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45 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER Unidade II 5 INFECÇÕES SEXUALMENTE TRANSMISSÍVEIS 5.1 Aspectos gerais A terminologia infecções sexualmente transmissíveis (IST) foi adotada pelo Ministério da Saúde do Brasil em 2015 para substituir a expressão doenças sexualmente transmissíveis (DST). Esse novo termo está em consonância com a nomenclatura adotada internacionalmente pela Organização Mundial da Saúde (OMS), pela Organização Pan‑Americana da Saúde (Opas) e pela sociedade científica. Essa modificação ocorreu em função da possibilidade de transmissão de uma infecção por meio do contato sexual, mesmo que não haja sinais e sintomas (BRASIL, 2016e). A transmissão das IST acontece, sobretudo, por via sexual e, eventualmente, por via sanguínea. Também podem ser transmitidas verticalmente, da mãe para a criança durante a gestação, o parto ou a amamentação. Essas infecções são causadas por mais de 30 agentes etiológicos, incluindo vírus, bactérias, fungos e protozoários. Podem se apresentar sob a forma de síndromes: corrimento uretral, corrimento vaginal, úlcera anogenital, verruga anogenital e doença inflamatória pélvica (DIP) (BRASIL, 2016e). 5.2 Características das principais IST Quadro 4 – Síndromes clínicas das IST, seus agentes etiológicos, transmissão e cura Síndrome IST Agente etiológico Tipo Transmissão sexual Curável Corrimento uretral/vaginal Candidíase Candida albicans Fungo Não Sim Vaginose bacteriana Múltiplos Bactéria Não Sim Tricomoníase Trichomonas vaginalis Protozoário Sim Sim Gonorreia Neisseria gonorrhoeae Bactéria Sim Sim Clamídia Chlamydia trachomatis Bactéria Sim Sim Úlcera anogenital Sífilis Treponema pallidum Bactéria Sim Sim Cancro mole (cancroide) Haemophilus ducreyi Bactéria Sim Sim Herpes Herpes simplex vírus (HSV‑2) Vírus Sim Não Donovanose Klebsiella granulomatis Bactéria Sim Sim Linfogranuloma Chlamydia trachomatis Bactéria Sim Sim Verruga anogenital Condiloma acuminado Papilomavírus humano Vírus Sim Não Doença Inflamatória Pélvica (DIP) Endometrite, anexite, salpingite, miometrite, ooforite, parametrite, pelviperitonite, abscesso do tubo ovariano Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, bactérias facultativas anaeróbias (exemplos: Gardnerella vaginalis, Haemophilus influenza, Streptococcus agalactiae) e outros microrganismos Fonte: Brasil (2016a). 46 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II O quadro anterior apresenta as principais manifestações clínicas das IST e os respectivos agentes etiológicos, transmissão por via sexual e se a infecção é curável ou não. 5.3 Aspectos epidiomólogicos As IST são consideradas um importante problema de saúde pública mundial em função de sua magnitude. Além disso, a presença de uma IST, como sífilis ou gonorreia, aumenta consideravelmente o risco de se adquirir ou transmitir a infecção por vírus da imunodeficiência humana (HIV). De acordo com as estimativas da OMS (2013), mais de um milhão de pessoas adquirem uma IST diariamente no mundo. Anualmente, estima‑se que 500 milhões de indivíduos no mundo são contaminados com uma IST curável, como a gonorreia, a clamídia, a sífilis e a tricomoníase. Calcula‑se que 530 milhões de pessoas estejam infectadas com o vírus do herpes genital (HSV‑2, do inglês herpes simplex virus tipo 2) e que mais de 290 milhões de mulheres estejam infectadas pelo papilomavírus humano (HPV) (BRASIL, 2016a). A infecção pelo HPV é responsável por 530 mil casos de câncer de colo uterino e por 275 mil mortes de mulheres em função dessa doença por ano. Além disso, a sífilis na gravidez causa cerca de 300 mil óbitos fetais e mortes neonatais anualmente e coloca 215 mil recém‑nascidos (RN) sob o risco de morte prematura, baixo peso ao nascimento ou sífilis congênita (BRASIL, 2016b). No Brasil, as IST também são consideradas um problema de saúde pública. Estima‑se mais de 10 milhões de casos novos de IST passíveis de cura ao ano (LOWDERMILK, 2012). Segundo o Ministério da Saúde, no período de 2010 a junho de 2016, foram notificados um total de 227.663 casos de sífilis adquirida, dos quais 60,1% são homens. Em 2010, a razão de sexos era de 1,8 casos em homens para cada caso em mulheres; em 2015, foi de 1,5 casos em homens para cada caso em mulheres (BRASIL, 2016b). Veja a figura a seguir: 100% 80% 60% 40% 20% 0% 90% 70% 50% 30% 10% 2010 63,9 1,8 2011 60,3 1,5 2012 61,0 1,6 2013 59,6 1,5 2014 60,3 1,5 2015 60,2 1,5 0 1,0 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 36,1 39,7 39,0 40,4 39,7 39,8 Feminino Masculino Razão do sexo Ra zã o do se xo Ano do diagnóstico Pe rc en tu al Figura 12 – Casos de sífilis adquirida segundo sexo e razão de sexo, por ano de diagnóstico, no Brasil (2010‑2015) 47 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER No que se refere à infecção pelo HIV no Brasil, no período de 2007 a 2016, foram notificados pelo Ministério da Saúde um total de 136.945 casos da infecção, dos quais 92.142 eram homens e eram 44.766 mulheres. A razão de sexos para o ano de 2015 foi de 2,4 (BRASIL, 2016e). 5.4 Estratégias de atenção à saúde Para promover a vigilância epidemiológica das IST, a Portaria nº 1.271, de 6 de junho de 2014, tornou obrigatória no Brasil a notificação dos casos de sífilis (adquirida, em gestante e congênita), de hepatite viral (B e C), de aids, de infecção pelo HIV e em gestante, parturiente ou puérpera e criança exposta ao risco de transmissão vertical do HIV (BRASIL, 2016e). A organização de serviços para atenção às pessoas com IST acontece, na maioria dos municípios, mediante o agendamento de consultas. Para que haja a quebra da cadeia de transmissão das IST e do HIV, a unidade de saúde deve garantir, o mais breve possível, o acolhimento adequado e com privacidade. Nesse sentido, o Ministério da Saúde recomenda diferentes atividades a serem desenvolvidas no manejo operacional das IST conforme o nível de atenção em saúde. Na ABS, as atividades a serem desenvolvidas são as seguintes (BRASIL, 2016e): • garantir o acolhimento e realizar atividades de informação/educação em saúde; • realizar consulta imediata no caso de úlceras genitais, de corrimentos genitais masculinos e femininos e de verrugas anogenitais; • realizar coleta de material cérvico‑vaginal para exames laboratoriais; • realizar testagem rápida e/ou coleta de sangue e/ou solicitação de exames para sífilis, HIV e hepatites B e C, nos casos de IST; • realizar tratamento das pessoas com IST e suas parcerias sexuais; • seguir o protocolo do MS para prevenção da transmissão vertical de HIV, sífilis e hepatites virais; • notificar as IST, conforme a Portaria vigente. Os demais agravos são notificados de acordo com recomendações dos estados/municípios, quando existentes; • comunicar as parcerias sexuais do caso‑índice para tratamento, conforme protocolo; • referir os casos suspeitos de IST com manifestações cutâneas extragenitais para unidades que disponham de dermatologista, caso necessário; • referir os casos de IST complicadas e/ou não resolvidas para unidades que disponham de especialistas e mais recursos laboratoriais; 48 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II • referir os casos de dor pélvica com sangramento vaginal, casos com indicação de avaliação cirúrgica ou quadros mais graves para unidades com ginecologista e/ou que disponham de atendimento cirúrgico. Essas unidades de saúde devem ter condições mínimas para o atendimento, além de estarem inseridas em uma rede de atenção que possibilite o encaminhamento para os níveis mais complexos, quando houver necessidade. De acordo com o Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Atenção Integral às Pessoas com Infecções Sexualmente Transmissíveis, publicado pelo Ministérioda Saúde (BRASIL, 2016e), a prevenção combinada das IST contempla diversas ações de prevenção e assistência, distribuídas em três áreas estratégicas: • prevenção individual e coletiva; • oferta de diagnóstico e tratamento para IST assintomáticas; • manejo de IST sintomáticas com uso de fluxogramas. O quadro a seguir apresenta a sintetização das ações a serem desenvolvidas nessas diferentes áreas: Quadro 5 – Estratégia de atenção integral às pessoas com IST: prevenção combinada Prevenção individual e coletiva Oferta de diagnóstico e tratamento para IST assintomáticas (com laboratório) Manejo de IST sintomáticas com uso de fluxogramas (com e sem laboratório) • Informação/educação em saúde • Preservativo masculino e feminino • Gel lubrificante • Busca adequada e acesso aos serviços de saúde • Prevenção da transmissão vertical de HIV, sífilis e hepatites virais • Vacinação para HBV e HPV • Profilaxia pós‑exposição ao HIV, quando indicada • Profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual • Redução de danos • Triagem para clamídia para gestantes de 15 a 24 anos, quando disponível • Triagem para sífilis, gonorreia, clamídia, hepatites virais B e C e HIV para pessoas com IST e populações‑chave (gays, HSH, profissionais do sexo, travestis/ transexuais e pessoas que usam drogas), quando disponível • Testagem de rotina para diagnóstico de HIV, sífilis e hepatite B durante o pré‑natal e parto, conforme recomenda o PCDT4 do MS para prevenção da transmissão vertical • Tratamento das infecções identificadas Condutas baseadas em fluxogramas: • Queixa de síndrome específica • Anamnese e exame físico • Diagnóstico com e sem laboratório • Tratamento etiológico ou baseado na clínica (para os principais agentes causadores da síndrome) • Ênfase na adesão ao tratamento • Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) • Notificação das IST, conforme a Portaria vigente. Os demais agravos são notificados de acordo com recomendações dos estados/municípios, quando existentes Fonte: Brasil (2016e, p. 32). 