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Pediatria Vol 2 - 2020(1)

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Qual é o sinal clínico
clássico da coarctação de
aorta?
1.1 CIRCULAÇÃO FETAL
Para compreender a dinâmica das cardiopatias congênitas, é
importante recordar alguns aspectos da circulação fetal (Figura 1.1).
O sangue oxigenado retorna da placenta pela veia umbilical. Cerca de
metade do sangue proveniente da placenta passa através dos
sinusoides hepáticos, enquanto o restante é desviado do fígado e
segue pelo ducto venoso para a veia cava inferior. Fluindo por esta
veia, o sangue entra no átrio direito do coração. A maior parte do
sangue que penetra no átrio direito é dirigida pela crista dividens
para o orifício forame oval, chegando, então, ao átrio esquerdo. Do
átrio esquerdo, o sangue passa ao ventrículo esquerdo através da
válvula mitral e a partir dessa cavidade é ejetado através da aorta
ascendente. O coração, a cabeça e o membro superior direito
recebem sangue com maior teor de oxigênio do que o restante do
corpo. Cerca de 40 a 50% do sangue da aorta descendente passam
pelas artérias umbilicais e retornam à placenta para reoxigenação. O
restante suprirá as vísceras e a metade inferior do corpo. Como os
pulmões do feto não são responsáveis pela oxigenação do sangue
fetal e pelo fato de as artérias pulmonares serem extremamente
sensíveis à hipóxia do ambiente intrauterino reagindo com
vasoconstrição, existe grande resistência à circulação proveniente
do ventrículo direito. Assim, as paredes deste ventrículo são
hipertrofiadas na vida fetal.
O sangue que chega ao átrio direito pela veia cava superior é
proveniente da cabeça e membros superiores, além de pouco
oxigenado. Esse volume de sangue passa preferencialmente através
da válvula tricúspide, chegando ao ventrículo direito. Deste, é
ejetado na artéria pulmonar. Em função da extrema vasoconstrição a
que a artéria pulmonar e seus principais ramos estão submetidas,
esse volume de sangue será desviado em cerca de 90%, por meio do
canal arterial para a aorta, antes da saída da artéria subclávia
esquerda. Isto levará a uma mistura de sangue a partir deste ponto
da aorta, o que torna este sangue menos oxigenado.
Dessa forma, o sangue com maior oxigenação do feto é o que irriga o
próprio coração e o cérebro. Tal fato e a própria dinâmica da
circulação fetal dependem das 3 estruturas próprias da circulação
fetal: ducto venoso, forame oval e canal arterial – ducto arterioso.
Figura 1.1 - Circulação fetal
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
Figura 1.2 - (A) Circulação pré-natal e (B) circulação pós-natal
Figura 1.3 - Circulação fetal
Com o nascimento, após o clampeamento do cordão umbilical e a
ventilação pulmonar, ocorrem alterações importantes na circulação
descrita. Ao ser ventilado – e insuflado – o pulmão, a sua resistência
vascular cai expressivamente, e a circulação no ducto arterial é
reduzida quase completamente.
O ducto arterioso geralmente deixa de ser funcional nas primeiras 10
a 15 horas pós-parto, exceto em prematuros e naqueles com hipóxia
persistente, situações em que pode permanecer aberto por mais
tempo.
O oxigênio constitui o fator mais importante do controle do
fechamento do ducto arterioso. Durante a vida fetal, a abertura deste
é controlada pelo baixo nível de oxigênio no sangue, já que o feto
vive em ambiente com baixo teor de oxigênio, mantendo, então, o
ducto pérvio. O ducto arterial também é mantido pérvio por meio da
produção de prostaglandinas durante a vida intrauterina, assim,
alguns inibidores da síntese de prostaglandinas, como a
indometacina, são usados para promover o fechamento do ducto
arterioso que persiste pérvio após o nascimento. Em algumas
semanas ou meses processa-se o fechamento anatômico, e o ducto
arterial se oblitera e passa a constituir o ligamento arterioso fibroso.
A oclusão da circulação placentária provoca queda imediata da
pressão sanguínea na veia cava inferior e no átrio direito. Devido ao
fluxo sanguíneo pulmonar aumentado, a pressão no interior do átrio
esquerdo fica maior que a do átrio direito, e essa pressão acarreta
fechamento funcional do orifício do forame oval. Já o fechamento
anatômico acontece mais tardiamente.
Entendendo a circulação fetal, pode-se observar que o coração fetal
funciona praticamente como bomba única, pois a oxigenação
sanguínea se apresenta na placenta, e os pulmões fetais não são
funcionantes, ocorrendo um shunt direito-esquerdo por meio do
forame oval e do ducto arterial. Com o nascimento, ocorrem as
alterações descritas e fundamentais para o acoplamento cardíaco à
necessidade de oxigenação sanguínea nos alvéolos pulmonares.
A grande maioria das malformações cardíacas é bem tolerada
durante a vida intrauterina, produzindo sinais após o nascimento.
1.2 APRESENTAÇÃO CLÍNICA
A incidência da cardiopatia congênita na população geral é de 1 a
2:1.000 nascidos vivos, distribuída de acordo com o exposto no
Quadro 1.1. Trinta por cento dos casos recebem alta da maternidade
sem esse diagnóstico.
Durante as primeiras horas após o nascimento, o Recém-Nascido
(RN) deve permanecer em observação quanto a qualquer sinal ou
sintoma que possa gerar suspeita, embora, com a utilização rotineira
da ultrassonografia obstétrica, especialmente a morfológica, cada
vez menos cardiopatas têm nascido sem um diagnóstico durante a
vida intrauterina. De qualquer forma, deve-se suspeitar de
cardiopatia congênita sempre que o RN apresente quaisquer dos
sinais que seguem:
a) Taquipneia, cansaço ou cianose às mamadas;
b) Qualquer tipo de sopro cardíaco ou alteração de bulhas cardíacas;
c) Alteração de pulsos e/ou, hipertensão arterial sistêmica ou, ainda,
diferença sensível da pressão arterial sistêmica entre os membros
superiores e os inferiores;
d) Arritmias – tais manifestações chamam atenção em qualquer RN.
Com o passar dos dias, após o nascimento, é possível observar
manifestações nos recém-nascidos cardiopatas, como impulsão
torácica, precórdio hiperdinâmico e dificuldade de ganhar peso,
hiperfluxo pulmonar ou, ainda, sinais de hipertensão pulmonar.
Quadro 1.1 - Distribuição da incidência na população
Em função dos tipos de repercussões presentes nas malformações
congênitas cardíacas, classificam-se tais repercussões considerando
ou não a presença de cianose. A cianose da criança com cardiopatia
congênita é do tipo central, quase sempre generalizada; entretanto,
em alguns casos, pode ser evidente no dimídio inferior (MMII) e
ausente no dimídio superior (MMSS) e mucosas, ou vice-versa, a
qual é denominada de cianose diferencial. A título de recordação, a
cianose não se refere diretamente à oxigenação sanguínea, mas à
relação de hemoglobina oxidada em comparação à reduzida. É
observada quando a hemoglobina reduzida no sangue circulante é
igual ou superior a 5 g/dL. Casos em que há déficit de oxigenação
podem produzir cianose; contudo, em casos de anemia associada a
má oxigenação, pode não haver. Casos em que a circulação e a
perfusão estão diminuídas em uma parte do corpo e a oxigenação
sanguínea não está prejudicada podem, igualmente, apresentar
ausência de cianose, à medida que o pouco sangue que chega àquela
área tem relação favorável de hemoglobina oxidada com relação à
reduzida.
1.3 AVALIAÇÃO DA CRIANÇA COM
CARDIOPATIA CONGÊNITA
A avaliação inicial tem 3 aspectos: cianóticas versus acianóticas,
radiografia de tórax e eletrocardiograma (ECG), e diagnóstico
realizado por meio de ecocardiograma (ECO).
Os defeitos cardíacos congênitos podem ser divididos em 2 grandes
grupos, com base na presença ou ausência de cianose. Em seguida,
podem, ainda, ser subdivididos conforme o fluxo pulmonar (normal,
aumentado ou diminuído) observado na radiografia de tórax. O ECG
pode ser usado para determinar a existência de hipertrofia das
câmaras cardíacas. As características dos sons cardíacos e de sopros
ajudam a estreitar o diagnóstico diferencial, e o diagnóstico final é
confirmado por ECO, cateterismo cardíaco ou ambos.
O teste de oximetria de pulso – “teste do coraçãozinho” – é um
método de triagem de cardiopatias consideradas críticas no período
neonatal.Deve-se realizar aferição da oximetria de pulso em todo
RN aparentemente saudável com idade gestacional maior que 34
semanas, antes da alta da unidade neonatal. Deve-se realizar
aferição no membro superior direito e em um dos membros
inferiores, entre 24 e 48 horas de vida. O resultado normal evidencia
saturação periférica maior que 95% em ambas as medidas, membro
superior direito e membro inferior, e diferença menor do que 3%
entre as medidas do membro superior direito e membro inferior.
Quanto ao resultado anormal, caso qualquer medida da SpO2 seja
menor do que 95% ou haja diferença igual ou superior a 3% entre as
medidas do membro superior direito e membro inferior, uma nova
aferição deverá ser realizada após 1 hora. Caso o resultado se
confirme, um ECO deverá ser feito dentro das 24 horas seguintes.
1.3.1 Teste do coraçãozinho
Figura 1.4 - Teste do coraçãozinho
Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria, 2012.
A oximetria de pulso é uma ferramenta de triagem neonatal.
Figura 1.5 - Triagem neonatal de cardiopatia congênita crítica
Fonte: elaborado pelos autores.
1.4 CARDIOPATIAS CONGÊNITAS
ACIANÓTICAS
As lesões mais comuns são as que produzem carga excessiva de
volume. Entre elas, as mais frequentes são lesões com shunt
esquerdo-direito: CIV, CIA e PCA.
A segunda maior classe de lesões acianóticas corresponde às que
provocam aumento da carga pressórica, secundárias à obstrução do
fluxo de saída ventricular – estenose pulmonar, estenose aórtica –
ou ao estreitamento de grandes vasos Coarctação da Aorta (CoAo).
No caso de lesões com sobrecarga de volume – CIV, CIA, PCA –, a
fisiopatologia comum é a comunicação entre as circulações
sistêmica e pulmonar, resultando num shunt de sangue rico em
oxigênio de volta para os pulmões. Esse shunt pode ser quantificado
por meio do cálculo da razão do fluxo sanguíneo pulmonar pelo fluxo
sistêmico (Qp:Qs). Um shunt 2:1 significa que o fluxo pulmonar está
2 vezes maior do que o normal. O remodelamento do coração ocorre
com predomínio de dilatação e, em menor grau, hipertrofia. Caso a
doença não seja tratada, há, progressivamente, aumento da
resistência vascular pulmonar que pode reduzir o shunt ou mesmo
inverter o seu sentido, passando a ser direito-esquerdo (fisiologia ou
síndrome de Eisenmenger).
