de
descontos de tributos municipais ou estaduais aos empreendedores que adequem seus
processos produtivos à necessidade de conservação ambiental. O uso simultâneo dos dois
princípios estabelece um terceira alternativa. O Quadro 1 resume as abordagens econômicas.
Uma quarta alternativa, não econômica, seria a região estabelecer padrões ambientais
menos restritivos, assumindo os custos sociais e ambientais da poluição.
A diferença entre as abordagens é que na abordagem jurídica as questões de custo-
beneficio são deixadas para a análise das partes empreendedoras e o instrumento de estudo
de impacto ambiental é utilizado para identificar projetos que podem e que não podem ser
² A internalização de custos externos é sugerida no Princípio 16 da Declaração do Rio e nos Capítulos 8 (c) e 18 (18.15) da
Agenda 21.
Sér. meio ambiente debate, 36
18
implementados. Na abordagem econômica procura-se analisar conjuntamente os custos e
benefícios econômicos (sociais e privados) e os custos e benefícios ambientais. O instrumento
de estudo de impacto ambiental é utilizado como forma de quantificação de custos ambientais,
se possível em termos econômicos, e como indicador das alternativas e de seus custos
correspondentes para correção de deseconomias externas que devam ser internalizadas através
dos princípios poluidor-pagador ou beneficiário-pagador.
QUADRO 1ABORDAGENS ECONÔMICAS PARA A INTERNALIZAÇÃO DE
EXTERNALIDADES
adoção do „princípio poluidor-pagador“, pelo qual obriga-se aos agentes
econômicos a incorporação aos seus custos privados dos custos de controle
das externalidades geradas.
adoção do „princípio beneficiário-pagador“, pelo qual a comunidade afetada
subsidia ou „suborna“, os agentes econômicos para a adoção das medidas
corretivas nas suas atividades.
adoção de uma combinação de 1 e 2.
Um dos problemas desta abordagem é que ela pode ser eficiente para controlar a
poluição a ser emitida no futuro. Falha, porém, na recuperação de áreas degradadas devido
às ações poluidoras passadas. Sendo assim, ela pode ser pouco efetiva na maior parte das
situações em que o ambiente esgotou sua capacidade de suporte a resíduos e que medidas
de recuperação, e não de mitigação apenas, devam ser aplicadas.
Outra restrição ocorre quando acha-se em pauta a compatibilização do
desenvolvimento econômico com a eqúidade social. Esta eqüidade pode ser promovida
pela recuperação da capacidade de suporte do ambiente e também pela criação de empregos,
redistribuição de renda, aumento de oportunidades educacionais, culturais e recreativas. É
difícil se conceber em que medida o princípio poluidor-pagador, que visa a impedir um
comportamento ambientalmente inadequado, possa ser aplicado para estimular um
comportamento social ou ambientalmente desejável. O princípio beneficiário-pagador,
aplicado através de subsídios aos empreendedores que gerem as medidas necessárias, parece
ser mais adequado.
Esta nova concepção apresenta uma diferença com relação a anterior que merece ser
melhor explicada. Na primeira abordagem o poder público deixa aos agentes econômicos,
privados e públicos, o estabelecimento de metas de planejamento, cuidando apenas para
que os custos externos sejam considerados nas suas decisões. Na última situação o poder
público deve estabelecer as metas de planejamento compatibilizadas com os padrões de
qualidade ambiental e de eqüidade social almejadas. Através, principalmente, do princípio
beneficiário-pagador e, eventualmente, do poluidor-pagador, estimula-se os empreendedores
a um comportamento adequado e/ou gera recursos financeiros para a implementação dos
projetos necessários para obtenção dos padrões referidos.
OPÇÃO 1
OPÇÃO 2
OPÇÃO 3
19
Sér. meio ambiente debate, 36
Isto leva a uma abordagem que atende à exigência ambiental ao incorporar o
conceito de �desenvolvimento sustentável�, ou seja, a noção de que as atividades econômicas,
mesmo aquelas em expansão, devem, pelo menos, manter o �capital natural�, ou seja, o
estoque de recursos naturais renováveis, para as gerações futuras ou, em caso de degradação
acelerada, para a geração atual. Isto, por sua vez, dá origem a uma solução do tipo �custo-
efetividade�, e não mais de �custo-beneficio�, ao longo de 5 etapas descritas no Quadro 2³.
A primeira etapa estabelece o nível de comprometimento que o ambiente pode ter
como fonte de recursos econômicos, ou seja, estabelece o ponto de equilíbrio entre a
desenvolvimento e a proteção ambiental. O estabelecimento deste ponto de equilíbrio, ou do
"capital natural" a ser preservado, é função de uma negociação social que pode ser executada
mediante duas alternativas. Na primeira alternativa o "capital natural" seria estabelecido por
arbítrio do poder público, consultados ou não especialistas. Na outra alternativa o "capital
natural" seria acordado mediante a participação popular através, por exemplo, da atuação de
colegiados existentes ou a serem especificamente criados para tal, geralmente respeitando
certas condições de contorno estabelecidas pelo poder público. As vantagens e desvantagens
de cada alternativa serão detalhadas adiante.
QUADRO 2 - ABORDAGEM MODERNA : ANÁLISE „CUSTO-EFETIVIDADE“
 - Estabelecimento de padrões de qualidade ambiental a atingir, no sentido de
manter o „capital natural“. Por exemplo, reduzir a perda de solo de X para Y t/ha;
reduzir a concentração máxima de poluentes nos cursos de água ou no ar de t
para 5 mg/l. Questão básica : como são estabelecidos tais padrões?
- Geração de alternativas pela introdução de “projetos-sombra“, isto é, obras e/ou
medidas mitigadoras acopladas ao modelo econômico corrente que permitam
atingir os objetivos de qualidade adotados.
- Geração de alternativas vinculadas a modelos econômicos alternativos (com
seus próprios „projetos-sombra“ acoplados) capazes, igualmente, de atingir os
objetivos de qualidade estabelecidos.
- Cálculo da rentabilidade das alternativas geradas nas ETAPAS 2 e 3. Note-se,
agora, em virtude da incorporação dos „projetos-sombra“ (corretivos), as
rentabilidades privada de longo prazo e social coincidem, podendo-se falar em
uma única rentabilidade. Questão básica: qual o período de análise a ser
considerado para o cálculo das rentabilidades?
- Seleção da alternativa mais rentável.
A segunda e terceiras etapas geram alternativas de intervenção vinculadas ao modelo
econômico vigente, incluídos os investimentos necessários à preservação ou recuperação do
"capital natural", ou vinculadas a modelos econômicos alternativos, em geral de caráter
conservacionista.
³ Vide Princípio 16 da Declaração do Rio, e Capítulos 8 e 18 (18.15) da Agenda 21 onde as bases da análise custo-
efetividade são sugeridas.
