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1 3ª AULA – A PROPRIEDADE. A propriedade. Função social. Extensão. A descoberta. Atributos. Modos aquisitivos. Registro público. Acessões. Usucapião. Perda da propriedade. Aquisição e perda da propriedade móvel. Propriedade resolúvel e aparente. Direitos de vizinhança 1 – CONCEITO → com base no art. 1.228, Carlos Roberto Gonçalves diz que o direito de propriedade é o “poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha”. Orlando Gomes dizia que pelo critério sintético, propriedade seria “a submissão de uma coisa, em todas as suas relações, a uma pessoa”. Deve-se ter em mente que o conceito de propriedade é sempre dinâmico. Atualmente, a garantia constitucional da propriedade está relativizada, tendo sua interpretação limitada pela legislação ordinária. Diz-se que a soma dos 4 poderes do domínio, nas mãos do titular e com o título forma o direito de propriedade. • Uso • Gozo • Disposição e • Reivindicação Quem titularizar os 4 poderes, mais o título em cartório, vai ter propriedade. Não há uma escalada hierárquica entre os três institutos: propriedade, domínio e posse. Eles têm funções e efeitos diferentes. São três situações jurídicas distintas. Posse é um dos poderes. • pode haver posse sem ter propriedade. • pode haver posse por ser proprietário • pode haver domínio por ser proprietário • pode ter domínio sem ter propriedade. • pode ter posse sem ter domínio ou propriedade 2 – ESTRUTURA E FUNÇÃO Afirma Guilherme Calmon Nogueira da Gama que a propriedade só pode ser adequadamente compreendida se conjugada em dois aspectos: a) O estrutural (aspecto estático) – concebida nos elementos previstos no art. 1228; usar, gozar, dispor e reaver. b) O funcional (aspecto dinâmico) – função social. 2.1 – ASPECTO ESTRUTURAL - Aqui a doutrina cita os elementos da propriedade: uso, gozo (fruição), disposição. Estes correspondem ao conteúdo econômico (elemento interno) do direito de propriedade. Já a faculdade de reaver a coisa representa seu conteúdo jurídico (elemento externo). 2 A - (ius utendi) é a possibilidade de o proprietário retirar da coisa em todos os serviços e utilidades que ela proporcionar. É a faculdade de o dono servir-se da coisa e de utilizá-la da maneira que entender mais conveniente, sem, no entanto, alterar-lhe a substância. Limita-se pelo abuso de direito (1.228 §2º) B - direito de gozar ou usufruir (jus fruendi) compreende o poder de perceber os frutos naturais e civis da coisa e de aproveitar economicamente os seus produtos. C - O direito de dispor da coisa (jus abutendi) consiste no poder de transferir a coisa, de gravá-la de ônus e de aliená-la a outrem a qualquer título. Não significa, todavia, prerrogativa de abusar da coisa, destruindo-a gratuitamente, pois a própria CF prescreve que o uso da propriedade deve ser condicionado ao bem- estar social. D - O quarto elemento constitutivo é o direito de reaver a coisa (rei vindicatio), de reivindicá-la das mãos de quem injustamente a possua ou detenha, como corolário de seu direito de sequela, que é uma das características do direito real. Envolve a proteção específica da propriedade, que se perfaz pela ação reivindicatória. 2.2 – ASPECTO FUNCIONAL – A FUNÇÃO SOCIAL. No direito romano, a propriedade tinha caráter individualista. Na Idade Média, passou por uma fase peculiar, com dualidade de sujeitos; o dono e o que explorava economicamente o imóvel, pagando ao primeiro pelo seu uso. Havia todo um sistema hereditário para garantir que o domínio permanecesse numa dada família de tal forma que esta não perdesse o seu poder no contexto do sistema político. Após a Revolução Francesa, a propriedade assumiu feição marcadamente individualista, pois representava garantia sobre o patrimônio e sua riqueza. Gradativamente, foi acentuado o seu caráter social, contribuindo para essa situação as encíclicas Rerum Novarum, (1891) do Papa Leão XIII, e Quadragésimo Ano, de Pio XI (1931 – comemorando os 40 anos da Rerum Novarum). O sopro da socialização acabou impregnando o século XX, influenciando a concepção da propriedade e o direito das coisas. Nota-se que o legislador dos séculos XVIII e XIX trabalharam a propriedade sob a feição não intervencionista do Estado, o qual se limitaria a agir para proteger os titulares destes direitos. A mudança de paradigma só se dá no século XX, por força dos mecanismos de mudança social, reconhecendo a necessidade de a propriedade atender a interesses sociais. No Brasil, pode-se observar que o Código Civil de 1916 trabalhou a propriedade como elemento de interesse de seu proprietário-titular, calcando-se em interesses individualistas e patrimonialistas, assegurando uma série de faculdades e poderes jurídicos bastante amplos, ainda que muitas vezes sem qualquer funcionalidade. Já o CC de 2002, lastreado no princípio da socialidade (entre outros), passa a fazer alusão ao aspecto funcional no §1º do art. 1.228, ao tratar do direito de propriedade: Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. 3 § 1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. § 2º São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. A CF/88 já tinha atribuído o patamar de direito fundamental à função social da propriedade (art. 5º, XXIII). Gustavo Tepedino assevera que a propriedade fundiária especulativa que vise apenas à acumulação e não observa os objetivos da República, descumprindo a função social não é tutelada pela Constituição. Nesse sentido: art. 182, § 4º CF/88 que prevê a desapropriação sanção: Art. 182 - A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. § 4º - É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais. E neste particular, Tepedino assevera que a propriedade com finalidade especulativa, que não cumpra sua função social, ainda que economicamente capaz de produzir riqueza, deverá ser prioritariamente desapropriada, segundo a CF, para fins de reforma agrária. Ainda que a CF tenha avançado, isso não impede a existência de críticas afirmando que houve uma influência do espírito conservador quando do desenvolvimento da política urbana, posto que: a) Não facultou ao Poder Público local estabelecer a escolha do tipo de sanção mais adequada, sem seguir a ordem constitucional; b) Vedou a usucapião especial urbana e rural em relação a imóveis públicos; c) A não operacionalização das regiões metropolitanas CF Art. 186 - A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios egraus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. 