Buscar

Diferenças arq

Prévia do material em texto

Wiki - Link https://pt.wikipedia.org/wiki/Regionalismo_cr%C3%ADtico
Regionalismo crítico é uma abordagem arquitetural que tenta remediar a indiferença em relação ao lugar onde está situado o objeto arquitetural moderno. Através da utilização das forças do contexto, visa enriquecer a significação da arquitetura. O termo foi introduzido por Alexander Tzonis e Liane Lefaivre e posteriormente pelo célebre crítico e historiador da arquitetura Kenneth Frampton.
É um termo que não tenta identificar o vernáculo moderno, mas sim identificar ‘escolas’ regionais recentes e cujo objetivo principal tem sido refletir os limitados elementos construtivos nos quais se basearam e serviram.
É uma manifestação local que tenta assimilar e reinterpretar o recente processo iniciado pelo movimento moderno e ainda assim considerar a independência cultural, econômica e política local. Sinteticamente, uma antítese entre cultura de raiz e civilização universal.
Estas características eram pontuais e geralmente surgiam em locais onde o Estilo Internacional não conseguiu se implantar definitivamente. Em Copenhaga, o arquiteto dinamarquês Jørn Utzon ergueu a Igreja Bagsvaerd em 1976, na qual usa elementos pré-fabricados de concreto – de valor universal – combinados de modo particularmente articulado, com abóbadas de concreto armado moldado in situ – com valor um tanto regional, a levar o fato de ser uma abóbada o elemento que simbolicamente representa a luz.
Exemplo de Regionalismo foi o movimento nacionalista catalão Grupo R, fundado em Barcelona, no ano de 1952, que por um lado se via obrigado a reviver os valores e procedimentos racionalistas e antifascistas do GATEPAC (Grupo de Artistas y Técnicos Españoles para la Arquitectura Contemporánea); e por outro, estava consciente da responsabilidade política de evocar um regionalismo realista, acessível à população em geral. Em primeiro lugar estava a tradição da alvenaria catalã; depois estava a influência de Richard Neutra e do Neoplasticismo, seguido da influência neo-realista do italiano Ignazio Gardella.
Outro fator importante consiste na atenção dada para os materiais locais, o artesanato e as sutilezas da luz local. Em Nova York a obra do austríaco Raimund Abraham se molda nestes preceitos, uma vez que enfatiza, além dos aspectos citados, a topografia como ela se apresenta.
Gino Valle representou uma outra maneira de ser regionalista – aquela em que o arquiteto centraliza sua arquitetura em apenas uma cidade, geralmente sua cidade natal. Valle foi um grande arquiteto, mas sua obra se restringiu à cidade de Udine. Na Europa esta preocupação aconteceu principalmente pela devastação gerada pela Segunda Guerra Mundial, estes arquitetos queriam contribuir com o ressurgimento de sua cultura, e reconstruíam as cidades.
O Regionalismo Crítico é portanto uma prática marginal que, ao mesmo tempo que se recusa a abandonar aspectos progressistas, repreende a arquitetura desumana que privilegia a estética e a cultura dominante tão modernizada. Mas não o faz de maneira utópica. E em um ambiente onde o arquiteto tenta ser maior que sua obra, os regionalistas davam ênfase maior ao território onde a obra estava inserida. Contra a tendência da ‘civilização universal’ que privilegia o ar-condicionado, fazem da luz, do terreno, das condições climáticas, as bases que sustentariam o projeto. Fazem do aspecto visual uma característica secundária, na medida em que enfatizam o táctil, as diferentes temperaturas em ambientes distintos, assim com o aroma, os sons, a ventilação e até mesmo o acabamento dos pisos e paredes que são convites ao tato. Isto provoca involuntariamente mudanças sensoriais, de postura, psicológicas, etc. Tentam rigorosamente se apropriar de referências externas, tanto formais quanto tecnológicas, mas sem deixar de lado o que é local.
