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72 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Unidade II 5 EPIDEMIOLOGIA E PREVENÇÃO 5.1 Diagnóstico Os médicos dedicam grande parte do seu tempo determinando diagnósticos depois de aplicar vários testes. A maior parte dos bons clínicos usa juízo crítico, conhecimento amplo da leitura e um tipo de abordagem empírica própria de como organizar a informação diagnóstica. Entretanto, o clínico também precisa se familiarizar com alguns princípios básicos para a interpretação dos testes diagnósticos. Um teste diagnóstico geralmente é concebido como um exame realizado em laboratório. A informação clínica obtida da história, do exame físico ou de procedimentos de imagem pode ser aplicada quando um conjunto de achados clínicos serve como teste diagnóstico (WARD et al.,1986). 5.1.1 Acurácia do resultado do teste Estabelecer um diagnóstico é um processo imperfeito, resultando em probabilidade e não em certeza de estar correto. Cada vez mais o médico moderno expressa a possibilidade de que um paciente tenha a doença com o uso de uma probabilidade. Desta forma, faz sentido que ele se familiarize com as relações matemáticas entre as propriedades dos testes diagnósticos e a informação que fornece às várias situações clínicas. Em muitos casos, o entendimento dessas questões auxilia a resolução de algumas incertezas em torno do uso de testes diagnósticos. Em outras situações, apenas melhora o entendimento da incerteza. Ocasionalmente, pode convencer o médico a aumentar seu próprio nível de incerteza (GRINER; PANZER; GREENLAND, 1986). Na relação entre um teste diagnóstico e a ocorrência de doença, há duas possibilidades de o resultado do teste ser correto (verdadeiro-positivo e verdadeiro-negativo), e duas possibilidades de o resultado ser incorreto (falso-positivo e falso-negativo), conforme observa-se no quadro a seguir. 5.1.1.1 O padrão-ouro A avaliação de acurácia de um teste baseia-se na sua relação com alguns meios de saber se a doença está ou não realmente presente – um indicador mais fiel da verdade, geralmente referido como “padrão- ouro” (gold standard; “teste padrão”). O que acontece é que este padrão-ouro é frequentemente difícil de ser encontrado. Algumas vezes o padrão-ouro é, por si só, um teste simples e barato, entretanto, usualmente, não é o caso. Mais frequentemente, para ter certeza de que a doença está realmente presente ou ausente, deve-se lançar mão de testes relativamente elaborados, caros ou arriscados. Entre eles, estão a biópsia, a exploração cirúrgica e, certamente, a autópsia. 73 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA Para doenças que não são autolimitadas e que costumam se tornar manifestas alguns anos após a suspeita inicial, os resultados do acompanhamento podem servir como um padrão-ouro. Em tais casos, a validação do teste é possível, mesmo que a confirmação imediata não seja factível porque o teste padrão é muito arriscado, demorado ou caro. Deve-se ter cuidado ao decidir sobre a duração do período de acompanhamento, que precisa ser longo o suficiente para permitir que a doença se manifeste, mas não tão longo que os casos possam ter se originado após a avaliação inicial. Quadro 3 – Relação entre teste diagnóstico e ocorrência de doença Doença Teste Presente Ausente Anormal a b a+b Normal c d c+d a+c b+d O uso de testes mais simples como substitutos dos mais elaborados e mais exatos no estabelecimento da presença de doença é feito com o entendimento de que isso resulte em um risco de diagnóstico incorreto, o que é justificado pela segurança e conveniência do teste mais simples. Mas pode ser útil somente quando os riscos de erros de classificação são conhecidos e considerados aceitavelmente baixos, o que requer dados sólidos que comparem a acurácia do teste contra um padrão apropriado. Observação Desejamos uma elevada acurácia de um teste quando: • A doença for importante, mas curável. • Existe possibilidade de consequências graves na identificação de falsos positivos e falsos negativos. 5.1.1.2 Consequências de padrões imperfeitos Nem sempre é possível, na prática, saber quão bem os testes em uso se comparam a um padrão inteiramente fidedigno. É preciso escolher como padrão de validade um teste que, sabidamente, não é perfeito, mas que é considerado o melhor disponível. Isso pode levar à comparação de um teste fraco contra outro, um deles sendo considerado como padrão de validade por ter maior uso, ou por ser julgado superior por um consenso de peritos. Ao proceder assim, pode-se originar um paradoxo. Se um teste novo é comparado com um teste padrão antigo (mas não exato), o teste novo pode parecer pior, mesmo sendo realmente melhor. Por exemplo, se o teste novo é mais sensível do que o teste padrão, os pacientes identificados adicionalmente pelo teste novo seriam considerados falso-positivos em relação ao teste antigo. Se o novo teste é negativo com maior frequência em pessoas que de fato 74 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II não têm a doença, resultados desses pacientes com o novo teste serão considerados falso-negativos comparados com o teste antigo. Assim, se um padrão inacurado de validade for usado, um teste novo não poderá desempenhar melhor que seu padrão e parecerá inferior quando estiver mais próximo da verdade (GRINER; PANZER; GREENLAND, 1986). 5.1.2 Sensibilidade e especificidade Sensibilidade é definida como a proporção de indivíduos com a doença, que têm um teste positivo para a doença, um teste sensível raramente não a encontra. Especificidade é a proporção dos indivíduos sem a doença, que têm um teste negativo. Um teste específico raramente classificará erroneamente pessoas sadias em doentes. Sensibilidade = ____a___ a + c Especificidade = ___d____ b + d Prevalência = ____a + c_____ a + b + c + d Valor Preditivo (+) = ____a____ a + b Valor Preditivo (-) = ___d___ c + d Onde: a = verdadeiro-positivo; b = falso-positivo; c = falso-negativo; d = verdadeiro positivo. 5.1.2.1 Uso de testes sensíveis Ao selecionar um teste, é necessário considerar sua sensibilidade e especificidade. Um teste sensível (positivo na presença da doença) é o de escolha quando a penalidade por deixar de diagnosticar uma doença for grande. Isso é o caso, por exemplo, quando há suspeita de uma situação perigosa mais tratável. Testes sensíveis também são úteis nas fases iniciais de um processo diagnóstico, quando um grande número de possibilidades está sendo considerado e se quer reduzi- las. Os testes diagnósticos são usados nessas situações para excluir doenças – estabelecer que algumas são possibilidades improváveis. Em suma, um teste sensível é mais útil ao clínico quando o resultado dele for negativo (WARD et al.,1986). 75 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDEPÚBLICA Lembrete Devemos escolher um teste sensível quando: • A doença for grave e não pode passar despercebida. • A doença é tratável. • Os resultados falsos não determinam nenhum traumatismo, psicológico, econômico ou social para o indivíduo. 5.1.2.2 Uso de testes específicos Testes específicos são úteis para confirmar um diagnóstico sugerido por outros dados. Isso porque um teste altamente específico é raramente positivo na ausência da doença – dá poucos resultados falso- positivos. Testes altamente específicos são particularmente necessários quando os resultados falso- positivos podem lesar o paciente física, emocional ou financeiramente. Assim, antes que o paciente com câncer seja submetido à quimioterapia, que é um procedimento que acarreta riscos, trauma emocional e custos financeiros, é geralmente necessário que se faça diagnóstico tecidual em vez de confiar em exames menos específicos (CATALONA et al.,1991). Resumindo, um teste específico é mais útil quando o resultado for positivo. Lembrete Utilizamos um teste mais específico quando: • A doença for importante, mas difícil de tratar ou incurável. • O fato de saber que não se tem a doença tem importância sanitária e psicológica. • Os resultados falsos positivos podem provocar traumas psicológicos, econômicos ou sociais. 5.1.2.3 Viés Algumas vezes, a sensibilidade e a especificidade do teste não são estabelecidas independentemente dos meios pelos quais o diagnóstico verdadeiro é estabelecido, levando a uma avaliação tendenciosa de suas propriedades. Isso pode ocorrer de vários modos. Se o teste for avaliado com dados obtidos durante a avaliação clínica de pacientes suspeitos de ter a doença em questão, um teste positivo pode induzir o médico a continuar procurando o diagnóstico, aumentando a probabilidade de achar a doença. Por outro lado, um teste negativo pode levar o médico a abdicar de testes adicionais, tornando mais provável que a doença, se presente, não seja detectada. 76 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Em outras situações, o resultado do teste pode ser parte da informação usada para estabelecer o diagnóstico; ou, ao contrário, os resultados dos testes podem ser interpretados à luz de outras informações clínicas ou do próprio diagnóstico final. 5.1.2.4 Acaso Valores para sensibilidade e especificidade são estimados usualmente a partir de observações de amostras relativamente pequenas de pessoas com e sem a doença em questão. Devido ao acaso, (variação aleatória), em uma determinada amostra, particularmente se ela é pequena, a sensibilidade e especificidade do teste podem não representar os valores verdadeiros, mesmo que não haja vícios no estudo. Os valores observados são compatíveis com uma faixa de valores verdadeiros, caracterizada tipicamente pelo “intervalo de confiança de 95%”. A amplitude desta gama de valores define o grau de precisão das estimativas de sensibilidade e especificidade. Desta forma, valores relatados para a sensibilidade e especificidade não deveriam ser tomados muito literalmente se estimados por um número pequeno de pacientes. 5.1.3 Valor preditivo A sensibilidade e a especificidade são propriedades de um teste considerado ao tomar uma decisão sobre pedir ou não um exame diagnóstico. Mas, uma vez com o resultado na mão, seja ele positivo ou negativo, a sensibilidade e a especificidade não têm mais relevância. Isso ocorre porque esses valores se referem a pessoas sabidamente doentes ou não doentes. Mas, se o diagnóstico da doença já for conhecido, não é necessário solicitar um teste diagnóstico. O dilema do clínico é determinar se o paciente tem ou não a doença, dados os resultados de um teste. A probabilidade de doença, dados os resultados de um teste, é chamada de “valor preditivo do teste”. O valor preditivo positivo de um teste é a probabilidade de doença com resultado positivo (anormal). O valor preditivo negativo é a probabilidade de não ter a doença quando o resultado for negativo (normal). O valor preditivo é uma resposta à questão: “Se o resultado de meu paciente for positivo (ou negativo), qual a probabilidade de que ele tenha ou não tenha a doença?” O valor preditivo é também chamado de “probabilidade posterior”, a probabilidade de doença após o conhecimento do resultado do teste. Existem vários termos que sumarizam o valor global do teste. Um deles, a acurácia, é a proporção de todos os resultados corretos, tanto os positivos quanto os negativos. 5.1.3.1 Determinantes do valor preditivo O valor preditivo de um teste não é propriedade apenas do teste. Além de ser determinado apenas pela sensibilidade e especificidade do teste, depende também da prevalência da doença na população que está sendo testada. Aqui, o termo “prevalência” tem seu significado usual – a proporção de pessoas com a condição em questão, em uma população definida, em um determinado ponto no tempo. Neste contexto pode ser também chamada de probabilidade prévia (ou pré-teste), a probabilidade de doença antes do conhecimento do resultado do teste. 77 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA A fórmula matemática que relaciona sensibilidade, especificidade e prevalência ao valor preditivo positivo é calculada de acordo com o Teorema de Bayes das probabilidades condicionais: Valor Sensibilidade x Prevalência preditivo = ______________________________________________________ positivo (Sensibilidade x Prevalência) + (1 – Especificidade) x (1 – Prevalência) Quanto mais sensível for um teste, melhor será o seu valor preditivo negativo (maior será a segurança do médico de que um paciente com um resultado negativo não tenha a doença que procura). Em contraposição, quanto mais específico for o teste, melhor será seu valor preditivo positivo (maior será a segurança de um médico de que um resultado positivo confirme ou mantenha o diagnóstico procurado). Como o valor preditivo também depende da prevalência, ele é influenciado pelo contexto em que o teste é aplicado. Resultados positivos, mesmo de um teste muito sensível, quando se referem a pacientes com alta chance de doença, são prováveis de serem falso-positivos. Da mesma forma, resultados negativos, mesmo de um teste muito sensível, quando se referem a pacientes com alta chance de doença, são prováveis de serem falso-negativos. Em resumo, a interpretação do resultado de um teste diagnóstico, negativo ou positivo, varia de um contexto a outro, de acordo com a prevalência estimada da doença no contexto específico. Os esforços atuais para prevenir a transmissão da síndrome de imunodeficiência adquirida (Aids) através dos produtos hemoderivados é exemplo do efeito da prevalência da doença no valor preditivo positivo. Como exemplo pode-se mencionar um teste sanguíneo de anticorpos para o vírus da imunodeficiência humana (HIV), que é usado para triar doadores de sangue. Num ponto de corte, a sensibilidade é 97,8%, e a especificidade é 90,4%. Em 1985, o valor preditivo positivo do teste foi estimado com base na prevalência das unidades de sangue infectadas como sendo em torno de 1/9250 testes. Assim, quase 10.000 unidades teriam de ser descartadas ou sofrer investigação adicional para prevenir uma transfusão com sangue contaminado. Mas a situação mudou. Na medida em que a prevalência da infecção pelo HIVaumenta na população geral, melhora o valor preditivo dos testes de rastreamento. Um ano mais tarde, a United States Agency for International Development (1998) mostra prevalência de 25/10.000 em 67.690 unidades testadas, o que, com níveis semelhantes de sensibilidade e especificidade, produziria um valor preditivo positivo de 2,5%, muito mais alto do que o de alguns anos antes. 5.1.4 Estimando a prevalência Como um clínico pode estimar a prevalência ou a probabilidade de doença no contexto de seus pacientes para determinar o valor preditivo do resultado de um teste? Existem várias fontes de informação: a literatura médica, bancos de dados locais e julgamento clínico. Apesar de que esta estimativa de prevalência seja raramente muito precisa, o erro dificilmente será grande o suficiente para mudar o julgamento clínico baseado em sua estimativa. De qualquer modo, o processo certamente será mais acurado que o julgamento sem tais probabilidades explícitas. Em geral, a prevalência é mais importante do que a sensibilidade/especificidade na determinação do valor preditivo. Uma razão pela qual isso ocorre é que a prevalência geralmente tem uma faixa de 78 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II variação mais ampla. A prevalência de doença em contextos clínicos pode variar de uma fração de per cento até quase a certeza diagnóstica, dependendo da idade, gênero, fatores de risco e achados clínicos do paciente. Quando contrastadas duas prevalências de doença hepática: a de um adulto sadio que não usa drogas (ilícitas ou não) e consome álcool apenas ocasionalmente, e a de um ictérico, usuário de drogas endovenosas; a variação da sensibilidade e da especificidade é bem menor. Pelos padrões atuais, não há interesse em teste com sensibilidade e especificidade muito abaixo de 50% mas, se ambas forem 99%, o teste será considerado fabuloso. Em outras palavras, em termos práticos, a variação de sensibilidade e especificidade raramente será maior do que duas vezes. 