Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Introdução Com o aumento das doenças oncológicas há igualmente um aumento do risco de complicações intrínsecas a estas, como é o caso das feridas malignas, sendo imprescindível que os profissionais de saúde saibam atuar perante estas situações, uma vez que a abordagem a estas feridas difere em alguns aspetos da abordagem das restantes feridas crónicas. As feridas malignas são lesões fungoides que surgem quando ocorre a infiltração das células cancerígenas ao nível da epiderme, derme e tecidos adjacentes, podendo mesmo alcançar o sistema vascular e linfático, ulcerando, assim, a superfície do corpo (DEALEY, 2006). Estas feridas podem advir de um cancro primário, de uma metástase na pele de um tumor local ou de um tumor localizado num sítio distante (ROCHA et al., 2006). O termo “ferida maligna” não é consensual na literatura, encontrando-se outras nomenclaturas como “lesões tumorais”, “úlceras neoplásicas”, “ferida oncológica”, “ferida maligna fungoide”, entre outras. No entanto, qualquer que seja a terminologia, a sua definição é única, exata e universal, sendo então explicada como uma lesão cutânea crónica que deriva quer da infiltração, quer da erosão do epitélio cutâneo (epiderme, derme e hipoderme) pelas células cancerígenas, podendo atingir também os vasos sanguíneos e linfáticos (GROCOTT, 2009). Estas feridas tendem a ocorrer em pacientes com idades compreendidas entre os 60 e os 70 anos, com metástases e que se encontram numa fase terminal da doença, com especial incidência nos últimos 6 a 12 meses de vida (HAISFIELD-WOLFE & RUND, 2002). Além disso, há que referir que estas feridas apresentam, na esmagadora maioria das vezes, um mau prognóstico, sem qualquer potencial de cicatrização, uma vez que se verifica um mau aporte sanguíneo,com consequente morte celular e manutenção constante da fase inflamatória (NAYLOR, 2002 (a)) (ALEXANDER, 2010). Verifica-se que os profissionais de saúde não estão devidamente familiarizados com esta área, havendo, ainda, alguma falta de informação quanto às caraterísticas da ferida, implicações da mesma no bem-estar do doente e sobre os cuidados a prestar. Deste modo é essencial que esta temática seja melhor abordada e investigada, de forma a otimizar o controlo de queixas físicas e/ou psicológicas e, por conseguinte, melhorar a qualidade de vida destes utentes (GROCOTT et al., 2005). Embora haja escassez de dados sobre a prevalência de feridas malignas, THEIRS (1986) cit. HAISFIELD – WOLFE (2002) e MAIDA et al. (2009 (a)) estima que cerca de 5 – 14.8% das pessoas com cancro desenvolvem feridas malignas, o que associam, em parte, a um descuido do próprio utente no que toca à procura atempada de cuidados médicos e de enfermagem. Assim sendo, torna-se imprescindível a colaboração de todos os membros da equipa de saúde para que sejam traçadas linhas gerais de orientação, que foquem a deteção precoce e a redução de danos (ROCHA et al., 2006). Em resumo As feridas malignas são formadas pela infiltração das células malignas do tumor nas estruturas da pele. http://www.instagram.com/soenfermagem Estimativa do câncer Fisiopatologia O processo de formação de uma ferida maligna decorre em três eventos essenciais: Crescimento do tumor – leva ao rompimento da pele. Neovascularização – provimento de substratos para o crescimento tumoral. Invasão da membrana basal das células saudáveis – há processo de crescimento expansivo da ferida sobre a superfície acometida. Com o crescimento anormal e desorganizado, tem-se a formação, no sítio da ferida, de verdadeiros agregados de massa tumoral necrótica, onde ocorrerá contaminação por microorganismos aeróbicos (por exemplo: Pseudomonas aeruginosa e Staphylococcus aureus) e anaeróbicos (bacteroides). O produto final do metabolismo desses microorganismos são os ácidos graxos voláteis (ácido acético, caproico), além dos gases putrescina e cadaverina, que provocam odor fétido às feridas malignas. Nas feridas malignas, a fase inflamatória está continuamente a ser reiniciada, devido à presença das células cancerígenas que são reconhecidas como corpos estranhos (SHEPERD, 2003 e DRAPER, 2005 cit. LLOYD, 2008). O prolongamento desta fase aumenta a atividade extracelular, o que torna os capilares mais permeáveis, havendo saída de exsudado seroso e libertação de histaminas que são responsáveis pelo prurido na pele circundante (SHEPERD, 2003 e DRAPER, 2005 cit. LLOYD, 2008). Além disso, as feridas malignas têm uma larga deficiência de contração tecidular, o que também dificulta a cicatrização das mesmas (GOMES & CAMARGO, 2004). Essa deficiência deve-se à baixa produção de fibroblastos, consequência direta do défice nutricional que os doentes oncológicos geralmente apresentam (GOMES & CAMARGO, 2004). Regra geral, a menos que o tumor esteja controlado por tratamentos anticancerígenos isolados ou combinados, a ferida continua a desenvolver-se, podendo causar destruição maciça (GROCOTT, 2001). Classificação As feridas malignas podem ser classificadas quanto origem, podendo ser primárias (quando se origina no local do tumor primário), metastáticas (se tem origem no local da metástase) ou recorrentes (quando após a cicatrização há o surgimento de uma nova lesão no mesmo local); quanto ao aspecto, grau de odor e estadiamento (CAMARÃO, 2009). Classificação quanto ao aspecto Feridas ulcerativas malignas: Quando estão ulceradas e formam crateras rasas Feridas fungosas malignas (ou feridas vegetantes malignas): Quando são semelhantes à couve-flor Feridas fungosas malignas ulceradas: União do aspecto vegetativo e partes ulceradas Classificação da ferida quanto ao estadiamento No que concerne ao estadiamento, a classificação das feridas malignas foi proposta por HAISFIELD-WOLFE & BAXENDALE-COX em 1999, tendo elaborado um estadiamento classificatório com base no adotado universalmente para a classificação das úlceras por pressão (KEMP, 1999). Desta forma, estas feridas podem ser descritas em termos de estadiamento do seguinte modo: Estadiamento 1 Pele íntegra. Tecido de coloração avermelhada ou violácea. Nódulo visível e delimitado. Assintomático Estadiamento 1N Ferida fechada ou com abertura superficial por orifício de drenagem de exsudato límpido, de coloração amarelada ou de aspecto purulento. Tecido avermelhado ou violáceo, ferida seca ou úmida. Dor ou prurido ocasionais. Sem odor. Estadiamento 2 Ferida aberta envolvendo derme e epiderme. Ulcerações superficiais. Por vezes, friáveis e sensíveis à manipulação. Exsudato ausente ou em pouca quantidade (lesões secas ou úmidas). Intenso processo inflamatório ao redor da ferida. Dor e odor ocasionais. Estadiamento 3 Ferida espessa envolvendo o tecido subcutâneo. Profundidade regular, com saliência e formação irregular. Características: friável, ulcerada ou vegetativa, podendo apresentar tecido necrótico liquefeito ou sólido e aderido, odor fétido, exsudato. Lesões satélites em risco de ruptura. Tecido de coloração avermelhada ou violácea, porém o leito da ferida encontra-se predominantemente de coloração amarelada. Estadiamento 4 Ferida invadindo profundas estruturas anatômicas. Profundidade expressiva. Por vezes, não se visualiza seu limite. Em alguns casos, com exsudato abundante, odor fétido e dor. Tecido de coloração avermelhada ou violácea, porém o leito da ferida encontra-se predominantemente de coloração amarelada. Classificação quanto ao grau do odor Para COLLIER (1997) cit. EDWARDS (2000), uma ferida com odor é aquela que tem um cheiro ofensivo quer para o