Na síndrome de Eisenmenger, a resistência vascular pulmonar após
o nascimento permanece alta ou aumenta depois de ter diminuído
durante a lactância. Os principais fatores que levam a essa síndrome
são pressão pulmonar aumentada, fluxo pulmonar aumentado,
hipóxia e hipercapnia.
No caso de lesões com sobrecarga de pressão, como: estenose
pulmonar, estenose aórtica, CoAo; a fisiopatologia nessas lesões é
uma obstrução do fluxo normal do sangue. As mais comuns são as
obstruções do fluxo de saída dos ventrículos. Mecanismos de
compensação levam a hipertrofia ventricular e dilatação em estágios
mais avançados.
1.4.1 Comunicação interventricular (CIV)
A CIV é a cardiopatia congênita mais comum. Nessa malformação
congênita, há passagem de sangue do ventrículo esquerdo para o
direito por intermédio de uma abertura no septo interventricular,
em alguns casos, todo o septo interventricular está ausente. O shunt
esquerdo-direito ocorre por diferença de pressão; como a pressão
sistêmica, (pós-carga) é maior do que a encontrada na circulação
pulmonar, o sangue dirige-se do local de maior pressão para o de
menor pressão. Como resultado, parte do sangue já oxigenado e que
está no ventrículo esquerdo é devolvida ao ventrículo direito e
novamente impulsionada aos pulmões, determinando sobrecarga
ventricular direita e aumento do trabalho cardíaco.
Figura 1.6 - Comunicação interventricular
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
1.4.1.1 Diagnóstico
O shunt é menor no período neonatal.
Eventualmente, as manifestações de insuficiência cardíaca,
sobrecarga de volume, decorrentes da CIV só se manifestam de 2 a 3
meses após o nascimento, quando os níveis de pressão na circulação
pulmonar declinam. Nesse momento, como a diferença das pressões
entre os 2 ventrículos é grande, o fluxo esquerdo-direito pela CIV é
máximo, exigindo trabalho cardíaco acima das suas capacidades.
As manifestações clínicas iniciais podem restringir-se a apenas 1
sopro holossistólico na borda paraesternal esquerda, acompanhado
ou não de frêmito. De acordo com a dimensão da CIV e/ou, em razão
da queda da pressão pulmonar, podem advir as manifestações da
insuficiência cardíaca, como dispneia, taquicardia e sudorese,
dificuldade para mamar, infecções respiratórias, hipertensão
pulmonar e sibilância.
A radiografia de tórax pode evidenciar área cardíaca aumentada,
principalmente o ventrículo esquerdo, além do aumento da trama
vascular e da artéria pulmonar. O ECG pode mostrar alterações
elétricas indicativas de sobrecarga de ventrículo esquerdo ou
biventricular, onda T invertida em V-1 ou onda T ascendente.
O ecocardiograma, o exame mais importante para a definição
diagnóstica de comunicação interventricular e para a conduta
clínica, evidencia o defeito anatômico, bem como o fluxo, se
associado ao Doppler. Este também faz uma estimativa da
hipertensão pulmonar caso ela esteja presente.
Figura 1.7 - Radiografia de tórax com área cardíaca aumentada
1.4.1.2 Tratamento
Com exceção das CIVs muito pequenas, que podem regredir
espontaneamente, todas as demais devem ser operadas, de
preferência durante os 2 primeiros anos de vida. Quanto a crianças
com repercussões hemodinâmicas precoces, a correção deve ser feita
precocemente, a fim de evitar lesão da vasculatura com consequente
hipertensão pulmonar.
Nos casos em que a conduta é expectante, há insuficiência cardíaca
ou a cirurgia não pode ser realizada prontamente, são realizados
restrição hídrica, uso de digital, diuréticos e vasodilatadores.
Figura 1.8 - Melhora radiológica após cirurgia
Fonte: Anesthetic management of children with congenital heart diseases presented for non
cardiac surgery, 2009.
1.4.2 Comunicação interatrial (CIA)
Nesse tipo de defeito, também não ocorre cianose, pois, à medida
que a pressão atrial esquerda é maior do que a direita, há shunt
esquerdo-direito. Novamente, aqui há recirculação de sangue já
oxigenado. O fechamento inicial do forame oval é de natureza
funcional, como se a valva fosse empurrada contra o “batente”,
impedindo fluxo da esquerda para a direita. O fechamento anatômico
do forame oval ocorre até o primeiro ano de vida. Defeitos na valva
ou no próprio forame oval podem originar a CIA após o nascimento
(Figura 1.9). Lembrando que, durante a vida intrauterina, há
comunicação fisiológica entre os 2 átrios, embora o fluxo durante a
vida fetal seja da direita para a esquerda.
Figura 1.9 - Defeito do septo atrial
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
1.4.2.1 Diagnóstico
A sintomatologia depende do grau de shunt esquerdo-direito.
As manifestações da comunicação interatrial são mais comuns por
volta dos 3 ou 4 anos de vida, época em que as pressões
intracavitárias cardíacas estão sujeitas a algumas alterações e
resultam em maior shunt esquerdo-direito, aumento do átrio e
ventrículo direitos, podendo chegar à dilatação da artéria pulmonar.
Os sintomas mais frequentes, quando ocorrem, são dispneia,
palpitações e fadiga. Infecções respiratórias e déficit ponderal
podem acontecer, e a insuficiência cardíaca é um evento tardio. Ao
exame físico cardíaco, podem ser auscultados desdobramento fixo
de B2, que é típico dessa anomalia e ocorre pelo retardo no
esvaziamento do ventrículo direito, o qual apresenta volume
sanguíneo aumentado, sopro sistólico e, algumas vezes, sopro
diastólico. À radiografia de tórax, pode-se observar aumento da área
cardíaca, do tronco da artéria pulmonar e da trama vascular
pulmonar. O ECG pode apresentar alterações de condução
decorrentes da remodelação cardíaca, como QRS aumentado, e, em
50% dos pacientes, observa-se mudança na onda P, sugerindo
aumento atrial direito. O cateterismo cardíaco aponta aumento da
saturação do oxigênio nas amostras de sanguedo átrio direito,
ventrículo direito e artérias pulmonares em relação às saturações de
veias cavas superiores e inferiores.
Figura 1.10 - Ressonância magnética cardíaca que evidencia a comunicação interatrial
Fonte: Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular.
1.4.2.2 Tratamento
A correção cirúrgica da CIA é indicada a sintomáticos e àqueles com
relação fluxo pulmonar-sistêmico maior que 1,5:1. A correção
cirúrgica deve ser realizada eletivamente por volta dos 2 anos, para
evitar aumento crônico do átrio e do ventrículo direitos. O
procedimento é simples e praticamente sem mortalidade.
1.4.3 Persistência do canal arterial
O canal arterial (Figura 1.11) desempenha função primordial durante
a vida intrauterina, com fluxo da artéria pulmonar para a artéria
aorta. Com a aeração e a expansão pulmonares, há queda da
resistência vascular pulmonar, de forma que, quando há fluxo
residual pelo canal arterial, ele ocorre no sentido aorta-artéria
pulmonar, desde que não exista associação a hipertensão pulmonar.
Dessa forma, outra vez há “circulação fútil”, ou seja, parte do
sangue já oxigenado retorna à circulação pulmonar. O fechamento
funcional do canal arterial acontece fisiologicamente por volta das
primeiras 10 a 15 horas de vida no RN a termo e, mais tardiamente,
no pré-termo, entre o décimo quarto e o vigésimo dia de vida.
Figura 1.11 - Persistência do canal arterial
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
Caso não haja sorologia materna conhecida
para rubéola, aquela deve ser pesquisada na
confirmação desse tipo de cardiopatia, embora
a PCA seja relativamente mais prevalente em
prematuros, independentemente da presença
de outro tipo de doença.
1.4.3.1 Diagnóstico
Os achados de exame físico são sopro contínuo, tipo maquinaria, no
foco pulmonar e pressão arterial divergente (“fuga” da aorta →
pulmonar).
Vale lembrar que o RN prematuro responde mais satisfatoriamente
às medidas farmacológicas para fechamento de um canal arterial
persistente do que o nascido a termo. No entanto, no pré-termo, a
descompensação cardíaca pode ser muito mais precoce quando
comparada ao RN a termo. Na ausculta cardíaca, pode-se encontrar
um sopro sistólico clássico em região infraclavicular e esquerda,
descrito como sopro “em maquinaria” ou “em trovoada”. Também
podem ser encontrados pulsos periféricos amplos e ampla pressão
de pulso.
Em casos de PCA de pequeno fluxo, normalmente não há
repercussões nas pressões do átrio direito e do ventrículo direito, ao
passo que PCA de fluxo mais expressivo acaba gerando aumento
considerável nas pressões dessas 2 câmaras, bem como na artéria
pulmonar. Nesse caso, a PCA pode levar a doença vascular pulmonar
caso a doença de base não seja corrigida.
Com o aumento da pressão na artéria pulmonar e as alterações
anatômicas no leito arterial (muscularização), há elevação da
pressão no leito, podendo levar a inversão do fluxo no ducto arterial
e, consequentemente, cianose.
Na radiografia de tórax, pode-se observar aumento (hipertrofia) das
câmaras cardíacas esquerdas (Figura 1.12), o coração bombeia mais
sangue do que o volume circulante pelo hiperfluxo, embora ocorra
também aumento do ventrículo direito, da trama vasobrônquica e da
aorta ascendente.
Figura 1.12 - Radiografia de tórax que mostra aumento das câmaras cardíacas esquerdas
Fonte: Conexão anômala parcial de veias pulmonares em átrio direito com ausência de
comunicação interatrial, 2007.
O ECG pode evidenciar alterações compatíveis com sobrecarga
biventricular ou predomínio do ventrículo direito, uma vez que ela é
mais precoce. O ECO com Doppler é o exame padrão-ouro, pois
evidencia a própria persistência do canal e é possível que também
evidencie o fluxo sanguíneo local. Pode, ainda, estimar a hipertensão
pulmonar, quando ela está presente. As complicações são
insuficiência cardíaca congestiva, endarterite e doença vascular
pulmonar – Eisenmenger.
1.4.3.2 Tratamento
A abordagem inicial da PCA baseia-se em restrição hídrica,
diuréticos, visando diminuir o trabalho cardíaco, e ventilação
mecânica, quando necessário. Tal abordagem visa promover o
fechamento da PCA, tanto por medidas farmacológicas –
indometacina, ibuprofeno; esperam-se de 48 a 72 horas, com
fechamento em 80% dos casos – como por procedimentos cirúrgicos
(toracotomia ou cateterismo).