5.1.5 Processos endêmicos Uma determinada doença pode ser caracterizada como presente em nível endêmico, epidêmico, com casos esporádicos ou inexistente. O fato de existir um número elevado de casos de uma doença não significa necessariamente que uma epidemia esteja configurada. Por exemplo, há dezenas de milhares de novos casos de acidente vascular cerebral (AVC) no Brasil por ano, mas o país não vive uma epidemia de AVCs. Em uma definição genérica, epidemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma não constante (crescente) ao longo do tempo. Endemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma constante ao longo do tempo, permitidas as flutuações cíclicas ou sazonais. A descrição epidemiológica de um evento ficaria incompleta se faltassem informações adequadas sobre qualquer uma das três vertentes que constituem a Epidemiologia descritiva: as características da população, do lugar e do tempo. Como exemplo, podemos traçar o perfil da poliomielite ou da tuberculose (RUFFINO-NETO; PEREIRA, 1981). Além da obtenção das frequências desses eventos entre os segmentos da população (por sexo e faixas etárias, por exemplo) e entre regiões, será conveniente também especificar como estas frequências evoluem com o passar do tempo (MORAES; GUEDES; BARATA, 1985). 5.1.5.1 Definindo variações Variações cíclicas Caracteriza as oscilações periódicas de frequências. Variações sazonais Designa oscilações periódicas de frequência, cujos ciclos configuram ritmo sazonal. O perfil de numerosos agravos à saúde demonstra oscilações de frequência durante o ano. 79 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA Variações irregulares Algumas epidemias são a expressão de frequências mais elevadas do que as habituais, como ocorrem em relação ao sarampo e à meningite meningocócica. O aumento do número de casos decorre da ação de um fator específico, de um episódio inusitado ou de uma combinação de fatores e situações, de modo que os casos referentes à epidemia misturam-se às frequências endêmicas da doença. Outras epidemias são acontecimentos pontuais, que tem seu início e término bem delimitados (MORAES et al., 1982). Muito já se sabe sobre a Teoria das Epidemias e de como lidar com elas. Contudo, por não apresentarem padrão de periodicidade regular, a prevenção de certas epidemias torna-se difícil de ser alcançada. Algumas vezes, as causas das elevações de frequências das doenças são facilmente apontadas, pois estão ligadas a acontecimentos evidentes para a população, tais como as enchentes ou as secas de grandes proporções. Outras vezes, o aumento de casos só é reconhecido posteriormente, quando os dados são colocados em uma série temporal (MASCARENHAS, 1973). Análise das variações irregulares Os textos especializados sobre séries temporais fornecem orientação sobre formas de análises das variações irregulares, depois de removidas a sazonalidade, os ciclos e a tendência do evento. O resíduo, que está livre de qualquer variação regular, é então analisado, à luz de um modelo probabilístico. 5.1.5.2 Epidemia x endemia Epidemia é a concentração de casos de uma mesma doença em determinado local e época, claramente em excesso ao que seria teoricamente esperado. Uma epidemia é uma etapa na evolução da doença na coletividade. Existe uma fase de normalidade, em que as frequências são endêmicas ou não há casos de doença e, outra, de anormalidade, caracterizada por alta incidência do evento, significativamente bem acima do período anterior. O número de casos esperados é conhecido como “frequência endêmica”. Quando a doença é relativamente constante, em uma área, ela é dita “endêmica”, não importando se a frequência é baixa ou alta. Por vezes, nesse último caso, usa-se a denominação “hiperendêmica”. Uma epidemia de grandes proporções, envolvendo extensas áreas e um número elevado de pessoas, é dita “pandemia”; o termo aplica-se, geralmente, a uma doença que passa de um continente para o outro. O intervalo de tempo previsto para a ocorrência de uma nova epidemia varia, para cada agravo de saúde. Em doenças endêmicas, este intervalo pode ser estabelecido até com relativa facilidade pela análise retrospectiva dos dados de incidência. A ocorrência de um número de casos, além do esperado, associada ou não a algum evento ambiental de grandes proporções, caracteriza a variação do tipo irregular e aponta para a necessidade de investigar as suas mais prováveis causas. Quando a doença só aparece sob a forma de surtos, como no exemplo das intoxicações alimentares, os conglomerados de casos, com este diagnóstico, são então devidamente investigados (MORAES; GUEDES; BARATA, 1985). 80 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II 5.1.5.3 Tipos de epidemia • Epidemia explosiva: também chamada de “brusca”, “instantânea”, “maciça” ou por “fonte comum”, “veículo comum”, “foco comum” ou “foco endêmico”, há um aumento expressivo no número de casos em curto período. Esse aumento é compatível com o período de incubação da doença. • Epidemia progressiva: ou “de contato” entre a pessoa doente e a sadia, ocorre um aumento gradativodo número de casos, mas a fonte de infecção não é única, sendo representada por exposições sucessivas. 5.1.5.4 Investigação de surtos epidêmicos É frequente a utilização da expressão “investigação epidemiológica” no sentido de investigação de surtos, abrangendo a identificação de contatos de casos de doença, geralmente infecciosa, com objetivo de determinar os diversos elos da cadeia de transmissão. No entanto, essa expressão passou a ser entendida de maneira mais ampla, como sinônimo de “pesquisa epidemiológica”. Assim sendo, adotou-se “investigação epidemiológica de campo” como uma designação específica para as investigações de surtos. Essa atividade constitui um desafio para o epidemiologista enfrentar no dia a dia de um serviço de saúde. Frequentemente, nesses eventos, sua causa, origem e modos de disseminação são desconhecidos, e o número de pessoas envolvidas pode ser grande. Por decorrência, temos como objetivo principal das investigações de surtos: • identificação da sua etiologia; • identificação das fontes e modos de transmissão; • identificação de grupos expostos a maior risco. As epidemias constituem situações anormais que se apresentam para a comunidade como um evento potencialmente grave, desencadeando pressões sociais que necessitam ser respondidas pelas autoridades sanitárias com a maior urgência, fato que condiciona o ritmo e as condições do curso da sua investigação. Um dos objetivos da vigilância em saúde pública é justamente a identificação de surtos, ou seja, observar os passos previstos para cada sistema de vigilância em termos de uma periodicidade regular na coleta dos dados, análise e disseminação da informação analisada. É frequente a identificação de surtos por parte de profissionais da saúde, que alertam as autoridades sanitárias a respeito da ocorrência de um número inusitado de determinado evento adverso à saúde. Outras vezes, são os próprios membros do grupo populacional afetado os responsáveis pela identificação do surto. 81 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 11 N º d e ca so s Dia e mês 27 /de z 28 /de z 29 /de z 30 /de z 31 /de z 01 /ja n 02 /ja n 03 /ja n 04 /ja n 05 /ja n 06 /ja n 07 /ja n 08 /ja n 09 /ja n 10 /ja n 18 30 202020 30 1516 9 11 1413 1111 30 25 20 15 10 5 0 Figura 8 – Número de casos diários de dengue que deram entrada na emergência do HGPV A razão de uma investigação de surto é controlar a epidemia, prevenindo a ocorrência de mais casos. Antes de estabelecermos a estratégia de controle, é necessário saber em que etapa do seu curso a epidemia se encontra. O número de casos está aumentando ou o surto já está se extinguindo? A resposta a essa questão condicionará o objetivo da investigação. Se a epidemia estiver em curso, o objetivo será prevenir novos casos; portanto, a investigação se concentrará na extensão do evento, no tamanho e nas características da população sob risco para delinear e desenvolver medidas apropriadas de controle. Caso a epidemia já esteja em seu término, o objetivo passa a ser prevenir surtos semelhantes no futuro; portanto, a investigação deverá centralizar seus esforços principalmente em identificar os fatores que contribuíram para a ocorrência do evento. Os esforços na investigação do surto e nas medidas de controle devem ser proporcionais aos conhecimentos disponíveis a respeito da causa, da origem e do modo de disseminação da epidemia. Se soubermos pouco a respeito do agente, da fonte e dos modos de transmissão, serão necessários esforços de investigação para delinearmos as medidas de controle. Ao contrário, se dispusermos de um bom conhecimento dessas variáveis, estaremos aptos a indicar as medidas apropriadas de controle. Quando o surto for de causa e/ou fonte e de modos de transmissão desconhecidos, mas se a doença for grave e o desenvolvimento da investigação permitir a identificação da possível fonte e/ou modo de transmissão, as ações de controle poderão ser tomadas antes mesmo da sua conclusão. Embora a investigação de surtos possa apresentar algumas características semelhantes às da pesquisa epidemiológica, cabe salientar pelo menos três diferenças importantes entre ambas: 82 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II • As investigações epidemiológicas de campo iniciam-se com frequência sem hipótese clara. Geralmente, requerem o uso de estudos descritivos para a formulação de hipóteses, que posteriormente serão testadas por meio de estudos analíticos, na maior parte das vezes, de caso-controle. • Quando ocorrem problemas agudos que implicam medidas imediatas de proteção à saúde da comunidade exposta ao risco, a investigação do surto deve se restringir, num primeiro momento, à coleta dos dados e agilizar sua análise, com o objetivo de desencadear rapidamente as ações de controle. • A amplitude e grau de aprofundamento de uma investigação de um surto de doença aguda vão depender do nível de conhecimento da etiologia, da fonte, modos de transmissão e das medidas de controle disponíveis. Os referenciais teóricos aplicados nas investigações epidemiológicas de campo originam-se da clínica médica, da Epidemiologia e das ciências de laboratório. A investigação de surtos constitui atividade que deve ser incorporada por qualquer sistema de vigilância, não só visando a eventos adversos à saúde, raros e/ou pouco conhecidos, mas também a doenças cujos conhecimentos estejam bem estabelecidos. As epidemias devem ser encaradas como experimentos naturais, cuja investigação permitirá a identificação de lacunas no conhecimento, induzindo o desenvolvimento de pesquisas que poderão resultar no aprimoramento dos serviços de saúde. Muitas vezes a investigação de um surto que se apresenta inicialmente como rotineiro pode nos levar à ampliação dos conhecimentos a respeito do agravo estudado, de seu agente, fonte(s) e modo(s) de transmissão. Neste último caso, muitas vezes, é necessário descartar ou caracterizar mudanças no comportamento da doença, do agente, da fonte ou modo de transmissão. 5.2 Epidemiologia geral das doenças transmissíveis Doenças transmissíveis são aquelas em que ocorre a transmissão de um hospedeiro para outro, de um agente vivo que, dentro do conceito de multicausalidade, atua como causa necessária da doença. Por vezes o agente elabora, antes de alcançar o novo hospedeiro, produtos tóxicos que, depois, por alguma forma, são até este veiculado. Tendo em conta a existência do agente vivo, a história natural das doenças transmissíveis apresenta algumas características em comum, cuja compreensão facilita o estudo específico de cada uma delas. Existem três formas pelas quais pode ser estabelecido o estímulo-doença: • Infecção: é a penetração, no organismo, de um homem ou de outro animal, de um agente que nele se desenvolve ou se multiplica; da infecção pode ou não resultar doença, aparente ou inaparente, usualmente referida como infecciosa. A presença de agentes que poderiam provocar doença se 83 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Corr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA penetrassem no organismo, na superfície do corpo, em roupas ou objetos de uso, na água ou outros alimentos ou em quaisquer objetos não constitui infecção, mas sim contaminação. • Infestação: é o alojamento, com ou sem desenvolvimento e reprodução, de artrópodes na superfície do corpo ou nas vestes. Também se usa a palavra infestação para designar a existência de certos animais, especialmente artrópodes e roedores, em objetos e locais. • Absorção de produtos tóxicos do agente: ocorre, usualmente, por ingestão. Esse item diz respeito apenas aos casos em que não há infecção, ou seja, quando se trata de toxinas produzidas fora do organismo do hospedeiro, não incluindo aqueles em que os produtos tóxicos provêm de agentes antes nele já localizados. Dessas três formas de estabelecimento do estímulo-doença, a mais frequente, é a infecção. Seja qual for a forma, é peculiar, no caso das doenças transmissíveis, o fato de, como seu nome indica, ter havido transmissão do agente vivo que, por si mesmo ou por seus produtos tóxicos, vai constituir o estímulo-doença. Nessa conceituação se enquadram todas as doenças transmissíveis, mas elas apresentam larga variedade quanto a cada fase do processo de transmissão (NOVO,1984). Algumas definições básicas são indispensáveis para destacar claramente as etapas essenciais que caracterizam o processo de transmissão. Tais definições são as seguintes: • Fontes de infecção: são representadas por homens ou outros animais vertebrados, infectados, de cujos organismos o agente vivo pode sair, por alguma forma, para, por algum meio, alcançar, eventualmente, outro hospedeiro vertebrado. • Vias de eliminação: são as formas pelas quais o agente deixa a fonte de infecção. Sem uma via de eliminação disponível, a transmissão não pode ocorrer. • Vias de transmissão: são os meios pelos quais o agente alcança o novo hospedeiro vertebrado. • Portas de entrada: são as vias pelas quais o agente penetra no organismo do hospedeiro vertebrado. 5.2.1 Características de agentes infecciosos nas suas relações com o hospedeiro Por “infectividade”, designamos a capacidade de um agente se alojar e se multiplicar ou se desenvolver em um hospedeiro. Em animais de laboratório, podemos, experimentalmente, medir a infectividade em termos de dose infectante. Se da infecção decorrer doença clinicamente reconhecível, sua ocorrência fica comprovada, mas, nos casos em que as manifestações são escassas ou nulas, métodos bacteriológicos ou sorológicos podem ser usados para verificar a infecção. Por “patogenicidade”, designamos a capacidade do agente de provocar a doença, com suas manifestações clínicas características, entre os infectados suscetíveis. A medida da patogenicidade é dada, então, simplesmente pela proporção de doentes entre os infectados suscetíveis. 84 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II A expressão “virulência” é usada com diferentes significados, por vezes até sinônimos de patogenicidade. É usual definir a virulência como a expressão do grau de severidade ou gravidade da doença, considerando-se como critérios de severidade as sequelas sérias e permanentes, como as paralisias na poliomielite, ou a morte. A medida da virulência seria, com este conceito, dada pela relação entre casos “severos” e o total de casos; se o critério adotado para classificar os casos como severos é, como frequentemente acontece, a morte, essa relação se torna igual ao coeficiente de letalidade (ou fatalidade) da doença. Deve ser lembrado que, tratando-se de características dos agentes em seu relacionamento com os hospedeiros, os graus de infectividade, patogenicidade e virulência podem variar, para um mesmo agente, de acordo com o hospedeiro. Mesmo no caso do hospedeiro humano, variações podem ocorrer em função de idade, sexo, raça, condições de nutrição etc. Fatores de natureza genética desempenham um importante papel no comportamento do hospedeiro. 