4 Art. 186 da CF você encontra algumas prerrogativas que devem ser cumpridas para a função social de imóvel urbano rural. O fato de estar na CF, para ampla maioria da jurisprudência, não significa que aquilo dali seja exaustivo, a função social da propriedade ela varia de acordo com a condição do bem. A disciplina da CF não é exauriente porque posteriormente, independente da previsão constitucional, você poderá trazer elementos agregadores para esse conceito e instituto da função social. A CF/1988 dispõe que a propriedade atenderá a sua função social (art. 5º, XXIII) e também determina que a ordem econômica deverá observar a função da propriedade, impondo freios à atividade empresarial (art. 170, III). A função social não é apenas um limite ao direito de propriedade, pois além das funções negativas, ela tem funções positivas, assim, ela integra o direito de propriedade, não sendo apenas um marco negativo. Também o Estatuto da Terra (Lei 4.504/64) prevê a ideia do exercício vinculado à função social: Art. 2° É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei. § 1° A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente: a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias; b) mantém níveis satisfatórios de produtividade; c) assegura a conservação dos recursos naturais; d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivem. 3 – EXTENSÃO O art. 1.229 limita a extensão da propriedade pelo critério da utilidade: até onde lhe for útil. * O proprietário nos pode se opor à realização de trabalhos a uma altura ou profundidade que não tenha ele interesse algum em impedi-los. Art. 1.229 - A propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las. Art. 1.230 “a propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por leis especiais” que constituem propriedade distinta do solo para efeito de exploração ou aproveitamento e pertencem à União (CF, art. 176; Código de Mineração, art. 84). A propriedade do produto da lavra é do concessionário que a explora, cabendo ao proprietário do solo apenas participação nos resultados da lavra. 4 – A DESCOBERTA (invenção CC/16) Descoberta é achado de coisa perdida por seu dono. Descobridor é a pessoa que a encontra. A descoberta não é modo de adquirir a propriedade, uma vez que o descobridor não pode conservar para si o objeto extraviado, tendo a obrigação de restituí-lo. 5 Art. 1.233 “Quem quer que ache coisa alheia perdida há de restituí-la ao dono ou legítimo possuidor. Parágrafo único. Não o conhecendo, o descobridor fará por encontrá-lo, e, se não o encontrar, entregará a coisa achada à autoridade competente”. Trata-se, portanto, de coisa perdida e não de coisa abandonada. As obrigações impostas ao descobridor só nascem, todavia, se se apropriar da coisa perdida. Se não o fizer — ninguém está obrigado a recolher a coisa perdida — o simples achado não gera qualquer efeito. Art. 1.234 Aquele que restituir a coisa achada, nos termos do artigo antecedente, terá direito a uma recompensa não inferior a cinco por cento do seu valor, e à indenização pelas despesas que houver feito com a conservação e transporte da coisa, se o dono não preferir abandoná-la. Parágrafo único. Na determinação do montante da recompensa, considerar-se- á o esforço desenvolvido pelo descobridor para encontrar o dono, ou o legítimo possuidor, as possibilidades que teria este de encontrar a coisa e a situação econômica de ambos. Mesmo estando obrigado a restituir a coisa achada, assegura-se ao descobridor o direito a uma recompensa, denominada achádego. Assegura-lhe, ainda, o direito de ser indenizado pelas despesas que houver feito, mas apenas as necessárias, destinadas à conservação da coisa, e as efetuadas com o seu transporte, que forem devidamente comprovadas. Todavia, o direito à recompensa e à indenização somente é devido se o dono ou possuidor da coisa tiver interesse em recebê-la. Se ele não se interessar pela restituição, pode abandoná-la. Nesse caso, se o descobridor quiser, pode adquiri-la, pois ela deixa de ser coisa perdida e passa a ser tida como abandonada, operando-se sua ocupação (art. 1.263). Art. 1.235: O descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor legítimo, quando tiver procedido com dolo. O descobridor não é obrigado a recolher a coisa achada, mas se o fizer, deverá tomar os cuidados necessários para conservá-la e restituí-la ao dono, fazendo jus, por isso, à indenização das despesas necessárias. 5 - SUJEITO E OBJETO O proprietário pode ser qualquer pessoa física ou jurídica, tanto de direito privado quanto público, basta possuir capacidade de direito. Quanto ao objeto a doutrina diverge, pois entendem alguns que o direito de propriedade estaria limitado às coisas corpóreas, enquanto outros entendem que incidiria também sobre bens incorpóreos a exemplo dos diretos autorais. No tocante ao objeto, vigoram alguns princípios: a) da materialização ou corporeidade – somente bens corpóreos podem ser objeto da propriedade, pois a coisa precisa ser determinada e tangível. b) Da individualização – necessidade de identificação específica do objeto do direito de propriedade c) Da acessoriedade – pressuposição de que pertencem ao proprietário da coisa principal as partes integrantes, os frutos e os produtos. 6 - ESPÉCIES 6.1 - Quanto à plenitude das faculdades: 6 a) Propriedade Plena ou Alodial – quando o proprietário tem consigo os atributos de gozar, usar, reaver e dispor da coisa; todos os elementos previstos no art. 1.228 do CC estão reunidos nas mãos do seu titular b) Propriedade Limitada ou Restrita – quando uma ou algumas das faculdades da propriedade são destacadas do direito de propriedade e são concedidas a outras pessoas que não o titular, formando, portanto, os direitos reais sobre coisa alheia ou são constituídos direitos obrigacionais a partir do negócio jurídico celebrado. Assim, havendo a divisão entre os referidos atributos, o direito de propriedade é composto de duas partes destacáveis: • Nua-propriedade – corresponde à titularidade do domínio, ao fato de ser proprietário e de ter o bem em seu nome. Costuma-se dizer que a nuapropriedade é aquela despida dos atributos do uso e da fruição (atributos diretos ou imediatos). A pessoa que a detém recebe o nome de nu-proprietário, senhorio direto ou proprietário direto. • Domínio útil – corresponde aos atributos de usar, gozar e dispor da coisa. Dependendo dos atributos que possui, a pessoa que o detém recebe uma denominação diferente: superficiário, usufrutuário, usuário, habitante, promitente comprador etc. No usufruto, por exemplo, o direito de usar e gozar fica com o usufrutuário, permanecendo com o nu-proprietário somente o de dispor e reivindicar a coisa. O usufrutuário, em razão desse desmembramento, passa a ter um direito real sobre coisa alheia, sendo oponível erga omnes. O art. 1.225 fornece a relação dos direitos reais, e cita, em primeiro lugar, o direito de propriedade. Os demais resultam de seu desmembramentoe são denominados direitos reais sobre coisas alheias (jura in re aliena)”. Os direitos reais sobre coisas alheias dividem-se em • direitos reais de gozo ou de fruição: superfície, servidões, usufruto, uso, habitação e o direito do promitente comprador do imóvel; concessão de uso especial para fins de moradia e a concessão de direito real de uso, e a laje. • direitos reais de garantia: penhor, hipoteca e anticrese (art. 1.225, VIII a X). • direito real de aquisição 6.2 - Quanto ao local - Propriedade urbana e rural – eles têm tratamento legislativo distinto. O solo urbano está regido pela lei do parcelamento do solo urbano (Lei 6766/79), Estatuto da Cidade (Lei 10257/01). A propriedade rural é regida pelo Estatuto da Terra (Lei 4504/64) e de leis esparsas que versam sobre suas disposições e sobre a desapropriação para reforma agrária. 6.3 - Quanto à duração - propriedade perpétua ou revogável – a primeira tem duração ilimitada. A revogável é aquela em que o próprio título de constituição do direito de propriedade, por sua própria natureza ou em virtude da vontade do agente ou das partes, contém condição resolutiva. 