O tratamento é feito com drogas
(indometacina), cirurgia e cateterismo (“coils”).
Figura 1.13 - Cateterismo com “coil”
São contraindicações do uso do inibidor da prostaglandina E:
a) Sepse;
b) Plaquetopenia – menor que 80.000;
c) Hemorragia intracraniana;
d) Hiperbilirrubinemia;
e) Sangramento renal ou enteral;
f) Creatinina maior que 1,8 ou débito urinário menor que 1 mL/kg/h.
1.4.4 Retorno venoso anômalo parcial das veias
pulmonares
A síndrome da cimitarra é uma anomalia parcial da drenagem
venosa do pulmão direito para a veia cava inferior. À radiografia de
tórax, vê-se sombra de densidade vascular na silhueta cardíaca
direita.
Figura 1.14 - Cimitarra
Fonte: Worldantiques, 2014.
Figura 1.15 - Síndrome da cimitarra
Fonte: JVinocur, 2010.
1.4.5 Estenose pulmonar
Figura 1.16 - “Fácies de elfo”
Tal cardiopatia diz respeito a defeitos na valva pulmonar e em seu
anel, na região infundibular ou acima do anel pulmonar.
A estenose pulmonar está associada à rubéola congênita. Ocorre a
síndrome de Williams quando há associação a estenose aórtica
supravalvar, hipercalcemia idiopática, “fácies de elfo” e retardo
mental.
1.4.5.1 Diagnóstico
Classicamente, está qualificada entre as cardiopatias acianóticas, no
entanto, quando o grau de estenose é importante, pode apresentar-
se com cianose, dispneia e fadiga, que pioram ao esforço físico.
Outros achados ao exame físico incluem primeira bulha acentuada
na área tricúspide e segunda bulha na área pulmonar, estalido
protossistólico pulmonar e sopro sistólico em ejeção no segundo
espaço intercostal esquerdo irradiado para a região infraclavicular
esquerda e, algumas vezes, o pescoço. Eventualmente, o sopro pode
ser de tal intensidade que encobre as bulhas. O ventrículo direito
trabalha contra um obstáculo: a pressão em seu interior apresenta-
se aumentada, podendo haver hipertrofia concêntrica, ou seja,
aumento da espessura de suas paredes maior do que o aumento do
volume de seu interior. Essa hipertrofia pode ser observada por
radiografia de tórax, ECO ou ECG. Este pode evidenciá-la de forma
indireta, por meio das alterações elétricas que gera desvio do eixo
para a direita, ondas T positivas em derivações direitas e onda Q em
V1 associada a sobrecarga atrial direita. O ECO demonstra,
morfologicamente, estenose, mobilidade e espessura dos folhetos
valvares, tamanho do anel valvar, dilatação pós-estenótica e
gradiente transvalvar.
Figura 1.17 - Radiografia de tórax mostrando trama vascular pulmonar diminuída na
presença de aumento das cavidades direitas
Nota: o arco médio retificado orienta para a presença de obstrução da via de saída do
ventrículo direito. 
Fonte: Caso 1/2007 – Criança de três anos com Estenose Pulmonar Infundibular, 2007.
1.4.5.2 Tratamento
O objetivo do tratamento é a correção da estenose por meio de
valvoplastia com cateter e balão cirúrgico precoce seguido de
profilaxia para endocardite. Quando há estenose pulmonar com
cianose, o uso de prostaglandina E-1 pode proporcionar melhora do
quadro.
1.4.6 Estenose aórtica
Somente obstruções mais graves causam sintomas na infância. No
quadro clínico, o aumento da obstrução resulta em aumento da área
cardíaca, hipertrofia do ventrículo esquerdo, e diminuição do pulso.
1.4.6.1 Diagnóstico
Evolui com aparecimento súbito de insuficiência cardíaca
congestiva, edema pulmonar e, algumas vezes, colapso periférico.
Além disso, ocorre aparecimento de frêmito sistêmico sobre a área
aórtica, fúrcula e cervical, com estalido protossistólico aórtico e
mitral e sopro rude em ejeção de máxima intensidade sobre o
rebordo esternal direito. A radiografia revela área cardíaca normal
nas estenoses discretas e dilatação aórtica e hipertrofiade ventrículo
esquerdo nas estenoses graves. No ECG, há desvio de eixo para a
esquerda, aparecimento de onda R em V5 e V6, profunda em V1 e V2,
com padrão de “strain”, e alteração de repolarização ventricular. O
ECO serve para análise da válvula, mobilidade, espessura, tamanho
do anel, dilatação pós-estenótica, gradiente transvalvar, hipertrofia
do ventrículo esquerdo e obstruções subvalvares e supravalvares.
Figura 1.18 - Radiografia de tórax que salienta a dilatação do arco superior à direita
correspondente a aorta ascendente dilatada
Fonte: Caso 7/2003 - Instituto do coração do hospital das Clínicas da FMUSP, 2003.
1.4.6.2 Tratamento
Compreende seguimento do paciente assintomático e profilaxia de
endocardite. Nos casos críticos, trata-se primeiramente a
insuficiência cardíaca congestiva e prepara-se para a cirurgia.
1.4.7 Coarctação da aorta
Em 98% dos casos a coarctação é justaductal.
Figura 1.19 - Coarctação da aorta
Fonte: Nelson Textbook of Pediatrics.
Associada à síndrome de Turner e à válvula bicúspide em mais de
70% dos casos, trata-se de um estreitamento ou de obstrução do
arco aórtico que pode ocorrer antes da emergência do canal arterial,
na própria junção da aorta com este ou mesmo após a emergência
deste, porém, ainda no arco. Pode, também, ser classificada em
relação à emergência da artéria subclávia esquerda, 98% dos casos
ocorrem abaixo dela, na posição justaductal ou mesmo pré-ductal.
Figura 1.20 - Coarctação da aorta
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
Lembrando da circulação fetal e da posição do ducto arterial, note-se
que o ducto arterial se insere na aorta após a emergência das artérias
subclávias. Por isso, em casos de CoAo em que o estreitamento
acontece antes do ducto arterial, a circulação para os órgãos
abdominais e para os membros inferiores ocorre por intermédio da
manutenção da permeabilidade desse ducto. O sangue proveniente
do ventrículo direito é desviado para a aorta descendente por
intermédio do ducto arterial, e, dessa forma, é garantida a circulação
abaixo da coarctação, embora com baixa concentração de oxigênio.
1.4.7.1 Diagnóstico
Ao quadro clínico estará presente o sinal clássico, que é a diferença
de pulso e pressão de membros superiores e inferiores. Por meio da
palpação simultânea de pulsos, será verificado o atraso radial-
femoral.
Figura 1.21 - Cianose diferencial
Fonte: Nelson Textbook of Pediatrics.
O quadro clínico pode variar desde totalmente assintomático até com
manifestação clara de insuficiência cardíaca.
O sinal clínico de maior expressão de coarctação da aorta é a
diferença de pulsos e de pressão arterial entre os membros inferiores
e superiores. Os pulsos femorais, poplíteos, tibiais posteriores e
pediosos são mais fracos quando comparados aos braquiais, radiais e
carotídeos. Tal diferença varia na dependência da circulação pelas
artérias mamárias internas e intercostais oriundas das subclávias
ou, até mesmo, das artérias frênicas e vertebrais. A diferença nas
pressões sistólicas pode variar entre 145 mais ou menos 12mmHg
nos membros superiores e 70 mais ou menos 10 mmHg nos
membros inferiores. Precórdio pulsátil ou hiperdinâmico não é raro,
bem como a presença de frêmitos. À ausculta, verifica-se sopro
sistólico na borda esternal esquerda entre o terceiro e o quarto
espaços intercostais, que se irradiam para o dorso e o pescoço. Em
alguns casos, pode haver sopro sistólico audível na região
interescapular, na altura correspondente à coarctação.
Atualmente, o diagnóstico é obtido, em especial, por meio de ECO.
Entretanto, outros exames podem contribuir, como o ECG, que pode
mostrar alterações importantes no seguimento ST e ondas T
negativas em V5 e V6. As alterações na radiografia de tórax
dependem da idade do paciente, dos efeitos da hipertensão arterial e
da circulação colateral. Entre os lactentes, verificam-se aumento de
área cardíaca e congestão pulmonar e, nas crianças maiores,
aumento acentuado do ventrículo esquerdo. A partir da primeira
década, acentua-se tal aumento, e a artéria subclávia aumentada é
visualizada com uma sombra no mediastino superior.
Eventualmente, verifica-se imagem de dilatação da aorta
descendente. Utilizando-se de radiografia de esôfago contrastado,
pode-se encontrar uma imagem de “3 invertido”, com
espessamento das bordas inferiores das costelas com erosão central
– sinal de Röesler.
Figura 1.22 - Sinal de Röesler (setas)
Fonte: Medical Pictures Info.
1.4.7.2 Tratamento
No tratamento inicial do RN em estado grave, administra-se
prostaglandina até a avaliação do grau de comprometimento da
circulação e, se necessário, manutenção da medicação até correção
cirúrgica. Em alguns casos, pode-se fazer correção eletiva, desde que
o RN se encontre assintomático. Em casos de RN com sinais de
insuficiência cardíaca, esta deve ser primeiramente compensada
para, em seguida, ser realizado procedimento cirúrgico. Entretanto,
um ótimo momento para a correção cirúrgica está entre o segundo e
o quarto ano. As complicações aumentam com a idade, podendo
ocorrer, nos adultos não tratados, hipertensão arterial,
encefalopatia hipertensiva, coronariopatia, além de endarterite e
endocardite.
1.4.8 Defeito do septo atrioventricular
É uma anormalidade do desenvolvimento dos coxins endocárdicos
que resulta em uma CIA tipo ostium primum, uma CIV e uma única
valva atrioventricular.
Comporta-se mecanicamente como uma grande CIV. O shunt ocorre
da esquerda para a direita, e pode ocorrer aumento da resistência
pulmonar. É a anomalia cardíaca mais frequente nos pacientes com
síndrome de Down.
Clinicamente se manifesta por dispneia, baixo desenvolvimento
ponderoestatural e infecções respiratórias de repetição.
Ao exame, o sopro pode ser discreto pois as pressões nos átrios e
ventrículos é equilibrada. A segunda bulha é hiperfonética e pode ser
desdobrada.
Quando a hipertensão pulmonar se desenvolve com hiper-
resistência vascular pulmonar aparece a cianose generalizada, que é
mais precoce nos pacientes com síndrome de Down.
O exame padrão ouro para seu diagnóstico é o ecocardiograma com
Doppler.
O tratamento é sempre cirúrgico.