5.2.2 Fontes de infecção (ou de infestação) Para a maioria das doenças transmissíveis que afetam o homem, ele é, em condições naturais, o único vertebrado suscetível, constituindo a única fonte de infecção. Quando os agentes dispõem, em condições naturais, de outros hospedeiros vertebrados, estes também podem ser fontes de infecção para o homem. O estudo das fontes de infecção implica o estabelecimento de algumas definições pertinentes. Período de incubação Intervalo de tempo entre o momento em que ocorre a infecção (ou infestação) e o aparecimento das primeiras manifestações de doença atribuíveis ao agente em causa. São inespecíficas, traduzindo-se por sinais e sintomas compartilhados, com variações de natureza e intensidade, por muitos processos infecciosos, especialmente os de evolução aguda. Quando se trata de indivíduos (ou animais) em relação aos quais se tenha razões para supor que estejam infectados por um determinado agente, o relacionamento deste com manifestações inespecíficas pode ser estabelecido. Entretanto, se não soubermos dos antecedentes, poderíamos atribuir essas manifestações a várias outras entidades, particularmente às das infecções agudas das vias respiratórias superiores; é usual que se pense tratar-se de resfriado comum. Seja qual for o grau de especificidade das manifestações, o período de incubação termina quando elas surgem. Para cada moléstia, em particular, a duração do período de incubação é relativamente constante e previsível, mas, como qualquer outra característica biológica, apresenta uma amplitude de variação (IVERSSON,1976). Período prodrômico Intervalo de tempo durante o qual o paciente apresenta manifestações inespecíficas, desde o aparecimento dos primeiros sintomas e sinais da doença em causa, até que surjam os que são característicos, permitindo o diagnóstico clínico ou, pelo menos, a formulação de hipóteses diagnósticas limitadas a um campo mais restrito. Evidentemente, quando os primeiros sintomas e sinais são 85 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA característicos, não há período prodrômico. A duração dele também varia, de doença para doença, e de um paciente para outro, com a mesma doença. Período de transmissibilidade Intervalo de tempo, em continuidade ou com intermitências, durante o qual pode ocorrer eliminação do agente, a partir da fonte de infecção. A eliminação só começa no período prodrômico ou mesmo apenas em fases mais ou menos avançadas da doença caracterizada. Iniciada a eliminação, ela pode perdurar por períodos que, mais uma vez, variam de doença para doença. Com base nas informações, pode ser elaborada uma classificação de fontes de infecção, sejam elas representadas por homens ou por outros vertebrados, incluindo: • doentes: típicos ou atípicos (em período prodrômico e subclínicos ou ambulatoriais); • não doentes ou “portadores” (em incubação, convalescentes ou sãos). O termo “portadores” designa os indivíduos que, sem apresentarem manifestações de doença atribuíveis a um determinado agente, constituem fontes de infecção deste. As três categorias de portadores podem ser descritas como: • em incubação: não tiveram a doença, não a têm, mas vão tê-la após terminado o período de incubação; • convalescentes: não têm a doença, mas a tiveram; • sãos: não têm a doença, não a tiveram e nem vão tê-la. É claro queuma fonte de infecção classificada como portador em incubação passará à condição de doente, eventualmente em período prodrômico e depois como caso típico ou atípico; poderá, ainda, voltar à condição de portador, agora convalescente. Vale lembrar que, como casos atípicos, são também referidas formas excepcionalmente severas de algumas doenças, cujas características não usuais tornam o diagnóstico clínico mais difícil. 5.2.3 Vias de eliminação São variadas as formas pelas quais pode ocorrer a saída de um agente da fonte de infecção. Estas formas são usualmente designadas por “vias de eliminação” e podem ser divididas em: • Secreções naso-buco-faríngeas: a boca e as vias respiratórias superiores são normalmente úmidas, aumentando essa umidade, usualmente, quando há infecção das mucosas que revestem essas vias. Assim sendo, em cada expiração, especialmente nos casos de tosse ou espirro, a umidade é expelida na forma de gotículas que incluem partículas sólidas, tais como células descamadas 86 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II e germes da flora normal das cavidades em causa e, eventualmente, agentes de infecção que constituem o que se designa por núcleos infectantes das gotículas. Além de agentes que se localizam nas mucosas de revestimento das cavidades, outros para elas podem ser drenados por secreções ou exsudatos de órgãos ou formações com elas relacionados. • Fezes: é a via natural de eliminação para agentes cuja localização única ou principal se dá nas paredes ou na luz do intestino, como acontece com alguns vírus, enterobactérias, protozoários e helmintos. Além disso, certos agentes são também eliminados pelas fezes após serem levados para a luz do intestino por secreções de órgãos que têm principal localização. • Urina: além dos agentes de infecções urogenitais, são eliminados pela urina agentes que apresentam uma fase septicêmica. • Sangue: constitui via de eliminação que, em condições naturais, depende da intervenção de um artrópode hematófago; doenças como a malária e a febre amarela, por exemplo, não podem ser transmitidas se o agente não for retirado da fonte de infecção pelo artrópode, pois não há outro meio pelo qual ele possa ser eliminado. Evidentemente, agentes podem ser retirados da fonte de infecção, com o sangue, quando este é coletado para fins de transfusão ou de exames laboratoriais, bem como quando adere a agulhas de injeção ou materiais cirúrgicos. • Escarro: é a via natural de eliminação de agentes localizados na traqueia, brônquios e pulmões; por adição, em passagem, podem ser acrescentados agentes presentes em secreções naso-buco- faríngeas. • Exsudatos, descargas purulentas e descamações epiteliais: aqui se inclui uma variedade de condições, tais como lesões superficiais abertas, supurações do conduto auditivo, da uretra, da conjuntiva ocular e outras mucosas, além de células epiteliais infectadas que descamam. • Leite: um número relativamente limitado de agentes patogênicos é eliminado por esta via. • Suor: além de agentes de doença da pele, há relatos de achados, no suor, de outros como o bacilo tífico, por exemplo, quando em fase septicêmica; a importância epidemiológica desta via deve ser muito pequena. • Outras vias: além das citadas, duas outras vias de eliminação devem ser consideradas – na primeira, é em órgãos da fonte de infecção (carnes, vísceras, usualmente) em que o agente está contido; nas outras, o agente passa através da placenta, do organismo materno para o fetal, nas infecções congênitas. Outro aspecto importante a ser ponderado é referente à diferença marcante que há quanto à continuidade ou intermitência de eliminação do agente, entre as vias representadas por secreções buco- naso-faríngeas e escarro, de um lado, e por excretas (fezes e urina), de outro. Finalmente, um agente pode ser eliminado por apenas uma ou por mais de uma via. 87 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 5.2.4 Vias de transmissão O meio exterior é, via de regra, desfavorável para agentes etiológicos das doenças infecciosas. Entretanto, é grande a variabilidade de comportamento que tais agentes apresentam frente às condições, também variáveis, que têm de enfrentar no meio exterior, especialmente no que se refere à umidade, à temperatura e às radiações. Podemos classificar as vias de transmissão segundo o tempo que medeia entre a eliminação do agente da fonte de infecção e a sua entrada em novo hospedeiro vertebrado. 5.2.4.1 Vias de transmissão que permitem nula ou curta permanência do agente no meio externo É indispensável um estreito relacionamento entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro vertebrado, para que ocorra a transferência direta ou praticamente direta do material infectante, recentemente eliminado e não alterado pelas condições do meio. Podemos dizer que a transmissão ocorre por contágio, devendo ser distinguidas duas formas: • Contágio imediato: implica justaposição de superfícies, reduzindo a zero o tempo de exposição do agente ao meio exterior; esta condição se verifica na transferência do agente durante relações sexuais, por beijo na boca, por mordeduras e nas infecções congênitas. • Contágio mediato: sem a justaposição de superfícies, mas sempre com o relacionamento que assegura tempo de permanência do agente no meio exterior suficientemente curto para que o material infectante não se altere. Três formas de transmissão devem ser referidas: por gotículas, por objeto contaminado e pelo mecanismo mão/boca. Não há, na conceituação de contágio mediato, a possibilidade de rigorosa definição de limites de tempo; o que mais interessa do ponto de vista epidemiológico é a avaliação do grau de relacionamento entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro, conduzindo ou não à admissão de que a transmissão tenha ocorrido de modo direto ou praticamente direto. Quando esta admissão não for razoável, pensaremos em outras formas de transmissão, por núcleos infectantes de gotículas ou por objetos contaminados, sem as características do contágio. 5.2.4.2 Vias de transmissão que exigem exposição mais prolongada do agente às condições do meio exterior Não há passagem direta ou praticamente direta da fonte de infecção para o novo hospedeiro vertebrado, é comum a chamarmos de “vias de transmissão indireta”. Podemos dizer que existe, sempre, um veículo, ou vários sucessivos que, na falta do relacionamento definido no contágio, estabelece a conexão entre a fonte de infecção e o novo hospedeiro vertebrado. Assim, classificamos as vias de transmissão indiretas segundo a natureza de tais veículos. 88 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Transmissão por vetores O termo “vetor” designa, em Epidemiologia, artrópodes que, por alguma forma, participam da transmissão de agentes infectantes. Dois tipos de vetores, essencialmente diferentes, devem ser considerados: os biológicos e os mecânicos, sendo os primeiros muito mais importantes. Transmissão pelo ar e por poeiras Admite-se, atualmente, que constitui uma possibilidade de transmissão de certas doenças, com graus variáveis de importância segundo a naturezados agentes infectantes e as circunstâncias, que, operando por contágio, assumem um significado maior. Transmissão indireta por objetos contaminados Foi comprovada a transmissão da varíola ao pessoal da lavanderia de hospitais, por meio de roupas contaminadas por doentes; nesse exemplo, fica bem evidente a inexistência do relacionamento que permitiria a transmissão direta ou praticamente direta. O mesmo acontece quando se trata de outros agentes infectantes contaminando toalhas, roupas de cama, talheres, copos, xícaras e outros objetos dessa natureza. Transmissão por alimentos A contaminação pode ocorrer por várias formas – a água de superfície pode se contaminar em contato com o solo que esteja contaminado, ao receber descargas de excretas em cursos de água ou reservatórios, nas canalizações em que é transportada, e, até mesmo, em recipientes em que é guardada para consumo. As águas de poços podem receber contaminação da superfície, pela abertura superior, ou por infiltração a partir de fossas vizinhas. O leite e as carnes podem provir de animais infectados; hortaliças podem ser cultivadas em terrenos adubados com excretas humanos ou animais; ostras podem ser colhidas de locais onde são descarregados com excretas humanos ou animais; elas ainda podem ser colhidas em locais onde são descarregados esgotos. A estas e outras formas de contaminação de alimentos, na origem, juntam-se todas as que, de acordo com as circunstâncias de cada caso, possam ocorrer nas fases seguintes de transporte, industrialização, armazenamento e comercialização. Mais tarde, durante o período que precede o consumo, fontes de infecção que manipulem o alimento, para prepará-lo ou para servi-lo, podem transferir para ele agentes infectantes, pelas mãos ou pela projeção de gotículas. O mais importante papel na transmissão é desempenhado pelos alimentos consumidos crus. A possibilidade de transmissão por alimentos depende da capacidade dos agentes infectantes de resistir às condições a que são expostos e do tempo de exposição; deve-se ter em mente, porém, que alguns alimentos, especialmente o leite e derivados, podem constituir meios de cultura adequados para alguns agentes. Transmissão pelo solo O solo pode participar da transmissão por várias formas – os agentes infectantes nele depositados (principalmente os eliminados com excretas); nele podem permanecer, por tempo muito longo. Formas de resistência (esporos) de agentes infectantes, vão infectar o novo hospedeiro através de soluções de 89 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA continuidade da pele; ovos do agente precisam evoluir no solo antes de se tornarem infectantes; ovos ou larvas do agente precisam evoluir no solo até alcançarem o estágio de larvas infectantes capazes de penetrar ativamente através da pele do novo hospedeiro. 5.2.5 Portas de entrada Conhecendo o mecanismo de transmissão, é fácil compreender que a penetração do agente infectante no novo hospedeiro pode se dar por uma das seguintes vias: • respiratória; • digestiva; • através de mucosas; • através da pele. Há alguma relação entre a via de eliminação e a porta de entrada; assim, por exemplo, agentes eliminados pelas secreções naso-buco-faríngeas têm como porta de entrada, frequentemente, a via respiratória, enquanto os eliminados pelos excretas penetram, usualmente, pela via digestiva. Mas há numerosas exceções a este relacionamento, bastando que se cite a penetração pela pele, de certos agentes eliminados pelas fezes. Assim, como há, para alguns agentes, mais de uma via de eliminação, também pode haver, para certos agentes, mais de uma porta de entrada. 5.2.5.1 O novo hospedeiro Uma vez que se tenha dado a penetração do agente no novo hospedeiro, o processo apresentará uma das seguintes sequências: • O agente é destruído pelos mecanismos de defesa do hospedeiro, antes de se dar a infecção. • O agente não é destruído pelos mecanismos de defesa do hospedeiro e nele se instala, com as seguintes probabilidades: — morte do hospedeiro em período relativamente curto; — morte do hospedeiro após longo prazo (doença crônica); — o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, dentro de um prazo relativamente curto, destruindo o agente; — o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, após longo prazo, ao fim do qual o agente é destruído (doença crônica); — o hospedeiro sara, com ou sem sequelas, permanecendo o agente, em equilíbrio que eventualmente pode ser rompido. 90 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II A sequência do processo depende da interação de fatores relativos ao hospedeiro e ao agente. Saiba mais Para obter informações sobre a transmissão vertical do HIV no Brasil, consulte o texto: VERMELHO, L. L.; SILVA, L. P.; COSTA, A. J. L. Epidemiologia da transmissão vertical do HIV no Brasil. [s.d.]. Disponível em: <http://www.Aids.gov.br/ sites/default/files/Epidemiologia_da_Transmissao_Vertical_do_HIV_no_ Brasil.pdf>. Acesso em: 8 abr. 2015. 5.3 PREVENÇÃO A manutenção de saúde (promoção/proteção de saúde) constitui grande parte da prática clínica. Muitas vezes, as atividades podem ser incorporadas ao atendimento usual dos pacientes, como quando um médico checa a pressão arterial de um paciente com queixa de dor de garganta; algumas vezes, é agendada uma consulta especial apenas para a manutenção da saúde. A prevenção na comunidade também é efetiva. Exigência de imunizações para os estudantes, proibição do fumo em locais públicos e restrições à venda de armas de fogo são exemplos de prevenção para a comunidade em geral. Para alguns problemas, como acidentes com armas de fogo, a prevenção na comunidade funciona melhor. Para outros, como o câncer colorretal (SELBY et al.,1993), é o melhor é o rastreamento em âmbito clínico. Para outros, ainda, esforços clínicos podem complementar atividades comunitárias, como a prevenção do tabagismo, em que os clínicos auxiliam pacientes individuais a pararem de fumar, em que a educação pública, as leis e os impostos previnem os jovens de começarem a fumar (FIORE et al.,1994). 