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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC-SP 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rubens Carmo Elias Filho 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO E AS RESTRIÇÕES AOS DIREITOS DOS 
CONDÔMINOS DELA DECORRENTES 
 
 
 
 
 
 
 
 
DOUTORADO EM DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC-SP 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rubens Carmo Elias Filho 
 
 
 
 
 
 
 
 
A CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO E AS RESTRIÇÕES AOS DIREITOS DOS 
CONDÔMINOS DELA DECORRENTES 
 
 
 
 
DOUTORADO EM DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
Tese apresentada à Banca Examinadora, como 
exigência parcial para a obtenção do título de 
Doutor em Direito (Direito Civil), pela 
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 
sob a orientação do Professor Doutor João 
Batista Lopes. 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
 
2012 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Banca Examinadora 
 
_________________________ 
_________________________ 
_________________________ 
_________________________ 
_________________________ 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Às minhas princesas, Maria Luísa e Maria Beatriz; 
à Cris, minha esposa, nossa rainha, minha parceira, meu apoio e 
incentivo; 
a meus pais, minha inspiração constante; 
às minhas irmãs, pelo carinho e apoio; 
a meus sogros, pela compreensão; 
aos meus queridos sobrinhos, pela alegria do convívio e do 
aprender; 
aos amigos e meus sócios, pela confiança e compreensão; 
 
à Profª. Regina Toledo Damião que tanto torce por mim. 
 
Ao saudoso Dr. J. Nascimento Franco, insigne condominialista, 
que tanto me ensinou, cuja presença tanta falta faz; 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ao meu estimado orientador, Prof. João Batista Lopes, cujas 
sugestões e incentivo foram indispensáveis à conclusão do 
presente estudo. Muito obrigado pela oportunidade, presteza, e 
por toda atenção a mim dispensada. 
 
Aos prezados Profs. Rosa Maria de Andrade Nery e Gilberto 
Haddad Jabur, pela alta contribuição por ocasião do exame de 
qualificação, cujas pertinentes críticas construíram um trabalho 
mais acurado. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
 
O estudo da Convenção de Condomínio e das restrições aos direitos dos 
condôminos, que dela decorrem, teve como objetivo avaliar qual a fundamentação jurídica 
para as restrições que impõem obrigações de fazer e não fazer capazes de alterar 
significativamente o exercício tradicional do direito de propriedade, especificamente no 
regime do condomínio voluntário e edilício. 
 
Tais restrições, no condomínio, decorrentes de diferentes parâmetros de uso e 
fruição, e regras de conduta delimitadoras do direito de propriedade, muitas vezes, são 
questionadas quanto ao critério de validade à luz da Constituição Federal, sob o 
fundamento de que o direito de propriedade constitui direito fundamental. 
 
Acontece que muitas das restrições desenvolvidas ao longo do trabalho, bastante 
polêmicas, mas corriqueiras, decorrem de necessidades condominiais ou de diferentes 
modos de utilização de novas estruturas edilícias, sendo oportuno avaliar se realmente tais 
delimitações são violadoras do direito de propriedade ou simplesmente ainda não se 
consolidou um entendimento a respeito do tema, a justificar a pesquisa doutrinária e 
jurisprudencial que se pretendeu realizar. 
 
O trabalho buscou apresentar as delimitações ao direito de propriedade, no regime 
condominial, como restrições impostas aos proprietários, sejam eles sujeitos ao regime do 
condomínio voluntário ou do condomínio edilício, duas expressões do direito de 
propriedade das mais presentes na sociedade moderna, sendo necessário avaliar como tais 
restrições são e podem ser impostas, e qual a sua eficácia frente aos condôminos, terceiros 
e futuros adquirentes. 
 
Para tanto, foram avaliadas as restrições, à luz do conceito de obrigação propter 
rem e se tal qualificação contribuiria para a exigibilidade das restrições impostas, assim 
como a forma pela qual as restrições poderiam ser regularmente impostas aos condôminos, 
na seara do condomínio edilício, mediante sua inclusão na Convenção de Condomínio, ou 
ainda, na seara do condomínio voluntário, para o qual não existe previsão legal de registro 
da Convenção Condominial. 
 
O estudo foi desenvolvido em três módulos, sendo o primeiro voltado às questões 
estruturais do direito de propriedade, suas restrições, e à função social; no segundo, foram 
desenvolvidos os conceitos e efeitos do condomínio voluntário e edilício; e, no terceiro, 
adentrou-se na análise das restrições impostas aos condôminos, em diversas situações 
comuns da vida condominial, de alta indagação, mas que se mostraram legais, quando 
observadas as normas aplicáveis e em consonância com o contexto social e econômico do 
condomínio, pautando-se sempre pela função social, pela ética e boa-fé. 
 
 
Palavras-Chave: Direito de Propriedade, Condomínio, Restrições ao direito de propriedade, 
Obrigações propter rem 
 
 
ABSTRACT 
 
 
The study of condominium bylaws and its ensuing restraints to building occupants’ 
rights aims to assess the legal grounds for such restrictions, which impose affirmative and 
negative covenants capable of significantly altering the traditional exercise of ownership 
rights, particularly the voluntary co-ownership and multi-ownership condominium 
systems. 
 
The validity of such restraints on condominium, brought about by different 
enjoyment and fruition parameters and limitations on ownership rights, is often disputed in 
light of the Federal Constitution, on the grounds that ownership constitutes fundamental 
civil rights. 
 
Many quite polemical, however commonplace, restraints addressed in this paper 
arise from either daily issues in multi-ownership condominia or the different uses of the 
new shared building facilities. We deem it timely to consider if such restraints indeed 
impose limitations on ownership rights or rather reveal an incipient understanding on the 
theme, justifying the research on legal writings and case law intended herein. 
 
This paper attempts to present the limitations to the exercise of ownership rights in 
property held pro indiviso, such as restraints imposed on the owner in either voluntary co-
ownership or multi-ownership condominium, two of the most recurring expressions in 
modern ownership laws. It also assesses what such limitations are, how they are imposed, 
and what their effectiveness before occupants, third parties and prospective owners can be. 
 
To achieve this, we assess the restraints in light of propter rem covenants and 
speculate whether such type should require the restraints and how they could be routinely 
imposed both on occupants of multi-ownership condominium, by means of its due 
inclusion on condominium bylaws, and on holders of voluntary jointly-owned property, 
about which the law states no registration procedures for condominium bylaws. 
 
The study is presented in three modules. The first concerns structural questions on 
ownership rights, its restrictions and social purpose; the second, the definitions and effects 
of voluntary co-ownership and multi-ownership condominia; the third, an in-depth look at 
the restraints imposed on occupants and owners, in a range of daily situations of sheer 
indignation despite its compliance with applicable laws and resonance with the social and 
economic context in condominia, grounded in social purpose, ethics, and good faith. 
 
 
 
KEY WORDS: Property Law, Condominium, Limitation on Ownership, Obligation 
Propter Rem. 
 
 
 
 
 
SUMÁRIOINTRODUÇÃO 1 
1. DIREITO DE PROPRIEDADE 4 
1.1 Conceito 4 
1.2 Noção histórica do direito de propriedade 5 
1.2.1 Breve notícia histórica da propriedade no Brasil 9 
1.3 Objeto do direito de propriedade 11 
1.3.1 Elementos constitutivos do direito de propriedade 15 
1.3.1.1 Direito de usar 15 
1.3.1.2 Direito de fruir 15 
1.3.1.3 Direito de dispor 16 
1.3.1.4 Direito de reivindicar 16 
1.4 Função social da propriedade 18 
1.4.1 O abuso de direito 24 
1.5 Restrições ao direito de propriedade 26 
1.5.1 Hipóteses de incidência de restrição do direito de propriedade em 
função de sua destinação social 
 
28 
1.5.2 Direito de vizinhança 29 
1.5.2.1 Direito de construir 30 
1.5.2.2 Uso anormal da propriedade 32 
1.5.2.3 Obrigações propter rem 34 
2. CONDOMÍNIO 
2.1 A diferença entre as modalidades condominiais do condomínio voluntário e o 
condomínio edilício 
2.2 O condomínio como expressão do exercício da função social propriedade 
2.3 Condomínio voluntário 
2.3.1 Conceito 
2.3.2 Natureza Jurídica 
2.3.3 Direitos e deveres dos condôminos 
2.3.4 Direito de preferência 
2.3.4.1 O alcance do artigo 504 do Código Civil 
2.3.4.2 Proposta de alteração do disposto no artigo 504 do Código Civil 
2.3.4.3 O direito de preferência convencional 
2.3.4.4 Cláusulas drag e tag along trazidas do direito societário 
2.3.4.5 Proposta de alteração legislativa para permissão de registro da 
39 
 