paciente, quer para o cuidador ou para ambos. Este é usualmente descrito como sendo o sintoma mais angustiante e o que causa maior estigma social (ALEXANDER, 2009 (a)) (LO et al.,2008), principalmente porque o odor fica nas roupas, bem como na casa, alimentando, assim, o medo de que os outros possam sentir o cheiro da ferida (HAUGHTON & YOUNG, 1995 cit. EDWARDS, 2000). O odor pode, assim, alterar a capacidade de socialização e de cooperação do paciente, sendo este invadido por sentimentos de depressão, angústia, tristeza (NAZARKO, 2006) (LLOYD, 2008), além de implicar uma lembrança constante da presença da ferida e do cancro (WATRET, 2010). LAWTON (2000) cit. PROBST et al. (2013) corrobora esta perspetiva, afirmando que o cheiro cria uma fronteira em redor do paciente, repelindo as pessoas que o rodeiam. O odor nas feridas malignas é um sintoma extremamente limitante na vida do doente (ROCHA et al., 2006), pelo que a eliminação ou redução do mesmo é fundamental para a promoção da qualidade de vida destes pacientes e para a melhoria/ aumento da sua autoestima (GROCOTT, 2000; HOLLOWAY, 2004 cit. LLOYD, 2008). Odor grau I : Sentido ao abrir o cu rat ivo; Odor grau I: Sentido ao abrir o curativo; Odor grau II: Sentido ao se aproximar do paciente, sem abrir o curativo; Odor grau III: Sentido no ambiente, sem abrir o curativo. É caracteristicamente forte e/ou nauseante. Cuidados com as feridas malignas Saber o comportamento da célula tumoral frente a um produto cicatrizante é um fato inexplorado, mas intrigante à luz dos princípios da carcinogênese. Observa-se, na prática, que os pacientes portadores destas feridas, sob tratamento pela radioterapia e quimioterapia, têm considerável resposta à redução e involução do processo desfigurante que elas ocasionam, fato que fala a favor da utilização de produtos cicatrizantes. Mas, considerando que a recidiva do tumor pode ser consequência de uma única célula alterada, questiona-se o uso dos produtos cicatrizantes, visto que eles induzem a divisão celular para fins de reparação tecidual. Os pacientes excluídos da fase de tratamento curativo, à medida que o quadro clínico se agrava, caminham para o aumento progressivo da ferida neoplásica, onde o tecido necrótico se prolifera e o uso dos antissépticos, considerados citotóxicos para o tecido de granulação, passa a ser útil porque a cicatrização não é a meta. O objetivo é alcançar o controle da secreção e do odor, sangramento, dor e prurido, e a meta é o curativo confortável, funcional e estético. O controle do odor e da secreção requer limpeza criteriosa e cuidadosa, com o uso de soluções antissépticas. No consenso entre toxicidade e efetividade, proteger a pele e as bordas da ferida tumoral com pomada à base de óxido de zinco tem sido técnica recomendada. Na prática vivenciada, esta ação mostrou-se efetiva também como técnica de analgesia, uma vez que os pacientes que dela se utilizaram referiram sentir menos dor ao redor da ferida. Papel da enfermagem no cuidado paliativo Como profissional integrante de equipe multi e interdisciplinar, o enfermeiro, no campo dos Cuidados Paliativos, tem atribuições específicas: Realizar a Sistematização da Assistência em Enfermagem (SAE) priorizando os diagnósticos de enfermagem relacionados à melhoria da qualidade de vida; Prestar consultas de enfermagem em cada retorno do paciente ao ambulatório, preferencialmente antes da consulta médica, seguindo os protocolos normatizados; Orientar o paciente e familiares quanto ao uso de medicamentos (ação, dosagem e efeitos colaterais) e eventuais procedimentos a serem realizados em domicílio; Conscientizar o paciente e/ou cuidador quanto à importância de desenvolver o autocuidado; Supervisionar e controlar a administração de drogas prescritas; Realizar