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Folha de São Paulo (2020-06-01)

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SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020ANO 100 ┆ Nº 33.297 R$ 5,00
D E S D E 1 9 2 1 UM J O R NA L A S E RV I Ç O D O B R A S I L
Polícia letalSem justiça, sempaz
Sobre alta de mortes por
forçasdoEstadonoBrasil.
Acerca de manifestações
que sacodemosEUA.
EDITORIAISA2
AUDIÊNCIA/MÊS
PÁGINAS VISTAS 428.386.671
VISITANTES ÚNICOS 73.786.377
ISSN 1414-5723
9 771414 572025
33297
folhainvest A12
Metade dos
contribuintes ainda
não declarou o
Imposto de Renda
Ilustrada B7
Em entrevista para
filme, Aldir Blanc diz
como verteu cenas
da vida em canções
Catarina Pignato
Mathias Alencastro
Comprotestos,
EUA vivem o seu
junho de 2013
MundoA9
Thiago Amparo
Negros buscam
liberdade que
não nos foi dada
MundoA9
Manifestos por democracia
buscamunião dasDiretas Já
Movimentos tentam agrupar adversários ideológicos contra um inimigo comum, o autoritarismo
Após ataques dopresiden-
te JairBolsonaroa institui-
ções, manifestos em favor
dademocraciatomaramas
redessociaiseosjornaisnos
últimos dias, buscando re-
criarumclimadeDiretasJá.
Se a comparação com o
movimento de 1984 ainda
pode soarumtantoexage-
rada,háumparaleloeviden-
teentreosdoismomentos.
Oprincipal,auniãodead-
versáriosideológicoscontra
uminimigocomum,oauto-
ritarismo.Emgeral nãohá
defesa explícita do afasta-
mento dopresidente.
Amaior iniciativaéoMo-
vimento Estamos Juntos,
lançadoanteontem.Arreba-
nhou8.000assinaturaspor
horaereunianestedomin-
gomais de 150mil nomes.
Ontem surgiu outro ma-
nifesto,voltadoaomeioju-
rídico.ComotítulodeBas-
ta!, reúnecercade720pro-
fissionais dodireito.
Houve mais posiciona-
mentos,comoodoColégio
dePresidentesdeTribunais
de Justiça, que defendeu o
SupremoTribunalFederal.
Outro, assinado por 535
nomesdoMinistérioPúbli-
coFederal, querqueopro-
curador-geralsaianecessa-
riamente da lista tríplice.
Tambémhouvemanifes-
tos de caráter setorial, em
áreascomomeioambiente
e relações exteriores.
A última pesquisa Data-
folhamostrouque43%dos
brasileiros consideram o
governo ruim ou péssimo,
recordena gestão. Poder A4
Atos contra racismo nos EUA
têm repressão e barbárie
Osprotestospelamortede
George Floyd, homem ne-
gro cujo pescoço foi pren-
sadonochãopelojoelhode
umpolicialbranco, jásees-
palharamporaomenos75
cidadesdosEUA.Noquinto
diaconsecutivodeatosan-
tirracistas, toquesde reco-
lherforamignorados,eare-
pressãopolicialaumentou.
As manifestações deixa-
ramquatromortoseaome-
nos 1.700 presos. Há regis-
trosdecarroseviaturas in-
cendiados,saqueseespan-
camentos.Osatos,queche-
garam a Berlim e Londres,
sãomarcadosporgritosde
“nãoconsigorespirar”,frase
repetidaporFloydenquan-
to era sufocado.MundoA8
Celso deMello
compara país
à Alemanha
de Adolf Hitler
Em mensagem a minis-
trosdoSTF,omagistrado
dizqueaintervençãomili-
tar,comodefendemapoi-
adoresdopresidente, na-
damais é senão a instau-
raçãodeuma“abjetadita-
dura”.Aoversimilaridade
entre o país atual e a Ale-
manhasobHitler, odeca-
nodizserprecisoresistirà
“destruiçãodaordemde-
mocrática”. Poder A6
Mortes por
coronavírus
podem ser
140%maiores
Dados do próprio Minis-
tériodaSaúde, tabulados
pelaFolha, indicamqueo
Brasil teve,atéabril,9.420
mortes a mais causadas
pelaCovid-19doqueoto-
tal divulgado à época.
EmSãoPaulo, os sepul-
tamentos na cidade au-
mentam desde janeiro e
subiram50%emabril em
relaçãoa2019. SaúdeB1 eB2
Grupo armado de extrema direita pró-Bolsonaro realiza protesto em frente ao STF Wallace Martins/Futura Press/Folhapress
Ato pró-democracia de torcidas de futebol termina em confronto comPMs e apoiadores de Bolsonaro na av. Paulista, em São Paulo Eduardo Knapp/Folhapress
Manifestante tenta impedir passagemde policiais em ato perto da Casa Branca Eric Thayer/Reuters
Protesto político de
torcidas acaba em
confronto em SP
Integrantesdetorcidasde
futebol de clubes de São
Pauloprotagonizaramato
pró-democraciaontemna
avenida Paulista. De iní-
cio pacífico, terminaram
emconfrontocomaPMe
apoiadoresdeBolsonaro.
Em Brasília, um grupo
armado de extrema di-
reita protestou em frente
aoSTF.EsporteB11 ePoderA6
MuhammadYunus
ENTREVISTA DA 2ª
Pandemia tirou o
mundo de rota
econômica suicida
A11
Começa hoje processo
de reabertura da
economia em SP B3
52% são contra presença
demilitares no governoA7
a eee
opinião
A2 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020
UM JORNAL A S ERV I ÇO DO BRAS I L
a
Publicado desde 1921 – Propriedade da Empresa Folha daManhã S.A.
presidente Luiz Frias
diretor de redação Sérgio Dávila
superintendentes Antonio Manuel Teixeira Mendes e Judith Brito
conselho editorial Rogério Cezar de Cerqueira Leite, Marcelo Coelho,
Ana Estela de Sousa Pinto, Cláudia Collucci, Hélio Schwartsman,
Mônica Bergamo, Patrícia Campos Mello, Suzana Singer, Vinicius Mota,
Antonio Manuel Teixeira Mendes, Luiz Frias e Sérgio Dávila (secretário)
diretoria-executiva Marcelo Benez (comercial), Marcelo Machado
Gonçalves (financeiro) e Eduardo Alcaro (planejamento e novos negócios)
editoriais@grupofolha.com.br
EDITORIAIS
Sem justiça, sempaz
Polícia letal
Asmanifestaçõesqueeclodemnos
EUA, motivadas pelo assassinato
do cidadão negro George Floyd
porumpolicial branco,na cidade
de Minneapolis, parecem trans-
cender, em sua extensão e em al-
gumas características, os contor-
nosdeprotestosanteriorescontra
o racismonaquele país.
A brutalidade física e simbóli-
cadacenanaqualoagenteDerek
Chauvin sufoca como joelho, por
9minutos,umapessoaqueestava
sobcontroleedizianãotercondi-
çõesderespirardespertourevolta
entre americanos de todas as co-
lorações raciais —e catalisou um
sentimento latente de exaustão e
descontentamentonopaís.
Aimediataocupaçãodasruaspor
parte de manifestantes sem uma
coordenação centralizada discer-
nível fez lembrar os movimentos
queirromperamnoChileeemou-
tros países da região em 2019.
O slogan “De quem é a rua? A
ruaénossa”, repetidonosEstados
Unidos, revelaumaíndoleatécer-
topontoanálogaadeseusequiva-
lentes latino-americanos.
A covardiamonstruosa do poli-
cial eadesproporçãodaforçapor
eleutilizadatalveztenhamencena-
dotambémodramadasdesigual-
dadespresentesemumasocieda-
de que, opulenta em sua econo-
mia, vem se tornando crescente-
menteiníquanasúltimasdécadas.
Comosetornoucomumempro-
testoscontemporâneos,orecurso
aatosviolentos,quenãorarodes-
cambamparaovandalismoconde-
nável e politicamente ineficaz, se
fez presente nas demonstrações,
em contraste com a linha pacifis-
ta consagrada porMartin Luther
King, o campeão da luta pelos di-
reitos civis e denegros.
Os tempos sãooutros todavia, e
é inegávelque,desdeaquelascon-
quistasbasilaresdadécadade1960,
a violênciapolicial contraapopu-
lação negra —e também latina,
cumpre lembrar—jamais cessou.
Quantoaesseaspecto,reabre-se
nosEUAodebateacercadosmeca-
nismos legais de institucionaliza-
ção de tal truculência—a doutri-
na da “imunidadequalificada”, há
anos sistematizada em decisões
da Suprema Corte, que torna ex-
tremamente difícil levar a termo
tentativas de condenar judicial-
mente agentes das polícias.
Trata-se da versão norte-ame-
ricana para um tipo de proteção
aosexcessosquenoBrasilganhou
o nome de “excludente de ilicitu-
de”, dispositivo proposto sem su-
cessoempacote legislativodoex-
ministro da Justiça SergioMoro.
Ofatodequeessaassimchama-
da“autorizaçãoparamatar”tenha
sidorejeitadapeloCongressonão
deixa, infelizmente, o Brasil em
melhorsituação.Aqui,comleisou
semleis,banalizou-se,empropor-
çõesdramáticas,arotinadabruta-
lidadepolicial impunesobreaspo-
pulaçõespobres enegras.Ospro-
testosda sociedade, emboraexis-
tam, sãopontuais eminoritários.
Nesse contexto, seria semdúvi-
davaliosoparaosdoispaísesrefle-
tiremsobreumoutrosloganado-
tado pelos manifestantes ameri-
canos: “Sem justiça, não há paz”
(“No justice, no peace”).
Seaindapairavadúvidasobreoca-
ráterendêmicodaviolênciapolicial
noBrasil,nãodeveriapairarmais.
Emmeioàpandemia,SãoPauloe
Rio de Janeiro quebram recordes
históricosdemortesporpoliciais.
Já elevada para qualquer parâ-
metroquenão sejaodabarbárie,
amaiorletalidadepolicialnoinício
desteanoverificadanosdoisesta-
dos contrasta, ainda mais, com a
quedade outros crimes.
Entrejaneiroemarçodesteano,
aPolíciaMilitarpaulistamatou255
pessoasemsupostassituaçõesde
confronto,umaumentode23%em
relaçãoaomesmoperíododoano
passado,segundodadosdaSecre-
taria da Segurança Pública.
Tendênciasimilar,emboramais
letal, se vê noRio. Dados do Insti-
tutodeSegurançaPública(ISP)re-
gistraramumaumentode43%nas
mortes por policiais fluminenses
nomêsde abril, com 177 vítimas.