40 
43 
44 
44 
45 
47 
51 
51 
53 
54 
56 
 
convenção de condomínio pro indiviso 
2.4 Condomínio edilício 
2.4.1 O condomínio edilício como direito real novo 
2.4.2 A Convenção de condomínio 
2.4.2.1 Natureza jurídica da convenção de condomínio 
2.4.2.1.1 Natureza normativista da convenção de condomínio 
2.4.2.1.2 Natureza contratual da convenção de condomínio 
2.4.2.1.3 Natureza mista da convenção de condomínio 
2.4.2.2 Relevância da natureza da Convenção Condominial, diante da 
vigência da lei nova – Aplicabilidade do Código Civil de 2002 às 
Convenções produzidas e registradas antes da sua vigência 
2.4.2.2.1 A revogação das normas jurídicas 
2.4.2.2.2 Critério de solução de antinomias por Norberto 
Bobbio 
2.4.2.2.3 Irretroatividade das leis 
2.4.2.2.4 Os efeitos do Código Civil de 2002 sobre as 
Convenções de Condomínio elaboradas sob a égide dos artigos 
1º a 27 da Lei 4.591/1964 
2.4.3 Direitos e deveres dos condôminos 
3. AS RESTRIÇÕES CONDOMINIAIS 
3.1 As restrições decorrentes de assembleia geral 
3.1.1 A fixação do quorum qualificado para determinadas deliberações 
3.1.2 Invalidade das deliberações de assembleia 
3.1.3 Restrições que podem ser objeto de deliberação em assembleia geral 
3.1.4 Proposta legislativa para estabelecimento de prazo prescricional para 
reclamação sobre deliberação assemblear, mediante a inserção do artigo 
1.354-A no Código Civil 
3.1.5 A legalidade das restrições aos direitos dos condôminos e a teoria da 
pluralidade dos direitos limitados 
3.2 Restrições trazidas em Convenção de Condomínio 
3.2.1 Validade e invalidade das normas previstas na convenção 
de condomínio 
3.2.2 Procedimento para alteração da Convenção de Condomínio 
3.2.3 Oportunidade para impugnação das normas previstas na Convenção de 
Condomínio 
3.3 Restrições ao condômino inadimplente ao uso de áreas e serviços comuns, de 
63 
64 
66 
68 
70 
71 
72 
74 
 
 
78 
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82 
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96 
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101 
 
 
102 
 
103 
104 
 
106 
110 
111 
 
 
utilização individual 
3.3.1 Hipóteses abusivas 
3.3.2 Possibilidade de restrição e sua fundamentação jurídica e legal 
3.4 Supressão de serviços essenciais no caso de inadimplemento das despesas 
condominiais 
3.4.1 Requisitos para a validade da supressão de serviços essenciais 
3.4.2 A obrigação de pagamento das despesas de consumo individual e sua 
qualificação meramente pessoal 
3.5 Restrições ao direito de venda de unidades a estranhos (inspiração do direito 
americano) 
3.5.1 As atribuições do registro de imóveis 
3.5.2 Condição de aplicação da restrição ao direito de venda 
3.5.3 A arrematação do imóvel em hasta pública 
3.6 Restrição à locação do imóvel em condomínio edilício 
3.7 Restrições decorrentes da segurança (vistoria em veículos, filmagens) 
3.8 Restrições ao condômino nocivo ou antissocial 
3.8.1 Multa aplicável ao condômino nocivo ou antissocial 
3.8.2 A perda da propriedade no ordenamento jurídico 
3.8.3 A posição da doutrina, diante da omissão legislativa 
3.8.4 A aplicação dos princípios gerais do direito e a função social da 
propriedade para o afastamento do condômino antissocial 
3.8.5 Proposta legislativa para a exclusão do condômino nocivo ou 
antissocial, mediante a inserção dos §§ 1º a 3º, no artigo 1.337 do Código 
Civil 
3.9 A destinação do imóvel 
3.9.1 A destinação da unidade autônoma e a possibilidade de sua alteração – 
unidades hoteleiras e em shopping Center 
3.9.1.1 O caso Shopping Center Ibirapuera 
3.9.1.2 Notas sobre megacondomínios e suas convenções de 
condomínio 
3.10 Envidraçamento na sacada 
3.10.1 Retirada das portas e esquadrias existentes entre a sala e a sacada 
3.11 A questão do retrofit (alteração da fachada) 
3.12 Alteração da destinação do condomínio 
3.12.1 Alteração da destinação de áreas comuns específicas e serviços 
3.12.2 Proposta legislativa de alteração da redação do artigo 1.351 do Código 
112 
113 
114 
 
116 
118 
 
119 
 
120 
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125 
127 
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130 
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138 
 
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144 
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146 
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150 
152 
155 
156 
158 
160 
 
Civil 
3.12.3 Proposta legislativa de inserção do inciso VI, no artigo 1.334 do 
Código Civil 
3.13 Restrição de uso de áreas comuns para empregados e serviçais 
3.14 A proteção ao direito da minoria 
3.15 Restrições quanto ao uso das vagas de garagem e estacionamento 
3.15.1 A possibilidade de alienação e locação da vaga de garagem 
3.15.2 Modo de utilização das vagas de garagem 
3.16 Vedação ao direito de votar e participar das assembleias ao condômino 
inadimplente 
3.17 Cláusulas de não indenizar 
3.18 Repercussão do tempo nas relações jurídico-condominiais 
3.18.1 Os comportamentos contraditórios e a sua inadmissibilidade 
3.18.2 Aplicação da supressio, surrectio e venire contra factum proprium nas 
relações jurídico-condominiais 
3.19 A arbitragem 
3.20 As restrições impostas por leis municipais, estaduais e federais 
3.20.1 A lei da vedação ao cigarro no Estado de São Paulo 
3.21 Restrições aos condôminos no direito estrangeiro 
3.21.1 Direito Espanhol 
3.21.2 Direito Argentino 
3.21.3 Direito Italiano 
3.21.4. Direito Português 
3.21.5 Direito Francês 
3.21.6. Direito Uruguaio 
3.21.7 Direito Suíço 
3.21.8 Direito Mexicano 
CONCLUSÕES 
BIBLIOGRAFIA 
QUADRO DE NORMAS QUE DISCIPLINAM O CONDOMÍNIO EDILICIO 
162 
 
163 
163 
167 
168 
170 
172 
 
175 
176 
180 
183 
 
184 
185 
190 
191 
192 
192 
196 
200 
202 
204 
206 
207 
208 
212 
219 
232 
 
 
 
 
 
1 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
A experiência da vida em condomínio, nas últimas décadas, ampliou o debate e as 
implicações jurídicas da aplicação das normas condominiais, em decorrência da implantação 
de conjuntos habitacionais de grande porte, com numerosas torres e unidades autônomas, bem 
como pelo desenvolvimento de empreendimentos voltados à renda locatícia. 
 
Centros comerciais, denominados ―Shopping Centers‖, galpões para locação com as 
mais diversas finalidades, entre outras edificações são construídas mediante a conjugação de 
interesses de várias pessoas físicas e jurídicas, sendo possível desenvolver tais 
empreendimentos, sob o regime jurídico do condomínio voluntário. 
 
Outrossim, por meio da incorporação imobiliária, são oferecidos ao público 
empreendimentos imobiliários, denominados ―condomínios-clube‖, ―megacondomínios‖ e 
―condomíniosmultiuso‖, que conjugam imóveis residenciais, apart-services, unidades 
hoteleiras, serviços em geral, malls (pequenos centros comerciais), Shopping Center, entre 
outros, que exigem uma formatação jurídica compatível com a complexidade edilícia, 
estabelecendo parâmetros de uso e fruição, além de regras de conduta, vistas como 
indispensáveis para o adequado funcionamento do empreendimento, sem as quais instaurar-
se-ia verdadeira balbúrdia no condomínio, com todas as consequências dela decorrentes. 
 
Há muito, por outro ângulo, o Shopping Center Ibirapuera, localizado na cidade de 
São Paulo, foi constituído sob o regime do condomínio edilício, sob a égide da Lei 4.591, de 
1964, sendo certo que, em prol do melhor desenvolvimento da atividade econômica, 
atratividade e consumo, visando à maior rentabilidade de cada lojista ou condômino, as lojas 
devem possuir uma finalidade específica, definida pela Administração do Condomínio, com 
fundamento no conceito de tenant mix, finalidade essa que somente poderá ser alterada, 
mediante aprovação do corpo administrativo, sendo certo que pedidos de alteração de 
destinação são a ele submetidos, norma convencional regularmente cumprida pelos 
condôminos. 
 
2 
 
 
De idêntica forma, verifica-se a existência de unidades autônomas destinadas à 
atividade hoteleira e ainda os edifícios de destinação exclusiva, vedada a alteração da 
destinação, a critério exclusivo de seus proprietários. 
 
Em outros imóveis, são vistas restrições impostas aos condôminos do imóvel, onde é 
erigido o empreendimento, seja ele regido pelo regime do condomínio edilício ou voluntário. 
Por exemplo, a impossibilidade de um condômino realizar atividade empresarial que cause 
concorrência a outro condômino. Vejamos: empresa proprietária de determinado imóvel 
resolve vender fração ideal localizada para a instalação de outro empreendimento e impõe a 
obrigação de não permitir que nele se instale atividade que concorra direta ou indiretamente 
com o alienante. 
 
Por outro prisma, recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos 
autos da Apelação Cível 516.142-4/0-00, sendo relator o Desembargador Donegá Morandini, 
deu validade à deliberação que restringiu o direito de uso de determinadas áreas ao 
condômino inadimplente, questão altamente polêmica, na medida em que grande parte da 
doutrina e jurisprudência se posiciona no sentido de ser defesa tal restrição, porque as únicas 
sanções possíveis aos condôminos inadimplentes seriam aquelas previstas expressamente em 
lei, como as multas e o impedimento de participar das assembleias. 
 
Outra questão de altíssima indagação no ambiente condominial diz respeito a impedir 
o uso do bem por condômino nocivo ou antissocial, na medida em que a lei assim também 
não contemplou, ao contrário do que fizeram algumas legislações alienígenas. 
 
Ainda, em condomínio de 10 (dez) casas situado no litoral norte do estado de São 
Paulo, construído por um grupo de amigos, a Convenção de Condomínio, não registrada, 
previu que a venda das residências para estranhos dependeria de prévia autorização do 
Conselho Consultivo do condomínio para evitar que ingressassem no condomínio pessoas que 
não tivessem as mesmas características sociais, culturais e econômicas, questão de altíssima 
subjetividade, que vem sendo cumprida pelos condôminos. Contudo, caso um condômino não 
cumpra a cláusula da convenção, qual seria a consequência? Poderia a venda ser desfeita? 
Estaria o Tabelião de Notas obrigado a cumprir a norma, exigindo, antes da lavratura da 
escritura de compra e venda, ―vênia condominial‖? 
 