O Regionalismo Crítico é considerado como uma das formas do pós-modernismo, em arquitetura.[1]V
Vitruvius - https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.124/3573
Quais seriam as direções e apontamentos na busca de caminhos transitáveis para arquitetura contemporânea? Pistas para a reposta desta pergunta podem estar em dois textos escritos nas décadas de 80 e 90. Porém é importante não se esquecer de alguns momentos antes de encontrar o cenário onde/quando estes foram escritos. Lembrar que se pensou sobre o que estava “acontecendo com a arquitetura moderna” (1); do crescimento das inquietações a respeito do Estilo Internacional; da reflexão pela continuidade na trincheira-revista italiana Casabella (2); como da materialização desta resistência em forma de torre: a Velasca de 1958. Lembrar também do questionamento “se arquitetura não seria importante demais para ser deixada para arquitetos” (3); de repensar se tanta abstração, distanciamento da vida cotidiana e elitismo intelectual seriam uma direção correta; do “nervoso desmanche” no ano de1966 (4); da Strada Novissima e a “Presença do passado” (5); como do questionamento se seria o “moderno um projeto inacabado” (6). Para então, em 1981, chegar ao cenário da publicação de um texto de Kenneth Frampton onde este declara uma resistência em seis pontos. O outro texto exige ainda que se lembre, continuando esta despretensiosa história saltitante, do questionamento onde estariam os outros 359 graus (7) e de uma exposição no MOMA em Nova Iorque chamada Deconstructivist Architecture em 1988, para, por fim pelo menos neste ensaio, em 1991, ser publicado um outro texto, desta vez de Bernard Tschumi, que agora declara seis conceitos para a arquitetura contemporânea.
Estes dois textos, e os seis apontamentos de cada um deles, manifestam defesas e aconselhamentos por um caminho para o futuro da arquitetura, um caminho não necessariamente seguro, mas transitável e crítico. Exercícios teóricos de retaguarda e vanguarda resumidos a seguir: seis é igual a...
Seis pontos para uma arquitetura de resistência (8)
Publicado no início da década de 80, o texto do historiador inglês Frampton destaca seis pontos, que em alguns momentos servem para a ordenação do raciocínio e em outros são proposições claras, por uma de resistência aos caminhos trilhados pela arquitetura naquele momento e por uma defesa de um Regionalismo Crítico. Esta ideia de Regionalismo Crítico advém do termo cunhado por Alex Tzonis e Liane Lefaivre, e engrossado pelas reflexões de Paul Ricoeur, no livro Universalization and National Cultures de 1961. O autor divide seu ensaio em seis pontos, que são: Cultura e civilização, Ascensão e queda da vanguarda, Regionalismo crítico e cultura mundial, Resistência da forma do lugar, Cultura versus natureza e Visual versus tátil. Estes procuram a construção de uma posição de retaguarda, um raciocínio cujo primeiro ponto principia no entendimento do embate entre a civilização universal e a cultura local, onde o utilitarismo imposto pelo processo de produção, as abordagens tecnológicas cada vez mais condicionantes para a arquitetura, as megalópoles e a ausência de sentido das fachadas/máscaras compensatórias, marcariam a vitória em andamento da primeira, a civilização universal, sobre a segunda, a cultura local.
No segundo ponto, tratando das vanguardas, diagnostica uma queda deste espírito, onde a alma libertadora estaria se perdendo perante a direção do entretenimento e a comodidade a frente das imagens gratuitas e cenográficas. Assim caberia assumir uma postura de retaguarda, o regionalismo crítico, que aparece no terceiro ponto, agora através de uma abordagem mais propositiva. Armado com uma visão crítica sobre o regionalismo sentimental, uma comunicação populista, o autor evoca uma percepção crítica da realidade, através dos elementos derivados das especificidades de um local em particular. Estas particularidades poderiam estar na luz, na tectônica derivada do modo estrutural peculiar ou na topografia do local. Ainda alerta que não se deve desprezar as técnicas universais, pois o tempo atual, enquanto herdeiro desta civilização, deveria ser portador da cultura local sobre o veículo da civilizaçãouniversal. Então, o primeiro passo seria desconstruir o espectro da cultura mundial para depois realizar uma crítica.