ETAPA 1
ETAPA 2
ETAPA 3
ETAPA 4
ETAPA 5
Sér. meio ambiente debate, 36
20
Na quarta etapa, as alternativas geradas nas duas etapas anteriores são comparadas
de forma que se possa selecionar a alternativa mais eficiente sob o ponto de vista social. A
questão básica, nesta etapa, trata doperíodo a ser adotado na análise da rentabilidade das
alternativas geradas. As análises realizadas sob o ponto de vista privado têm geralmente
períodos mais reduzidos do aquelas que o são sob o ponto de vista público. Isto se deve às
questões transgeracionais que são objeto de preferências da sociedade como um todo, mas
não de indivíduos atuando isoladamente. Sendo mais explícito, a sociedade, considerada
como um todo, estará mais disposta a analisar os efeitos de longo prazo das suas atividades,
e que por isto afetarão às futuras gerações, do que indivíduos ou corporações privadas,
atuando de forma isolada. Diante disto cabe ao poder público assumir esta preferência social,
em nome da sociedade, nas análises das atividades econômicas. Como existem alternativas
que se mostram rentáveis no longo prazo mas não em períodos mais reduzidos, poderão
haver situações em que o mesmo projeto tenha méritos econômicos sob uma ótica social, e
por isto sob o ponto de vista público, e não o tenha sob o ponto de vista privado. Esta questão
deverá ser tratada em seguida na comparação das rentabilidades sociais e privadas das
alternativas.
Se, na comparação, a melhor alternativa vinculada ao modelo econômico corrente
(Etapa 2) tiver rentabilidade superior às demais, a análise recairia na fase de incorporação de
�projetos-sombra� (ou corretivos) às atividades atuais, resultando em rentabilidade privada
menor que as atividades econômicas correntes. Diante disso, deve-se induzir os agentes
privados a um comportamento socialmente adequado mediante a adoção de uma das três
opções do Quadro 1. Em qualquer caso, faria-se com que a adoção dos projetos-sombra
fosse atraente sob o ponto de vista privado (às custas da penalização ou gratificação financeira
dos empreendedores), como o seria sob o ponto de vista social.
Se for escolhido um dos modelos econômicos alternativos gerados na ETAPA 3,
duas situações podem ocorrer, conforme apresentado no Quadro 3.
QUADRO 3 - SITUAÇÕES ALTERNATIVAS ORIGINADAS DA ANÁLISE
"CUSTO- EFETIVIDADE“
A rentabilidade da melhor alternativa associada ao modelo econômico
alternativo é superior à rentabilidade privada de todas alternativas do
modelo econômico corrente, de caráter degradador.
A rentabilidade (social) da melhor alternativa associada ao modelo
econômico alternativo, embora superior às rentabilidades sociais das
alternativas associadas ao modelo econômico corrente, é inferior à
rentabilidade privada obtida na melhor alternativa com este último modelo.
Na primeira situação, a alteração do comportamento dos agentes, ou seja, a passagem
do modelo econômico corrente para o alternativo, é uma questão de comunicação social ou
extensão (ou, também, �conscientização�). O comportamento socialmente mais desejável
será também o mais lucrativo do ponto de vista privado, tratando-se apenas de conscientizar
os agentes sobre a existência desta oportunidade.
Na segunda situação, a rentabilidade privada maior das alternativas, vinculadas ao
modelo econômico corrente, compelirá ao empreendedor privado a adotá-las. Para que isto
seja evitado, o poder público deverá usar os princípios "poluidor-pagador", "beneficiário-
SITUAÇÃO 1
SITUAÇÃO 2
21
Sér. meio ambiente debate, 36
pagador", ou uma combinação de ambos para induzir os empreendedores ou a adotarem o
modelo econômico alternativo ou, se permanecerem no modelo corrente, a adotarem os
"projetos-sombra" necessários.
Os Quadros 2 e 3 podem ter suas concepções estendidas facilmente à incorporação
de padrões de eqüidade social, o segundo tipo de objetivo a ser considerado. Neste caso, os
padrões indicados na Etapa 1 do Quadro 2 seriam especificados através de metas de
distribuição de renda, de oferta de empregos e de oportunidades educacionais, culturais e
recreativas. Outro tipo de negociação social deverá ser promovido para o estabelecimento
destes padrões e o processo prosseguiria com adaptações similares às demais etapas.
3.1.2 - Sobre a quantificaçáo do "capital natural"4
A primeira questão básica formulada relacionou-se à quantificação do "capital natural",
ou seja, do estoque necessário ou desejado de recursos naturais para a sociedade atual e que
deverá ser mantido para as gerações futuras. Isto requer levantamentos e análises sobre a
dinâmica ambiental, com o desenvolvimento de modelos formais ou informais de simulação
que integrem todas as relações de causa-efeito e permitam a hipotetização de cenários
vinculados a alternativas de uso e proteção do ambiente no futuro de longo prazo além,
portanto, dos horizontes de planejamento adotados pela iniciativa privada. Este requisito
esbarra na incapacidade de desenvolver-se modelos de simulação operacionais devido à
carência de conhecimentos sobre a dinâmica ambiental. Algum teor de subjetividade deverá
ser utilizado nas projeções, além de um comportamento decisório coerente com tal situação
de grande incerteza do futuro. Este comportamento decisório é caracterizado pela preservação
de opções para o futuro. Por exemplo, significaria evitar projetos que comprometessem,
irremediavelmente, um recurso ambiental sobre o qual não se tem conhecimentos suficientes
para permitir a projeção das conseqüências da intervenção.
A quantificação do "capital natural", no âmbito dos estados brasileiros, tem sido
buscada atualmente pelas iniciativas de realização do zoneamento ecológico- restrições de
uso dos recursos ambientais ela está definindo usos alternativos mais rentáveis social,
econômica ou ambientalmente do capital natural e estabelecendo o patrimônio a ser
preservado para as gerações futuras.
A valoração destes cenários é outra etapa importante e complexa pois envolve várias
classes de valores que são adotadas pela sociedade.
a) Valor de uso é o valor derivado do uso do ambiente como recurso para promover o
bem-estar da sociedade. Por exemplo, a floresta amazônica enquanto fonte de
madeiras nobres. Um recurso com valor de uso, quando se torna escasso, assume
um valor econômico. Por exemplo, a água tem um valor de uso. Onde ela é abundante
em face à demanda, como em certas regiões da Amazônia, ela não tem valor
econômico. O contrário ocorre quando escasseia, seja em termos quantitativos, e/ou
qualitativos. Em certas condições, quando é viável e admissível a atribuição de direitos
de propriedade privada, um recurso econômico pode ter preço em mercado o que,
dependendo das condições de formação de preços, pode estabelecer um parâmetro
de valoração. Este valor estabelecido pelo preço de mercado é adotado nas análise
sob o ponto de vista privado.