3 
 
 
Diante de todos os parâmetros de uso e fruição e regras de conduta que delimitam o 
direito de propriedade, acima indicadas, entre outras a serem discorridas ao longo deste 
trabalho, urge definir se estão em consonância ou não com a Constituição Federal, que não se 
olvide, garante o direito de propriedade, desde que observada sua função social. 
 
Há que se perquirir como adequar as necessidades condominiais ou as novas estruturas 
edilícias ao ordenamento jurídico vigente ou, talvez, avaliar se realmente tais delimitações são 
violadoras do direito de propriedade ou simplesmente ainda não se consolidou um 
entendimento a respeito do tema. Essas questões parecem ser merecedoras de uma avaliação, 
ainda mais acurada, sob o ponto de vista doutrinário e jurisprudencial. 
 
Por isso, ao longo deste trabalho, pretende-se apresentar as delimitações ao direito de 
propriedade, no regime condominial, como restrições impostas aos proprietários, sejam eles 
sujeitos ao regime do condomínio voluntário ou do condomínio edilício, duas expressões do 
direito de propriedade das mais presentes na sociedade moderna, sendo necessário avaliar 
como tais restrições são e podem ser impostas, e qual a sua eficácia frente aos condôminos, 
terceiros e futuros adquirentes. 
 
Para tanto, importa entender se as obrigações, a que se vinculam os condôminos, 
podem ser consideradas de natureza propter rem e se tal qualificação pode contribuir para a 
exigibilidade das restrições impostas, bem como avaliar como tais restrições devem ser 
prescritas, tanto na seara do condomínio edilício, mediante sua inclusão na Convenção de 
Condomínio, ou ainda, na seara do condomínio voluntário, para o qual não existe previsão 
legal de registro da Convenção Condominial. 
 
Por isso, o presente estudo, composto de três capítulos, visa, no primeiro, adentrar nas 
questões propedêuticas ao direito de propriedade, suas restrições, e à função social; no 
segundo capítulo, tratar especificamente do condomínio voluntário e edilício; e, no terceiro, 
aprofundar a análise das restrições impostas aos condôminos, em diversas situações comuns 
da vida condominial, mas que se mostram, ainda hoje, de alta indagação, sustentando a sua 
legalidade, desde que sejam observadas as normas atinentes e não caracterize condição 
abusiva, em detrimento da ética e da boa-fé. 
 
 
4 
 
 
 
1. DIREITO DE PROPRIEDADE 
 
1.1 Conceito 
 
O direito à propriedade
1
 está entre os direitos mais antigos e reconhecidos em toda a 
humanidade, manifestando-se, nos primórdios das sociedades grega e romana, na religião 
doméstica, de modo que a família não podia renunciar a esse direito, já que a terra não 
pertencia a uma pessoa individualmente considerada, mas ―aos que já morreram na família e 
aos que nela estão por nascer‖
2
, porque a propriedade formava um só corpo com a família, 
para venerar o deus doméstico, garantindo a perpetuação do culto. 
 
O direito de apropriação de bens se dá por necessidade humana, com características 
distintas ao longo dos tempos. Desenvolveu-se nos regimes capitalistas
3
 de maneira a proteger 
os bens materiais e imateriais legitimamente adquiridos pela pessoa humana
4
, possuindo a 
propriedade um sentido amplo que dá ao proprietário ―[...] a faculdade de usar, gozar e dispor 
 
1
 Propriedade e domínio serão aplicadas ao longo do presente trabalho como expressões sinônimas. Convém, 
porém, relembrar as lições de Lafayette Rodrigues Pereira: ―O domínio (direito de propriedade no sentido 
estrito) é o direito real em toda a sua compreensão, ou antes, é a síntese de todos os direitos reais; manifesta-
se por todos os atos que o homem pode praticar sobre a coisa corpórea; é a plena potestas, o império 
exclusivo e absoluto de nossa vontade sobre a coisa.‖ (Direito das Coisas, p.21). E, mais adiante preleciona: 
―O direito de propriedade, em sentido genérico, abrange todos os direitos que formam o nosso patrimônio, 
isto é, todos os direitos que podem ser reduzidos a valor pecuniário. 
Mas, ordinariamente, o direito de propriedade é tomado em sentido mais restrito, como compreendendo tão-
somente o direito que tem por objeto direto ou imediato as coisas corpóreas. Nesta acepção se lhe dá mais 
geralmenteo nome de domínio, consagrado por monumentos legislativos antiquíssimos e de significação 
mais espiritual e característico. 
Domínio é o direito real que vincula e legalmente submete ao poder absoluto de nossa vontade a coisa corpórea, 
na substância, acidentes e acessórios. 
Desta noção resulta: 
1. Que o domínio envolve a faculdade de gozar de todas as vantagens e utilidades que a coisa encerra, sob 
quaisquer relações; 
2. Que é ilimitado e como tal inclui em si o direito de praticar sobre a coisa todos os atos que são 
compatíveis com as leis da natureza; 
3. Que é de sua essência exclusivo, isto é, contém em si o direito de excluir da coisa a ação de pessoas 
estranhas. 
Estes são os caracteres fundamentais do domínio. 
Todavia é ele suscetível de limites e restrições que lhe pode impor ou a lei ou a vontade do senhor (dominus).‖ 
(Direito das Coisas, p. 79). Para Lodovico Barassi, os dois termos atualmente se equivalem, mas o termo 
mais técnico é propriedade, porque domínio se relaciona com o direito público, cuja expressão não 
corresponde necessariamente ao exercício do direito de propriedade (Proprietà e Comproprietá, p. 25.) 
2
 FUSTEL DE COULANGES, Numa Denis. A Cidade Antiga, Estudo sobre o Culto, O Direito e as Instituições 
da Grécia e de Roma, p. 90. 
3
 ROSENFIELD, Denis Lerrer. Justiça, Democracia e Capitalismo, p. 18. 
4
 A teoria naturalista foi defendida por Clóvis Bevilacqua, in. Código Civil Comentado, vol. I, p. 114 
5 
 
 
da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou 
detenha.‖ (artigo 1,228 Código Civil de 2002). 
 
Ainda que o Código Civil tenha circunscrito a propriedade aos bens corpóreos, ou 
seja, às coisas, o artigo 5º, XXI, da Constituição, ao proteger o direito de propriedade, 
abrangeu também os créditos e toda posição jurídica de valor patrimonial
5
. 
 
A partir do direito romano, cujo conhecimento entre nós se inicia com a Lei das Doze 
Tábuas, a propriedade era entendida como um direito tão significativo, absoluto e perene, que 
o titular do direito de propriedade poderia usar e gozar de sua coisa do céu ao inferno (usque 
ad sidera usque ad inferos). 
 
O direito de propriedade, todavia, não mais se coaduna, com a visão romana pretérita, 
de que se vincula e se submete ao poder absoluto do proprietário, passando a ser visto como 
uma ―relação jurídica complexa, que tem por conteúdo as faculdades de uso, gozo e 
disposição da coisa por parte do proprietário, subordinadas à função social e com correlatos 
deveres, ônus e obrigações em relação a terceiros‖
6
. 
 
Nada obstante, 
 
A experiência mostra que a propriedade varia em função do momento 
temporal no qual é analisada e do ordenamento jurídico que a consagra. A 
propriedade ilimitada do século XIX não é igual à propriedade do início do 
século XXI. A propriedade alemã, apesar da mesma matriz romana, não 
surge igual à portuguesa. Elementos históricos variados e uma tradição 
cultural distinta são suficientes para alterar o conteúdo do direito em cada 
uma destas ordens jurídicas
7
. 
 
1.2 Evolução histórica do direito de propriedade 
 
A luta pela subsistência, possivelmente, determinou a formação dos primeiros 
sentimentos sobre a propriedade, na defesa pelas cavernas e outras formas de abrigo, 
estendendo-se para as áreas de vegetação, em busca do alimento
8
. 
 
5
 GOMES, Orlando os define como ―quase-propridades‖ (Significado da Evolução Contemporânea do Direito de 
Propriedade, RT 757-717, nov/1998) 
6
 LOUREIRO, Francisco Eduardo. Código Civil Comentado (Coord. Min. César Peluzo), p. 1043. 
7
 VIEIRA, José Alberto C.. Direitos Reais, p. 666. 
8
 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas, p. 171. 
6 
 
 
Os primitivos viviam em grupos, sem uma organização formal, inexistindo o princípio 
da autoridade. Retirando o seu sustento da natureza, carecendo de instrumentos necessários à 
vida e à proteção, deslocavam-se para onde existisse a caça e a pesca, sem residência fixa, em 
vida nômade, repartindo o fruto da coleta, em manifestação de propriedade coletiva
9
. 
 
O poder material sobre as coisas abrangeu o grupo, ligados por laços de parentesco ou 
convivência duradoura, sendo certo que as ideias iniciais de domínio se assemelhavam à 
demarcação de território, contudo, diante do nomadismo, inexistia o caráter de perpetuidade 
sobre a sobredita propriedade. 
 
Fortalecidos os laços familiares, instituiu-se o matriarcado, como germe da autoridade 
e de organização grupal, daí evoluindo para grupos menores e deslocando-se a autoridade 
para a pessoa mais velha, que representava o tronco central do qual descendiam as gerações, 
surgindo o patriarcado, permanecendo o sentido de propriedade coletiva. 
 
A partir do momento em que as sociedades começaram a fixar-se em determinadas 
áreas, com a evolução cerebral e desenvolvimento da agricultura e pecuária, a propriedade 
começou a desempenhar um papel importante na estrutura social, perdurando, por muito 
tempo, a propriedade familiar. 
 
Por sua vez, a particularização da propriedade adveio como consequência natural da 
dissipação dos grupos ou da divisão dos seus membros, tornando-se mais consolidada quando 
os indivíduos se estabeleceram definitivamente em determinadas regiões
10
. 
 