7 - PROPRIEDADE REVOGÁVEL: RESOLÚVEL E AD TEMPUS Em algumas situações, quebra-se a noção geral da duração ilimitada e irrevogável da propriedade, pois o princípio da irrevogabilidade da propriedade 7 pode ceder quando a duração do direito subjetivo se subordinar a acontecimento futuro previsto no próprio título constitutivo, ou, mesmo não previsto no título, em razão de certos fatos consignados em norma, ocorrendo, assim, a chamada propriedade revogável, na qual a própria causa da aquisição já encerra o princípio da resolução. O CC traz duas situações distintas e delineadas: a propriedade resolúvel e a propriedade ad tempus. 7.1 – A PROPRIEDADE RESOLÚVEL (art. 1.359) Art. 1359 - Resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento do termo, entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha. Podemos citar como exemplos de propriedade resolúvel: a retrovenda, a propriedade fiduciária, a propriedade superficiária e o fideicomisso. Assim, a titularidade e o direito de propriedade já nascem com a perspectiva de durabilidade subordinada a um acontecimento futuro e certo (termo final) ou incerto (condição resolutiva, art. 121), pois o negócio jurídico que constitui a propriedade em nome de certa pessoa já contém dentro de si um elemento acidenta que será o germe de sua própria destruição, pois há uma cláusula expressa que determina a extinção do direito subjetivo para certo tempo. O proprietário resolúvel age como qualquer proprietário, enquanto não se verifica o evento futuro certo ou incerto, pois a limitação de seu direito subjetivo é apenas de ordem temporal. Portanto, poderá exercitar todos os poderes dominiais sobre o bem: poderá usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa em face de terceiros, concentrando em si a plenitude das faculdades. Todavia, efetivando-se o termo final ou condição, resolve-se a propriedade, que será titularizada nas mãos do proprietário diferido, pois uma vez ocorrido o evento previsto no título, assume a condição de proprietário. Resolvida a propriedade, sua extinção ocorre retroativamente, produzindo efeitos ex tunc (art. 1.359). Terceiros que adquiriram a propriedade neste interim serão sacrificados. Consequentemente, todos os direitos concedidos pelo proprietário resolúvel, em sua pendência, também serão resolvidos, pois o novo proprietário poderá reivindicar a coisa contra terceiros que negociaram com o proprietário resolúvel. Não pode o terceiro alegar o estado de boa-fé ou de ignorância para se forrar dos efeitos da sequela, pois a oponibilidade erga omnes da clausula resolutiva decorre do fato de haver sido registrada no oficio imobiliário. A mesma situação se verifica se o proprietário resolúvel ao invés de alienar a coisa para terceiro, grave-a com ônus reais, introduzindo um usufruto ou uma hipoteca, exemplificadamente. Com efeito, alcançada a resolução da propriedade, os direitos reais concebidos pelo antigo proprietário sucumbirão diante da revogação do direito subjetivo que havia lhes introduzido no mundo jurídico. Vale dizer, extinto o principal, extinguem-se os acessórios. O proprietário diferido receberá a propriedade plena, sem quaisquer limitações. Enquanto não se verifica o termo ou condição resolutiva, o proprietário diferido terá apenas a condição de titular de direito eventual (art. 130, CC), podendo, contudo, praticar todos os atos necessários a conservação deste direito. Assim, se o proprietário resolúvel pratica atos de destruição do imóvel, poderá o proprietário diferido exercer quaisquer pretensões capazes de cessar os danos ou evitar novos prejuízos. 8 Na propriedade resolúvel, o evento que extingue o direito de propriedade acarreta sua transmissão no estado em que a coisa se encontrava ao ser recebida pelo proprietário resolúvel. Ex: A estipula com B um contrato de compra e venda, com pacto de retrovenda no prazo de três anos (art. 505). Poderá, quando do vencimento do termo, exercer o direito potestativo de reaver a coisa para si mesmo que ela se encontre na propriedade de C, em razão de venda efetuada por B. Qualquer resistência de C será combatida pelo exercício da pretensão reivindicatória por parte de A. Em síntese, o negócio jurídico que produz a propriedade resolúvel é existente, válido e eficaz, pois produz imediatamente os efeitos pretendidos pelas partes. É o que prevê o art. 127: “se for resolutiva a condição, enquanto esta não se realizar, vigorará o negócio jurídico, podendo exercer-se desde a conclusão deste o direito por ele estabelecido, todavia, o advento do termo ou condição resolutiva implica ineficácia superveniente, sendo imprópria qualquer menção a uma suposta “invalidade superveniente”.1 Um exemplo de propriedade resolúvel é a propriedade fiduciária, onde há a transmissão do bem ao credor fiduciário, em garantia de uma dívida, sendo o bem resgatado pelo devedor no momento da quitação do débito (condição resolutiva). Propriedade fiduciária A alienação fiduciária é negócio jurídico bilateral, em que o credor fiduciário adquire propriedade resolúvel e posse indireta do bem, em garantia do financiamento efetuado pelo devedor Art. 1.361. Considera-se fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor, com escopo de garantia, transfere ao credor. § 1º Constitui-se a propriedade fiduciária com o registro do contrato, celebrado por instrumento público ou particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor, ou, em se tratando de veículos, na repartição competente para o licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro. § 2º Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o devedor possuidor direto da coisa. § 3º A propriedade superveniente, adquirida pelo devedor, torna eficaz, desde o arquivamento, a transferência da propriedade fiduciária. 7.2 – A PROPRIEDADE AD TEMPUS (art. 1.360 CC) Art. 1360 - Se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor, que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado proprietário perfeito, restando à pessoa, em cujo benefício houve a resolução, ação contra aquele cuja propriedade se resolveu para haver a própria coisa ou o seu valor. Na propriedade ad tempus, a extinção do direito de propriedade decorre de um evento superveniente; não há previsão cláusula contratual de limitação temporal da eficácia do negócio jurídico. Não se trata de propriedade resolúvel, porém, revogável em razão de um evento futuro. A distinção tem efeitos práticos da maior importância. Se a propriedade se extingue em virtude de um fato superveniente,um fato posterior à transmissão do direito subjetivo, não se pode cogitar de efeitos retroativos. Por conseguinte, 1 Zeno Veloso: “causas supervenientes, fatores ou circunstâncias que surgem depois, fatos posteriores ao surgimento do negócio, não determinam sua nulidade ou anulabilidade. Pode até ocorrer que um evento ulterior a seu nascimento determine a ineficácia do negócio, como nos casos de revogação, resolução ou distrato”, cf. Invalidade do Negócio Jurídico, p. 30. 