1.5 PROLAPSO MITRAL
Anormalidade valvar mais comum, ocorre geralmente por
degeneração mixomatosa na valva e nas cordoalhas. A valva fica
espessada e alargada, e quando o ventrículo esquerdo se contrai, os
folhetos da valva se projetam para dentro do ventrículo, permitindo
refluxo do sangue para dentro do átrio esquerdo. Quando o prolapso
é significativo pode levar à insuficiência cardíaca e arritmia.
A causa da degeneração mixomatosa é desconhecida, mas tem um
forte componente hereditário. É especialmente frequente na
síndrome de Marfan.
A maioria dos pacientes são assintomáticos, porém quando há
queixa o cansaço e a palpitação são as queixas mais frequentes.
Quando intenso, o prolapso se manifesta com sinais de insuficiência
cardíaca.
Ao exame físico ocorre estalido mitral característico seguido por um
ruído ou sopro.
O exame padrão-ouro é o ecocardiograma com Doppler.
O tratamento não é necessário na maioria dos pacientes. Pacientes
com regurgitação mitral ou evidência de degeneração mixomatosa
devem receber profilaxia com antibiótico antes de qualquer
procedimento que possa causar bacteriemia.
Qual é o sinal clínico
clássico da coarctação de
aorta?
O sinal clínico clássico da coarctação de aorta é a diferença
de pulso e pressão de membros superiores e inferiores. Por
meio da palpação simultânea de pulsos, será verificado o
atraso radial-femoral.
Quais alterações
caracterizam a tetralogia de
Fallot?
2.1 INTRODUÇÃO
As cardiopatias congênitas podem ser divididas de acordo com a
fisiopatologia, com fluxo pulmonar diminuído – por exemplo:
tetralogia de Fallot, anomalia de Ebstein e outras – ou aumentado –
transposição dos grandes vasos, truncus arteriosus e outros. A
radiografia de tórax é útil para a diferenciação inicial entre essas 2
categorias.
As lesões cianóticas com fluxo pulmonar diminuído incluem
obstrução do fluxo sanguíneo pulmonar emassociação a existência
de um caminho pelo qual o sangue venoso sistêmico possa ser
desviado da direita para a esquerda e entrar na circulação sistêmica.
O grau de cianose depende da gravidade da obstrução do fluxo
pulmonar. Caso a obstrução seja leve, o paciente pode ser acianótico
em repouso, além da hipótese de crises hipercianóticas em condições
de estresse. Nos casos de obstrução muito grave, o fluxo pulmonar
pode depender da patência do ducto arterial. Quando o ducto se fecha
nos primeiros dias de vida, o neonato passa por profunda hipoxemia
e choque.
As lesões cianóticas com fluxo pulmonar aumentado apresentam a
cianose causada por conexões ventriculoarteriais anormais –
transposição dos grandes vasos – ou por mistura total do sangue
venoso sistêmico e pulmonar no coração – truncus arteriosus.
2.2 TETRALOGIA DE FALLOT
Tal cardiopatia consiste em 4 alterações interligadas, que produzem
cianose exatamente devido à concomitância de algumas destas
(Figura 2.1).
A tetralogia de Fallot envolve comunicação
interventricular, estenose pulmonar,
dextroposição da aorta e hipertrofia do
ventrículo direto.
Figura 2.1 - Tetralogia de Fallot
Legenda: (A) Tetralogia de Fallot – a) estenose da válvula pulmonar; b) hipertrofia do
ventrículo direito; c) dextroposição da aorta; d) comunicação intraventricular; (B) radiografia
de tetralogia de Fallot “em tamanco holandês”.
A obstrução na via de saída do ventrículo direito leva a aumento da
pressão durante a sístole. Dessa forma, na dependência do grau da
obstrução, há shunt direito-esquerdo entre os ventrículos. A aorta
dextroposta situa-se, parcialmente, sobre a comunicação
interventricular (CIV), por consequência, uma parte do sangue
lançado na circulação sistêmica é constituída de hemoglobina
reduzida. Quando a obstrução é discreta, o fluxo entre os ventrículos
acontece da esquerda para a direita. Portanto, o grau de obstrução na
via de saída do ventrículo direito determina o grau de cianose e da
sintomatologia do paciente. A cianose pode não ser inicialmente
observada na dependência da permeabilidade do canal arterial, ou
seja, o sangue é desviado do ventrículo direito para o esquerdo e
lançado na artéria aorta. Na dependência do valor de pressão da
artéria pulmonar, pode haver fluxo da aorta para a artéria pulmonar
e daí para os pulmões, sendo então oxigenado. Caso essa situação se
perpetue, as manifestações de insuficiência cardíaca podem preceder
a cianose. Em outros casos, esta pode surgir gradativamente à
medida que se fecha o canal arterial.
2.2.1 Diagnóstico
O quadro clínico pode variar de discreta cianose em mucosa, lábios e
leitos ungueais, eventualmente visíveis apenas ao choro ou à
mamada, e apresentar-se com baqueteamento de dedos e
hipodesenvolvimento físico em casos mais expressivos. O exame
físico pode evidenciar sopro sistólico ejetivo, segunda bulha única e
frêmito. Também é comum haver policitemia, um mecanismo de
compensação da cianose. Crises hipercianóticas ou hipoxêmicas
ocorrem com lactentes e crianças até 2 anos, são paroxísticas e
caracterizam-se por hiperpneia, irritabilidade e choro prolongado –
que aumenta a cianose –, podendo levar o lactente a síncope,
convulsões e, esporadicamente, morte. Tais crises podem ocorrer
quando há aumento da resistência ao fluxo de saída do ventrículo
direito ou diminuição da resistência sistêmica, pelo aumento do
shunt direito-esquerdo e queda na oxigenação ainda maior do que a
existente de base. No momento da crise, deve-se colocar o paciente
em posição genupeitoral – cócoras – por diminuir a circulação nos
membros inferiores e consequente redução do shunt direito-
esquerdo, administrar oxigênio e morfina.
O diagnóstico, na maioria das vezes, é obtido intraútero por
ultrassonografia, porém a doença não tem repercussão nesse
período. Após o nascimento, o ecocardiograma (ECO) continua a ser
o exame de eleição, em virtude da sua facilidade e acurácia. A
radiografia de tórax mostra área cardíaca normal ou discretamente
aumentada, botão aórtico saliente e ápice cardíaco elevado acima do
diafragma. O coração apresenta-se com imagem semelhante a um
tamanco holandês, sendo assim chamada. Em 25% dos casos, ocorre
arco aórtico para a direita: coração em sabot. O eletrocardiograma
(ECG) mostra alterações elétricas compatíveis com hipertrofia
ventricular direita, onda T ascendente em V1 com onda R pura e sem
onda S.
Figura 2.2 - Radiografia de tórax – diagnóstico da tetralogia de Fallot
Fonte: Caso 6/2004 – lactente de 14 meses com tetralogia de Fallot e com discreto
hiperfluxo pulmonar. Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da FMUSP, 2004.
2.2.2 Tratamento
O tratamento para as crises hipercianóticas de hipóxia é composto
por:
a) Oxigênio;
b) Morfina para suprimir o centro respiratório e abolir a taquipneia;
c) Posição genupeitoral para aumentar a resistência vascular
periférica;
d) Vasoconstritores para aumentar a resistência vascular sistêmica:
epinefrina 0,01 mg/kg;
e) Bicarbonato de sódio – 1 mEq/kg – intravenoso;
f) Betabloqueadores para relaxar a musculatura infundibular –
propranolol via IV;
g) Cetamina – 1 a 3 mg/kg – para sedar e aumentar a resistência
vascular periférica;
h) Tetralogia de Fallot – o tratamento para RNs com obstrução
importante compreende, inicialmente, a manutenção de prostaglandina
em infusão contínua até ser realizada a cirurgia paliativa – shunt
Blalock-Taussig –. Esta é indicada para crianças abaixo de 6 meses,
com más condições clínicas ou com anatomia desfavorável. Consiste
em um conduto que liga a artéria subclávia ao ramo homolateral da
artéria pulmonar. A cirurgia corretiva deve ser feita entre 3 meses e 1
ano, e consiste em alívio da obstrução do trato de saída de ventrículo
direito, removendo as faixas de músculo ali localizadas e promovendo
o fechamento da CIV com um patch. Por vezes pode ser necessária
uma valvotomia – valva pulmonar estenótica.
2.2.3 Complicações
a) Trombose cerebral – policitemia, desidratação – menor que 2 anos;
b) Abscesso cerebral – maior que 2 anos;
c) Endocardite.
2.3 ANOMALIA DE EBSTEIN DA
VÁLVULA TRICÚSPIDE
Na anomalia de Ebstein da válvula tricúspide, temos, como
alterações, aumento no tamanho do átrio direito, válvula tricúspide
regurgitante, obstrução ao fluxo de saída do ventrículo direito –
tricúspide “em vela de barco” – e excesso de volume do átrio direito
pelo forame oval para o átrio esquerdo: shunt que gera cianose.
Figura 2.3 - Radiografia de tórax de paciente com anomalia de Ebstein e esquema com as
correspondências anatômicas
Trata-se de uma doença rara, que representa 0,04% das cardiopatias
congênitas e consiste no deslocamento para baixo de válvula
tricúspide anormal, entrando no ventrículo direito e dividindo-o em
2 partes: a primeira, que é uma continuidade do átrio direito, e a
segunda, menor, que funciona como ventrículo. O átrio direito é
muito grande, e a válvula tricúspide, em geral, regurgitante (Figura
2.4).
Figura 2.4 - Anomalia de Ebstein
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
O débito do ventrículo direito é baixo. Já o aumento de volume do
átrio direito leva a desvio do sangue deste, por meio do forame oval,
para o átrio esquerdo, provocando a cianose. Quanto ao quadro
clínico, neonatos com formas graves de anomalia de Ebstein
apresentam cianose intensa, cardiomegalia gigante e sopro sistólico;
também são comuns o ritmo de galope e a presença de estalidos. O
fluxo pulmonar costuma depender do canal arterial.
2.3.1 Diagnóstico
O diagnóstico é feito com o ECG, que indica bloqueio do ramo direito;
pode ocorrer taquicardia supraventricular – síndrome Wol�-
Parkinson-White –; a radiografia revela cardiomegalia, e o ECO ou o
cateterismo confirma o diagnóstico.
Figura 2.5 - Radiografia de tórax com grande aumento de área cardíaca à custa das
câmaras direitas
Fonte: Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular.
2.3.2 Tratamento
O tratamento em neonatos com hipóxia grave deve ser feito com
prostaglandina. Algumas vezes é indicado shunt aortopulmonar–
procedimento de Starnes –, ao passo que o tratamento cirúrgico está
indicado para os pacientes com insuficiência cardíaca, cardiomegalia
progressiva, arritmia cardíaca e cianose.