No Direito Romano se encontra a raiz histórica do nosso instituto da propriedade
11
, 
que foi individual desde os primeiros momentos. 
 
A propriedade privada em Roma, em síntese, aparece em uma primeira época como 
uma instituição religiosa
12
; em uma segunda assume um caráter aristocrático e, na última, 
chega a transformar-se em propriedade individual privada, reduzida à área do direito familiar, 
 
9
 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Limitações Urbanas ao Direito de Propriedade, p. 8. 
10
 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas, p. 171. 
11
 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil, Vol. IV, p. 81. 
12
 Como já mencionado, a religião influenciou a preservação da propriedade para o culto e para os antepassados, 
não se podendo transmitir a terra a terceiros, preservando-a em função da família (FUSTEL DE 
COULANGES, Numa Denis A Cidade Antiga, p. 78-91). 
7 
 
 
de certa extensão, quando se trata de bem imóvel ou circunscrita a coisas móveis, como os 
escravos. Na lei das XII Tábuas emerge, já, uma propriedade mais ampla sobre a terra, dentro 
de Roma, que permite ao titular, desde que seja cidadão romano, ampliar suas faculdades 
sobre ela
13
. 
 
A partir do Século I d.c., a propriedade romana adquiriu o caráter de absoluta. Após, 
Justiniano unificou os conceitos que tratavam da propriedade privada. Foi acentuada a 
propriedade privada com a conquista de novas regiões, distribuindo terras aos guerreiros, que 
optavam entre aquelas de melhor qualidade. 
 
Na Idade Média, formou-se o regime feudal com a concentração dos bens em mãos de 
poucas pessoas, em decorrência do enfraquecimento do poder real em virtude das inúmeras 
invasões dos povos bárbaros, o que gerou a necessidade de serem instituídos poderes locais 
para melhor proteção das terras e da população. 
 
A propriedade feudal caracterizou-se basicamente por dois traços principais: 
 
Os homens e as terras formando uma hierarquia, pois um homem depende de 
outro mais poderoso e a terra depende de outra mais importante. Os reis 
perderam seus poderosos poderes sobre as terras e os senhores feudais 
passaram a exercer plenamente seus poderes sobre as suas próprias terras, 
criando assim um vínculo entre ambos, possuidores e detentores da terra. 
Dessa forma, no período medieval, a propriedade caracterizou-se 
basicamente pela primazia da propriedade imóvel. Dela advinha a riqueza e 
o poder, pois a subsistência social dependia fundamentalmente de seu 
cultivo
14
. 
 
Já neste período, as ordens religiosasvinham reagindo contra a exploração do 
próximo, contra violência e contra o acúmulo de riquezas, manifestando-se, sob a influência 
de Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino, no sentido de que a propriedade constituía um 
direito individual, sagrado, mas que deveria ser exercido em benefício de todos. Consoante as 
lições de Santo Tomás de Aquino, 
 
13
 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas, p. 172. 
14
 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Limitações, p. 24; Orlando Gomes assim caracteriza a 
propriedade medieval: “A propriedade medieval caracteriza-se pela quebra desse conceito unitário. Sobre o 
mesmo bem, há concorrência de proprietários; A dissociação revela-se através do binômio domínio evidente 
+ domínio útil. O titular do primeiro concede o direito de utilização econômica do bem e recebe, em troca, 
serviços ou rendas. Quem tem o domínio útil perpetuamente, embora suporte encargos, possui, em verdade, 
uma propriedade paralela”. (Direitos Reais, p. 102). 
 
8 
 
 
 
Deus destinou as coisas ao bem-estar de todos os homens, embora não se 
devesse aceitar a exploração coletiva da propriedade, por ser mais adequada 
a iniciativa individual: o homem produz mediante um estímulo, que é o 
remuneratório, e se todos fossem chamados a contribuir em conjunto, para a 
obtenção de um resultado impessoal e genérico, sem aferição individual, 
ninguém se esforçaria, havendo negligencia geral, uns esperando os outros, 
mas a sobra desse ganho pessoal, ou seja, o que ultrapasse as necessidades 
do proprietário deveria ser colocado para o benefício da comunidade
15
 . 
 
Na fase moderna, a partir do séc. XVIII, em contraposição ao regime autoritário 
adotado por algumas monarquias, tais como a francesa, que proclamou o direito da Coroa 
sobre todas as terras, adveio, na Revolução Francesa, a declaração dos direitos do homem, 
que, dentre outros princípios, estabeleceu a propriedade como sagrada e inviolável (art. 17), 
ressuscitando o conceito romanista da propriedade exclusiva
16
, o que foi, posteriormente, 
incorporado ao Código Napoleônico (artigo 544), que pretendeu democratizar a propriedade, 
abolindo privilégios, cancelando direitos perpétuos
17
, afirmando-se como direito civil, 
garantindo ao seu titular a mais ampla liberdade, o direito à utilização econômica da coisa, 
dentro dos limites da regulamentação legal existente
18
. 
 
Com a Revolução Industrial, propagou-se o liberalismo econômico, no que tange ao 
afastamento do intervencionismo estatal nas atividades privadas, expandindo a livre iniciativa, 
com a mais ampla liberdade na aquisição da propriedade, conceito enraizado nos sistemas 
legais e políticos dos países ocidentais, pelo capitalismo, no qual o conceito unitário de 
propriedade é restaurado, com exaltação à concepção individualista, de modo que o direito do 
proprietário é elevado à condição de direito natural, em pé de igualdade com as liberdades 
fundamentais
19
. 
 
 
15
 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Limitações, p. 25. 
16
 MAZEAUD, Henri y Leon; MAZEAUD Jean, Lecciones de Derecho Civil, Parte Segunda, p. 16. 
17
 PEREIRA, Cáio Mario da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. IV, p. 82. 
18
 WALD, Arnoldo. Direito das Coisas, p. 112. Como já nos manifestamos anteriormente: ―Os conceitos do 
liberalismo propagados pelo povo francês prestigiavam a propriedade imobiliária como um dos direitos 
naturais e imprescritíveis do homem (art. 2
o
 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão), 
proclamando a propriedade como ―direito inviolável e sagrado‖, cuja ilimitação prevista no direito romano 
foi absorvida pelo Código Napoleônico, que prevê, em seu art. 544, a propriedade como sendo “le droit de 
jouir et disposer des choses de la manière la plus absolue, pourvu quón n‟en fasse pas un usage prohibé par 
les lois ou par les règlements”, consagrado, outrossim, ao mesmo tempo, o princípio da legitimidade da 
limitação do Estado sobre a propriedade, ao definir esse instituto, como ―o direito de gozar e de dispor das 
coisas de modo absoluto, contanto que isso não se torne uso proibido pelas leis ou pelos regulamentos‖. 
(ELIAS FILHO, Rubens Carmo. As despesas do condomínio edilício, p. 45). 
19
 GOMES, Orlando. Direitos Reais, p. 102. 
9 
 
 
Em sentido diametralmente oposto, implementou-se o marxismo que objetivou a 
socialização da propriedade, tornando propriedades exclusivas do Estado, 
 
A terra, o subsolo, as águas e os bosques. Pertencem ao Estado os meios 
básicos de produção na indústria, na construção e na agricultura, os meios de 
transporte e de comunicação, os bancos, os bens dos estabelecimentos 
comerciais, de serviços públicos, empresas organizadas pelo Estado, o fundo 
imobiliário fundamental das cidades, assim como outros bens necessários 
para cumprir as funções do Estado
20
 . 
 
Esses princípios que já não se sustentam, tendo-se instituído na grande maioria dos 
países o regime capitalista, e, consequentemente, o sistema da propriedade privada. 
 
Após a Segunda Guerra Mundial, acentuou-se o fenômeno da ―socialização do 
direito‖, ―tendo-se em vista, de um lado, o desenvolvimento da teoria do abuso do direito e, 
de outro, o sentido de proteção ao mais fraco, como técnica de restabelecimento do equilíbrio 
social‖
21
, abandonando-se a concepção do direito de propriedade como um direito absoluto e 
individualista, para se dizer que a propriedade tem uma função social, ou, mais ainda, a 
propriedade é uma função social
22
, encontrando, atualmente, ―um ponto de relativo equilíbrio 
entre o liberalismo exacerbado do século XVIII [...] e o marxismo que defendia a abolição da 
propriedade privada‖
23
. 
 
1.2.1 Breve notícia histórica da propriedade no Brasil 
 
Como o liberalismo do século XIX reconheceu amplamente os poderes do proprietário 
só admitindo excepcionalmente a intervenção na propriedade alheia, tal conceito viu-se 
empregado no artigo 179, n. 22, da Constituição Imperial Brasileira de 1824, que garantia o 
direito de propriedade em toda a sua plenitude, salvo quando existisse interesse público, 
hipótese em que o cidadão seria previamente indenizado do valor da propriedade, o que foi 
repetido na Constituição de 1891, a qual inaugurou a República em nosso país, mantendo a 
característica da propriedade de direito absoluto, nos moldes do Código Napoleônico, porque, 
 
20
 Artigo 11, da Constituição Russa, de 07.10.77 
21
 PEREIRA, Cáio Mario da Silva. Condomínio e Incorporações, p. 29. 
22
 AREAN, Beatriz A. Derechos Reales, vol. 1, p. 235. 
23
 MORATO, Antonio Carlos, Código Civil Interpretado, p. 1004. 
10 
 
 
por conveniências políticas, não interessava aos latifundiários uma noção mais social do 
direito de propriedade
24
. 
 
A Constituição de 1934 já salientou em seu artigo 113, n.17, o caráter social da 
propriedade frisando que esse direito ―não poderá ser exercido contra o interesse social e 
coletivo‖, enquanto a Carta de 1937 relegou para a legislação ordinária a regulamentação do 
conteúdo e dos limites do direito de propriedade (art.122, n. 4). 
 