procedimentos como: troca de Sonda Nasogástrica (SNG), Sonda Nasoenteral (SNE), Sonda Vesical de Demora (SVD), cateterismo intermitente e curativos, sempre que necessário; Auxiliar na consulta ou em procedimentos médicos, como: analgesia epidural ou controle de bombas internas. Intervenções de enfermagem avaliação da ferida e das necessidades do paciente Avaliar a ferida quanto a: - Localização. - Tamanho. - Configuração. - Área de envolvimento. - Cor. - Extensão (fístula ao redor). - Odor. - Exsudato. - Sangramento. - Dor. - Prurido. - Descamação. - Sinais de infecção - Acometimento ou invasão de órgãos e sistemas. Avaliar a progressão ou mudança na ferida. Definir os produtos necessários/apropriados para a ferida. Identificar as necessidades educacionais do paciente/cuidador quanto aos cuidados com a ferida após a alta. Encaminhar o paciente à Psicologia/Serviço Social de maneira apropriada. Cuidados durante o curativo da ferida maligna Cuidados básicos Limpar a ferida para remoção superficial de bactérias e debris. Conter/absorver exsudato. Eliminar o espaço morto (preenchê-lo com curativo). Eliminar a adesão de gaze às bordas/superfície da ferida. Manter úmido o leito da ferida. Promover os curativos simétricos com a aparência do paciente. Empregar técnica cautelosa visando à analgesia. Retirar as gazes anteriores com irrigação abundante. Irrigar o leito da ferida com jato de seringa 20 ml/agulha 40x12 mm. Proteger o curativo com saco plástico durante o banho de aspersão e abri-lo para troca somente no leito (evitando a dispersão de exsudato e micro-organismos no ambiente). Cuidados específicos Controle da dor Monitorar o nível de dor pela Escala Visual Analógica (EVA). Considerar o uso de gelo, medicação analgésica resgate/SOS (conforme a prescrição). Iniciar o curativo após 30 minutos para analgesia via oral, 5 minutos para analgesia subcutânea ou endovenosa, e início imediato para a via tópica. Retirar os adesivos cuidadosamente. Adequar o horário de troca de curativos após o paciente já estar medicado. Avaliar a necessidade de analgesia tópica com lidocaína gel a 2% (aplicar sobre a ferida tumoral e ao redor, cobrindo cerca de 2 cm de tecido saudável). Empregar técnica cautelosa, evitar friccionar o leito da ferida. Irrigar o leito da ferida com água destilada ou soro fisiológico 0,9% e aplicar óxido de zinco (pomada) nas bordas e ao redor da ferida (a camada de pomada age evitando o contato direto entre a pele do paciente e o exsudato, o que causa desconforto, por vezes, referido pelo paciente como sensação de dor em queimação ou ardência). Observar a necessidade de analgesia após a realização do curativo. Reavaliar a necessidade de alteração do esquema analgésico prescrito. Considerar a necessidade, junto à equipe médica, de anti-inflamatórios, radioterapia antiálgica ou cirurgia. Registrar a avaliação da dor pela EVA e a analgesia empregada antes e após o curativo. Comunicar à equipe médica os casos de sofrimento álgico que fogem ao controle da conduta preconizada. Controle de exsudato O controle do exsudado é importante por vários fatores, incluindo a diminuição do odor, a proteção da pele circundante, o aumento do conforto e da autoestima (HALLET, 1993 e SAUNDERS, 1997 cit. POLETTI et al., 2002). Assim, é importante controlar o exsudado e utilizar curativos que facilitem o mínimo de mudanças possível, para que as perturbações causadas ao paciente sejam mínimas (PUDNER, 1998). O curativo adequado deve ser capaz de absorver grandes quantidades de exsudado sem provocar trauma à pele circundante; ser capaz de reduzir o odor; manter, tanto quanto possível, a simetria do corpo; estar disponível em tamanhos grandes o suficiente para usar em feridas malignas grandes e com forma irregular; manter