4O dimensionamento do �capital natural� está em consonância com a proposta de estabelecimento de sistemas de
contabilidade ecológica e econômica integrada apresentada no Capitulo 8 (D), parágrafos 8.41 a 8.49, da Agenda 21.
Sér. meio ambiente debate, 36
22
b) Valor de opção é o valor derivado do uso potencial do ambiente para promover
o bem estar da sociedade. Ele se contrapõem ao valor de uso já que este se refere
ao uso corrente do ambiente enquanto o de opção referencia um uso provável que
poderá ocorrer no futuro. Esta classe de valores pode ser associada à estratégia de
preservação de opções de uso, típica de situações de grande incerteza do futuro, o
que poderá tornar alguns recursos ambientais com valor social expressivo. Por
exemplo, a floresta amazônica, por sua diversidade biológica, poderá se tornar
fonte de possíveis medicamentos no futuro. Trata-se, portanto, de uma face da
questão transgeracional já comentada.
c) Valor intrinseco ou de existência é o valor intrinsecamente associado ao
ambiente, independente da possibilidade de seu uso, corrente ou potencial, para
promover o bem-estar da sociedade. Alternadamente, são valores estabelecidos
pela sociedade em uma base de "não uso", o que determina uma satisfação social
pela simples existência de um bem ambiental (valor de existência). Por exemplo, à
floresta amazônicapoderia ser atribuído um valor intrínseco, mesmo que nenhum
uso corrente ou potencial pudesse ser atribuido aos seus recursos, ou um valor
intrínseco derivado de uma preferência estabelecida pela sociedade (brasileira ou
i-lo, pagando ou não. No caso de bens públicos já existentes não há possibilidade
de transacioná-los devido aos mesmos motivos. Devido a isto, estes bens não
possuem preço de mercado que possa balizar a quantificação de seu valor em termos
econômicos. No entanto, bens públicos como eqúidade social e amenidades
ambientais assumem valores expressivos para a sociedade e devem ser produzidos
ou protegidos, cabendo ao poder público esta função, que raramente é assumida
pela iniciativa privada.
Isto leva à conclusão de que existem de bens com valores que podem ou não ser
economicamente quantificados, sendo que o"capital natural" e a eqüidade social pertencem
em grande parte à segunda classe. Devido a isto, a fixação do ponto de máxima eficiência
entre o uso econômico do ambiente e sua proteção (ou fixação do capital natural), não poderá
ser estabelecida pela análise custo beneficio tradicional, mesmo quando realizada sob o
ponto de vista da sociedade como um todo. A alternativa é que esta transação seja realizada
por negociação social ou arbítrio do poder público, questão a ser considerada a seguir.
3.1.3 - Negociaçáo social ou arbítrio do poder público?
Em uma sociedade democrática os valores sociais são estabelecidos tendo em
consideração o postulado de que o valor social de um bem é obtido pela agregação dos
valores que cada pessoa da sociedade lhe atribui, em estado de completa informação. Os
individuos tem oportunidade de expressar estes valores por suas disposições de pagamento,
no que diz respeito a bens transacionados em mercados, ou pelo voto. Como a transação
entre o desenvolvimento econômico e a conservação do "capital natural" envolve bens públicos,
sem preço em mercado, a segunda forma de expressão, o voto, seria a única alternativa para
a mesma. Entretanto, esta opção merece certas restrições. Inicialmente, por uma questão
operacional, a realização de eleições formais para tomada de qualquer decisão que envolva
a questão desenvolvimento econômico vs. "capital natural" apresenta complexidades e
dificuldades de legitimação ainda não resolvidas pela moderna tecnologia da informação.
Depois, porque o voto não expressa intensidade de sentimento: desta forma, uma minoria
que seja intensamente favorável ou desfavorável a uma decisão poderá ser anulada por uma
grande maioria que lhe é oposta sem, no entanto, grande convicção. Finalmente, existe a
23
Sér. meio ambiente debate, 36
questão da adequada informação: nem todo cidadão está devidamente informado para a
tomada de posições que afetarão o futuro de sua geração e das próximas.
A alternativa de deixar estas questões para arbítrio do poder público pode ser
igualmente criticada. Isto resultaria em grande intervenção estatal em questões para as quais
eventualmente não se acha devidamente preparado para resolver, a necessidade correlata de
montar uma máquina administrativa e analítica ao custo de grandes investimentos, e o risco
de que as decisões acabem sendo direcionadas por questões menores, ao sabor de desejos,
ambições e ciúmes do administrador público o qual, como o resto da sociedade, não é imune
a sentimentos mesquinhos.
Uma solução de compromisso pode ser buscada para a questão ambiental
5
. Nela, a
sociedade deveria participar da negociação através de colegiados apropriados. Estes
colegiados deveriam, em princípio, ser formados pela representação de usuários dos recursos
ambientais e de grupos sociais mais diretamente envolvidos com a questão. No entanto, não se
pode desconhecer que embora as decisões a respeito do uso dos recursos ambientais de uma
pequena bacia pouco afetem a sociedade como um todo, a concentração das decisões em
todas pequenas bacias que formam uma região deverão, por certo, afetá-la. Além disto, deverão
ser considerados os interesses da sociedade como um todo no uso ou proteção dos recursos
ambientais da bacia que poderão conflitar com os da sociedade local e usuários de seus recursos.
A questão informacional é também relevante. Deve-se admitir que os usuários e a
comunidade local nem sempre conhecem, ou tem condições de considerar, devidamente, as
múltiplas facetas do uso dos recursos ambientais. Por todas estas razões deve ser promovida e
estimulada a participação comunitária e de usuários no gerenciamento da bacia, sem que isto
resulte na atribuição de direitos irrestritos de decisão. A negociação social a ser promovida
deve considerar os interesses de todas as partes, comunidade local, usuários e sociedade, e
adotar mecanismos de precaução contra decisões que não considerem carências
informacionais e considerações intergeracionais.
Para contornar a alternativa de aumentar de forma descontrolada a representação
social no gerenciamento de cada pequena bacia, o poder público deverá assumir o ponto de
vista da sociedade como um todo em sua participação no gerenciamento. Isto poderá ser
realizado através de "condições de contorno" que delimitem o espaço decisório em que a
negociação social promovida pela comunidade local pode se desenvolver. Isto equivaleria ao
poder público estabelecer limites máximos de comprometimento dos recursos ambientais no
presente e delegar à comunidade a decisão sobre a forma de apropriação.
O grau de informação da comunidade e usuários seria outra variável a ser considerada.
O poder público deveria, através de atividades de extensão e educação ambiental apropriadamente
dimensionadas, orientá-los sobre as conseqüências de cada alternativa selecionada.