2.4 TRANSPOSIÇÃO DE GRANDES
ARTÉRIAS
A Transposição de Grandes Artérias (TGA) é uma malformação
cardíaca congênita em que a relação atrioventricular está mantida,
de forma que parte ou todo o sangue que chega ao átrio direito passa
ao ventrículo direito. O sangue proveniente da circulação chega ao
átrio direito por meio das veias cavas. Do ventrículo direito emerge a
artéria aorta, devolvendo o sangue à circulação sistêmica (Figura
2.6).
O sangue proveniente dos pulmões chega ao átrio esquerdo, de onde
parte, ou todo o sangue chega ao ventrículo esquerdo. Deste emerge
ao tronco pulmonar, retornando aos pulmões. Como se pode notar,
caso não haja mistura desse sangue em algum ponto, têm-se 2
circulações “fechadas” não comunicantes e os tecidos jamais
receberiam sangue oxigenado.
Figura 2.6 - Fluxo invertido
Legenda: (A) coração normal – circulação normal; (B) coração com malformação –
circulação em coração com transposição dos grandes vasos.
Por isso, é impossível haver sobrevivência. Caso contrário,
certamente o sangue da circulação sistêmica se misturaria ao da
circulação pulmonar. Na maioria das vezes, isso acontece por meio
de CIA, CIV e/ou PCA. A TGA pode apresentar-se com septo
interventricular íntegro ou com CIV. No caso de septo
interventricular íntegro, a comunicação entre as 2 circulações
acontece por meio da CIA e do canal arterial. Com seu o fechamento,
há aumento da cianose e insuficiência cardiorrespiratória gradativa.
A transposição de grandes artérias apresenta maior incidência em
filhos de diabéticas e em homens (3:1).
2.4.1 Diagnóstico
A ausculta cardíaca apresenta sopro sistólico em ejeção e de
intensidade variável na área pulmonar, segunda bulha única e, no
caso de PCA, sopro contínuo. O ECG apresenta alterações elétricas
que indicam desvio de eixo para a direita, sobrecarga ventricular
direita e V1 com morfologia Rs e R’ com onda T positiva em V1 e V2.
Quando há CIV, a comunicação entre as 2 circulações está garantida;
mesmo com o fechamento do canal arterial, a cianose
eventualmente pode não ser vista e, quando presente, não revela
grande piora com o seu fechamento. No entanto, após a terceira
semana de vida, o RN já pode apresentar algum sinal de insuficiência
cardíaca, com taquicardia e taquipneia. A ausculta pode apresentar-
se com sopro contínuo de alta frequência e de localização
paraesternal esquerda baixa, com segunda bulha hiperfonética em
área pulmonar e tricúspide. O ECG mostra alterações elétricas
sugestivas de sobrecarga de câmaras esquerdas e ventrículo direito.
Figura 2.7 - Radiografia de tórax com situs solitus visceral
Nota: segundo arco escavado com afilamento de estruturas mediastinais e proeminência
vascular pulmonar com discreta oligoemia periférica, típica de portador de transposição de
grandes artérias. 
Fonte: Portadora de transposição das grandes artérias operada em idade pré-escolar,
2007.
2.4.2 Tratamento
As opções de tratamento são:
a) Prostaglandina E1;
b) Atriosseptostomia de Rashkind;
Em se tratando de cirurgia:
a) Troca arterial (cirurgia de Jatene), a qual deve ser feita nas
primeiras 2 semanas de vida, porque o ventrículo esquerdo pode
hipotrofiar e não aguentar a pressão;
b) TGA com CIV, a qual pode ser feita após 2 semanas de vida, uma
vez que a CIV equaliza as pressões entre os ventrículos.
O tratamento baseia-se, sempre, no uso de prostaglandina E-1, na
forma intravenosa e contínua, oxigênio, correção de qualquer
distúrbio acidobásico e/ou hidroeletrolítico, atriosseptostomia com
cateter balão ou lâmina e, no caso de insuficiência cardíaca, uso de
digoxina e diuréticos. E o tratamento cirúrgico, sempre indicado,
pode ser a cirurgia de Jatene, de Senning ou, ainda, de Rastelli, de
preferência até a segunda semana de vida.
2.5 RETORNO VENOSO PULMONAR
ANÔMALO TOTAL
Nessa condição, as veias pulmonares podem drenar acima ou abaixo
do diafragma. O diagnóstico é feito por meio de radiografia de tórax,
e é patognomônica em crianças maiores a imagem “em boneco de
neve”.
Figura 2.8 - Imagem “em boneco de neve”
2.6 SÍNDROME DO CORAÇÃO
ESQUERDO HIPOPLÁSICO
Nessa síndrome, não há o desenvolvimento do lado esquerdo do
coração (atresia aórtica, atresia mitral). Dentre as alterações, estão a
hipoplasia da aorta ascendente e o ventrículo esquerdo não
funcional. O ventrículo direito mantém as circulações sistêmica e
pulmonar.
Figura 2.9 - Fisiologia da síndrome do coração esquerdo hipoplásico
Legenda: os números dentro dos círculos representam os valores de saturação de
oxigênio. 
Fonte: Nelson Textbook of Pediatrics.
Figura 2.10 - Fisiologia da síndrome do coração esquerdo hipoplásico
Nota: o sangue com pouca oxigenação, oriundo da circulação sistêmica, retorna ao átrio
direito normalmente. A maior parte do sangue oxigenado que retorna dos pulmões para o
átrio esquerdo atravessa um defeito do septo atrial para se unir ao sangue pouco
oxigenado no átrio direito. Esse sangue misto é, então, ejetado pelo ventrículo direito para
a artéria pulmonar. O sangue na artéria pulmonar é direcionado aos pulmões e à aorta
através de um canal arterial patente. 
Fonte: adaptado de Comparison of Shunt Types in the Norwood Procedure for Single-
Ventricle Lesions, 2010.
2.6.1 Tratamento
A cirurgia de Norwood possui 3 estágios (respectivamente, Figuras
2.11, 2.12 e 2.13).
Figura 2.11 - Primeiro estágio
Legenda: (A) o tronco da artéria pulmonar é transectado, e é criada uma (B) “neoaorta”,
formada com a cirurgia de Norwood e o shunt de Blalock-Taussig modificado.
Figura 2.12 - Segundo estágio: anastomose de Glenn
Figura 2.13 - Terceiro estágio: procedimento de Fontan com a utilização de um conduto
extracardíaco para conectar o fluxo sanguíneo da veia cava inferior com a artéria pulmonar
Figura 2.14 - Procedimento de Fontan
2.7 TRUNCUS ARTERIOSUS
Um tronco arterial único sai do coração e supre as circulações
sistêmica e pulmonar. Uma CIV está sempre presente com o tronco
arterial, ficando logo acima da CIV, recebendo sangue tanto do
ventrículo direito quanto do esquerdo. O tronco arterial origina a
aorta ascendente e a artéria pulmonar (Figura 2.15).
A saturação de oxigênio na aorta é a mesma que a observada na
artéria pulmonar, definição de lesão com mistura total.
2.7.1 Diagnóstico
O quadro clínico apresenta-se de modo que, como o fluxo pulmonar
é grande, há pouca cianose. O hiperfluxo pulmonar também leva a
insuficiência cardíaca. O truncus arteriosus pode estar associado à
síndrome de DiGeorge.
A síndrome de DiGeorge envolve orelhas de baixa implantação, boca
pequena, fenda palatina, ausência de timo e das paratireoides,
anomalias cardíacas, atraso mental, déficit de crescimento,
convulsões e problemas cognitivo-comportamentais.
Figura 2.15 - Radiografia de tórax de paciente jovem com truncus arteriosus
Nota: área cardíaca aumentada e mediastino estreito; percebe-se, ainda, pletora pulmonar.
2.7.2 Tratamento
O tratamento é cirúrgico e compreende o fechamento da CIV, a
separação da artéria pulmonar do tronco arterial e o estabelecimento
de um circuito entre o ventrículo direito e a artéria pulmonar (reparo
de Rastelli).
Figura 2.16 - (A) Coração normal e (B) coração com truncus arteriosus
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
Quais alterações
caracterizam a tetralogia de
Fallot?
A tetralogia de Fallot é caracterizada pela presença de
comunicação interventricular, dextroposição da aorta,
estenose pulmonar e hipertrofia de ventrículo direito.
Como deve ser aferida a
pressão arterial nas
crianças e adolescentes e
como é definida e
classificada a hipertensão
arterial?
3.1 INTRODUÇÃO
A Hipertensão Arterial (HA) é conceituada pela 7ª Diretriz Brasileira
de Hipertensão Arterial, publicada em 2016, como uma condição
clínica multifatorial caracterizada pela elevação sustentada dos
níveis pressóricos.
A porcentagemde crianças e adolescentes com HA dobrou nas
últimas décadas, com prevalência estimada de 3,5%, e esse aumento
é atribuído ao aumento da prevalência de sobrepeso e obesidade na
população pediátrica.
A etiologia da HA pediátrica depende muito da idade, sendo que nas
crianças menores é mais frequente a HA secundária a nefropatias e,
em adolescentes, a HA primária associada a causas genéricas e
obesidade.
A HA nas crianças costuma ser assintomática, porém 40% já podem
apresentar hipertrofia de ventrículo esquerdo, fator preditor
importante de arritmias e de insuficiência cardíaca na idade adulta,
além da lesão de outros órgãos-alvo como retina e carótidas. Além
disso, a Pressão Arterial (PA) elevada durante a infância se
correlaciona com aumento da PA na idade adulta e presença de HA. Já
a presença de valores normais de PA durante a infância se
correlaciona com a ausência de HA na idade adulta.
O diagnóstico precoce e tratamento da PA elevada na infância se
associa ao menor risco de comorbidades na vida adulta, como HA e
síndrome metabólica, e por isso se recomenda a aferição anual da PA
em consultas de rotina a partir dos 3 anos de idade para todas as
crianças. As crianças menores de 3 anos devem ter sua PA avaliada
em situações de risco específicas, como nefropatias, uso de drogas
que elevam a PA e cardiopatias congênitas.
A aferição da PA deve ser feita respeitando-se as padronizações de
medição, que serão abordadas no decorrer deste capítulo.
3.2 DEFINIÇÕES
Em 2004, com a publicação do National High Blood Pressure
Education Program (NHBPEP), foi unificada e normatizada a
classificação da PA na população pediátrica. Em Pediatria,
diferentemente da população adulta, os valores pressóricos normais
são definidos de acordo com dados obtidos a partir da aferição da PA
de crianças sadias e distribuídos em uma tabela normativa com base
na idade cronológica, sexo e percentil de estatura.