49 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER 5.5 Atuação do enfermeiro A abordagem das pessoas com IST deve compreender a anamnese, a identificação das diferentes vulnerabilidades e o exame físico para o diagnóstico das IST. Durante o exame físico, o profissional de saúde deve proceder à coleta de material biológico para exame laboratorial, quando indicado. Também devem ser realizados exames para triagem de gonorreia, clamídia, sífilis, HIV e hepatites B e C sempre que disponível. A consulta clínica se finaliza com a prescrição e a orientação para o tratamento, além do estabelecimento de estratégia para seguimento e atenção às parcerias sexuais e o acesso aos insumos de prevenção das IST, como o preservativo (BRASIL, 2016e). Para garantir a qualidade do atendimento e a adesão ao tratamento faz‑se necessário estabelecimento de uma relação de confiança entre o profissional de saúde e a pessoa com IST. Para tanto, é importante a promoção de atividades de educação em saúde, além de assegurar um ambiente privativo, proporcionando maior confidencialidade das informações. Nesse contexto, destaca‑se a importância do papel do enfermeiro no manejo das IST, em consonância com a Portaria nº 2.488, de 21 de outubro de 2011, que aprova a Política Nacional da Atenção Básica e estabelece, entre outras atribuições específicas desse profissional, a realização de consulta de enfermagem, de procedimentos e de atividades em grupo. Estabelece, ainda, que o enfermeiro pode solicitar exames complementares, prescrever medicações e encaminhar os usuários a outros serviços quando houver necessidade, conforme protocolos ou outras normativas técnicas estabelecidas pelo gestor federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal, observadas as disposições legais da profissão. Ademais, a Lei nº 7.498, de 25 junho de 1986, que dispõe sobre a regulamentação do exercício de enfermagem, estabelece que cabe ao enfermeiro, como integrante da equipe de saúde, a prescrição de medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em rotina aprovada pela instituição de saúde. 5.6 Prevenção das IST Lowdermilk (2012) destaca que um componente essencial da prevenção primária das IST é o aconselhamento das mulheres com relação às práticas de redução de risco, incluindo o conhecimento de seu parceiro sexual, a redução no número de parceiros sexuais, o sexo de baixo risco, a prevenção da troca de fluidos orgânicos e a imunização. A autora indica a orientação da população, sobretudo das mulheres, sobre as práticas de redução de risco, conforme apresentado no quadro a seguir: Quadro 6 – Práticas de redução de risco Mais seguro Risco baixo (potencial) Risco alto (inseguro) Abstinência Beijo molhado (com ausência de ruptura na pele e mucosa) Relação sexual anal ou vaginal desprotegida Automasturbação Relação sexual vaginal ou anal com preservativo Contato oroanal Monogamia (ambos os parceiros sem atividade de alto risco) e testados para HIV e outras IST com resultado negativo Monogamia (ambos os parceiros e sem atividades de alto risco), mas não testados para HIV e outras IST Múltiplos parceiros sexuais, sem teste para HIV ou IST 50 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Afago, massagem, toque (com ausência de ruptura da pele) Sexo oral com mulher utilizando o preservativo feminino Qualquer sexo que provoque lesão tecidual ou sangramento Masturbação mútua sem contato com sêmen ou secreção vaginal e sem ruptura da pele Sexo oral com mulher utilizando o preservativo masculino Sexo oral em homem ou mulher sem uma barreira de látex ou plástico Abstinência de drogas Masturbação mútua sem contato com sêmen ou secreção vaginal; pele intacta saudável ou uso de barreira de látex ou plástico Compartilhar brinquedos sexuais e equipamento de ducha Fantasia sexual Contato de urina com pele intacta Compartilhar agulhas Conversa erótica, livros, filmes Contato com sangue, inclusive o menstrual Banho de chuveiro ou banheira eróticos Erotização dos pés, dedos, nádegas, abdome e orelhas Fonte: Lowdermilk (2012, p. 142). O uso do preservativo, masculino ou feminino, por pessoas sexualmente ativas é a maneira mais eficaz para a redução do risco de transmissão das IST. Constitui o único método que oferece dupla‑proteção, sendo eficaz na prevenção das IST e também para a contracepção. Desse modo, as orientações adequadas para a conservação e o uso correto e regular dos preservativos masculino e feminino devem fazer parte da abordagem profissional. Além disso, esses insumos devem ser disponibilizados como parte da rotina de atendimento na atenção em saúde (BRASIL, 2016e). Os cuidados com o preservativo masculino incluem (BRASIL, 2016e): • armazená‑lo longe do calor, observando‑se a integridade da embalagem, bem como o prazo de validade; • colocá‑lo antes da penetração, durante a ereção peniana; • manter a extremidade do preservativo apertada entre os dedos durante a colocação, retirando todo o ar do seu interior; • desenrolá‑lo até a base do pênis, ainda segurando a sua ponta; • utilizar apenas lubrificantes de base aquosa (gel lubrificante), pois a utilização de lubrificantes oleosos (como vaselina ou óleos alimentares) danifica o látex, facilitando a sua ruptura; • substituí‑lo imediatamente caso haja ruptura; • retirá‑lo após a ejaculação com o pênis ainda ereto, segurando o preservativo pela base para que não haja vazamento de esperma; • não reutilizá‑lo e, após o uso, descartá‑lo no lixo e não no vaso sanitário. 51 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER A figura a seguir apresenta a técnica adequada para a colocação do preservativo masculino: Figura 13 – Colocaçãodo preservativo masculino Com relação aos cuidados com o preservativo feminino, destacam‑se (BRASIL, 2016e): • armazená‑lo longe do calor, observando‑se a integridade da embalagem e prazo de validade; • não utilizá‑lo juntamente com o preservativo masculino; • pode ser colocado até oito horas antes da relação e retirado com tranquilidade após o coito, de preferência antes de a mulher levantar‑se, para evitar que o esperma escorra do interior do preservativo; • não colocar lubrificante, pois já vem lubrificado; • a mulher deve escolher uma posição confortável (em pé com um dos pés em cima de uma cadeira, sentada com os joelhos afastados, agachada ou deitada) para colocá‑lo corretamente; • o anel móvel deve ser apertado e introduzido na vagina – com o dedo indicador, deve‑se empurrar o anel o mais profundamente possível, para alcançar o colo do útero; • a argola fixa (externa) deve ficar aproximadamente 3 cm para fora da vagina; • durante a penetração, o pênis deve ser guiado para o centro do anel externo; • deve‑se utilizar um novo preservativo a cada relação sexual. 52 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II A figura a seguir apresenta a técnica adequada para a colocação do preservativo feminino: Figura 14 – Técnica para a colocação do preservativo feminino 5.7 Manejo das IST Segundo o Protocolo do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), a atenção integral às pessoas com IST deve incluir o diagnóstico de infecções assintomáticas (estratégias complementares) e sintomáticas. O referido Protocolo preconiza que a oferta de diagnóstico e tratamento para as IST assintomáticas deve ser a estratégia de triagem e tratamento das seguintes IST assintomáticas: sífilis latente recente e tardia, infecções por N. gonorrhoeae e C. trachomatis em mulheres, HIV e hepatites virais B e C. Por outro lado, o manejo de IST com a utilização dos fluxogramas deve abranger a detecção e o tratamento das IST que se apresentam sob a forma de úlceras genitais, corrimento uretral, corrimento vaginal, DIP e verrugas anogenitais. As ações a serem adotadas pelos profissionais de saúde durante as consultas ambulatoriais nos serviços de saúde para o diagnóstico de infecções assintomáticas devem incluir, de modo geral (BRASIL, 2016e): • Triagem para clamídia em gestantes de 15 a 24 anos, quando disponível. • Triagem para sífilis, gonorreia, clamídia, hepatites virais B e C e HIV em pessoas com IST e populações‑chave (gays, homens que têm relação sexual com homens, profissionais do sexo, travestis/transexuais e pessoas que usam drogas), quando disponível. • Testagem de rotina para diagnóstico de HIV, sífilis e hepatite B durante o pré‑natal e parto. • Tratamento das infecções identificadas. • Tratamento das parcerias sexuais para a(s) mesma(s) infecção(ões) apresentadas pelo caso índice, independentemente da presença de sinais ou sintomas. 53 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER O manejo de IST sintomáticas com uso de fluxograma, com e sem a utilização de testes laboratoriais, conforme preconiza o Ministério da Saúde, está apresentado na figura a seguir: Queixa de síndrome específica Anamnese e exame físico Identificação da síndrome Tratamento etiológico ou baseado na clínica (para os principais grandes causadores da síndrome) Fluxograma sem laboratório Fluxograma com laboratório Presença de laboratório? Informação/educação em saúde Oferta de preservativos e gel lubrificante Oferta de testes HIV e demais IST (sífilis, hepatite B, gonorreia e clamídia), quando disponíveis Ênfase na adesão do tratamento Vacinação para HBV e HPV, conforme estabelecido Oferta de profilaxia pós‑exposição para o HIV, quando indicado Oferta de profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual Notificação do caso, conforme estabelecido Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) Não Sim Figura 15 – Manejo de IST sintomáticas com uso de fluxograma Em sequência, serão discutidos os conteúdos relativos às principais manifestações clínicas das IST, como o corrimento vaginal, o corrimento uretral, as úlceras genitais, as DIP e as verrugas anogenitais. 