A forma do lugar ocupa posição de destaque no quarto ponto, aproximando da conceituação de Heidegger, ou seja, relacionado com o entendimento do habitar e do limite enquanto elemento determinante, Frampton faz uma abordagem crítica da visão abstrata do espaço, apoiando-se em uma concepção material e existencial. Uma posição distante da forma urbana da Megalópole, distante da fluidez do espaço infinito, mas próximo de uma densidade cultural que possibilitaria múltiplas e profundas experiências, como galerias intrincadas nas quadras das cidades mais antigas. A ideia de cultivar o lugar é tratada no quinto ponto, na relação entre cultura e natureza vê-se uma harmonia, uma interação entre estes, uma abordagem diferente das tradições mais abstratas da arquitetura moderna. A inscrição do edifício no local teria muitos níveis de significação, personificaria a forma construída e geraria um diálogo com o seu passado arqueológico, como suas transformações no decorrer do tempo. As especificidades do clima, a qualidade da luz, a força da malha urbana existente, tudo formaria uma consciência poética do lugar. No entanto, reforça: sem cair na sentimentalidade. Diante da dominação por uma técnica universal, uma janela que se abre de maneira específica para uma luz específica seria uma clara resistência perante o universal ar-condicionado. Ainda neste quinto ponto o autor encontra no tectônico uma alta potencialidade de resistência e de interação entre a matéria, a construção e a força da natureza da gravidade. Ressalvando que este fala da apresentação poética da estrutura e não da simples representação da fachada. (9)
No último ponto o autor discute a percepção tátil desta forma do lugar, ou deste lugar cultivado, uma resistência diante da dominação da civilização universal propalada pela velocidade da imagem. As percepções sensoriais que se complementam (10), uma capacidade de o corpo ler além dos recursos sugeridos pela visão, teriam importância residente no fato de que a leitura, o ato de decifrar o ambiente, somente pode ser feito a partir da sua própria experiência. Assim, não poderia ser reduzida à mera informação ou à simples evocação de um simulacro substituído por presenças ausentes. Esta abordagem do autor deixa claro seu entendimento fenomenológico. O Regionalismo Crítico esforçar-se-ia para equilibrar a prioridade consentida à imagem, reendereçando à escala tátil, onde o tátil opor-se-ia ao cenográfico e as máscaras compensatórias. O retorno do arquiteto à poética da construção. O tátil e o tectônico juntos teriam a capacidade de transcender a mera aparência do técnico, do mesmo modo que a “forma do lugar” teria o potencial para resistir ao ataque implacável da modernização global.
Seis conceitos para arquitetura contemporânea (11)
O arquiteto Bernard Tschumi apresentou outros apontamentos para um futuro da arquitetura através de seis conceitos. Seu texto busca construir um caminho de revisão das ideias de estrutura e função, além das aparências da imagem e da superfície da arquitetura, aparentemente provocado por um texto de Vicent Scully em defesa da arquitetura pós-moderna historicista e crítica ao deconstrutivismo (12). No início do ensaio Tschumi propõe uma recapitulação do passado arquitetônico recente para explicar as ideias que viriam, comenta a importância do livro Complexidade e Contradição de Venturi, que teria o papel de reavaliar as prioridades e valores da arquitetura, como também da influência da semiologia e linguística na restauração e decodificação de significados na arquitetura (13).
Para ilustrar este caminho para a superficialidade e suas consequências, Tschumi narra a construção de dois edifícios na Av. Madison em Manhattan: AT&T e o IBM. Quando em construção eram edifícios praticamente idênticos em sua estrutura de aço, função e layout de escritórios. Suas peles, fixadas através da mesma técnica, fazem surgir dois edifícios totalmente distintos, um símbolo do Pós-modernismo historicista em granito rosa e frontão, o outro representante de um modernismo tardio em um abstrato mármore polido e pele de vidro. Seria o “triunfo do superficial”, para o autor depois de 1830 a conexão entre imagem, estrutura e método da construção teria acabado; cabendo a necessidade de um maior entendimento das consequências da separação entre superfície e estrutura. A arquitetura estaria se tornando uma questão de aparências, influenciada pela fotografia e impressão em massa, a imagem teria ganhado um poder maior do que qualquer estrutura concreta, a superficialidade teria tornado o símbolo dos tempos atuais. O enorme apetite da mídia para o consumo de imagens arquitetônicas teria, como uma das consequências, a formação de uma história arquitetônica baseada em imagens e palavras impressas e não no próprio edifício. Assim como poderia a arquitetura manter um sentido e se distinguir de simples gráficos e imagens?
