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SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020ANO 100 ┆ Nº 33.297 R$ 5,00 D E S D E 1 9 2 1 UM J O R NA L A S E RV I Ç O D O B R A S I L Polícia letalSem justiça, sempaz Sobre alta de mortes por forçasdoEstadonoBrasil. Acerca de manifestações que sacodemosEUA. EDITORIAISA2 AUDIÊNCIA/MÊS PÁGINAS VISTAS 428.386.671 VISITANTES ÚNICOS 73.786.377 ISSN 1414-5723 9 771414 572025 33297 folhainvest A12 Metade dos contribuintes ainda não declarou o Imposto de Renda Ilustrada B7 Em entrevista para filme, Aldir Blanc diz como verteu cenas da vida em canções Catarina Pignato Mathias Alencastro Comprotestos, EUA vivem o seu junho de 2013 MundoA9 Thiago Amparo Negros buscam liberdade que não nos foi dada MundoA9 Manifestos por democracia buscamunião dasDiretas Já Movimentos tentam agrupar adversários ideológicos contra um inimigo comum, o autoritarismo Após ataques dopresiden- te JairBolsonaroa institui- ções, manifestos em favor dademocraciatomaramas redessociaiseosjornaisnos últimos dias, buscando re- criarumclimadeDiretasJá. Se a comparação com o movimento de 1984 ainda pode soarumtantoexage- rada,háumparaleloeviden- teentreosdoismomentos. Oprincipal,auniãodead- versáriosideológicoscontra uminimigocomum,oauto- ritarismo.Emgeral nãohá defesa explícita do afasta- mento dopresidente. Amaior iniciativaéoMo- vimento Estamos Juntos, lançadoanteontem.Arreba- nhou8.000assinaturaspor horaereunianestedomin- gomais de 150mil nomes. Ontem surgiu outro ma- nifesto,voltadoaomeioju- rídico.ComotítulodeBas- ta!, reúnecercade720pro- fissionais dodireito. Houve mais posiciona- mentos,comoodoColégio dePresidentesdeTribunais de Justiça, que defendeu o SupremoTribunalFederal. Outro, assinado por 535 nomesdoMinistérioPúbli- coFederal, querqueopro- curador-geralsaianecessa- riamente da lista tríplice. Tambémhouvemanifes- tos de caráter setorial, em áreascomomeioambiente e relações exteriores. A última pesquisa Data- folhamostrouque43%dos brasileiros consideram o governo ruim ou péssimo, recordena gestão. Poder A4 Atos contra racismo nos EUA têm repressão e barbárie Osprotestospelamortede George Floyd, homem ne- gro cujo pescoço foi pren- sadonochãopelojoelhode umpolicialbranco, jásees- palharamporaomenos75 cidadesdosEUA.Noquinto diaconsecutivodeatosan- tirracistas, toquesde reco- lherforamignorados,eare- pressãopolicialaumentou. As manifestações deixa- ramquatromortoseaome- nos 1.700 presos. Há regis- trosdecarroseviaturas in- cendiados,saqueseespan- camentos.Osatos,queche- garam a Berlim e Londres, sãomarcadosporgritosde “nãoconsigorespirar”,frase repetidaporFloydenquan- to era sufocado.MundoA8 Celso deMello compara país à Alemanha de Adolf Hitler Em mensagem a minis- trosdoSTF,omagistrado dizqueaintervençãomili- tar,comodefendemapoi- adoresdopresidente, na- damais é senão a instau- raçãodeuma“abjetadita- dura”.Aoversimilaridade entre o país atual e a Ale- manhasobHitler, odeca- nodizserprecisoresistirà “destruiçãodaordemde- mocrática”. Poder A6 Mortes por coronavírus podem ser 140%maiores Dados do próprio Minis- tériodaSaúde, tabulados pelaFolha, indicamqueo Brasil teve,atéabril,9.420 mortes a mais causadas pelaCovid-19doqueoto- tal divulgado à época. EmSãoPaulo, os sepul- tamentos na cidade au- mentam desde janeiro e subiram50%emabril em relaçãoa2019. SaúdeB1 eB2 Grupo armado de extrema direita pró-Bolsonaro realiza protesto em frente ao STF Wallace Martins/Futura Press/Folhapress Ato pró-democracia de torcidas de futebol termina em confronto comPMs e apoiadores de Bolsonaro na av. Paulista, em São Paulo Eduardo Knapp/Folhapress Manifestante tenta impedir passagemde policiais em ato perto da Casa Branca Eric Thayer/Reuters Protesto político de torcidas acaba em confronto em SP Integrantesdetorcidasde futebol de clubes de São Pauloprotagonizaramato pró-democraciaontemna avenida Paulista. De iní- cio pacífico, terminaram emconfrontocomaPMe apoiadoresdeBolsonaro. Em Brasília, um grupo armado de extrema di- reita protestou em frente aoSTF.EsporteB11 ePoderA6 MuhammadYunus ENTREVISTA DA 2ª Pandemia tirou o mundo de rota econômica suicida A11 Começa hoje processo de reabertura da economia em SP B3 52% são contra presença demilitares no governoA7 a eee opinião A2 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 UM JORNAL A S ERV I ÇO DO BRAS I L a Publicado desde 1921 – Propriedade da Empresa Folha daManhã S.A. presidente Luiz Frias diretor de redação Sérgio Dávila superintendentes Antonio Manuel Teixeira Mendes e Judith Brito conselho editorial Rogério Cezar de Cerqueira Leite, Marcelo Coelho, Ana Estela de Sousa Pinto, Cláudia Collucci, Hélio Schwartsman, Mônica Bergamo, Patrícia Campos Mello, Suzana Singer, Vinicius Mota, Antonio Manuel Teixeira Mendes, Luiz Frias e Sérgio Dávila (secretário) diretoria-executiva Marcelo Benez (comercial), Marcelo Machado Gonçalves (financeiro) e Eduardo Alcaro (planejamento e novos negócios) editoriais@grupofolha.com.br EDITORIAIS Sem justiça, sempaz Polícia letal Asmanifestaçõesqueeclodemnos EUA, motivadas pelo assassinato do cidadão negro George Floyd porumpolicial branco,na cidade de Minneapolis, parecem trans- cender, em sua extensão e em al- gumas características, os contor- nosdeprotestosanteriorescontra o racismonaquele país. A brutalidade física e simbóli- cadacenanaqualoagenteDerek Chauvin sufoca como joelho, por 9minutos,umapessoaqueestava sobcontroleedizianãotercondi- çõesderespirardespertourevolta entre americanos de todas as co- lorações raciais —e catalisou um sentimento latente de exaustão e descontentamentonopaís. Aimediataocupaçãodasruaspor parte de manifestantes sem uma coordenação centralizada discer- nível fez lembrar os movimentos queirromperamnoChileeemou- tros países da região em 2019. O slogan “De quem é a rua? A ruaénossa”, repetidonosEstados Unidos, revelaumaíndoleatécer- topontoanálogaadeseusequiva- lentes latino-americanos. A covardiamonstruosa do poli- cial eadesproporçãodaforçapor eleutilizadatalveztenhamencena- dotambémodramadasdesigual- dadespresentesemumasocieda- de que, opulenta em sua econo- mia, vem se tornando crescente- menteiníquanasúltimasdécadas. Comosetornoucomumempro- testoscontemporâneos,orecurso aatosviolentos,quenãorarodes- cambamparaovandalismoconde- nável e politicamente ineficaz, se fez presente nas demonstrações, em contraste com a linha pacifis- ta consagrada porMartin Luther King, o campeão da luta pelos di- reitos civis e denegros. Os tempos sãooutros todavia, e é inegávelque,desdeaquelascon- quistasbasilaresdadécadade1960, a violênciapolicial contraapopu- lação negra —e também latina, cumpre lembrar—jamais cessou. Quantoaesseaspecto,reabre-se nosEUAodebateacercadosmeca- nismos legais de institucionaliza- ção de tal truculência—a doutri- na da “imunidadequalificada”, há anos sistematizada em decisões da Suprema Corte, que torna ex- tremamente difícil levar a termo tentativas de condenar judicial- mente agentes das polícias. Trata-se da versão norte-ame- ricana para um tipo de proteção aosexcessosquenoBrasilganhou o nome de “excludente de ilicitu- de”, dispositivo proposto sem su- cessoempacote legislativodoex- ministro da Justiça SergioMoro. Ofatodequeessaassimchama- da“autorizaçãoparamatar”tenha sidorejeitadapeloCongressonão deixa, infelizmente, o Brasil em melhorsituação.Aqui,comleisou semleis,banalizou-se,empropor- çõesdramáticas,arotinadabruta- lidadepolicial impunesobreaspo- pulaçõespobres enegras.Ospro- testosda sociedade, emboraexis- tam, sãopontuais eminoritários. Nesse contexto, seria semdúvi- davaliosoparaosdoispaísesrefle- tiremsobreumoutrosloganado- tado pelos manifestantes ameri- canos: “Sem justiça, não há paz” (“No justice, no peace”). Seaindapairavadúvidasobreoca- ráterendêmicodaviolênciapolicial noBrasil,nãodeveriapairarmais. Emmeioàpandemia,SãoPauloe Rio de Janeiro quebram recordes históricosdemortesporpoliciais. Já elevada para qualquer parâ- metroquenão sejaodabarbárie, amaiorletalidadepolicialnoinício desteanoverificadanosdoisesta- dos contrasta, ainda mais, com a quedade outros crimes. Entrejaneiroemarçodesteano, aPolíciaMilitarpaulistamatou255 pessoasemsupostassituaçõesde confronto,umaumentode23%em relaçãoaomesmoperíododoano passado,segundodadosdaSecre- taria da Segurança Pública. Tendênciasimilar,emboramais letal, se vê noRio. Dados do Insti- tutodeSegurançaPública(ISP)re- gistraramumaumentode43%nas mortes por policiais fluminenses nomêsde abril, com 177 vítimas. Cumpre lembrar que são eleva- ções em índices já, hámuito tem- po, inaceitáveis. A título de com- paração, 1.011pessoas forammor- taspelapolíciadosEstadosUnidos noanopassado,segundolevanta- mentodojornalWashingtonPost. Guardadas as devidas propor- ções, apenas no Rio o número de mortosdomesmomodoem 2019 foi de 1.810, recorde desde 1998. Por trás destes números jazem vidas perdidas, em grande parte de jovens negros, contra os quais brutalidade é a regra, não a exce- ção.Contaram-semaisde70mar- casdeprojéteisnacasaonde João Pedro Matos Pinto, 14, foi morto pelas costas em São Gonçalo, re- giãometropolitana doRio. Aaltadaletalidadepolicialcami- nha na contramão da queda dos índices de criminalidade ante do mesmo período do ano passado, antes da pandemia. NoRJ, os homicídios dolosos ti- veram redução de 14%emabril, e roubos de ruadespencaram64%. Emboraonúmerodeassassinatos tenha tido leve alta em São Paulo (3,4%),oscrimespatrimoniaiscaí- ram, emmédia, pelametade. Injustificadasobqualquerparâ- metro civilizado, a letalidade das forças de segurança no Brasil ca- rece aindamais de razões emum cenárioderuasvazias.Paraexpli- ca-la, resta apenas a combinação dedescontrole com impunidade. Protestos contra truculência policial nos Estados Unidos levantam questões que valem para o Brasil sãopaulo Nãovaitergolpe,masvai ter jogo.Eotimedosbrucutus,que decertoprefeririaogolpe,começou ajogarfazumtempinhocomaenor- mevantagemdeestarsentadonaes- trepitosamáquinadoExecutivo fe- deral.Eisoqueparecehojeoteatro de