5.8 Corrimento vaginal É uma síndrome comum, ocorrendo principalmente na idade reprodutiva da mulher. Durante a avaliação clínica, é importante que o profissional tenha subsídios para diferenciar o conteúdo vaginal fisiológico do patológico. 54 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II O conteúdo vaginal fisiológico é proveniente de muco cervical, da descamação do epitélio vaginal (ação estrogênica), da transudação vaginal e da secreção das glândulas vestibulares (de Bartholin e de Skene). Possui aspecto mucoide, de coloração transparente ou branca e sem odor. As causas não infecciosas do corrimento vaginal incluem a vaginite inflamatória descamativa, a vaginite atrófica (mulheres na pós‑menopausa), a presença de corpo estranho, entre outros. Por outro lado, o corrimento vaginal patológico ocorre por múltiplos agentes etiológicos, dos quais citam‑se os mais comuns: candidíase vulvovaginal, vaginose bacteriana e tricomoníase. Entre estas, apenas a tricomoníase é considerada uma IST (BRASIL, 2016e). 5.8.1 Candidíase vulvovaginal Trata‑se de uma infecção vulvovaginal causada por um fungo comensal que habita a mucosa vaginal e digestiva, o qual cresce quando o meio se torna favorável ao seu desenvolvimento. Como esse microrganismo pode fazer parte da flora endógena em até 50% das mulheres assintomáticas, a relação sexual não é a principal forma de transmissão da infecção (BRASIL, 2016e). O principal agente etiológico da candidíase vulvovaginal é o fungo Candida albicans, responsável por cerca de 80% a 90% dos casos da infecção. Embora a infecção não seja transmitida sexualmente, é identificada com maior frequência nas mulheres em atividade sexual, provavelmente em função da presença de microrganismos colonizadores que penetram no epitélio via microabrasões (BRASIL, 2016e). Os sinais e sintomas da infecção podem se apresentar isolados ou associados e incluem: prurido vulvovaginal de intensidade variável (principal sintoma); disúria; dispareunia (dor ou desconforto durante as relações sexuais); corrimento branco, grumoso e com aspecto caseoso (“leite coalhado”); hiperemia; edema vulvar; fissuras e maceração da vulva; placas brancas ou branco‑acinzentadas, recobrindo a vagina e colo uterino. É importante mencionar que existem fatores predisponentes para o desenvolvimento da infecção vaginal por Candida spp. São exemplos: a gestação; o diabetes mellitus descompensado; a obesidade; o uso de métodos contraceptivos orais e de antibióticos, corticoides, imunossupressores ou quimio/ radioterapia; os hábitos de higiene e vestuário que aumentam a umidade e o calor local; o contato com substâncias alergênicas e/ou irritantes, como talcos, perfumes, sabonetes ou desodorantes íntimos, e as alterações na resposta imunológica (imunodeficiência), incluindo a infecção pelo HIV (BRASIL, 2016e). Para o diagnóstico da candidíase vulvovaginal, além da história completa da sintomatologia da mulher, seu início e evolução, o profissional de saúde deve proceder ao exame físico, incluindo a inspeção completa da região da vulva e da vagina e o exame especular. O teste do pH vaginal comumente revela valores inferiores a 4,5. As pseudo‑hifas características (brotamento ou ramificação de um fungo) podem ser visualizadas por meio da bacterioscopia (LOWDERMILK, 2012). De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), a primeira opção para o tratamento da afecção é o miconazol via vaginal (creme vaginal a 2%, um aplicador cheio, à noite, por sete dias) ou a nistatina via vaginal (100.000 UI, uma aplicação, à noite, por 14 dias). O fluconazol (150 mg, via 55 Re vi sã o: L uc as - D iagr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER oral, dose única) ou o itraconazol (100 mg, dois comprimidos, via oral, duas vezes por dia, por um dia) constituem a segunda opção para o tratamento da candidíase vulvovaginal. As parcerias sexuais não precisam ser tratadas, exceto as sintomáticas. Uma minoria de parceiros sexuais do sexo masculino pode apresentar balanite e/ou balanopostite, caracterizada por áreas eritematosas na glande do pênis, prurido ou irritação. Esses casos têm indicação de tratamento com agentes tópicos (BRASIL, 2016). 5.8.2 Vaginose bacteriana É uma afecção caracterizada pelo desequilíbrio da flora microbiota vaginal normal, com diminuição acentuada ou desaparecimento de lactobacilos acidófilos (Lactobacillus spp) e aumento de bactérias anaeróbias (Prevotella sp. e Mobiluncus sp.), Gardnerella vaginalis, Ureaplasma sp., Mycoplasma sp. e outros (BRASIL, 2016e). A bactéria Gardnerella vaginalis faz parte da flora vaginal normal das mulheres sexualmente ativas e é uma das principais responsáveis pela doença. A vaginose bacteriana constitui a causa mais comum de corrimento vaginal, afetando 10% das mulheres atendidas na ABS e entre 10% e 30% das gestantes. Pode ser assintomática em alguns casos. Geralmente, os sinais e sintomas da infecção incluem (BRASIL, 2016e): • Corrimento vaginal. — Odor fétido (semelhante a peixe), mais acentuado após a relação sexual sem o uso do preservativo e durante o período menstrual. — Coloração branco‑acinzentado. — Aspecto fluido ou cremoso, algumas vezes bolhoso. • Dispareunia (dor à relação sexual), pouco frequente. De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o diagnóstico clínico‑laboratorial da vaginose bacteriana deve ser confirmado quando estiverem presentes três dos critérios de Amsel: • corrimento vaginal homogêneo, geralmente acinzentado e de quantidade variável; • pH vaginal> 4,5; • Teste de Whiff ou teste da amina (KOH 10%) positivo; • presença de clue cells na bacterioscopia corada por Gram. 56 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Não é considerada uma infecção de transmissão sexual, mas pode ser desencadeada pela relação sexual em mulheres predispostas, visto que o contato com o esperma que apresenta um pH elevado contribui para o desequilíbrio da microbiota vaginal (BRASIL, 2016e). A vaginose bacteriana aumenta o risco de aquisição das IST, incluindo o HIV. Ainda, pode trazer complicações às cirurgias ginecológicas e à gravidez, pois está associada com ruptura prematura de membranas, corioamnionite, prematuridade e endometrite pós‑cesárea. Se estiver presente nos procedimentos invasivos, como curetagem uterina, biópsia de endométrio e inserção de dispositivo intrauterino (DIU), a bactéria aumenta o risco de doença inflamatória pélvica (DIP) (BRASIL, 2016e). O tratamento da infecção deve ser recomendado para as mulheres sintomáticas, gestantes e que apresentem comorbidades ou potencial risco de complicações (previamente à inserção de DIU, cirurgias ginecológicas e exames invasivos no trato genital). A primeira opção para o tratamento da infecção é o metronidazol via oral (250 mg, dois comprimidos, duas vezes por dia, durante sete dias) ou via vaginal (gel vaginal 100 mg/g, um aplicador cheio via vaginal, à noite ao deitar‑se, por cinco dias). O Ministério da Saúde não recomenda o tratamento das parcerias sexuais (BRASIL, 2016e). 5.8.3 Tricomoníase É causada pelo Trichomonas vaginalis, um protozoário flagelado, que tem como reservatório o colo uterino, a vagina e a uretra. Sua transmissão é quase exclusivamente por via sexual nos adultos. A infecção pode ser assintomática. Quando sintomática, apresenta‑se nas mulheres com um corrimento vaginal e com uretrite nos homens (BRASIL, 2016e). De acordo com o Protocolo do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), os sinais e sintomas da infecção são: • corrimento abundante, amarelado ou amarelo esverdeado, bolhoso (veja a figura a seguir); Figura 16 – Corrimento da tricomoníase 57 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER • prurido e/ou irritação vulvar; • dor pélvica (ocasionalmente); • sintomas urinários, como disúria e polaciúria; • hiperemia da mucosa do colo do útero (colpite difusa e/ou focal, com aspecto de framboesa), conforme a figura a seguir. Figura 17 – Colpite difusa (tricomoníase) Para o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o diagnóstico da tricomoníase deve ser feito por meio da visualização dos protozoários móveis em material da região ectocervical, por exame bacterioscópico a fresco ou pela coloração de Gram, Giemsa, Papanicolaou, entre outras. A primeira opção para o tratamento da infecção é o metronidazol via oral em dose única (400 mg, cinco comprimidos – dose total de tratamento 2 g) ou 250 mg de metronidazol via oral, dois comprimidos, duas vezes ao dia, durante sete dias. As parcerias sexuais devem sempre ser tratadas com o mesmo esquema terapêutico. O tratamento pode aliviar os sintomas de corrimento vaginal em gestantes, além de prevenir infecção respiratória ou genital em recém‑nascido. É importante ressaltar que as gestantes com infecção por T. vaginalis deverão ser tratadas independentemente de sua idade gestacional, pois essa IST está associada com rotura prematura de membranas, parto pré‑termo e RN de baixo peso ao nascimento. 