(Imagem 3)
Buscando dar uma direção para esta questão, o autor descreve seus seis conceitos: Tecnologias de “desfamiliarização”, O midiático choque metropolitano, Desestruturação, Sobreposição, O programa cruzado e o Momento de mudança (o evento). No primeiro conceito afirma que seria necessário tirar vantagem da condição de fragmentação e superficialidade através da “desfamiliarização”, assim se o desenho das janelas só reflete a superficialidade das decorações da fachada, dever-se-ia procurar uma maneira de fazer sem janelas, por exemplo. Assim se a sociedade está somente voltada para a mídia, fica mais evidente que a direção tomada pela tecnologia seria menos a dominação da natureza e sim o desenvolvimento da informação e da construção do mundo através de uma série de imagens. Então, parte para o segundo conceito, influenciado por Walter Benjamin, observa que em uma era de pura informação, a única coisa que conta é o “Choque”. A vida na metrópole gerou uma ansiedade em achar a si mesmo em um mundo marcado pela insignificância e gratuidade, a experiência dessa ansiedade seria a “desfamiliarização”, uma visão da cidade enquanto lugar de experimento. A arquitetura na megalópole estaria mais voltada a encontrar soluções não familiares, do que soluções calmas e confortantes, a fragmentação e o deslocamento poderiam ser vistos como um sinal positivo da vitalidade da cultura urbana. Então, o choque iria contra a nostalgia da permanência, seria o que ainda se tem para comunicar em tempos de informação generalizada. O autor conclui que o crescimento da superficialidade e das transformações também pode significar um enfraquecimento da arquitetura enquanto forma de dominação, poder e autoridade, como esta tem sido vista nos últimos seis mil anos.
Parte, então, para a desestruturação, o terceiro conceito, pois não caberia ao arquiteto questionar a estrutura? Comenta que raramente o arquiteto questiona seus fundamentos, o edifício do pensamento, questiona as imagens, mas não o aparato que geraria estas imagens. No quarto conceito, comenta como seria necessário confrontar oposições binárias, tais como, forma versus função e abstração versus figuração, e também suas hierarquias: “forma segue a função” e “o ornamento é subordinado à estrutura”. Assim a sobreposição tornar-se-ia um ponto chave, imagens complexas do simultâneo: “ambos” e “nem um nem outro”, atravessando fronteiras entre filmes, literatura e arquitetura. Haveria a necessidade de questionar constantemente a disciplina e as hierarquias, tornando o conceito uma ferramenta, mas sempre alerta que se não poderia perder o que difere o arquiteto de um filósofo: a materialidade, a lógica dos materiais, onde uma palavra não é um bloco de concreto (14).
Então, no quinto conceito, chega-se a alguma conclusão: a função não seguiria a forma, forma não seguiria a função – ou ficção– entretanto, elas certamente se interagem. Se o choque não pode mais ser produzido pela sucessão e justaposição de fachadas e salas, talvez possa ser produzido pelajustaposição de acontecimentos que ocorram nestes espaços por de trás das fachadas. Se a arquitetura é tanto conceito como experiência, espaço como uso, estrutura como imagem; então arquitetura para renovar-se deveria parar de separar essas categorias e, ao invés disso, uni-las em combinações sem hierarquia: “Programação Cruzada”.
Finalmente, conclui o sexto conceito: o momento de mudança. Assim, na procura do real prazer da arquitetura, da inesperada combinação de termos e dos estimulantes e inquietantes sentidos da vida urbana contemporânea, Tschumi afirma: não há arquitetura sem evento, como sem ação, sem atividades e sem funções. As combinações de acontecimentos e espaços estariam carregadas de capacidades subversivas, desafiando tanto a função quanto o espaço. O futuro da arquitetura encontrar-se-ia na construção de tais eventos e, principalmente, na espacialização que se relaciona com estes. O evento não seria uma origem ou um fim, não é a afirmação das certezas, é questionamento em terrenos múltiplos, fragmentados e deslocados. O autor insiste em uma arquitetura do evento que poderia “eventualizar” ou abrir aquilo que, na história ou tradição, seria entendido para ser fixo, essencial, monumental. Associar o evento com a noção de choque, o choque para ser efetivo na cultura midiatizada, na cultura de imagens. Faz-se nesse evento o lugar de choque, ou esse lugar da invenção de si mesmos. Por definição, esse é o lugar da combinação das diferenças.