operações dapolítica nacional. Nesse tabuleiro, ameaçar com as baionetas,mesmoquandoelasnão passamdepeçasdecorativasquealu- demaumpassadoobtuso,trazbene- fíciosmenoresparaogruponopo- der.Hipnotiza,comaromaartificial depólvora,aturmadatestosterona etalvez intimidealgumadversário. Mas a retórica do arreganhopro- duzseumaiorefeito,paraosituaci- onismo, quando levamuitas forças quepoderiamestartrabalhandona concretudedapolíticapara isolare enfraquecer o bolsonarismo a pre- ocupar-se mais com a preservação doenquadramentodoregimeeme- noscomoqueocorreemseumiolo. Talvez não haja escapatória para osdemocratas.Nonossopresiden- cialismo, o chefe eleito do Executi- vo, mesmo fraco como Jair Bolso- naro,detémomonopóliodomega- fonenacional, e issodesdesempre. Se ele aponta para os quartéis, é inescapávelpreocupar-se comisso. Saibamtodos,noentanto,queogo- vernoBolsonaromudouquando,há algunsmeses,viuqueseaproximava adegolado impeachment.Ele ago- ra opera emmodo dual. Enquanto grita “fogo!”, compra apoio parla- mentarnamoedadesempre.Eessa moeda funcionanonosso sistema. Se sobreviver até novembro, no- meará seu primeiro ministro para oSupremoTribunalFederal,omais duroecoesoobstáculoaodesvario bolsonaristaatéaqui.Emfevereiro, vai entrar com tudonadisputa das presidênciasdaCâmaraedoSenado. Casoofôlegodureatéjulhodoano que vem, mais um magistrado no STF. Equemsabe chegar a 2022 em condições dedisputar a reeleição. Esseéoprojetobolsonarista,que carrega o risco da deterioração do regime.Parabarrá-lo,osadversários precisamfazerpolítica.Manifestos não bastam. É arregaçar a manga, cooptarocentrãoemirar342votos. brasília Agrava-se a pandemia do coronavírus e Jair Bolsonaro não está preocupado. Agrava-se a crise políticaeopresidentedaRepública nãosecomportacomoquemdese- ja o seudistensionamento. Nãoseconstrangeemandaraca- valonaEsplanadaepasseardeheli- cópteroàscustasdodinheiropúblico para forjar cenas de apoio popular. Os lampejosdediálogoqueelesi- nalizanumdiaesvaem-seemsegui- daquandoprestigiaumprotestoan- tidemocrático.Maisumavez,Bolso- naro foi o protagonista de um ato anti-STFnaPraçadosTrêsPoderes. Aúnicapreocupaçãodopresiden- tehojeéestimularoimpassecomo Supremoporquesabequeotribunal podeseraorigemdesuaderrocada. Parecesemlógica,masnadaéme- lhor, na tática bolsonarista, do que desqualificaracortenomeiodojogo. Uminquéritoavançasobreainter- ferênciadopresidente,evidenciada pelos elementos notórios, em pe- ças de comandodaPolícia Federal. Outro fecha o cerco no “gabinete doódio” instaladonoPlanalto, sob atuteladeCarlosBolsonaro,o02.O TSEsurgenoxadrezcomopossibili- dadedecassaçãodachapaeleitoral. Ocompartilhamentodoinquérito das fakenews comacorte eleitoral podemuniciarações sobreofinan- ciamentoda vitória deBolsonaro. Umprocessode impeachmentfi- ca pendurado na temperatura do Congresso.Para seproteger,Bolso- naroabriuobalcãodenegócioscom ospolíticosfisiológicosdocentrão. Semcompromissocomopaís,es- segrupodepartidosabraçouetraiu DilmaRousseff.Bolsonaronãotem muita alternativaporqueo Judiciá- rio nãodará trégua a ele. Cresce ummovimento de procu- radoresincomodadoscomoalinha- mentodeAugustoArasaoPlanalto. OchefedaPGRvai serpressiona- do internamenteanãoengavetaro volumedecomplicaçõesdogoverno. Asociedadesemobilizacomabai- xo-assinadoseoutrasmanifestações. Também contra o governo vê-se até omilagre (provavelmente bem efêmero) de torcidas organizadas de futebol rivais lado a lado. riode janeiro Omundopós-pande- mia serádiferente—quantas vezes você não leu ou ouviu isso nos últi- mosdias?Mas ahistória do serhu- mano é a de sua eterna adaptação ao novo, seja ótimo ou horrível. O mundo pós-internet também é di- ferentee jáháumageraçãoquenão conheceoutro.Nósmesmos,maio- resde200anos,malnoslembramos de quando ainda passávamos tele- gramas.Para issotínhamosdeirao correioecomporumtexto“telegrá- fico”—curto, seco, terminandoem “Abracos”—, que um funcionário, o telegrafista,“escrevia”numamaqui- ninhaquefaziatec-tec,tecsestesre- presentandoospontosetraçosque formavamcadaletradamensagem. Todas as artes chegarão afetadas ao pós-vírus, em particular o cine- ma.Eleperderásuacondiçãodeúni- co veículo de fruição coletiva e de massa—justo o que o tornou, des- de sempre, diferente. Em meados dos anos40, por exemplo, coma 2ª Guerra e tudo, 100milhões de pes- soasporsemanaiamaocinemanos EUAeoutras tantasnoplaneta. Sa- laspara3.000pessoaseramcomuns, enadacomoumcinema lotadopa- rapotencializaraapreciaçãodeum drama, um filme de ação e, princi- palmente, uma comédia. Se há tempos isso já era impossí- vel, agora será impensável. As salas terãosuacapacidadelimitadaa25%, comosgatospingadosadoismetros um do outro. Os drive-ins, com só uma ou duas pessoas em cada car- ro, não serão solução. Ir ao cinema serápoucomelhordoqueassistir a umfilmeemcasa,pelaTV,pelovídeo oupelostreaming—oque,mesmoa dois,equivaleaumesportesolitário. Mas o ser humano se acostuma. Há muito que “West Side Story”, “Lawrence daArábia” e outrosmo- numentos, feitosparatelasmaiores doqueavida,mudaram-separa te- linhasde 20polegadas. Seusheróis ficaramdo tamanhodeumapulga, e nos adaptamos. O cinema talvez fosse maior do que a vida. Mas a vida o encolheu às suas dimensões. Não vai ter golpe, vai ter jogo Bolsonaro busca impasse comSTF Ex-maior do que a vida - Vinicius Mota - Leandro Colon - Ruy Castro No início do governo Bolso- naro, apresentei duas conje- turas sobre o STF. A primeira era que o seu suposto hiper- protagonismo ainda estava por vir, porque era em larga medidaepifenômenodaagen- dadogovernoedeeventosex- ternos(escândalosdecorrup- ção etc.). A previsão feita foi que “o STF terá enorme pro- tagonismonogovernoBolso- naro. Será o ator com efetivo poder de veto sobre a agenda iliberal do governo: contrari- ando iniciativas na área com- portamental e de segurança públicaecoibindoabusosevi- olaçõesdaseparaçãodePode- res. Essas pautas do governo encontrarãoumavirtualuna- nimidadeantagônicanoSTF”. Emoutras palavras, assisti- ríamosàcontençãodaagenda iliberal do governo, além do queHirshlchamoude“judicia- lizaçãodamegapolítica”,eque caracterizaassupremascortes nasdemocraciasatuais.Tería-mosassimumanormalização de nossa suprema corte. Sob Bolsonaro, comofimdapola- rização causada pela atuação do STF como corte criminal, ascríticasaohiperprotagonis- mosofreramradical inversão, mudandode sinal ideológico. OpoderdevetodoSTFmani- festa-seemvárias frentes(MP comrestriçãoàLeideAcessoà Informação,nomeaçãodeAle- xandre Ramagem para o co- mandodaPolícia Federal, au- tonomiadosestadosemunicí- piosnapandemia)eemtemas centrais para o governo e sua agenda(equiparaçãodahomo- fobiaecrimederacismoetc.). A segunda conjetura quefiz era que “a era das dissensões parecerá a umobservador do futuroterficadonopassado:a corteatuarácoesapelomenos até a nomeação dos substitu- tos deCelso deMello eMarco Aurélio”.Arigornãohánenhu- ma surpresa na virtual comu- nalidade de posições dos mi- nistros Luís Roberto Barroso e GilmarMendes nomomen- to.Semconflitosnaagendade atuação como corte criminal, e com razoável consenso na área comportamental, o dis- sensoéresidual:envolveques- tõesnormaisdeinterpretação constitucional.Oativismopro- cessual torna-se inócuo. Teri- amas 11 ilhasdado lugar aum só continente? Contraintuitivamente, o in- quérito das fake news é ele- mento dissonante do quadro deatuaçãodoSTFnogoverno Bolsonaro,porquedizrespeito àprópriacorte,nãodiretamen- teàcontençãodoExecutivoou questões comportamentais. Ele foi instauradoapósdeci- sões impopularesdoSupremo sobrecrimeseleitorais, fundo partidárioeprisãoemsegun- da instância. A reação do ministro Dias Toffolienvolveutambémoin- cidente coma revista Crusoé, em abril do mesmo ano, em meio a grande controvérsia. Seu desenlace —revogação da censura— foi favorável à corte. Não haverá solução fá- cil desta vez. Onze ilhas ou continente? - Marcus André Melo Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante da Universidade Yale. Escreve às segundas João Montanaro Só descontrole e impunidade explicam alta de mortes por ação do Estado durante a pandemia a eee opinião SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A3 Ato pró-democracia “Ato de torcedores a favor da de- mocracia acaba em confronto na Paulista” (Poder, 31/5). Até quan- do a polícia vai protegermanifes- taçõesgolpistasaomesmotempo emquereprimeatospró-democra- cia?Dequeadiantagovernadores repudiarempublicamenteasfalas doBolsonarosepermitemepatro- cinamosataquesàsinstituiçõesda Repúblicapelosfascistas?Issotem umnome: hipocrisia. Eduardo de Castro (Porto Alegre, RS) * Assisti a todas as imagens da Glo- bo,daBandedaCNN.Emnenhum momentoviastorcidaspelademo- craciacombarrasdeferro,coque- téis molotov ou depredando pro- priedadepúblicaouprivada.Gen- tepacífica,querendoprotestarem prol da democracia. Jogaram pe- dras depois que foram atacados por bombaspela PolíciaMilitar. José Roberto Gomes Rocha (Aracaju, SE) * Saberqueagrandemaioriadapo- pulação é anti-Bolsonaro é tudoo queBolsonaronãoprecisavaneste momento.Derrotar o racismoeo fascismonopaíséderrotarBolso- naroeseusapoiadores.Assimserá. Michael dos Santos Gomes (Campinas, SP) * “Confusão com torcidas é tudo o que Bolsonaro queria neste mo- mento” (Poder, 31/5). Geralmente gosto do que IgorGielowescreve. Maspensoque jáerahoradeuma reação, e quando ela vem unindo torcidas de Corinthians e Palmei- ras, vejo, ao contrário do colunis- ta, um futuro sombrio para omi- liciano instaladonaPresidência. Edgard Alexandre Júnior (São Paulo, SP) * Faltouoarticulistaanalisaracon- dutahistóricadaPM.Emdiversos finaisdesemanavimosbolsonaris- tasagredindoatémédicosemfren- teahospitaisouemBrasília.APM nadafez.Quandoumgrupodetor- cida organizada aparece, após se- manasdeprovocações,eleétacha- do de grupo dematizes violentas no textoemquestão.Poisbem,as torcidasabrirãomãodo“inimigo” tradicional para semanifestarem juntas pela democracia. Pedro Guilherme de Andrade (São Paulo, SP) * Sim, senhores, foi dada a largada paraaguerracivil.Nasemanaque vemteremoscenasdeselvageria.O