A publicação de 2004 foi atualizada em 2017 pela American Academy
of Pediatrics com os novos valores e classificação de PA que serão
abordados ao longo do capítulo. A grande mudança foi a retirada das
crianças com sobrepeso e obesidade das tabelas, o que causou uma
diminuição nos valores considerados normais de PA, e
consequentemente, um aumento no número de hipertensos.
A 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial
foi publicada em 2016 e, portanto, utiliza a
classificação adotada em 2004. A Sociedade
Brasileira de Pediatria já recomenda a adoção
dos novos valores e termos publicados pela
American Academy of Pediatrics em 2017.
É considerada PA normal qualquer valor de Pressão Arterial Sistólica
(PAS) e Pressão Arterial Diastólica (PAD) que esteja abaixo do
percentil 90 – p90 – para idade, sexo e estatura. Isso não mudou
com a atualização das tabelas dos valores de PA.
De acordo com a classificação abordada na 7ª Diretriz Brasileira de
Hipertensão Arterial, crianças e adolescentes que apresentam PAS
e/ou PAD ≥ p95 em 3 aferições diferentes são considerados
hipertensas. Crianças com valores de PAS e/ou PAD ≥ p90 e < p95 e
adolescentes com PAD/PAS ≥ 120x80 mmHg e < p95 são
considerados pré-hipertensos.
A hipertensão estágio 1 (HA 1) era considerada quando os valores
pressóricos estavam entre o percentil 95 – p95 – e 5mmHg acima do
percentil 99 – p99 –. A hipertensão estágio 2 (HA 2) era considerada
quando os valores pressóricos estivessem mais que 5 mmHg acima
do p99.
A nova classificação não considera mais o p99 e muda o termo “pré-
hipertensão” para “pressão arterial elevada”, além de dividir as
crianças e os adolescentes de 13 anos ou mais, conforme as Tabelas a
seguir.
Tabela 3.1 - Para crianças entre 1 e 13 anos de idade
Fonte: American Academy of Pediatrics, 2017.
Tabela 3.2 - Para crianças de 13 anos ou mais
Fonte: American Academy of Pediatrics, 2017.
3.3 ETIOLOGIA
A HA pode ser primária, sem causa identificável, ou secundária, com
causa identificável. A HA primária é a mais prevalente em
adolescentes, principalmente naqueles com sobrepeso e obesidade.
No entanto, é um diagnóstico de exclusão, e as causas secundárias
devem ser investigadas sempre que possível. A obesidade, sexo
masculino, etnias hispânica e africana, histórico familiar de HA,
ausência de aleitamento materno e agravos no período perinatal e
pós-natal são fatores de risco para a HA primária.
Considerar como mais frequente a hipertensão
secundária em crianças menores e hipertensão
primária em crianças maiores de 6 anos e
adolescentes.
A HA secundária é mais frequente em crianças mais jovens, menores
de 6 anos, mas pode acometer todas as faixas etárias. As doenças
renais correspondem à principal etiologia – 60% a 90%– e incluem
nefropatias parenquimatosas, renovasculares e obstrutivas. As
doenças endócrinas, como excesso de mineralocorticoides e doenças
da tireoide, correspondem a 5% dos casos, e a coarctação de aorta, a
2%. A HA secundária também pode ser secundária a
neurofibromatose, ser causada por medicamentos— corticoides,
anticoncepcionais orais, estimulantes do sistema nervoso central –
por exposição ambiental – substâncias como mercúrio, cádmio,
ftalatos e chumbo – ou por HA monogênica.
3.4 DIAGNÓSTICO
3.4.1 Aferição da pressão arterial
A aferição da PA deve ser feita em crianças saudáveis pelo menos
uma vez ao ano a partir dos 3 anos de idade. Crianças com 3 anos ou
mais, com fatores de risco para HA, devem ter sua PA aferida em
cada visita ao serviço de saúde. Crianças menores que 3 anos, em
situações de risco para HA, devem ter sua PA aferida em toda
consulta de rotina ou conforme necessário.
São fatores de risco para aferição de PA em menores que 3 anos:
a) Nefropatias, ITU de repetição;
b) Cardiopatias congênitas corrigidas ou não;
c) Em uso de drogas que elevam a PA;
d) Prematuro menores que 32 semanas, muito baixo peso ao nascer,
com antecedente de cateterização umbilical ou outras complicações
com necessidade de internação em UTI no período neonatal;
e) Submetidos a transplantes de órgãos sólidos ou medula óssea;
f) Neoplasias;
g) Evidências de aumento da pressão intracraniana;
h) Outras doenças associadas à hipertensão – neurofibromatose,
anemia falciforme.
Aferir a PA pelo menos 1 vez ao ano em crianças
saudáveis ≥ 3 anos. Nas crianças ≥ 3 anos com
fator de risco para HA, aferir a PA em toda visita
médica. Aferir a PA em crianças < 3 anos com
fatores de risco para HA conforme necessário.
Para aferir a PA, a criança deve estar calma por pelo menos 5
minutos, preferencialmente sentada, com os pés e as costas
apoiados. Alimentos ou bebidas estimulantes não devem ser
oferecidos antes da aferição. O braço escolhido deve ser o direito –
pacientes com coarctação de aorta têm uma PA falsamente baixa no
braço esquerdo – e ele deve estar apoiado no nível do coração. O
método preferencial é o auscultatório e, na sua ausência, indica-se o
método oscilométrico. Caso ocorra alteração no valor da PA pelo
método oscilométrico, esta deve ser confirmada com o método
auscultatório.
Deve-se sempre usar um manguito adequado para cada criança. A
escolha do manguito é feita através da medida da circunferência do
braço no ponto médio entre o acrômio e o olecrânio. O comprimento
da bolsa inflável deve ser de 80 a 100% da circunferência do braço, e
a largura deve equivaler a 40% da circunferência do braço.
O comprimento do manguito deve ser de 80 a
100% da circunferência do braço, e a largura
deve equivaler a 40% da circunferência do
braço. Os manguitos menores que os ideais
superestimam a PA, e os maiores mostram
valores mais baixos.
Figura 3.1 - Técnica de medida da pressão arterial
Fonte: adaptado de Hipertensão arterial na infância, 2003.
Aferir a PA pelo menos 2 vezes, no mesmo braço, com um intervalo
de tempo de 1 a 2 minutos. Se o valor da segunda medida for > 5
mmHg, afere-se novamente até que se chegue a um valor estável.
Caso a medida da PA no membro superior direito esteja elevada,
outra aferição deve ser feita no membro superior esquerdo e em um
dos membros inferiores. Essa medida deve ser feitacom o paciente
deitado e o manguito deve ser colocado na panturrilha de modo a
cobrir pelo menos 2 terços da distância entre o tornozelo e o joelho.
O diagnóstico de HA só deverá ser feito se as medidas de PAS e/ou
PAD estiverem ≥ p95 ou ≥ 130x80 mmHg em pelo menos 3 visitas
diferentes ao serviço de saúde.
O diagnóstico de HA só deve ser feito quando as
medidas de PAS e, ou PAD estiverem maior que
p95 ou maior que 130x80 mmHg em pelo menos
3 visitas diferentes ao serviço de saúde.
Muitas vezes, as crianças que apresentam aumento de PA na
primeira visita têm redução importante nos valores de PA na visita
subsequente. É o chamado efeito de acomodação, que resulta da
diminuição da ansiedade da primeira medida, responsável pela
Hipertensão do Avental Branco (HAB). A HAB é uma situação clínica
na qual o paciente apresenta valores elevados de PA quando aferida
no consultório, porém apresenta valores normais de PA quando
aferidas por Medida Ambulatorial da Pressão Arterial (MAPA) ou
Medida Residencial da Pressão Arterial (MRPA). A prevalência
descrita de HAB nas crianças é de 22 a 32%.
A realização de MAPA em crianças e adolescentes é indicada na
investigação da HAB, na hipertensão mascarada e no seguimento de
pacientes com PA elevada ou HA.
3.4.2 Anamnese
Detalhar as informações sobre o nascimento, crescimento e
desenvolvimento, antecedentes de doenças renais e urológicas,
endócrinas, cardíacas e neurológicas. Avaliar o histórico nutricional
e se há consumo aumentado de sódio, alimentos com muita gordura
e bebidas açucaradas em detrimento de vegetais, frutas e alimentos
com pouca gordura.
Avaliar o histórico de atividade física e sedentarismo, histórico
psicossocial – depressão, bullying, ansiedade, maus-tratos, uso de
álcool e tabaco – e história familiar de hipertensão.
3.4.3 Exame físico
Sempre avaliar peso, estatura e índice de massa corpórea nas curvas
padronizadas. Um exame físico detalhado pode mostrar indícios de
que a HA é secundária ou evidenciar lesão de órgão-alvo e
complicações associadas a HA. Atraso no crescimento pode ser
indício de doença crônica, aumento da frequência cardíaca pode
indicar hipertireoidismo ou fenilcetonúria, hipertrofia das adenoides
está associada a distúrbios do sono, e acantose nigricans sugere
resistência a insulina e diabetes.
Sempre avaliar a PA nas crianças que já têm diagnóstico de HA ou de
PA elevada nos 2 braços e em 1 das penas. A PA normalmente é cerca
de 10 a 20 mmHg mais elevada nos membros inferiores do que nos
superiores. Uma inversão nesses valores pode indicar coarctação de
aorta.
3.4.4 Exames complementares
Os exames subsidiários têm como objetivo definir a etiologia da HA,
identificar lesão de órgão-alvo e fatores de risco cardiovascular.
De acordo com a 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial, todas
as crianças e adolescentes com HA 1 e 2 devem ser avaliadas para
buscar lesão de órgão-alvo. Polissonografia ou poligrafia residencial
está indicada para crianças e adolescentes com distúrbio de sono.
Exames específicos para investigar HA secundária estão listados a
seguir:
a) Hemograma completo;
b) Função renal e eletrólitos (incluindo cálcio e magnésio);
c) Perfil lipídico;
d) Ácido úrico sérico;
e) Glicemia de jejum;
f) Exame de urina I e urocultura;
g) Radiografia de tórax;
h) Eletrocardiograma – ecodopplercardiograma;
i) Ultrassonografia renal com Doppler de artérias renais;
j) Fundoscopia.
São exames para confirmação de hipertensão arterial secundária:
a) Dosagem de eletrólitos na urina, proteinúria, creatinina urinária;
b) Nível sérico de renina (ou atividade de renina plasmática),
aldosterona, cortisol salivar, PTH, TSH, T4 livre e T3 livre;
c) Eletroforese de hemoglobina;
d) Autoanticorpos específicos: FAN, anti-DNA, p-ANCA, c-ANCA;
e) Catecolaminas e metanefrinas na urina (ou metanefrina plasmática)
e cintilografia com metaiodobenzilguanidina.