Assim a arquitetura seria capaz de criar condições que iriam tornar possível essa sociedade não-hierárquica e não-tradicional. Entendendo a natureza das circunstâncias contemporâneas e o processo da mídia que as acompanha, seria importante organizar estrategicamente os eventos através da arquitetura. Intensificar a rica colisão de eventos e espaços seria o que as cidades teriam que obter e o que os arquitetos deveriam ajudá-las a alcançar. Tóquio e Nova Iorque só aparentariam ser caóticos, mas ao contrário marcariam o aparecimento de uma nova urbanidade. Suas confrontações e combinações de elementos poderiam proporcionar o evento e o choque.
Comparação necessária: uma prova dos 6
Não é difícil encontrar diferenças entre os textos e os pensamentos destes dois autores, como estes mesmos destacam, um defende uma retaguarda e outro uma vanguarda. Isso já os colocaria em posições opostas na batalha. Poderia dizer também que Frampton trabalha a partir de uma abordagem mais fenomenológica, encontrando aportes nas ideias de Heidegger (15) e na construção existencial do lugar e, pelo outro lado, que Tschumi possui inspirações pós-estruturalistas claras, com referências em autores como Derrida, questionando as oposições binárias da arquitetura e suas hierarquias. No entanto, uma importante diferença é percebida no entendimento de Frampton quanto à necessidade de resistir com fortes braçadas à correnteza, lutando pela preservação de aspectos da disciplina arquitetônica que não poderiam ser transformados ou perdidos, enquanto Tschumi acredita em ricas potencialidades neste cenário atual e, tentando não perder a crítica, usa as forças desta correnteza contra ela mesma, talvez até para surfar um pouco. Muito possivelmente as palavras pessimismo e otimismo não caibam aqui, mas ajudam a dar uma tonalidade sobre as posturas de ambos diante o mundo que se apresenta. Porém é sempre necessário refletir se otimista é aquele que acredita poder transformar o mundo que o desagrada ou o que percebe o mundo sempre como uma possibilidade.
Seria, então, possível também encontrar aproximações e semelhanças entre estes e quais seriam os desdobramentos das diferenças já conhecidas?
Uma primeira semelhança entre estes dois trabalhos estaria no espírito de reação a alguns acontecimentos da arquitetura nos anos 80, como por exemplo, a Bienal de Veneza de 1980. Estes seriam uma reação de oposição, segundo Frampton, ao impulso reacionário e irreal de voltar às formas arquitetônicas do passado pré-industrial, com o perigo de regressar ao historicismo nostálgico ou o abundante decorativismo, ou, segundo Tschumi, às citações cenográficas superficiais de uma sociedade pré-industrial, ligadas apenas a aparência da arquitetura, um entendimento ficcional que não questiona os seus fundamentos, como por exemplo, a estrutura e o evento.
Outro ponto importante que deve ser observado é que estes os autores partem de diagnósticos bastante parecidos do cenário contemporâneo, ambos abordam as transformações geradas pelos centros metropolitanos, da questão da imagem e pelo fenômeno da superficialidade das fachadas (16). É verdade que se aprofundando mais, estes diagnósticos podem mostrar-se menos semelhantes. Por exemplo, um ano depois, Frampton escreve que a megalópole universal seria claramente avessa a uma densa diferenciação cultural, para ele esta visaria reduzir o ambiente a pura mercadoria, pouco mais do que uma paisagem alucinatória (17). A mesma megalópole, para Tschumi, poderia ser um caminho para soluções para problemas desconfortáveis e não familiares, uma rica colisão de espaços e eventos.