5.3.1 Níveis de prevenção O Webster’s Dictionary define prevenção como “o ato de impedir que aconteça”. Com essa definição em mente, quase todas as atividades em Medicina poderiam ser concebidas como prevenção (WEBSTER’s, 1991). Afinal de contas, o trabalho do médico é dirigido para prevenir a ocorrência inoportuna de morte (desenlace), doença, desconforto, deficiência funcional, descontentamento e despesa. Contudo, em medicina clínica, a definição de prevenção é usualmente restrita. Embora seja mais praticada agora, como nunca antes, os clínicos ainda gastam a maior parte de seu tempo diagnosticando e tratando, ao invés de prevenindo doença. Dependendo de quando no curso da doença as intervenções médicas são feitas, três tipos de prevenção são possíveis: primária, secundária e terciária. 91 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 5.3.2 Prevenção primária A prevenção primária impede que a doença ocorra por completo, removendo sua causa. É efetuada com frequência fora do sistema de assistênciaà saúde, na comunidade. A cloração e fluoração da rede de água e as leis que obrigam o uso do cinto de segurança em automóveis e de capacetes em usuários de motocicletas são alguns exemplos. Algumas atividades de prevenção primária ocorrem em locais específicos de trabalho (uso de tampões auditivos ou máscaras protetoras de poeira), em escolas (imunizações) ou em locais especializados de atenção à saúde (uso de testes para detectar o vírus da hepatite B ou o HIV em doadores de bancos de sangue). A maioria das doenças não infecciosas pode ser vista como tendo um estágio precoce, durante o qual os fatores causais iniciarão a produção das anormalidades fisiológicas. Na aterosclerose, por exemplo, pode haver altos níveis de lipoproteína de baixa densidade (LDL) e lipoproteína de muito baixa densidade no sangue (VLDL), mas nenhum sinal de ateroma durante o estágio pré-doença. O objetivo, nesse momento, é modificar os fatores de risco em uma direção favorável. Atividades que modificam a vida, como mudar para uma dieta baixa em gorduras, procurar um programa estável de exercícios aeróbicos e parar com o tabagismo, são consideradas como sendo métodos de prevenção primária, pois visam evitar a ocorrência do processo patológico. 5.3.3 Prevenção secundária A prevenção secundária detecta a doença precocemente quando ela é assintomática e quando o tratamento precoce pode impedi-la de progredir; exame citopatológico de colo uterino, mamografia e teste de sangue oculto nas fezes são exemplos (LERMAN et al.,1991). A maior parte da prevenção secundária é feita em âmbito clínico, e todos os médicos, especialmente os que atendem a adultos, realizam prevenção secundária. Existem alguns programas de âmbito comunitário (o rastreamento do diabetes em feiras é um exemplo). Mais cedo ou mais tarde, dependendo do indivíduo, um processo de doença como a aterosclerose da artéria coronária progredirá o suficiente para se tornar detectável por testes médicos, mesmo que o indivíduo ainda seja assintomático. Isso pode ser imaginado como o estado (escondido) latente da doença. 5.3.3.1 Rastreamento O rastreamento (triagem) é a identificação de uma doença ou fator de risco não reconhecido por meio da história clínica (por exemplo, perguntar a um paciente se ele fuma), do exame físico (como exame de próstata), de um exame laboratorial (como a determinação da fenilalanina sérica) ou de outro procedimento (como sigmoidoscopia) que possa ser aplicado rapidamente (SELBY, 1993). Testes de rastreamento separam pessoas que estão aparentemente bem, mas que apresentam uma doença ou um fator de risco para uma doença, daquelas que não os apresentam. São parte de muitas atividades de prevenção primária e de todas as de prevenção secundária. Um teste de rastreamento não pretende ser um diagnóstico. Se o médico não se compromete a investigar posteriormente os resultados alterados e, se necessário, a prescrever o tratamento, não deveria de modo algum realizar o teste. 92 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Para muitas doenças infecciosas ou não-infecciosas, o desenvolvimento de testes de rastreamento tem tornado possível detectar doenças latentes em indivíduos considerados em risco. Diagnóstico pré-sintomático e tratamento através de programas de rastreamento são referidos como prevenção secundária, porque é uma linha de defesa secundária da doença. Apesar da não prevenirem a causa de iniciar o processo de doença, podem prevenir as sequelas permanentes. 5.3.4 Prevenção terciária A prevenção terciária refere-se àquelas atividades clínicas que previnem deterioração adicional ou reduzem as complicações depois que uma doença já esteja manifesta. Um exemplo é o uso de betabloqueadores para diminuir o risco de mortalidade em pacientes que se recuperam de um infarto no miocárdio (SCHAPPERT,1993). Os domínios da prevenção terciária se fundem com a medicina curativa, aquela bem-realizada vai além de tratar os problemas que os pacientes apresentam. Por exemplo, em diabéticos, a prevenção terciária requer mais do que o controle adequado dos níveis glicêmicos; eles precisam de exames oftalmológicos regulares para a detecção precoce de retinopatia diabética, educação para os cuidados usuais com os pés, investigação e tratamento de outros fatores de risco cardiovasculares e monitoramento das proteínas urinárias, para que inibidores da enzima conversora de angiotensina possam ser usados para prevenir insuficiência renal. A prevenção terciária é particularmente importante para o manejo de pacientes com doença fatal. A meta aqui não é prevenir morte, mas maximizar o tempo de vida de alta qualidade que ainda resta a um paciente. Quando a doença se torna sintomática e a assistência médica é procurada, o objetivo do clínico é fornecer uma prevenção terciária de modo a limitar incapacidade em pacientes com sintomas precoces, ou de modo a reabilitar para pacientes com doença sintomática tardia. Existem poucos, se é que existem, programas de prevenção terciária fora do sistema de assistência à saúde, mas muitos profissionais de saúde, além dos médicos, atuam neles. 5.3.5 Abordagem do exame periódico de saúde Ao considerar o que fazer rotineiramente em pacientes sem sintomas de uma determinada doença, o clínico deve primeiro decidir que problemas médicos ou doenças deveriam tentar prevenir. Essa afirmação é tão óbvia que pareceria desnecessária. Mas o fato é que muitos procedimentos preventivos, especialmente os testes de rastreamento, são realizados sem um entendimento claro do que está sendo procurado. Por exemplo, um exame qualitativo de urina é frequentemente solicitado por médicos que realizam um exame clínico de rotina em seus pacientes. Mas esse exame pode ser usado para procurar vários problemas médicos, tais como: diabetes, infecção assintomática do trato urinário e cálculos renais. É necessário decidir quais, ou talvez qual, dessas condições vale a pena rastrear antes de solicitar o teste. Três critérios são importantes para decidir que condições incluir em um exame periódico da saúde: (a) carga de sofrimento causada pela condição; (b) a qualidade do teste de rastreamento, se 93 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA algum teste for necessário; e (c) a efetividade da intervenção de prevenção primária (por exemplo, aconselhamento de pacientes sobre a prática de sexo seguro) ou a efetividade do tratamento de prevenção secundária após a condição ser encontrada no rastreamento (por exemplo, tratamento de um câncer de próstata). Critérios para decidir se uma condição clínica deve ser incluída em exames periódicos de saúde: • Qual a carga de sofrimento causada pela condição em termos de: morte, doença, deficiência funcional, desconforto, descontentamento e despesa. • Quão bom é o teste de rastreamento, se for necessário realizá-lo, em termos de: sensibilidade, especificidade, simplicidade, custo, segurança, aceitabilidade e efeito do rótulo. • Para a prevenção primária, quão efetiva é a intervenção? Ou para a prevenção secundária, se a condição for encontrada, qual a efetividade do tratamento subsequente em termos de eficácia, adesão do paciente e o tratamento precoce ser mais efetivo que tratamento sadio. A carga de sofrimento leva em conta a frequência de uma condição de saúde. Muitas vezes, uma dada condição causa grande sofrimento paraos indivíduos desafortunados o suficiente para adquiri- la, mas é rara demais – talvez no grupo etário específico do paciente – para que seu rastreamento seja considerado. Um dilema particularmente difícil deparado por médicos e pacientes é a situação em que uma pessoa é sabidamente de alto risco para uma condição, mas não há evidência de que o tratamento precoce seja efetivo. O que podem fazer médico e paciente? Não há uma resposta fácil para este dilema. Mas se os médicos lembrarem que o rastreamento não terá utilidade, a menos que a terapia efetiva seja efetiva, eles poderão pesar cuidadosamente a evidência sobre a terapia com o paciente. Se a evidência for contra a efetividade do tratamento, pode-se prejudicar, ao invés de ajudar, o paciente com o rastreamento. 5.3.5.1 Quanto prejuízo para quanto benefício? Promoção de saúde e prevenção de doenças estão se tornando, progressivamente, mais populares. A meta de manter as pessoas tão saudáveis quanto possível é louvável, mas os conceitos por trás das metas são complexos. O mais importante: as atividades de promoção de saúde podem causar prejuízos. De fato, é possível dizer que elas causam usualmente prejuízo, mesmo que totalmente involuntário. Na melhor das hipóteses, elas custam dinheiro, consomem tempo dos pacientes e muitas vezes causam desconforto. Na pior das hipóteses, especialmente para aqueles pacientes com resultados falso- positivos, as atividades preventivas podem causar sério prejuízo físico em um raro paciente, seja por complicações do rastreamento em si, ou por efeitos adversos dos testes ou tratamentos subsequentes. Testes falso-positivos também podem causar prejuízos psicológicos. Então, é importante que um clínico tenha sólidas evidências sobre quanto benefício e quanto prejuízo as atividades de promoção de saúde podem alcançar. Boas intenções não são o suficiente. 94 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Antes de adotar um procedimento de promoção de saúde em um paciente, especialmente se o procedimento for controverso entre grupos de especialistas, o clínico deveria discutir os prós (probabilidades de benefícios conhecidos e almejados) e os contras (probabilidades de efeitos indesejados) de tal procedimento com seu paciente. 5.3.5.2 Recomendações atuais Com o progresso da ciência da prevenção, as recomendações atuais para proteção da saúde são muito diferentes daquelas do passado. Muitos grupos têm recomendado o abandono do exame clínico anual de rotina, em favor de uma abordagem seletiva, na qual os testes a serem feitos dependem a idade, sexo e características clínicas da pessoa (aumentando, assim, a prevalência e o valor preditivo). Tendem a recomendar menos testes do que anteriormente (diminuindo, assim, a percentagem de pacientes com resultados falso-positivos). Muitos grupos direcionam sua atenção para o processo de seleção, para decidir que condição médica deveria ser procurada. Há uma preocupação crescente em delimitar claramente os critérios que os testes devem preencher, antes que sejam incorporados aos exames periódicos de saúde. Grupos que explicitam critérios para selecionar condições médicas são mais conservadores em suas recomendações do que os sem os mesmos critérios. 6 VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA A vigilância epidemiológica é definida pela Lei n° 8.080/90 como: [...] um conjunto de ações que proporcionam o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos. O objetivo principal é fornecer orientação técnica permanente para os profissionais de saúde, que têm a responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças e agravos, tornando disponíveis, para esse fim, informações atualizadas sobre a ocorrência dessas doenças e agravos, bem como dos fatores que a condicionam, numa área geográfica ou população definida. E, ainda, constitui-se importante instrumento para o planejamento, a organização e a operacionalização dos serviços de saúde, como também para a normatização de atividades técnicas afins. O interesse em acompanhar a ocorrência de doenças em comunidades com o sentido de prevenir sua disseminação existe desde épocas remotas. Da necessidade de controlar enfermidades até a concepção atual de vigilância epidemiológica – informação para ação – um longo caminho foi percorrido. Neste processo, a vigilância epidemiológica passou por modificações de conceitos e de estratégias de ação, sem perder de vista o objetivo principal: coletar dados para o desencadeamento de ações de prevenção e controle. No Brasil, um conceito foi adotado oficialmente para descrever vigilância epidemiológica como “um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual 95 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA ou coletiva, com a finalidade de recomendar e adotar as medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos” (BRASIL, 1990). As atividades de vigilância epidemiológica se organizam de modo a garantir o cumprimento de suas principais funções e envolvem a coleta, o processamento, a análise e a interpretação de dados: a recomendação, a promoção e a avaliação da eficácia e da efetividade das medidas de controle; e a divulgação das informações obtidas. Essas etapas são operacionalizadas nas etapas a seguir: 6.1 Obtenção de dados É uma etapa primordial para o objetivo da vigilância epidemiológica: subsidiar o desencadeamento de ações de prevenção e controle de doenças e agravos. A qualidade e o valor da informação gerada dependem da adequada coleta de dados obtidos no local onde ocorre o agravo. Esses dados – denominados primários ou básicos –, ao serem processados, darão origem à informação que permite planejar ações. Para que esta etapa se cumpra de modo efetivo, é necessário reconhecer sua importância e investir em treinamento e reciclagem regulares dos profissionais que atuam nos níveis locais do sistema de informação. Por analogia com a produção industrial, os dados são a matéria-prima da vigilância epidemiológica e a informação, o seu produto final. A etapa de coleta de dados pode ser relacionada às categorias ou tipos de dados de interesse, às fontes em que estes podem ser obtidos e ao fluxo que devem seguir dentro do sistema de informação. 6.2 Tipos de dados 6.2.1 Demográficos Os dados demográficos, como o número de habitantes e a sua distribuição, segundo diversos aspectos (sexo e idade, por exemplo), são utilizados pela vigilância epidemiológica na expectativa de taxas e coeficientes, possibilitando efetuar comparações entre diferentes grupamentos populacionais. As bases de dados demográficos mais frequentemente utilizadas são o censo demográfico e o Sistema de Informações de Nascidos Vivos. 