Cumpre lembrar que são eleva-
ções em índices já, hámuito tem-
po, inaceitáveis. A título de com-
paração, 1.011pessoas forammor-
taspelapolíciadosEstadosUnidos
noanopassado,segundolevanta-
mentodojornalWashingtonPost.
Guardadas as devidas propor-
ções, apenas no Rio o número de
mortosdomesmomodoem 2019
foi de 1.810, recorde desde 1998.
Por trás destes números jazem
vidas perdidas, em grande parte
de jovens negros, contra os quais
brutalidade é a regra, não a exce-
ção.Contaram-semaisde70mar-
casdeprojéteisnacasaonde João
Pedro Matos Pinto, 14, foi morto
pelas costas em São Gonçalo, re-
giãometropolitana doRio.
Aaltadaletalidadepolicialcami-
nha na contramão da queda dos
índices de criminalidade ante do
mesmo período do ano passado,
antes da pandemia.
NoRJ, os homicídios dolosos ti-
veram redução de 14%emabril, e
roubos de ruadespencaram64%.
Emboraonúmerodeassassinatos
tenha tido leve alta em São Paulo
(3,4%),oscrimespatrimoniaiscaí-
ram, emmédia, pelametade.
Injustificadasobqualquerparâ-
metro civilizado, a letalidade das
forças de segurança no Brasil ca-
rece aindamais de razões emum
cenárioderuasvazias.Paraexpli-
ca-la, resta apenas a combinação
dedescontrole com impunidade.
Protestos contra truculência policial nos Estados
Unidos levantam questões que valem para o Brasil
sãopaulo Nãovaitergolpe,masvai
ter jogo.Eotimedosbrucutus,que
decertoprefeririaogolpe,começou
ajogarfazumtempinhocomaenor-
mevantagemdeestarsentadonaes-
trepitosamáquinadoExecutivo fe-
deral.Eisoqueparecehojeoteatro
de operações dapolítica nacional.
Nesse tabuleiro, ameaçar com as
baionetas,mesmoquandoelasnão
passamdepeçasdecorativasquealu-
demaumpassadoobtuso,trazbene-
fíciosmenoresparaogruponopo-
der.Hipnotiza,comaromaartificial
depólvora,aturmadatestosterona
etalvez intimidealgumadversário.
Mas a retórica do arreganhopro-
duzseumaiorefeito,paraosituaci-
onismo, quando levamuitas forças
quepoderiamestartrabalhandona
concretudedapolíticapara isolare
enfraquecer o bolsonarismo a pre-
ocupar-se mais com a preservação
doenquadramentodoregimeeme-
noscomoqueocorreemseumiolo.
Talvez não haja escapatória para
osdemocratas.Nonossopresiden-
cialismo, o chefe eleito do Executi-
vo, mesmo fraco como Jair Bolso-
naro,detémomonopóliodomega-
fonenacional, e issodesdesempre.
Se ele aponta para os quartéis, é
inescapávelpreocupar-se comisso.
Saibamtodos,noentanto,queogo-
vernoBolsonaromudouquando,há
algunsmeses,viuqueseaproximava
adegolado impeachment.Ele ago-
ra opera emmodo dual. Enquanto
grita “fogo!”, compra apoio parla-
mentarnamoedadesempre.Eessa
moeda funcionanonosso sistema.
Se sobreviver até novembro, no-
meará seu primeiro ministro para
oSupremoTribunalFederal,omais
duroecoesoobstáculoaodesvario
bolsonaristaatéaqui.Emfevereiro,
vai entrar com tudonadisputa das
presidênciasdaCâmaraedoSenado.
Casoofôlegodureatéjulhodoano
que vem, mais um magistrado no
STF. Equemsabe chegar a 2022 em
condições dedisputar a reeleição.
Esseéoprojetobolsonarista,que
carrega o risco da deterioração do
regime.Parabarrá-lo,osadversários
precisamfazerpolítica.Manifestos
não bastam. É arregaçar a manga,
cooptarocentrãoemirar342votos.
brasília Agrava-se a pandemia do
coronavírus e Jair Bolsonaro não
está preocupado. Agrava-se a crise
políticaeopresidentedaRepública
nãosecomportacomoquemdese-
ja o seudistensionamento.
Nãoseconstrangeemandaraca-
valonaEsplanadaepasseardeheli-
cópteroàscustasdodinheiropúblico
para forjar cenas de apoio popular.
Os lampejosdediálogoqueelesi-
nalizanumdiaesvaem-seemsegui-
daquandoprestigiaumprotestoan-
tidemocrático.Maisumavez,Bolso-
naro foi o protagonista de um ato
anti-STFnaPraçadosTrêsPoderes.
Aúnicapreocupaçãodopresiden-
tehojeéestimularoimpassecomo
Supremoporquesabequeotribunal
podeseraorigemdesuaderrocada.
Parecesemlógica,masnadaéme-
lhor, na tática bolsonarista, do que
desqualificaracortenomeiodojogo.
Uminquéritoavançasobreainter-
ferênciadopresidente,evidenciada
pelos elementos notórios, em pe-
ças de comandodaPolícia Federal.
Outro fecha o cerco no “gabinete
doódio” instaladonoPlanalto, sob
atuteladeCarlosBolsonaro,o02.O
TSEsurgenoxadrezcomopossibili-
dadedecassaçãodachapaeleitoral.
Ocompartilhamentodoinquérito
das fakenews comacorte eleitoral
podemuniciarações sobreofinan-
ciamentoda vitória deBolsonaro.
Umprocessode impeachmentfi-
ca pendurado na temperatura do
Congresso.Para seproteger,Bolso-
naroabriuobalcãodenegócioscom
ospolíticosfisiológicosdocentrão.
Semcompromissocomopaís,es-
segrupodepartidosabraçouetraiu
DilmaRousseff.Bolsonaronãotem
muita alternativaporqueo Judiciá-
rio nãodará trégua a ele.
Cresce ummovimento de procu-
radoresincomodadoscomoalinha-
mentodeAugustoArasaoPlanalto.
OchefedaPGRvai serpressiona-
do internamenteanãoengavetaro
volumedecomplicaçõesdogoverno.
Asociedadesemobilizacomabai-
xo-assinadoseoutrasmanifestações.
Também contra o governo vê-se
até omilagre (provavelmente bem
efêmero) de torcidas organizadas
de futebol rivais lado a lado.
riode janeiro Omundopós-pande-
mia serádiferente—quantas vezes
você não leu ou ouviu isso nos últi-
mosdias?Mas ahistória do serhu-
mano é a de sua eterna adaptação
ao novo, seja ótimo ou horrível. O
mundo pós-internet também é di-
ferentee jáháumageraçãoquenão
conheceoutro.Nósmesmos,maio-
resde200anos,malnoslembramos
de quando ainda passávamos tele-
gramas.Para issotínhamosdeirao
correioecomporumtexto“telegrá-
fico”—curto, seco, terminandoem
“Abracos”—, que um funcionário, o
telegrafista,“escrevia”numamaqui-
ninhaquefaziatec-tec,tecsestesre-
presentandoospontosetraçosque
formavamcadaletradamensagem.
Todas as artes chegarão afetadas
ao pós-vírus, em particular o cine-
ma.Eleperderásuacondiçãodeúni-
co veículo de fruição coletiva e de
massa—justo o que o tornou, des-
de sempre, diferente. Em meados
dos anos40, por exemplo, coma 2ª
Guerra e tudo, 100milhões de pes-
soasporsemanaiamaocinemanos
EUAeoutras tantasnoplaneta. Sa-
laspara3.000pessoaseramcomuns,
enadacomoumcinema lotadopa-
rapotencializaraapreciaçãodeum
drama, um filme de ação e, princi-
palmente, uma comédia.
Se há tempos isso já era impossí-
vel, agora será impensável. As salas
terãosuacapacidadelimitadaa25%,
comosgatospingadosadoismetros
um do outro. Os drive-ins, com só
uma ou duas pessoas em cada car-
ro, não serão solução. Ir ao cinema
serápoucomelhordoqueassistir a
umfilmeemcasa,pelaTV,pelovídeo
oupelostreaming—oque,mesmoa
dois,equivaleaumesportesolitário.
Mas o ser humano se acostuma.
Há muito que “West Side Story”,
“Lawrence daArábia” e outrosmo-
numentos, feitosparatelasmaiores
doqueavida,mudaram-separa te-
linhasde 20polegadas. Seusheróis
ficaramdo tamanhodeumapulga,
e nos adaptamos.
O cinema talvez fosse maior do
que a vida. Mas a vida o encolheu
às suas dimensões.
Não vai ter golpe, vai ter jogo
Bolsonaro busca impasse comSTF
Ex-maior do que a vida
-
Vinicius Mota
-
Leandro Colon
-
Ruy Castro
No início do governo Bolso-
naro, apresentei duas conje-
turas sobre o STF. A primeira
era que o seu suposto hiper-
protagonismo ainda estava
por vir, porque era em larga
medidaepifenômenodaagen-
dadogovernoedeeventosex-
ternos(escândalosdecorrup-
ção etc.). A previsão feita foi
que “o STF terá enorme pro-
tagonismonogovernoBolso-
naro. Será o ator com efetivo
poder de veto sobre a agenda
iliberal do governo: contrari-
ando iniciativas na área com-
portamental e de segurança
públicaecoibindoabusosevi-
olaçõesdaseparaçãodePode-
res. Essas pautas do governo
encontrarãoumavirtualuna-
nimidadeantagônicanoSTF”.
Emoutras palavras, assisti-
ríamosàcontençãodaagenda
iliberal do governo, além do
queHirshlchamoude“judicia-
lizaçãodamegapolítica”,eque
caracterizaassupremascortes
nasdemocraciasatuais.Tería-mosassimumanormalização
de nossa suprema corte. Sob
Bolsonaro, comofimdapola-
rização causada pela atuação
do STF como corte criminal,
ascríticasaohiperprotagonis-
mosofreramradical inversão,
mudandode sinal ideológico.
OpoderdevetodoSTFmani-
festa-seemvárias frentes(MP
comrestriçãoàLeideAcessoà
Informação,nomeaçãodeAle-
xandre Ramagem para o co-
mandodaPolícia Federal, au-
tonomiadosestadosemunicí-
piosnapandemia)eemtemas
centrais para o governo e sua
agenda(equiparaçãodahomo-
fobiaecrimederacismoetc.).