Em relação à imagem, ambos detectam sua proliferação acelerada, Tschumi observa que a fotografia aumentou o poder da imagem sobre qualquer estrutura concreta, tornando cada vez mais presentes os tratamentos de superfície na arquitetura, Frampton, por sua vez, destaca o perigo do desaparecimento da experiência direta diante da informação e da imagem publicitária, como também sua relação com práticas demagógicas e populistas. Tratando deste aspecto torna-se importante refletir como o pensamento de Robert Venturi, em Complexidade e Contradição, é visto pelos dois autores. Tschumi encontra no trabalho deste autor um extraordinário princípio de reavaliação dos valores da arquitetura, enquanto Frampton aponta uma mensagem populista sobre comunicação na arquitetura (18), em outro ensaio de Frampton, este ressalta a importância de tratar o tema da tectônica como resposta ao triunfo generalizado do galpão decorado de Venturi, uma “[...] síndrome prevalente de empacotar o abrigo como uma mercadoria gigante” (19).
Sobre a superficialidade das fachadas na arquitetura contemporânea, os dois autores abordam a aproximação da arquitetura ao cenográfico. Nesta luta contra a tendência de redução da arquitetura à cenografia, contra a perspectiva de degeneração cultural, Frampton vê o tectônico como direção. Frampton desenvolve mais este raciocínio em outro texto posterior (20), onde defende uma base de resistência, um fundamento material, afirmando que a arquitetura deveria necessariamente expressar-se na forma estrutural e construtiva, voltar à unidade estrutural como essência irredutível da forma arquitetônica: manifestação de uma estrutura potencialmente poética. Pelo outro lado Tschumi acredita no fim da conexão entre estrutura, método e imagem.
Assim é possível encontrar aproximações mesmo que não de forma plena. No entanto, fica mais evidenciado para um deles uma percepção de perigos que exigiriam uma resistência para mudar direções já iniciadas, enquanto o outro enxergaria potencialidades nas transformações, talvez estas como um caminho irrevogável, tentando usá-las como ambiente para novas direções. Os dois autores partilham abordagens críticas e buscam a transformação através de um olhar de estranhamento sobre a realidade presente. Então cabe comentar um último ponto de aproximação entre estes, a dimensão crítica da “desfamiliarização”.
No trabalho de Frampton essa relação com a “desfamiliarização” não é tão evidente, é necessário recorrer ao trabalho de Tzonis e Lefaivre (21), os propositores do termo Regionalismo Crítico. Os autores afirmam que este regionalismo precisa se questionar e se julgar, que não enfrenta somente o mundo, mas também a si mesmo, e seria a desfamiliarização o meio pelo qual se realizaria a função autorreflexiva, aplicando o pensamento de Victor Shklovsky. Este entendimento é possível de ser encontrado em Frampton através de algumas palavras usadas como “desconstruir” e “não familiar”.Por outro lado, Tschumi se apóia no entendimento de choque de Walter Benjamin e no conceito de uncanny freudiano, seu entendimento de desfamiliarização deveria tomar vantagem do desmantelamento, celebrar a fragmentação enaltecendo a cultura das diferenças. Apesar dos diferentes entendimentos e embasamentos do conceito de desfamiliarização (22) é possível ver nos pensamentos de ambos uma necessidade processual da sensação de estranheza. Para Tschumi seria uma necessidade de estimular a experimentação diante da anestesia urbana, o perigo da imagem, enquanto Frampton pensa na redescoberta dos valores do lugar, em percepção atenta, cultural e sinestésica; onde há a necessidade da estranheza diante da cultura de massa.
A noção dos tempos
Uma reflexão importante quando se pensa sobre os dois caminhos sugeridos, e em seus possíveis cruzamentos, surge quando se pensa no sexto conceito de Tschumi. Nesta parte do texto o autor aborda o tema “evento”, conceito chave em seu trabalho e definido anteriormente no livro Manhattan Transcripts, em 1978-81. Neste outro livro, através de uma diferente leitura de arquitetura, o evento é entendido como um incidente, uma particularidade em um programa, incluindo momentos de paixão, atos de amor e o instante da morte (23). Através desta poética definição podem ser destacadas palavras como “instante” e “momento” (24), ambas se relacionam com o fator aqui considerado fundamental: o tempo.