presidentequeraconvulsãosocial para justificara intervenção.Que- roverdequeladoasForçasArma- das vãoficar. Roberto Carlos Leandro Soares (Manaus, AM) Liberdade de expressão Após ler o editorial “Liberdadede expressão”(Opinião,31/5)eosco- mentáriosdeleitores,percebiaau- sênciademençãoao fatodequea LeideSegurançaNacional tipifica comocrimes condutas que visam derrubar o Estado democrático de Direito, comomanifestações a favor de um novo AI-5. Aquela lei nãovaleapenaspara“comunistas”. Éprecisoaplicá-la imediatamente emdefesadaordemdemocrática. Sadi Medeiros Júnior (Florianópolis, SC) Autoritarismo AentrevistacomoadvogadoAlber- to Toron (“Autoritarismo de Bol- sonaroé legadodaOperaçãoLava Jato”, Poder, 31/5) é deslumbrante porsualucidez,docomeçoaofim. Docomeço,quandodeclarasentir um“cheirodegolpenoar”.Aofim, quandoexplicaademoradeRodri- goMaiaemdesencadearoproces- sode impedimentodeBolsonaro: condições jurídicas existem, mas faltam condições políticas, expli- ca. Só não entendi a afirmaçãode que “autoritarismo de Bolsonaro é legadodaOperaçãoLavaJato”.O autoritarismodeBolsonaroémui- toantigo,fazpartedesuapersona- lidade.Não foiprecisoaLava Jato. Gilberto deMello Kujawski (São Paulo, SP) Milico-democracia ExcelenteoartigodeJoaquimFal- cão (“Militar da ativa e militar da reserva”, “Tendências / Debates”, 31/5)! Chegamos à conclusão de que,mais umavez, o jeitinhobra- sileirosefazpresente,agoranapo- lítica. Está sendo criada uma for- ma paradoxal de governo: a Dita- duraMilitarDemocrática. Roberto Cecil Vaz de Carvalho (Araraquara, SP) Polícia “Empresário acusado por violên- cia doméstica humilhaPMemAl- phaville”(Cotidiano,31/5).Queesse atendimentodaPMsejapreserva- doparafuturascomparaçõescom o procedimento de policiais que são contestados nas abordagens. Já vi muito cidadão tomando ta- pa na cara apenas por não ter en- tendidoumaperguntadopolicial. Rubens Rafael Júnior (São Bernardo do Campo, SP) * Apolícia deMinneapolis tem “ex- cludente de ilicitude”? João PauloMendes Parreira (São Caetano do Sul, SP) * Quando o mundo atravessa uma catástrofe,doisfatosdemonstram queestasituaçãonãoensinounada aalguns.NosEUA,GeorgeFloydfoi asfixiadoporumpolicialpornove minutos,enquantoimploravapor “ar”. NoBrasil, JoãoPedro, 14, per- deu a vida porque um policial o alvejoupelas costas. Exemplosde brutalidade.Hámuitoaaprender. Bruno Karaoglan Oliva (Santos, SP) Grupo dos 300 Entendoque aFolha, emparticu- lar, e amídia, emgeral, devampa- rardechamarafanáticabolsonaris- taSaraFernandaGirominide “Sa- ra Winter”. Isso a empodera e lhe dá destaque, bem como aomovi- mentoantidemocraticodequeela fazparte.Elaadotouessepseudô- nimopropositalmente:vemdeSa- rahWinter,defensoranazistabritâ- nica ativa nas décadas de 1920-30. Chamem-na pelo nome de batis- mo,assimdeixarãodefazerojogo da turba antidemocrática. Bolívar Arsênio Silva (São Paulo, SP) Fake news Éincoerentesustentarqueoinqué- rito das fake news precisa prosse- guir mesmo sendo teratogênico, comofazoeditorial “Livreexpres- são” (Opinião, 31/5). Há, no orde- namento jurídico brasileiro, mei- osadequadosparaaapuraçãodos supostos crimes, situação que re- vela o absurdo do apelo a mons- truosidades jurídicas. João Paulo Zizas (São Bernardo do Campo, SP) Pássaros migratórios Maravilhosa a reportagem na Fo- lha Corrida de 31/5. Muito inte- ressante o comportamento des- sas avesmigratórias. Mostra a sa- bedoriaquehánomundoanimal. E alémde tudo as aves são lindas. Marcos Fernandes de Carvalho (São Paulo, SP) Publicidade Inconveniente a publicidade, em página inteira, da manifestação de um pastor da Igreja Maranata neste domingo (31/5). Sou cristã, de outra vertente, mas me senti agredida pela exaltação de cren- ças religiosas em um veículo co- mo a Folha, sempre tão preocu- padaemvalorizar a ciência e a ra- zão.Nãoeranecessário.Ficaclara aposturado“pagou, levou”.Prefe- riria que o jornal mantivesse sua postura isenta, mesmo diante da oferta de pagamento. Ana Paula deMattos Freire (Belo Horizonte, MG) PAINELDO LEITOR folha.com/paineldoleitor leitor@grupofolha.com.br Cartas para al. Barão de Limeira, 425, São Paulo, CEP 01202-900. A Folha se reservao direito de publicar trechos das mensagens. Informe seu nome completo e endereço TENDÊNCIAS/DEBATES folha.com/tendencias debates@grupofolha.com.br Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros emundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo Estamos em uma época difícil pa- ra tentar regular a desinformação. O medo da pandemia e a crise po- lítica deixam a população vulnerá- velaqualquertipodesoluçãomági- ca.O ideal seriaopaísdiscutir oas- sunto comprofundidade ematuri- dade,ponderandoentre terounão regulaçãoe,umavezdecidoaadotá- la,definirqual tipoderegulaçãoéo maisadequado.Issodeveriaserfeito emdebatecomaacademia,asocie- dadecivil eossetores interessados. Não é esse o caminho sinaliza- do pelo Congresso, que mostra ur- gência, agindo sob a crença de que umaleiacabarácomasnotícias fal- saseapaziguaráacrisepolítica.Es- sapressaéequivocada,porquedes- considera-sequeumadasrazõesda existênciadadesinformaçãoéade- mandadaspessoasporinformações com forte apelo emotivo, que con- firmemsuas visões. Seinevitável,qualquerpropostale- gislativa deveria conceituar doque se trata. Desinformação é um con- teúdocomprovadamentefalso,dis- seminado com o propósito e o po- tencial de causar danos. Desinfor- maçãonãoéanotíciaquevocênão gosta de ouvir, ou que acredita ser ofensiva.Nãoétambéma informa- çãoerrada, veiculada semodevido cuidado.Nãoéainformaçãoincom- pleta, pois cada veículo é soberano nadecisão dequal aspecto danotí- cia seater commaisprofundidade. Desinformação tambémnão éopi- nião ou interpretação—nem a sá- tira ou a paródia. Para se chegar a um conceito, é necessário perqui- rir simultaneamente sobre a natu- reza do conteúdo e amotivação de quemodivulga. Napropostaquecirculacommais forçanoCongresso,asempresasde internetsofrerãobloqueioseserão multadassenãoagiremcontracon- teúdos criados por seus usuários. Nessa proposta, delega-se às redes sociais e aos aplicativos demensa- gens a ingrata e impraticável tarefa debanir informações, oqueprova- velmente trará restrições a expres- sões legítimas. Aposta-se ainda na ideiade tornar lei oque já vemsen- do feito pelas empresas, o que en- gessasoluçõesfuturas.Apressades- prezaasoluçãoeuropeia,emqueas empresas se obrigam a códigos de conduta construídos por elasmes- mas em conjunto com a sociedade civil e as instituições. Ainda,sepassaaolargodeenfren- tarumverdadeirocomérciodefrau- des,comodisparosemmassae“cur- tidas”artificiais.Embuscadeaudi- ência,algumasempresas, semnem mesmosedarconta,anunciamem sitessensacionalistasecheiosdebo- atos.Umaabordagemdemocrática passaporconceituarotermoedis- tribuirdiferentesresponsabilidades para diferentes agentes, de acordo com o papel que cumprem, e não colocar as plataformas de internet para filtrarem conteúdo sem cri- vo claro e sob ameaçadebloqueio. Quem defende iniciativas ima- turas de combate à desinforma- ção, sob o argumento de proteger a democracia, precisa ser alerta- do que somente é possível prote- ger o que se tem, e que só se tem democracia com garantia à liber- dade de expressão. Esforços para combateradesinformaçãonãopo- dem estar desinformados. Nota dos autores: a expressão em inglês que corresponde à desinformação é deliberadamente omitida neste texto por ser utilizada por governantes para desacreditar a imprensa. Pandemia,crisepolíticaeeconômi- ca,desrespeitoàsinstituições,ame- aças à democracia. Nesta segunda- feira (1º), Dia da Imprensa, hámes- mooquecomemorarnoBrasil?Per- guntadifícil, commúltiplasrespos- tas.Noquetocaà imprensaépossí- vel responder sim e não. Primeiro, o sim. A mais importante lição da pandemia para o jornalismo brasi- leiro é o resgate de sua credibilida- depelopúblico.Emmeioatantade- sinformação—as famigeradas “fa- ke news”—, onde buscar informa- çãodequalidade,apuradacommé- todo e rigor? Nos veículos profissi- onais de mídia, como jornais, TVs, rádios e sites de notícias. Foi o que confirmaramduaspesquisas feitas emmarçode 2020. Realizado com 10mil pessoas em dez países, incluindo o Brasil, o le- vantamento da Edelman mostrou que 59% dos brasileiros (64% no mundo) buscam informações con- fiáveis sobre a pandemia nos mei- os de comunicação tradicionais. Já apesquisaDatafolha,queouviu1.558 pessoasnopaís,chegouàconclusão semelhante:61%dosentrevistados confiam nos programas jornalísti- cosdeTV;56%,emjornais;50%,em rádio;e38%,emsitesdenotícias. Já conteúdos que circulam por plata- formas comoWhatsApp e Facebo- ok só foram apontadas como con- fiáveis por 12%dos entrevistados. Esseéoladopositivodapandemia para a imprensa. E o negativo? É o agravamentodacrise sofridapelos veículos de mídia, cujo modelo de negócios tradicional vem fazendo águadesdeosurgimentodainternet, na segundametade dos anos 1990. Com a queda na receita de publici- dade, os meios têm tentado diver- sificar as fontesde renda, comoco- brarporassinaturasdigitaise fazer conteúdo customizado para anun- ciantes.Masnãotemsidosuficiente parasegurarosempregosnasReda- ções, que têmencolhidoanoaano. Comapandemia, o que se viu no mundo e no Brasil foram propos- tasdereduçãodejornadaesalários e demissões. Apoiados na MP 936, que criou o Programa Emergenci- aldeManutençãodoEmpregoeda Renda, com medidas trabalhistas alternativas durante a crise da Co- vid-19, veículos têmfeitoacordoou demitidofuncionários.Sobrecarre- gadospelacoberturaintensaepelos riscos à saúde, nemtodosos jorna- listastêmcolhidooslourosdoreco- nhecimentopúblicodeseutrabalho. Háaindaumsegundoaspectone- gativo,quesecontrapõeaoreconhe- cimentoconquistadodesdeoinício da crise sanitáriamundial. É opro- cessodedeslegitimaraimprensa,o jornalismoeosjornalistas.Quando autoridades públicas, como o pre- sidente Jair Bolsonaro, emilitantes políticosradicais investemcontraa mídia,desqualificandooseutraba- lhodeinformarasociedade,nãofa- zemmaisdoqueatacaromensagei- ro. Mas toda ação gera