9 serão preservados todos os atos praticados pelo proprietário antes da extinção da propriedade, que terá apenas efeitos ex nunc. Assim, qualquer um que adquira a coisa antes da incidência do fato superveniente será considerado proprietário perfeito, prevalecendo o seu direito subjetivo contra erga omnes. Ao prejudicado caberá apenas ingressar com pleito indenizatório em face daquele que alienou o bem. Surge a propriedade ad tempus, invariavelmente nas transmissões gratuitas, inter vivos e causa mortis. Toda liberalidade é potencialmente revogável por eventos futuros. Assim, o fato extintivo superveniente acarreta a perda da propriedade no estado em que se encontra, sem prejuízo dos direitos adquiridos por terceiros, pois a eficácia do evento é para o futuro. Enunciado 509 da V Jornada de Direito Civil: “A resolução da propriedade quando prevista no titulo aquisitivo, opera ex tunc e erga omnes; se decorrente de causa superveniente, atua ex nunc e inter partes”. Exs: revogação da doação por descumprimento do encargo (art. 555); revogação da doação por ingratidão do donatário (art. 557); exclusão da sucessão por indignidade (art. 1.814). Exemplificando: A faz a doação de um imóvel em favor de B. Dois anos após a liberalidade, B comete crime de lesões corporais contra A. Faculta-se a este a revogação da doação por ingratidão do donatário B, reavendo a propriedade imobiliária. Se B, porem, alienou o imóvel a C, em um momento anterior, não poderá A reivindicar a coisa em face desse adquirente, em razão do evento superveniente, restando-lhe apenas o pleito indenizatório contra B, no valor do imóvel doado. E por se referir a fato não previsto no contrato, o terceiro, adquirente de boa-fé, tem seu direito de propriedade preservado, cabendo ao alienante (aquele em cujo benefício houve a resolução), tão somente haver perdas e danos contra o adquirente (aquele cuja propriedade se resolveu – não é o terceiro de boa-fé). A ação visando à retomada da coisa – ação reivindicatória – só tem lugar se (a coisa ainda estiver na posse do adquirente (proprietário resolúvel). 8 - A PROPRIEDADE APARENTE Aqui se discute a validação dos atos praticados por pessoas que verdadeiramente não possuem o direito de realizá-los, mas “apresentam-se, aos olhos de todos, como se fossem os autênticos titulares desse direito” (Orlando Gomes) Exemplificando: A doa a sua concubina B um imóvel, na constância de seu casamento com C. Posteriormente, termina o concubinato e A ajuíza ação de nulidade do negócio jurídico pleiteando a restituição do imóvel a seu patrimônio em razão da dissimulação. Porém, ao tempo da ação reivindicatória o imóvel já havia sido vendido por B a D, que nada sabia a respeito da ilegitimidade de B para adquirir a propriedade. Não se mostra justo que aquele que voluntariamente oculta um negócio jurídico possa posteriormente opô-lo a quem não tinha condições de conhecê-lo. O CC dispõe no parágrafo único, do art. 1.827, que “são eficazes as alienações feitas a título oneroso, pelo herdeiro aparente a terceiro de boa-fé”. Exemplificando: A, na condição de sobrinho de B, fica com a herança, pelo fato de não existir parente mais próximo ao de cujus. A aliena um dos imóveis herdados a C e, tempos depois, D ajuíza ação de investigação de paternidade e prova que era filho do falecido (B). Ocorre que D não poderá alcançar o imóvel alienado a C, posto que houve boa-fé do comprador. 10 Para haver propriedade aparente, é preciso que o suposto proprietário esteja convencido de que o bem realmente lhe pertença (boa-fé) e que o seu comportamento seja de tal ordem, que qualquer pessoa se enganaria na mesma situação; 9 - MODOS AQUISITIVOS DE PROPRIEDADE 9.1 – A PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA. A AQUISIÇÃO PELO REGISTRO DO TÍTULO O CC/02 não se ocupou em separar um dispositivo especifico para tipificar os modos de aquisição de propriedade imobiliária, limitando-se a disciplinar, no capítulo intitulado “Da aquisição da propriedade imóvel”, a usucapião, o registro do título e a acessão (arts. 1.238 a 1.259). Isto é correto, pois existem mais que aquelas quatro formas de aquisição de propriedade imobiliária. A desapropriação, a adjudicação compulsória e o casamento pela comunhão universal, exemplificadamente, também são modos aquisitivos. 9.1.1. Noções gerais Para a aquisição da propriedade imóvel, no direito brasileiro, não basta o contrato. Por ele, criam-se apenas obrigações e direitos. Art. 481: Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro. A transferência do domínio, porém, só se opera pela tradição, se for coisa móvel (art. 1.267) e pelo registro do título translativo, se for imóvel (art. 1.245). Art. 1.245: Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. § 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel”. O registro imobiliário confere apenas presunção juris tantum de domínio: uma vez efetuada a matrícula, presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se registrou (art. 1.245, § 2º). E a propriedade considera-se adquirida na data da apresentação do título a registro (art. 1.246), ainda que entre a prenotação e o registro haja decorrido bastante tempo. A importância do registro → há espécies de atos e fatos jurídicos que, por exigência da lei, devem ser conhecidas por todos, real ou presumidamente, como é o caso dos atos e fatos alusivos à propriedade imóvel. A relação dos atos sujeitos ao registro encontra-se na LRP (Lei 6.015/73). O CC/02 usa apenas a expressão “registro”, que engloba os antigos atos de transcrição e de inscrição. Há basicamente três sistemas distintos tratando sobre registro: a) Romano — o título ou causa (ato jurídico pelo qual uma pessoa manifesta validamente a vontade de adquirir um bem) não se mostra suficiente para transferir propriedade, devendo ser complementado pela observância de um modo (forma de aquisição), que seria o registro; b) Francês — o registro imobiliário constitui mero instrumento de publicidade, pois os contratos isoladamente transmitem a propriedade e geram eficácia real. O simples consentimento legitimamente manifestado pelas partes sobre a coisa e o preço são suficientes para a aquisição da propriedade. Dispensa-se a prática 11 de qualquer formalidade subsequente e só se procede ao registro como modo de publicidade e oponibilidade a terceiros. Os contratos possuem eficácia translativa. c) Alemão — os contratos produzem apenas obrigações. Para a transmissão da propriedade é abstraída a causa (contrato), já que a passagem da propriedade resulta de uma segunda convenção - denominada de convênio jurídico-real — realizada pelas mesmas partes perante o oficial de registro e completamente dissociada do título originário. O Direito Brasileiro perfilhou o caminho do meio — ou seja, o sistema romano — ao adotar a teoria do título e do modo em matéria de aquisição de propriedade. Sem registro não se adquire, inter vivos, a propriedade de bem imóvel (art. 1.245). Não basta o título para gerar efeito translativo (v. g., escritura pública, instrumento particular, carta de sentença e formalde partilha), pois determinante é o modo aquisitivo, ou seja, o registro. Em nosso sistema, o título simplesmente serve de causa à futura aquisição de propriedade, pois nosso ordenamento jurídico, diversamente do francês, não reconhece força translativa aos contratos. É fundamental a intervenção estatal, realizada pelo oficial do Cartório Imobiliário. O modo de aquisição e o fato jurídico que vincula o direito de propriedade ao adquirente do título. O registro exerce dupla eficácia: constitui