5.8.4 Manejo do corrimento vaginal A figura a seguir apresenta o fluxograma para o manejo do corrimento vaginal na atenção básica, de acordo com a recomendação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e): 58 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Anamnese e exame ginecológico (toque e exame especular) Queixa de corrimento vaginal Corrimento vaginal confirmado Fluxograma com pH e teste KOH 10% Fluxograma laboratorial (microscopia) Coleta de material para microscopia Informação/educação em saúde Oferta de preservativos e gel lubrificante Oferta de testes HIV e demais IST (sífilis, hepatite B, gonorreia e clamídia), quando disponíveis Ênfase na adesão do tratamento Vacinação para HBV e HPV, conforme estabelecido Oferta de profilaxia pós‑exposição para o HIV, quando indicado Oferta de profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual Notificação do caso, conforme estabelecido Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) Microscopia disponível? pH vaginal e/ou KOH a 10% pH > 4,5 e/ou KOH(+) pH < 4,5 e/ou KOH(‑) Presença de hifas Tratar candidiase Tratar vaginose bacteriana e triconomíase Presença de clue cells Tratar vaginose bacterianaCausa fisiológica Presença de Tricomonas sp. Tratar tricomoníase Corrimento grumoso ou eritema vulvar Não Não Sim Sim Figura 18 – Manejo de corrimento vaginal com uso de fluxograma Observação O profissional de saúde deve sempre orientar os usuários que, durante o tratamento com metronidazol, deve‑se evitar a ingestão de álcool, em função do “efeito antabuse”, caracterizado por mal‑estar, náuseas, tonturas 59 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER e gosto metálico na boca. É necessário, ainda, suspender as relações sexuais e, caso a mulher menstrue, deve‑se manter o tratamento. De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), os seguintes métodos podem ser utilizados para o diagnóstico de corrimento vaginal: • Teste de Whiff ou teste das aminas ou teste “do cheiro”: deve ser realizado colocando‑se uma gota de KOH a 10% sobre o conteúdo vaginal depositado numa lâmina de vidro. Se houver o “odor de peixe”, o teste é considerado positivo e sugestivo de vaginose bacteriana. • Teste de pH vaginal: utiliza uma fita de pH na parede lateral vaginal, comparando a cor resultante do contato do fluidovaginal com o padrão da fita. Normalmente, o pH vaginal é menor que 4,5. Valores de pH maiores que 4,5 indicam vaginose bacteriana ou tricomoníase, enquanto os valores menores que 4,5 indicam candidíase vulvovaginal. • Exame a fresco: faz‑se um esfregaço com amostra de material vaginal em lâmina de vidro e uma gota de salina, cobrindo‑se a preparação com lamínula. O preparado é examinado, observando‑se a presença de leucócitos, células parabasais, Trichomonas sp. móveis, leveduras e/ou pseudo‑hifas. Os leucócitos estão presentes em secreções vaginais de mulheres com candidíase vulvovaginal e tricomoníase. • Bacterioscopia por coloração de Gram: a presença de clue cells, células epiteliais escamosas de aspecto granular pontilhado e bordas indefinidas cobertas por pequenos e numerosos cocobacilos, é típica de vaginose bacteriana. 5.9 Corrimento uretral As uretrites são IST caracterizadas pela presença de processo inflamatório no canal uretral, acompanhada de corrimento. Os agentes microbianos causadores das uretrites podem ser transmitidos por relação sexual vaginal, anal e oral. De modo geral, o corrimento uretral tem aspecto que varia de mucoide a purulento, com volume variável, associado a dor uretral (independentemente da micção), disúria, estrangúria (micção lenta e dolorosa), prurido uretral e eritema de meato uretral (BRASIL, 2016e). Entre os fatores de risco associados às uretrites, citam‑se a idade jovem, o baixo nível socioeconômico, as múltiplas parcerias ou nova parceria sexual, o histórico de IST e o uso irregular de preservativos (BRASIL, 2016e). Os agentes etiológicos mais importantes do corrimento uretral são a Neisseria gonorrhoeae e a Chlamydia trachomatis. Outros agentes, como T. vaginalis, U. urealyticum, enterobactérias (nas relações anais insertivas), M. genitalium, vírus do herpes simples (HSV, do inglês herpes simplex virus), adenovírus e Candida spp. são menos frequentes. Na sequência, serão tratadas apenas as uretrites causadas pela Neisseria gonorrhoeae e pela Chlamydia trachomatis. 60 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II 5.9.1 Uretrite gonocócica Também conhecida como gonorreia, blenorragia ou blenorreia. É um processo infeccioso e inflamatório da mucosa uretral, causado pela Neisseria gonorrhoeae, um diplococo gram‑negativo intracelular. O risco de transmissão de um parceiro infectado a outro é de 50% por ato sexual. Os sinais e sintomas são determinados pelos locais primários da infecção, que pode acometer as membranas mucosas da uretra, a endocérvice, o reto, a faringe e a conjuntiva (BRASIL, 2016e). Clinicamente, apresenta‑se de forma completamente diferente no homem e na mulher. Em cerca de 70 a 80% dos casos femininos, a doença é assintomática. No homem, a infecção uretral pode ser assintomática em menos de 10% dos casos (BRASIL, 2013b; 2016e). No homem, a infecção provoca a uretrite masculina, na qual o sintoma mais precoce é a sensação de prurido na fossa navicular, que vai se estendendo para toda a uretra. Após um a três dias, a pessoa doente se queixa de ardência miccional (disúria), seguida por corrimento, inicialmente mucoide, que com o passar do tempo torna‑se mais abundante e purulento (BRASIL, 2013b; 2016e). Em alguns pacientes, pode haver febre e outras manifestações de infecção aguda sistêmica. Se não for tratada ou se o tratamento for tardio ou inadequado, o processo inflamatório se propaga ao restante da uretra, com o aparecimento de polaciúria e sensação de peso no períneo; raramente observa‑se hematúria ao final da micção (BRASIL, 2013b; 2016e). As complicações da uretrite gonocócica no homem ocorrem por infecção ascendente a partir da uretra. Entre estas destacam‑se: balanopostite, prostatite, epididimite, estenose uretral (rara), artrite, meningite, faringite, pielonefrite, miocardite, pericardite e septicemia. A conjuntivite gonocócica em adultos não é um quadro raro e ocorre basicamente por autoinoculação. A orquiepididimite pode provocar diminuição da fertilidade, podendo desencadear até mesmo a esterilidade masculina (BRASIL, 2013b). Embora a infecção seja assintomática na maioria das mulheres, quando a doença é aparente, manifesta‑se sob a forma de cervicite, a qual, se não for tratada adequadamente, resulta em graves complicações. Uma cervicite gonocócica prolongada, sem tratamento adequado, pode se estender ao endométrio e tubas uterinas, causando a doença inflamatória pélvica (DIP). A DIP pode estar relacionada à endometrite, salpingite e peritonite. A esterilidade feminina, a gravidez ectópica e a dor pélvica crônica são as principais sequelas dessa infecção (BRASIL, 2013b). Alguns sintomas genitais leves, como corrimento vaginal, dispareunia ou disúria, são frequentes na presença de cervicite mucopurulenta. O colo uterino pode estar edemaciado, facilmente sangrante ao toque da espátula e com presença de secreção mucopurulenta ou purulenta no orifício externo do colo do útero. As mães doentes ou com a infecção podem transmitir o gonococo para os recém‑nascidos durante o parto devido à contaminação no canal de parto, causando a conjuntivite gonocócica (BRASIL, 2013b). O risco de transmissão vertical da N. gonorrhoeae durante o parto vaginal oscila entre 30% e 50%. A oftalmia neonatal ou a conjuntivite purulenta do RN ocorre no primeiro mês de vida da criança, podendo causar a cegueira, especialmente quando causada pela N. gonohrroeae. Por isso, a doença deve ser tratada imediatamente, para prevenir o agravamento das lesões oculares (BRASIL, 2016e). 61 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER No Brasil, a prevenção da oftalmia neonatal é realizada por meio da administração de uma solução de nitrato de prata a 1%, chamada método de credeização, com aplicação única, na primeira hora após o nascimento ou pode ser substituído por tetraciclina a 1% (colírio), seguindo as mesmas orientações (BRASIL, 2016e). A infecção retal geralmente é assintomática, mas pode ocorrer corrimento retal em 12% dos casos ou dor/desconforto perianal ou anal em 7% dos casos. A infecção de faringe, tanto em homens como em mulheres, é habitualmente assintomática (mais de 90%) (BRASIL, 2016e). O diagnóstico da uretrite deve ser realizado com base nas manifestações clínicas (drenagem purulenta ou mucopurulenta ao exame físico) ou nos achados laboratoriais, como a bacterioscopia pela coloração Gram de secreção uretral. O tratamento da infecção é realizado por meio da administração de antibioticoterapia, prescrita pelo médico. 5.9.2 Uretrite não gonocócica Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), são consideradas uretrites não gonocócicas as uretrites sintomáticas cujos exames de bacterioscopia pela coloração de Gram e/ou cultura foram negativas para o gonococo. Diferentes agentes têm sido responsabilizados por essas infecções, como C. trachomatis, U. urealyticum, M. hominis e T. vaginalis, entre outros. A infecção por Chlamydia trachomatis (clamídia) no homem é responsável por aproximadamente 50% dos casos das uretrites não gonocócicas. A transmissão da infecção ocorre pelo contato sexual, com risco de 20% por ato, com período de incubação de 14 a 21 dias no homem. Estima‑se que dois terços das parceiras estáveis de homens com a infecção hospedem a clamídia na endocérvice. Essas mulheres podem reinfectar seu parceiro sexual e desenvolver quadro de DIP se permanecerem sem tratamento (BRASIL, 2016e). Habitualmente, a uretrite não gonocócica caracteriza‑se pela presença de corrimentos mucoides, discretos, com disúria leve e intermitente. Entretanto, em alguns casos, os corrimentos dessas uretrites podem ser clinicamente semelhantes aos da gonorreia. As uretrites causadas por C. trachomatis podem evoluir para prostatite, epididimite, balanite, conjuntivite (por autoinoculação) e síndrome uretro‑conjuntivo‑sinovial ou síndrome deReiter. O diagnóstico da uretrite deve ser realizado com base nas manifestações clínicas ou nos achados laboratoriais, como a bacterioscopia pela coloração Gram de secreção uretral. O tratamento da infecção é realizado por meio da administração de antibioticoterapia, realizada pelo médico. 