um meio úmido equilibrado; reduzir a dor durante e entre as trocas de curativos e manter os órgãosdos sentidos livres . A aplicação de um desbridante enzimático ou autolítico pode resultar na diminuição da quantidade de exsudado (NAYLOR, 2003 cit. GOMES & CAMARGO, 2004). Curativos absortivos: carvão ativado/alginato de cálcio e compressa/gaze como cobertura secundária. Atentar para a proteção da pele ao redor (empregar óxido de zinco na pele macerada e nas bordas da ferida antes da utilização de antissépticos). Avaliar os benefícios de coleta de material para cultura (aspirado ou em swab). Controle do prurido Investigar a causa do prurido. Uso de adesivos: considerar a utilização de adesivos hipoalergênicos. Utilizar dexametasona creme a 0,1% nas áreas com prurido. Exsudato: considerar a redução do intervalo de realização dos curativos. Utilizar dexametasona creme a 0,1% nas áreas com prurido. Relacionado à própria ferida tumoral: utilizar dexametasona creme a 0,1% nas áreas com prurido e em caso de persistência do sintoma, considerar com a equipe médica a introdução de terapia sistêmica. Candidíase cutânea: à inspeção, notam-se áreas de hiperemia ao redor da ferida associada a pápulas esbranquiçadas. Utilizar sulfadiazina de prata a 1%. Abordagem da necrose Avaliar as necessidades de desbridamento, de acordo com a capacidade funcional do paciente. Eleger forma de desbridamento (mecânico, químico, autolítico). Abordagem das fístulas cutâneas Aplicar óxido de zinco na pele ao redor da fístula. Adaptar, quando possível, uso de bolsas coletoras nas fístulas de alta drenagem, com placas de hidrocoloide ao redor da pele. Realizar curativo absortivo com carvão ativado e/ou alginato de cálcio, com compressa/gaze como cobertura secundária. Abordagem dos sintomas Quanto a abordagem dos sintomas, os pacientes devem ser referenciados à equipe de cuidados paliativos, se assim for necessário, pois esta é constituída por peritos no controle dos sintomas (GROCOTT, 2007). As medidas de controle de sintomas são, tanto sistémicas como locais (GROCOTT, 2007). O objetivo das boas práticas consiste em aumentar o tempo de progressão da doença ou em alcançar a melhor qualidade de vida para o paciente através do alívio dos sintomas físicos (ADDERLEY & SMITH, 2007) e pelo suporte psicossocial. Abordagem do sangramento Aplicar pressão diretamente sobre os vasos sangrantes com amparo de gaze, compressa ou toalha (evitar a cor branca). Considerar aplicação de soro fisiológico a 0,9% gelado; curativo hemostático à base de gelatina suína; alginato de cálcio; adrenalina (solução injetável) topicamente sobre os pontos sangrantes. Manter o meio úmido evitando aderência de gaze no sítio da ferida. Verificar, junto à equipe médica, a possibilidade de tratamento com: - Coagulante sistêmico como o ácido aminocaproico. - Intervenção cirúrgica. - Radioterapia anti-hemorrágica. - Sedação paliativa para os casos de sangramento intenso acompanhado de agitação, desespero e angústia do paciente Controle do odor Lesões cutâneas Odor grau I: Proceder a limpeza com soro fisiológico a 0,9% + antissepsia com clorexidina degermante; Retirar antisséptico com jato de soro fisiológico a 0,9% e manter gazes embebidas em hidróxido de alumínio no leito da ferida; Outras opções: sulfadiazina d e prata e/ou carvão ativado envolto em gaze umedecida com soro fisiológico a 0,9%. Ocluir com gaze embebida em vaselina líquida. Se as medidas acima forem ineficazes, considerar o uso de metronidazol tópico (gel a 0,8%). Odor grau II: Proceder a limpeza da ferida + antissepsia conforme descrito acima; Aplicar gel de metronidazol a 0,8% em gaze embebida em vaselina e aplicar no leito da ferida. Se hou ver necessidade, fazer escarotomia em tecido necrótico endurecido