e publica o direito real. De fato, a chave para entender o registro está justamente em perceber a sua origem em verdadeiro negócio jurídico complexo, composto de duas fases, a obrigacional e a real. Com efeito, quando o transmitente outorga uma escritura de compra e venda, o beneficiário adquire um título, toma-se credor de obrigação de dar (art. 237), mas não se converte ainda em proprietário. O título apenas lhe defere a posição de credor de uma relação obrigacional. Nada obstante, a primeira declaração já consubstancia em seu interior a vontade do adimplemento no plano do direito das coisas. A Escritura de Compra e Venda é o documento feito no Cartório de Notas (ou Tabelionato) por meio do qual o Oficial do Cartório (Tabelião) declara a vontade das partes contratantes. A função do Tabelião é colocar na escritura todas as condições da venda e compra realizada: objeto; partes, preço; forma de pagamento; entrega das chaves, etc., criando, assim, um título hábil ao Registro de Imóveis; e a formalização de todas as obrigações que decorrem da compra e venda, como por exemplo, qual o prazo para que o comprador informe o condomínio sobre a sua compra, e, se ele não informar, qual será a penalidade etc. O Cartório de Registro de Imóveis é o ofício responsável por manter em arquivo todo o histórico de todos os imóveis de sua região. Isto é feito por intermédio das Matrículas. Cada imóvel possui a sua Matrícula, identificada por um número no Cartório. Na Matrícula ficam registrados todos os acontecimentos ligados a ele (quem foram proprietários, quem é o atual; qual o número de cadastro junto à Prefeitura; se houve ou há algum gravame, isto é, hipoteca, penhora etc. A Escritura apenas formaliza a venda e cria um título hábil à transmissão da propriedade do imóvel; o Registro transfere definitivamente a titularidade do imóvel ao comprador e com ela, todas as obrigações acessórias (pagamento de condomínio, IPTU etc.). 12 9.1.2 - Atos de Registro de Imóveis: a) Matrícula: arts. 227 a 235 LRP. A matrícula é o registro inaugural do imóvel, consistindo na especificação do estado de um imóvel, tanto em seus aspectos físicos (localização, dimensões etc.) quando jurídicos (proprietário, forma de aquisição etc.), em virtude disso, exige controle rigoroso e exatidão das indicações que nela se contêm. Art. 228. A matrícula será efetuada por ocasião do primeiro registro a ser lançado na vigência desta lei, mediante os elementos constantes do título apresentado e do registro anterior nele mencionado. A LRP adotou o princípio da unicidade da matrícula: cada imóvel terá matrícula própria, de maneira que nenhum poderá ser matriculado mais de uma vez, nem duas matrículas poderão ter por objeto o mesmo imóvel, em sua integridade ou partes ideais (frações ideais) do mesmo imóvel. Se parte de um imóvel for alienada, caracterizando um desmembramento, constituirá ela um novo imóvel, que deverá, então, ser matriculado, recebendo número próprio. Pode dar-se, também, o fenômeno inverso, que é a fusão, ou seja, a unificação de matrículas de imóveis pertencentes ao mesmo titular do direito real. Admite- se, com efeito, a fusão de dois ou mais imóveis contíguos, pertencentes ao mesmo proprietário, em uma só matrícula, de novo número, encerrando-se as primitivas (LRP, art. 234). A fusão de matrículas dá homogeneidade jurídica a imóveis fisicamente contíguos e que, não obstante constituírem um todo harmônico, aparecem para o direito como entidades apartadas. As matrículas a unificar, embora autônomas, devem permitir verificação registrária da proximidade física dos imóveis. O encerramento das matrículas primitivas é averbado. Serão feitas averbações em todas as matrículas e registros dos imóveis fundidos. A matrícula só pode ser cancelada por determinação judicial, pelo desdobro ou pela fusão. Desdobro: subdivisão de lotes. Fusão: unificação de imóveis contíguos. No caso de fusão, o cancelamento da matrícula anterior e abertura de nova matrícula é uma faculdade do proprietário dos imóveis contíguos. b) Registro - O registro sucede à matrícula e é o ato que efetivamente acarreta a transferência da propriedade. O número inicial da matrícula é mantido, mas os subsequentes registros receberão numerações diferentes, em ordem cronológica, vinculados ao número da matrícula-base. Pelo art. 167, I da LRP, devem ser registrados todos os atos que influenciem no uso, gozo e disposição de um imóvel. Portanto, o registro será feito sempre que houver alteração na titularidade de um imóvel ou quando houver limitação da propriedade pela formação de direitos reais limitados. Assim, devem ser registrados atos como: compra e venda de imóvel, permuta, dação em pagamento, doação, instituição de bem de família, hipotecas, servidões, usufruto, uso, habitação, contratos de compromisso de compra e venda, anticrese, superfície, incorporações, instituições e convenções de condomínio, etc. c) Averbação - é qualquer anotação feita à margem de um registro, para indicar as alterações ocorridas no imóvel, seja quanto à sua situação física (edificação de uma casa, mudança de nome de rua), seja quanto à situação jurídica do seu 13 proprietário (mudança de solteiro para casado, p. ex.). Através da averbação é feita alteração em registro já existente. Averbam-se fatos posteriores à matrícula e ao registro que não alteram a essência desses atos, modificando apenas as características do imóvel ou do proprietário, a exemplo de mudança de denominação e de numeração dos prédios, da edificação, da reconstrução, da demolição, do desmembramento e do loteamento de imóveis; restabelecimento da sociedade conjugal; sentenças de divórcio e de nulidade ou anulação de casamento, quando nas respectivas partilhas existirem imóveis ou direitos reais sujeitos a registro; contrato de locação, para fins de exercício do direito de preferência; extinção do direito de superfície; cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade impostas a imóveis (art. 167, II LRP) 9.1.3 - Procedimento registral (síntese) a) Prenotação: é o protocolo de apresentação do título para registro. A prenotação é de fundamental importância para que seja determinada a preferência, eis que uma vez efetuado o registro, este retroagirá à data da prenotação. Tendo em vista a preferência, na prenotação deve conter data (e se possível, até hora) e número de ordem. b) Registro: feita a prenotação do título instruído com todos os documentos necessário e o pagamento dos emolumentos, o registro (ou a averbação, ou ambos, quando for o caso) deverá ser efetuado em até 30 (trinta) dias. A apresentação do título não significa que o registro será efetuado, pois o oficial do registro deverá proceder análise acurada a respeito da validade e da possibilidade do título a ser registrado (respeito ao princípio da legalidade). Caso não haja qualquer óbice legal, o registro será regularmente feito. A EXIGÊNCIA E A DÚVIDA Em razão da responsabilidade civil e penal dos registradores pode haver a formulação de exigências para a prática de um determinado ato. A exigência é ato administrativo, por escrito, que enuncia ao interessado as causas impeditivas do registro pretendido. Para as situações em que o interessado não concordar ou, até mesmo, se a exigência não puder ser atendida, a LRP previu