5.9.3 Manejo do corrimento uretral A figura apresentada a seguir sumariza o manejo do corrimento uretral, com suporte mínimo de laboratório, conforme recomendação do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e). 62 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Anamnese e exame físico Queixa de corrimento uretral Corrimento uretral confirmado Presença de laboratório? Corrimento grumoso ou eritema vulvar Presença de diplococos negativos intracelulares? Não Não Não Não Sim Sim Sim Sim Coleta de material para microscopia (Gram) Cultura para gonococo e/ou biologia molecular para Clamidia, quando disponível Sinais e sintomas persistem após 14 dias? Tratar clamídia Referenciar Excluir falha na adesão ao tratamento e possibilidade de resistência antimicrobiana Alta pH vaginal e/ou KOH a 10% Tratar para Trichomonas vaginais, Mycoplasma genitalium e Ureplasma urealyctium Informação/educação em saúde Oferta de preservativos e gel lubrificante Oferta de testes HIV e demais IST (sífilis, hepatite B, gonorreia e clamídia), quando disponíveis Ênfase na adesão do tratamento Vacinação para HBV e HPV, conforme estabelecido Oferta de profilaxia pós‑exposição para o HIV, quando indicado Oferta de profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual Notificação do caso, conforme estabelecido Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) Figura 19 – Manejo do corrimento uretral com uso de fluxograma 63 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER 5.10 Úlceras genitais As ulcerações genitais podem ser causadas por diferentes agentes etiológicos. Entre as IST que mais frequentemente causam úlceras, citam‑se a sífilis, o herpes genital, o cancro mole, o linfogranuloma venéreo e a donovanose. Nos casos em que a úlcera genital é diagnosticada como uma IST, o paciente deve ser manejado adequadamente. De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o manejo de úlcera genital deve seguir o fluxograma apresentado na figura a seguir: Alta Referenciar Tratar herpes genital Tratar sífilis e cancroide Tratar sífilis, cancroide e donovanose Realizar biópsia Coleta de material para microscopia (Gram e Giemsa) e campo escuro Biologia molecular, quando disponível Tratar sífilis primária/ secundária Identificação de T. pallidum Referenciar Tratar herpes genital Sugestivo de HSV Tratar cancroide Sugestivo de H. ducrey Tratar donovanose Segestivo de K. granulomatis História ou evidência de lesões vesiculosas Laboratório disponível? IST causa provável? Lesões com mais de 4 semanas? Sinais e sintomas persistem após 14 dias? Informação/educação em saúde Oferta de preservativos e gel lubrificante Oferta de testes HIV e demais IST (sífilis, hepatite B, gonorreia e clamídia), quando disponíveis Ênfase na adesão do tratamento Vacinação para HBV e HPV, conforme estabelecido Oferta de profilaxia pós‑exposição para o HIV, quando indicado Oferta de profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual Notificação do caso, conforme estabelecido Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) Úlcera genital presente Não Não Não Não Sim Sim Sim SimSim Figura 20 – Manejo de úlcera genital com uso de fluxograma 64 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Na sequência, serão discutidas as infecções mais frequentes no Brasil, como a sífilis e o herpes genital. 5.10.1 Sífilis Também conhecida como doença de Lues, a sífilis é uma doença infectocontagiosa sistêmica, de evolução crônica, provocada por uma espiroqueta exclusiva do ser humano chamada Treponema pallidum. Pode ser classificada como congênita e adquirida (BRASIL, 2013b; 2016e). A sífilis congênita é a infecção do feto pelo T. pallidum, transmitida por via placentária, em qualquer momento da gestação ou estágio clínico da doença em gestante não tratada ou inadequadamente tratada. Sua ocorrência evidencia falhas dos serviços de saúde, particularmente da atenção ao pré‑natal, pois o diagnóstico precoce e o tratamento da gestante são condutas relativamente simples e muito eficazes para a prevenção dessa doença (BRASIL, 2013b). A sífilis congênita é classificada em recente e tardia. Quando os sinais e sintomas surgem logo após o nascimento ou nos primeiros dois anos de vida da criança, é denominada sífilis congênita recente. Quando o surgimento da sintomatologia ocorre após esse período (dois anos), a sífilis congênita é classificada como tardia (BRASIL, 2013b). O quadro clínico da sífilis congênita varia conforme diferentes fatores, tais como o tempo de exposição fetal ao treponema; a carga treponêmica materna; a virulência do treponema; o tratamento da infecção materna; a coinfecção materna pelo HIV ou outra causa e imunodeficiência. Esses fatores podem acarretar em processo de abortamento, natimorto ou óbito neonatal, assim como sífilis congênita sintomática ou assintomática ao nascimento (BRASIL, 2013b). A sífilis adquirida é transmitida predominantemente pela relação sexual. A transmissão por transfusão sanguínea é rara nos dias atuais. Sua evolução é dividida em recente e tardia. A sífilis adquirida recente compreende o primeiro ano de evolução da doença, período de desenvolvimento imunitário na sífilis não tratada. Inclui as fases primária, secundária e latente precoce e tardia da sífilis. É considerada tardia após o primeiro ano de evolução e inclui a sífilis latente tardia e terciária. Ocorre em indivíduos infectados pelo treponema que não receberam tratamento adequado ou que não foram tratados (BRASIL, 2013b). A sífilis é um importante agravo em saúde pública. Além de ser infectocontagiosa e de causar graves comprometimentos no organismo de uma pessoa não tratada, a infecção aumenta significativamente o risco de se contrair a infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), uma vez que a entrada do vírus é facilitada pela presença das lesões sifilíticas. A presença do T. pallidum no organismo também acelera a evolução da infecção pelo HIV para a síndrome da imunodeficiência adquirida (aids). Ademais, a sífilis congênita é responsável pelas elevadas altas taxas de morbidade e mortalidade infantil, podendo chegar a 40% a taxa de abortamento, óbito fetal e morte neonatal (BRASIL, 2016e). 65 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER Segundo o Boletim Epidemiológico de Sífilis do Ministério da Saúde de 2016 (BRASIL, 2016d), o número de casos de sífilis adquiridas (em adultos) aumentou 32,7% no Brasil no período entre 2014 e 2015. Entre as gestantes, o aumento foi de 20,9%, e as infecções congênitas aumentaram 19% no mesmo período, conforme a figura a seguir. Entre 1998 e junho de 2016, foram notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) 142.961 casos de sífilis congênita em menores de um ano de idade. 0,82 0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 30,0 35,0 40,0 45,0 3,7 2,4 3,3 4,0 4,6 5,4 6,5 11,8 5,0 17,9 6,0 25,2 7,5 9,3 11,2 42,7 32,2 2010 2011 2012 Adquirida Gestantes Congênita 2013 2014 2015 Ano Ta xa d e de te cç ão Figura 21 – Taxa de detecção de sífilis adquirida, taxa de detecção de sífilis em gestantes e taxa de incidência de sífilis congênita, segundo ano de diagnóstico (Brasil, 2010‑2015) A evolução da sífilis não tratada consiste em fases sintomáticas entremeadas por períodos assintomáticos (latência). No entanto, essa coreografiaregular pode ser alterada por alguns fatores, como o estado imunológico do hospedeiro e a administração de terapia antimicrobiana para outros patógenos e que podem ser efetivas contra o treponema. Dessa forma, o tempo de apresentação e os sinais e sintomas podem variar. Classicamente, os estágios da sífilis não tratada são classificados como: sífilis primária, sífilis secundária, sífilis latente (recente até um ano após exposição e tardia com mais de um ano de evolução) e sífilis terciária (BRASIL, 2016d). A sífilis primária, também conhecida como cancro duro ou protossifiloma, ocorre após o contato sexual com um indivíduo infectado. O período de incubação da infecção varia de 10 a 90 dias (média de três semanas). A primeira manifestação clínica é caracterizada pela presença de úlcera, geralmente única, que ocorre no local de entrada da bactéria (pênis, vulva, vagina, colo uterino, ânus, boca ou outros locais do tegumento), indolor, com base endurecida e fundo limpo, rica em treponemas. Geralmente é acompanhada de linfadenopatia inguinal. Esse estágio pode durar entre duas e seis semanas, desaparecendo de modo espontâneo, independentemente de tratamento. A sífilis secundária é marcada pela disseminação dos treponemas pelo organismo e aparece em média entre seis semanas e seis meses após a infecção. Podem ocorrer erupções cutâneas 66 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II em forma de máculas (roséola) e/ou pápulas, principalmente no tronco; eritema palmoplantares; placas eritematosas branco‑acinzentadas nas mucosas; lesões pápulo‑hipertróficas nas mucosas ou pregas cutâneas (condiloma plano ou condiloma lata); alopécia em clareira e madarose (perda dos cílios e/ou sobrancelhas). A sintomatologia pode desaparecer espontaneamente em poucas semanas, independentemente de tratamento. As lesões secundárias são ricas em treponemas. Mais raramente, pode haver comprometimento hepático e quadros meníngeos e/ou até oculares (BRASIL, 2016d). Na sífilis latente não existem manifestações clínicas, mas há treponemas localizados em determinados tecidos. É classificada em latente recente (menos de um ano de infecção) e latente tardia (mais de um ano de infecção). O diagnóstico da infecção é realizado apenas pelas reações sorológicas. As manifestações clínicas surgem após um período variável de latência (BRASIL, 2013b). A sífilis terciária ocorre aproximadamente em 30% das infecções não tratadas, após um longo período de latência, podendo surgir entre dois e 40 anos depois do início da infecção. É considerada rara, devido ao fato de que a maioria da população recebe indiretamente, ao longo da vida, antibióticos com ação sobre o T. pallidum e que levam à cura da infecção. Quando presente, nesse estágio a sífilis se manifesta na forma de inflamação e destruição tecidual. Caracteriza‑se pela formação de gomas sifilíticas (tumorações com tendência a liquefação) na pele, mucosas, ossos ou qualquer tecido. As lesões causam desfiguração e incapacidade, podendo ser fatais. É comum o acometimento do sistema nervoso e cardiovascular. Para o diagnóstico, devem‑se considerar as seguintes lesões (BRASIL, 2013b; 2016d): • cutâneas: gomosas e nodulares, de caráter destrutivo; • ósseas: periostite, osteíte gomosa ou esclerosante, artrites, sinovites e nódulos justa‑articulares; • cardiovasculares: aortite sifilítica, aneurisma e estenose de coronárias; • neurológicas: meningite aguda, goma do cérebro ou da medula, atrofia do nervo óptico, lesão do sétimo par craniano, paralisia geral, tabes dorsalis e demência. O quadro a seguir apresenta de modo resumido as manifestações clínicas da sífilis adquirida conforme sua evolução: 67 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER Quadro 7 – Manifestações clínicas da sífilis adquirida, conforme sua evolução e manifestações clínicas Evolução Estágios da sífilis adquirida Manifestações clínicas Sífilis recente (menos de um ano de duração) Primária • 10 a 90 dias após contato, em média três semanas • A lesão desaparece sem cicatriz em duas a seis semanas com ou sem tratamento • Úlcera genital (cancro duro) indolor, geralmente única, com fundo limpo e infiltrada • Linfonodos regionais indolores, de consistência elástica, que não fistulizam Secundária • Seis semanas a seis meses após o contato • As lesões desaparecem sem cicatrizes em quatro a 12 semanas • Pode haver novos surtos • Lesões cutaneomucosas sintomáticas • Sintomas gerais, micropoliadenopatia • Pode haver envolvimento ocular, hepático e neurológico (exemplos: alterações nos pares cranianos, meningismo) • Latente recente • Assintomática, com testes imunológicos reagentes Sífilis tardia (mais de um ano de duração) • Latente tardia • Assintomática, com testes imunológicos reagentes Terciária • Dois a 40 anos após contato • Quadro cutâneo destrutivo e formação de gomas sifilíticas que podem ocorrer em qualquer órgão • Acometimento ósseo, cardiovascular e neurológico Fonte: Brasil (2016d, p. 92). De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016d), os testes de sífilis podem ser utilizados para triagem de pessoas assintomáticas ou para o diagnóstico em pessoas sintomáticas, nas quais a anamnese e o exame físico devem ser cuidadosamente realizados. Na sífilis primária, o diagnóstico laboratorial pode ser realizado pela pesquisa direta do T. pallidum por microscopia de campo escuro, pelos métodos de coloração ou pela imunofluorescência direta, em amostras de lesões, aspirado de linfonodo e/ou material de biópsia. Os testes imunológicos podem não apresentar reatividade no início desse estágio, pois os anticorpos começam a surgir na corrente sanguínea cerca de 7 a 10 dias após o aparecimento do cancro duro. O primeiro teste imunológico a se tornar reagente, em torno de 10 dias da evolução do cancro duro, é o FTA‑Abs. Quando não for possível a realização da pesquisa direta do T. pallidum, o diagnóstico deverá ser realizado pela observação da lesão típica e da anamnese do paciente, sendo importante investigar se existe história pregressa de tratamento de sífilis. Na sífilis secundária, todos os testes que detectam anticorpos são reagentes. Nesse estágio, espera‑se encontrar títulos altos nos testes quantitativos não treponêmicos. O diagnóstico é realizado com base na presença de lesões típicas na pele e mucosas disseminadas, que costumam ser exuberantes nessa fase. A confirmação ocorre por meio dos testes treponêmicos e não treponêmicos (BRASIL, 2016d). 68 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016d), o exame em campo escuro permite a pesquisa direta do T. pallidum e pode ser realizado tanto com amostras obtidas nas lesões primárias como nas lesões secundárias da sífilis, em adultos ou em crianças. A amostra utilizada é o exsudato seroso das lesões ativas, livre de eritrócitos, outros organismos e restos de tecido. Na sífilis latente, todos os testes para a detecção de anticorpos permanecem reagentes, e observa‑se uma diminuição dos títulos nos testes não treponêmicos quantitativos. O diagnóstico da infecção é realizado com base na história clínica do indivíduo e na combinação de resultados dos testes (BRASIL, 2016d). Na sífilis terciária, os testes que detectam anticorpos habitualmente são reagentes, principalmente os testes treponêmicos; os títulos dos anticorpos nos testes não treponêmicos tendem a ser baixos e raramente podem ser negativos. Quando possível, o diagnóstico deve ser baseado na investigação de amostras provenientes dos órgãos nos quais haja suspeita de atividade do patógeno (BRASIL, 2016d). Para o diagnóstico de sífilis em gestante, podem ser utilizados os testes treponêmicos rápidos ou os testes treponêmicos convencionais (Elisa, FTA‑Abs, TPHA, entre outros) e os não treponêmicos(VDRL, RPR, TRUST, entre outros). Durante o pré‑natal, todas as gestantes devem ser submetidas ao teste para o diagnóstico da sífilis em dois momentos: uma vez no primeiro trimestre de gravidez e a segunda no terceiro trimestre. A parceria sexual também deve ser testada (BRASIL, 2016d). O tratamento da sífilis é realizado por meio da administração de penicilina. O esquema terapêutico recomendado pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2016d) para o tratamento da sífilis primária, secundária e latente recente (até um ano de duração) é a penicilina G benzatina, 2,4 milhões UI, intramuscular, em dose única (1,2 milhão UI em cada glúteo). Nos casos de sífilis latente tardia (com mais de um ano de evolução) ou latente com duração ignorada e sífilis terciária recomenda‑se a penicilina G benzatina, 2,4 milhões UI, intramuscular, administradas semanalmente durante três semanas, com dose total de 7,2 milhões UI. 5.10.2 Herpes genital Os Herpes simplex virus (HSV), tipos 1 e 2, pertencem à família Herpesviridae, da qual fazem parte o citomegalovírus (CMV), o varicela zoster vírus (VZV), o Epstein‑Barr vírus (EBV), o herpes‑vírus humano 6 (HHV‑6) e o herpes‑vírus humano 8 (HHV 8). Embora os HSV 1 e 2 possam provocar lesões em qualquer parte do corpo, há predomínio do tipo 2 nas lesões genitais e do tipo 1 nas lesões periorais (BRASIL, 2013b; 2016e). A transmissão é feita por contato íntimo com indivíduo transmissor do vírus, a partir de superfície mucosa ou lesão infectante. O HSV é rapidamente inativado em temperatura ambiente e após secagem, o que faz com que a disseminação por aerossóis ou fômites seja rara. O vírus ganha acesso através de escoriações na pele ou contato direto com a cérvice uterina, uretra, orofaringe ou conjuntiva (BRASIL, 2013b). Atualmente, tem sido reconhecida a importância do HSV na etiologia de úlceras genitais, respondendo por grande percentual dos casos de transmissão do HIV, o que coloca o controle do herpes como uma prioridade (BRASIL, 2013b). 69 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER As manifestações clínicas da infecção pelo vírus herpes simples dependem, principalmente, das características do vírus, da imunidade do hospedeiro e da predisposição genética do paciente (PENELLO et al., 2010). A proporção de infecções herpéticas sintomáticas é estimada entre 13% e 37% dos casos (BRASIL, 2016e). O quadro clínico da infecção pelo HSV pode ser dividido em primoinfecção herpética e surtos recidivantes. A primoinfecção herpética tem um período de incubação médio de seis dias. Em geral, é uma manifestação mais grave caracterizada pelo surgimento de lesões eritemato‑papulosas de um a três milímetros de diâmetro, que evoluem rapidamente para vesículas sobre base eritematosa, são muito dolorosas e de localização variável na região genital. O conteúdo dessas vesículas geralmente é citrino (BRASIL, 2016e). O quadro clássico da primoinfecção herpética frequentemente é precedido por febre, cefaleia, mialgias e adinamia. Pode ocorrer disúria, com ou sem retenção urinária. Aparecem precocemente durante o curso da doença e, geralmente, desaparecem antes da cura das lesões. Posteriormente, há formação das vesículas eritematosas, ulceração e re‑epitelização, durando todo o quadro cerca de duas ou três semanas. A formação de cicatriz é incomum (PENELLO et al., 2010; BRASIL, 2016e). Nas mulheres, em especial, pode ocorrer um quadro similar a uma infeção urinária baixa. A linfadenomegalia inguinal dolorosa bilateral está presente em 50% dos casos. Quando há acometimento do colo do útero, é comum o corrimento vaginal, que pode ser abundante. Nos homens, o acometimento da uretra pode provocar corrimento uretral e, raramente, é acompanhado de lesões extragenitais. O quadro clínico pode durar de duas a três semanas (BRASIL, 2016e). Após a infecção primária, o vírus pode ficar em estado de latência em gânglios de nervos cranianos ou da medula. Quando reativado por diferentes motivos, o HSV migra através dos nervos periféricos, retornando à pele ou mucosa e produzindo a erupção do herpes simples recidivante. Após a infecção genital primária por HSV 2 ou HSV 1, respectivamente, 90 e 60% dos pacientes desenvolvem novos episódios nos primeiros 12 meses, por reativação dos vírus (BRASIL, 2013b; 2016e). A recorrência das lesões pode estar associada à presença de quadro febril, exposição à radiação ultravioleta, traumatismos, menstruação, estresse físico ou emocional, antibioticoterapia prolongada e imunodeficiência. Geralmente, essa recorrência tende a ser na mesma localização da lesão inicial (BRASIL, 2013b; 2016e). O quadro clínico das recorrências é menos intenso quando comparado ao observado na primoinfecção. É precedido pelos sinais prodômicos característicos: aumento de sensibilidade, prurido, “queimação”, mialgias e “fisgadas” nas pernas, quadris e região anogenital (no herpes genital) (BRASIL, 2013b; 2016e). O diagnóstico da infecção é iminentemente clínico. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e) recomenda que o tratamento seja realizado com antivirais (aciclovir, via oral), conforme estágio da doença e sob a orientação médica. Esse tratamento, quando feito precocemente, é eficaz para reduzir a intensidade e duração do episódio. É importante mencionar que o tratamento das lesões locais pode ser realizado com a aplicação de compressas de solução fisiológica ou degermante em solução aquosa, para higienização das lesões. O uso de pomadas com antibiótico é indicado somente nos casos de infecção secundária, e os 70 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II analgésicos orais podem ser prescritos, caso haja necessidade. Ressalta‑se que não há associação entre herpes simples genital e câncer. 5.11 Doença inflamatória pélvica A doença inflamatória pélvica (DIP) é uma inflamação da região pélvica em função da propagação de microrganismos a partir do trato genital inferior (vagina e colo do útero) para o trato genital superior (endométrio, tubas uterinas e estruturas adjacentes). A ascensão de microrganismos pode ser espontânea ou proveniente de sua manipulação, como a inserção do dispositivo intrauterino (DIU), a biópsia de endométrio, a curetagem, entre outros (DEKKER et al., 2014; BRASIL, 2016e). A virulência dos germes e a resposta imune definem a progressão da doença, o que inclui endometrite, salpingite, pelviperitonite, ooforite, peri‑hepatite (síndrome de Fitz‑Hugh‑Curtis) e abscesso tubo‑ovariano ou de fundo de saco de Douglas (HALBE; CUNHA, 2010). Em 60% dos casos, a DIP acontece em função de um microrganismo sexualmente transmitido (DEKKER et al., 2014). O quadro a seguir apresenta os agentes etiológicos transmitidos por via sexual e os endógenos encontrados na DIP. Quadro 8 – Exemplos de patógenos endógenos e sexualmente transmissíveis encontrados na doença inflamatória pélvica Aeróbios Haemophilus influenzae, Pseudomonas aeruginosa Anaeróbios facultativos Corynebacterium spp, Enterococcus faecalis, Escherichia coli, Gardnerella vaginalis, Klebsiella spp., Peptostreptococcus, Staphylococcus spp., Staphylococcus aureus, Streptococcus spp., S. agalactiae (beta‑hemolítico) Anaeróbios Atopobium vaginae, bacilos associados à vaginose bacteriana (BVAB1‑2‑3), Bacteroides spp., Bacteroides fragilis, Clostridium spp., Eggerthella spp., Leptotrichia amnionii, Megasphaera spp., Mobiluncus mulieris, Prevotella spp. Microrganismos sexualmente transmissíveis Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae, Mycoplasma genitalium, M. hominis, Ureaplasma urealyticum, U. parvum, Trichomonas vaginalis, citomegalovírus, herpesvírus simples (ambos da família Herpesviridea) Fonte: Halbe e Cunha (2010, p. 106). A DIP é considerada um sério problema de saúde pública e constitui uma das mais importantes complicações das IST (BRASIL, 2016e). A prevalência da inflamação pélvica é subestimada, poisa maioria dos casos é subclínica – mais de 60% dos casos. A maior prevalência é em mulheres sexualmente ativas entre 15 e 24 anos de idade (HALBE; CUNHA, 2010). Está associada a importantes sequelas em longo prazo, causando morbidades reprodutivas que incluem a infertilidade por fator tubário, a gravidez ectópica e a dor pélvica crônica (em 18% dos casos). A mortalidade, após o uso adequado de antibióticos, reduziu‑se praticamente a zero nos países desenvolvidos (BRASIL, 2016e). Os fatores de risco para DIP incluem as IST prévias ou atuais (pessoas com infecção por clamídia, micoplasmas e/ou gonococos na cérvice uterina apresentam um risco aumentado de DIP); múltiplas parcerias sexuais e parceria sexual atual com uretrite; e o uso de método anticoncepcional (o DIU pode representar um risco três a cinco vezes maior para o desenvolvimento de DIP, se a paciente for portadora de cervicite) (LOWDERMILK, 2012; BRASIL, 2016e). 71 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER Os sintomas da DIP variam, dependendo da forma da infecção (aguda, subaguda ou crônica), mas a presença de dor é comum a todos os tipos de infecção (LOWDERMILK, 2012). Para Halbe e Cunha (2010), o quadro clínico descrito a seguir é sugestivo de DIP: dor no baixo ventre ou na região lombossacral e sintomas genitourinários (por exemplo, corrimento, sangramento vaginal, dispareunia e disúria); febre, dor no hipocôndrio direito e náuseas ou vômitos sugerem peri‑hepatite (15% dos casos). Para a investigação da DIP, ao realizar o exame físico, o profissional de saúde deve avaliar os seguintes parâmetros (HALBE; CUNHA, 2010): • temperatura axilar maior que 38 °C; • dor à palpação e descompressão brusca dolorosa no baixo ventre; • dor à palpação do colo uterino e dos anexos; • palpação de tumor anexial doloroso (abscesso tubo‑ovariano); • abaulamento doloroso do fundo de saco vaginal (abscesso pélvico); • canal cervical com corrimento branco, amarelado ou sangramento induzido. Para o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o diagnóstico clínico de DIP deve estar fundamentado nos critérios maiores, menores e nos critérios elaborados, conforme apresentado no quadro a seguir: Quadro 9 – Critérios diagnósticos de DIP Critérios maiores Critérios menores Critérios elaborados Dor no hipogástrio Temperatura axilar> 37,5 °C ou> 38,3 °C Evidência histopatológica de endometrite Dor à palpação dos anexos Conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal Presença de abscesso tubo‑ovariano ou de fundo de saco de Douglas em estudo de imagem Dor à mobilização de colo uterino Massa pélvica Laparoscopia com evidência de DIP Mais de cinco leucócitos por campo de imersão em material de endocérvice Leucocitose em sangue periférico Proteína C reativa ou velocidade de hemossedimentação (VHS) elevada Comprovação laboratorial de infecção cervical por gonococo, clamídia ou micoplasmas Fonte: Brasil (2016e, p. 76). Os critérios elaborados podem aumentar a especificidade do diagnóstico. Para a confirmação clínica de DIP, é necessária a presença de três critérios maiores mais um critério menor ou um critério elaborado (BRASIL, 2016e). 72 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II O tratamento da DIP deve ser iniciado imediatamente nas mulheres jovens, sexualmente ativas, com queixa de desconforto ou dor pélvica e que preencham os critérios clínicos para a doença. O esquema terapêutico a ser utilizado dependerá do agente etiológico e deve apresentar ampla cobertura antimicrobiana para a doença (BRASIL, 2016e). Halbe e Cunha (2010) acrescentam que a escolha dos antibióticos dependerá da disponibilidade, da tolerância e do juízo clínico. A decisão de tratar a mulher ou de referi‑la para uma unidade de maior complexidade deve estar fundamentada na gravidade do quadro clínico e nas condições locais de trabalho para a assistência e cuidados, considerando que o atraso no tratamento pode acarretar danos irreversíveis ao sistema reprodutor feminino (BRASIL, 2016e). De acordo com o protocolo do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o tratamento ambulatorial deve ser oferecido às mulheres que apresentam quadro clínico leve e exame abdominal e ginecológico sem sinais de pelviperitonite. Os critérios para indicação do tratamento hospitalar de DIP são os seguintes: • abscesso tubo‑ovariano; • gravidez; • ausência de resposta clínica após 72 horas do início do tratamento com antibioticoterapia oral; • intolerância a antibióticos orais ou dificuldade para seguimento ambulatorial; • estado geral grave, com náuseas, vômitos e febre; • dificuldade em exclusão de emergência cirúrgica (exemplos: apendicite, gravidez ectópica). É importante mencionar que, segundo o protocolo do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), as parcerias sexuais dos últimos dois meses, sintomáticas ou não, devem ser tratadas empiricamente contra N. gonorrhoeae e C. trachomatis. A educação em saúde é fundamental para o tratamento efetivo da DIP. Nesse sentido, Lowdermilk (2012) recomenda que o enfermeiro deve: • orientar as mulheres sobre a natureza da doença; • incentivar a adesão a todas as recomendações da terapia, enfatizando a necessidade de ingerir todos os medicamentos, mesmo quando os sintomas desapareceram; • aconselhar a abstinência das relações sexuais até o final do tratamento; • oferecer aconselhamento contraceptivo; • aconselhar a utilização de preservativo durante a relação sexual; 73 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER • desaconselhar a utilização do DIU como método contraceptivo para as mulheres com história de DIP. Em função da relação entre a DIP e a sexualidade, a imagem corporal e o autoconceito, a mulher diagnosticada com a doença pode necessitar de apoio psicológico, por isso a referência a um grupo de apoio ou para o acompanhamento psicológico pode ser apropriada (LOWDERMILK, 2012). A figura a seguir apresenta o manejo adequado