Concluindo, a negociação social em uma sociedade democrática apresenta
dificuldades de ser conduzida de forma apropriada devido a questões operacionais,
que levam à limitação do número de participantes, e questões relacionadas ao nível
de informação. Caberá ao poder público intervir para superar ambas dificuldades,
representando os segmentos sociais excluídos da negociação por questões operacionais
e provendo os participantes com informações necessárias através de programas de
educação ambiental e extensão. As alternativas para concretização desta solução de
compromisso serão consideradas adiante.
5Esta proposta está em sintonia com o Princípio 10 da Declaração do Rio, o Artigo 6 (a) iii da Convenção-Quadro sobre
Mudanças Climáticas, e os seguintes parágrafos da Agenda 21 : 8.3, 10.10, 18.9, 18.22, 18.59 e 23.2.
Sér. meio ambiente debate, 36
24
Já a questão de eqüidade social é mais abrangente pois não diz respeito diretamente
a uma bacia hidrográfica mas a uma nação como um todo e as suas unidades político-
administrativas. Os colegiados adequados para o tratamento desta questão já existem o
Congresso Nacional, as Assembléias Legislativas e as Câmaras Municipais.
3.2 - Integração dos Instrumentos : Zoneamento Ecológico-Econômico, Estudo
de Impacto Ambiental e Gerenciamento de Bacias Hidrográficas6.
As análises anteriores produziram os elementos necessários para que seja promovida
a integração dos instrumentos de gestão ambiental que são objeto deste projeto. Isto é
apresentado esquematicamente na Figura 3.
O Zoneamento ecológico-econômico tem por função estabelecer a vocação do
ambiente regional com suporte de atividades de interesse antrópico. Isto é materializado na
forma de condicionantes regionais que determinam as atividades mais adequadas e aquelas
que devem ser evitadas. Para viabilizar estas conclusões poderão ser requeridos estudos de
impacto ambiental, de caráter regional, e no âmbito das atividades de planejamento, que
determinem os impactos de diferentes diretrizes de desenvolvimento regional. Como
conclusão, o zoneamento ecológico-econômico deverá apresentar o que aqui foi nomeado
por �capital natural�, ou seja, o estoque regional de recursos ambientais, distribuído naqueles
disponíveis para a sociedadeatual, vinculados às formas mais adequadas de uso, e aquele
que lhe é indisponível, devendo ser reservado para as gerações futuras.
ZONEAMENTO ESTUDO DE IMPACTO
ECOLÓGICO– ECONÔMICO AMBIENTAL
FUNÇÕES FUNÇÕES
• Vocação ambientais • Estabelecimento de "projeto-sombra"
• Condicionantes regionais • Geração e alternativas técnicas e
• Estabelecimento do "Capital locacionais
Natural" regional • Restrição "ad hoc"
GERENCIAMENTO
DE BACIAS
HIDDROGRÁFICAS
FUNÇÕES
• Negociaçõa social
• Compatibilização das intervenções
Figura 3- Integração dos instrumentos de gestão ambiental
6 A proposta de integração aqui descrita está de acordo com o Princípio 17 da Declaração do Rio e com os parágrafos 7.41,
18.12, 18.38, 18.39, 18.65, 18.72 e 23.2 da Agenda 21.
25
Sér. meio ambiente debate, 36
Os estudos de impacto ambiental, além daqueles realizados regionalmente como
subsídio ao zoneamento ecológico-econômico, serão realizados caso a caso analisando
consequências de intervenções específicas no ambiente. Estas intervenções estarão previstas
no zoneamento devendo, porém, serem submetidas a estudos localizados que visem a
determinação de ações� mitigadoras, ou �projetos-sombra�, de alternativas tecnológicas e
locacionais e, finalmente, de restrições específicas.
Finalmente, no gerenciamento de bacias hidrográficas, é estabelecida a negociação
social que deverá compatibilizar as metas de desenvolvimento econômico, proteção ambiental
e promoção social, no âmbito desta unidade de planejamento. Para isto, deverão ser atendidos
os condicionantes de caráter regional estabelecidos no zoneamento ecológico-econômico e
consideradas as alternativas e restrições específicas introduzidas, para cada caso, pelos estudos
de impacto ambiental. Haverá igualmente a articulação e compatibilização das intervenções
dos diversos segmentos sociais com interesses nos recursos ambientais da bacia.
3.3 - Marcos referencias para a gestão ambiental7
Estabelecido o pano de fundo que procurou enquadrar os conceitos, problemas e
demandas da gestão ambiental e do gerenciamento de bacias hidrográficas, cabe neste
ponto resumir as constatações em marcos referenciais, ou seja, em princípios e critérios que
deverão ser adotados para a análise de propostas e avaliação de resultados de experiências
sobre o tema. Deve ser notado que, a rigor, pouco existe na literatura sobre gerenciamento
de bacias hidrográficas mas apenas sobre o gerenciamento de um de seus recursos ambientais,
a água. As experiências apresentadas dizem respeito ao gerenciamento de recursos hídricos,
tal como ele foi destacado na Figura 2. É possível porém estender seus princípios e diretrizes
para o gerenciamento de bacias hidrográficas. Isto é apresentado no Quadro 4.
O princípio 7 do Quadro 4 estabelece a necessidade de descentralização do poder
de decisão com a coordenação das entidades sendo promovida por órgão único. Isto está
consoante com as considerações previamente apresentadas sobre o processo de
negociação social. Os instrumentos que este órgão deve contar para promoção de suas
atribuições são conhecidos: a) outorga do uso dos recursos ambientais de propriedade
pública como é o caso da água no Brasil ; b) licenciamento de atividades potencialmente
poluidoras; c) cobrança pelo direito de uso dos recursos ambientais de propriedade pública
e d) rateio de custo de obras de interesse comum. Estes instrumentos deverão ser detalhados
adiante. Os critérios que devem nortear a atuação desta entidade coordenadora acham-se
apresentados no Quadro 5.
7 Os princípios e critérios aqui apresentados acham-se de acordo com aqueles oriundo da Rio 91, referenciados nas notas
de rodapé previamente colocadas.
Sér. meio ambiente debate, 36
26
QUADRO 5 - CRITÉRIOS PARA A ENTIDADE COORDENADORA DA GESTÃO
AMBIENTAL. (Adaptado de Kneese e Bower,1968).
1. Internalizar a maior parte das externalidades associadas à descarga de resíduos no
ambiente;
2. Estar capacitada para implementar todas as medidas relevantes para a melhoria da
qualidade ambiental ;
3. Ser capaz de levar em conta, devidamente, as interrelações entre a qualidade ambiental
e os outros aspectos do desenvolvimento e uso dos recursos ambientais;
4. Ser capaz de levar em conta, devidamente, as interrelações entre a gestão da qualidade
ambiental e a gestão do uso do solo;
5. Ser capaz de levar em conta, adequadamente, as interrelações entre o gerenciamento
da qualidade de alguns aspectos ambientais e os impactos sobre os demais aspectos
daqualidade ambiental;
6. Dar oportunidade para que as partes afetadas tenham voz ativa nas decisões relativas
aos recursos ambientais.