uma reação —oupelomenosdeveria.Cansados de ver seus profissionais agredidos verbalmente no cercadinho diante do Palácio do Alvorada por Bolso- naroeapoiadores, veículos tradici- onais, como Folha e Grupo Globo, tomaram uma decisão importante nodia25demaio:retiraramospro- fissionaisdolocalatéquesejagaran- tida a sua segurança. Pior quando os ataques descem aonívelpessoal,comomostramda- dos coletados pela Abraji (Associa- çãoBrasileiradeJornalismoInvesti- gativo).Em2019,houvenoBrasil59 registrosdediscursoestigmatizante feitospor agentespolíticos epúbli- cos contra jornalistas; em 2020, fo- ram 39 até agora. Os casos de assé- dio virtual foram 30 em 2019 e che- gama 20neste ano. Desde a chega- da da pandemia, a Abraji registrou 24violaçõesà liberdadede impren- sa entre 1º demarço e 21de abril. Entre as jornalistas mulheres, a situação é ainda mais grave, pois o assédio assume contornos ma- chistas e misóginos, como mos- tramos casos recentes dePatrícia Campos Mello e Vera Magalhães, entre tantos outros. Apesar do cenário desalentador, o jornalismo vive e sobreviverá à pandemia. Seupapeldefiscalizaro Estado e os Poderes seguirá, pois é vital a toda democracia. Ideal seria quea imprensaeseusprofissionais fossem respeitados e tivessem um ambienteseguroparatrabalhar,ga- rantido pelo Estado. Aí, sim, se po- deria comemoraroDiada Impren- sa emsuaplenitude. Dia da Imprensa: há o que comemorar? Desinformados - Cristina Zahar Secretária-executiva da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) - Taís Gasparian e Francisco Brito Cruz Advogada e sócia do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo, Gasparian - Advogados, integra o Conselho Consultivo do InternetLab, centro de pesquisa em direito e tecnologia Doutor em direito pela USP e diretor do InternetLab Pandemia resgatou a credibilidade do jornalismo profissional brasileiro Faltam debate e profundidade no caminho sinalizado pelo Congresso [ Com a pandemia, o que se viu nomundo e no Brasil foram propostas de redução de jornada e salários e demissões. (...) Sobrecarregadospela cobertura intensa e pelos riscos à saúde, nem todos os jornalistas têm colhido os louros do reconhecimento público de seu trabalho [ Na proposta que circula commais força no Congresso, as empresas de internet sofrerão bloqueios e serão multadas se não agirem contra conteúdos criados por seus usuários. (...) Delega-se às redes sociais e aos aplicativos demensagens a ingrata e impraticável tarefa de banir informações, o que provavelmente trará restrições a expressões legítimas Opássaro Verão, também chamado Príncipe, que vive entre Argentina e Brasil Fabio Schunck a eee Jornal filiado ao IVC Circulação paga às segundas de abr.2020, impresso mais digitais (IVC) 337.585 exemplares Páginas vistas no site da Folha em abr.2020 (Google Analytics) 428.386.671 Visitantes únicos no site da Folha em abr.2020 (Google Analytics) 73.786.377 Que polícia é essa que tolera manifestações antidemocráticas contras as instituições e agride atos pela democracia? Do deputado federal Marcelo Ramos (PL-AM), sobre a ação das PMs de São Paulo e do Rio contra protestos neste domingo (31) TIROTEIO comMariana Carneiro e Guilherme Seto Apesar da disposição demonstrada pelo STF de ten- tar imporlimitesaJairBolsonaro, integrantesdaclas- sepolíticaedoJudiciárioavaliamqueasprincipais in- vestigações em andamento ainda dependemde pro- vas inquestionáveis e pressão social para prospera- rem. Isso porque o único comprerrogativa para ofe- recer denúncia é o procurador-geral, Augusto Aras, que vemmanifestandodiscordância comoSupremo e afinidade comaspautas dopresidente. Tabuleiro fechado Segundopolíticose magistradosouvidospeloPai- nel,porenquantoosinquéri- tos têm como efeito prático aumentar tensões e, no má- ximo,desgastara imagemde Jair Bolsonaro. Se nada mu- dar, as apurações estarão fa- dadas ao fracasso. livre Oprocurador-geral foi contra todas as medidas de buscaeapreensãonainvesti- gaçãode fakenews.Nosbas- tidores,eletambémtemdito não ver indícios de que Bol- sonarotenhapraticadoqual- quer tipo de crime no caso queapurainterferêncianaPF. respeito Nanotaoficialque divulgouàs23h25dasexta-fei- ra (29) para dizer que estava incomodado comas especu- laçõesdeseunomeparauma vaganoSupremo,Arasnãoci- touumasóvezBolsonaro,que umdia antes fez referência à situação, dizendo que consi- derava seu nome para uma terceiravaga,hojeinexistente. protesto Oabaixo-assinado feitoporprocuradoresafavor doprocessotradicionaldees- colhadoPGR,ouseja,contra Aras, jáchegoua641adesões nofimdesemana.Ascoletas continuam. recado Apesardenãoter ti- do nenhum resultado prá- tico, o HC assinado por An- dréMendonça (Justiça) para protegerAbrahamWeintraub (Educação) foibemrecebido no Supremo. legitimidade Ainterpretação é que foi umademonstração de respeito ao STF e que aju- dou a lembrar o presidente quais sãoos caminhosquan- do há discordância de uma ordem judicial. atenção OConpeg,quereú- neprocuradoresgeraisdoses- tados,disseemnota sepreo- cuparcomacriminalizaçãoda atuaçãodegestoresnapande- mia. A entidade afirmouque nem toda contratação emer- gencial é ilícita. Amanifesta- çãoocorreapósasprimeiras operações deflagradas con- tra supostos desvios na crise do coronavírus. cartola Na representação contra o governador Wilson Witzel(PSC),oMinistérioPú- blico citou um dirigente do Botafogo,vinculando-oaum contratodeR$12milhões,sus- peito de fraude. alvo A empresa Speed, su- postamente contratada pa- ra distribuir medicamentos, apresentou ao governo um emaildeumescritóriodead- vocacia,oRouxinol&Rivera, queseriadeAnibalRouxinol. nãoécomigo Nomesmoen- dereço, diz o MPF, funciona o CNPJ do filho dele, Anibal Rouxinol Segundo, gerente jurídicodoclube.Elessusten- tamnessesdadosadesconfi- ançasobreaempresa.Odiri- gentediznuncaterouvidofa- larnaSpeed,assimcomoseu pai. O filho afirma que criou a empresa jurídica somente para receberpagamentosdo Botafogo. boiada O secretário de pro- dutividadedaEconomia,Car- losdaCosta,temditoaauxili- aresquepretendedarlargada aumadesregulamentaçãora- dicalemsetoreseconômicos. troca Na semana passada, ele tirou o economista Cé- sar Mattos da secretaria de Advocacia da Concorrência eCompetitividadeecolocou Geanluca Lorenzon, egresso do Instituto Mises, de linha- gem liberal. quem manda Internamen- te, fala-se que Carlos da Cos- taqueracionarumadesregu- lamentaçãoselvagemdaeco- nomia. Jáosecretáriodiz,no entanto, buscar responderà ordem de Jair Bolsonaro, de “retirar o Estado do cangote do empreendedor”. bic ÀrevistaCrusoé,oex-mi- nistro SergioMorodisse que o presidente deixou de vetar algunspontosnoprojeto an- ticrime para proteger seu fi- lhoFlávio.Umdosartigosque Bolsonaro deixou passar foi usadopeloex-PMAdrianoda Nóbrega, ligadoàfamília,em umatentativadehabeascor- pus,ummêsantesdemorrer, comomostrouoPainel. Camila Mattoso painel@grupofolha.com.brPAINEL MG, PR, RJ, SP R$ 5 (seg. a sáb.) R$ 7 (domingo) Redação São Paulo Al. Barão de Limeira, 425 | Campos Elíseos | 01202-900 | (11) 3224-3222 Atendimento ao assinante (11) 3224-3090 | 0800-775-8080 Ombudsman ombudsman@grupofolha.com.br | 0800-015-9000 Assine a Folha assine.folha.com.br | 0800-015-8000 Venda avulsa ES, GO, MT, MS, RS R$ 6 R$ 8,50 DF, SC R$ 5,50 R$ 8 AL, BA, PE, SE, TO R$ 9,25 R$ 11 Outros estados R$ 10 R$ 11,50 Assinatura semestral à vista com entrega domiciliar diária Carga tributária 3,65% MG, PR, RJ, SP R$ 685 ES, GO, MT, MS, RS R$ 1.089 DF, SC R$ 858 AL, BA, PE, SE, TO R$ 1.177 Outros estados R$ 1.460 GRUPO FOLHA A4 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 poder coronavírus Estamos Juntos Reúne artistas, empresários e intelectuais de campos ideoló- gicos diversos Basta! Organizado por juristas e advogados, o movimento tem aproxima- damente 700 assinaturas As Forças Armadas e a Democracia Manifesto pede que as Forças Armadas respeitem a democracia Presidentes dos TJs Presidentes dos 27 TJs manifestaram “integral apoio” ao STF, alvo de ataques de Bolsonaro Procuradores Manifesto pediu a aprovação de uma proposta que obrigue o presidente da República a escolher a che- fia da PGR por meio de uma lista tríplice ComissãoArns Entidade diz se preocupar com “manifestações desestabiliza- doras feitas por agentes públicos” Somos 70 por cento Campanha contra o presidente com apoio de celebridades como a apre- sentadora Xuxa -Fábio Zanini são paulo Uma profusão de manifestosemfavordademo- craciaapósataquesdopresi- denteJairBolsonaroainstitu- ições tomou as redes sociais e as páginas de jornal nos úl- timos dias, buscando recriar umcerto climadeDiretas Já. Seacomparaçãocomomo- vimento de 1984 ainda pode soar um tanto exagerada, há umparaleloevidenteentreos doismomentos. O principal, a união de adversários ideo- lógicoscontrauminimigoco- mum, associadoaoautorita- rismo.Emgeral,contudo,não hádefesaexplícitadoafasta- mentodopresidente. Amaior iniciativaéoMovi- mentoEstamosJuntos, lança- do no sábado (30) e que res- gata a cor amarela—símbo- lonoDiretas Já.Nofimdese- mana, arrebanhou assinatu- ras online ao ritmo de 8.000 por hora, e já reuniamais de 150milnodomingo(31). “Co- moaconteceunomovimento DiretasJá,éhoradedeixarde ladovelhasdisputasembusca dobemcomum”, diz o texto. A lista de signatários vai de apoiadoresdosocialismoade- fensores do Estado mínimo. Osmanifestantesafirmamre- presentarmaisdedois terços dapopulação,referindo-seao apoiodecercade30%aBolso- naroregistradosempesquisas doDatafolha eoutros.Háaté mesmo ummovimento cha- mado “Somos 70 porcento”, queganhouas redes sociais. Noentanto,entreosnomes maisreconhecíveis,parecem rarososconservadoresedis- sidentesdobolsonarismo—o músico Lobão éumdeles. Otextonãocitaopresiden- te,masmandarecadoaeleao cobrarrespeitoàConstituição e à separaçãodos Poderes. Uma das apoiadoras, a so- ciólogaMaria Victoria Bene- vides, tem larga experiência emoutrasmobilizações. Em abril de 1984, participou de umafotohistóricanotopodo prédiodaFolha,nocentrode SP,emque61personalidades pediameleições