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OLIVEIRA, Carlos Eduardo de. Filosofia Política e Idade Média: Conhecimento, vontade e bem comum como fundamentos da política medieval. In: RAMOS, Flamarion Caldeira; MELO, Rúrion; FRATESCHI, Yara. Manual de Filosofia Política: Para os cursos de Teoria do Estado & Ciência Política, Filosofia e Ciências Sociais. 3 Ed. São Paulo: Saraiva, 2017. “Não parece, porém, que Agostinho tenha pensado que a razão se sobreponha à fé ou vice-versa. Antes, temos ali a proposta de uma relação convergente (NOVAES FILHO, 2009): para que tenha fé, o homem precisa da razão, ao mesmo tempo que, quanto àquilo que ainda não pode compreender, o homem precisa da fé “que purifica o coração (isto é, a mente) para que abarque e sustente a luz da suprema razão”, que é a razão divina. Assim, longe de ser vista como algo irracional, a fé é antes entendida como a possibilidade de amadurecimento e realização integral da razão. Fé e razão se complementam. ” (p. 38) Agostinho aplicou estudos de como conciliar fé e razão, visto que à época e até mesmo nos dias atuais, fé e razão parecem não andar juntas. Para ele, era através da razão que o indivíduo conseguiria compreender grande parte das escrituras sagradas, mas, o conhecimento total só viria por intermédio da “luz divina”, por isso faz-se necessário que fé e razão andem lado a lado. “Agostinho vê-se capaz de preparar o primeiro grande passo de sua argumentação: todo esse percurso que leva da “contemplação da criação” a certo “conhecimento de Deus”, que percebe a importância da operação conjunta da fé e da razão para o conhecimento da verdade (...)” (p. 39) O entendimento da filosofia de Agostinho é imprescindível para os dias atuais, pois muitas pessoas ainda insistem em associar religião à ignorância, mas Agostinho mostrou através de sua filosofia que esse estereótipo é equivocado: fé e razão convergem. Outrossim, o estigma e preconceito de que filósofos são ateus, isto é, não podem ter fé, é errado segundo as concepções de Agostinho. Nesse pensar, cientistas podem ser cristãos, e o fato de serem cientistas não questiona a sua própria fé. “Mas, continua Agostinho, se onde não há justiça não pode haver direito, e onde não há direito não pode haver povo, e se onde não há povo não pode haver república, a justiça nada mais é para Cícero do que “aquela virtude que distribui a cada um o que é seu” (AGOSTINHO, 2001, p. 412). Ora, se justiça é distribuir a cada um o que é seu, tudo o que afasta o homem do Deus verdadeiro e o submete a demônios impuros é injustiça”. (p. 44) Embora Agostinho tivesse grande influência da igreja, há uma grande singularidade no pensamento dele em não negar a razão e nem dizer que a fé se sobrepõe a razão. Desse modo, os argumentos de Agostinho sempre convergem para conciliar fé e razão, como tratado no trecho, ele define o que é justiça de forma objetiva (razão) e o antônimo de justiça de forma subjetiva (fé). STRAUSS, Leo; CROPSEY, Joseph. História da Filosofia Política. 1 Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. “A mesma diferença crucial acarretava a consequência de que a sociedade crista, e só ela era governada por dois poderes distintos e dois códigos legais distintos, um eclesiástico ou canônico e outro civil, cada um com sua própria esfera de competência e, em princípio, cada um usufruindo relativa liberdade de interferência por parte do outro. Ao primeiro, cabia a tareia de orientar os homens para o seu fim sobrenatural; ao segundo, o de direciona-los para o seu fim terreno ou temporal. Como resultado, era possível, em geral, estudar os fenômenos políticos apenas a luz da razão, sem direta contestação da autoridade religiosa estabelecida e sem correr o risco de um confronto aberto com ela.” (p.227 e 228) Segundo Tomás de Aquino, nem todas as verdades eram alcançadas por intermédio do divino, essa chamou de “verdades naturais” que eram alcançadas através da razão. E denominou “verdades da fé” as verdades que só poderiam ser obtidas por meio da divindade, ou seja, pela fé. Além de afirmar que a razão foi feita por Deus, fé e razão são por definição, conceitos que alcançam a verdade. “Longe de destruir a natureza, a graça divina a pressupõe e aperfeiçoa, alçando-a para um fim que e mais elevado do que qualquer outro a que poderia aspirar pelos seus próprios meios. Por conseguinte, entre as verdades da Revelação e o conhecimento adquirido pelo uso exclusivo da razão e da experiência, há uma distinção, mas não pode haver discordância fundamental. A harmonia preestabelecida entre as duas ordens se fundamenta teoricamente no pressuposto de que Deus, o revelador da verdade divina, e também o autor da natureza. ” (p.229) Nesse trecho, percebe-se a presença da influência aristotélica na filosofia de Tomás de Aquino. Posto que Aristóteles escreveu que tudo que se move é movido por algo anterior, seguindo a lógica deve haver o primeiro motor. E para Tomás de Aquino o primeiro motor foi Deus e, por conseguinte todo o restante veio dele. “Qualquer discrepância entre a Bíblia e os ensinamentos dos filósofos remonta a imperfeição da mente humana, que ou interpretou incorretamente o que e dado pela Revelação ou errou em sua busca pela verdade natural. A alma humana e a mais fraca das substancias intelectuais. Todos os conhecimentos do homem se originam com os sentidos e são obtidos por abstração das coisas sensíveis.” (p. 229) Nos dias de hoje, conciliar religião e ciência é um trabalho árduo, pois muitos os consideram antagônicos. No entanto, a filosofia de Tomás de Aquino demonstra que há convergência entre fé e razão, e não é necessário distinguir ciência e religião, mas na verdade conciliá-las, a razão nesse sentido, seria uma maneira de tentar compreender a fé. “O bem comum e a finalidade da autoridade política são, em primeira instancia, a paz ou a harmonia das diferentes partes que se combinam para formar a cidade. A paz existe quando cada parte e ajustada ao todo e funciona com razoável tranquilidade dentro dele. Mas esta unidade fundamental, juntamente com a capacidade de neutralizar as forças que ameaçam destrui-la, representa apenas a condição mínima em que a cidade e capaz de subsistir. ” (p. 242) O entendimento de política por Aquino pressupõe que o estado deve existir, mas que ele não é superior à religião, mas sim subordinado. Pois para ele, a igreja visa o bem das pessoas. Essa era a concepção na qual Tomás de Aquino estava situado, pois na idade média o poder dominante era o da igreja, e sua filosofia legitimava este poder.