o procedimento de dúvida. Pelo procedimento de dúvida, submete-se ao poder judiciário, em atividadede caráter eminentemente administrativo, o acerto da exigência formulada pelo cartório, chancelando ou não a atitude do oficial e direcionando as providências a serem tomadas pelo interessado no registro. O procedimento de dúvida é meramente administrativo, devendo, mesmo quando haja interesse da União, ser decidido pelo juiz corregedor competente de acordo com a lei de organização judiciária do Estado (RSTJ 6/120) Recebidas as razões da dúvida, o juiz ouvirá o MP, e se não forem necessárias diligências, a dúvida será julgada de pronto procedente ou improcedente Walter Ceneviva: dúvida é pedido de natureza administrativa, formulado pelo oficial, a requerimento do apresentante de título imobiliário, para que o juiz competente decida sobre a legitimidade da exigência feita, como condição de registro pretendido. Note-se que não se trata de uma dúvida do registrador a ser resolvida pelo Judiciário em uma espécie de consulta3. Trata-se de procedimento administrativo, por meio do qual o Judiciário se manifesta sobre o entendimento do cartório, ante a existência de um inconformismo do interessado. 14 O procedimento está previsto no art. 198 da LRP: Art. 198 - Havendo exigência a ser satisfeita, o oficial indicá-la-á por escrito. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, ou não a podendo satisfazer, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la, obedecendo-se ao seguinte: I - no Protocolo, anotará o oficial, à margem da prenotação, a ocorrência da dúvida; Il - após certificar, no título, a prenotação e a suscitação da dúvida, rubricará o oficial todas as suas folhas; III - em seguida, o oficial dará ciência dos termos da dúvida ao apresentante, fornecendo-lhe cópia da suscitação e notificando-o para impugná-la, perante o juízo competente, no prazo de 15 (quinze) dias; IV - certificado o cumprimento do disposto no item anterior, remeter-se-ão ao juízo competente, mediante carga, as razões da dúvida, acompanhadas do título. 9.1.4 - Princípios que regem o registro de imóveis a. Princípio da publicidade O registro confere publicidade às transações imobiliárias, valendo contra terceiros. Qualquer pessoa poderá requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido (LRP, art. 17). Os registros devem estar permanentemente abertos, com poucas exceções, ao integral conhecimento de todos. O serventuário é obrigado, sob penas disciplinares, a expedir certidões e informar a parte. O registro, assim, salvo exceções relativas a direitos alusivos à família e à filiação, torna público o que nele se contém, criando a presunção de seu conhecimento ou de sua cognoscibilidade. Uma vez registrado, ninguém pode ignorar o direito a que corresponde, porque impedido pela publicidade consequente do registro. Pelo sistema obrigatório de publicidade imobiliária decorrente do registro (LRP, art. 169), qualquer transformação (objetiva e subjetiva) da propriedade imóvel torna-se cognoscível por todos. b). Princípio da força probante (fé pública) ou presunção Os registros têm força probante, pois gozam da presunção de veracidade. Presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se encontra registrado. Trata-se de presunção juris tantum, sendo o adquirente tido como titular do direito registrado, salvo prova em contrário (art. 1.247): Art. 1.245, § 2º, CC:“Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel”. Art 1247 “Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retifique ou anule”. c). Princípio da legalidade Incumbe ao oficial do cartório, por dever de ofício, examinar a legalidade e a validade dos títulos que lhe são apresentados para registro, nos seus aspectos intrínsecos e extrínsecos. Não lhe cabe, entretanto, segundo respeitável corrente de opinião, arguir vícios do consentimento, destituídos de interesse público e 15 somente invocáveis pelos interessados, devendo limitar-se à verificação de sua natureza, se registrável ou não. No entanto há posicionamento dizendo que este exame da legalidade dos títulos e, portanto, o levantamento das dúvidas deve ser das nulidades e também as anulabilidades ostensivas. Assim, o oficial pode levantar toda e qualquer dúvida, quer com relação às formalidades externas, quer internas, do título, desde que deste, única e exclusivamente, ela provenha’”. Após o título ser protocolizado, faz-se a prenotação, devendo o oficial examiná- lo. Se estiver em ordem, será registrado. Havendo exigência a ser satisfeita, indicá-la-á por escrito, tendo o interessado 30 dias para a regularização. Não se conformando o apresentante com a exigência do oficial, será o título, a seu requerimento e com a declaração de dúvida, remetido ao juízo competente para dirimi-la (LRP, art. 198). Neste caso, o prazo de trinta dias permanecerá suspenso, até a solução a ser dada pelo juiz. d) Princípio da territorialidade Por tal princípio, exige-se que o registro ocorra na circunscrição imobiliária da situação do imóvel. A escritura pública pode ser lavrada no Cartório de Notas de qualquer localidade, mas o registro só pode ser efetuado no Registro de Imóveis da situação do imóvel (LRP, art. 169). Assim, qualquer interessado pode, a todo tempo, verificar a existência, ou não, de um negócio, tendo por objeto determinado imóvel. Havendo na comarca mais de uma circunscrição imobiliária, a atribuição do registro de atos pertinentes ao imóvel será a definida nas leis de organização judiciária. Deve o oficial, ao receber a documentação a ser registrada, apurar, preliminarmente, se é sua, ou não, a competência territorial, indicando, na hipótese negativa, a circunscrição. Neste caso está dispensado de prenotar o título e suscitar dúvida. Surgida, porém, controvérsia, insistindo a parte na atribuição que o serventuário nega, será decidida pelo corregedor permanente, em processo de dúvida. Em se tratando de bens situados em comarcas diversas, o registro deverá ser feito em todas elas. O desmembramento da comarca não exige, porém, repetição de registro já efetuado no novo cartório (LRP, art. 170). e) Princípio da continuidade Somente se admite o registro de um título se a pessoa que nele aparece como alienante é a mesma que figura no registro como o seu proprietário. Assim, se “A” consta como o proprietário no registro e aliena o seu imóvel a “B”, que, por sua vez, o transfere a “C”, a escritura outorgada por “B” a “C” somente poderá ser registrada depois que “B” figurar como dono no registro de imóveis, ou seja, apenas depois de registrada a escritura outorgada por “A” a “B”. Art. 195 LRP: “Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro”. O princípio da continuidade determina, pois, o imprescindível encadeamento entre assentos pertinentes a um dado imóvel e às pessoas nele interessadas. Cumpre ao oficial zelar pela sua observância, cabendo-lhe exigir a matrícula, mesmo para o imóvel adquirido antes do CC/16. O aludido princípio obedece a duas linhas mestras: a) a do imóvel, como transposto para os livros registrários; e b) a das pessoas com interesse nos registros. Ambas devem ser seguidas de modo rigoroso e ininterrupto. 