diretas. “Estávamosnumasituação de quemestá saindo de uma ditaduraeagoranossomedo é estarmos entrando numa. Porisso que émais fácil essa união de tucanos com petis- taseoPDT,oueconomistaor- todoxosquesealiamaoutros de esquerda”, afirma. Benevides, que é membro Manifestospró-democracia buscamclimadeDiretas Já após ataquesdeBolsonaro Textos defendendo a Constituição e a independência de Poderes unem adversários ideológicos; procuradores e juízes também semobilizam Houveaindaoutrosposici- onamentos, comoodoColé- gio de Presidentes de Tribu- nais de Justiça, que se mani- festouemdefesadoSTF (Su- premo Tribunal Federal) na última sexta (29). Naquinta(28),ummanifes- toassinadopor535 integran- tes doMinistério Público Fe- deraldefendeuemendaobri- gandoopresidenteaescolher paraaProcuradoria-Geralda Repúblicanomeapartirdelis- tatríplice.OatualPGR,Augus- toAras, não fezparteda lista eévistoporpartedosprocu- radorescomopró-Bolsonaro. Também houve manifes- tos recentes de caráter seto- rial,emáreascomomeioam- biente e relações exteriores. ParaJoséCarlosDias,ex-mi- nistro da Justiça no governo FHC e presidente da Comis- sãoArns,éprecisoconsolidar umamaioriadedemocratas, mesmolevandoemcontaque umterçodapopulaçãosegue apoiandoopresidente. AúltimapesquisaDatafolha mostrouque43%consideram ogovernoruimoupéssimo,re- cordenagestão,masaaprova- çãoaBolsonaroseguiaem33%. “Temos que ter união. As forças democráticas de vári- astendênciaspolíticasdevem estarpresentesnestemomen- to, comonasDiretas, emque subiramnomesmopalanque Tancredo,Ulysses,Fernando Henrique e Lula”, diz. Em 17demaio, aComissão Arns defendeu em texto na Folha a saída de Bolsonaro. “Ao semear a intranquilida- de,a insegurança,adesinfor- maçãoe, sobretudo, ao colo- car emriscoavidadosbrasi- leiros, o seu afastamento do cargo se impõe”, disse. Segundo Dias, o novo vale do Anhangabaú, ao menos enquantodurarapandemia, são as redes sociais. “Temos que atuar em defesa da im- prensa livre, das instituições edaliberdade.Somosmuitos.” ArazãoparaaojerizaaBol- sonaro, dizemosapoiadores dos manifestos, vem do que se poderia caracterizar co- mo “conjunto da obra”, que reúne ataque a instituições e menosprezoaocoronavírus. “A gente concorda empou- cascoisas,masnessemomen- to estamos unidos no funda- mental. Não é possível a con- tinuidadedeumgovernoque promoveamorte”,dizDouglas Belchior,daUneafroBrasileda CoalizãoNegraporDireitos. APOIADORES DE BOLSONARO VOLTAMA SE REUNIR EMBRASÍLIA Manifestantes repetiramneste domingo (31) ato em frente ao Planalto com ataques ao STF e ao Congresso e a favor do presidente, que andou de helicóptero e de cavalo Leia na pág A6 $ QUEM SE MANIFESTOU da Comissão Arns de Direi- tos Humanos, diz ter assina- doincontáveismanifestosno passado e nota uma diferen- ça para os dias atuais. “Antigamente eu conhecia todo mundo. Hoje participo comgentequenemconheço, ougentequeeuvejoedigo:‘pu- xa,nuncapenseiqueessapes- soa poderia estar assinando ummanifesto juntocomigo’.” Outroquefigurana fotode 1984, o economista e ex-mi- nistroLuizCarlosBresserPe- reiratambémassinouonovo manifesto.“OBrasil temuma democraciaconsolidada,mas umpresidentepsicopataque aestáameaçandodiariamen- te compalavras e atos”, diz. Defensordoimpeachment, Bresser afirma que a impor- tânciademanifestoseabaixo- assinados é mostrar a depu- tados que o afastamento do presidente é possível. Neste domingo (31), outro manifesto surgiu, voltado ao meio jurídico. Com o título deBasta!, reúnecercade720 profissionais dodireito. “O Brasil não pode conti- nuar a ser agredido por al- guém que, ungido democra- ticamente ao cargo de presi- dente da República, exerce o nobre mandato que lhe foi conferidoparaarruinarcom osalicercesdenossosistema democrático”, afirma. Uma das apoiadoras, a ad- vogada e professora da FGV Flávia Rahal diz que omani- festo reúne “vozes em defe- sa dademocracia”. “Esse e os outros manifestos são a uni- ãodepessoasquepodemter posturas ideológicasdiferen- tes,masveemnamanutenção dademocracia apeçaprinci- palparaorespeitoàConstitu- içãoeàsinstituições”,afirma. Chamaaatenção, segundo ela, a velocidadecomquees- ses documentos têm obtido apoio.“Empoucotemporeu- nirammuitagente. Issomos- traumdesejodaspessoasde saírem da inércia e agirem pelo respeito à democracia.” Ofatodeacriseocorrerem meio à pandemia do corona- vírus torna mais fácil reunir apoiosonline,jáquemanifes- taçõesderuaouemambientes universitáriosnãosãoopção. Issopodeajudar a explicar amultiplicaçãodeiniciativas. No sábado (30), outro docu- mento comexpoentes dodi- reito teve 170 assinaturas em defesadequeasForçasArma- dasrespeitemaConstituição. Wagner Pires/Futura Press/Folhapress a eee coronavírus poder SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A5 Osbolsonaristas falarammais de golpe de estado na semana passadadoqueesta colunano últimoanoemeio,oqueéumfei- to admirável. Do “Acabou, por- ra”deBolsonaroao“nãoéques- tãodese,édequando”deEduar- doBolsonaro,passandoporOla- vodeCarvalhopedindoaexecu- ção de Alexandre deMoraes, o jogoestácadavezmaisaberto. Bolsonaronuncatevetantos motivosparadarumgolpe.Seja pelosatentadosàdemocracia, pelasabotagemàsaúdepúbli- ca ou pelo aparelhamento da PolíciaFederal, é difícil imagi- nar um cenário em que o Bra- silcontinuetendoleieBolsona- ronãotenhaproblemas.Ainda temideologia,aindatemproje- todepoder,masagoraogolpe é para fugir da polícia. Aschancesdesucessodeum golpe bolsonarista já foram maiores:quandotinhamMoro eolavajatismonamão,quando tinhamo dobro de aprovação popular,quandoareeleiçãode Trump parecia certa, quando aindahavia quemacreditasse emPauloGuedes,quandoBol- sonaroaindanãohavia sidoo pior governante domundono combate à pandemia. Mas mesmo um golpe fraco pode ser bem-sucedido se não encontrar resistência. Éprecisofazerumafrentecon- traoautoritarismodeBolsona- ro,e,seelaforfeita,elavaivencer. Elaseráforteosuficienteparain- timidareconverterosgolpistas prudentes, seráforteosuficien- teparadestruirosimprudentes. Não é fácil montá-la. Será umafrentedegenteque jábri- gounolimitedesuasforçaspa- ra derrotar outros membros da frente, de gente que já per- deucargosporcausadeoutros membros da frente, que já foi sacaneada por outros mem- bros da frente, que acha (em mais de um caso, com razão) queoutrosmembrosda frente sãoresponsáveisporestarmos na situação emque estamos. O ideal é que essa seja, inclu- sive, uma oportunidade para conversar, para dar uma olha- danoqueosoutrosdemocratas estãopensando,quemsabedali nãosaialgoquesirvaparasua própriareflexão?Podeseruma chancedecurarressentimentos e construir novas alianças. Es- sas polinizações cruzadas não são raras emmomentos como esse.Odebatesobrearendabá- sica, por exemplo, parece estar cruzandofronteirasideológicas. Apandemiafortaleceuosgo- vernadores, eosgovernadores deesquerdavinhamsendomais moderadoseabertosaodiálo- go do que vários parlamenta- res progressistas (o que é nor- mal, governadores precisam conquistarmaiorias).Podeser omomentodeseconstruirum novoprogramadecentro, que aindanãoexiste.Quemnãoqui- ser dar palpites sobre os ter- mos de sua reconstrução po- de passar o resto da vida cor- rendo atrás dele depois. Mas se não der para fazer nada disso, não importa, va- mosemfrente,todomundocom seusressentimentos,todomun- docomasferidasabertas,cada um defendendo uma coisa di- ferente, unidos apenas napre- servaçãodademocraciacons- titucionalbrasileira.Ninguém precisavotarnomesmocandi- dato, levantaramesmabandei- ra, falarcomomesmovocabu- lário.Sóénecessárioquesees- tejadispostoadefenderaliber- dadedoadversáriomaisdoque o próprio programa. A única certeza é que a re- pública se lembrará de quem não a tiver defendido quando elaestavasobataque,quando seusfilhosmorriamsemsocor- ro. E nenhum trilhão que não veio vai servir de álibi. É preciso fazer uma frente contra o autoritarismo, e, se feita, ela vai vencer - Celso Rocha de Barros Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) Democratas vs. Golpistas dom.ElioGaspari, JaniodeFreitas |seg. CelsoRochadeBarros |ter. Joel PinheirodaFonseca |qua. ElioGaspari, ConradoHübnerMendes |qui. FernandoSchüler |sex. ReinaldoAzevedo|sáb. DemétrioMagnoli Quando cessa o diálogo, cessa a razão, irrompe a intolerância OPINIÃO Viversobdemocraciasignifica aceitardiferenças,pressupõe submeter-seàregradamaio- ria,observadoscontrolesde- mocráticos necessários para queessamaiorianãoaniqui- le os demais. A maioria, expressa no ci- clo eleitoral, é amagia desse sistema,quepermiteaoEsta- do ir se conformando às de- mandasdasociedade,recon- figurandoseupapel,continu- amente,porqueoEstadonão é um fim em si mesmo, mas expressãodoDireitoparaor- ganizar a vida emconjunto. Os controles sobre o po- der,portanto,sãofundamen- tais para evitar que maiori- as –transitórias por nature- za– assenhorem-se do Esta- docomfinalidadesindevidas. Devemoscuidarparaquees- sescontrolesoperemcomal- tivez e independência, guia- dos pelo Direito, para que os desviantessejamcoarctados. SomenteoDireitopodecon- trolar e conduzir a força. A Constituição não é uma pes- soa, nem uma seita: ela re- presenta umconsensomíni- mo que nos faz a todos inte- grantesdeummesmopaís.A interpretação de suas regras nos compete a todos; mas a últimapalavra éda Suprema Corte.Ea revisãode suasde- cisões se faz por intermédio dasprópriasregrasdoDireito. Não podemos transigir com essas regras básicas. Um sistema com essa con- formaçãoresisteàmudança. Eresistirnãoéruim,sobretu- doquandosetratade limitar o poder. Quando cessa o diá- logo, cessa a razão, irrompe a intolerância. Matilhas sali- vam contra honras e reputa- ções.Mudamaosabordoven- to a direção de seus ataques. Esse estado de coisas neces- sita de umbasta. Basta! O exercício diário da tole- rância –sobretudo do diálo- go– é o que permite convi- vermos com aquilo que não noséfamiliar.Toleramospo- sição contrária à nossa na expectativa de que logo se- rá anossa vez, ou, aomenos, o momento de tentarmos, mediante eleições livres e justas, escolhermos os nos- sos pontos de vista. Quaissãonossospontosde