A segunda conjetura quefiz
era que “a era das dissensões
parecerá a umobservador do
futuroterficadonopassado:a
corteatuarácoesapelomenos
até a nomeação dos substitu-
tos deCelso deMello eMarco
Aurélio”.Arigornãohánenhu-
ma surpresa na virtual comu-
nalidade de posições dos mi-
nistros Luís Roberto Barroso
e GilmarMendes nomomen-
to.Semconflitosnaagendade
atuação como corte criminal,
e com razoável consenso na
área comportamental, o dis-
sensoéresidual:envolveques-
tõesnormaisdeinterpretação
constitucional.Oativismopro-
cessual torna-se inócuo. Teri-
amas 11 ilhasdado lugar aum
só continente?
Contraintuitivamente, o in-
quérito das fake news é ele-
mento dissonante do quadro
deatuaçãodoSTFnogoverno
Bolsonaro,porquedizrespeito
àprópriacorte,nãodiretamen-
teàcontençãodoExecutivoou
questões comportamentais.
Ele foi instauradoapósdeci-
sões impopularesdoSupremo
sobrecrimeseleitorais, fundo
partidárioeprisãoemsegun-
da instância.
A reação do ministro Dias
Toffolienvolveutambémoin-
cidente coma revista Crusoé,
em abril do mesmo ano, em
meio a grande controvérsia.
Seu desenlace —revogação
da censura— foi favorável à
corte. Não haverá solução fá-
cil desta vez.
Onze ilhas ou
continente?
-
Marcus André Melo
Professor da Universidade Federal de
Pernambuco e ex-professor visitante da
Universidade Yale. Escreve às segundas
João Montanaro
Só descontrole e impunidade explicam alta de
mortes por ação do Estado durante a pandemia
a eee
opinião
SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A3
Ato pró-democracia
“Ato de torcedores a favor da de-
mocracia acaba em confronto na
Paulista” (Poder, 31/5). Até quan-
do a polícia vai protegermanifes-
taçõesgolpistasaomesmotempo
emquereprimeatospró-democra-
cia?Dequeadiantagovernadores
repudiarempublicamenteasfalas
doBolsonarosepermitemepatro-
cinamosataquesàsinstituiçõesda
Repúblicapelosfascistas?Issotem
umnome: hipocrisia.
Eduardo de Castro (Porto Alegre, RS)
*
Assisti a todas as imagens da Glo-
bo,daBandedaCNN.Emnenhum
momentoviastorcidaspelademo-
craciacombarrasdeferro,coque-
téis molotov ou depredando pro-
priedadepúblicaouprivada.Gen-
tepacífica,querendoprotestarem
prol da democracia. Jogaram pe-
dras depois que foram atacados
por bombaspela PolíciaMilitar.
José Roberto Gomes Rocha
(Aracaju, SE)
*
Saberqueagrandemaioriadapo-
pulação é anti-Bolsonaro é tudoo
queBolsonaronãoprecisavaneste
momento.Derrotar o racismoeo
fascismonopaíséderrotarBolso-
naroeseusapoiadores.Assimserá.
Michael dos Santos Gomes
(Campinas, SP)
*
“Confusão com torcidas é tudo o
que Bolsonaro queria neste mo-
mento” (Poder, 31/5). Geralmente
gosto do que IgorGielowescreve.
Maspensoque jáerahoradeuma
reação, e quando ela vem unindo
torcidas de Corinthians e Palmei-
ras, vejo, ao contrário do colunis-
ta, um futuro sombrio para omi-
liciano instaladonaPresidência.
Edgard Alexandre Júnior
(São Paulo, SP)
*
Faltouoarticulistaanalisaracon-
dutahistóricadaPM.Emdiversos
finaisdesemanavimosbolsonaris-
tasagredindoatémédicosemfren-
teahospitaisouemBrasília.APM
nadafez.Quandoumgrupodetor-
cida organizada aparece, após se-
manasdeprovocações,eleétacha-
do de grupo dematizes violentas
no textoemquestão.Poisbem,as
torcidasabrirãomãodo“inimigo”
tradicional para semanifestarem
juntas pela democracia.
Pedro Guilherme de Andrade
(São Paulo, SP)
*
Sim, senhores, foi dada a largada
paraaguerracivil.Nasemanaque
vemteremoscenasdeselvageria.O
presidentequeraconvulsãosocial
para justificara intervenção.Que-
roverdequeladoasForçasArma-
das vãoficar.
Roberto Carlos Leandro Soares
(Manaus, AM)
Liberdade de expressão
Após ler o editorial “Liberdadede
expressão”(Opinião,31/5)eosco-
mentáriosdeleitores,percebiaau-
sênciademençãoao fatodequea
LeideSegurançaNacional tipifica
comocrimes condutas que visam
derrubar o Estado democrático
de Direito, comomanifestações a
favor de um novo AI-5. Aquela lei
nãovaleapenaspara“comunistas”.
Éprecisoaplicá-la imediatamente
emdefesadaordemdemocrática.
Sadi Medeiros Júnior
(Florianópolis, SC)
Autoritarismo
AentrevistacomoadvogadoAlber-
to Toron (“Autoritarismo de Bol-
sonaroé legadodaOperaçãoLava
Jato”, Poder, 31/5) é deslumbrante
porsualucidez,docomeçoaofim.
Docomeço,quandodeclarasentir
um“cheirodegolpenoar”.Aofim,
quandoexplicaademoradeRodri-
goMaiaemdesencadearoproces-
sode impedimentodeBolsonaro:
condições jurídicas existem, mas
faltam condições políticas, expli-
ca. Só não entendi a afirmaçãode
que “autoritarismo de Bolsonaro
é legadodaOperaçãoLavaJato”.O
autoritarismodeBolsonaroémui-
toantigo,fazpartedesuapersona-
lidade.Não foiprecisoaLava Jato.
Gilberto deMello Kujawski
(São Paulo, SP)
Milico-democracia
ExcelenteoartigodeJoaquimFal-
cão (“Militar da ativa e militar da
reserva”, “Tendências / Debates”,
31/5)! Chegamos à conclusão de
que,mais umavez, o jeitinhobra-
sileirosefazpresente,agoranapo-
lítica. Está sendo criada uma for-
ma paradoxal de governo: a Dita-
duraMilitarDemocrática.
Roberto Cecil Vaz de Carvalho
(Araraquara, SP)
Polícia
“Empresário acusado por violên-
cia doméstica humilhaPMemAl-
phaville”(Cotidiano,31/5).Queesse
atendimentodaPMsejapreserva-
doparafuturascomparaçõescom
o procedimento de policiais que
são contestados nas abordagens.
Já vi muito cidadão tomando ta-
pa na cara apenas por não ter en-
tendidoumaperguntadopolicial.
Rubens Rafael Júnior
(São Bernardo do Campo, SP)
*
Apolícia deMinneapolis tem “ex-
cludente de ilicitude”?
João PauloMendes Parreira
(São Caetano do Sul, SP)
*
Quando o mundo atravessa uma
catástrofe,doisfatosdemonstram
queestasituaçãonãoensinounada
aalguns.NosEUA,GeorgeFloydfoi
asfixiadoporumpolicialpornove
minutos,enquantoimploravapor
“ar”. NoBrasil, JoãoPedro, 14, per-
deu a vida porque um policial o
alvejoupelas costas. Exemplosde
brutalidade.Hámuitoaaprender.
Bruno Karaoglan Oliva (Santos, SP)
Grupo dos 300
Entendoque aFolha, emparticu-
lar, e amídia, emgeral, devampa-
rardechamarafanáticabolsonaris-
taSaraFernandaGirominide “Sa-
ra Winter”. Isso a empodera e lhe
dá destaque, bem como aomovi-
mentoantidemocraticodequeela
fazparte.Elaadotouessepseudô-
nimopropositalmente:vemdeSa-
rahWinter,defensoranazistabritâ-
nica ativa nas décadas de 1920-30.
Chamem-na pelo nome de batis-
mo,assimdeixarãodefazerojogo
da turba antidemocrática.
Bolívar Arsênio Silva (São Paulo, SP)
Fake news
Éincoerentesustentarqueoinqué-
rito das fake news precisa prosse-
guir mesmo sendo teratogênico,
comofazoeditorial “Livreexpres-
são” (Opinião, 31/5). Há, no orde-
namento jurídico brasileiro, mei-
osadequadosparaaapuraçãodos
supostos crimes, situação que re-
vela o absurdo do apelo a mons-
truosidades jurídicas.
João Paulo Zizas
(São Bernardo do Campo, SP)
Pássaros migratórios
Maravilhosa a reportagem na Fo-
lha Corrida de 31/5. Muito inte-
ressante o comportamento des-
sas avesmigratórias. Mostra a sa-
bedoriaquehánomundoanimal.
E alémde tudo as aves são lindas.
Marcos Fernandes de Carvalho
(São Paulo, SP)
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Inconveniente a publicidade, em
página inteira, da manifestação
de um pastor da Igreja Maranata
neste domingo (31/5). Sou cristã,
de outra vertente, mas me senti
agredida pela exaltação de cren-
ças religiosas em um veículo co-
mo a Folha, sempre tão preocu-
padaemvalorizar a ciência e a ra-
zão.Nãoeranecessário.Ficaclara
aposturado“pagou, levou”.Prefe-
riria que o jornal mantivesse sua
postura isenta, mesmo diante da
oferta de pagamento.
Ana Paula deMattos Freire
(Belo Horizonte, MG)
PAINELDO LEITOR
folha.com/paineldoleitor leitor@grupofolha.com.br
Cartas para al. Barão de Limeira, 425, São Paulo, CEP 01202-900. A Folha se reservao
direito de publicar trechos das mensagens. Informe seu nome completo e endereço
TENDÊNCIAS/DEBATES
folha.com/tendencias debates@grupofolha.com.br
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular
o debate dos problemas brasileiros emundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo
Estamos em uma época difícil pa-
ra tentar regular a desinformação.
O medo da pandemia e a crise po-
lítica deixam a população vulnerá-
velaqualquertipodesoluçãomági-
ca.O ideal seriaopaísdiscutir oas-
sunto comprofundidade ematuri-
dade,ponderandoentre terounão
regulaçãoe,umavezdecidoaadotá-
la,definirqual tipoderegulaçãoéo
maisadequado.Issodeveriaserfeito
emdebatecomaacademia,asocie-
dadecivil eossetores interessados.
Não é esse o caminho sinaliza-
do pelo Congresso, que mostra ur-
gência, agindo sob a crença de que
umaleiacabarácomasnotícias fal-
saseapaziguaráacrisepolítica.Es-
sapressaéequivocada,porquedes-
considera-sequeumadasrazõesda
existênciadadesinformaçãoéade-
mandadaspessoasporinformações
com forte apelo emotivo, que con-
firmemsuas visões.
