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----------------------------------------------------~QD A presunção de inocência e o ônus da prova em processo penal Dentre as recomendações aprovadas no XV Congresso Internacio- nal de Direito Penal, merece atenção, especialmente diante do que dispõe o art. 156 do nosso CPP, a de que "o acusado deve beneficiar- se da presunção de inocência ao longo de todo o procedimento, que cessa somente quando a sentença adquire o valor da coisa julgada. A presunção de inocência é também válida para as causas de justificação e demais causas de exclusão da responsabilidade penal". Esse enunciado, além de reafirmar o valor da presuncão de inocên- cia como princípio informador de um processo penal democrático, ressalta a necessidade de uma prova plena e conclusiva a respeito de todos os elementos constitutivos da infração penal imputada ao réu (nulla accusatio sine probatione). Vale lembrar que o princípio da presunção de inocência, desde sua consagração inicial pelo art, 9° da "Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão", de 1789, tem um duplo significado: de um lado, regra processual segundo a qual o acusado não está obrigado a fornecer provas de sua inocência, pois esta é de antemão presumida; de outro, garantia de que o status do cidadão não será afetado por qualquer medida restritiva, antes de uma condenação definitiva. Entre nós, com a introdução do preceito do art. 5°, inc. LVII, da Constituição de 1988 (ninguém será considera culpado até o trãnsito em julgado de sentença penal condenatôriai, discutiu-se muito sobre o alcance da garantia, entendendo alguns que o constituinte não teria acolhido integralmente a presunção de inocência, mas apenas uma "não culpabilidade", de extensão menos abrangente. Todavia. com a adesão do Brasil à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), conforme decreto n° 678, de 6.11.92 (D.O. de 9.11.92, p. 15.562 ss.), e diante da disposição do art, 5°, § 2°, da Constituição Federal, essa discussão perdeu interesse, pois o texto internacional, que agora integra o nosso direito constitucional, assegura que "toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa" (art. 8°, 2, da Convenção). Assim, acolhida amplamente em nosso direito a presunção da inocência, é bastante oportuna a recomendação aprovada no XV Congresso da A.I.D.P., principalmente porque o nosso CPP ainda contém uma regra, segundo a qual "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer"(ar!. 156, primeira parte, CPP). A afirmação sobre a existência de um ônus da prova em processo penal tem sido fortemente contestada pela doutrina, seja pela negativa de qualquer encargo probatório, tanto para a acusação como para a defesa, pois é ao juiz que compete esclarecer oficiosamente os fatos (Figueiredo Dias), seja porque é o Ministério Público que deve provar a presença de todos os elementos de fato sobre os quais se funda a pretensão punitiva (Bettiol). Em um processo penal orientado pela presunção de inocência, é evidentemente inadequado falar em ônus da prova, especialmente em relação à defesa, pois se o acusado é considerado inocente. até que se comprove legalmente sua culpabilidade. é claro que o encargo de demonstrar os fatos incumbe integralmente à acusação; e, como conse- qüência, não atendido o referido ônus, a dúvida deve ser solucionadapro reo. E o mesmo deve ser dito a respeito de uma eventual incerteza sobre a ocorrência de uma causa de justificação ou exclusão da responsabi- lidade, pois como sublinhou Saraceno, as circunstâncias impeditivas não são senão o reverso das constitutivas, e uma dúvida sobre aquelas constitui também uma dúvida a respeito destas últimas. Diante disso, é válido concluir, com Ferrajoll, que enquanto a acusação só prevalece se confirmada, as hipóteses defensivas mere- cem aceitação desde que não desmentidas: ainda que a prova não seja suficiente para aceitá-Ias como verdadeiras, isso não é bastante para adotar como certa a versão