vista?Osmaisdiversospossí- veisqueseapresentemnuma sociedade aberta. Com uma exceção: essa tolerância não pode admitir que atentem contra esse sistema, para fi- car numa palavra em voga. Nisso reside o paradoxo da intolerância, formulado por Karl Popper: há uma fron- teira para aceitar a diferen- ça, e essa fronteira se esta- belece justamente quando se coloca em risco a plurali- dade que as nossas institui- ções,mesmocomtodassuas falhas e defeitos, significam para nos garantir. Nãoaceitaremosqueesses limites sejam esgarçados, a quepretexto seja. OpoderdoEstado,quefun- cionacomoumguiaparapro- duzir a força de uma nação, semal-usado a conduzirá ao precipício. Assistimos atôni- tos a essa condução até este momento. Até. Ombreemosas instituições –e seus representantes– que buscam confrontar o abuso. Confiremo-lhes apoio; faça- mo-lo às iniciativas de con- tençãodabarbárie.Quisahis- tória que fossem essas mu- lheres e homens que, inves- tidos de autoridade, esti- vessem à frente dessa bata- lha. Estejamos com eles e ao lado de quemmais se dispu- ser a controlaropoder. Poishá tempodereversão, antesdas“consequências im- previsíveis”. Basta! Sebastião Botto de Barros Tojal, Sérgio Rabello Tamm Renault, Pierpaolo Cruz Bottini e Igor Sant’Anna Tamasauskas Advogados, são integrantes do Basta! a eeeA6 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 Bolsonarista querditadura, diz decanodoSTF Emmensagem a colegas, Celso de Mello compara Brasil com Alemanha na ascensão de Hitler e sofre críticas pelo tom -Mônica Bergamo e Igor Gielow sãopaulo OministroCelsode Mello,decanodoSTF(Supre- mo Tribunal Federal), disse queobolsonarismoqueruma ditaduramilitar instaladano Brasil. Amensagem foi envi- ada a colegasda corte, e cau- souumagranderepercussão nomundopolítico. Notexto,eledizquea“inter- vençãomilitar,comopreten- dida por bolsonaristas e ou- tras lideranças autocráticas quedesprezama liberdadee odeiam a democracia”, nada mais é “senão a instauração, no Brasil, de uma desprezí- vel e abjetaditaduramilitar”. Mellocomparouomomen- tovividopeloBrasilcomoda Alemanha durante a ascen- são do ditador nazista Adolf Hitler (1889-1945). “Guardadas as devidas pro- porções, o ‘ovo da serpente’, à semelhança do que ocor- reu na República deWeimar (1919-1933)pareceestarpres- tesaeclodirnoBrasil”,dizele, emprestando o título o clás- sico filme de Ingmar Berg- man (1977) sobre a ascensão donazismo. “É preciso resistir à destrui- ção da ordem democrática, para evitar o que ocorreu na República de Weimar”, afir- mouMello, emreferência ao sistema de governo alemão do entreguerras. “Quando Hitler, após eleito pelo voto popular e posteri- ormente nomeado pelo pre- sidentePaulvonHindenburg comochancelerdaAlemanha, nãohesitouemrompereem nulificaraprogressista,demo- cráticaeinovadoraConstitu- içãodeWeimar”, disse. A mensagem veio no mo- mentoemqueBolsonaroinsi- nuasemprequepossívela in- vocaçãodoartigo142daCons- tituição,queprevêquePode- res possam chamar os mili- tares para aplacar anarquia. Mello é o relator do inqué- ritosobreasacusaçõesdoex- ministro Sergio Moro sobre interferência de Bolsonaro naPolícia Federal. Sua manifestação, que ele emnotadisse ter sidoemca- ráter pessoal e não instituci- onal, levou a imediatas acu- sações de suspeição por par- tedosfilhosdeBolsonaroem redes sociais. SegundodisseàFolhaomi- nistro GilmarMendes, ama- nifestação não veio em boa hora.AojornalOEstadodeS. Paulo, ele disse que “não de- vemosacenderfósforospara versehágasolinanotanque”. Mello fez a afirmação an- tes dos protestos do domin- go, em que Bolsonaro nova- mente prestigiou ato na Es- planadadosMinistérios pre- gandogolpismocontraoSu- premoecontraoCongresso. Outro ministro da corte, falando sob reserva, se dis- sepreocupadocomasuspei- ta que a afirmação trará so- bre Mello enquanto preside um inquérito de grande pe- so contra o presidente. Em São Paulo, houve ma- nifestação contrária ao pre- sidente comtorcidas organi- zadasdefutebol,queacabou emconfusãocomaPolíciaMi- litareativistasbolsonaristas. Nasemanapassada,Bolso- narocompartilhouovídeode uma entrevista em que o ju- ristaIvesGandraMartinsde- fendequeasForçasArmadas podemagir comopodermo- derador, de forma pontual, quando houver impasse en- tre os demais Poderes. O climade tensão institucio- nalémalvistopeloserviçoati- vo das Forças Armadas, que rechaçamhipótesesgolpistas. Incomodoumuitogenerais, almirantes e brigadeiros ou- vidosnodomingopelaFolha o fato de oministro da Defe- sa, general Fernando Azeve- do, ter dividido o helicópte- rousadopelopresidentenes- te domingo. Bolsonarosobrevoouama- nifestação golpista a seu fa- vor com Azevedo a seu lado, embora não tenha sido visto nosmomentossubsequentes dodesempenhopresidencial, queincluíramumacavalgada. Detalhe: era um aparelho camuflado da Força Aérea, e nãoousualhelicópteropinta- dodebrancodaPresidência. Na semana passada, Aze- vedo já havia divulgado nota apoiando o general Augusto Heleno(GabinetedeSeguran- çaInstitucional)emsuamani- festaçãoqueviariscodeinsta- bilidadedemocráticanopaís. A ativa fardada se queixou comBolsonaro sobreo tema na segunda, em reunião dos comandantesdasForçascom opresidente eAzevedo. Por outro lado, tanto a ati- vaquantoaalamilitar aloca- da no governo estão do lado deBolsonaronoembatecom o Supremo, considerando as recentes medidas envolven- doopresidenteequivalentes a umcerco aoPlanalto. Confusão com torcidas é tudo o que o presidente queria nestemomento ANÁLISE -Igor Gielow sãopaulo Oconflitonosatos pró-democraciaemSãoPau- loétudooqueobolsonaris- mopoderiaquererparainvo- car seus fantasmas de uma intervençãomilitaremfavor dopresidentedaRepública, aindaqueoescopodosinci- dente sejamínimo. Esse é o Brasil de 2020. Grupos radicais especulam golpes a favor de um gover- nante, e torcidas organiza- das conhecidaspela violên- cia no trato à diferença se dispõemairàsruasparade- fenderalgoquechamamde democracia. Se entrará para a história desteanoapresençadepes- soasnaruacontraBolsona- ro,apósrepetidosatosemfa- vordopresidenteedesuair- responsabilidade sanitária, nãopareceumbomagouro para omovimento tudo ter acabadoembombasdegáse correria. Pareciaóbvioqueissoaca- baria assim. Torcidas orga- nizadas são o bolsonaris- mo com uma camiseta de time: pregam o ódio ao ri- val, a desunião e a submis- são do adversário. Sua existência, de resto umfenômenomundial, le- vou o dito país do futebol a sediar incríveis jogos de torcida única nas arqui- bancadas. O recadoficaparaaclasse política, já devidamente as- sustadapelaalarmistamen- sagemdo decano do Supre- mo, Celso de Mello, fazen- do uma comparação histo- ricamente exagerada entre omomentoatualdoBrasil e a Alemanha na ascensão do nazismo. Hipérboles, contudo, tal- vez sejam o único jeito de enfrentamento institucio- nal quando um presidente sepõeagaloparpelaEspla- nada dosMinistérios entre golpistasassumidos.Aogos- to dos histriônicos 30 (não 300)deBrasília,sófaltoude- sembainhar uma espada e gritar “Esparta!”. A questão, contudo, foge da teatralidade. Ela se cha- ma artigo 142 da Constitu- ição, uma peça mal redigi- da que permite leituras di- versas —a rigor, o Supre- mo Tribunal Federal pode convocar as Forças Arma- das para reprimir a bader- na pública que acompanha asfranjasmaisradicalizadas dobolsonarismo. Ocorrequehámétodoen- tre os apoiadores do pre- sidente. Por toda a retóri- ca de leões, são gatinhos na hora da prática. Já torci- das organizadas e seu atá- vico desejo pelo confron- to oferecem a desculpa ideal para robôs clonados dos filhos de Bolsonaro no Twitter clamarem contra a desordem. O mandatário máximo nãofariamelhor.Desdeque aesquerdacolocouogover- no de Sebastián Piñera de joelhos com protestos no Chile,opresidentebrasilei- ro insinua que omesmo se dará por aqui. Para, logica- mente, invocar sua leitura torta do artigo 142 —que, paraodesalentodosativis- tas,nada falaemfecharou- tros Poderes. Sob ele, qualquer Poder constituídopoderáchamar militarespararesolversitua- çõesdeanarquia.Nadadisso seinsinuacomalgumascen- tenas oumilhares de torce- doresnaavenidaPaulista, é óbvio.Masoqueimportasão ascenaspinçadasdeembate comaPolíciaMilitar. Opresidentebalançao142 comoumratopestilentoem meio a uma pandemia que ele ignoranaprática. Énotórioqueoserviçoati- vodasForçasArmadasdes- preza tal possibilidade no momento, apesar de fatias significativas de sua cúpu- la apoiarem Bolsonaro ao achar que o Supremo tem se excedido. Essa já é a visão dos an- tesmoderadoresdaalami- litar no governo, ora trans- formados em insuflado- res de tensões. Bolsonaro só cavalga após os tais 300 do Brasil macaquearem a KuKluxKlan de umaAmé- rica inexistente entre nós porque se sente avalizado por eles. A influênciaamericanase viu também na via contrá- ria, com uma tentativa de associar os atos brasileiros com a revolta que se disse- mina por cidades dos EUA anteoassassinatodonegro George Floyd por um poli- cial branco. Naconfusão,ganhaopre- sidente cujo mandato está ameaçadopordiversasfren- tes.Amensagemdodecanoé hiperbólicaeseráusadacon- trasuapresunçãodeisenção daquipordiante,nãomuito diferente do corre-corre de corintianos, palmeirenses, são-paulinos e quetais nes- te domingo. Seela teráocondãodeor- ganizar,defato,algumaraci- onalidadeacercadodebate sobreapermanênciadeBol- sonaronocargo,essaéuma hipótesealtamenteespecu- lativa agora. Leiamais emEsporte Bolsonaro usa helicóptero e cavalo emnovo ato -Thiago Resende e Talita Fernandes brasília OpresidenteJairBol- sonarorequisitouumhelicóp- tero oficial para sobrevoar a Esplanada dos Ministérios neste domingo (31) e presti- giar mais umamanifestação a favordeseugovernoecon- traoSTF (SupremoTribunal Federal) e oCongresso. Depois,desceuecaminhou paracumprimentarseusapoi- adoresqueestavamemfrente aoPlanalto. Elenãoutilizava máscara, obrigatória no Dis- tritoFederalcomomedidade combateàCovid-19.Emsegui- da, andou a cavalo diante de manifestantes. O presidente nãodeudeclarações. Na domingo passado (24), Bolsonarotambémhaviautili- zadoumhelicópteroparaso- brevoaraárea.Nestedomin- go, uma carreata e pessoas a pé se dirigiram à Praça dos TrêsPoderes,ondeumgrupo se aglomerouà espera dele. O helicóptero, em um pas- seio de 40minutos, deu pelo menosseisvoltasnaEsplana- daepousouporvoltadas 12h noPaláciodoPlanalto.Omi- nistro da Defesa, Fernando Azevedo,acompanhouopre- sidente.Apóscumprimentar apoiadores,emfrenteaoPla- nalto,Bolsonaroretornouao Alvoradadehelicóptero. Como tem ocorrido cons- tantemente, oSTF foi oprin- cipal alvo das palavras de or- dem e das placas carregadas pormanifestantes.Placasafir- mavam: “Supremo é o povo” e “Abaixo a ditadura do STF”. Faixas faziamataques ao Su- premoepediamintervenção militar. Congressistas foram chamadosde corruptos. Onúmerodemanifestantes destedomingoerapoucomai- or queoda semanapassada. Maiscedo,Bolsonarovoltou afazerataquesàimprensaem publicação emredes sociais. “OmaiordosFAKENEWSé o‘gabinetedoódio’inventado pelaimprensa”,afirmou,emre- ferênciaaogrupoalvodeinves- tigação no inquérito das fake news.