Seinevitável,qualquerpropostale-
gislativa deveria conceituar doque
se trata. Desinformação é um con-
teúdocomprovadamentefalso,dis-
seminado com o propósito e o po-
tencial de causar danos. Desinfor-
maçãonãoéanotíciaquevocênão
gosta de ouvir, ou que acredita ser
ofensiva.Nãoétambéma informa-
çãoerrada, veiculada semodevido
cuidado.Nãoéainformaçãoincom-
pleta, pois cada veículo é soberano
nadecisão dequal aspecto danotí-
cia seater commaisprofundidade.
Desinformação tambémnão éopi-
nião ou interpretação—nem a sá-
tira ou a paródia. Para se chegar a
um conceito, é necessário perqui-
rir simultaneamente sobre a natu-
reza do conteúdo e amotivação de
quemodivulga.
Napropostaquecirculacommais
forçanoCongresso,asempresasde
internetsofrerãobloqueioseserão
multadassenãoagiremcontracon-
teúdos criados por seus usuários.
Nessa proposta, delega-se às redes
sociais e aos aplicativos demensa-
gens a ingrata e impraticável tarefa
debanir informações, oqueprova-
velmente trará restrições a expres-
sões legítimas. Aposta-se ainda na
ideiade tornar lei oque já vemsen-
do feito pelas empresas, o que en-
gessasoluçõesfuturas.Apressades-
prezaasoluçãoeuropeia,emqueas
empresas se obrigam a códigos de
conduta construídos por elasmes-
mas em conjunto com a sociedade
civil e as instituições.
Ainda,sepassaaolargodeenfren-
tarumverdadeirocomérciodefrau-
des,comodisparosemmassae“cur-
tidas”artificiais.Embuscadeaudi-
ência,algumasempresas, semnem
mesmosedarconta,anunciamem
sitessensacionalistasecheiosdebo-
atos.Umaabordagemdemocrática
passaporconceituarotermoedis-
tribuirdiferentesresponsabilidades
para diferentes agentes, de acordo
com o papel que cumprem, e não
colocar as plataformas de internet
para filtrarem conteúdo sem cri-
vo claro e sob ameaçadebloqueio.
Quem defende iniciativas ima-
turas de combate à desinforma-
ção, sob o argumento de proteger
a democracia, precisa ser alerta-
do que somente é possível prote-
ger o que se tem, e que só se tem
democracia com garantia à liber-
dade de expressão. Esforços para
combateradesinformaçãonãopo-
dem estar desinformados.
Nota dos autores: a expressão em inglês que
corresponde à desinformação é deliberadamente
omitida neste texto por ser utilizada por
governantes para desacreditar a imprensa.
Pandemia,crisepolíticaeeconômi-
ca,desrespeitoàsinstituições,ame-
aças à democracia. Nesta segunda-
feira (1º), Dia da Imprensa, hámes-
mooquecomemorarnoBrasil?Per-
guntadifícil, commúltiplasrespos-
tas.Noquetocaà imprensaépossí-
vel responder sim e não. Primeiro,
o sim. A mais importante lição da
pandemia para o jornalismo brasi-
leiro é o resgate de sua credibilida-
depelopúblico.Emmeioatantade-
sinformação—as famigeradas “fa-
ke news”—, onde buscar informa-
çãodequalidade,apuradacommé-
todo e rigor? Nos veículos profissi-
onais de mídia, como jornais, TVs,
rádios e sites de notícias. Foi o que
confirmaramduaspesquisas feitas
emmarçode 2020.
Realizado com 10mil pessoas em
dez países, incluindo o Brasil, o le-
vantamento da Edelman mostrou
que 59% dos brasileiros (64% no
mundo) buscam informações con-
fiáveis sobre a pandemia nos mei-
os de comunicação tradicionais. Já
apesquisaDatafolha,queouviu1.558
pessoasnopaís,chegouàconclusão
semelhante:61%dosentrevistados
confiam nos programas jornalísti-
cosdeTV;56%,emjornais;50%,em
rádio;e38%,emsitesdenotícias. Já
conteúdos que circulam por plata-
formas comoWhatsApp e Facebo-
ok só foram apontadas como con-
fiáveis por 12%dos entrevistados.
Esseéoladopositivodapandemia
para a imprensa. E o negativo? É o
agravamentodacrise sofridapelos
veículos de mídia, cujo modelo de
negócios tradicional vem fazendo
águadesdeosurgimentodainternet,
na segundametade dos anos 1990.
Com a queda na receita de publici-
dade, os meios têm tentado diver-
sificar as fontesde renda, comoco-
brarporassinaturasdigitaise fazer
conteúdo customizado para anun-
ciantes.Masnãotemsidosuficiente
parasegurarosempregosnasReda-
ções, que têmencolhidoanoaano.
Comapandemia, o que se viu no
mundo e no Brasil foram propos-
tasdereduçãodejornadaesalários
e demissões. Apoiados na MP 936,
que criou o Programa Emergenci-
aldeManutençãodoEmpregoeda
Renda, com medidas trabalhistas
alternativas durante a crise da Co-
vid-19, veículos têmfeitoacordoou
demitidofuncionários.Sobrecarre-
gadospelacoberturaintensaepelos
riscos à saúde, nemtodosos jorna-
listastêmcolhidooslourosdoreco-
nhecimentopúblicodeseutrabalho.
Háaindaumsegundoaspectone-
gativo,quesecontrapõeaoreconhe-
cimentoconquistadodesdeoinício
da crise sanitáriamundial. É opro-
cessodedeslegitimaraimprensa,o
jornalismoeosjornalistas.Quando
autoridades públicas, como o pre-
sidente Jair Bolsonaro, emilitantes
políticosradicais investemcontraa
mídia,desqualificandooseutraba-
lhodeinformarasociedade,nãofa-
zemmaisdoqueatacaromensagei-
ro. Mas toda ação gera uma reação
—oupelomenosdeveria.Cansados
de ver seus profissionais agredidos
verbalmente no cercadinho diante
do Palácio do Alvorada por Bolso-
naroeapoiadores, veículos tradici-
onais, como Folha e Grupo Globo,
tomaram uma decisão importante
nodia25demaio:retiraramospro-
fissionaisdolocalatéquesejagaran-
tida a sua segurança.
Pior quando os ataques descem
aonívelpessoal,comomostramda-
dos coletados pela Abraji (Associa-
çãoBrasileiradeJornalismoInvesti-
gativo).Em2019,houvenoBrasil59
registrosdediscursoestigmatizante
feitospor agentespolíticos epúbli-
cos contra jornalistas; em 2020, fo-
ram 39 até agora. Os casos de assé-
dio virtual foram 30 em 2019 e che-
gama 20neste ano. Desde a chega-
da da pandemia, a Abraji registrou
24violaçõesà liberdadede impren-
sa entre 1º demarço e 21de abril.
Entre as jornalistas mulheres, a
situação é ainda mais grave, pois
o assédio assume contornos ma-
chistas e misóginos, como mos-
tramos casos recentes dePatrícia
Campos Mello e Vera Magalhães,
entre tantos outros.
Apesar do cenário desalentador,
o jornalismo vive e sobreviverá à
pandemia. Seupapeldefiscalizaro
Estado e os Poderes seguirá, pois é
vital a toda democracia. Ideal seria
quea imprensaeseusprofissionais
fossem respeitados e tivessem um
ambienteseguroparatrabalhar,ga-
rantido pelo Estado. Aí, sim, se po-
deria comemoraroDiada Impren-
sa emsuaplenitude.
Dia da Imprensa: há o que comemorar?
Desinformados
-
Cristina Zahar
Secretária-executiva da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)
-
Taís Gasparian e Francisco Brito Cruz
Advogada e sócia do escritório Rodrigues Barbosa, Mac Dowell de Figueiredo, Gasparian - Advogados,
integra o Conselho Consultivo do InternetLab, centro de pesquisa em direito e tecnologia
Doutor em direito pela USP e diretor do InternetLab
Pandemia resgatou a credibilidade do jornalismo profissional brasileiro
Faltam debate e profundidade no caminho sinalizado pelo Congresso
[
Com a pandemia, o que
se viu nomundo e no
Brasil foram propostas
de redução de jornada
e salários e demissões.
(...) Sobrecarregadospela cobertura intensa
e pelos riscos à saúde,
nem todos os jornalistas
têm colhido os louros
do reconhecimento
público de seu trabalho
[
Na proposta que circula
commais força no
Congresso, as empresas
de internet sofrerão
bloqueios e serão
multadas se não agirem
contra conteúdos criados
por seus usuários.
(...) Delega-se às redes
sociais e aos aplicativos
demensagens a ingrata
e impraticável tarefa
de banir informações,
o que provavelmente
trará restrições a
expressões legítimas
Opássaro Verão, também
chamado Príncipe, que vive entre
Argentina e Brasil Fabio Schunck
a eee
Jornal filiado ao IVC
Circulação paga às segundas de abr.2020, impresso mais digitais (IVC) 337.585 exemplares
Páginas vistas no site da Folha em abr.2020 (Google Analytics) 428.386.671
Visitantes únicos no site da Folha em abr.2020 (Google Analytics) 73.786.377
Que polícia é essa que tolera
manifestações antidemocráticas contras
as instituições e agride atos pela democracia?
Do deputado federal Marcelo Ramos (PL-AM), sobre a ação das PMs de
São Paulo e do Rio contra protestos neste domingo (31)
TIROTEIO
comMariana Carneiro e Guilherme Seto
Apesar da disposição demonstrada pelo STF de ten-
tar imporlimitesaJairBolsonaro, integrantesdaclas-
sepolíticaedoJudiciárioavaliamqueasprincipais in-
vestigações em andamento ainda dependemde pro-
vas inquestionáveis e pressão social para prospera-
rem. Isso porque o único comprerrogativa para ofe-
recer denúncia é o procurador-geral, Augusto Aras,
que vemmanifestandodiscordância comoSupremo
e afinidade comaspautas dopresidente.