A American Academy of Pediatrics recomenda, além dos exames
citados anteriormente, também solicitar aos pacientes obesos
hemoglobina glicada, transaminases – pesquisa de esteato-hepatite
– e perfil lipídico em jejum.
3.5 MANEJO INICIAL DO PACIENTE ATÉ
O DIAGNÓSTICO
3.5.1 Pacientes com pressão arterial elevada
A American Academy of Pediatrics recomenda que, após a primeira
consulta, o paciente com PA elevada seja orientado quanto a
mudanças do estilo de vida, como perda de peso, reeducação
alimentar e atividade física, e que seja reavaliado em 6 meses. Se a
PA persistir > p90, (checar a PA sempre nos 2 braços e em 1 das
pernas), reforçar as orientações de mudança no estilo de vida e
reavaliar o paciente após mais 6 meses. Se após os 12 meses, e 3
medidas, o paciente persistir com PA elevada, solicitar MAPA e todos
os exames da investigação inicial. Considerar encaminhar ao
cardiologista ou nefrologista pediátrico para acompanhamento
específico.
3.5.2 Pacientes com valores de pressão arterial
estágio HA 1
Para os pacientes que estão assintomáticos, a American Academy of
Pediatrics recomenda, inicialmente, a terapia não farmacológica
com mudança do estilo de vida e reavaliação em 1 a 2 semanas. Se
após esse período a PA persistir > p95 na aferição auscultatória (2
braços e 1 perna), as orientações nutricionais e de atividade física
devem ser reforçadas e a PA deve ser reavaliada em 3 meses. Se após
as 3 visitas o paciente continuar com HA 1 e assintomático, solicitar
MAPA, exames iniciais de triagem e encaminhar para o especialista.
3.5.3 Pacientes com valores de pressão arterial
estágio HA 2
A American Academy of Pediatrics recomenda que o paciente com
HA 2 (PA > p95 + 12 mmHg) assintomático receba as recomendações
de mudança de estilo de vida e que seja reavaliado dentro de 1
semana. A qualquer momento pode ser encaminhado para um centro
de referência. Se após 1 semana a PA persistir com níveis de HA 2,
pode-se ou solicitar MAPA, exames iniciais de triagem e iniciar o
tratamento, ou encaminhar o paciente dentro de 1 semana para
avaliação com especialista. Se em qualquer momento o paciente com
HA 2 estiver sintomático e/ou com valores de PA > 30 mmHg acima
do p95 – ou > 180x120 nos adolescentes –, encaminhar com
urgência ao serviço de emergência.
#IMPORTANTE
A MAPA serve para fazer diagnóstico de HA,
afastar a hipertensão do “avental branco” e
avaliar o controle do tratamento dos pacientes
com HA.
Quadro 3.1 - Comparação da classificação da pressão arterial entre as Diretrizes de 2004 e
2017
3.6 TRATAMENTO
Anteriormente, considerava-se como alvo do tratamento atingir
valores pressóricos < p95. Sabe-se atualmente que crianças e
adolescentes com a PA entre p90 e p95 têm risco aumentado de
desenvolver doença cardiovascular e hipertrofia de ventrículo
esquerdo no início da vida adulta. Portanto, o objetivo atual do
tratamento farmacológico e não farmacológico é manter níveis
pressóricos < p90 ou < 130x80mmHg em adolescentes.
#IMPORTANTE
O objetivo do tratamento da HA é atingir
valores de PA < p90 em crianças ou < 130x80
mmHg em adolescentes.
3.6.1 Medidas não farmacológicas
Inicialmente, recomenda-se mudança no estilo de vida. A redução de
peso mostra bons resultados na criança obesa, e a prática de
atividade física tem um bom efeito sobre os valores da PAS. A 7ª
Diretriz Brasileira de Pressão Arterial recomenda a prática de
exercício aeróbico moderado por 30 a 60 minutos e, se possível,
diariamente. Pode-se realizar treinamento resistido ou localizado
com supervisão, exceto levantamento de peso. Não há
contraindicação a esportes competitivos, exceto para pacientes com
HA 2 ainda não controlada. A dieta deve ser mais saudável e pode
incluir restrição de sódio com suplementação de potássio e cálcio.
A American Academy of Pediatrics recomenda a dieta chamada
Dietary Approaches to Stop Hypertension (DASH), rica em frutas,
vegetais, laticínios com baixo teor de gordura, grãos integrais,
peixes, aves, castanhas, carne vermelha magra e com consumo
restrito de açúcares e sódio (Quadro 3.2). Quanto à atividade física, a
recomendação do novo guideline é de atividadeaeróbica vigorosa
por 30 a 60 minutos, de 3 a 5 vezes por semana.
Quadro 3.2 - Dieta DASH
Fonte: American Academy of Pediatrics, 2017.
3.6.2 Medidas farmacológicas
O tratamento medicamentoso deve ser iniciado em toda criança ou
adolescente com HA sintomática, HA secundária, HA persistente não
responsiva às medidas não farmacológicas, presença de lesão de
órgão-alvo, diabetes tipo 1 e 2 e doença renal crônica.
A recomendação é iniciar com uma só droga de primeira linha em
baixa dose e ajustar a cada 2 a 4 semanas conforme a resposta. Se a
PA não atingir os valores desejados, um segundo medicamento deve
ser introduzido, associando-o à terapia inicial. A utilização de todas
as classes de anti-hipertensivos parece segura no grupo pediátrico. A
American Academy of Pediatrics não recomenda iniciar o tratamento
isolado com betabloqueadores. Opta-se por iniciar com inibidor da
enzima conversora de angiotensina, bloqueador do receptor de
angiotensina, bloqueador dos canais de cálcio ou diurético tiazídico.
O tratamento da HA secundária deve ser realizado em consonância
com o processo fisiopatológico de base, levando em consideração as
comorbidades de cada caso.
O Quadro 3.3 apresenta as drogas mais utilizadas na HA pediátrica.
Quadro 3.3 - Anti-hipertensivos orais mais utilizados na hipertensão arterial pediátrica
Fonte: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial.
3.6.3 Crise hipertensiva
A Emergência Hipertensiva (EH), caracterizada por aumento abrupto
da PA associada a lesão de órgão-alvo que pode incluir
acometimento neurológico, renal, ocular, hepático ou insuficiência
miocárdica, manifesta-se como encefalopatia, convulsões,
alterações visuais, alterações no eletrocardiograma ou
ecocardiograma, insuficiência renal ou hepática. A redução da PA
deve ocorrer de maneira lenta e progressiva. No Brasil, a medicação
mais utilizada no tratamento da EH é o nitroprussiato de sódio. Vale
lembrar que seu metabólito é o cianeto e, se a medicação for
utilizada por mais de 24 horas, o paciente deve ter controle do nível
sérico. Após estabilização da PA, pode-se iniciar anti-hipertensivo
por via oral.
A urgência hipertensiva é caracterizada por elevação aguda da PA
associada a sintomas menos graves em um paciente com risco de
lesão de órgão-alvo sem evidência de acometimento recente. Seu
manejo pode ser feito com medicações via oral, com redução da PA
em 24 a 48 horas.
Pacientes com tumores produtores de catecolamina podem ser inicialmente
alfabloqueados com fenoxibenzamina, seguida de adição cuidadosa de um
betabloqueador.
Na crise hipertensiva causada por sobrecarga de volume, por
exemplo, nos pacientes com glomerulonefrite aguda, a furosemida é
a droga inicial de escolha. Em caso de oligúria ou anúria, outros
anti-hipertensivos podem ser utilizados concomitantemente,
podendo haver necessidade de diálise para controle volêmico.
No Quadro 3.4 estão os anti-hipertensivos mais usados na crise
hipertensiva.
Quadro 3.4 - Anti-hipertensivos mais usados em pediatria para emergência hipertensiva
Fonte: 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial.
3.7 CONCLUSÃO
A HA na infância está associada a eventos desfavoráveis e
comorbidades no futuro. Sua incidência vem aumentando
progressivamente, principalmente associada a obesidade. O
diagnóstico precoce e o tratamento da HA na infância associam-se a
menor risco de HA e de aumento da ateromatose carotídea na vida
adulta.
Como deve ser aferida a
pressão arterial nas
crianças e adolescentes e
como é definida e
classificada a hipertensão
arterial?
A medida da PA é feita preferencialmente com a criança
calma, em ambiente agradável, em repouso de pelo menos
5 minutos, sentada, com o braço direito estendido na altura
do coração. O manguito deve possuir uma câmara interna
com largura correspondente a 40% da circunferência do
braço (medida no ponto médio entre o olécrano e o
acrômio) e o comprimento equivalente a 80 a 100% da
mesma, sem superposição.
Ela é classificada em primária e secundária, e em relação
aos percentis tem a seguinte classificação:
1. PA normal: PAS e PAD < p90;
2. PA elevada (antigo pré-hipertensão): PAS e/ou PAD ≥ p
90 e < p 95 ou entre 120x80 mmHg e < p95;
3. Hipertensão estágio 1: PAS e/ou PAD ≥ p95 e < 12 mmHg
acima do p95 ou entre 130x80 mmHg a 139x89 mmHg;
4. Hipertensão estágio 2: PAS e/ou PAD ≥ 12 mmHg acima
do p95 ou ≥ 140x90 mmHg.
Como abordar inicialmente
uma criança em parada
cardiorrespiratória?
4.1 INTRODUÇÃO
A parada cardíaca, ou parada cardiorrespiratória (PCR) – cessação da
atividade mecânica do coração –, cursa com inconsciência, apneia e
ausência de pulso central palpável. Entre lactentes e crianças, em
geral, não acontece por causas cardíacas primárias, mas por falência
respiratória progressiva ou choque. Em geral, situações de hipóxia,
hipercapnia e acidose prolongadas progridem para bradicardia e
hipotensão e podem culminar em uma PCR.
Dentre as causas cardíacas que levam a essa condição, a fibrilação
ventricular e a taquicardia ventricular sem pulso são os ritmos
cardíacos iniciais em apenas 5 a 15% das crianças que evoluem para
PCR, e a incidência de ambas aumenta com a idade. Entre as crianças
com doenças cardíacas de base – cardiopatias congênitas,
miocardiopatias –, a PCR causada por arritmias deve ser
considerada, assim como os casos de intoxicação por drogas –
digitálicos.
No ambiente pré-hospitalar, os eventos mais associados à parada
cardíaca são trauma, Síndrome da Morte Súbita do Lactente (SMSL),
afogamento por submersão, envenenamento, engasgo, asma grave e
pneumonia. A SMSL, por sua vez, acomete crianças menores de 1 ano
e constitui um quadro multifatorial em que a asfixia por reinalação e
diminuição dos despertares leva ao entorpecimento – hipóxia,
hipercapnia. Em resumo, é o óbito no lactente de até 1 ano sem causa
aparente e definida, e é mais comum quanto mais jovem a criança.