“AtéomomentoaFolha, Globo,Estadão...nãoaponta- ramumasófakenewsprodu- zidapelo tal ‘gabinete’.” Depois,Bolsonarofalouem “mídiapodre”ecitouaçõesdo TSEsobredisparosdemensa- gens emmassadeWhatsApp na campanha eleitoral. “Será que,seeuchamaressaimpren- sa e negociar com ela alguns BILHÕES DE REAIS em pro- paganda,tudoissoseacaba?” Grupo de extrema direita protesta com tochas emáscaras brasília Um grupo de extre- madireitacompessoasmas- caradas carregando tochas protestou na madrugada de domingo(31)emfrenteaoSTF (SupremoTribunalFederal). Osmanifestanteseramlide- radosporSaraWinter, inves- tigadanoinquéritocontrafa- ke newsque tramita no STF. Elaéumdoslíderesdocha- madomovimento“Os300do Brasil”, grupo armado de ex- trema direita formado por apoiadores de Jair Bolsona- roqueacampamemBrasília. Commáscaras,roupaspre- tasetochas,ogrupo,formado porpoucasdezenasdepesso- as, desceu a Esplanada e, se- gundo imagens divulgadas por eles nas redes, se posici- onouemfrente aoSupremo. “Viemos cobrar, o STF não vai nos calar”, gritavam. OministroAlexandredeMo- raes,doSTF,relatordoinqué- rito das fake news, foi o prin- cipal alvo: “Ministro covarde, queremos liberdade. Incons- titucional,Alexandre imoral”. O acampamento chamado Os300doBrasil,doqualSara Winterélíder,temparticipan- tes armados, comoaprópria coordenadoraafirmouemen- trevistaàFolha.Eladisse,con- tudo, que as armas são ape- nasparaautodefesa.Oporte de armas em manifestações éproibidopelaConstituição. Umdosobjetivosdogrupo étreinarmilitantesdispostos a defender o governo Bolso- naro.A ativista tambémteve breve passagem pelo Minis- tério dos Direitos Humanos, cuja titular éDamaresAlves. Ogrupopassouaser inves- tigadopelaProcuradoria-Ge- raldaRepública,noâmbitodo inquérito instaurado no fim deabrilparaapurarasrecen- tesmanifestaçõesantidemo- cráticas.Aapuraçãofoiauto- rizadatambémpeloministro AlexandredeMoraes. Aorganizaçãolideradapor Sararefutaosupostocaráter violentodomovimentoerejei- taorótulodemilíciaarmada. Namanhãdedomingo,qua- tro termos relacionados ao protesto estiveram entre os dez mais falados no Twitter brasileiro:“os300”,“SaraWin- ter”,“Brasília”e“KuKluxKlan”, referênciaaogruposuprema- cista norte-americano que tambémusatochasemásca- ras emsuasmanifestações. EmsuacontanoTwitter,Sa- rarebateucomparaçõesentre oprotestoeogruposuprema- cista.“Aideiafoideumapoia- dorqueé judeuequemcom- prouastochasemáscarasfoi umorganizadordos 300que énegro”, escreveu. O ex-ministro SergioMoro se manifestou nas redes so- ciais sobreoato. “Tão loucos mas, ainda bem, tão poucos. O único inverno chegando é odas quatro estações.” Presidente Jair Bolsonaro acena para apoiadores enquanto anda emum cavalo da PolíciaMilitar Pedro Ladeira/Folhapress Grupo de extrema direita protesta com tochas em frente ao STF Wallace Martins/Futura Press/Folhapress poder coronavírus a eee são paulo Emtemposde ru- mores sobre o papel dosmi- litaresnapolítica,afortepre- sença de fardados no gover- no do capitão reformado do ExércitoJairBolsonarodivide opiniõesnoBrasil, com ligei- ro predomínio daqueles que condenamaprática. SegundopesquisadoData- folha,52%dosbrasileirossãocontraapresençafardadano poderpolítico,enquanto43% a aprovam e 5% não sabem responder. O levantamento foi feitona segunda (25) e na terça (26), ouvindo2.069adultospossu- idores de telefone celular — elenãofoipresencialparaevi- tarriscosdecontágiopeloco- ronavírus. Amargemde erro édedoispontospercentuais. Hoje,8dos22ministrosdo governosãoegressosdasFor- ças,eumdeles(ogeneralLu- izEduardoRamos,secretário deGoverno)aindaépartedo serviço ativo. Umnonooficial,ogeneralda ativa Eduardo Pazuello, ocu- painterinamenteoMinistério da Saúde, centro da coorde- naçãodecombateàCovid-19. Lá,apósastraumáticassaídas deLuizHenriqueMandettae NelsonTeich,promoveuuma militarizaçãodecargosvitais, nomeando 17 fardados. Porfim,ovice-presidenteé umgeneraldequatroestrelas dareserva,HamiltonMourão. Espraiam-se pela Esplanada cerca de 2.500 outrosmilita- res, ocupando cargos diver- sos, pelo menos 1.200 deles emprestadosda ativa. Amilitarização, fenômeno inédito no escopo mas que temsuaorigemjánogoverno deMichelTemer(MDB,2016- 18),agradamaisosmaisricos e instruídos:62%dosquega- nhammaisde 10 saláriosmí- nimosaprovamomovimento, assimcomo50%dosquetêm curso superior—neste caso, empatandocomos47%con- trários à ocupação. Apresença desagradamais asmulheres(57%derejeição) doquehomens(51%deaprova- ção).Comoseriadeseesperar, éamplamenteaprovada(76%) pelosqueconsideramogover- noótimooubom,eigualmen- terejeitada(78%)porquemo acharuimoupéssimo. A discussão sobre amilita- rizaçãobolsonaristadivideas Forças Armadas desde o co- meço do governo. Em entre- vistaàFolha logoapósaelei- ção, o então comandante do Exército, Eduardo Villas Bô- as, tentoudissociarosmilita- res do então futuro governo. Casoperdido,comoarecen- tealiançadosfardadoscomo antesdemonizadocentrãoem proldagovernabilidadeecon- traumimpeachmentmostra. Além de sua origem farda- da, aliás umadistorção dado 52%são contrapresençademilitares emcargosnogoverno, dizDatafolha Aprovação à participação de fardados é de 43%; 8 dos 22ministros são egressos das Forças queele saiudoExércitoapós passar por um processo dis- ciplinarporsupostatramade atentados em 1988, Bolsona- ro cercou-se de generais da reservana campanha. A estrela era Augusto He- leno, colega seu e de Mou- rão no curso de paraquedis- mo. Hoje commenos poder do que já teve, ele segue co- mochefedoGabinetedeSe- gurança Institucional. Com o governo em curso, formou-se a ala militar, pa- ra a crítica constante de He- leno.Narealidade,sãovárias asalas,eaconfiguraçãoatual passapeloeixoFernandoAze- vedo (Defesa)-Walter Braga Netto(CasaCivil)-Ramos(Se- cretaria deGoverno). Ostrêsgenerais jáserviram juntosnoComandoMilitardo Leste,noRio, comAzevedoà frenteehojeservindodepivô dogrupoecontatocomoser- viçoativodevidoaseucargo. Ramos, contudo, se desta- ca pela relação pessoal com Bolsonaro, com quem divi- diuquartocomocadete,e foi especulado pelo presidente para comandar o Exército, já que a relação com o atual chefe,EdsonPujol,nãoédas mais azeitadas. Azevedo,porsuavez,seequi- libranumacordaapósveroen- fraquecidochefebuscarmais apoioentreseuesteiomilitar. Foiobrigadoadivulgarnotas reforçando o comprometi- mentodasForçascomaCons- tituição após Bolsonaro par- ticipar de atos golpistas,mas também apoiou Heleno em suanotaemqueapontavaris- cosàestabilidadeemdecisões doSupremoTribunalFederal. O serviço ativo, contudo, é outra história. Nemtodos os membros do Alto-Comando doExércitosesentemconfor- táveiscomaassociaçãoaum governo tão polêmico quan- to o de Bolsonaro, e o temor expresso por Villas Bôas em 2018 de que uma militariza- ção da política se transfigu- rasse numa politização dos quartéis permanece. Até aqui, indíciosdisso são vistosmuitoemredessociais, comapopularidadedasmen- sagens bolsonaristas entre médiosebaixosescalõesdas Forças. A atração que o dis- curso exerce sobre PMs pelo país,contudo,émaisnotória, comoseviunomotimdacor- poraçãonoCearáneste ano. Azevedo tem logrado di- versas vitórias corporativas nocargo, enquantoBolsona- robuscaassociar-se cadavez mais aos fardados durante a crise política embutida na emergência daCovid-19. Oplanodereestruturaçãode carreiraereformaprevidenci- áriadosmilitaresfoiaprovado noanopassado,apósduasdé- cadas de protelação, além de váriasbenessesacessórias. AMarinha,Forçamaisafas- tada do núcleo do poder, ga- nhouR$7,6bilhõesparacons- trução de novos navios, nu- ma operação criticada den- tro da área econômica. Já a Força Aérea, ainda mais dis- tantedobolsonarismo,man- teve seu cronogramadepro- gramas estratégicos, comoo caça Gripen ou o cargueiro C-390Millenium. IgorGielow Pesquisa diz que brasileiro temorgulho dopaís,mas está triste são paulo Pesquisa doData- folhamostra que dois terços dos brasileiros têm orgulho do país,mas aomesmo tem- posemostrampessimistase desanimados quando insta- dosaexpressarossentimen- tos que ele provoca. Olevantamentoouviu2.069 pessoasportelefone,paraevi- tar contato pessoal durante apandemia, nosdias 25 e 26. A margem de erro é de dois pontos paramais oumenos. É a primeira queda abrup- ta desde que o índice de or- gulhosos subiu, a partir do menor índice na série histó- rica, iniciadaem2000.Eleha- via sidoregistradoemjunho de2017,quandohouveempa- teentrevergonhaeorgulho, no auge da crise do governo Michel Temer (MDB). Damesma forma, aumen- tou o número daqueles que sesentemmaisenvergonha- dos do que orgulhosos, de 22%para 29%. Foramfeitasváriaspergun- tasacercadosentimentoque oBrasilprovocanaspessoas, e aí o quadro émenos róseo. O retrato é de umpaís triste, desanimado e commedo do futuro, embora ao mesmo temposedigamaistranquilo. Estão tristes com o Brasil 63% dos ouvidos, enquanto 34%sedizem felizes. Por ou- tro lado, dizem ter raiva ao pensar nopaís 42%, enquan- to52%afirmamestartranqui- los—umainversãoemrelação à pesquisa de julha de 2019. Declaram-se desanimados 59%, ante 39% que