Tabuleiro
fechado Segundopolíticose
magistradosouvidospeloPai-
nel,porenquantoosinquéri-
tos têm como efeito prático
aumentar tensões e, no má-
ximo,desgastara imagemde
Jair Bolsonaro. Se nada mu-
dar, as apurações estarão fa-
dadas ao fracasso.
livre Oprocurador-geral foi
contra todas as medidas de
buscaeapreensãonainvesti-
gaçãode fakenews.Nosbas-
tidores,eletambémtemdito
não ver indícios de que Bol-
sonarotenhapraticadoqual-
quer tipo de crime no caso
queapurainterferêncianaPF.
respeito Nanotaoficialque
divulgouàs23h25dasexta-fei-
ra (29) para dizer que estava
incomodado comas especu-
laçõesdeseunomeparauma
vaganoSupremo,Arasnãoci-
touumasóvezBolsonaro,que
umdia antes fez referência à
situação, dizendo que consi-
derava seu nome para uma
terceiravaga,hojeinexistente.
protesto Oabaixo-assinado
feitoporprocuradoresafavor
doprocessotradicionaldees-
colhadoPGR,ouseja,contra
Aras, jáchegoua641adesões
nofimdesemana.Ascoletas
continuam.
recado Apesardenãoter ti-
do nenhum resultado prá-
tico, o HC assinado por An-
dréMendonça (Justiça) para
protegerAbrahamWeintraub
(Educação) foibemrecebido
no Supremo.
legitimidade Ainterpretação
é que foi umademonstração
de respeito ao STF e que aju-
dou a lembrar o presidente
quais sãoos caminhosquan-
do há discordância de uma
ordem judicial.
atenção OConpeg,quereú-
neprocuradoresgeraisdoses-
tados,disseemnota sepreo-
cuparcomacriminalizaçãoda
atuaçãodegestoresnapande-
mia. A entidade afirmouque
nem toda contratação emer-
gencial é ilícita. Amanifesta-
çãoocorreapósasprimeiras
operações deflagradas con-
tra supostos desvios na crise
do coronavírus.
cartola Na representação
contra o governador Wilson
Witzel(PSC),oMinistérioPú-
blico citou um dirigente do
Botafogo,vinculando-oaum
contratodeR$12milhões,sus-
peito de fraude.
alvo A empresa Speed, su-
postamente contratada pa-
ra distribuir medicamentos,
apresentou ao governo um
emaildeumescritóriodead-
vocacia,oRouxinol&Rivera,
queseriadeAnibalRouxinol.
nãoécomigo Nomesmoen-
dereço, diz o MPF, funciona
o CNPJ do filho dele, Anibal
Rouxinol Segundo, gerente
jurídicodoclube.Elessusten-
tamnessesdadosadesconfi-
ançasobreaempresa.Odiri-
gentediznuncaterouvidofa-
larnaSpeed,assimcomoseu
pai. O filho afirma que criou
a empresa jurídica somente
para receberpagamentosdo
Botafogo.
boiada O secretário de pro-
dutividadedaEconomia,Car-
losdaCosta,temditoaauxili-
aresquepretendedarlargada
aumadesregulamentaçãora-
dicalemsetoreseconômicos.
troca Na semana passada,
ele tirou o economista Cé-
sar Mattos da secretaria de
Advocacia da Concorrência
eCompetitividadeecolocou
Geanluca Lorenzon, egresso
do Instituto Mises, de linha-
gem liberal.
quem manda Internamen-
te, fala-se que Carlos da Cos-
taqueracionarumadesregu-
lamentaçãoselvagemdaeco-
nomia. Jáosecretáriodiz,no
entanto, buscar responderà
ordem de Jair Bolsonaro, de
“retirar o Estado do cangote
do empreendedor”.
bic ÀrevistaCrusoé,oex-mi-
nistro SergioMorodisse que
o presidente deixou de vetar
algunspontosnoprojeto an-
ticrime para proteger seu fi-
lhoFlávio.Umdosartigosque
Bolsonaro deixou passar foi
usadopeloex-PMAdrianoda
Nóbrega, ligadoàfamília,em
umatentativadehabeascor-
pus,ummêsantesdemorrer,
comomostrouoPainel.
Camila Mattoso
painel@grupofolha.com.brPAINEL
MG, PR, RJ, SP
R$ 5 (seg. a sáb.)
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Redação São Paulo
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Outros estados
R$ 1.460
GRUPO FOLHA
A4 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020
poder coronavírus
Estamos
Juntos
Reúne artistas,
empresários e
intelectuais de
campos ideoló-
gicos diversos
Basta!
Organizado
por juristas e
advogados, o
movimento
tem aproxima-
damente 700
assinaturas
As Forças
Armadas e a
Democracia
Manifesto pede
que as Forças
Armadas
respeitem a
democracia
Presidentes
dos TJs
Presidentes
dos 27 TJs
manifestaram
“integral apoio”
ao STF, alvo
de ataques de
Bolsonaro
Procuradores
Manifesto
pediu a
aprovação de
uma proposta
que obrigue o
presidente da
República a
escolher a che-
fia da PGR por
meio de uma
lista tríplice
ComissãoArns
Entidade diz se
preocupar com
“manifestações
desestabiliza-
doras feitas
por agentes
públicos”
Somos 70
por cento
Campanha
contra o
presidente
com apoio de
celebridades
como a apre-
sentadora Xuxa
-Fábio Zanini
são paulo Uma profusão de
manifestosemfavordademo-
craciaapósataquesdopresi-
denteJairBolsonaroainstitu-
ições tomou as redes sociais
e as páginas de jornal nos úl-
timos dias, buscando recriar
umcerto climadeDiretas Já.
Seacomparaçãocomomo-
vimento de 1984 ainda pode
soar um tanto exagerada, há
umparaleloevidenteentreos
doismomentos. O principal,
a união de adversários ideo-
lógicoscontrauminimigoco-
mum, associadoaoautorita-
rismo.Emgeral,contudo,não
hádefesaexplícitadoafasta-
mentodopresidente.
Amaior iniciativaéoMovi-
mentoEstamosJuntos, lança-
do no sábado (30) e que res-
gata a cor amarela—símbo-
lonoDiretas Já.Nofimdese-
mana, arrebanhou assinatu-
ras online ao ritmo de 8.000
por hora, e já reuniamais de
150milnodomingo(31). “Co-
moaconteceunomovimento
DiretasJá,éhoradedeixarde
ladovelhasdisputasembusca
dobemcomum”, diz o texto.
A lista de signatários vai de
apoiadoresdosocialismoade-
fensores do Estado mínimo.
Osmanifestantesafirmamre-
presentarmaisdedois terços
dapopulação,referindo-seao
apoiodecercade30%aBolso-
naroregistradosempesquisas
doDatafolha eoutros.Háaté
mesmo ummovimento cha-
mado “Somos 70 porcento”,
queganhouas redes sociais.
Noentanto,entreosnomes
maisreconhecíveis,parecem
rarososconservadoresedis-
sidentesdobolsonarismo—o
músico Lobão éumdeles.
Otextonãocitaopresiden-
te,masmandarecadoaeleao
cobrarrespeitoàConstituição
e à separaçãodos Poderes.
Uma das apoiadoras, a so-
ciólogaMaria Victoria Bene-
vides, tem larga experiência
emoutrasmobilizações. Em
abril de 1984, participou de
umafotohistóricanotopodo
prédiodaFolha,nocentrode
SP,emque61personalidades
pediameleições diretas.
“Estávamosnumasituação
de quemestá saindo de uma
ditaduraeagoranossomedo
é estarmos entrando numa.
Porisso que émais fácil essa
união de tucanos com petis-
taseoPDT,oueconomistaor-
todoxosquesealiamaoutros
de esquerda”, afirma.
Benevides, que é membro
Manifestospró-democracia
buscamclimadeDiretas Já
após ataquesdeBolsonaro
Textos defendendo a Constituição e a independência de Poderes unem
adversários ideológicos; procuradores e juízes também semobilizam
Houveaindaoutrosposici-
onamentos, comoodoColé-
gio de Presidentes de Tribu-
nais de Justiça, que se mani-
festouemdefesadoSTF (Su-
premo Tribunal Federal) na
última sexta (29).
Naquinta(28),ummanifes-
toassinadopor535 integran-
tes doMinistério Público Fe-
deraldefendeuemendaobri-
gandoopresidenteaescolher
paraaProcuradoria-Geralda
Repúblicanomeapartirdelis-
tatríplice.OatualPGR,Augus-
toAras, não fezparteda lista
eévistoporpartedosprocu-
radorescomopró-Bolsonaro.
Também houve manifes-
tos recentes de caráter seto-
rial,emáreascomomeioam-
biente e relações exteriores.
ParaJoséCarlosDias,ex-mi-
nistro da Justiça no governo
FHC e presidente da Comis-
sãoArns,éprecisoconsolidar
umamaioriadedemocratas,
mesmolevandoemcontaque
umterçodapopulaçãosegue
apoiandoopresidente.
AúltimapesquisaDatafolha
mostrouque43%consideram
ogovernoruimoupéssimo,re-
cordenagestão,masaaprova-
çãoaBolsonaroseguiaem33%.
“Temos que ter união. As
forças democráticas de vári-
astendênciaspolíticasdevem
estarpresentesnestemomen-
to, comonasDiretas, emque
subiramnomesmopalanque
Tancredo,Ulysses,Fernando
Henrique e Lula”, diz.
Em 17demaio, aComissão
Arns defendeu em texto na
Folha a saída de Bolsonaro.
“Ao semear a intranquilida-
de,a insegurança,adesinfor-
maçãoe, sobretudo, ao colo-
car emriscoavidadosbrasi-
leiros, o seu afastamento do
cargo se impõe”, disse.
Segundo Dias, o novo vale
do Anhangabaú, ao menos
enquantodurarapandemia,
são as redes sociais. “Temos
que atuar em defesa da im-
prensa livre, das instituições
edaliberdade.Somosmuitos.”
ArazãoparaaojerizaaBol-
sonaro, dizemosapoiadores
dos manifestos, vem do que
se poderia caracterizar co-
mo “conjunto da obra”, que
reúne ataque a instituições e
menosprezoaocoronavírus.
“A gente concorda empou-
cascoisas,masnessemomen-
to estamos unidos no funda-
mental. Não é possível a con-
tinuidadedeumgovernoque
promoveamorte”,dizDouglas
Belchior,daUneafroBrasileda
CoalizãoNegraporDireitos.
APOIADORES DE BOLSONARO VOLTAMA SE REUNIR EMBRASÍLIA
Manifestantes repetiramneste domingo (31) ato em frente ao Planalto com ataques ao STF e ao Congresso e a
favor do presidente, que andou de helicóptero e de cavalo Leia na pág A6
$
QUEM SE
MANIFESTOU
da Comissão Arns de Direi-
tos Humanos, diz ter assina-
doincontáveismanifestosno
passado e nota uma diferen-
ça para os dias atuais.
“Antigamente eu conhecia
todo mundo. Hoje participo
comgentequenemconheço,
ougentequeeuvejoedigo:‘pu-
xa,nuncapenseiqueessapes-
soa poderia estar assinando
ummanifesto juntocomigo’.”