Estudos recentes têm revelado que tanto a SMSL quanto a morte
súbita em crianças maiores e em adultos jovens podem estar
relacionadas a mutações genéticas que causariam alterações nos
canais iônicos cardíacos, o desbalanço eletrolítico dentro e fora de
células cardíacas poderia predispor a arritmia.
Os fatores de risco e protetores para a síndrome de morte súbita do
lactente são recorrentemente abordados nas provas; fatores de risco
são dormir na região prona (“de barriga para baixo”), pais e/ou
cuidadores tabagistas, uso de protetores de berço e cobertas e
hipotermia ou hipertermia no recém-nascido. O principal fator
protetor é dormir na posição supina (“de barriga para cima”), e a
vacinação. O aleitamento materno ainda não teve seu efeito protetor
comprovado em relação à prevenção para a síndrome da morte
súbita.
A ressuscitação cardiopulmonar (RCP) é um conjunto de medidas
que tem como objetivo a manutenção dos sinais vitais por meio da
ventilação, da circulação e do estabelecimento de via aérea pérvia.
Diversas ações, como as compressões torácicas, a desfibrilação e o
uso de drogas fazem parte de sequências padronizadas pela
American Heart Association (AHA) e divididas em suporte básico e
avançado de vida em pediatria. As diretrizes da AHA nada mais são
do que formas de sistematizar o atendimento, a fim de avaliar,
identificar e intervir sobre o agravo, de forma protocolar, com o
objetivo de fornecer um atendimento mais rápido, preciso e com
melhores resultados a condições de alta mortalidade.
A sobrevida durante a RCP é de 7 a 11%, porém, quando a parada é
apenas respiratória, sem assistolia, é de 75 a 90%, números que
justificam a importância da prevenção da PCR, por meio do
reconhecimento precoce dos sinais de insuficiência respiratória e
circulatória, que podem culminar com a ocorrência. Em se tratando
de sobrevida e prevenção, vale lembrar que os traumas são a
principal causa de morte na faixa etária de 1 ano até a adolescência.
Figura 4.1 - Cadeias de sobrevivência para o atendimento do Suporte Avançado de Vida
em Pediatria (PALS), pela American Heart Association
Fonte: Manual doProfissional, PALS, 2015.
Os elos da cadeia de sobrevivência proposta pela AHA têm como
finalidade aumentar a sobrevida e a qualidade de vida. A cadeia atual
inclui o elo “prevenção”, uma vez que, as principais causas de
mortalidade na faixa etária pediátrica são causas externas ou
trauma.
4.2 SUPORTE BÁSICO DE VIDA
As ações incluídas no suporte básico de vida objetivam aumentar a
sobrevivência e melhorar a qualidade de vida, uma vez que fazem
parte de sua cadeia de sobrevivência os seguintes elos e/ou itens:
prevenção do trauma, início precoce e eficiente da RCP, conexão a
um sistema de emergência, transporte e suporte avançado.
Em 2010, foram publicadas pela AHA novas recomendações para a
sequência de RCP, que incluem a mudança do ABC (vias aéreas –
Airway; ventilação – Breathing; compressões torácicas – Circulação)
para o CAB (compressões torácicas, via aérea e respiração),
priorizando as compressões torácicas, já que a vasta maioria das
vítimas que necessitam de RCP compreende adultos com fibrilação
ventricular, cujo prognóstico depende de compressões torácicas
iniciadas prontamente e com o mínimo de interrupções possível.
Outra justificativa para a mudança em crianças seria a simplificação
da sequência de treinamento para que fosse contemplado maior
número de vítimas de falência cardíaca, inclusive pelo público leigo.
Entretanto, é preciso certificar-se da necessidade da RCP, checando
a responsividade da vítima e a sua respiração, para então iniciar as
compressões torácicas e as demais ações descritas na Figura 4.2.
Vale lembrar que as diretrizes da Academia Americana de Pediatria
para o Suporte Básico e Avançado de Vida (BLS e PALS) são indicadas
a partir da alta do serviço de Neonatologia – maternidade— até a
adolescência, marcada para este fim pelo aparecimento do broto
mamário nas meninas e pilificação nos meninos.
Figura 4.2 - Suporte básico de vida
Nota: atualização da diretriz de ressuscitação cardiopulmonar da American Heart
Association de 2015 para Pediatria. 
Fonte: American Heart Association, 2015.
4.2.1 Avaliação da segurança do ambiente
Em primeiro lugar deve ser avaliada a segurança do socorrista, a fim
de não gerar nova vítima. O atendimento só deverá ocorrer se o
ambiente for seguro para isso.
4.2.2 Responsividade
A responsividade é testada segurando firmemente a vítima nos 2
ombros, e chamando pelo seu nome. Nos lactentes menores de 1 ano
deve-se bater nas solas dos pés, também chamando pelo seu nome.
No caso de não responsividade, deve ser chamada ajuda
imediatamente, para desfibrilador automático – DEA – e serviço de
remoção avançado. Se houver 2 socorristas, um inicia as manobras
de ressuscitação enquanto o outro chama pela ajuda. Se o socorrista
estiver sozinho, ou aciona o serviço médico de emergência pelo
telefone celular ou abandona a vítima para fazê-lo, antes de iniciar
os procedimentos.
4.2.3 Respiração e circulação
Deve-se observar a elevação do tórax e sentir o fluxo de ar pelas vias
aéreas da criança e checar o pulso, simultaneamente. Nos menores
de 1 ano, checa-se o pulso braquial e/ou femoral e, nos maiores de 1
ano, carotídeo ou femoral. A avaliação de respiração e circulação não
deve durar mais do que 10 segundos, e caso não seja identificado
movimento ventilatório regular e pulso as manobras de
ressuscitação devem ser iniciadas.
Se não houver evidência de trauma, a criança poderá ficar em
posição de recuperação, decúbito lateral, que mantém a via aérea
patente. Na suspeita de trauma craniano ou raquimedular, o pescoço
e a cabeça devem estar alinhados e, quando necessário, ser
movimentados em bloco. Recomenda-se a manobra de tração da
mandíbula com estabilização da coluna vertebral.
4.2.3.1 Compressões torácicas
Devem ter a frequência de compressões ritmadas entre 100 e 120
compressões por minuto, bem como profundidade de 1 terço do
diâmetro anteroposterior do tórax da criança, cerca de 4 cm no
lactente, 5 cm em crianças maiores e até 6 cm, no máximo, em
adolescentes. É importante permitir a reexpansão do tórax após cada
compressão, pois isso melhora o retorno do fluxo sanguíneo ao
coração. Em lactentes, um único socorrista pode realizá-la por meio
da técnica dos 2 dedos sobre o esterno abaixo da linha intermamilar.
Em crianças maiores, o socorrista deve comprimir a metade inferior
do esterno com 1 ou 2 mãos, com 1 sobre a outra.
4.2.3.2 Abertura das vias aéreas e ventilação
A manobra de elevação da mandíbula com leve extensão do pescoço
deve ser realizada para iniciar a ventilação. Se houver bolsa-valva-
máscara disponível, esta deve ser utilizada. A máscara deve cobrir
boca e nariz, sem escape de ar, e o reservatório ser de dimensão
adequada de forma que permita expansão torácica eficaz, sem
barotrauma. Entretanto, no caso de não haver material, no lactente,
poderá ser utilizada a técnica boca a boca e nariz, a boca do
socorrista deve englobar a boca e o nariz do lactente, e em crianças
maiores, o boca a boca, técnica em que é importante pinçar o nariz
da vítima durante a ventilação. Se a RCP for realizada em apenas 1
socorrista são indicadas 30 compressões por 2 ventilações. Em 2
socorristas 15 compressões por 2 ventilações. A cada 2 minutos, ou 5
ciclos, as manobras devem ser interrompidas de forma breve,
checado pulso, e caso o paciente mantenha a condição de parada
cardiorrespiratória continuar a RCP, invertendo as funções
ventilação e compressão.
Se houver possibilidade de intubação orotraqueal as compressões e
ventilações passam a ser realizadas de forma independente: 100 a
120 compressões por minuto e 12 a 20 ventilações por minuto. A
vantagem é a redução de interrupções nas compressões, a cada
interrupção há grande redução de fluxo cerebral e coronariano, e são
necessárias algumas compressões para retomar o fluxo; a redução de
interrupções garante fluxo contínuo e melhor prognóstico de
reversão e morbidade pós-PCR.
A escolha do tamanho da lâmina do laringoscópio é a distância do
mento ao lóbulo da orelha. A lâmina reta é mais adequada para
crianças pequenas, por pinçar a epiglote, que é maior nessa faixa
etária. O tamanho da cânula é calculado pela fórmula idade/4 + 3,5
naquelas com cu�, ou idade/4 + 4, naquelas sem cu�. O uso de
cânula com ou sem cu� depende da patologia de base e dificuldade
ventilatória. A cânula deve ser fixada na altura de 3 vezes o número
da cânula, no lábio superior.
Figura 4.3 - Abertura de vias aéreas
Legenda: (A) sem trauma; (B) com trauma.
Figura 4.4 - Ventilação boca a boca
Fonte: ilustração Claudio Van Erven Ripinskas.
#IMPORTANTE
Na etapa de ventilação do suporte básico de
vida, o reconhecimento da existência de algum
corpo estranho nas vias aéreas é importante, já
que há elevada taxa de mortalidade por
aspiração de corpo estranho na faixa etária
pediátrica.
4.2.3.3 Engasgo
As obstruções leves e moderadas são resolvidas solicitando-se à
criança que continue a tossir, e as severas – a criança não consegue
tossir ou emitir sons – requerem intervenção imediata. Lactentes até
1 ano de idade devem ser posicionados com a cabeça em um nível
inferior ao do tórax e receber 5 golpes na região interescapular. Caso
não ocorra a desobstrução, o socorrista deve realizar 5 compressões
torácicas e repetir o ciclo até eliminar o objeto. Nunca deve ser
realizada manobra de varredura às cegas na boca do lactente, mas
caso seja visto o objeto causador da obstrução este deve ser retirado,
com movimento em forma de pinça. Crianças maiores, acima de 1
ano de idade, e conscientes devem ser submetidas à manobra de
Heimlich: 5 compressões abdominais subdiafragmáticas até a
desobstrução ou a perda da consciência; quanto às inconscientes e
em apneia, o socorrista deve iniciar as compressões torácicas, 30
vezes, e se ao abrir as vias aéreas for possível a visualização do
objeto, deve tentar retirá-lo. Caso não seja possível a retirada, o
socorrista deve fazer 2 ventilações, manter a RCP – 30
compressões:2 ventilações ou 15:2, a depender se 1 ou 2 socorristas –
e ativar o serviço de emergência.
Vale

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