QUADRO 4 - PRINCÍPIOS DA GESTÃO AMBIENTAL (Adaptado de Veiga da Cunha,
Gonçalves, Figueiredo e Lino (1980).
1. A avaliação dos benefícios para a coletividade resultantes da utilização dos recursos
ambientais deve ter em conta as várias componentes da qualidade da vida: nível de
vida, condições de vida e qualidade do ambiente.
2. A unidade básica da gestão ambiental deve ser a bacia hidrográfica.
3. A capacidade de autodepuração do ambiente deve ser considerada como um recurso
natural cuja utilização é legitima devendo os benefícios resultantes desta utilização
reverterem para a coletividade. A utilização do ambiente como meio receptor de rejeitos
não deve contudo provocar a rotura dos ciclos ecológicos que garantem os processos
de autodepuração.
4. A gestão ambiental deve processar-se no quadro do ordenamento do território visando
a compatibilizar nos âmbitos regional, nacional e internacional o desenvolvimento
econômico e social com os valores do ambiente.
5. Para por em prática uma política de gestão ambiental é essencial assegurar a
participação das populações através de mecanismos devidamente institucionalizados.
6. A autoridade em matéria de gestão ambiental deve pertencer ao Estado.
7. Na definição de uma política de gestão ambiental devem participar todas entidades com
intervenção nos problemas do ambiente. Todavia a responsabilidade pela execução desta
política deve competir a um único órgão que coordene em todos os níveis a atuação
daquelas entidades em relação aos problemas ambientais.
27
Sér. meio ambiente debate, 36
4 - MODELOS DE GERENCIAMENTO DE RECURSOS HIDRÍCOS
A adoção da bacia hidrográfica como a unidade ideal de planejamento e intervenção,
requer o desenvolvimento de modelos de gerenciamento que se mostrem apropriados às
demandas anteriormente apresentadas. Para tanto, será realizada uma revisão dos modelos
historicamente adotados para o gerenciamento de bacias hidrográficas. Inicialmente, serão
apresentadas suas evoluções conceituais para, então, serem comentadas as experiências
relevantes realizadas adotando cada modelo. Quando apropriado será estabelecida a ponte
entre o gerenciamento dos recursos hídricos, que originou tais modelos, e o gerenciamento de
bacia hidrográfica, objetivo mais amplo deste texto. O texto tem por base as análises apresentadas
em DNAEE (1985) e suas extensões realizadas em LANNA & ABREU (1992).
A evolução dos mecanismos institucionais e financeiros para o gerenciamento de
recursos hídricos permite distinguir três fases, que adotam modelos gerenciais cada vez mais
complexos mas que, não obstante, possibilitam uma abordagem mais eficiente do problema :
o modelo burocrático, o modelo econômico-financeiro e o modelo sistêmico de integração
participativa. Eles serão descritos a seguir.
4.1- Modelo burocrático
Este modelo começou a ser implantado no final do século XIX sendo seu marco
referencial estabelecido no Brasil no início a década de 30 com a aprovação do Decreto nº
24.643 de 10 de Junho de 1930, do Código de Águas. Neste modelo, o objetivo predominante
do administrador público é cumprir e fazer cumprir os dispositivos legais. Para instrumentalização
deste processo, em face da complexidade e abrangência dos problemas das bacias hidrográficas,
é gerada uma grande quantidade de leis, decretos, portarias, regulamentos e normas sobreuso
e proteção do ambiente, alguns dos quais se tornam inclusive objeto de disposições
constitucionais. Como conseqüência, a autoridade e o poder tendem a concentrar-se
gradualmente em entidades públicas, de natureza burocrática, que trabalham com processos
casuísticos e reativos destinados a aprovar concessões e autorizações de uso, licenciamento de
obras, ações de fiscalização, de interdição ou multa, e demais ações formais de acordo com as
atribuições de diversos escalões hierárquicos.
As falhas identificadas deste modelo é que ele busca tão somente estabelecer condições
de contorno para a solução da questão ambiental sendo omisso quanto à necessidade do
planejamento estratégico, da negociação social e da geração de recursos financeiros necessários
aos investimentos para implementação das soluções. Tendo por base as considerações
previamente realizadas, constata-se que o sucesso deste modelo, particularmente quando
aplicado ao gerenciamento de bacias hidrográficas, exige que previamente ao preparo dos
instrumentos legais ocorra:
1. uma bem sucedida negociação entre o desenvolvimento econômico e a proteção
ambiental, com a fixação de "capital natural";
2. que esta negociação tenha legitimidade, ou seja, aceitação social, em qualquer
circunstância no espaço e no tempo;
3. e que, finalmente, seja possível à legislação captar exatamente suas determinações.
Sér. meio ambiente debate, 36
28
Estes requisitos são extremamente exigentes, já que a questão em pauta surge em
diversos tipos de problemas decisórios, os quais variam l ocal e regionalmente, e também no
tempo. Isto faz com que nenhuma legislação, por mais completa e inteligente que se possa
imaginá-la, tenha condições de capturar a complexidade da questão ambiental, de forma
espacialmente ampla e temporalmente permanente.
Isto acaba por tornar esta legislação pouco precisa, permitindo sua aplicação em
qualquer circunstância porém de forma inócua ou, no extremo oposto, demasiadamente
detalhada e, por isto, inaplicável à maioria das situações. Ao se omitir sobre as necessidades de
planejamento estratégico, negociação social e financiamento, acaba-se por experimentar o
fracasso no trato da questão ambiental, conforme tem sido verificado quando é adotada
exclusivamente a via legal para solucioná-la. Diante disto, a autoridade pública torna-se
ineficiente e politicamente frágil ante os grupos de pressão interessados em concessões,
autorizações e licenciamentos para benefícios setoriais ou unilaterais. A inadequação desta
situação tem como consequência o surgimento e agravamento dos conflitos de uso e proteção
do ambiente, que realimentam o processo de elaboração de instrumentos legais, dentro da
assertiva de que "se alguma coisa não está funcionando é por que não existe lei apropriada".