acusatória. (Antonio Magalhães Gomes Filho) Cooperação penal internacional na defesa dos direitos do homem No XV Congresso Internacional de Di- reito Penal da AIDP, a 4' Seção dedicou-se ao tema da cooperação penal internacional na defesa dos Direitos Humanos. A Seção reuniu-se sob a presidência do prof. Raimo Lahti, Titular de Direito Penal de Helsinki, compondo a mesa os Drs. Helmuth Epp, vice-presidente, Julian Schutte, relator-ge- ral, e Paulo Klautau, secretário. Manifestaram-se nas discussões, entre outros, os seguintes participantes: Bert Swat (Holanda), OUo Lagondy (Alema- nha), Mário Pisani (Itália), Desirée Para- dans (Holanda), Helmuth Epp (Áustria). Osvaldo :'>Iartinez Morales (Uruguai), Orie(Holanda),Jan S.JÔ Crona (Holanda), Petter Wilkitzki (Suécia). Varnaelle (Holanda), Bruce Zagaris (Estados Uni- dos), Theo Vogler (Alemanha). Isabelle Pratt (Françaj.tNíco Kellzei (Alemanha). Albin Eser t Alernanha), Hamenn Van der Wilt (Holanda), Ivón Aliaga Romeo (Bolí- via) e Maria Celeste Santos (Brasil). A resolução então tomada enfatizou os seguintes pontos: a) Regionalização da coo- peração. ainda que o controle permaneça sob a tipicidade penal de cada Estado. para evi- tar as dificuldades práticas de operaciona- lização: b) Necessidade de acordos envol- vendo as organizações. as polícias e organi- zações regionais. inclusive organizações não governamentais. para a melhor perse- cução dos delitos contra Direitos Humanos: c) Harrnonização dos Direitos Penal e Pro- cessual Penal dos Estados participantes; d) Troca de notas diplomáticas. prevendo a possibilidade de suspender ou eventualmen- te denunciar o instrumento por uma ou mais partes com relação a outra parte. no caso de violação; e) Estimular a constituição de Tri- bunais Internacionais Permanentes. seja a nível regional. seja universal. como vem sendo recomendado pela AIDP há décadas; f) Revisão dos tratados de cooperação penal internacional. com a obrigação de cornpa- tibilizar a matéria penal de cada Estado com as obrigações internacionais referentes à proteção dos Direitos Humanos; g) Dever de colaboração especialmente nos casos de vi- olação do direito de não ser submetido a tortura, a expropriações arbitrárias ou a pro- cessos criminais que não cumprem os prin- cípios geralmente aceitos relativamente a um Juízo imparcial: h) Quanto chamados à cooperação, os Estados devem ter em conta a amplitude com que os direitos e liberdades efetivamente são protegidos nos Estados; i) Os Estados devem cuidar da definição e da proteção dos direitos individuais específi- cos, com acesso á um Tribunal capaz de punir as infringências correspondentes; j) Entre os direitos relevantes. deve ser dada especial atenção aos direitos relativos à transferência de prisioneiros; I) Deve ser sempre excluída a prova obtida sem respeito aos Direitos Humanos fundamentais; m) O seqüestro de uma pessoa em país estrangei- ro, a indução à apresentação espontânea com falsas promessas, resultando em detenção e persecução, são contrários ao Direito Inter- nacional público e não podem ser tolerados. devendo ser tidos como obstáculo ao proces- so. com direito. para a vítima, de restituição ao estado anterior à violação. sem prejuízo da responsabi lização das pessoas envolvidas com tais atos; n) Deve-se reclamar urgência à implementação da cooperação internacio- nal em matéria penal. particularmente a ní- vel regional. Esse o sumário dos trabalhos. materiali- zados em resoluções. A matéria, pela com- plexidade evidente. ante a vigorosa manifes- tação de soberania ínsita em toda lei penal, vem desafiando os juristas no decorrer da história das instituições. A preocupação da AIDP, estabelecendo o tema e a dedicação dos participantes do Congresso em buscar- lhe caminhos efetivos para a preservação dos Direitos Humanos por intermédio do Direito Penal, evidencia importantes passos no sen- tido da efetiva proteção desses direitos entre os povos. (Sidnei Beneti)
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