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A presunção de inocência e o ônus da Prova no Processo Penal - Antônio Magalhães Gomes Filho

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A presunção de inocência e o
ônus da prova em processo penal
Dentre as recomendações aprovadas no XV Congresso Internacio-
nal de Direito Penal, merece atenção, especialmente diante do que
dispõe o art. 156 do nosso CPP, a de que "o acusado deve beneficiar-
se da presunção de inocência ao longo de todo o procedimento, que
cessa somente quando a sentença adquire o valor da coisa julgada. A
presunção de inocência é também válida para as causas de justificação
e demais causas de exclusão da responsabilidade penal".
Esse enunciado, além de reafirmar o valor da presuncão de inocên-
cia como princípio informador de um processo penal democrático,
ressalta a necessidade de uma prova plena e conclusiva a respeito de
todos os elementos constitutivos da infração penal imputada ao réu
(nulla accusatio sine probatione).
Vale lembrar que o princípio da presunção de inocência, desde sua
consagração inicial pelo art, 9° da "Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão", de 1789, tem um duplo significado: de um
lado, regra processual segundo a qual o acusado não está obrigado a
fornecer provas de sua inocência, pois esta é de antemão presumida;
de outro, garantia de que o status do cidadão não será afetado por
qualquer medida restritiva, antes de uma condenação definitiva.
Entre nós, com a introdução do preceito do art. 5°, inc. LVII, da
Constituição de 1988 (ninguém será considera culpado até o trãnsito
em julgado de sentença penal condenatôriai, discutiu-se muito sobre
o alcance da garantia, entendendo alguns que o constituinte não teria
acolhido integralmente a presunção de inocência, mas apenas uma
"não culpabilidade", de extensão menos abrangente.
Todavia. com a adesão do Brasil à Convenção Americana sobre
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), conforme
decreto n° 678, de 6.11.92 (D.O. de 9.11.92, p. 15.562 ss.), e diante da
disposição do art, 5°, § 2°, da Constituição Federal, essa discussão
perdeu interesse, pois o texto internacional, que agora integra o nosso
direito constitucional, assegura que "toda pessoa acusada de delito
tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se
comprove legalmente sua culpa" (art. 8°, 2, da Convenção).
Assim, acolhida amplamente em nosso direito a presunção da
inocência, é bastante oportuna a recomendação aprovada no XV
Congresso da A.I.D.P., principalmente porque o nosso CPP ainda
contém uma regra, segundo a qual "a prova da alegação incumbirá a
quem a fizer"(ar!. 156, primeira parte, CPP).
A afirmação sobre a existência de um ônus da prova em processo
penal tem sido fortemente contestada pela doutrina, seja pela negativa
de qualquer encargo probatório, tanto para a acusação como para a
defesa, pois é ao juiz que compete esclarecer oficiosamente os fatos
(Figueiredo Dias), seja porque é o Ministério Público que deve
provar a presença de todos os elementos de fato sobre os quais se funda
a pretensão punitiva (Bettiol).
Em um processo penal orientado pela presunção de inocência, é
evidentemente inadequado falar em ônus da prova, especialmente em
relação à defesa, pois se o acusado é considerado inocente. até que se
comprove legalmente sua culpabilidade. é claro que o encargo de
demonstrar os fatos incumbe integralmente à acusação; e, como conse-
qüência, não atendido o referido ônus, a dúvida deve ser solucionadapro
reo.
E o mesmo deve ser dito a respeito de uma eventual incerteza sobre
a ocorrência de uma causa de justificação ou exclusão da responsabi-
lidade, pois como sublinhou Saraceno, as circunstâncias impeditivas
não são senão o reverso das constitutivas, e uma dúvida sobre aquelas
constitui também uma dúvida a respeito destas últimas.
Diante disso, é válido concluir, com Ferrajoll, que enquanto a
acusação só prevalece se confirmada, as hipóteses defensivas mere-
cem aceitação desde que não desmentidas: ainda que a prova não seja
suficiente para aceitá-Ias como verdadeiras, isso não é bastante para
adotar como certa a versão acusatória.