A Constituição de 1946, não obstante tenha garantido o direito de propriedade, 
assegurando indenização justa e prévia, em caso de desapropriação (art. 141, § 16), permitiu a 
intervenção do Estado no domínio econômico (art. 146), condicionando o uso da propriedade 
ao bem-estar social, possibilitando que lei ordinária viesse a promover justa distribuição da 
propriedade, com igual oportunidade para todos (art. 147). 
 
A Constituição de 1967, no governo militar, profundamente modificada pela Emenda 
Constitucional n.1/69, garantiu o direito de propriedade, salvo em caso de desapropriação por 
necessidade ou utilidade pública ou por interesse social (art. 152,§ 22). Trouxe garantiaaos 
autores de inventos industriais e de obras literárias e científicas (art. 153, §§ 23 e 24). No art. 
150, fixou metas de ordem econômica, entre elas a ―função social da propriedade‖. Pela 
primeira vez, foi usada a expressão ―função social‖ para dispor a respeito da necessária 
coexistência entre os interesses do proprietário e da sociedade (arts. 157, III, e 160, III), como 
princípio de ordem econômica e social, não sendo elevado ao nível de garantia fundamental 
do cidadão. O princípio era aplicado apenas para a propriedade privada
25
. 
 
A Constituição de 1988 garante o direito de propriedade, observada a sua função 
social, ressalvadas as hipóteses de desapropriação por necessidade ou utilidade pública ou por 
interesse social, mediante justa e prévia indenização (art. 5º, XXII, XXIII e XXIV), 
assegurando aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem 
como proteção às criações industriais, às marcas, nomes de empresas e outros signos 
distintivos (art. 5º, XXIX). 
 
 
24
 PRADO, João Adelino Moraes de Almeida. A Função Social da Propriedade em face da Constituição Federal 
1988, p. 36. 
25
 Ibidem, p. 37. 
11 
 
 
Faz menção expressa a função social da propriedade ainda no art. 170, III, que trata 
dos princípios gerais da ordem econômica, no art. 182, § 2º, quando fala a respeito da política 
urbana
26
 e também quando fala da política agrícola e fundiária, no art. 184 e no art. 186, onde 
expressa claramente que: 
 
Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, 
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em 
lei, aos seguintes requisitos: I – aproveitamento racional e adequado; II – 
utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio 
ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de 
trabalho; IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos 
trabalhadores. 
 
Enfim, como bem sintetiza Arnoldo Wald: 
 
A evolução do direito de propriedade, diretamente vinculado às condições 
econômicas e políticas do momento, oscilando entre a exclusividade 
romanista e a dispersão ou superposição medieval, ora com amplas garantias 
para o seu titular, ora dependendo do interesse social representado pela 
vontade estatal. É, assim, um dos conceitos mais maleáveis do direito, 
adaptando-se sempre às contingências do momento, como verdadeiro 
instrumento do equilíbrio social, procurando conciliar as exigências, muitas 
vezes antagônicas, da segurança e da justiça, dos interesses coletivos e 
individuais
27
. 
 
 
1.3 O objeto do direito de propriedade 
 
Pode ser objeto do direito de propriedade tudo que seja suscetível de apropriação, 
coisas corpóreas, móveis e imóveis
28
, observadas as restrições previstas no ordenamento 
jurídico, sendo ainda controvertida a questão sob o ponto de vista da apropriação de bens 
incorpóreos
29
. 
 
Nada obstante, como o artigo 5º, XXI, da Constituição, ao proteger o direito de 
propriedade, abrangeu também os créditos e toda posição jurídica de valor patrimonial. 
 
26
 A regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, o Estatuto da Cidade (Lei n.10.257, de 
10.07.2001), impôs uma série de obrigações ao proprietário de imóvel urbano, conforme a dicção do § único, 
do artigo 1
o
: “as normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em 
prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” 
visando a ordenação dos espaços habitáveis, para a garantia da qualidade de vida dos cidadãos. 
27
 WALD, Arnoldo. Direito das Coisas, p. 115 
28
 SANTOS JUSTO, A. Direitos Reais, p. 219 
29
 CHALHUB, Melhim Namem. Curso de Direito Civil, Direitos Reais, p. 46 
12 
 
 
Cumpre assinalar que os bens móveis e imóveis têm tratamento jurídico diverso, compatível 
com sua conformação, assim como os bens intelectuais são tutelados de forma específica, não 
se aplicando, para eles, a teoria dos direitos reais
30
. 
 
Como já anteriormente exposto, a propriedade não é apenas uma instituição jurídica, 
mas objeto de estudo da economia, da sociologia, da política, da filosofia, sendo certo que, em 
grande medida, ponderam Diez-Picazo e Antonio Gullon
31
, a propriedade e sua regulação 
jurídica não são mais do que uma superestrutura das ideias sociais, políticas e econômicas que 
em um período determinado movimentam as nações, de modo que uma definição legal da 
propriedade está sempre influenciada por um ambiente histórico em que é formulada. 
 
Neste sentido, o Código Napoleônico é expressão do movimento liberal que deflagrou 
a Revolução Francesa, tendo disposto, em seu artigo 544, que a propriedade é ―O direito de 
gozar e de dispor das coisas da maneira mais absoluta, desde que delas não se faça uso 
proibido pelas leis e pelos regulamentos.‖, redação também utilizada pelo Código Civil 
Italiano de 1865 (artigo 436). 
 
Foi bastante criticado o exagero da adjetivação ―do modo mais absoluto” para o 
direito de gozar e dispor das coisas, porque o que é absoluto não admite graus
32
, tratando-se 
de verdadeira retórica do liberalismo, além de trazer no mesmo dispositivo, proibições ao 
direito de propriedade que se afirma absoluto. 
 
A qualificação do direito de propriedade como absoluto, porém, consoante as lições de 
Francesco Gazzoni
33
, não decorre da ilimitação dos poderes inerentes à propriedade, mas ao 
fato de a propriedade não estar mais vinculada aos encargos e limitações impostas pelo senhor 
feudal, no pretérito. 
 
 
30
 Os direitos reais somente podem recair sobre coisas determinadas, conforme as lições de Edmundo Gatti. 
Teoria General de los Derechos Reales, p. 74. 
31
 DÍEZ-PICAZO, Luis; GULLÓN Antonio. Instituciones de Derecho Civil, Derechos Reales, p. 104. 
32
 MONTEIRO, Washington de Barros. Direito das Coisas, p. 85. 
33
 GAZZONI, Francesco. Manuale de Diritto Privato, p. 199. 
13 
 
 
O Código Civil Espanhol, no artigo 348
34
, por exemplo, definiu a propriedade como o 
direito de gozar e dispor de uma coisa, sem outras limitações que as estabelecidas em leis, não 
tendo utilizado o pleonasmo acima indicado, assim como o Código Civil Português, que ao 
tratar do ―Conteúdo do direito de propriedade‖, prescreve ―O proprietário goza de modo pleno 
e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos 
limites da lei e com observância das restrições por ela impostas”., redação semelhante à do 
artigo 832, do Código Civil Italiano de 1942
35
, do artigo 2.513
36
 do Código Civil Argentino, 
entre outros. 
 
Na mesma linha de raciocínio, o Código Civil Brasileiro de 1916 atribuiu o 
proprietário ―o direito de usar; gozar e dispor da coisa e o direito de reavê-la do poder de 
quem quer que injustamente a possua ou detenha‖. e o Código Civil de 2002, no mesmo 
sentido do antigo, no artigo 1.228, estabeleceu: ―O proprietário tem a faculdade de usar, gozar 
e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou 
detenha‖. 
 
Nada obstante, de fato, o direito de propriedade é absoluto
37
 dentro do âmbito 
resguardado pelo ordenamento jurídico, sendo o mais amplo e extenso, tanto que a ele é 
atribuída a oponibilidade erga omnes
38
 e, ainda, o caráter de plenitude
39
. Nas palavras dos 
irmãos Mazeaud, 
 
O absolutismo do direito de propriedade se afirma não somente por sua 
oponibilidade contra terceiros, mas também com relação ao seu titular, é um 
direito excludente (I) e individual (II); em relação aos poderes que confere: é 
 
34
 Art. 348. La propiedad es el derecho de gozar y disponer de uma cosa, sin más limitacionesque las 
establecidas en las leyes. El propietario tiene accion contra el tenedor y el poseedor de la cosa para 
reivindicarla. 
35
 Art. 842, do Código Civil Italiano: “Il proprietario há diritto di godere e dispore delle cose in modo pieno ed 
esclusivo, entro i limiti e com l´osservanza degli obblighi stabiliti dall´ordinamento giuridico 
36
 Art. 2513 do Código Civil Argentino: “Es inherente a la propiedad el derecho de posser la cosa, disponer o 
servirse de Ella, usarla y gozarla conforme a un ejercicio regular.” 
37
 Beatriz Arean, seguindo as ideias de Edmundo Gatti, após discorrer a respeito das diversas definições de 
―absolutez‖, sustenta que o domínio (a propriedade) é absoluto porque é o único direito real que permite a 
seu titular fazer da coisa o que quiser, usar e gozar dela como melhor lhe aprouver, alterar sua substância, até 
o extremo de poder destruí-la, alterar a sua destinação dando a ela a que considere mais adequado às suas 
necessidades, dentro do marco legal e desde que não atente contra os direitos de terceiros, a ordem pública, a 
moral e os bons costumes. (AREAN, Beatriz. Derechos Reales, Vol. 1, p. 248). 
38
 MONTEIRO, Washington de Barros. Direitos Reais, p. 85; VENOSA, Silvio de Salvo. Direitos Reais, p. 178. 
39
 Artigo 1231, do Código Civil de 2002: ―A propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário‖. 
14 
 
 
um direito total (III) e soberano (IV); em relação à sua duração, é um direito 
perpétuo (V)
40
. 
 