e aplicar gel de metronidazol. Odor grau III: Considerar emergência dermatológica. Seguir passos acima e considerar, junto à equipe médica, a possibilidade de associação do metronidazol sistêmico (endovenoso ou via oral) ao uso tópico. Lesões cavitárias (a partir de odor grau II) Cavidade oral – orientar e/ou realizar higiene oral com solução 5 ml de gel de metronidazol a 0,8% diluído em 50 ml de água filtrada. Usar, pelo menos, duas vezes ao dia, durante dez dias. Fístula cutânea – injetar, com auxílio de uma seringa com bico, 5 ml ou mais (conforme avaliação) de gel de metronidazol a 0,8% no orifício da fístula. Caso essa fístula apresente volume Tratamento e Controle de Feridas Tumorais e Úlceras por Pressão no Câncer Avançado 19 de drenagem prejudicial à área perifistular, deverá ser delimitada com dispositivo protetor. Usar duas vezes ao dia, por dez dias e reavaliar. Vaginal – introduzir o aplicador vaginal ou sonda foley nº 16 (quando houver estreitamento do canal), com creme vaginal de metronidazol a 10%. Usar duas vezes ao dia, durante dez dias e reavaliar. Canal anal – introduzir sonda retal ou foley nº 16 (quando houver estreitamento do canal), com creme vaginal de metronidazol a 10%. Usar duas vezes ao dia, durante dez dias e reavaliar. Sintomas psicológicos causados pela ferida maligna Os sintomas físicos, usualmente, são mais valorizados, descurando-se, na maior parte das vezes, os aspetos psicológicos, sociais, espirituais e culturais que advêm de uma ferida maligna (NAYLOR et al., 2001), pelo que a natureza multidimensional da ferida deve ser tida em conta aquando da avaliação (ALEXANDER, 2009 (a)). Ao haver penetração da pele pelo tumor, os sinais de malignidade tornam-se visíveis, pelo que viver com uma ferida maligna é uma experiência aterradora (MERZ et al., 2011). Parafraseando MURPHY (2006) cit. ALEXANDER (2009 (a), p. 327) “Podemos começar a imaginar como se deve sentir um paciente ao ver parte do seu corpo decompor-se e ter de viver com o cheiro ofensivo da ferida, ver a reação das suas visitas (incluindo médicos e enfermeiros) e saber que significa morte prolongada”. Este desafio da doença pode levar a uma panóplia de emoções, incluindo repugnância por si mesmo e vergonha do parceiro, família e/ ou profissionais de saúde (MERZ et al., 2011). A informação existente sobre a experiência de viver com uma ferida maligna é escassa, sendo a maior parte do conhecimento dado pelos profissionais e não pelos pacientes (ALEXANDER, 2009 (a)). Esta escassez de informação é preocupante, no sentido em que para muitos pacientes não é a ferida que é a causadora de grande parte da preocupação, mas sim os assuntos psicossociais a ela associados e o consequente impacto na sua qualidade de vida. Viver com uma ferida maligna causa angústia psicológica ao induzir isolamento social; alteração da imagem corporal estigma; assuntos existenciais associados com a aproximação da morte e com a procura de um significado para a vida; alteração dos relacionamentos e perda da personalidade (PIGGIN & JONES, 2007) (ALEXANDER, 2009 (a)). Estes sentimentos geralmente são agravados em pessoas que têm feridas malignas localizadas em zonas visíveis como a cabeça e pescoço ou em regiões íntimas, como a mama e períneo (GROCOTT, 1999 e BIRD, 2000 cit. ALEXANDER, 2009 (a)) (PUDNER, 1998) (NAYLOR et al., 2001) (WATRET, 2010). Caso clínico Paciente de 49 anos, do sexo feminino, vive com a cunhada e é doméstica, encontrando- se afastada, por questões de saúde. Apresenta um tumor primário, diagnosticado em 2015 como sendo um adenocarcinoma da vulva, tendo como comorbilidades/ fatores de risco poliartralgias e diabetes mellitus tipo II. No que concerne ao Índice de Karnofsky, o valor a ela associado é o 10, ou seja, doente