Outroquefigurana fotode
1984, o economista e ex-mi-
nistroLuizCarlosBresserPe-
reiratambémassinouonovo
manifesto.“OBrasil temuma
democraciaconsolidada,mas
umpresidentepsicopataque
aestáameaçandodiariamen-
te compalavras e atos”, diz.
Defensordoimpeachment,
Bresser afirma que a impor-
tânciademanifestoseabaixo-
assinados é mostrar a depu-
tados que o afastamento do
presidente é possível.
Neste domingo (31), outro
manifesto surgiu, voltado ao
meio jurídico. Com o título
deBasta!, reúnecercade720
profissionais dodireito.
“O Brasil não pode conti-
nuar a ser agredido por al-
guém que, ungido democra-
ticamente ao cargo de presi-
dente da República, exerce o
nobre mandato que lhe foi
conferidoparaarruinarcom
osalicercesdenossosistema
democrático”, afirma.
Uma das apoiadoras, a ad-
vogada e professora da FGV
Flávia Rahal diz que omani-
festo reúne “vozes em defe-
sa dademocracia”. “Esse e os
outros manifestos são a uni-
ãodepessoasquepodemter
posturas ideológicasdiferen-
tes,masveemnamanutenção
dademocracia apeçaprinci-
palparaorespeitoàConstitu-
içãoeàsinstituições”,afirma.
Chamaaatenção, segundo
ela, a velocidadecomquees-
ses documentos têm obtido
apoio.“Empoucotemporeu-
nirammuitagente. Issomos-
traumdesejodaspessoasde
saírem da inércia e agirem
pelo respeito à democracia.”
Ofatodeacriseocorrerem
meio à pandemia do corona-
vírus torna mais fácil reunir
apoiosonline,jáquemanifes-
taçõesderuaouemambientes
universitáriosnãosãoopção.
Issopodeajudar a explicar
amultiplicaçãodeiniciativas.
No sábado (30), outro docu-
mento comexpoentes dodi-
reito teve 170 assinaturas em
defesadequeasForçasArma-
dasrespeitemaConstituição.
Wagner Pires/Futura Press/Folhapress
a eee
coronavírus poder
SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A5
Osbolsonaristas falarammais
de golpe de estado na semana
passadadoqueesta colunano
últimoanoemeio,oqueéumfei-
to admirável. Do “Acabou, por-
ra”deBolsonaroao“nãoéques-
tãodese,édequando”deEduar-
doBolsonaro,passandoporOla-
vodeCarvalhopedindoaexecu-
ção de Alexandre deMoraes, o
jogoestácadavezmaisaberto.
Bolsonaronuncatevetantos
motivosparadarumgolpe.Seja
pelosatentadosàdemocracia,
pelasabotagemàsaúdepúbli-
ca ou pelo aparelhamento da
PolíciaFederal, é difícil imagi-
nar um cenário em que o Bra-
silcontinuetendoleieBolsona-
ronãotenhaproblemas.Ainda
temideologia,aindatemproje-
todepoder,masagoraogolpe
é para fugir da polícia.
Aschancesdesucessodeum
golpe bolsonarista já foram
maiores:quandotinhamMoro
eolavajatismonamão,quando
tinhamo dobro de aprovação
popular,quandoareeleiçãode
Trump parecia certa, quando
aindahavia quemacreditasse
emPauloGuedes,quandoBol-
sonaroaindanãohavia sidoo
pior governante domundono
combate à pandemia.
Mas mesmo um golpe fraco
pode ser bem-sucedido se não
encontrar resistência.
Éprecisofazerumafrentecon-
traoautoritarismodeBolsona-
ro,e,seelaforfeita,elavaivencer.
Elaseráforteosuficienteparain-
timidareconverterosgolpistas
prudentes, seráforteosuficien-
teparadestruirosimprudentes.
Não é fácil montá-la. Será
umafrentedegenteque jábri-
gounolimitedesuasforçaspa-
ra derrotar outros membros
da frente, de gente que já per-
deucargosporcausadeoutros
membros da frente, que já foi
sacaneada por outros mem-
bros da frente, que acha (em
mais de um caso, com razão)
queoutrosmembrosda frente
sãoresponsáveisporestarmos
na situação emque estamos.
O ideal é que essa seja, inclu-
sive, uma oportunidade para
conversar, para dar uma olha-
danoqueosoutrosdemocratas
estãopensando,quemsabedali
nãosaialgoquesirvaparasua
própriareflexão?Podeseruma
chancedecurarressentimentos
e construir novas alianças. Es-
sas polinizações cruzadas não
são raras emmomentos como
esse.Odebatesobrearendabá-
sica, por exemplo, parece estar
cruzandofronteirasideológicas.
Apandemiafortaleceuosgo-
vernadores, eosgovernadores
deesquerdavinhamsendomais
moderadoseabertosaodiálo-
go do que vários parlamenta-
res progressistas (o que é nor-
mal, governadores precisam
conquistarmaiorias).Podeser
omomentodeseconstruirum
novoprogramadecentro, que
aindanãoexiste.Quemnãoqui-
ser dar palpites sobre os ter-
mos de sua reconstrução po-
de passar o resto da vida cor-
rendo atrás dele depois.
Mas se não der para fazer
nada disso, não importa, va-
mosemfrente,todomundocom
seusressentimentos,todomun-
docomasferidasabertas,cada
um defendendo uma coisa di-
ferente, unidos apenas napre-
servaçãodademocraciacons-
titucionalbrasileira.Ninguém
precisavotarnomesmocandi-
dato, levantaramesmabandei-
ra, falarcomomesmovocabu-
lário.Sóénecessárioquesees-
tejadispostoadefenderaliber-
dadedoadversáriomaisdoque
o próprio programa.
A única certeza é que a re-
pública se lembrará de quem
não a tiver defendido quando
elaestavasobataque,quando
seusfilhosmorriamsemsocor-
ro. E nenhum trilhão que não
veio vai servir de álibi.
É preciso fazer uma frente contra o autoritarismo, e, se feita, ela vai vencer
-
Celso Rocha de Barros
Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra)
Democratas vs. Golpistas
dom.ElioGaspari, JaniodeFreitas |seg. CelsoRochadeBarros |ter. Joel PinheirodaFonseca |qua. ElioGaspari, ConradoHübnerMendes |qui. FernandoSchüler |sex. ReinaldoAzevedo|sáb. DemétrioMagnoli
Quando cessa o diálogo, cessa a razão, irrompe a intolerância
OPINIÃO
Viversobdemocraciasignifica
aceitardiferenças,pressupõe
submeter-seàregradamaio-
ria,observadoscontrolesde-
mocráticos necessários para
queessamaiorianãoaniqui-
le os demais.
A maioria, expressa no ci-
clo eleitoral, é amagia desse
sistema,quepermiteaoEsta-
do ir se conformando às de-
mandasdasociedade,recon-
figurandoseupapel,continu-
amente,porqueoEstadonão
é um fim em si mesmo, mas
expressãodoDireitoparaor-
ganizar a vida emconjunto.
Os controles sobre o po-
der,portanto,sãofundamen-
tais para evitar que maiori-
as –transitórias por nature-
za– assenhorem-se do Esta-
docomfinalidadesindevidas.
Devemoscuidarparaquees-
sescontrolesoperemcomal-
tivez e independência, guia-
dos pelo Direito, para que os
desviantessejamcoarctados.
SomenteoDireitopodecon-
trolar e conduzir a força. A
Constituição não é uma pes-
soa, nem uma seita: ela re-
presenta umconsensomíni-
mo que nos faz a todos inte-
grantesdeummesmopaís.A
interpretação de suas regras
nos compete a todos; mas a
últimapalavra éda Suprema
Corte.Ea revisãode suasde-
cisões se faz por intermédio
dasprópriasregrasdoDireito.
Não podemos transigir com
essas regras básicas.
Um sistema com essa con-
formaçãoresisteàmudança.
Eresistirnãoéruim,sobretu-
doquandosetratade limitar
o poder. Quando cessa o diá-
logo, cessa a razão, irrompe
a intolerância. Matilhas sali-
vam contra honras e reputa-
ções.Mudamaosabordoven-
to a direção de seus ataques.
Esse estado de coisas neces-
sita de umbasta. Basta!
O exercício diário da tole-
rância –sobretudo do diálo-
go– é o que permite convi-
vermos com aquilo que não
noséfamiliar.Toleramospo-
sição contrária à nossa na
expectativa de que logo se-
rá anossa vez, ou, aomenos,
o momento de tentarmos,
mediante eleições livres e
justas, escolhermos os nos-
sos pontos de vista.
Quaissãonossospontosde
vista?Osmaisdiversospossí-
veisqueseapresentemnuma
sociedade aberta. Com uma
exceção: essa tolerância não
pode admitir que atentem
contra esse sistema, para fi-
car numa palavra em voga.
Nisso reside o paradoxo da
intolerância, formulado por
Karl Popper: há uma fron-
teira para aceitar a diferen-
ça, e essa fronteira se esta-
belece justamente quando
se coloca em risco a plurali-
dade que as nossas institui-
ções,mesmocomtodassuas
falhas e defeitos, significam
para nos garantir.
Nãoaceitaremosqueesses
limites sejam esgarçados, a
quepretexto seja.
OpoderdoEstado,quefun-
cionacomoumguiaparapro-
duzir a força de uma nação,
semal-usado a conduzirá ao
precipício. Assistimos atôni-
tos a essa condução até este
momento. Até.
Ombreemosas instituições
–e seus representantes– que
buscam confrontar o abuso.
Confiremo-lhes apoio; faça-
mo-lo às iniciativas de con-
tençãodabarbárie.Quisahis-
tória que fossem essas mu-
lheres e homens que, inves-
tidos de autoridade, esti-
vessem à frente dessa bata-
lha. Estejamos com eles e ao
lado de quemmais se dispu-
ser a controlaropoder.
Poishá tempodereversão,
antesdas“consequências im-
previsíveis”.
Basta!
Sebastião Botto de Barros
Tojal, Sérgio Rabello Tamm
Renault, Pierpaolo Cruz
Bottini e Igor Sant’Anna
Tamasauskas
Advogados, são integrantes do Basta!
a eeeA6 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020
Bolsonarista querditadura, diz decanodoSTF
Emmensagem a colegas, Celso de Mello compara Brasil com Alemanha na ascensão de Hitler e sofre críticas pelo tom
-Mônica Bergamo
e Igor Gielow
sãopaulo OministroCelsode
Mello,decanodoSTF(Supre-
mo Tribunal Federal), disse
queobolsonarismoqueruma
ditaduramilitar instaladano
Brasil. Amensagem foi envi-
ada a colegasda corte, e cau-
souumagranderepercussão
nomundopolítico.