O direito de propriedade constitui o núcleo dos direitos reais, de modo que todos os 
direitos reais da propriedade decorrem, os quais correspondem a modificações ou limitações 
dela. 
 
Bastante elucidativas, em arremate, as lições de Orlando Gomes: 
 
A propriedade é um direito complexo, se bem que unitário, consistindo num 
feixe de direitos consubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor e 
reivindicar a coisa que lhe serve de objeto. 
Direito absoluto também é porque confere ao titular o poder de decidir se 
deve usar a coisa, abandoná-la, aliená-la, destruí-la, e, ainda, se lhe convém 
limitá-lo, constituindo, por desmembramento, outros direitos reais em favor 
de terceiros. Em outro sentido, diz-se igualmente, que é absoluto, porque 
oponível a todos. Mas a oponibilidade erga omnes não é peculiar ao direito 
de propriedade. O que lhe é próprio é esse poder jurídico de dominação da 
coisa, que fica ileso em sua substancialidade ainda quando sofre certas 
limitações. 
Por último, seu caráter de direito absoluto se manifesta mais nitidamente no 
aspecto real de poder direto sobre a coisa com a qual se distingue das outras 
relações jurídicas. 
O direito de propriedade é perpétuo. Incluindo a perpetuidade entre seus 
caracteres, significa-se que tem duração ilimitada, e não se extingue pelo 
não-uso. 
O aspecto pessoal do direito de propriedade revela-se no jus prohibendi, que 
consiste no poder de proibir que terceiros exerçam sobre a coisa qualquer 
senhorio. Por esse motivo, diz-se que é um direito exclusivo. 
Tem ainda, como característica a elasticidade, pois pode ser distendido ou 
contraído, no seu exercício, conforme se lhe agreguem ou retirem faculdades 
destacáveis. 
Considerada na perspectiva dos poderes do titular, a propriedade é o mais 
amplo direito de utilização econômica das coisas, direta ou indiretamente. O 
proprietário tem a faculdade de servir-se da coisa, de lhe perceber os frutos e 
produtos, e lhe dar a destinação que lhe aprouver. Exerce poderes jurídicos 
tão extensos que a sua enumeração seria impossível. 
O direito de propriedade é assegurado na Constituição, salvo o caso de 
desapropriação, até por interesse social
41
. 
 
 
 
 
40
 MAZEAUD, Henri y. MAZEAUD, Leon Jean. Lecciones de Derecho Civil, Parte Segunda, p. 35. No mesmo 
sentido: ―Encontrando-se em mãos do proprietário todas as faculdades inerentes ao domínio, o seu direito se 
diz absoluto ou pleno no sentido de poder usar, gozar e dispor da coisa da maneira que lhe aprouver, podendo 
dela exigir todas as utilidades que esteja apta a oferecer, sujeito apenas a determinadas limitações impostas 
no interesse público‖ .(GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, vol., p. 219). 
41
 GOMES, Orlando. Direitos Reais, p. 97-98. 
15 
 
 
1.3.1 Elementos constitutivos do direito de propriedade 
 
Tratando, especificamente, do conteúdo do direito de propriedade, vários atributos 
decorrem de seu conteúdo, que se resumem na trilogia romana do jus utendi, fruendi et 
abutendi, acrescentando-se o poder de reaver a coisa injustamente possuída por outrem
42
. 
 
Analisadas outras legislações, de mesma inspiração latina, como a italiana, francesa e 
a portuguesa, é possível verificar que, de forma analítica, a propriedade tem sido definida pela 
reunião dos direitos dos direitos de usar, gozar, dispor e reivindicar
43
. 
 
1.3.1.1 O direito de usar 
 
A faculdade de usar enseja colocar a coisa a serviço do titular sem alterar-lhe a 
substância, servindo-se da coisa, ou terceiro, de forma geral, lembrando, sempre, que o uso se 
subordina às normas de boa vizinhança e é incompatível com o abuso do direito de 
propriedade, questões a serem aprofundadas ao longo deste trabalho. Assim, tratando-se de 
uma casa, poderá nela morar, porém, nada impede que modifique seu destino e utilizá-la 
como depósito ou como comércio, se ao proprietário parecer mais conveniente, desde que não 
exista uma restrição administrativa ou convencional que assim proíba
44
, ou decorrentes da 
propriedade horizontal, que é objeto do presente estudo. 
 
1.3.1.2 O direito de fruir 
 
A faculdade de gozar envolve a percepção de frutos, naturais e civis, ou seja, extrair 
da coisa benefícios e vantagens. O direito aos frutos, previsto no artigo 1.232 do Código 
Civil, é uma das modalidades do gozo da coisa, todavia, os frutos e demais utilidades podem 
 
42
 Apropriadas as lições de Melhim Namem Chalhub: ―O direito de propriedade contempla uma fase interna e 
outra externa; na face interna, os direitos elementares que compõem o direito de propriedade são o direito de 
usar (jus utendi), o de fruir (jus fruendi) e o de dispor (jus abutendi), enquanto na face externa o direito de 
propriedade encerra o de exclusão, ou seja, o direito que tem o titular da propriedade de excluir quem quer 
que seja dos limites em que é assegurada a senhoria sobre a coisa, como, por exemplo, o direito de retomar a 
coisa de quem injustamente a detenha.‖ (Direitos Reais, p.43). 
43
 Como afirma Caio Mário da Silva Pereira: ―Se não é perfeita a definição, melhor noção não é apresentada.‖ 
(Instituições de Direito Civil, vol. IV, p.67) 
44
 ARÉAN, Beatriz A. Derechos Reales, Vol. 1, p. 251. 
16 
 
 
ser atribuídas a outrem, por título jurídico especial, seja pelo uso, habitação, usufruto, locação 
e também na posse, na hipótese prevista no artigo 1.214, do Código Civil
45
. 
 
 
1.3.1.3 O direito de dispor 
 
A faculdade de dispor (jus abutendi) envolve o poder de consumir o bem, alterando-
lhe sua substância, alienar ou gravar. Não corresponde à prerrogativa de abusar da coisa, 
destruindo-a gratuitamente. Nem mesmo no Direito Romano se admitia a ideia de uso 
antissocial do domínio, situação atualmente inconcebível à luz do bem-estar social
46
. 
 
Corresponde, de toda forma, ao poder mais abrangente, porque somente aquele que 
puder usar e gozar o bem, poderá dele dispor, seja a título oneroso ou gratuito, permitindo-se, 
quando viável, também o desmembramento. Pode abandonar ou destruir a coisa, salvo as 
hipóteses legais, como o tombamento. 
 
 
1.3.1.4 O direito de reivindicar 
 
A faculdade de reivindicar envolve uma proteção específica, que se concretiza por 
meio da ação reivindicatória, porque de nada valeria ao proprietário ter o poder de usar, gozare dispor do bem ou da coisa, se não lhe fosse permitido o direito de reaver de quem 
injustamente se apossasse
47
. 
 
O direito de propriedade, como acima mencionado, encontra-se salvaguardado 
constitucionalmente (art. 5º, XXII, da Constituição Federal) e, igualmente as suas faculdades, 
que não podem, portanto, ser usurpadas, nem pelo Estado
48
, nem pelos particulares, salvo as 
situações decorrentes da observância da função social
49
, condição inerente ao exercício da 
 
45
 MONTEIRO, Washington de Barros. Direitos Reais, p. 95. 
46
 RODRIGUES, Silvio. Direito das Coisas, p. 75. 
47
 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das Coisas, p. 212. 
48
 Como característica do Estado Constitucional 
49
 A este respeito, verifique-se os instrumentos de política urbana, traduzidos pelo Estatuto Social, decorrente do 
§ 4º, do artigo 182, da Constituição Federal, tais como a edificação e parcelamento compulsórios, o IPTU 
progressivo e desapropriação com pagamento de títulos da dívida pública (artigos 5º a 8º, da Lei 
10.257/2001). Como elucida Renata Lourenço Ferreira dos Santos: ―Os instrumentos adotados pelo texto 
constitucional têm por característica obrigar o proprietário a um comportamento positivo de promover uma 
17 
 
 
propriedade (art. 5º. XXIII, da Constituição Federal) e aquelas decorrentes da autonomia da 
vontade, liberdade individual
50
, igualmente protegida pela Carta Magna. 
 
Nesse sentido, as leis de interesse público, ou ainda as normas disciplinadoras do 
regime privado, prestigiarão o direito de propriedade e não o afetarão salvante os limites 
próprios do texto constitucional. 
 
Na medida em que nosso ordenamento assegura a propriedade, como 
princípio positivado, condicionado ao interesse coletivo, a propriedade 
individual não deve ser ignorada e sim compatibilizada sob pena de restar 
ferido nosso próprio regime de Estado Constitucional. Para tanto, é 
inconcebível uma exegese formal do exercício dominial, pois o valor 
liberdade tem de ser compatibilizado com o da igualdade, teleologicamente 
orientado em face dos casos concretos. 
Do exposto, não raro incorrerão, repisa-se, ingerências e limitações ao 
exercício do domínio, pelos princípios jurídicos que o informam em graus 
mais abstratos, pela já asseverada porosidade deste para com os de ordem 
pessoal, no âmbito da esfera proprietária, que o instrumentaliza
51
. 
 
 
Neste sentido, as faculdades inerentes ao proprietário, separadamente ou em conjunto, 
é preciso sempre ter em mente, expressam um direito fundamental do cidadão e, com base 
nesta premissa, há que se verificar a legalidade das leis que venham sobre o domínio 
interferir. 
 