Para uma compreensão maior das características do evento e suas relações com o tempo, recorre-se aos esclarecimentos de um geógrafo sobre a natureza do espaço, os ensinamentos de Milton Santos (25). O evento, para este autor, trata-se de um instante do tempo dando-se em um ponto do espaço, um elemento de atualidade que não se repete. Por isso, continuando o pensamento de Santos, a cada novo acontecer o preexistente transforma o seu conteúdo e também muda sua significação. Para o evento a repetição seria a exceção, o desvio, a anormalidade: um veículo das possibilidades. Estas pistas são importantes para entender as diferenças da percepção do tempo entre os dois artigos. Pode-se encontrar nas palavras de Tschumi um tempo acelerado, marcado pelas mudanças, com a persistente fragrância do instante (26). Pelo outro lado, o tempo de Frampton, apesar de descrever momentos riquíssimos de percepção tátil, parece vinculado com a continuidade, repetição, com um tempo longo e histórico. Santos também observa que os eventos dissolvem as identidades, propondo outras, mostrando que não são fixas, o que parece distante dos entendimentos de Frampton. Então cabe mais uma reflexão de Santos, a ideia de duração, pois se o evento é sempre presente não é obrigatoriamente instantâneo. Assim é importante estudar a percepção desta duração do tempo.
Existem muitos tempos dentro do tempo, e todos são passíveis de observação: coexistem. Como Ades salienta, o tempo não é uma dimensão fria, de pura constatação, trata-se de uma experimentação no decorrer de sua duração, cuja avaliação de sua estimativa depende de marcadores externos, como também de um grande fator de subjetividade (27). Aproximando-se mais desta pesquisa, e do entendimento da duração, é possível arriscar algumas relações, mesmo consciente das diferenças de características entre os objetos investigados aqui e o de Ades. Este entendimento da duração pode variar com a densidade ou a quantidade de acontecimentos, como também com os desejos e afetos, que “inflam e encolhem” o tempo. Quanto mais complexa a informação, maior a duração subjetiva. O que pode gerar uma reflexão sobre a relação absorvida de Tschumi com a atualidade, com o curto momento alongado, e com a percepção da complexidade embutida no tempo do agora. Por outro lado em Frampton se vê uma ritmicidade, que se cria para preencher e segmentar o tempo. Então, o tempo do momento não corresponde na totalidade às características do tempo histórico de séculos. Por fim é importante lembrar que, se é verdade que a percepção da duração decorre de uma construção psicológica, esta construção também não significa invento ou fantasia, é a própria maneira de se chegar a uma realidade que não vem pronta através dos sentidos.
Inconclusivo
A existência de tempos diferentes não é para ser vista como um relativismo alienante, e sim como um reconhecimento que permita colocar lado a lado ideias diferentes para tentarem um diálogo. Assim, apropriando-se das ideias de Ricoeur, contidas no trecho sempre citado por Frampton quando trata de Regionalismo Crítico, é preciso pensar o que acontecerá com nossa civilização quando ela de fato se encontrar com civilizações diferentes por outros meios que não o choque da conquista e da dominação, é necessário admitir que esse encontro ainda não se deu no plano de um diálogo autêntico (28).
Este diálogo exige o entendimento do outro e o reposicionamento em nova perspectiva, por exemplo, lembrar que nem tudo é a multifacetada metrópole, ou seu tempo acelerado, ao mesmo tempo em que estas existem e estão em crescimento, então reduzir tudo a estas é desaparecer as diferenças que poderão ser úteis no futuro. Também não se pode negar o papel dos eventos e suas potencialidades, do momento que se vive e das raízes do passado. Que a riqueza da realidade multifacetada e plural da época contemporânea fascine, parece bastante compreensível e importante, mas algo precisa ser continuado, mesmo que este algo traga em si o gene mutante da transformação. O caminho é necessário para continuar o percurso – reflexão e ação, “pense e dance”. É necessário não esquecer que existe uma dimensão cultural da arquitetura a prevalecer sobre a deterioração do consumo veloz e superficial.
O caminho não parece formado, a ansiedade por um substituto mais ou menos homogêneo como o estilo internacional também não parece ajudar, no entanto a reflexão necessária vai se construindo e não pode ser ignorada. Na tal cultura das diferenças, citada por Tschumi, a questão não parece estar em reconhecer as diferenças, e sim em estabelecer meios que estas convivam em verdadeiro diálogo e mantendo suas necessárias diferenças. Imperando a diferença reaparece a pergunta, então, seis é igual a seis?

Continue navegando