dizem o contrário. Têm medo sobre o futuro danação 57%, e 41% dizemconfiarnele.Para69%, osentimentodeinsegurança se sobrepõe ao de seguran- ça (30%)aopensarnoBrasil. Os entrevistados se divi- demquandoquestionadosse têmmais medo ou esperan- ça: 53% adotam o tom posi- tivo e 46%, o negativo. Chamaaatençãoaprepon- derância de sentimentos ne- gativosassociadasànaçãoen- tremulheres e jovens de 16 a 24anos.Essesgruposlideram osíndicesdaquelesquesedi- zemmaisdesanimados,com medodo futuro, infelizes, in- segurosesemesperança.Ape- nasnoquesitodaraivaqueo Brasil faz a pessoa passar os maisbravossãoosmaisricos (acimade10saláriosmínimos, 48%)einstruídos(comcurso superior, 50%). Hárelativahomogeneidade regionalnosquesitoslevanta- dos, coma exceçãomais evi- denteacercadohumornoSu- deste, a região mais populo- sa do país, que concentra os principais centros urbanos. Ali, aqueles que têm raiva ao pensar no Brasil empatam em 47% com os que se sen- temmais tranquilos. Empresários são, de lon- ge, os mais otimistas quan- doocorteéaocupação.Nada menosque80%dizemsentir orgulho do país, além de es- tarem esperançosos (72%) e tranquilos (66%). Comoseriaalgoprevisível, a empolgação opõe aqueles queconsideramogovernoJa- irBolsonarobomouótimoe osqueo julgamruimoupés- simo. Dos primeiros, 80%se dizem orgulhosos do Brasil, enquantonosegundogrupo 44%sedizemcomvergonha. Omesmo se repete, de for- ma espelhada, em todos os quesitosde sentimentos: en- quanto75%dosqueaprovam Bolsonaro se dizem tranqui- los,64%dosqueorejeitames- tão com raiva do Brasil, e as- simpor diante. A pandemia do novo coro- navírus impactadeformadi- ferenteaspercepçõesdobra- sileiro.Quando se cruzamas respostas com o fato do en- trevistado ter tido Covid-19 ou conhecido algumdoente, não hámudanças ante os ín- dices gerais aferidos. Já quando o cruzamento é comograude adesão ao iso- lamentosocial,principalme- dida para o combate à disse- minação do vírus, fica claro que ignorar riscos traz uma medidadeconfortopsíquico. Quãomaisnormalmentevive o entrevistado,menos senti- mentosnegativoseleexprime. Nosentidocontrário, quão mais isolado, mais angustia- dossãoossentimentosexpres- sosdemedo,tristezaeinsegu-rançacomopaís. IgorGielow coronavírus poder SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A7 Presença demilitares no governo divide população Opinião sobre a presenção de militares no governo Em% 5 Não sabe 43 Sim, deveriam ter cargos 52 Não deveriam ter cargos 51% entre homens 62% entre quem ganha mais de dez salários mínimos 67% entre empresários 50% entre moradores do Sul 57% entre mulheres 56% entre quem ganhar até dois salários mínimos 60% entre funcionários públicos 53% entre moradores do Centro-Oeste/Norte Tem mais orgulho do que vergonha ou mais vergonha do que orgulho de ser brasileiro? Em% 70% entre quem tem mais de 60 anos 80% entre empresários 73% entre moradores do Nordeste 81% entre quem aprova o governo Bolsonaro 35% entre quem ganha mais de dez salários mínimos 35% entre estudantes 33% entre moradores do Sudeste 44% entre quem reprova o governo Bolsonaro Mai.20Dez.19Jun.17 0 100 Não sabe/Outras respostas Mais vergonha do que orgulho Mais orgulho do que vergonha 3 29 67 2 22 76 3 47 50 Sentimento em relação ao Brasil de hoje, em % Fonte: Pesquisa Datafolha realizada em 25 e 26 de maio, com 2.069 brasileiros adultos que possuem telefone celular em todas as regiões e estados do país. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos Não sabe Não sabe Não sabe Não sabe Não sabe Não sabe mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 mai. 20 jul. 19 24 e 25. out.18 2.out. 18 Tranquilo Feliz Animado Seguro Com confiança no futuro Commais esperança do que medo Com raiva Triste Desanimado Inseguro Commedo do futuro Commais medo do que esperança 6 3 1 1 2 1 52 63 59 69 57 53 42 34 39 30 41 46 5 2 1 1 2 1 27 79 78 88 62 59 68 18 21 11 36 40 0 100 0 100 0 100 0 100 0 100 58% entre homens 50% entre quem tem ensino superior 75% entre estudantes 48% entre empresários 66% entre moradores do Nordeste 60% entre quem está vivendo normalmente na pandemia 89% entre quem rejeita o governo de Bolsonaro 58% entre quem aprova o governo Bolsonaro 66% entre quem tem de 16 a 24 anos 48% entre homens 72% entre empresários 61% entre estudantes a eeeA8 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 mundo -DaigoOliva e Rafael Balago sãopaulo Emcimadeumcarro dapolíciadestruído,ummani- festantepula repetidasvezes. Rodeadoporcentenasdepes- soas, ele abre os braços e, em seguida,sejogaemcimadaslu- zesdeemergênciadaviatura. Pareceumdascenasfinaisde “Coringa”,maséNovaYorkem mais uma noite de protestos emdiversascidadesdosEUA. No quinto dia consecutivo de atos pelo fim da violência policialcontranegrosnopaís, quecomeçounosábado(30)e adentrou amadrugada deste domingo (31), imagens como essasemultiplicaram,desafi- ando toques de recolher im- postosamaisde20municípi- oseconvocaçõesadicionaisde soldadosdaGuardaNacional. Na maior parte do domin- go,asmanifestaçõesseguiram pacíficas, como, por exem- plo, emumamarcha emNo- vaYork.Houve,porém,regis- tros de confrontos entre ati- vistaseagentesdesegurança naFiladélfia,emSantaMoni- ca e em SanDiego, assim co- mona capitalWashington. EmMinneapolis,umcami- nhão-tanque avançou sobre os ativistas, mas ninguémfi- couferido, segundoumates- temunhada agência de notí- cias Reuters. Omotorista foi retirado do caminhão e es- pancadopormanifestantes. Fora do país, marchas tam- bémforamrealizadasemBer- lim e Londres, ondemanifes- tantes se ajoelharam na Tra- falgarSquare,bradaramgritos como“semjustiça,sempaz”e marcharamatéasededoParla- mentoeaembaixadadosEUA. Desde quarta, atos ocorre- ramemaomenos75cidades americanas, segundo levan- tamentodoNewYorkTimes, com registro de quatromor- tes e aomenos 1.700prisões. Assim,asmanifestaçõesde- sencadeadas pela morte de GeorgeFloyd, homemnegro cujopescoçofoiprensadono chão pelo joelho de umpoli- cialbranco, jánãose limitam aMinneapolis, onde o crime ocorreu,eespalham,aomes- mo tempo, reações contra o racismoeviolêncianas ruas. Na madrugada de domin- go, de Los Angeles aMiami e Chicago,osprotestosmarca- dosporgritosde“nãoconsigo respirar”, fraseditaporFloyd enquanto era sufocado, co- meçaram pacificamente an- tesdesetornaremtumultuo- sos,comruasbloqueadaspor ativistas,carros incendiados, saqueseatéespancamentos. Dooutro lado, as forçasde segurançareagiramemcenas de barbárie. Em Nova York, dois carros da polícia atro- pelaramdezenasdemanifes- tantes que tentavam impe- dir a passagemdos veículos. Em Atlanta, na Geórgia, dois jovens negros foramar- rancadosàforçadedentrode um carro por policiais que usavam o que parecem ser armas de choque. Nas ima- gens transmitidas pela CBS, as vítimas não oferecem re- sistência e, mesmo assim, sãotratadascombrutalidade. Em Salt Lake City, o canal ABC4flagrouumagentecom escudoempurrandoumido- so de bengala. Namesma ci- dade, outra cena de selvage- ria. Em reação a umhomem branco que ameaçava mani- festantes com arco e flecha, ativistaslincharamoagressor. Viaturasforamincendiadas naFiladélfia,elojas,saqueadas em Los Angeles. Agentes em Richmond, na Virgínia, tive- ramdeserhospitalizadosde- vidoaferimentos,eumapes- soa foimorta em Indianápo- lis,ondeumvice-chefedepo- líciadissequeodepartamento recebeutantosrelatosdedis- parosqueperderamaconta. Além da morte na última madrugada, um homem foi morto em St. Louis, Minne- sota, no sábado, ao ficar pre- so entre dois caminhões, en- quantoumdeles tentavama- nobrar para escapar de um bloqueio na estrada. Na sex- ta,emDetroit,umhomemde 21anosfoimortopordisparos feitosdedentrodeumcarro. Em Minneapolis, na quar- ta, Calvin Horton Jr. foi mor- toporumtirodisparadoper- Protestos ignoramtoquesderecolher, eEUAtestemunhamcenasdebarbárie Manifestações antirracismo ocorremnoite após noite no país enquanto repressão policial aumenta todeumalojaqueestavasen- dosaqueada.Houvetambém amorte de um segurança de umprédiofederalemOakland, cujarelaçãocomosatosainda é avaliadapelas autoridades. À CNN Melvin Carter, pre- feito de St. Paul, pediu “paz, e não paciência”, frase repe- tida por Keisha Lance Bot- toms, prefeitadeAtlanta.Ao menos 170 lojas foram dani- ficadas durante os protestos emSt. Paul, segundoCarter. Nos últimos dias, muitos jornalistas também foram agredidospelas forças de se- gurança—e,àsvezes,porma- nifestantes.Nasexta(29),afo- tógrafaLindaTiradolevouum tiro de bala de borracha no olho esquerdo enquanto co- briaosatosemMinneapolis. A repórterKaitlinRust, do canalWave 3News, e o foto- jornalista JamesDobson fo- ramalvosdebalasdepimen- taporpoliciaisquepareciam mirar a jornalista. Ao vivo, ela gritava “estousentoatin- gida, estou sento atingida!”. NosarredoresdaCasaBran- ca, ativistas, por suavez, ata- caramumcorrespondenteda FoxNewsesuaequipe,pegan- do omicrofone do profissio- naleoatingindocomoobjeto. O presidente dos Estados Unidos,DonaldTrump,defen- dequeascidadesajamdema- neiramaisduracontraosma- nifestanteseacusouoqueele chamade anarquistaseanti- fascistasdeseremosrespon- sáveispelaondadeviolência. Asmanifestaçõesatingem opaísemummomentodeli- cado.Pormaisdedoismeses, milhões de pessoas tiveram de ficar em suas casas para retardarapropagaçãodoco- ronavírus,que jámatoumais de 100mil pessoas nos EUA. As medidas adotadas para combateraCovid-19 levaram àpiorcriseeconômicadesde aGrandeDepressão, com40 milhões de desempregados. Odebatesobreosplanospa- rareabrir lojasealiviarrestri- ções em cidades fechadas fi- couemsegundoplano,agora queaviolênciapolicialgerou manifestações de fúria. No entanto, a situação desper- ta a preocupação de especi- alistasemsaúde,quetemem umanovaondade contágio. Floyd,cujamorteprovocou aondadeatos,haviaperdido o emprego como segurança em um restaurante por con- tadasmedidasdeisolamento socialparaconterapandemia. Nascido em Houston, foi acusado de assalto a mão ar- madaem2007e,em2009,con- denadoacincoanosdecadeia. Ao deixar a prisão,
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