(Antonio Magalhães Gomes Filho)
Cooperação penal internacional
na defesa dos direitos do homem
No XV Congresso Internacional de Di-
reito Penal da AIDP, a 4' Seção dedicou-se
ao tema da cooperação penal internacional
na defesa dos Direitos Humanos. A Seção
reuniu-se sob a presidência do prof. Raimo
Lahti, Titular de Direito Penal de Helsinki,
compondo a mesa os Drs. Helmuth Epp,
vice-presidente, Julian Schutte, relator-ge-
ral, e Paulo Klautau, secretário.
Manifestaram-se nas discussões, entre
outros, os seguintes participantes: Bert
Swat (Holanda), OUo Lagondy (Alema-
nha), Mário Pisani (Itália), Desirée Para-
dans (Holanda), Helmuth Epp (Áustria).
Osvaldo :'>Iartinez Morales (Uruguai),
Orie(Holanda),Jan S.JÔ Crona (Holanda),
Petter Wilkitzki (Suécia). Varnaelle
(Holanda), Bruce Zagaris (Estados Uni-
dos), Theo Vogler (Alemanha). Isabelle
Pratt (Françaj.tNíco Kellzei (Alemanha).
Albin Eser t Alernanha), Hamenn Van der
Wilt (Holanda), Ivón Aliaga Romeo (Bolí-
via) e Maria Celeste Santos (Brasil).
A resolução então tomada enfatizou os
seguintes pontos: a) Regionalização da coo-
peração. ainda que o controle permaneça sob
a tipicidade penal de cada Estado. para evi-
tar as dificuldades práticas de operaciona-
lização: b) Necessidade de acordos envol-
vendo as organizações. as polícias e organi-
zações regionais. inclusive organizações
não governamentais. para a melhor perse-
cução dos delitos contra Direitos Humanos:
c) Harrnonização dos Direitos Penal e Pro-
cessual Penal dos Estados participantes; d)
Troca de notas diplomáticas. prevendo a
possibilidade de suspender ou eventualmen-
te denunciar o instrumento por uma ou mais
partes com relação a outra parte. no caso de
violação; e) Estimular a constituição de Tri-
bunais Internacionais Permanentes. seja a
nível regional. seja universal. como vem
sendo recomendado pela AIDP há décadas;
f) Revisão dos tratados de cooperação penal
internacional. com a obrigação de cornpa-
tibilizar a matéria penal de cada Estado com
as obrigações internacionais referentes à
proteção dos Direitos Humanos; g) Dever de
colaboração especialmente nos casos de vi-
olação do direito de não ser submetido a
tortura, a expropriações arbitrárias ou a pro-
cessos criminais que não cumprem os prin-
cípios geralmente aceitos relativamente a
um Juízo imparcial: h) Quanto chamados à
cooperação, os Estados devem ter em conta
a amplitude com que os direitos e liberdades
efetivamente são protegidos nos Estados; i)
Os Estados devem cuidar da definição e da
proteção dos direitos individuais específi-
cos, com acesso á um Tribunal capaz de
punir as infringências correspondentes; j)
Entre os direitos relevantes. deve ser dada
especial atenção aos direitos relativos à
transferência de prisioneiros; I) Deve ser
sempre excluída a prova obtida sem respeito
aos Direitos Humanos fundamentais; m) O
seqüestro de uma pessoa em país estrangei-
ro, a indução à apresentação espontânea com
falsas promessas, resultando em detenção e
persecução, são contrários ao Direito Inter-
nacional público e não podem ser tolerados.
devendo ser tidos como obstáculo ao proces-
so. com direito. para a vítima, de restituição
ao estado anterior à violação. sem prejuízo
da responsabi lização das pessoas envolvidas
com tais atos; n) Deve-se reclamar urgência
à implementação da cooperação internacio-
nal em matéria penal. particularmente a ní-
vel regional.
Esse o sumário dos trabalhos. materiali-
zados em resoluções. A matéria, pela com-
plexidade evidente. ante a vigorosa manifes-
tação de soberania ínsita em toda lei penal,
vem desafiando os juristas no decorrer da
história das instituições. A preocupação da
AIDP, estabelecendo o tema e a dedicação
dos participantes do Congresso em buscar-
lhe caminhos efetivos para a preservação dos
Direitos Humanos por intermédio do Direito
Penal, evidencia importantes passos no sen-
tido da efetiva proteção desses direitos entre
os povos.
(Sidnei Beneti)

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