6.2.2 Morbidade Os dados que permitem conhecer a morbidade em uma população podem se referir à ocorrência isolada de agravos sintomáticos ou assintomáticos ou a surtos e epidemias. Podem se tratar de dados sobre doenças já conhecidas e endêmicas, ou que possibilitem a detecção de agravos inusitados (como o caso da Aids) ou emergentes (como a dengue). Os dados laboratoriais e o de consumo de medicamentos podemser utilizados como aliados na indicação da ocorrência/propagação/controle de doenças. Também o consumo de preservativos pode ser aproveitado para a avaliação de impactos das medidas de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis. 96 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II A atualização dos profissionais da vigilância com referência aos agravos que vêm ocorrendo em outras regiões facilita o pronto reconhecimento diante da introdução da mesma doença em local anteriormente sem casos. Outro dado relevante tem origem no conhecimento dos fluxos de viajantes e das possíveis endemias que podem se disseminar desta forma. 6.2.3 Mortalidades Os dados de mortalidade, provenientes de declarações de óbito, apesar de não terem a qualidade ideal, têm importância capital nas estimativas de indicadores de saúde, sendo reconhecidamente úteis para este fim. Por exemplo, a distribuição proporcional de óbitos segundo faixa etária é um dos mais utilizados para conhecer as condições de saúde de grupos populacionais. Além desta aplicação, o acompanhamento da letalidade por meningite meningocócica permite avaliar a agilidade da assistência médica em efetuar o diagnóstico e instituir o tratamento. Assim sendo, a vigilância epidemiológica precisa estar informada sobre a ocorrência dos óbitos em sua área para avaliar a efetividade das ações e monitorar a situação de saúde. 6.2.4 Áreas e situações de risco O papel da vigilância epidemiológica não se restringe à interrupção da cadeia de transmissão de uma doença, mas deve também intervir sobre a rede de acontecimentos que podem originar os agravos à saúde. Também é importante saber de informações sobre os fatores condicionantes de doenças para que possa mapear áreas e situações de risco. Dados comumente utilizados para este fim são: condições de saneamento, abastecimento e qualidade da água, qualidade e distribuição do sangue e uso de agentes tóxicos ambientais. Além dos fatores conhecidos, frente à ocorrência de um agravo inusitado ou a uma epidemia, convém pesquisar outros fatores que possam estar contribuindo para aquela situação naquele momento. 6.3 Fontes de dados Múltiplas são as fontes de dados utilizadas em vigilância epidemiológica, e a acessibilidade a elas vem sendo facilitada pela informação crescente. Apesar das limitações, e até mesmo para gerar a necessidade de aperfeiçoamento, o emprego destas fontes possibilita o entendimento da situação de modo ágil, abrindo um leque de questões que motivarão novos estudos e desencadearão alternativas para solucionar possíveis problemas. Entretanto, a necessidade de agilizar o processo de divulgação de dados deve caminhar ao lado da necessidade de preservar e investir na qualidade da obtenção deles. 6.3.1 Demográficos Os censos, realizados periodicamente pela maioria dos países, constituem-se na fonte de dados demográficos de maior aceitabilidade. Estes dados, com tabulações segundo variáveis geográficas e socioeconômicas e em diversos graus de agregação, são publicados por meio de catálogos impressos e encontram-se disponíveis através da internet, como site do IBGE (<www.ibge.gov.br>) no Brasil. 97 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA Como exemplo, podemos citar a Resolução da Presidência do IBGE nº 04, de 22 de dezembro de 2014, em que o IBGE (2014) divulga a área territorial brasileira para o país, unidades da federação e municípios. Área Territorial Brasileira Introdução As estimativas da população residente para os 5.570 municípios produzidas pelo IBGE consideram a situação atualizada da Divisão Político-Administrativa Brasileira – DPA. O reprocessamento dos valores das áreas territoriais, de acordo com a estrutura político- administrativa vigente em 01/07/2013, data de referência das Estimativas Populacionais 2013, incorporaram as alterações de limites territoriais municipais ocorridas após o Censo Demográfico 2010 e praticadas nas Estimativas Populacionais de 2011, 2012 e 2013, bem como demais ajustes territoriais ocorridos neste período. Para a superfície do Brasil foi mantido o valor de 8.515.767,049 km2, publicado no DOU nº 16 de 23/01/2013, conforme Resolução Nº 01, de 15 de janeiro de 2013. Motivações das alterações promovidas nos arquivos estaduais e municipais: • Natureza legal ou judicial. • Modificações na pertinência territorial de algumas localidades por decisões judiciais (Liminares e Mandados) ou por parecer normativo da Procuradoria Federal no IBGE. • Alterações ou ajustes cartográficos comunicados oficialmente ao IBGE pelos órgãos estaduais responsáveis pela divisão política administrativa no âmbito dos convênios existentes. • Ajustes e refinamentos cartográficos dos contornos dos polígonos estaduais e municipais. • Inovações tecnológicas advindas de uma melhora significativa das geotecnologias e dos insumos para identificação e representação cartográfica dos polígonos estaduais e municipais. Informações sobre alteração na metodologia para cálculo de áreas municipais As áreas disponibilizadas foram calculadas por meio do software GEOMEDIA, utilizando- se a Projeção Cônica Equivalente de Albers, em virtude de ser esta a projeção equivalente apropriada para tal finalidade, com os seguintes parâmetros para o país: • Longitude origem: -54°. • Latitude origem: -12°. 98 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II • Paralelo padrão 1: -2°. • Paralelo padrão 2: -22°. O sistema de referência utilizado foi o Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas (SIRGAS2000), conforme Resolução do Presidente do IBGE Nº 1/2005, disponível em: <ftp://geoftp.ibge.gov.br/documentos/geodesia/projeto_mudanca_referencial_geodesico/ legislacao/rpr_01_25fev2005.pdf> A definição do sistema geodésico de referência acompanha, em cada fase da história, o estado da arte dos métodos e técnicas então disponíveis. Com o advento dos sistemas globais de navegação (i.e. posicionamento) por satélites (GNSS – Global Navigation Satellite Systems), tornou-se mandatória a adoção de um novo sistema de referência, geocêntrico, compatível com a precisão dos métodos de posicionamento correspondentes e também com os sistemas adotados no restante do globo terrestre. Curiosidades O maior estado brasileiro continua sendo o Amazonas, com 1.559.148,890 km², que supera a soma dos territórios das regiões Sul e Sudeste. O estado de menor extensão territorial, Sergipe, com 21.918,493 km². O maior município brasileiro, no entanto, fica no Pará é Altamira e tem 159.533,255 km². Vêm em seguida, Barcelos (122.471,158 km²) e São Gabriel da Cachoeira (109.183,434 km²), ambos no Amazonas, e Oriximiná (107.603,291 km²), no Pará. O município mineiro de Santa Cruz de Minas, com área de 3,565 km² é o menor do país. E segundo menor é Águas de São Pedro, em São Paulo, com área de 3,612 km². Suas áreas são menores em relação à da Ilha de Fernando de Noronha, distrito estadual de Pernambuco, que tem 17,017 km². Fonte: Brasil (2013). Saiba mais Outra fonte de dados, imprescindível nos cálculos de estimativas de expectativa de vida e de fecundidade, origina-senas estatísticas de nascidos vivos e está estruturada em sistema informatizado. O site que disponibiliza as informações é: <www.datasus.gov.br>. 99 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 6.3.2 Morbidade A notificação – comunicação da ocorrência de uma doença ou agravo à saúde feita à autoridade sanitária por profissionais de saúde ou qualquer cidadão – é a principal fonte de informação sobre a morbidade da vigilância epidemiológica. Saiba mais Atualmente, no Brasil, os dados de doença e agravos de notificação compulsória alimentam o subsistema de informação da vigilância epidemiológica e é denominado Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN, também informatizado. As informações podem ser obtidas em: <www.funasa.gov.br>. Saiba mais Menos utilizado pela vigilância epidemiológica, mas de igual valor para o diagnóstico de saúde em comunidades e para o planejamento de ações preventivas e da oferta de serviços de saúde, são os dados de morbidade do Sistema de Informações de Saúde do SUS (Datasus), através do Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS) e do Sistema de Informações Ambulatoriais (SAI-SUS). Os dados secundários, aqueles que sofrem alguma tabulação prévia a partir dos primariamente gerados, encontram- se também disponíveis no site: <www.datasus.gov.br>. Alguns agravos à saúde, como as neoplasias, a tuberculose, a hanseníase, o diabetes e a Aids, têm um sistema especial de registro de morbidade. Estes sistemas (que são usados para os agravos anteriormente relacionados) foram sendo criados dentro de uma política de controle de doenças baseada em campanhas e programas de saúde que objetivam oferecer uma assistência integral à saúde, considerando os aspectos relativos aos diversos níveis de prevenção e assistência médica. 100 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Saiba mais Os registros sobre as neoplasias podem ser encontrados no site do Instituto Nacional do Câncer: <www.inca.gov.br>. Podem ser tabulados segundo o estado e o órgão atingido, estando ainda disponíveis análises epidemiológicas atualizadas sobre a incidência e a mortalidade. Saiba mais De modo similar, os registros de Aids, tuberculose, hanseníase e diabetes podem ser obtidos no site do Ministério da Saúde: <www.saude.gov.br>. 6.3.3 Mortalidade Os dados das declarações de óbito são informatizados e dão origem ao Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) e encontram-se também disponíveis em meios eletrônicos (<www.datasus.gov.br>). No SIM, os dados de mortalidade podem ser tabulados, em nível nacional, estadual e municipal, de modo a serem obtidas distribuições dos óbitos segundo as variáveis contidas na causa básica do óbito. Este sistema, assim como os demais sistemas que têm disponibilizado bases eletrônicas de dados, encontra-se em permanente aperfeiçoamento e é importante que as notas técnicas sobre a metodologia aplicada sejam rigorosamente observadas quando da sua utilização. 6.3.4 Áreas e situação de risco No sentido de prever a ocorrência de agravos e traçar prioridades de intervenção, é necessário manter atualizadas as informações acerca de áreas, situações e grupamentos humanos expostos ao risco de adoecer. Esses dados com frequência podem ser obtidos em setores externos à vigilância epidemiológica e ao próprio setor de saúde. Por exemplo, se o interesse da vigilância epidemiológica estiver em reduzir a mortalidade por atropelamento, necessita-se conhecer os locais onde o risco de ocorrência deste evento seja mais elevado para priorizar ações. As ocorrências de acidentes automobilísticos encontram-se disponíveis em órgãos governamentais de controle do tráfego rodoviário. 101 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA De modo semelhante, encontra-se o conhecimento sobre o risco de exposição e agrotóxicos ou há produtos hemoterápicos contaminados e, ainda, dos diferenciais de risco de aquisição de doenças de veiculação hídrica segundo as condições de saneamento, além dos complexos aspectos socioculturais e a infinidade de comportamento e hábitos de vida denominados como de risco para determinadas doenças. 6.3.5 Laboratórios, farmácias e indústrias de medicamentos Os laboratórios de análises clínicas e os serviços de hemoterapia constituem uma importante fonte de informação para a vigilância epidemiológica em diversos países. O monitoramento de infecções de transmissão sanguínea, como a Aids e as hepatites B e C, através do conhecimento da soroprevalência em doadores de sangue, é frequentemente empregado para comparar regiões e grupos diversos, segundo o risco. A curva de produção e consumo de determinados medicamentos pode indicar a existência ou a maior frequência de certas doenças e, até mesmo, explicar a ocorrência ou ausência de outras. Por exemplo, o consumo elevado de vermífugos poderia explicar a inexistência de verminoses em comunidades de saneamento básico deficiente. 6.3.6 Imprensa e comunidade Aliadas eficientes na obtenção de informações, a imprensa e a comunidade devem ser valorizadas, em especial em localidades onde a vigilância epidemiológica não está bem estruturada. Além disso, podem participar de modo eficaz nas etapas de divulgação, multiplicando informações sobre as medidas preventivas a serem tomadas diante da ocorrência de uma epidemia. 6.4 Fluxo de informação No Brasil, o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica foi instituído em 1975, através da Lei Federal nº 6.529 (BRASIL, 1975), em que também foi criada a obrigatoriedade da notificação compulsória de doenças. Desde então, a lista nacional de doenças de notificação compulsória vem sendo periodicamente atualizada. A portaria nº 1.271, de 6 de junho de 2014 (BRASIL, 2014) define a Lista Nacional de Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o território nacional, nos termos do anexo, e dá outras providências. Lista Nacional de Notificação Compulsória: 1 – a) Acidente de trabalho com exposição a material biológico; b) Acidente de trabalho: grave, fatal e em crianças e adolescentes. 2 – Acidente por animal peçonhento. 102 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II 3 – Acidente por animal potencialmente transmissor da raiva. 4 – Botulismo. 5 – Cólera. 6 – Coqueluche. 7 – a) Dengue – casos; b) dengue – óbitos. 8 – Difteria. 9 – Doença de chagas aguda. 10 – Doença de creutzfeldt-jakob (DCJ). 11 – a) Doença Invasiva por “haemophilus influenza”; b) Doença meningocócica. 12 – Doenças com suspeita de disseminação intencional: a) antraz pneumônico; b) tularemia; c) varíola. 13 – Doenças febris hemorrágicas emergentes/reemergentes: a) arenavírus; b) ebola; c) marburg; d) lassa; e) febre purpúrica brasileira. 14 – Esquistossomose. 15 – Eventode saúde pública (ESP) que se constitua ameaça à saúde pública (ver definição no art. 2º desta portaria). 16 – Eventos adversos graves ou óbitos pós-vacinação. 17 – Febre amarela. 18 – Febre de chikungunya. 19 – Febre do Nilo Ocidental e outras arboviroses de importância em saúde pública. 20 – Febre maculosa e outras riquetisioses. 21 – Febre tifoide. 22 – Hanseníase. 23 – Hantavirose. 103 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 24 – Hepatites virais. 25 – HIV/AIDS – infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana ou Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. 26 – Infecção pelo HIV em gestante, parturiente ou puérpera e criança exposta ao risco de transmissão vertical do HIV. 27 – Infecção pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV). 28 – Influenza humana produzida por novo subtipo viral. 29 – Intoxicação exógena (por substâncias químicas, incluindo agrotóxicos, gases tóxicos e metais pesados). 30 – Leishmaniose tegumentar americana. 31 – Leishmaniose visceral. 32 – Leptospirose. 33 – a) Malária na região amazônica; b) malária na região extra Amazônica. 34 – Óbito: a) infantil; b) materno. 35 – Poliomielite por poliovírus selvagem. 36 – Peste. 37 – Raiva humana. 38 – Síndrome da rubéola congênita. 39 – Doenças exantemáticas: a) sarampo; b) rubéola. 40 – Sífilis: a) adquirida; b) congênita; c) em gestante. 41 – Síndrome da paralisia flácida aguda. 42 – Síndrome respiratória aguda grave associada a coronavírus a. SARS-CoV; b. MERS-CoV. 43 – Tétano: a. Acidental; b. Neonatal. 44 – Tuberculose. 104 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II 45 – Varicela - caso grave internado ou óbito. 