Isto acaba por produzir uma legislação difusa, confusa, muitas vezes conflitante entre si e quase
sempre de difícil interpretação, com o conseqüente agravamento dos problemas da
administração pública que de um quadro de atuação ineficiente passa para outro de total
inoperância. Nesta situação, surge uma reação contrária, sintetizada pela frase �já existem leis
suficientes, havendo simplesmente necessidade de serem aplicadas�. Neste caso remete-se a
culpa do fracasso do modelo à lentidão da justiça e à inoperância, ou mesmo venalidade, do
poder público, associadas a atitudes ambientalmente criminosas dos agentes econômicos. O
gerenciamento de recursos hídricos torna-se uma questão de polícia, desconhecendo-se que
estes sintomas tem como causa fundamental a carência de um sistema real e efetivo para sua
promoção.
Apesar de ter experimentado um fracasso reconhecido na produção de um
gerenciamento eficiente de recursos hídricos no Brasil, este modelo encontrou condições
propícias para ser reformulado com o preparo das novas constituições federal e estaduais, a
partir de 1988. A ótica do que poderia ser denominado por �modelo neo-burocrático�, é que
agora seria possível o preparo de leis adequadas, pela produção de uma legislação totalmente
nova e, desta vez sim, articulada e eficiente. No entanto, deve ser compreendido que, por um
lado, a legislação anterior não foi resultado da incompetência dos administradores, juristas e
legisladores mas do próprio processo político que tal opção propicia. Sendo assim, ao ser
novamente adotado este modelo, a tendência é de se cometer outra vez os mesmos erros. Por
outro lado, a dificuldade em se aplicá-la não resulta da incompetência ou venalidade da
administração pública, ou da lentidão da justiça, mas das limitações do próprio modelo. Há
necessidade, portanto, de um modelo de gerenciamento de bacia hidrográfica que resolva a
questão ambiental, operacionalizado e instrumentalizado por uma legislação efetiva, mas que
não tenha no processo civil ou criminal sua única opção para promoção do desenvolvimento
sustentável.
4.2 - Modelo econômico-financeiro
Este modelo pode ser considerado como um desdobramento da política econômica
preconizada por John Maynard Keynes utilizada na década de 30 para superar a grande
depressão capitalista e que resultou na criação nos EEUU da Tennessee Valley Authority em
1933, como a primeira superintendência de bacia hidrográfica. É também fruto do momento
de glória da análise custo-benefício, cujas bases de aplicação aos recursos hídricos foram
29
Sér. meio ambiente debate, 36
estabelecidas pelo Flood Control Act, novamente nos EEUU, em 1936. No Brasil, tem como
marco de sua aplicação a criação, em 1948, da Companhia de Desenvolvimento do Vale do
São Francisco (CODEVASF).
Ele é caracterizado pela predominância do emprego de instrumentos econômicos e
financeiros para promoção do desenvolvimento econômico nacional ou regional, e induzir a
obediência das disposições legais vigentes. Pode aparecer com duas orientações. Em uma
delas ele é alicerçado em prioridades setoriais do governo. Tem como força motora programas
de investimentos em saneamento, irrigação, eletrificação, mineração, reflorestamento, criação
de áreas de preservação, etc., e como entidades privilegiadas autarquias e empresas públicas.
Na outra orientação, mais moderna, ele busca o desenvolvimento integral, e portanto multi-
setorial da bacia hidrográfica.
Na primeira orientação, de caráter setorial, a injeção de recursos financeiros acarreta o
desenvolvimento dos setores selecionados pelos planos governamentais. Isto tende a causar
um desbalanceamento entre os diversos usos dos recursos ambientais e, destes usos com os
objetivos de proteção. Pode ocorrer uma apropriação excessiva e, mesmo perdulária, por certos
setores, o que restringe a utilização ótima do ambiente pelos setores sociais e econômicos,
possibilitando a intensificação do uso setorial não integrado em certas bacias de importância
econômica acarretando quase sempre os mesmos conflitos do modelo burocrático, agora com
caráter intersetorial e, até mesmo, intrasetorial. Finalmente, tende ou a subdimensionar a questão
ambiental, ou a superdimensioná-la, no processo do planejamento integrado da bacia, dando
origem a processos traumáticos e, muitas vezes, histéricos de contestação por parte de grupos
"desenvolvimentistas" ou ambientalistas�.
Não obstante estas críticas a este modelo, mesmo com a orientação setorial adotada,
representa um avanço em relação ao anterior já que, pelo menos setorial e circunstancialmente,
possibilita a realização do planejamento estratégico da bacia e canaliza recursos financeiros
para implantação dos planos. Isto permite a ocorrência de um certo grau desenvolvimento no
uso ou na proteção do ambiente. Falha porém na promoção do gerenciamento integral da
bacia hidrográfica, pois não trata de forma global todos os problemas e oportunidades de
desenvolvimento e proteção ambiental e não dispõe sobre a negociação social para abordagem
da questão ambiental antes, adota o arbítrio do poder público para resolvê-la. Acarreta também
o aparecimento de entidades públicas com grandes poderes que estabelecem conflitos com
outras preexistentes, criandoimpasses políticos de difícil solução. E tem uma grave conseqüência
que aparece quando os programas são encerrados: muitas vezes são perdidos grandes
investimentos realizados para propiciar um uso setorial do ambiente que não será mais
privilegiado no futuro ou a bacia se torna extremamente vulnerável a atividades com potencial
de degradação ambiental.
A crítica anterior pode ser contestada pela argumentação de que algumas bacias
brasileiras apresentam tal grau de deterioração qualitativa, real ou potencial, que somente
programas de preservação ou recuperação, envolvendo grandes investimentos, poderão
solucioná-los. O mesmo pode ser comentado a respeito da necessidade de programas de
irrigação, de energia, de navegação, etc. O estabelecimento de programas de investimentos
não é aqui condenado e nem poderia sê-lo. O que se alega é que a gestão ambiental, e o
conseqüente gerenciamento de bacias hidrográficas, não pode ser efetivada exclusivamente
por programas setoriais, arbitrados pelo poder público. Há necessidade de estabelecimento de
um modelo de gerenciamento que possibilite o desenvolvimento econômico integral da bacia,
socialmente eficiente e ambientalmente sustentável, o que implica no fomento, articulação e
coordenação dos programas que sejam necessários para atender necessidades e oportunidades
de curto e longo prazo, e não apenas a implementação de programas setoriais não integrados
Sér. meio ambiente debate, 36
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e de caráter transitório. Um modelo que aumente a eficácia da geração e emprego de
instrumentos legais, ao invés de produzir uma legislação caótica. Enfim, há necessidade de um
modelo de gerenciamento de bacia hidrográfica com a capacidade de abordar todos os
problemas e oportunidades de desenvolvimento econômico e social, e de proteção ambiental,
gerando e aplicando com eficiência os instrumentos legais e econômicos necessários, integrando
e articulando as instituições públicas, privadas e comunitárias interessadas, dentro de uma
concepção sistêmica do gerenciamento.