Cabe, porém, deixar claro que a relação que se estabelece entre o proprietário e a coisa 
não se faz mais de forma unitária (teoria realista), ou seja, mediante o mero estabelecimento 
da pertinência da coisa ao proprietário, mas reorientada pelos valores advindos da 
Constituição Federal, pois mesmo os direitos reais decorrem de relação jurídicas 
intersubjetivas. 
 
 
 
destinação concreta para a sua propriedade. São mecanismos destinados a impedir e inibir o processo da 
especulação imobiliária nas cidades, de conferir aos imóveis urbanos ociosos uma destinação voltada a 
beneficiar a coletividade. Isto é, o proprietário de imóvel urbano para garantir o seu direito de propriedade já 
deveria ter conferido a este uma função social. Na falta dessa destinação, o Poder Público municipal está 
constitucionalmente capacitado para tornar social a função da propriedade urbana.‖ (Efetivando a função 
social da propriedade através de instrumentos de política urbana, p. 10) 
50
 Característica do Estado Liberal 
51
 ARONNE, Ricardo. Propriedade e Domínio, p. 142. 
 
 
18 
 
 
1.4 Função social da propriedade 
 
Em busca do exercício do direito de propriedade de maneira a atender a sua função 
social, até mesmo em Roma existiam limitações ao direito de propriedade, de caráter privado 
e público, disposições relativas à distância entre as construções, altura e conservação das 
edificações etc
52
, que tinham como finalidade o interesse social. 
 
Desde o Brasil colônia, como noticia Jeferson Carus Guedes, já se verificava a 
preocupação com a utilização produtiva da terra, na medida em que a Lei 601, de 1850 (Lei 
de Terras), disciplinou a utilização das terras, estabelecendo que seriam arrecadadas pela 
Coroa aquelas que, dadas em concessão, não tivessem sido aproveitadas. ―Em síntese, deve 
destacar-se que já naquele remoto tempo se registrava a exigência de ‗cultura‘ da terra como 
indicativo do interesse do particular sobre a fração de terra a legitimador da aquisição‖.
53
 
 
O Código Civil de 1916, de inspiração romana, em seu artigo 524 estabelecia: ―A lei 
assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder 
de quem quer que injustamente os possua‖, mas, ao mesmo tempo o seu artigo 526, ao tratar 
da extensão do direito de propriedade, já contemplava: 
 
A propriedade do solo abrange a do que lhe está superior e inferior, em toda 
a altura e em toda a profundidade, úteis ao seu exercício, não podendo, 
todavia, o proprietário opor-se a trabalhos, que sejam empreendidos a uma 
altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse algum em obstá-los. 
 
A seu respeito, já comentava Clovis Bevilacqua: 
 
O proprietário do imóvel estende seu direito à superfície, inclusive o espaço 
aéreo correspondente, e ao sub-solo, em prolongamento vertical da porção 
de solo, correspondente à superfície. Mas a propriedade é noção econômica, 
a sua extensão deve corresponder à sua utilidade; é também um phenomeno 
social, deve adaptar-se às necessidades da vida collectiva. Sob o influxo da 
sociologia e da economia política o direito imprime à propriedade a forma, 
que ela deve ter. Por isso, ainda reconhecendo que a columna atmospherica 
acima do solo e as camadas do sub-solo pertencem ao proprietário do 
terreno, a lei civil estabelece limites a esse direito, tomando por medida a 
utilidade
54
. 
 
 
52
 MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus. Limitações urbanas ao Direito de Propriedade, p. 20. 
53
 GUEDES, Jefferson Carus. Função social das propriedades, p. 348. 
54
 BEVILACQUA, Clovis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Commentado, vol 3, p.59. 
19 
 
 
 
A observância à função social da propriedade, como retro mencionado, viu-se 
introduzida no ordenamento jurídico brasileiro, na Constituição de 1934, sendo certo que as 
anteriores, de 1824 e 1891, já garantiam o direito de propriedade, resguardado o interesse 
público. 
 
Cumpre destacar que a função social da propriedade, prevista no artigo 5º, inciso 
XXIII, da Constituição Federal, está contemplada no artigo 1.228, §§ 1º e 2º, do Código Civil 
vigente, que dispõe: 
 
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e 
o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou 
detenha. 
§ 1
o
 O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas 
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de 
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas 
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem 
como evitada a poluição do ar e das águas. 
§ 2
o
 São defesos os atos que não trazem ao proprietário qualquer 
comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar 
outrem. 
 
A propriedade deverá ser exercida de tal maneira que não prejudique o direito de 
terceiros, não impondo, porém, obrigações apenas ao proprietário mas, ―vai dirigido ao 
proprietário,ao não-proprietário, ao juiz, ao administrador e, naturalmente, ao legislador‖
55
 
uma vez que para a aplicação imediata dos preceitos constitucionais, de que a propriedade 
deve atender ao fim social, cada ente civil, no exercício de suas funções, deve exigir o 
cumprimento da função social da propriedade, inclusive o particular, que deve abster-se de 
atentar contra o meio ambiente, relações de consumo, patrimônio cultural, artístico, genético, 
mesmo que não exista lei específica. 
 
Contudo a observância da função social não deve levar à conclusão de que toda 
propriedade nela se esgota, como pretendia Duguit, que, consoante sua teoria, deveria impor 
a todo proprietário, a obrigação de empregá-la de acordo com sua finalidade social, 
 
55
 MORAES, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988, p. 75. 
20 
 
 
aumentando a interdependência social
56
, a caracterizar o proprietário como um encarregado 
de um serviço social.
57
. 
 
Nada obstante, a função social da propriedade, ou melhor, consoante os ensinamentos 
de José Oliveira Ascensão, a ―função social dos direitos reais‖, não é vista apenas como forma 
de afastar o abuso de direito, mas por suas finalidades sociais, e, para tal função, existem 
intervenções limitadoras e impulsionadoras, 
 
[...], no primeiro caso a lei pretenderia apenas manter cada titular dentro de 
limites que se não revelassem prejudiciais à comunidade, enquanto que no 
segundo interviria activamente, fomentaria, impulsionaria, de maneira a que 
de uma situação de direito real derivasse um resultado socialmente mais 
valioso
58
. 
 
 
Porém jamais seria possível que, mediante as intervenções do Poder Público, toda a 
propriedade cumprisse sua função social, assim como não se tem condições de definir todos 
os meios de exercício do direito de propriedade, em consonância com o interesse social. 
Afastada a ilusão liberal da coincidência dos interesses individual e coletivo, privilegia-se ―a 
necessidade de assegurar que a propriedade não seja alheada do benefício social‖
59
. 
 
A garantia da autonomia pessoal é, logicamente, o objecto primário da 
atribuição dos bens em termos reais. E essa falharia se a conduta do sujeito 
fosse minuciosamente determinada pela lei ou pelos órgãos públicos, sob a 
alegação de garantia da função social. O que se pretende antes de mais é a 
colaboração com a liberdade dos indivíduos. As intervenções em nome da 
função social devem ser prudentes, prevendo os casos em que os titulares se 
desviaram flagrantemente das necessidades gerais, ou em que estas se 
apresentem de modo premente
60
 . 
 
No ordenamento jurídico pátrio, a função social está presente, de maneira expressa, 
em diversos ordenamentos jurídicos, não apenas quando se trata da propriedade imobiliária, 
mas nas propriedades, como se verifica, por exemplo, na própria Lei das Sociedades 
Anônimas ao exigir que o administrador exerça as atribuições que a lei e o estatuto lhe 
 
56
 MORAES, José Diniz de. A função social da propriedade e a Constituição Federal de 1988, p. 96. 
57
 MALUF, Carlos Alberto Dabus. Limitações ao Direito de Propriedade, p. 61. 
58
 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil: Reais, p.192. 
59
 Ibidem, p.190. 
60
 Ibidem, p.201. 
21 
 
 
conferem para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem 
público e da função social da empresa
61
. 
 
Construída uma nova visão da propriedade, à luz de sua destinação social, apropriadas 
as lições de Stéfano Rodotà, citadas por Francisco Eduardo Loureiro
62
, 
 
para quem a função social manifesta-se concretamente na relação jurídica da 
propriedade sob os seguintes aspectos: a) privação de determinadas 
faculdades; b) complexo de condições para o exercício de faculdades 
atribuídas ao proprietário; c) obrigação de exercer determinadas faculdades. 
 
A propriedade privada contemporânea, como se verifica, apresenta novos contornos 
sustentados em dois princípios: - a faculdade do proprietário de exigir a abstenção dos sujeitos 
passivos na ingerência da coisa e o seu dever de transformar o seu bem, em prol do coletivo, 
dando-o uma função que atenda ao interesse social, de caráter subjetivo, decorrente das 
próprias características da propriedade
63
, de conteúdo dinâmico, como já se pronunciava 
Gustavo Tepedino, mesmo antes da vigência do Código Civil atual: 
 
A propriedade pode ser estudada em dois aspectos, o estrutural e o funcional. 
A dogmática tradicional e, na sua esteira, o Código Civil brasileiro, 
preocupa-se somente com a estrutura do direito subjetivo proprietário. O art. 
524 do C. Civ., com efeito, evitando defini-la, dispõe sobre os poderes do 
titular do domínio, fixando o aspecto interno ou econômico, caracterizador 
do senhorio, e outro externo, o aspecto propriamente jurídico da estrutura da 
propriedade. O primeiro aspecto, interno ou econômico, é composto pelas 
faculdades de usar, fruir e dispor. O segundo, o jurídico, traduz-se na 
faculdade de exclusão das ingerências alheias. 
Estes dois aspectos, o interno e o externo, compõem a estrutura da 
propriedade, o seu aspecto estático. 
Já o segundo aspecto, mais polêmico, é alvo de disputa ideológica, refere-se 
ao aspecto dinâmico da propriedade, a função que desempenha no mundo 
jurídico e econômico a chamada função social da propriedade
64
. 
 