46 – a. Violência: doméstica e/ou outras violências. b. Violência: sexual e tentativa de suicídio. Adaptado de: Brasil (2014b). A inclusão de doenças nesta lista é decidida mediante a consideração conjunta de critérios, de modo não linear, não sendo necessário o atendimento a todos eles: magnitude, potencial de disseminação, transcendência, vulnerabilidade, compromissos internacionais, regulamento sanitário internacional e epidemias, surtos e agravos inusitados. A notificação deve ser sigilosa e efetuada mediante a suspeita da doença, não sendo necessária a confirmação do caso, pois costuma resultar em perda de notificação e/ou atraso na tomada de decisão. O envio de formulários de notificação deve ser realizado mesmo na circunstância de ausência de casos de notificação compulsória. Esta notificação – denominada de negativa – funciona como indicador de aceitabilidade do sistema de informação. Atualmente, o fluxo de informação da vigilância epidemiológica (figura a seguir) está informatizado e vem sendo aperfeiçoado, tendo em vista que o dado coletado deve ter qualidade e homogeneidade sem prejuízo à detecção da multiplicidade de situações e à oportunidade da instituição de medidas de controle. Unidades ambulatoriais de saúde Hospitais Secretaria municipal do estado Municipal Regional de saúde Secretaria estadual de saúde Estadual Ministério da saúde Nacional Outras fontes Figura 9 – Fluxo de informação do Sinan Propõe-se, de maneira geral, que as fichas individuais de notificação sejam preenchidas pelos profissionais de saúde nas unidades assistenciais, as quais devem manter uma segunda via arquivada, 105 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA pois a original é remetida para o serviço de vigilância epidemiológica responsável pelo desencadeamento das medidas de controle necessárias. Este, por sua vez, além dessa incumbência, deve encaminhar os formulários para o setor de digitação das secretarias municipais, para que posteriormente os arquivos de transferência sejam enviados por meio magnético às secretarias estaduais e, em seguida, ao Ministério da Saúde, conforme periodicidade definida na figura a seguir. Secretaria municipal de saúde Secretaria de estado da saúde Regional de saúde Ministério da saúde Semanal 1º ao 3º dia útil 15º ao 18º dia útil Semanal Figura 10 – Periodicidade para envio dos arquivos de transferência do Sinan Preconiza-se que, em todas as instâncias, os dados aportados pelo Sinan sejam consolidados e analisados e que haja uma retroalimentação dos níveis que o antecedem, além de sua redistribuição, segundo local de residência dos pacientes objetos das notificações. Saiba mais No nível federal, os dados do Sinan são processados, analisados juntamente com aqueles que chegam por outras vias e divulgados pelo Boletim Epidemiológico do SUS e informes epidemiológicos eletrônicos, disponibilizados no site: <www.saude.gov.br>. Ao contrário dos demais sistemas, em que as críticas de consistência são realizadas antes do envio a qualquer outra esfera de governo, a necessidade de desencadeamento imediato de uma ação faz com que, nesse caso, os dados sejam enviados o mais rapidamente possível, ficando a sua crítica para um segundo momento – quando do encerramento do caso e, posteriormente, o da análise das informações para divulgação. No entanto, apesar desta peculiaridade, esta análise é fundamental para que se possa garantir uma base de dados com qualidade, não podendo ser relegada a segundo plano, tendo em vista que os dados já foram encaminhados para os níveis hierárquicos superiores. A partir da alimentação do banco de dados do Sinan, pode-se calcular a incidência, prevalência, letalidade e mortalidade, bem como realizar análises de acordo com as características de pessoa, tempo e lugar, particularmente no que se refere às doenças transmissíveis de notificação obrigatória, além de outros indicadores epidemiológicos e operacionais utilizados para as avaliações local, municipal, estadual e nacional. 106 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Para que o Sinan se consolide como a principal fonte de informação de morbidade para as doenças de notificação compulsória, faz-se necessário garantir tanto a cobertura como a qualidade das informações. Sua utilização, em todo o território nacional, possivelmente, possibilitará a obtenção dos dados indispensáveis ao cálculo dos principais indicadores necessários para o monitoramento dessas doenças, gerando instrumentos para a formulação e avaliação das políticas, planos e programas de saúde, subsidiando o processo de tomada de decisões e contribuindo para a melhoria da situação de saúde da população. 6.5 Avaliação da vigilância epidemiológica A avaliação do sistema de vigilância tem como objetivo promover o melhor uso dos instrumentos do sistema através do desenvolvimento de sua eficiência e efetividade. Os Centers for Disease Control and Prevention, dos EUA, em 1988, desenvolveram uma metodologia de avaliação de sistemas de vigilância epidemiológica. Ela avalia a vigilância epidemiológica com base em critérios preestabelecidose é internacionalmente reconhecida, o que permite efetuar comparações com avaliações realizadas em outros países. A avaliação deve ser permanente em todos os níveis do sistema de vigilância epidemiológica e ser norteada por dois eixos fundamentais: o evento adverso à saúde sob vigilância e o sistema de vigilância epidemiológica. O evento é enfocado sob os aspectos da magnitude, transcendência e vulnerabilidade, e o sistema segundo atributos de utilidade, qualidade (sensibilidade, especificidade, representatividade, oportunidade, simplicidade, flexibilidade, aceitabilidade e custo). Para se efetuar esta avaliação, utilizam-se instrumentos que subsidiam a mensuração de cada um dos aspectos relacionados ao evento e aos atributos do sistema: os indicadores epidemiológicos e os operacionais. Os indicadores epidemiológicos são utilizados para mensurar questões relativas à importância do evento, e os operacionais são úteis na avaliação do sistema. Saiba mais Para maiores detalhes sobre vigilância epidemiológica no Brasil, consulte: BRASIL. Ministério da Saúde. Vigilância em saúde no SUS: fortalecendo a capacidade de resposta aos velhos e novos desafios. Brasília, 2006. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigilancia_ saude_SUS.pdf>. 6.6 Métodos empregados em Epidemiologia A demanda por qualidade máxima do cuidado em saúde, combinada com a necessidade de uso racional de recursos tanto públicos quanto privados, tem contribuído para aumentar a pressão sobre 107 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA os profissionais da área da saúde no sentido de assegurar a introdução de uma prática baseada em evidências científicas. A expressão “medicina baseada em evidência” surgiu na década de 1980 para descrever a aprendizagem baseada em problemas, usada pela McMaster University Medicine School. Prática Baseada em Evidência (PBE) e Cuidado em Saúde Baseado em Evidência compreendem os mesmos conceitos e princípios da Medicina baseada em evidência, sendo empregados por diferentes profissionais e em diversos contextos de saúde. No intuito de melhor conhecer a saúde da população, os fatores que a determinam, a evolução do processo da doença e o impacto das ações propostas para alterar o seu curso, os homens de ciência desenvolveram numerosas maneiras de abordagem e investigação. Como consequência, existem muitos métodos a nossa disposição. Na verdade eles são comuns a outros ramos da ciência. Para uma dada situação ou momento, um deles poderá ser mais adequado do que outro, embora vários sejam usados no estudo de um mesmo tema. Cada qual tem os seus aspectos positivos e suas limitações, de modo que, os conhecendo, pode-se antecipar as facilidades e as dificuldades encontradas pelas pessoas que os utilizam; e julgar, ao avaliar a metodologia empregada, os resultados apresentados e a interpretação dada, ou seja, se a teoria foi convenientemente aplicada. Na investigação de um tema, três estratégias independentes de abordagem vêm sendo utilizadas, de longa data, pelos profissionais da área da saúde: o estudo de casos, a investigação experimental em laboratório e a pesquisa, considerando a população. 6.6.1 Estudo de casos O estudo de casos costuma ser a primeira abordagem de um tema. Ele é usado para a avaliação inicial de problemas ainda mal conhecidos e cujas características ou variações naturais não foram devidamente detalhadas. Muitas revistas científicas apresentam uma seção de “relato” ou “apresentação de casos”, para difundir os resultados destes estudos. Trata-se de observar um ou poucos indivíduos com uma mesma doença ou evento e, a partir da descrição dos respectivos casos, traçar um perfil das suas principais características. Essa forma de abordagem e as pesquisas qualitativas, de maneira geral, são usadas em combinação com as quantitativas, para compor um quadro mais completo da situação. Assim sendo, o estudo de casos é empregado para enfocar grupos específicos da população ou um particular aspecto de interesse, não devidamente investigados em pesquisas quantitativas ou que simplesmente necessitem de suplementação de informações, com maior riqueza de detalhes (LIMA-COSTA; BARRETO, 2003). 6.6.1.1 Aspectos positivos do estudo de casos Em geral, o estudo de caso é relativamente fácil de ser realizado e de baixo custo. O relato pode restringir-se a uma simples descrição ou ir mais além, de modo a sugerir explicações sobre elementos pouco conhecidos, tais como os fatores implicados na etiologia ou no curso de doença, sob vigência ou não de terapêutica. Em clínica, é possível acompanhar pacientes durante anos, e mesmo décadas, chegando-se a um quadro repleto de detalhes sobre aspectos evolutivos de uma dada condição. O estudo de caso constitui-se em um verdadeiro inventário do que acontece genericamente, à luz da observação 108 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II de poucos indivíduos. É um enfoque qualitativo e exploratório, embora muitas facetas possam ser quantificadas. Um aspecto positivo convém realçar: é a possibilidade de observação intensiva de cada caso. 6.6.2 Limitações do estudo de casos Às vezes, a observação restringe-se a situações incomuns de enfermos graves, outras vezes, aos casos de evolução atípica, de reação inusitada ou de resultado terapêutico inesperado; muito raramente, abrange pacientes em todas as fases de manifestação da doença. Além disso, há certa dose de subjetividade na apreciação dos fatos, difícil de contornar, pois o observador já pode ter uma ideia preconcebida do tema e a faz preponderar. Apesar das vantagens referentes à facilidade de realização e baixo custo, duas limitações principais estão presentes no estudo de casos: • a falta de controle – os casos serviriam para contornar problemas de aferição e comparação; • número pequeno de indivíduos incluídos para observação – o que aponta para a prudência na interpretação dos resultados de estudos de casos, especialmente na generalização das conclusões. De modo geral, este tipo de investigação, como tem sido atualmente empregado na área clínica, é útil para levantar problemas, muito dos quais são complementarmente investigados com o auxílio de outros métodos. 6.7 Investigação experimental de laboratório Nesta segunda modalidade de estudo de um tema, é possível imprimir maior precisão a todas as etapas de investigação. Aspectos positivos da investigação de laboratório O laboratório é o lugar ideal para estudos experimentais. O grau de subjetividade na aferição dos dados pode ser reduzido, em laboratório, pelo uso de rigorosos controles, que servem também para parâmetros a fim de comparar os resultados. Na maioria das vezes, por motivos éticos, o foco da avaliação incide sobre os animais, embora as pessoas possam ser igualmente alvo deste tipo de investigação, em casos selecionados. Principal limitação da investigação experimental de laboratório A questão problemática das investigações em animais reside na extrapolação de resultados para os seres humanos. Em última análise, este é o ângulo que realmente interessa. A prudência é sempre recomendada, na extrapolação, visto que diferenças entre espécies podem invalidar as generalizações. 109 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 015 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA 6.8 Pesquisa populacional A pesquisa populacional é a terceira estratégia para estudo de um tema. Ela é a abordagem central da Epidemiologia, sendo também empregada em outras áreas, como na Genética e nas Ciências Sociais. Conjuntos formados por indivíduos (particularizados um a um ou agregados por algum critério) constituem a matéria-prima da investigação epidemiológica. Os agregados de que trata a pesquisa epidemiológica são quase sempre referidos a uma base geográfica e temporal, constituindo populações em um sentido estrito. Eles são mais do que o somatório dos indivíduos que os compõem, porque os coletivos humanos são necessariamente determinados, social e culturalmente. Por esse motivo, a Epidemiologia estuda duas classes de seres: agregados humanos, coletivos de homens e mulheres e indivíduos membros desses agregados. Justifica-se, assim, adotar como principal eixo estruturante da arquitetura da pesquisa epidemiológica o tipo de unidade de observação e de análise expresso na dicotomia “estudo agregado versus estudo individualizado”. Após considerar esse critério de base, estudos epidemiológicos podem então ser classificados de acordo com dois eixos complementares; o primeiro refere-se ao posicionamento do investigador, e o segundo remete à dimensão temporal do estudo. O papel do investigador em sua relação com o objeto da investigação compreende dois tipos: posição passiva e ativa. O posicionamento passivo implica a observação, da forma mais metódica e acurada possível, dos processos de produção de doentes em populações, com o mínimo de interferência nos objetos concretos estudados. O posicionamento ativo atende às estratégias de ação do investigador no sentido de interferir nos processos de estudos, de maneira sistemática e controlada, resultando no que correntemente se denomina experimentação. Experimentos constituem manobras de intervenção que têm como objetivo isolar efeitos, controlar interferências externas e desencadear processos cruciais para o teste de hipóteses. Para equivaler à polaridade passivo-ativo, no presente contexto, empregamos a oposição operacional (ainda que limitada e parcial) entre observação versus intervenção. A temporalidade do desenho do estudo, para o que nos interessa na investigação epidemiológica, pode ser desdobrada em duas categorias: instantânea e serial. O caráter instantâneo de um estudo se define quando a produção do dado é realizada em um único momento no tempo, como se fora um corte transversal do processo em observação. Uma metáfora espacial do tempo justificaria o uso do termo “transversal” para essa modalidade de desenho. Por outro lado, qualquer tipo de seguimento em uma escala temporal define o caráter serial de um dado estudo. Ainda com base na metáfora do “tempo linear”, tem-se empregado o termo “longitudinal” para essa designação. 6.9 Critérios para a classificação de métodos empregados em Epidemiologia Muitos são os critérios empregados para classificar os métodos utilizados na Epidemiologia, entre os quais: 110 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II • o propósito geral, que distingue os estudos descritivos e os analíticos (os últimos também ditos comparativos ou de testes de hipóteses); • o modo de exposição das pessoas ao fator em foco, pelo quais são separados os estudos de observação e os de intervenção (experimentação); • a direção temporal das observações, que diferencia os estudos prospectivos (coortes), retrospectivos (casos-controle) e transversais; • a unidade de observação, que divide as pesquisas em dois tipos: aquelas em que a unidade é o indivíduo, e as que têm como unidade de observação um grupo de indivíduos: por exemplo, um município ou país. Existem outros critérios que geram outras classificações, como os seguintes: longitudinal x transversal, estudo controlado x não controlado, randomizado x não randomizado, experimental x quase experimental etc. 6.9.1 Estudos descritivos Os estudos descritivos têm por objetivo determinar a distribuição de doenças ou condições relacionadas à saúde, segundo o tempo, o lugar e/ou as características dos indivíduos, ou seja, esclarecer: quando, onde e quem adoece. A Epidemiologia descritiva pode fazer uso de dados secundários (dados preexistentes de mortalidade e hospitalizações, por exemplo) e primários (dados coletados para o desenvolvimento do estudo). Também examina como a incidência (casos novos) ou a prevalência (casos existentes) de uma doença ou condição relacionada à saúde varia de acordo com determinadas características, como sexo, idade, escolaridade e renda entre outras. Quando a ocorrência da doença/condição relacionada à saúde difere segundo o tempo, lugar ou pessoa. Coleta de novos dados No Brasil, existem importantes bancos de dados secundários – como o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM-SUS), o Sistema de Informações sobre Autorizações de Internações Hospitalares (SIH- SUS) e a Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (PNAD, 1998) – que podem ser usados em estudos epidemiológicos. Usos dos resultados dos estudos descritivos A inspeção da distribuição das frequências de um evento, sejam elas dispostas em tabelas, gráficos ou outra forma de expressão de resultados, é utilizada para alcançar dois objetivos principais: • Identificar os grupos de risco, o que informa sobre as necessidades e características dos seguimentos que poderiam beneficiar-se de alguma forma de medida saneadora – daí a íntima relação da Epidemiologia com a prevenção de doenças e o planejamento de saúde. 