Este modelo pode ser obtido com a segunda orientação do modelo econômico-
financeiro, que visa ao desenvolvimento integral da bacia hidrográfica. O problema desta
opção é a necessidade de criação de entidades de grande porte que concorrem pelo
espaço político e administrativo com as demais entidades públicas atuantes na bacia.
Isto dificulta, freqüentemente, a necessária articulação interinstitucional e com usuários
e comunidade, como será comentado quando for discutido o exemplo brasileiro de
entidades deste tipo, a CODEVASF.
4.3 - Modelo sistêmico de integraçáo participativa
Trata-se do modelo mais moderno de gerenciamento de recursos hídricos, objetivo
estratégico de qualquer reformulação institucional e legal bem conduzida. Ele caracteriza-se
pela criação de uma estrutura sistêmica, na forma de matriz institucional de gerenciamento,
responsável pela execução de funções gerenciais específicas, e pela adoção de três instrumentos,
apresentados no Quadro 6.
QUADRO 6 - INSTRUMENTOS DO MODELO SISTÊMICO DE INTEGRAÇÃO
PARTICIPATIVA
Planejamento estratégico por bacia hidrográfica. Baseado no estudo de
cenários alternativos futuros, estabelecendo metas alternativas especÍficas
de desenvolvimento integrado do uso múltiplo e proteção do ambiente no
âmbito de uma bacia hidrográfica. Vinculados a estas metas são definidos
prazos para concretização, meios financeiros e os instrumentos legais
requeridos.
Tomada de decisão através de deliberações multilaterais e
descentralizadas. Baseada na constituição de um colegiado no qual
participem representantes de instituições públicas, privadas, usuários,
comunidades e de classes políticas e empresariais atuantes na bacia.
Esse colegiado tem a si assegurada a proposição, análise e aprovação
dos planos e programas de investimentos vinculados ao desenvolvimento
e proteção ambiental da bacia, permitindo o cotejo dos benefícios e custos
correspondentes às diferentes alternativas.
Estabelecimento de instrumentos legais e financeiros necessários à
implementação de planos e programas de investimentos. Tendo por base
o planejamento estratégico e as decisões, serão estabelecidos os
instrumentos legais pertinentes e as formas de captação de recursos
financeiros necessários para implementação das decisões.
INSTRUMENTO 1
INSTRUMENTO 2
INSTRUMENTO 3
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Sér. meio ambiente debate, 36
No que diz respeito ao planejamento estratégico por bacia hidrográfica, deve ser
entendido que os interesses uso e proteção do ambiente de uma bacia hidrográfica provêm de
diversos setores. Há necessidade de serem conhecidos, ou pelo menos hipotetizados, os diversos
planos setoriais de longo prazo, quantificando e hierarquizando as intenções de uso e proteção
ambiental de forma que seja possível a elaboração de um plano multi-setorial de longo prazo
que buscará articular os usos entre si e estes com as disponibilidades da bacia hidrográfica e
com a proteção ambiental. Como no planejamento de longo prazo não há possibilidade de
obtenção de previsões confiáveis, estabelece-se a demanda de formulação de cenários
alternativos de uso e proteção do ambiente que servirão de base para os planos setoriais. Não
é possível estabelecer-se o cenário mais provável de ocorrer. Em uma sociedade, demandas e
valores mudam, e assim não será encontrada em qualquer momento uma solução final para os
problemas. O planejamento deve ser um processo contínuo de julgamentos e decisões para
atender a novas situações em um futuro incerto. Sendo assim, muitas decisões que
comprometeriam o atendimento de determinados setores na ocorrência de dado cenário
deverão ser evitadas e o gerenciamento da bacia hidrográfica poderá privilegiar aquelas
decisões que preservem opções futuras de uso e proteção do ambiente. O planejamento
estratégico contrasta com os programas circunstanciais do modelo econômico-financeiro por
considerar unificadamente os problemas de desenvolvimento e proteção da bacia no longo
prazo. Como consequência, são previstos os programas de estímulo econômico e os
instrumentos legais requeridos para atendimento das necessidades sociais e ambientais.
O segundo instrumento prevê uma forma de estabelecimento da negociação coletiva
previamente apresentada, no âmbito da unidade de planejamento formada pela bacia
hidrográfica. A tomada de decisão, através de decisões multilaterais e descentralizadas, não é
preconizado apenas como forma de democratizar o gerenciamento da bacia hidrográfica. Nem
deve ser confundido com uma tentativa de se estabelecer o �assembleísmos� na tomada de
decisões. Em outras palavras, qualquer decisão sendo obrigatoriamente tomada em uma
assembléia de representantes dos interessados. Seu propósito vem de duas constatações
importantes e que se constituem em grandes dificuldades para um gerenciamento eficiente.
Em primeiro lugar, o uso e a proteção do ambiente em uma bacia é promovido por um grande
número de entidades, de caráter público ou privado. Estas entidades possuem graus distintos
de poder político sendo geralmente privilegiadas, embora nem sempre, as entidades públicas
e, entre estas, as federais, mais que as estaduais, e estas mais que as municipais. Quando a
apropriação do ambiente atinge um nível próximo ao das suas disponibilidades qualitativas e
quantitativas surgem os conflitos que envolvem diversas entidades, de setoriais e locais da
bacia. Isto é agravado em presença de degradação. A solução destes conflitos é difícil, mesmo
existindo entidade responsável por esta tarefa. Via de regra, ela terá inúmeras atribuições que
dificultam o seu pleno exercício por falta de pessoal, tempo ou canais de comunicação e,
inclusive, conhecimento pleno da natureza dos problemas. Não obstante, será dela requerida
tomada de decisões críticas, pois envolvem a restrição ao atendimento de interesses, o que
pode dar margem a contenciosos políticos e legais, sem se falar nas possíveis manobras de
bastidores que resultam em pressões ilegítimas. O resultado é que nem sempre a solução que
promove a maior satisfaçãosocial, a curto e a longo prazos, será adotada. Em certos casos
nenhuma solução é tomada, diante da complexidade do problema, deixando que �os conflitos
se resolvam por si mesmos�, o que acarreta grandes prejuízos sociais e ambientais.
A constituição do colegiado de bacia hidrográfica visa a formação de um fórum no
qual todos os interessados possam expor seus interesses e discuti-los de forma transparente e
inequívoca. Parte do pressuposto que o poder público deve efetivamente assumir a propriedade
dos recursos hídricos e estabelecer controles sobre o uso do ambiente, de acordo com o que
dispõem a Constituição. No entanto, o gerenciamento de bacias hidrográficas é complexo e
envolve diversos interesses conflitantes. Sendo assim, o poder público, sem abdicar ao seu
papel gerencial e de coordenação, deve reconhecer a necessidade de promover uma
Sér. meio ambiente debate, 36
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descentralização do gerenciamento, permitindo a interveniência dos representantes dos diversos
segmentos interessados. Esta interveniência viabiliza o estabelecimento da decisão que, na
visão da maioria dos participantes do colegiado, melhor atenda aos interesses comuns, com
as limitações impostas pelo poder público para atender aos interesses mais amplos do
município, do estado ou da nação. Desta forma, evita-se a possibilidade de que o
gerenciamento de bacias hidrográficas se desenvolva nos bastidores, e traz sua execução ao
contexto de uma ampla participação e pleno conhecimento dos interesses e das conseqüências
das decisões adotadas.