para a DIP conforme protocolo do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e). Anamnese e exame ginecológico (toque vaginal e exame especular) Queixa de desconforto abdominal ou dor pélvica Diagnóstico clínico de DIP? Indicação de internação hospitalar? Houve melhora em três dias? Sangramento vaginal ou atraso menstrural ou parto/ aborto recente? Quadro abdominal grave; defesa muscular ou dor à palpação ou T axilar > 37,5 ºC ou T oral > 38,3 ºC? Coleta de material para Gonococo clamídia, tricomonas e vaginose bacteriana, se disponível iniciar tratamento ambulatorial agendar retorno em três dias Investigar outras causas Referenciar Manter conduta Enfatizar adesão ao tratamento Critérios maiores dor no hipogástrio dor à palpação dos anexos dor à mobilização de colo uterino Critérios menores Temperatura axilar > 37,5 ºC ou > 38,3 ºC Conteúdo vaginal ou secreção endocervical anormal Massa pélvica Mais de cinco leucócitos por campo de imersão em material de endocervice Leucositose em sangue periférico Proteína C reativa ou velocidade de hemossedimentação (VHS) elevada Comprovação laboratorial de infecção cervical pelo gonococo, clamídia ou micoplasmas Critérios elaborados Evidência histopatológica de endometrite Presença de absceno tubo‑ovariano ou de fundo de saco de Douglas em estudo de imagem Laparoscopia com evidência de DIP Não Não Não Não Não Sim Sim Sim Sim Sim Figura 22 – Manejo da DIP com uso de fluxograma 74 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II Lembrete Para a confirmação clínica de DIP, é necessária a presença de três critérios maiores mais um critério menor ou um critério elaborado. 5.12 Papilomavírus humano O papilomavírus humano (HPV), também conhecido como condiloma acuminado ou verrugas anogenitais, é uma das IST virais mais frequentesno mundo (LOWDERMILK, 2012; BRASIL, 2016e). O risco estimado para a exposição a essa infecção é de 15% a 25% a cada nova parceria sexual. Em grande parte dos casos, a infecção é autolimitada e transitória, sem causar qualquer dano. A maioria das pessoas que entram em contato com o vírus pode nunca ter o diagnóstico da infecção se não desenvolver lesões clínicas e não realizar testes laboratoriais (BRASIL, 2016e). Cerca de 1% a 2% da população apresenta verrugas genitais e 2% a 5% das mulheres apresentam alterações no exame de citologia oncótica do colo do útero em função da infecção pelo HPV. A prevalência é maior em mulheres jovens, quando comparadas às mulheres com mais de 30 anos de idade (BRASIL, 2016e). O HPV está relacionado ao câncer cervical em aproximadamente 100% dos casos, com menor percentual de participação nos casos de câncer em outros locais: 85% de ânus, 40% de vulva, 70% de vagina, 50% de pênis, 35% de orofaringe, 10% de laringe e 23% de boca (BRASIL, 2016e). De acordo com os dados do Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o tempo médio entre a infecção pelo HPV de alto risco e o desenvolvimento do câncer cervical é de aproximadamente 20 anos, de acordo com o tipo, a carga e a capacidade de persistência viral e o estado imunológico da mulher. O HPV é um DNA‑vírus não cultivável da família do Papovavirus que pode induzir uma grande variedade de lesões proliferativas na região anogenital. Atualmente, existem mais de 200 tipos de HPV descritos na literatura, dos quais cerca de 40 tipos infectam o trato anogenital e, no mínimo, 20 subtipos estão associados ao carcinoma do colo uterino (BRASIL, 2013b; 2016e). De acordo com o risco oncogênico e o tipo de lesão, os tipos de HPV que infectam o trato genital são divididos em dois grupos (BRASIL, 2016e): • Baixo risco oncogênico: detectados em lesões anogenitais benignas e lesões intraepiteliais de baixo grau. Tipos 6, 11, 40, 42, 43, 44, 54, 61, 70, 72, 81 e CP6108. • Alto risco oncogênico: detectados em lesões intraepiteliais de alto grau e, especialmente, nos carcinomas. Tipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59, 68, 73 e 82. A maioria das infecções por HPV é assintomática ou não aparente. A infecção pelo HPV, tanto no homem como na mulher, tem sido descrita sob três formas de apresentação: latente, subclínica e clínica. 75 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER A apresentação latente ocorre quando as pessoas infectadas por HPV não desenvolvem qualquer lesão. Essa condição pode permanecer durante toda a vida. Apenas algumas pessoas podem, anos mais tarde, expressar a doença com condilomas ou alterações celulares do colo uterino. Nessa situação, não existe manifestação clínica, citológica ou histológica, apenas podendo a infecção ser demonstrada por meio de exames de biologia molecular (detecção do DNA viral). A apresentação subclínica (lesão subclínica) ocorre quando as microlesões pelo HPV são diagnosticadas por meio de exame de colpocitologia oncótica e/ou colposcopia (lesões acetobrancas), com ou sem biópsia. A lesão intraepitelial escamosa de baixo ou alto risco é detectada com mais frequência. A apresentação clínica (lesão macroscópica) é conhecida como verruga genital ou condiloma acuminado. Manifesta‑se pela presença de lesões exofíticas, com superfície granulosa, únicas ou múltiplas, restritas ou disseminadas, da cor da pele, eritematosas ou hiperpigmentadas e de tamanho variável. As lesões maiores assemelham‑se a “couve‑flor” e as menores possuem aparência de pápula ou placa, podendo também ter aspecto filiforme, sendo, geralmente, resultantes de infecção por tipos não oncogênicos do HPV (BRASIL, 2016e). Dependendo do tamanho e localização anatômica, as lesões podem ser dolorosas, friáveis e/ ou pruriginosas. Na mulher, encontram‑se na vulva, períneo, região perianal, vagina e colo. No homem, localizam‑se na glande, sulco balanoprepucial e região perianal. Com menos frequência, as verrugas podem estar presentes em áreas extragenitais, como conjuntivas e mucosa nasal, oral e laríngea (BRASIL, 2016e). A transmissão do HPV ocorre, geralmente, por contato direto, podendo haver autoinoculação e infecção por fômites. O período de incubação é de um a 20 meses, com média de três meses. O período de transmissibilidade é desconhecido, no entanto, existe transmissão do vírus enquanto houver lesão viável (BRASIL, 2013b). Conforme preconiza o Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e), o diagnóstico do condiloma acuminado deve ser clínico, podendo ser confirmado por meio da biópsia. Entre as técnicas utilizadas para o diagnóstico das lesões anogenitais induzidas por HPV, o referido Ministério recomenda a realização dos seguintes exames: colpocitologia oncótica de colo uterino, citologia oncótica anal, colposcopia, anuscopia e histopatologia. Rotineiramente, não é recomendável a triagem de infecção subclínica pelo HPV. O Ministério da Saúde (BRASIL, 2016e) indica a biópsia de lesões anogenitais sugestivas de HPV nos seguintes casos: • existência de dúvida no diagnóstico da lesão anogenital; • presença de lesão suspeita de neoplasia (lesões pigmentadas, endurecidas, fixas ou ulceradas); • ausência de resposta ao tratamento convencional; 76 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 Unidade II • aumento das lesões durante o tratamento; • pacientes com imunodeficiência (HIV, uso de drogas imunossupressoras, corticoides, entre outros). O principal objetivo do tratamento das lesões anogenitais induzidas pelo HPV é a remoção das lesões clínicas. No entanto, nenhuma evidência indica que os tratamentos disponíveis erradicam ou afetam a história natural da infecção do HPV. O tratamento deve ser individualizado, considerando o tamanho, a morfologia, o número e o local das lesões. Além disso, deve‑se avaliar o perfil imunológico das pessoas. A figura a seguir apresenta o resumo do manejo clínico das verrugas anogenitais, baseado na morfologia e distribuição das lesões anogenitais (BRASIL, 2016e): Excisão cirúrgica Eletrocautério Em sessão única? Informação/educação em saúde Oferta de preservativos e gel lubrificante Oferta de testes HIV e demais IST (sífilis, hepatite B, gonorreia e clamídia), quando disponíveis Ênfase na adesão do tratamento Vacinação para HBV e HPV, conforme estabelecido Oferta de profilaxia pós‑exposição para o HIV, quando indicado Oferta de profilaxia pós‑exposição às IST em violência sexual Notificação do caso, conforme estabelecido Comunicação, diagnóstico e tratamento das parcerias sexuais (mesmo que assintomáticas) Úlcera genital presente Anamnese e exame físico Tratamento na unidade de saúde Não Sim Em múltiplas sessões: ATA70‑90% ou Podofilina 0,5% ou crioterapia Em circunstâncias especiais: Doença disseminada Grandes volumes Grávidas Imunossuprimidos Crianças Referenciar ao especialista Figura 23 – Manejo clínico das verrugas anogenitais com uso de fluxograma As opções terapêuticas para o tratamento das lesões anogenitais induzidas pelo HPV incluem (BRASIL, 2016e): • Podofilina a 10%‑25% (solução): contém uma série de substâncias com ação antimitótica. É contraindicada na gestação. 77 Re vi sã o: L uc as - D ia gr am aç ão : J ef fe rs on - 0 4/ 12 /1 7 POLÍTICAS DE ATENÇÃO À SAÚDE DA MULHER • Ácido tricloroacético (ATA) a 80%‑90% (solução): é um agente cáustico que promove destruição dos condilomas pela coagulação química de seu conteúdo proteico. • Eletrocauterização: utiliza um eletrocautério para remover lesões isoladas. Exige equipamento específico e anestesia local. • Crioterapia: promove a destruição térmica por meio de equipamentos específicos resfriados (nitrogênio líquido ou CO2), eliminando as verrugas por citólise térmica. • Exérese cirúrgica: método apropriado para o tratamento de poucas lesões, quando é desejável exame histopatológico do
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