111 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA • Sugerir explicações para as variações de frequência, o que serve de base ao prosseguimento de pesquisas sobre o assunto, através de estudos analíticos – o que atesta o forte componente de investigação, existente na Epidemiologia. 6.9.2 Estudos analíticos Tem o objetivo básico de avaliar (não apenas descrever) se a ocorrência de um determinado evento é diferente entre indivíduos expostos e não expostos a um determinado fator ou de acordo com as características das pessoas. Estes são estudos realizados com o objetivo específico de testar hipóteses que relacionem eventos: uma suposta “causa” e um “dado efeito” ou, como habitualmente referido, entre a exposição e a doença. Os estudos analíticos diferem dos descritivos em um importante aspecto: a presença de um grupo controle, formado ao mesmo tempo com o grupo de estudo e que serve para a comparação dos resultados. O modo como os grupos de estudo e controle é formado gera os diversos tipos de estudos analíticos. De uma maneira esquemática: a investigação de uma relação exposição-doença pode ser feita de três modos em função de o ponto de partida das observações ser a causa ou o efeito. O investigador introduz um fator de exposição ou um novo recurso terapêutico e avalia-o, utilizando ferramentas bioestatísticas. Geralmente, constituem-se na base dos estudos primários. São três os pontos de partida das investigações analíticas. Visto em um deles, haver duas possibilidades randomizar ou não para formar grupos, o resultado e um total de quatro delineamentos básicos, em que há formação de um “grupo de estudo”e de um “grupo controle” para a comparação dos resultados. 6.9.3 Estudo experimental, do tipo ensaio clínico randomizado O estudo clínico randomizado (ECR) consiste em um tipo de estudo experimental, desenvolvido em seres humanos e que visa ao conhecimento do efeito de intervenções em saúde. Pode ser considerado como uma das ferramentas mais poderosas para a obtenção de evidências para a prática clínica. Associada a essa característica, encontra-se a simplicidade em seu desenho, quando comparado a outros tipos de estudos. Bons ECRs são capazes de minimizar a influência de fatores de confusão sobre relações de causa-efeito, quando comparados aos demais desenhos, daí sua grande relevância como fonte de evidências. No caso específico do ECR, diferencia-se dos demais tipos de estudos clínicos experimentais pelo fato de que os participantes recebem uma dentre as intervenções propostas de forma aleatória. No contexto da classificação dos estudos científicos em saúde, pode-se dizer que os ECRs são, em se tratando de estudos primários, os de maior relevância para a clínica. As revisões sistemáticas, apesar de serem consideradas ainda mais relevantes, são estudos secundários, ou seja, dependem de estudos primários com qualidade para derivarem inferências. Daí a grande importância dos ECRs como fonte de evidências também para as revisões sistemáticas. A fim de determinar se um artigo científico refere-se ao relato de um ECR, quatro características fundamentais devem ser identificadas: a primeira delas é a comparação entre intervenções aplicadas à 112 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II saúde de seres humanos, ou seja, estudos sobre aspectos sem relação direta com a saúde ou desenvolvidos em animais são desconsiderados; um segundo aspecto relevante é a natureza prospectiva, as intervenções são planejadas antes, e a exposição é controlada pelos pesquisadores; em terceiro lugar, duas ou mais intervenções são comparadas no estudo. Por intervenção, entendem-se, além de tratamentos para desordens físicas ou mentais, os regimes preventivos, programas de detecção ou testes diagnósticos (uma pode ser um grupo controle/sem tratamento). Além disso, uma ou mais das intervenções comparadas pode ser constituída por um grupo controle, sem nenhum procedimento ativo. Por fim, a aplicação das intervenções deve ser aleatória, tendo apenas a chance influenciando o processo. Uma primeira característica do ensaio clínico randomizado é o recrutamento de um grupo comum, a partir de uma população de interesse. Em seguida é que se decidem quais intervenções os participantes receberão, por meio da randomização. Tecnicamente, esse processo envolve determinar a alocação por meio de números obtidos por sorteio, ao invés de características da amostra ou preferência dos participantes. Após a aplicação das intervenções, realiza-se a leitura de uma ou mais variáveis de desfecho que, na figura, apresenta-se como presente e ausente (SOUZA, 2009). 6.9.4 Estudos de coorte O termo coorte é utilizado para nomear um grupo de indivíduos que têm em comum um conjunto de características e que são observados durante um período de tempo com o intuito de analisar a sua evolução. Em um estudo de coorte, agrupa-se inicialmente um conjunto de indivíduos (coorte) que não apresentam o resultado esperado (outcome), geralmente uma doença, mas que podem vir a apresentá-lo (população em risco). No início do estudo, todos os indivíduos são classificados quanto aos fatores (possíveis fatores de risco) que se pensa poder estar relacionados com o resultado esperado. Os indivíduos são, então, seguidos por um período de tempo, analisando-se, depois, quais apresentaram o resultado esperado, geralmente uma doença (figura a seguir). Ausência da doença Exposição ao factor de risco População tempo Expostos Não expostos Amostra Doentes Doentes Não doentes Não doentes Figura 11 – Representação de um estudo de coorte Desta forma, podemos estudar o modo como a presença de características específicas influencia o aparecimento de determinada doença, comparando os riscos daqueles que têm uma característica de desenvolvê-la com o risco daqueles que não a têm (quadro a seguir). 113 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA Quadro 4 – Cálculo do risco relativo (RR) num estudo de coorte Doença Casos Controles Exposição Expostos A B Não-expostos C D RR = _____A/(A+B)_____ C/(C+D) A expressão básica de risco é a incidência cumulativa, definida como a proporção de novos casos de uma doença que surgem numa determinada população durante um período de tempo específico. Nos estudos de coorte, interessa-nos, normalmente, comparar os riscos de duas populações que diferem quanto à exposição a um determinado fator. Para comparar riscos, utilizam-se as chamadas medidas de associação e de impacto, também designadas medidas de efeito, de que em seguida se citam algumas das comumente usadas em estudos de coorte: • Risco Atribuível (RA): é uma medida que corresponde à diferença de riscos, ou incidências cumulativas (IC), entre os indivíduos expostos e os não expostos ao fator em estudo. Responde à questão: “qual é o risco (incidência cumulativa) adicional de vir a desenvolver a doença devido à exposição ao fator em causa?” RA = ICE - ICE • Risco Relativo (RR): é uma medida de associação, também conhecida por razão de riscos, e corresponde à razão entre os riscos ou incidências cumulativas dos indivíduos expostos e a dos não expostos. Responde à questão: “quantas vezes é mais provável os indivíduos expostos virem a desenvolver a doença em relação aos não expostos?” RA = ICE ICE • Percentagem de Risco Atribuível (RA%): é uma medida de impacto e é uma estimativa da “quantidade de doença” que é atribuível, unicamente, à exposição. Representa, também, a proporção de doença que poderia ser eliminada se fosse removida a exposição. RA% = x100 RA ICE Usando os parâmetros de classificação dos desenhos de estudo, podemos dizer que um estudo de coorte é observacional, longitudinal, normalmente, prospectivo, descritivo ou analítico, tem como unidades de análise os indivíduos e, como base de seleção dos participantes, a existência de uma determinada exposição. 114 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Para além dos estudos de coorte prospectivos, existem dois outros tipos: retrospectivos ou históricos (em que exposição e tempo de seguimento aconteceram no passado), e os estudos de coorte duplo ou com controles externos (em que os indivíduos expostos e os não expostos pertencem a populações diferentes). Os estudos de coorte têm uma vasta utilização na investigação biomédica, servindo para responder a vários tipos de questões, dependendo das características dos indivíduos e dos resultados esperados. Assim, através dos estudos de coorte, pode-se estudar a incidência, os fatores de risco e o prognóstico de doenças, assim como, avaliar intervenções terapêuticas ou preventivas. Vantagens Os estudos de coorte são a melhor alternativa aos experimentais, que são muitas vezesinviáveis em investigação biomédica. Uma das principais vantagens desses estudos é serem melhores, senão mesmo, os únicos, métodos de estudar a incidência e história natural das doenças. Eles seguem a mesma lógica que os ensaios clínicos (“se um indivíduo for exposto a um determinado fator, desenvolverá ou não a doença?”), e permitem garantir que o fator em causa preceda no tempo o aparecimento do resultado esperado (outcome), fortalecendo assim a inferência de que o fator pode ser uma causa do resultado esperado. Os estudos de coorte são especialmente úteis para estudar doenças potencialmente fatais. Quando são estudadas, retrospectivamente, é necessário recorrer a dados indiretos (processos clínicos, testemunhos de familiares etc.), o que torna muito difícil e, por vezes, impossível, a medição de certos fatores. Por exemplo, um familiar conseguirá, facilmente, dizer se o indivíduo falecido fumava ou não, mas a sua capacidade de quantificar o número de cigarros que ele fumava por dia será muito mais limitada. O fato dos estudos de coorte ser prospectivo permite fazer uma medição das variáveis ou fatores que apresentam, de um modo completo, válido e preciso; primeiro porque determinam exposições no presente sem ter de recorrer à memória dos indivíduos, ou a outras fontes indiretas, o que poderia enviesar a determinação. Segundo porque as determinações são feitas antes do resultado esperado, geralmente, uma doença ter acontecido, evitando, assim, o enviesamento inerente à determinação da exposição num indivíduo que conhece já o seu estado de doente. Por outro lado, o caráter prospectivo desses estudos permite analisar a relação entre os fatores em estudo e vários resultados esperados. Por exemplo, o estudo de todas as doenças relacionadas com os hábitos tabágicos, o que não é possível com outros estudos. Ainda relacionado com o caráter prospectivo dos estudos de coorte está o fato de permitirem apresentar resultados com crescentes tempos de seguimento, aumentando, assim, o número de casos e o poder estatístico do estudo à medida que o tempo de seguimento se torna mais longo, em detrimento de um modesto aumento no custo do estudo. Desvantagens Do ponto de vista puramente científico, a maior desvantagem dos estudos observacionais, nomeadamente os de coorte, é estarem sujeitos a um número muito maior de vieses, ou erros 115 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA sistemáticos, que os experimentais, uma vez que não se controla diretamente a exposição ao fator em estudo. Os fatores de confusão são um importante exemplo desse tipo de erros. As pessoas que são expostas a um determinado fator de risco, provavelmente, diferem do grupo das não expostas, com que são comparadas em muitos outros fatores para além daquele que se pretende estudar. Se tais fatores estiverem relacionados com a doença, poderão ser eles, e não o fator que se pretende estudar, os responsáveis pela possível associação que se pode encontrar entre o fator em causa e a doença. A estes outros fatores que estão associados simultaneamente à doença em estudo e ao fator em causa e que confundem a relação entre este e a doença, dá-se o nome de “fatores de confusão” (confounding factors). Por exemplo, os hábitos tabágicos podem ser um fator de confusão quando se pretende estudar a associação entre a prática de exercício físico e o enfarte agudo do miocárdio (EAM). Se os fumantes praticam menos exercício físico que os não fumantes e têm, ao mesmo tempo, maior incidência de EAM, então uma aparente associação entre uma menor prática de exercício físico e uma maior incidência de EAM poderá, na realidade, dever-se ao fator de confusão, ou seja, hábitos tabágicos. Do ponto de vista prático, uma importante desvantagem dos estudos de coorte é que, se o resultado esperado, geralmente uma doença, for pouco frequente (o que, normalmente, acontece) um grande número de indivíduos tem de ser seguido durante um longo período de tempo para poder tirar conclusões. Assim, os estudos de coorte são um método muito caro e pouco eficaz, especialmente, para estudar doenças raras. A eficácia de um estudo de coorte é crescente com a frequência da doença em estudo. Esses estudos são, por isso, muito mais eficazes na averiguação do prognóstico de doenças, em que os resultados esperados têm, geralmente, uma maior frequência e com tempos de seguimento menores. Outro fator que pode tornar mais caro e mais difícil a formação de uma coorte é o fato de ser necessário ter a certeza de que é constituída, no início, por indivíduos que não apresentam o resultado esperado, exigindo, assim, a disponibilidade e utilização de testes suficientemente sensíveis e específicos como para poder excluir, com certeza, a doença em causa em todos os indivíduos. Outro fator é o fato de o seguimento dos doentes nos estudos de coorte dever prolongar-se por um período de tempo suficientemente longo, para permitir que o risco inerente à exposição se manifeste. Por exemplo, se pretendêssemos estudar a relação entre a irradiação do pescoço e o cancro da tiroide, um tempo de seguimento de um ano seria, nitidamente, insuficiente. Um dos grandes obstáculos à apresentação de conclusões válidas num estudo de coorte prende-se com as chamadas perdas de seguimento (follow-up). Nesses estudos, idealmente, todos os indivíduos devem ser observados ao longo de todo o período de seguimento ou até atingirem o resultado esperado, uma vez que, se as causas e a magnitude do abandono (drop out) estiverem de algum modo, ligados ao aparecimento da própria doença, as conclusões do estudo poderão ser enviesadas. 6.9.5 Estudos de caso-controle Ao contrário dos dois delineamentos mostrados anteriormente, o ensaio clínico randomizado e o estudo de coorte, a investigação do tipo caso-controle parte do efeito para chegar às causas. É, portanto, uma pesquisa etiológica retrospectiva, feita de trás para frente, só podendo ser realizada após o fato consumado, ou seja, depois de o efeito já ter ocorrido. 