 
61
 Artigo 154, da Lei 6404/76 
62
 LOUREIRO, Francisco Eduardo. A propriedade como relação jurídica complexa, p. 128. 
63
 ARONNE, Ricardo. Propriedade e Domínio, p. 190. Merece nota a lição de Pietro Perlingieri, trazidas por 
Renan Lotufo: ―A estrutura da propriedade realiza a função muito complexa de solidariedade, que de um 
ponto de vista moderno é completamente diversa daquela egoística, individualista, do século XIX. Com o 
tempo esta função mudou a estrutura do instituto da propriedade, de modo que ela não constitui mais um 
exclusivo direito subjetivo, mas vem a ser sempre mais uma situação de poder-dever, cujo aspecto negativo, 
limitativo, obrigatório assume uma postura prevalente. 
A propriedade privada é uma situação jurídica subjetiva complexa, composta não só de aspecto positivo, de 
intervenção do sujeito privado, mas de aspecto negativo, de intervenção do Estado ou de terceiro sobre a sua 
situação jurídica. O Estado não é mais garantista, mas intervencionista.‖ (A Função Social da Propriedade na 
Jurisprudência Brasileira, p. 343). 
64
 TEPEDINO, Gustavo. Contornos constitucionais da propriedade privada, p.311. 
22 
 
 
O direito real, não se pode olvidar, deve ser exercido para atender o interesse 
individual, mas direcionando-se ao interesse social, ―em uma relação de concorrência 
conjuntiva, de coincidência, de equilíbrio sistêmico, sob pena de fazer perturbações na 
função‖
65
, função social, no sentido de utilidade, funcionalidade ou finalidade, estabelecendo 
uma cláusula geral, de conteúdo genérico, capaz de impor obrigações de fazer e de não fazer 
ao proprietário, a ser avaliada, em cada circunstância específica, de acordo com o contexto 
sócio, econômico, cultural e regional. 
 
O proprietário de imóvel está sujeito à nova conformação do seu direito de 
propriedade, dada a necessária compatibilização de concepções
66
 e dos diversos 
mandamentos, que incidem sobre a propriedade, tais como as normas administrativas, 
urbanísticas, empresariais (comerciais) e civis, sob fundamento das normas constitucionais
67
, 
estando a função social da propriedade ―instrumentalizada e exteriorizada na CF – através do 
art. 184, ao prescrever a possibilidade de haver a desapropriação dos imóveis rurais que não 
cumpram a sua função social – e no Estatuto da Cidade – aplicando-a quanto às terras 
urbanas‖
68
. 
 
O proprietáriode imóvel rural, por exemplo, está sujeito ao cumprimento dos índices 
de produtividade, vinculado ao módulo rural, estabelecidos em conformidade com a 
localização do imóvel (artigos 184 a 187, da Constituição Federal), sob pena desapropriação 
para fins de reforma agrária, observadas ademais as normas do Estatuto da Terra, o qual, além 
de buscar níveis adequados de produtividade, alinhados com o bem-estar dos proprietários e 
trabalhadores das terras, também se preocupa com a conservação dos recursos naturais (artigo 
2º, inciso I, alínea ―c‖, da Lei 4.504/1964)
69
. 
 
Por sua vez, a comprovar que a apuração do cumprimento da função social dependerá 
da análise sócio-econômico, cultural e regional, quando comprovado o legítimo esforço do 
proprietário para cumprir os níveis de produtividade exigidos, o que não se obteve por 
 
65
 PENTEADO, Luciano de Camargo. Direito das Coisas, p.195. 
66
 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional, p. 705 
67
 DA SILVA, José Afonso. Direito Constitucional Positivo, p.248 
68
 NERY, Rosa Maria de Andrade. Introdução ao Pensamento Jurídico e à Teoria Geral do Direito Privado, p. 
250. 
69
 OPTIZ, Silvia C.B., OPTIZ, Oswaldo. Curso Completo de Direito Agrário, 169 
23 
 
 
questões alheias à sua vontade, é possível se afastar a desapropriação para fins de reforma 
agrária
70
. 
 
O proprietário de imóvel urbano vincula-se às determinações do Estatuto da Cidade, 
decorrente de mandamento constitucional (artigo 182, da Constituição Federal), sendo certo 
que, entre outras medidas, o Poder Público poderá determinar que o proprietário promova 
―o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, 
subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as condições e os prazos para implementação da 
referida obrigação‖ (artigo 5º, caput, da Lei 10.257/2001), sob pena cobrança do IPTU 
progressivo no tempo, ―mediante a majoração da alíquota pelo prazo de 5 (cinco) anos 
consecutivos‖ (artigo 7º), após o que, em caso de descumprimento da obrigação imposta, será 
procedida ―a desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública‖. (artigo 
8º). 
 
Enfim, merece relevo a lição de Rosa Maria de Andrade Nery e Nelson Nery: 
 
Funcionalidade dos institutos jurídicos. O primeiro realce da análise jurídica 
do contrato e da propriedade dirige-se para sua função econômica porque 
ambos, respectivamente, são institutos que visam à circulação de riquezas e à 
produção de riquezas. Isto não retira desses mesmos institutos, tanto do 
contrato quanto da propriedade, a sua funcionalidade própria: devem 
cumprir sua função social, tão importante quanto sua função econômica. 
Portanto, é importante interpretar a função social do contrato e da 
propriedade como estruturas fundamentais, respectivamente, do negócio 
jurídico e da situação jurídica de direito real, estruturas essas que devem 
estar em consonância com a realidade social, para que possam imprimir-lhes 
destinação útil tendo-se em conta sua função própria e, por conseguinte, para 
que cumpram, efetivamente, a função econômico-social de que se reveste o 
próprio direito e cada um de seus institutos. O contrato não compreende 
apenas as pretensões individuais, ele deve ser entendido como verdadeiro 
instrumento de convívio social e de preservação da paz social. No que 
respeita à propriedade, deve-se sempre observar a capacidade produtiva que 
ela espelha e sua vocação para atender, em tempo e lugar certos, o objetivo 
social que ela deve atingir, resguardando sempre seu aspecto jurídico de 
direito fundamental do homem (CF 5º, XXII.
71
. 
 
 
 
 
 
 
70
 STJ, Resp 545.555-CE, rel. Min. Luiz Fux, j. 04.11.2004. 
71
 NERY JUNIOR, Nelson. NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado, p. 970-971 
24 
 
 
1.4.1 O abuso do direito 
 
O Código Civil, em demonstração de seus fins sociais e éticos, repudia, sob qualquer 
ângulo, o abuso de direito, caracterizando-o como ato ilícito e, como tal, impondo ao infrator 
o dever de reparação do dano, seja ele material ou moral, assim dispondo o seu artigo 187: 
―Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede 
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos 
bons costumes‖. 
 
O acima citado § 2º, do artigo 1.228 do Código Civil deve ser interpretado em 
conjunto com o seu artigo 187, a reforçar a repressão ao abuso de direito, além de precisar que 
a consequência da violação dos mencionados dispositivos é a configuração do ato ilícito a 
impor o dever de reparação do dano pelo proprietário
72
. 
 
O direito de propriedade, então, ainda que pudesse ser entendido como absoluto e 
oponível erga omnes, desde seus primórdios, foi exercido em consonância com sua função 
social, o que, a priori, pode ser entendido como a utilização da propriedade, vedado o abuso 
do direito
73
, desta forma o proprietário deve exercer o direito de maneira tal que não exceda 
―manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos 
bons costumes‖ (artigo 187 do Código Civil de 2002
74
), afastando-se da prática de atos 
emulativos, ou seja, atos praticados pelo proprietário, que não lhe tenham utilidade ou 
comodidade legítima, com a única intenção de prejudicar o outro
75
. 
 
O Egrégio Tribunal de Justiça Paulista, v.g., no Agravo de Instrumento nº 11.31.803-
0/0, sendo relator o eminente Desembargador Antonio Rigolim, diante de ação de nunciação 
de obra nova promovida pelo vizinho para impedir que construtora promovesse a introdução 
de tirantes em seu subsolo, solucionou a questão, com base no artigo 1.229 do Código Civil, 
constando do V. acórdão que: 
 
A colocação de tirantes, cuja finalidade é apenas a de permitir e amparar a 
construção da parede de concreto, não causará qualquer dano ao imóvel 
vizinho e nem implica em violação de qualquer direito, até porque se trata de 
 
72
 BOULOS, Daniel Martins. Abuso do Direito no novo Código Civil, p.271. 
73
 ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Civil: Reais, p.190. 
74
 De semelhante redação o artigo 334 do Código Civil Português. 
75
 GUEDES, Jeferson Carus. Função social das “propriedades”, p.352. 
25 
 
 
instalação apenas temporária e em profundidade que não implica em 
qualquer tipo de transtorno. É conduta que tem permissivo no artigo 1.229 
do Código Civil, não havendo razão para impedi-la.‖ dispositivo legal este 
que, em alusão à vedação aos atos emulativos, prescreve que: ―A 
propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, 
em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário 
opor-se a atividades que sejam realizadas, por terceiro, a uma altura ou 
profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-las. 
 
Como destaca Marcos Alcino Torres
76
, 
 
Na propriedade em geral as alterações introduzidas pelo novo Código Civil 
na caracterização do conteúdo do direito, com a ampliação dos deveres do 
titular em prol de interesses não proprietários, consubstanciam a 
caracterização da noção plural das propriedades. Esta noção se extrai da 
regra contida no §1º do art.1.228 do Código Civil ao fixar que o direito de 
propriedade deve (dever, obrigação) ser exercido em consonância com suas 
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de 
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora e a fauna, as 
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, 
bem como evitada a poluição do ar e das águas. 
A despeito de não perder a característica de um direito subjetivo dos mais 
representativos no direito privado, aos deveres acima acrescentou-se a 
proibição (que não deixa de ser

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