16 f) Princípio da prioridade Protege quem primeiro registra o seu título. A prenotação assegura a prioridade do registro. Se mais de um título for apresentado a registro no mesmo dia, será registrado aquele prenotado em primeiro lugar no protocolo (LRP, art. 191). Caso a parte interessada, em 30 dias, não atenda às exigências formuladas pelo oficial, cessam os efeitos da prenotação, podendo ser examinado e registrado,se estiver em ordem, o título apresentado em segundo lugar. Se o primeiro apresentante não se conformar com as exigências indicadas e requerer a suscitação de dúvida, o prazo fica prorrogado até o julgamento do referido procedimento. Art. 192 LRP “o disposto nos arts. 190 e 191 não se aplica às escrituras públicas, da mesma data e apresentadas no mesmo dia, que determinem, taxativamente, a hora da sua lavratura, prevalecendo, para efeito de prioridade, a que foi lavrada em primeiro lugar”. A aplicação desse dispositivo restringe-se a hipóteses pouco frequentes. g). Princípio da especialidade Previsto no art. 225 LRP, que exige a minuciosa individualização, no título, do bem a ser registrado. Art. 225 - Os tabeliães, escrivães e juizes farão com que, nas escrituras e nos autos judiciais, as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de terreno, se esse fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário. § 1º As mesmas minúcias, com relação à caracterização do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para registro. § 2º Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior. § 3º Nos autos judiciais que versem sobre imóveis rurais, a localização, os limites e as confrontações serão obtidos a partir de memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais. É o que trata dos dados geográficos do imóvel, especialmente os relativos às metragens e confrontações. Objetiva proteger o registro de erros que possam confundir as propriedades e causar prejuízos aos seus titulares. Significa tal princípio que todo registro deve recair sobre um objeto precisamente individuado. Compete ao oficial do cartório exigir que, nas escrituras públicas, nos instrumentos particulares e nos autos judiciais as partes indiquem, com precisão, os característicos, as confrontações e as localizações dos imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar de terreno, se fica do lado par ou do lado ímpar do logradouro, em que quadra e a que distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados certidão do registro imobiliário (LRP, art. 225). 17 No tocante aos vizinhos, não são mais aceitas as velhas indicações tais como “com quem de direito”, ou “com fulano ou sucessores”. É necessária a expressa indicação do confrontante. Se o título não estiver em ordem, será exigida a sua retificação, para que se conforme com a descrição dos imóveis que consta do registro. h) Princípio da instância Não permite que o oficial proceda a registros de ofício, mas somente a requerimento do interessado, ainda que verbal. Sem solicitação ou instância da parte ou da autoridade, o registrador não pratica os atos do seu ofício. Art. 13 LRP “Salvo as anotações e as averbações obrigatórias, os atos do registro serão praticados: I - por ordem judicial; II – a requerimento verbal ou escrito dos interessados; III - a requerimento do Ministério Público, quando a lei autorizar”. Até mesmo a instauração de procedimento de dúvida será feita a requerimento do interessado (LRP, art. 198). Manteve-se a prática tradicional, facilitadora dos negócios imobiliários, em que não se exige sequer que o interessado formule expressamente o requerimento de registro, pois o ofício do Registro de Imóveis se satisfaz com o requerimento tácito decorrente da apresentação do título registrável. Essa apresentação pode ser feita por qualquer pessoa, transformando-se assim o interessado em simples portador, de acordo com uma prática mais que centenária. 9.2 - DA AQUISIÇÃO POR ACESSÃO 9.2.1. CONCEITO DE ACESSÃO Para Beviláqua, acessão “é o modo originário de adquirir, em virtude do qual fica pertencendo ao proprietário tudo quanto se une ou incorpora ao seu bem”. A acessão sempre depende do concurso de dois requisitos: a) a conjunção entre duas coisas, até então separadas; b) o caráter acessório de uma dessas coisas, em confronto com a outra. Na acessão predomina o princípio segundo o qual a coisa acessória segue a principal. A coisa acedida é a principal, a coisa acedente, a acessória. Entretanto, com relação às suas consequências, aplica-se também o princípio que veda o enriquecimento sem causa. O legislador entendeu mais conveniente atribuir o domínio da coisa acessória também ao dono da principal, para evitar o estabelecimento de um condomínio forçado e indesejado, porém, ao mesmo tempo, procurou evitar o locupletamento indevido, possibilitando ao proprietário desfalcado o percebimento de uma indenização. 9.2.2 - FORMAS DE ACESSÃO A acessão pode ser de dois tipos: a) física ou natural (por decorrer de fenômenos naturais, sendo acessões de imóvel a imóvel): como ocorre pela formação de ilhas, aluvião, avulsão, abandono de álveo (art. 1.248, I a IV). É o que prevê o art 1248: Art. 1.248. A acessão pode dar-se: I - por formação de ilhas; 18 II - por aluvião; III - por avulsão; IV - por abandono de álveo; V - por plantações ou construções. b) industrial - decorre do trabalho do homem, sendo acessão de móvel a imóvel: plantações e construções (art. 1.248, V). 9.2.2.1. ACESSÕES FÍSICAS OU NATURAIS a) Acessão pela formação de ilhas (art. 1.249) O direito civil não trata da acessão de ilhas ou ilhotas formadas no curso de rios navegáveis ou que banhem mais de um Estado, uma vez que tais correntes são públicas (CF, art. 20, IV). Consideram-se navegáveis os rios e as lagoas em que a navegação seja possível, por embarcações de qualquer espécie (Dec. n. 21.235/1932). b) Aluvião (Art. 1.250) É o acréscimo lento formado nas margens dos rios, que importa em aquisição para o proprietário do imóvel. Esses acréscimos pertencem aos donos dos terrenos marginais (acessório segue o principal). c) Avulsão (Art. 1.251) Verifica-se a avulsão quando a força súbita da corrente arranca uma parte considerável de um prédio, arrojando-a sobre outro (Código de Águas, art. 19). Porém, segundo se depreende da leitura do art. 1.251 do CC, a avulsão dá-se não só pela força de corrente como ainda por qualquer força natural e violenta. Não se confunde com a aluvião, que é acréscimo vagaroso e imperceptível. d) Álveo abandonado (Art. 1.252) Vale dizer, apropriar-se do leito de um rio que se secou, que pertencerá aos proprietários ribeirinhos. Se o rio retornar ao leito antigo, recompor-se- á a situação anterior (art. 1.252, CC). O Código de Águas define o álveo como “a superfície que as águas cobrem sem transbordar para o solo natural e ordinariamente enxuto” (art. 9º). É, em suma, o leito do rio; ou seja, por onde a água passa. Ele será público de uso comum, ou dominical, conforme a propriedade das respectivas águas; e será particular, no caso de águas comuns ou águas particulares (Código de Águas, art. 10). 9.2.2.2 - ACESSÕES INDUSTRIAIS (ARTIFICIAIS): CONSTRUÇÕES E PLANTAÇÕES As construções e plantações são chamadas de acessões industriais ou artificiais porque derivam de um comportamento ativo do ser humano. A regra básica → presunção relativa de que toda construção ou plantação existente em um terreno foi feita pelo dono e à sua custa. Art. 1.253: “Toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita pelo proprietárioe à sua custa, até que se prove o contrário”. A presunção não vigora nas hipóteses dos arts. 1.254 e ss.: 19 Art. 1.254. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais alheios, adquire a propriedade destes; mas fica obrigado a pagar-lhes o valor, além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé. Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização. Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo. a) na primeira, o dono do solo edifica ou planta em terreno próprio, com sementes ou materiais alheios; b) na segunda, o dono das sementes ou materiais planta ou constrói em terreno alheio; c) na última, um terceiro planta ou edifica com semente ou material alheios, em terreno igualmente alheio. A solução para o problema decorrente da questão do domínio da coisa principal e da acessória, bem como a da fixação da indenização devida pela parte beneficiada àquela que, em virtude da solução legal, experimentou prejuízo varia de acordo com boa-fé ou má-fé do agente. Assim, se o proprietário semeia, planta ou edifica em seu próprio terreno, mas com “sementes, plantas ou materiais alheios”, adquire a propriedade destes, visto que o acessório segue o principal. O que adere ao solo a este se incorpora. Porém, para evitar o enriquecimento sem causa, estabelece o art. 1.254 que terá de reembolsar o valor do que utilizar, respondendo ainda “por perdas e danos, se agiu de má-fé”. Portanto, ainda que de má-fé, o proprietário do solo adquire automaticamente a propriedade das sementes, plantas e materiais, beneficiado pela acessão. Não haveria interesse social em que se arrancassem plantas e sementes, ou se destruíssem edifícios. O proprietário torna-se dono dessas acessões, mas terá de ressarcir o seu valor. Por outro lado, dispõe o art. 1.255, caput: “aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização”. Se, no entanto, estiver de má-fé, o proprietário terá a opção de obrigá-lo a repor as coisas no estado anterior, retirando a planta ou demolindo a edificação, e a pagar os prejuízos, ou deixar que permaneça, a seu benefício e sem indenização. Não seria justo que o plantador ou construtor que procedesse de má-fé fosse encontrar para esta uma proteção da ordem jurídica e receber indenização pelo seu ato ilícito, em condição melhor do que o possuidor de má-fé, que também nenhuma indenização recebe. Para semear, plantar ou edificar é necessário que o dono da coisa esteja na posse do imóvel. Se de boa-fé, é legítimo o exercício do direito de retenção, só o restituindo após receber a indenização. 20 Quando o valor do terreno era inferior ao da construção ou plantação levantada de boa-fé, mostrava-se injusta a regra do art. 547 CC/16, que determinava a sua perda em favor do dono do solo. Com efeito, se a construção ou plantação, levantada de boa-fé, ultrapassasse o valor do terreno, mesmo assim o dono do imóvel adquiria a sua propriedade. Tal situação encontra-se agora mais bem disciplinada no parágrafo único do art. 1.255: “Se a construção ou plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo”. Esta última regra constitui inovação introduzida pelo CC/02, caracterizando uma espécie de desapropriação no interesse privado. Configura a denominada “acessão inversa”, lastreada no princípio da função social da propriedade, não sendo justo sacrificar o construtor de boa-fé, em proveito do titular desidioso, proprietário de terreno que nada faz para impedir a edificação, quando poderia ter-se incumbido de realizar oposição judicial. Obs - Pequenas diferenças de avaliação entre o valor do solo e o da construção ou da plantação não autorizam o uso da acessão inversa”. O art. 1.255 somente se aplica às construções e plantações, que são acessões industriais, e não às benfeitorias, que não são coisas novas, mas apenas acréscimos ou melhoramentos em obras já feitas. Nas acessões, o proprietário paga o justo valor, isto é, o valor efetivo dos materiais e da mão de obra. Nas benfeitorias, estando o possuidor de má- fé, pode o proprietário optar entre o valor atual e o seu custo (art. 1.222), devendo este, no entanto, ser corrigido monetariamente. Se “de ambas as partes houver má-fé”, o proprietário adquire as sementes, plantas e construções, mas é obrigado a ressarcir o valor das acessões (art. 1.256). À falta de elementos positivos, presume a lei, ainda, no parágrafo único do art. 1.256, a má-fé do proprietário quando o trabalho de construção ou lavoura foi realizado em sua presença e sem impugnação sua. O mesmo critério se aplica quando terceiro, que não é dono das sementes, plantas ou materiais, emprega-os de boa-fé em solo alheio. Assim mesmo o proprietário os adquire, e o dono das plantas ou dos materiais poderá cobrar a indenização do dono do solo quando não puder havê-la do plantador ou construtor (art. 1.257 e parágrafo único). No tocante à invasão de solo alheio por construção, o CC/02, suprindo a omissão do CC/16, disciplina a questão no art. 1.258: “Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em proporção não superior à vigésima parte deste, adquire o construtor de boa-fé a propriedade da parte do solo invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte, e responde por indenização que represente, também, o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente. Parágrafo único. Pagando em décuplo as perdas e danos previstos neste artigo, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte do solo que invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção exceder 21 consideravelmente o dessa parte e não se puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo para a construção”. Os requisitos para que ocorra a aquisição da propriedade do solo são, pois, os seguintes: a) que a construção tenha sido feita parcialmente em solo próprio, mas havendo invasão de solo alheio; b) que a invasão do solo alheio não seja superior à vigésima parte deste; c) que o construtor tenha agido de boa-fé; d) que o valor da construção exceda o da parte invadida: e) que o construtor indenize o dono do terreno invadido, pagando-lhe o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente. A invasão pela construção de área alheia considerável é disciplinada no art. 1.259 do Código Civil: “Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio exceder a vigésima parte deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e danos que abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da desvalorização da área remanescente; se de má-fé, é obrigado a demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos em dobro”. Prezad@s Na próxima semana, dia 23/03, espero-os no horário normal de nossos encontros para uma aula interativa usando o APP TEAMS. O link de acesso está disponível em seu ambiente virtual – SIA. Tudo foi desenhado para darmos continuidade às aulas presenciais, mas agora usando diversas ferramentas de aprendizagem. Para participar ativamente, deverá acessar a Aula/Conteúdo “Propriedade”. (aula 7) A leitura prévia deste material permitirá que interaja de forma efetiva em nosso encontro. Postei, ainda, no Fórum duas perguntas para nosso debate. Abraços virtuais, Vicente Passos
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