moribundo, fato que levou a que a doente não conseguisse preencher a segunda parte do questionário referenteà qualidade de vida. Atualmente, como indicativo pelo Índice de Karnosfsky, encontra-se numa fase paliativa, tendo feito anteriormente quimioterapia e imunoterapia e é seguida por uma equipa multidisciplinar constituída pelo médico, enfermeiros, assistente social, nutricionista e capelão. Relativamente à ferida, esta surgiu a 08 de abril de 2016, localizando-se ao nível da região inguinal direita, vulva e região supra-púbica. É uma ferida ulcerativa, exofítica e não mensurável, que contêm tecido necrótico/ desvitalizado, exsudado abundante, presença de infeção, risco de hemorragia espontânea, prurido e com uma escala de odor de 4 em 4 (odor é sentido na sala, quarto e enfermaria). A pele circundante apresenta-se hiperemiada, macerada e com nódulos. A doente classifica a sua dor, segundo a escala visual analógica, com um valor de 3 durante o dia e de 10 durante o tratamento, sendo a terapêutica analgésica/ adjuvante por via sistémica. O prestador de cuidados habitual, incluindo à ferida, é a família. No entanto, e por se encontrar internada, quem presta cuidados, atualmente, são os enfermeiros. O tratamento tem a duração de 10 minutos, sendo realizado duas vezes por dia com hidrofibra e carvão ativado. Bibliografia Camargo TC, Gomes IP. Feridas Tumorais e Cuidado de enfermagem: buscando evidências para o controle de sintomas. R Enferm UERJ. 2004;12:211-6. Tulli ACP, Pinheiro CSC, Teixeira SZ. Dor Oncológica: os cuidados de enfermagem. Revista da Sociedade Brasileira de Cancerologia. 2005;4(5):123-35. Bauer C, Gerlach M, Doughty D. Care Of Metastatic Skin Lesions. J Wocn. 2000;27:247-51. Upright Ca, Salton C, Roberts F, et al. Evaluation Of Mesalt Dressing And Continuous Wet Saline Dressings In Ulcerating Metastatic Skin Lesions. Cancer Nursing. 1994;17(2):149-55. Firmino F, Araújo DF, Sobreiro V. O controle da odor em feridas tumorais através do uso do metronidazol. Prática Hospitalar. 2002;4(24):30-3. BRASIL. Ministério d a Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Tratamento e Controle de Feridas Tumorais e Úlceras por Pressão no Câncer Avançado (Série Cuidados Paliativos). Rio de Janeiro: INCA, 2009. 44p. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Cuidados Paliativos Oncológicos: controle da dor (Série M anuais Técnicos, n. 328). Rio de Janeiro: INCA, 2002. 120p. FIRMINO, F. Pacientes portadores de feridas neoplásicas em Serviços de Cuidados Paliativos: contribuições para a elaboração de protocolos de intervenções de enfermagem. Revista Brasileira de Cancerologia, v. 51, n. 4, p. 347-359, 2005. EITE, A. Feridas tumorais: cuidados de enfermagem. R ev. Científica do Hospital Central do Exército do Rio de Janeiro. 2007; 2(2):36-40. ADDERLEY, Una J., SMITH, Ruth – Topical agents and dressings for fungating wounds. Cochrane Database of Systematic Reviews. ISSN 0882‐2863. Vol. 18, nº. 2 (2007) p. 1 – 22. AGREDA, J. Javier Soldevilla – Cuidados Paliativos en Enfermería: Cuidados de Las Heridas Neoplásicas Y Manejo Del Linfedema. 1ª ed. Espanha: Sociedad Vasca de Cuidados Paliativos, 2003. ISBN 84-930967-9-2. P. 107 – 122. ALVAREZ, Oscar M., et al. – Incorporating Wound Healing Strategies to Improve Palliation (Symptom Management) in Patients with Chronic Wounds. Journal of Palliative Medicine. ISSN 0882‐2863. Vol 10, nº. 5 (2007) p. 1161, 1171 - 1189. EORTC – EORTC QLQ-C30 Scoring Manual. 3 rd ed. Brussels: 2001. ISBN 2- 9300 64-22-6. FORJAZ, Gonçalo – Incidência do Cancro na Região Autónoma dos Açores: 1997- 2006. Angra do Heroísmo: RORA, 2011 p.5 - 36. FORTIN, Marie-Fabienne – O Processo de Investigação: Da concepção à realização. Loures: Lusociência, 1999. ISBN 972 8383-10-X.
Compartilhar