Notexto,eledizquea“inter-
vençãomilitar,comopreten-
dida por bolsonaristas e ou-
tras lideranças autocráticas
quedesprezama liberdadee
odeiam a democracia”, nada
mais é “senão a instauração,
no Brasil, de uma desprezí-
vel e abjetaditaduramilitar”.
Mellocomparouomomen-
tovividopeloBrasilcomoda
Alemanha durante a ascen-
são do ditador nazista Adolf
Hitler (1889-1945).
“Guardadas as devidas pro-
porções, o ‘ovo da serpente’,
à semelhança do que ocor-
reu na República deWeimar
(1919-1933)pareceestarpres-
tesaeclodirnoBrasil”,dizele,
emprestando o título o clás-
sico filme de Ingmar Berg-
man (1977) sobre a ascensão
donazismo.
“É preciso resistir à destrui-
ção da ordem democrática,
para evitar o que ocorreu na
República de Weimar”, afir-
mouMello, emreferência ao
sistema de governo alemão
do entreguerras.
“Quando Hitler, após eleito
pelo voto popular e posteri-
ormente nomeado pelo pre-
sidentePaulvonHindenburg
comochancelerdaAlemanha,
nãohesitouemrompereem
nulificaraprogressista,demo-
cráticaeinovadoraConstitu-
içãodeWeimar”, disse.
A mensagem veio no mo-
mentoemqueBolsonaroinsi-
nuasemprequepossívela in-
vocaçãodoartigo142daCons-
tituição,queprevêquePode-
res possam chamar os mili-
tares para aplacar anarquia.
Mello é o relator do inqué-
ritosobreasacusaçõesdoex-
ministro Sergio Moro sobre
interferência de Bolsonaro
naPolícia Federal.
Sua manifestação, que ele
emnotadisse ter sidoemca-
ráter pessoal e não instituci-
onal, levou a imediatas acu-
sações de suspeição por par-
tedosfilhosdeBolsonaroem
redes sociais.
SegundodisseàFolhaomi-
nistro GilmarMendes, ama-
nifestação não veio em boa
hora.AojornalOEstadodeS.
Paulo, ele disse que “não de-
vemosacenderfósforospara
versehágasolinanotanque”.
Mello fez a afirmação an-
tes dos protestos do domin-
go, em que Bolsonaro nova-
mente prestigiou ato na Es-
planadadosMinistérios pre-
gandogolpismocontraoSu-
premoecontraoCongresso.
Outro ministro da corte,
falando sob reserva, se dis-
sepreocupadocomasuspei-
ta que a afirmação trará so-
bre Mello enquanto preside
um inquérito de grande pe-
so contra o presidente.
Em São Paulo, houve ma-
nifestação contrária ao pre-
sidente comtorcidas organi-
zadasdefutebol,queacabou
emconfusãocomaPolíciaMi-
litareativistasbolsonaristas.
Nasemanapassada,Bolso-
narocompartilhouovídeode
uma entrevista em que o ju-
ristaIvesGandraMartinsde-
fendequeasForçasArmadas
podemagir comopodermo-
derador, de forma pontual,
quando houver impasse en-
tre os demais Poderes.
O climade tensão institucio-
nalémalvistopeloserviçoati-
vo das Forças Armadas, que
rechaçamhipótesesgolpistas.
Incomodoumuitogenerais,
almirantes e brigadeiros ou-
vidosnodomingopelaFolha
o fato de oministro da Defe-
sa, general Fernando Azeve-
do, ter dividido o helicópte-
rousadopelopresidentenes-
te domingo.
Bolsonarosobrevoouama-
nifestação golpista a seu fa-
vor com Azevedo a seu lado,
embora não tenha sido visto
nosmomentossubsequentes
dodesempenhopresidencial,
queincluíramumacavalgada.
Detalhe: era um aparelho
camuflado da Força Aérea, e
nãoousualhelicópteropinta-
dodebrancodaPresidência.
Na semana passada, Aze-
vedo já havia divulgado nota
apoiando o general Augusto
Heleno(GabinetedeSeguran-
çaInstitucional)emsuamani-
festaçãoqueviariscodeinsta-
bilidadedemocráticanopaís.
A ativa fardada se queixou
comBolsonaro sobreo tema
na segunda, em reunião dos
comandantesdasForçascom
opresidente eAzevedo.
Por outro lado, tanto a ati-
vaquantoaalamilitar aloca-
da no governo estão do lado
deBolsonaronoembatecom
o Supremo, considerando as
recentes medidas envolven-
doopresidenteequivalentes
a umcerco aoPlanalto.
Confusão com torcidas é
tudo o que o presidente
queria nestemomento
ANÁLISE
-Igor Gielow
sãopaulo Oconflitonosatos
pró-democraciaemSãoPau-
loétudooqueobolsonaris-
mopoderiaquererparainvo-
car seus fantasmas de uma
intervençãomilitaremfavor
dopresidentedaRepública,
aindaqueoescopodosinci-
dente sejamínimo.
Esse é o Brasil de 2020.
Grupos radicais especulam
golpes a favor de um gover-
nante, e torcidas organiza-
das conhecidaspela violên-
cia no trato à diferença se
dispõemairàsruasparade-
fenderalgoquechamamde
democracia.
Se entrará para a história
desteanoapresençadepes-
soasnaruacontraBolsona-
ro,apósrepetidosatosemfa-
vordopresidenteedesuair-
responsabilidade sanitária,
nãopareceumbomagouro
para omovimento tudo ter
acabadoembombasdegáse correria.
Pareciaóbvioqueissoaca-
baria assim. Torcidas orga-
nizadas são o bolsonaris-
mo com uma camiseta de
time: pregam o ódio ao ri-
val, a desunião e a submis-
são do adversário.
Sua existência, de resto
umfenômenomundial, le-
vou o dito país do futebol
a sediar incríveis jogos de
torcida única nas arqui-
bancadas.
O recadoficaparaaclasse
política, já devidamente as-
sustadapelaalarmistamen-
sagemdo decano do Supre-
mo, Celso de Mello, fazen-
do uma comparação histo-
ricamente exagerada entre
omomentoatualdoBrasil e
a Alemanha na ascensão do
nazismo.
Hipérboles, contudo, tal-
vez sejam o único jeito de
enfrentamento institucio-
nal quando um presidente
sepõeagaloparpelaEspla-
nada dosMinistérios entre
golpistasassumidos.Aogos-
to dos histriônicos 30 (não
300)deBrasília,sófaltoude-
sembainhar uma espada e
gritar “Esparta!”.
A questão, contudo, foge
da teatralidade. Ela se cha-
ma artigo 142 da Constitu-
ição, uma peça mal redigi-
da que permite leituras di-
versas —a rigor, o Supre-
mo Tribunal Federal pode
convocar as Forças Arma-
das para reprimir a bader-
na pública que acompanha
asfranjasmaisradicalizadas
dobolsonarismo.
Ocorrequehámétodoen-
tre os apoiadores do pre-
sidente. Por toda a retóri-
ca de leões, são gatinhos
na hora da prática. Já torci-
das organizadas e seu atá-
vico desejo pelo confron-
to oferecem a desculpa
ideal para robôs clonados
dos filhos de Bolsonaro no
Twitter clamarem contra a
desordem.
O mandatário máximo
nãofariamelhor.Desdeque
aesquerdacolocouogover-
no de Sebastián Piñera de
joelhos com protestos no
Chile,opresidentebrasilei-
ro insinua que omesmo se
dará por aqui. Para, logica-
mente, invocar sua leitura
torta do artigo 142 —que,
paraodesalentodosativis-
tas,nada falaemfecharou-
tros Poderes.
Sob ele, qualquer Poder
constituídopoderáchamar
militarespararesolversitua-
çõesdeanarquia.Nadadisso
seinsinuacomalgumascen-
tenas oumilhares de torce-
doresnaavenidaPaulista, é
óbvio.Masoqueimportasão
ascenaspinçadasdeembate
comaPolíciaMilitar.
Opresidentebalançao142
comoumratopestilentoem
meio a uma pandemia que
ele ignoranaprática.
Énotórioqueoserviçoati-
vodasForçasArmadasdes-
preza tal possibilidade no
momento, apesar de fatias
significativas de sua cúpu-
la apoiarem Bolsonaro ao
achar que o Supremo tem
se excedido.
Essa já é a visão dos an-
tesmoderadoresdaalami-
litar no governo, ora trans-
formados em insuflado-
res de tensões. Bolsonaro
só cavalga após os tais 300
do Brasil macaquearem a
KuKluxKlan de umaAmé-
rica inexistente entre nós
porque se sente avalizado
por eles.
A influênciaamericanase
viu também na via contrá-
ria, com uma tentativa de
associar os atos brasileiros
com a revolta que se disse-
mina por cidades dos EUA
anteoassassinatodonegro
George Floyd por um poli-
cial branco.
Naconfusão,ganhaopre-
sidente cujo mandato está
ameaçadopordiversasfren-
tes.Amensagemdodecanoé
hiperbólicaeseráusadacon-
trasuapresunçãodeisenção
daquipordiante,nãomuito
diferente do corre-corre de
corintianos, palmeirenses,
são-paulinos e quetais nes-
te domingo.
Seela teráocondãodeor-
ganizar,defato,algumaraci-
onalidadeacercadodebate
sobreapermanênciadeBol-
sonaronocargo,essaéuma
hipótesealtamenteespecu-
lativa agora.
Leiamais emEsporte
Bolsonaro usa helicóptero e cavalo emnovo ato
-Thiago Resende e
Talita Fernandes
brasília OpresidenteJairBol-
sonarorequisitouumhelicóp-
tero oficial para sobrevoar a
Esplanada dos Ministérios
neste domingo (31) e presti-
giar mais umamanifestação
a favordeseugovernoecon-
traoSTF (SupremoTribunal
Federal) e oCongresso.
Depois,desceuecaminhou
paracumprimentarseusapoi-
adoresqueestavamemfrente
aoPlanalto. Elenãoutilizava
máscara, obrigatória no Dis-
tritoFederalcomomedidade
combateàCovid-19.Emsegui-
da, andou a cavalo diante de
manifestantes. O presidente
nãodeudeclarações.
Na domingo passado (24),
Bolsonarotambémhaviautili-
zadoumhelicópteroparaso-
brevoaraárea.Nestedomin-
go, uma carreata e pessoas a
pé se dirigiram à Praça dos
TrêsPoderes,ondeumgrupo
se aglomerouà espera dele.