116 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Os estudos tipo caso-controle são indicados em: • Situações como as encontradas em surtos epidêmicos ou diante de agravos desconhecidos, em que é indispensável à identificação urgente da etiologia da doença com o objetivo de uma imediata ação de controle. • Esse delineamento permite, de forma rápida e pouco custosa, a investigação de fatores de risco associados a doenças raras e de longo período de latência. Os estudos tipo caso-controle apresentam, porém, algumas dificuldades: • A análise retrospectiva dos dados obtidos depende muito da memória dos casos e dos controles, isso pode gerar vieses de memória. Por exemplo, uma mãe de uma criança acometida de malformação congênita será capaz de fazer uma descrição com maior riqueza de detalhes e maior precisão das intercorrências ocorridas durante a gravidez, se comparada com a exposição desses mesmos eventos realizada por uma mãe de uma criança normal. • Outro problema é o viés de seleção de casos e controles, que pode ser atenuado se os casos forem selecionados em uma única área com a observação de critérios bem padronizados para sua inclusão no grupo. Nos estudos tipo caso-controle, a classificação de um doente como caso pressupõe uma perfeita definição das características desse grupo, que deve levar em consideração vários aspectos,entre eles: • critério diagnóstico; • aspectos e variedades clínicas; • estadiamento da doença; • emprego de casos ocorridos num intervalo definido de tempo (incidência) ou de casos prevalentes em determinado momento; • fonte dos casos que podem ser todos os atendidos por um ou mais serviços médicos ou todos os doentes encontrados na população. Esses cuidados são indispensáveis para garantir a maior comparabilidade interna entre casos e controles e, portanto, uma estimativa mais consistente do risco. A escolha do grupo controle constitui um dos pontos mais importantes do delineamento dos estudos tipo caso-controle, devendo buscar a máxima semelhança entre casos e controles, à exceção do fato de os controles não apresentarem a doença objeto do estudo. No entanto, isso é difícil de ser obtido, pois até irmãos gêmeos são submetidos a diferentes exposições ambientais. 117 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA De uma maneira geral, para evitar possíveis distorções determinadas pela escolha dos controles entre pacientes hospitalizados, recomenda-se que esses controles sejam escolhidos entre indivíduos que vivam na vizinhança dos casos, ou sejam parentes, ou colegas de trabalho ou de escola, ou que mantenham alguma relação de proximidade com os casos. Os do tipo caso-controle não permitem o cálculo direto do RR em consequência da forma de seleção dos participantes – casos (doentes) e controles (não doentes) – que não utilizam denominadores que expressem a verdadeira dimensão dos grupos de expostos e de não expostos numa população (SUZUMURA et al., 2006). Condução do estudo de caso-controle, organização do trabalho de campo, supervisão e coordenação Deve-se organizar o trabalho de campo para o recrutamento dos participantes da pesquisa elegíveis para os grupos caso e controle. Também é necessário estabelecer um sistema de supervisão e coordenação, para que a pesquisa siga de acordo com o planejamento. Pode ser realizado um estudo piloto para avaliar a logística do protocolo, porém fica a critério do investigador principal. Controle de qualidade de dados Um item pouco citado, mas muito importante em pesquisa é a abordagem para assegurar a qualidade e consistência dos dados. Na ausência de procedimentos de controle de qualidade apropriados, são comuns problemas com dados falsos e inconsistentes. Cabe ressaltar a importância da equipe de coordenação e supervisão para o treinamento e acompanhamento dos entrevistadores. Também é recomendável que os dados sejam tabulados em planilhas eletrônicas periodicamente, o que direciona o pesquisador para checar a presença de dados imprecisos. Análise dos dados Deve ser feita a comparação da proporção de expostos entre casos com a proporção de expostos entre os controles. A medida estatística de associação utilizada para o desenho de estudo de caso-controle é a razão de chances (odds ratio), que se comporta como o risco relativo para os estudos de coorte e é definida como o quociente entre a probabilidade de um determinado evento ocorrer e a de não ocorrer. Quanto mais forte for a associação, medida pela razão de chances, maior será a possibilidade de haver relação causal entre o fator de exposição e a ocorrência de HAS. Além disso, pode ser calculado o risco atribuível na população (RAP). Vantagens Epidemiologistas frequentemente procuram estudos de caso-controle como um dos mais eficientes tipos de desenho em termos de tempo, custo e esforço, o que é válido, caso a metodologia seja corretamente empregada. 118 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II Desvantagens Uma importante desvantagem dos estudos de caso-controle é que apenas um desfecho pode ser estudado, ou seja, a presença ou ausência de HAS, que foi o critério para a seleção das amostras. Mas a maior desvantagem é sua suscetibilidade a vieses. Eles são decorrentes de duas principais situações: processo de seleção dos grupos caso e controle e aferição retrospectiva das variáveis preditoras. Os vieses de seleção devem ser minimizados ao máximo, seguindo as orientações já aludidas sobre os critérios de seleção dos indivíduos dos grupos caso e controle, observando o pareamento e a captação de pessoas da mesma área (comunidade, hospital ou clínica). Como a informação sobre o fator de exposição é obtida após a ocorrência da doença, o participante da pesquisa pode não fornecer os dados corretamente. Uma das maneiras de se tentar controlar esse viés é coletar as informações necessárias em registros médicos ou documentos-fonte precedentes ao aparecimento da HAS. Outra maneira de controlar o viés de aferição é realizar o cegamento dos investigadores e dos pacientes para evitar tendências na coleta dos dados retrospectivos. 6.9.6 Estudos transversais Cada indivíduo é avaliado para o fator de exposição e para a doença em determinado momento. Muitas vezes o estudo transversal é realizado apenas com objetivo descritivo sem nenhuma hipótese para ser avaliada. Alguns têm usado o termo “levantamento” para denominar estudos transversais realizados com essa finalidade. O estudo transversal pode ser usado como um estudo analítico para avaliar hipóteses de associações entre exposição ou características e evento. No entanto, limitações existem quando se tenta concluir qual a natureza da relação entre exposição e evento nessas situações. Essa limitação relaciona-se, principalmente, com o fato de que a exposição e a doença são avaliadas ao mesmo tempo. Uma questão importante que pode ficar sem resposta é sobre o que apareceu primeiro: o fator de exposição ou a doença. Outro ponto que deve ser observado nestes estudos transversais é a dificuldade em separar os casos novos da doença dos casos já presentes por algum tempo. Desta forma, os estudos transversais irão refletir não apenas determinantes de doença, mas de sobrevida. Apesar das limitações, os estudos transversais, pelo fato de incluir indivíduos com e sem o evento e de poder avaliar associações entre o evento e exposições ou características, podem ser considerados um passo adiante na identificação dos determinantes de doenças, quando comparados com relatos ou séries de casos. Na verdade, existem situações em que os estudos transversais podem ser considerados verdadeiramente analíticos. Isso ocorre quando o fator de exposição não sofre influência do tempo. Diversos exemplos serão encontrados entre aqueles fatores presentes desde o nascimento, como tipo sanguíneo, sexo (masculino, feminino) e sistema HLA. Como os estudos transversais descrevem o que ocorre com um determinado grupo e em um determinado momento, eles são importantes guias para tomadas de decisões no setor de planejamento de saúde. Para o profissional que lida diretamente com pacientes, os estudos transversais oferecem informações da maior utilidade ao chamar atenção para características ligadas com a frequência de uma determinada doença na comunidade ou determinado serviço assistencial. Esses estudos, portanto, podem influenciar o raciocínio clínico e a tomada de decisões na prática médica. 119 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIAE SAÚDE PÚBLICA Quando da escolha do desenho de pesquisa, deve ser considerado que os estudos transversais, habitualmente, exigem menos recursos financeiros e podem ser realizados mais rapidamente do que os estudos de caso-controle ou coorte. Os estudos transversais também podem ser: • Comparados – 4.835 indivíduos de 20 a 74 anos foram selecionados aleatoriamente da população adulta do Rio Grande do Sul para, em sua própria residência, responderem a um questionário sobre hábitos alimentares e terem sua pressão arterial medida. Os 4.565 indivíduos efetivamente estudados foram então classificados como consumidores excessivos de sal ou não, e em hipertensos e não hipertensos. • Não comparados – (estudo de prevalência) 3.101 moradores da fronteira sudeste do Rio Grande do Sul foram submetidos à investigação para determinar a prevalência de soropositividade para hidatidose (SITTA et al., 2010). Vantagens: • Fáceis, rápidos e baratos. • Boa fonte de hipóteses. Desvantagens: • Impossível determinar o que ocorre primeiro (causa - efeito). • Desconhecimento da ação dos fatores no passado. • Impossibilidade de estabelecer uma prova causal. 6.9.7 Estudos ecológicos As medidas usadas representam características de grupos populacionais. Assim, a unidade de análise é a população e não o indivíduo. Um exemplo seria um estudo envolvendo diversas cidades brasileiras em que se procurasse correlacionar dados sobre mortalidade infantil por cada município com a renda per capita e índice de analfabetismo do local no sentido de encontrar evidências de que o nível socioeconômico é um dos determinantes de mortalidade infantil. Observação Os principais objetivos dos estudos ecológicos são a identificação de regiões de sobrerrisco em relação à média global do processo estudado e a busca de fatores explicativos dos diferenciais de incidência encontrados. 120 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II A limitação principal do estudo ecológico é que a relação entre o fator de exposição e o evento pode não estar ocorrendo no indivíduo. Desta forma uma associação entre uma exposição e evento considerando a população não permite afirmar que a exposição está mais presente naqueles que adquirem a doença – falácia ecológica. Estes estudos ajudam a identificar fatores que merecem uma investigação mais detalhada através de estudo com maior capacidade analítica. Por exemplo, a demonstração de uma relação entre venda de cigarros per capita e mortalidade de doença cardiovascular (DCV) em estudos ecológicos motivou o planejamento de estudos caso-controle e coorte que vierem a demonstrar de forma bem mais convincente que o hábito de fumar é um dos fatores determinantes de DCV, particularmente doença coronariana e acidente vascular cerebral. Os estudos de séries temporais, em que uma mesma área ou população é estudada em momentos distintos do tempo, são classificados como um subtipo dos estudos ecológicos. Nesse caso, cada unidade de tempo passaria a ser tratada como uma unidade ecológica completa. Vantagens: • Facilidade de execução. • Baixo custo relativo. • Simplicidade analítica. • Capacidade de gerar hipóteses. Desvantagens: • Baixo poder analítico. • Pouco desenvolvimento das técnicas de análise dos dados. • Vulnerável à chamada “falácia ecológica”. Resumo É inquestionável a contribuição dada por metodologias diagnósticas nos levantamentos epidemiológicos de doenças endêmicas. Quando estes diagnósticos são utilizados como medidores da prevalência, é preciso ter um bom estudo da sensibilidade e, principalmente, da especificidade do método empregado. Para os profissionais que atuam em regiões não endêmicas, o diagnóstico pode ser realizado, com efeito, através de uma anamnese minuciosa, 121 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o EPIDEMIOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA incluindo informações sobre a história geográfica, a exposição à água ou a alimentos potencialmente contaminados, viagens a áreas endêmicas e a ocorrência de sinais e sintomas associada aos achados ao exame físico são elementos essenciais para o diagnóstico. O fato de existir um alto número de casos de uma doença não significa necessariamente que uma epidemia esteja configurada. Genericamente, epidemia é a ocorrência de uma doença em uma população de forma não crescente ao longo do tempo. Endemia é a ocorrência de uma doença em uma população, constante, ao longo do tempo, permitidas as flutuações cíclicas ou sazonais. Aumento gradual ou constante do número de casos de uma doença representa uma alteração do nível endêmico e o aumento brusco do número de casos caracteriza um processo epidêmico. Os caracteres epidemiológicos constituem o resultado da estrutura epidemiológica em cada momento e se expressa pela frequência e distribuição da doença na população em determinado instante, de acordo com as variáveis tempo, espaço e pessoa. A expressão “doença transmissível” se refere a qualquer doença causada por um agente infeccioso específico, ou seus produtos tóxicos, que se manifesta pela transmissão deste agente ou de seus produtos, de uma pessoa ou animal infectado ou de um reservatório a um hospedeiro suscetível, direta ou indiretamente, por meio de um hospedeiro intermediário, de natureza vegetal ou animal, de um vetor ou do meio ambiente inanimado. A expressão doença transmissível pode ser resumida como aquela em que o agente etiológico é vivo e é transmissível. São doenças transmissíveis aquelas em que o organismo parasitante pode migrar do parasitado para o sadio, havendo ou não uma fase intermediária de desenvolvimento no ambiente. As doenças infecciosas podem assumir várias formas. Uma doença manifesta é aquela que apresenta todas as características clínicas que lhe são típicas. Em situação contrária, na infecção inaparente, o indivíduo não apresenta sinais ou sintomas clínicos manifestos. Fala-se em uma forma subclínica ou assintomática da doença. Essa forma de infecção tem uma importância grande em Epidemiologia, devido ao fato de que as pessoas podem transmitir o agente aos suscetíveis com a mesma intensidade encontrada na doença manifesta, porém de uma forma oculta. A vigilância epidemiológica é definida como “um conjunto de ações que proporciona o conhecimento, a detecção ou prevenção de qualquer 122 GH OS P - Re vi sã o: A lin e - Di ag ra m aç ão : F ab io - 0 3/ 05 /2 01 5 // J un çã o de c on te úd os - R ev isã o: A na / Co rr eç ão : M ár ci o Unidade II mudança nos fatores determinantes e condicionantes de saúde individual ou coletiva, com a finalidade de adotar medidas de prevenção e controle das doenças ou agravos” (BRASIL, 2002). Seu objetivo principal é fornecer orientação técnica constante para os profissionais de saúde, que têm a responsabilidade de decidir sobre a execução de ações de controle de doenças e agravos, tornando disponíveis informações atualizadas sobre a ocorrência dessas doenças e agravos, bem como dos fatores que a condicionam, numa área geográfica ou população definida. Constitui importante instrumento para o planejamento, a organização e a operacionalização dos serviços de saúde e para a normatização de atividades técnicas afins. Com a intenção demelhor conhecer a saúde da população, os fatores que a determinam, a evolução do processo da doença e o impacto das ações propostas para alterar o seu curso, os epidemiologistas desenvolveram numerosos métodos de abordagem e investigação. Atualmente, há muitos métodos a nossa disposição. Para cada situação, um método poderá ser mais adequado do que outro, embora vários métodos sejam usados em um único estudo. Cada método tem os seus aspectos positivos e suas limitações, de modo que, conhecendo-os, pode-se antecipar as facilidades e as dificuldades encontradas pelos pesquisadores.