Uma outra constatação surge de uma reflexão sobre as causas da falência dos modelos
historicamente adotados para gerenciamento dos recursos ambientais. Uma delas é que, como
é dito popularmente �as leis muitas vezes não pegam� ou seja, apesar de existirem, nem sempre
são acatadas e as entidades com poderes para implementá-las não têm condições operacionais
de evitá-lo. Existem duas formas de corrigir este problema. Uma delas é reforçar o poder de
polícia das entidades responsáveis, o que exige grandes investimentos em pessoal e
equipamentos, e a tomada de medidas coercitivas impopulares e de difícil sustentação política.
Muitas vezes, retorna-se à principal causa da falência deste modelos, imaginando-se que os
problemas serão solucionados por novas imposições legais. A outra, mais racional, é fazer com
que os agentes entendam as razões da existência das leis e de que forma suas infrações poderão
afetar o bem estar das gerações presentes e futuras. A constituição de um colegiado com
atribuições no gerenciamento de uma bacia é uma das formas de se obter este entendimento
fazendo com que cada participante controle sua atuação, impeça a atuação ilegal de outros, e
reforce a atuação das entidades com atribuições de controle, visando o bem comum dos
interessados na bacia hidrográfica.
Estas considerações mostram a relevância do estabelecimento de instâncias de
negociação como forma de tratar os valores ambientais não quantificáveis economicamente e
balizar a atuação do poder público no trato da questão ambiental.
O terceiro instrumento engloba uma série de alternativas necessárias ante a constatação
de que o mercado de livre iniciativa, por si só, não é eficiente para a promoção do uso
socialmente ótimo do ambiente. Isto requer:
a) a implementaçao de instrumentos legais especificamente desenvolvidos para
a bacia, na forma de programas ou planos diretores, enquadramentos dos cursos
de água em classes de uso preponderante, criação de áreas de interesse ecológico
ou de proteção ambiental, etc.
b) a outorga do uso da água, incluindo os lançamentos de resíduos, através de
cotas: trata-se de um instrumento discricionário que os poderes públicos, federal e
estaduais, proprietários constitucionais das águas, dispõem para promover o seu
uso adequado sob o ponto de vista da sociedade como um todo, limitando os
poderes dos colegiados de bacia.
c) a cobrança de tarifas pelo uso da água, incluido o lançamento de resíduos
nos corpo s de água: instrumento que pode ser usado para gerar recursos para
investimentos na bacia, primordialmente, e para estimular o uso socialmente
adequado da água, em caráter complementar, sendo uma aplicação dos princípios
�poluidor-pagador� ou �beneficiário-pagador� acima apresentados.
d) o rateio de custo das obras de interesse comum entre os seus beneficiários:
desdobramento do instrumento anterior, que conjuga o caráter financeiro com a
promoção da justiça fiscal, impondo o custeio de uma obra aos seus beneficiários
diretos.
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Sér. meio ambiente debate, 36
É necessário entender que o gerenciamento de bacias hidrográficas comporta
investimentos de grande monta, seja em medidas estruturais, tais como reservatórios, sistemas
de abastecimento e de esgotos, de irrigação, criação e fiscalização de reservas, etc, seja em
medidas não estruturais voltadas à consecução do gerenciamento propriamente dito, na forma
de operação de entidades devidamente equipadas de pessoal e material, promoção de
programas de extensão rural e educação comunitária, etc. Não se pode pretender que toda a
sociedade pague por isso através de impostos mas, ao contrário, que parcela substancial dos
recursos financeiros seja gerada na própria bacia, onde se encontram os beneficiários diretos
dos investimentos. Duas das formas de geração de recursos financeiros são a cobrança pelo
uso da água e, mais diretamente, o rateio das obras de interesse comum entre seus
beneficiários. A execução destes instrumentos de participação financeira nos investimentos
pode ser facilitada na medida que seu estabelecimento e aplicação sejam realizados com
ampla participação dos envolvidos. Esta é mais uma das justificativas para a criação do
colegiado da bacia.
Esta questão da cobrança causa muitas vezes violentas, quando não destemperadas,
manifestações de grupos ou pessoas que alegam que �o Estado já c obra impostos demasiados
para o retorno que dá à sociedade�. Entendem ser esta cobrança mais uma forma de aumento
de imposto e por isto a desaprovam enfaticamente. Este instrumento, sendo entendido
adequadamente, poderia, no entanto, fazer parte até mesmo das recomendações do discurso
liberal que fundamenta estas reações. A idéia subjacente é que a bacia deve gerar os recursos
financeiros para seus próprios investimentos, assim como o faz um condomínio de edifício.
Como não existe na economia �almoço grátis�, a alternativa à cobrança é o financiamento dos
investimentos justamente pelos impostos que seriam cobrados de toda sociedade e não daquele
segmento diretamente beneficiado, que se insere na bacia. Isto poderá, inclusive, reforçar os
argumentos sobre a necessidade de diminuição de impostos, pois seria estabelecido um
instrumento de arrecadação alternativo que tem a vantagem de poder ser controlado pelos
próprios pagadores, através da atuação do colegiado de bacia. Nas bacias sem capacidade de
pagamento haveria ainda necessidade de buscar-se nos impostos pagos por toda sociedade
suas fontes de financiamento. Neste caso, haveria a legitimação deste instrumento por estar
coadunado com objetivos sociais amplos, como os de diminuição de diferenças regionais,
estabelecimento de pólos alternativos de desenvolvimento, ampliação da fronteira agrícola,
melhoria da distribuição de renda, etc.
Em resumo, os instrumentos comentados facultam o comprometimento consciente
da sociedade e dos usuários dos recursos ambientais com os planos, programas e
instrumentos legais requeridos para o desenvolvimento da bacia hidrográfica. É criada
uma vontade política regional, que junto com a geração de recursos financeiros, torna-se o
vetor mais relevante do sucesso da administração pública na promoção do uso e proteção
do ambiente.
Do ponto de vista gerencial este modelo de sistêmico de gerenciamento adapta a
concepção apresentada do gerenciamento ambiental, apresentada na Figura 1, às demandas
gerenciais do gerenciamento de recursos hídricos. Sua extensão ao gerenciamento de bacias
hidrográficas, de caráter mais amplo, pode ser realizada

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