O helicóptero, em um pas-
seio de 40minutos, deu pelo
menosseisvoltasnaEsplana-
daepousouporvoltadas 12h
noPaláciodoPlanalto.Omi-
nistro da Defesa, Fernando
Azevedo,acompanhouopre-
sidente.Apóscumprimentar
apoiadores,emfrenteaoPla-
nalto,Bolsonaroretornouao
Alvoradadehelicóptero.
Como tem ocorrido cons-
tantemente, oSTF foi oprin-
cipal alvo das palavras de or-
dem e das placas carregadas
pormanifestantes.Placasafir-
mavam: “Supremo é o povo”
e “Abaixo a ditadura do STF”.
Faixas faziamataques ao Su-
premoepediamintervenção
militar. Congressistas foram
chamadosde corruptos.
Onúmerodemanifestantes
destedomingoerapoucomai-
or queoda semanapassada.
Maiscedo,Bolsonarovoltou
afazerataquesàimprensaem
publicação emredes sociais.
“OmaiordosFAKENEWSé
o‘gabinetedoódio’inventado
pelaimprensa”,afirmou,emre-
ferênciaaogrupoalvodeinves-
tigação no inquérito das fake
news.“AtéomomentoaFolha,
Globo,Estadão...nãoaponta-
ramumasófakenewsprodu-
zidapelo tal ‘gabinete’.”
Depois,Bolsonarofalouem
“mídiapodre”ecitouaçõesdo
TSEsobredisparosdemensa-
gens emmassadeWhatsApp
na campanha eleitoral. “Será
que,seeuchamaressaimpren-
sa e negociar com ela alguns
BILHÕES DE REAIS em pro-
paganda,tudoissoseacaba?”
Grupo de extrema
direita protesta com
tochas emáscaras
brasília Um grupo de extre-
madireitacompessoasmas-
caradas carregando tochas
protestou na madrugada de
domingo(31)emfrenteaoSTF
(SupremoTribunalFederal).
Osmanifestanteseramlide-
radosporSaraWinter, inves-
tigadanoinquéritocontrafa-
ke newsque tramita no STF.
Elaéumdoslíderesdocha-
madomovimento“Os300do
Brasil”, grupo armado de ex-
trema direita formado por
apoiadores de Jair Bolsona-
roqueacampamemBrasília.
Commáscaras,roupaspre-
tasetochas,ogrupo,formado
porpoucasdezenasdepesso-
as, desceu a Esplanada e, se-
gundo imagens divulgadas
por eles nas redes, se posici-
onouemfrente aoSupremo.
“Viemos cobrar, o STF não
vai nos calar”, gritavam.
OministroAlexandredeMo-
raes,doSTF,relatordoinqué-
rito das fake news, foi o prin-
cipal alvo: “Ministro covarde,
queremos liberdade. Incons-
titucional,Alexandre imoral”.
O acampamento chamado
Os300doBrasil,doqualSara
Winterélíder,temparticipan-
tes armados, comoaprópria
coordenadoraafirmouemen-
trevistaàFolha.Eladisse,con-
tudo, que as armas são ape-
nasparaautodefesa.Oporte
de armas em manifestações
éproibidopelaConstituição.
Umdosobjetivosdogrupo
étreinarmilitantesdispostos
a defender o governo Bolso-
naro.A ativista tambémteve
breve passagem pelo Minis-
tério dos Direitos Humanos,
cuja titular éDamaresAlves.
Ogrupopassouaser inves-
tigadopelaProcuradoria-Ge-
raldaRepública,noâmbitodo
inquérito instaurado no fim
deabrilparaapurarasrecen-
tesmanifestaçõesantidemo-
cráticas.Aapuraçãofoiauto-
rizadatambémpeloministro
AlexandredeMoraes.
Aorganizaçãolideradapor
Sararefutaosupostocaráter
violentodomovimentoerejei-
taorótulodemilíciaarmada.
Namanhãdedomingo,qua-
tro termos relacionados ao
protesto estiveram entre os
dez mais falados no Twitter
brasileiro:“os300”,“SaraWin-
ter”,“Brasília”e“KuKluxKlan”,
referênciaaogruposuprema-
cista norte-americano que
tambémusatochasemásca-
ras emsuasmanifestações.
EmsuacontanoTwitter,Sa-
rarebateucomparaçõesentre
oprotestoeogruposuprema-
cista.“Aideiafoideumapoia-
dorqueé judeuequemcom-
prouastochasemáscarasfoi
umorganizadordos 300que
énegro”, escreveu.
O ex-ministro SergioMoro
se manifestou nas redes so-
ciais sobreoato. “Tão loucos
mas, ainda bem, tão poucos.
O único inverno chegando é
odas quatro estações.”
Presidente Jair Bolsonaro acena para apoiadores enquanto anda emum cavalo da PolíciaMilitar Pedro Ladeira/Folhapress
Grupo de extrema direita protesta com tochas em frente ao STF Wallace Martins/Futura Press/Folhapress
poder coronavírus
a eee
são paulo Emtemposde ru-
mores sobre o papel dosmi-
litaresnapolítica,afortepre-
sença de fardados no gover-
no do capitão reformado do
ExércitoJairBolsonarodivide
opiniõesnoBrasil, com ligei-
ro predomínio daqueles que
condenamaprática.
SegundopesquisadoData-
folha,52%dosbrasileirossãocontraapresençafardadano
poderpolítico,enquanto43%
a aprovam e 5% não sabem
responder.
O levantamento foi feitona
segunda (25) e na terça (26),
ouvindo2.069adultospossu-
idores de telefone celular —
elenãofoipresencialparaevi-
tarriscosdecontágiopeloco-
ronavírus. Amargemde erro
édedoispontospercentuais.
Hoje,8dos22ministrosdo
governosãoegressosdasFor-
ças,eumdeles(ogeneralLu-
izEduardoRamos,secretário
deGoverno)aindaépartedo
serviço ativo.
Umnonooficial,ogeneralda
ativa Eduardo Pazuello, ocu-
painterinamenteoMinistério
da Saúde, centro da coorde-
naçãodecombateàCovid-19.
Lá,apósastraumáticassaídas
deLuizHenriqueMandettae
NelsonTeich,promoveuuma
militarizaçãodecargosvitais,
nomeando 17 fardados.
Porfim,ovice-presidenteé
umgeneraldequatroestrelas
dareserva,HamiltonMourão.
Espraiam-se pela Esplanada
cerca de 2.500 outrosmilita-
res, ocupando cargos diver-
sos, pelo menos 1.200 deles
emprestadosda ativa.
Amilitarização, fenômeno
inédito no escopo mas que
temsuaorigemjánogoverno
deMichelTemer(MDB,2016-
18),agradamaisosmaisricos
e instruídos:62%dosquega-
nhammaisde 10 saláriosmí-
nimosaprovamomovimento,
assimcomo50%dosquetêm
curso superior—neste caso,
empatandocomos47%con-
trários à ocupação.
Apresença desagradamais
asmulheres(57%derejeição)
doquehomens(51%deaprova-
ção).Comoseriadeseesperar,
éamplamenteaprovada(76%)
pelosqueconsideramogover-
noótimooubom,eigualmen-
terejeitada(78%)porquemo
acharuimoupéssimo.
A discussão sobre amilita-
rizaçãobolsonaristadivideas
Forças Armadas desde o co-
meço do governo. Em entre-
vistaàFolha logoapósaelei-
ção, o então comandante do
Exército, Eduardo Villas Bô-
as, tentoudissociarosmilita-
res do então futuro governo.
Casoperdido,comoarecen-
tealiançadosfardadoscomo
antesdemonizadocentrãoem
proldagovernabilidadeecon-
traumimpeachmentmostra.
Além de sua origem farda-
da, aliás umadistorção dado
52%são contrapresençademilitares
emcargosnogoverno, dizDatafolha
Aprovação à participação de fardados é de 43%; 8 dos 22ministros são egressos das Forças
queele saiudoExércitoapós
passar por um processo dis-
ciplinarporsupostatramade
atentados em 1988, Bolsona-
ro cercou-se de generais da
reservana campanha.
A estrela era Augusto He-
leno, colega seu e de Mou-
rão no curso de paraquedis-
mo. Hoje commenos poder
do que já teve, ele segue co-
mochefedoGabinetedeSe-
gurança Institucional.
Com o governo em curso,
formou-se a ala militar, pa-
ra a crítica constante de He-
leno.Narealidade,sãovárias
asalas,eaconfiguraçãoatual
passapeloeixoFernandoAze-
vedo (Defesa)-Walter Braga
Netto(CasaCivil)-Ramos(Se-
cretaria deGoverno).
Ostrêsgenerais jáserviram
juntosnoComandoMilitardo
Leste,noRio, comAzevedoà
frenteehojeservindodepivô
dogrupoecontatocomoser-
viçoativodevidoaseucargo.
Ramos, contudo, se desta-
ca pela relação pessoal com
Bolsonaro, com quem divi-
diuquartocomocadete,e foi
especulado pelo presidente
para comandar o Exército,
já que a relação com o atual
chefe,EdsonPujol,nãoédas
mais azeitadas.
Azevedo,porsuavez,seequi-
libranumacordaapósveroen-
fraquecidochefebuscarmais
apoioentreseuesteiomilitar.
Foiobrigadoadivulgarnotas
reforçando o comprometi-
mentodasForçascomaCons-
tituição após Bolsonaro par-
ticipar de atos golpistas,mas
também apoiou Heleno em
suanotaemqueapontavaris-
cosàestabilidadeemdecisões
doSupremoTribunalFederal.
O serviço ativo, contudo, é
outra história. Nemtodos os
membros do Alto-Comando
doExércitosesentemconfor-
táveiscomaassociaçãoaum
governo tão polêmico quan-
to o de Bolsonaro, e o temor
expresso por Villas Bôas em
2018 de que uma militariza-
ção da política se transfigu-
rasse numa politização dos
quartéis permanece.
Até aqui, indíciosdisso são
vistosmuitoemredessociais,
comapopularidadedasmen-
sagens bolsonaristas entre
médiosebaixosescalõesdas
Forças. A atração que o dis-
curso exerce sobre PMs pelo
país,contudo,émaisnotória,
comoseviunomotimdacor-
poraçãonoCearáneste ano.
Azevedo tem logrado di-
versas vitórias corporativas
nocargo, enquantoBolsona-
robuscaassociar-se cadavez
mais aos fardados durante
a crise política embutida na
emergência daCovid-19.
Oplanodereestruturaçãode
carreiraereformaprevidenci-
áriadosmilitaresfoiaprovado
noanopassado,apósduasdé-
cadas de protelação, além de
váriasbenessesacessórias.
AMarinha,Forçamaisafas-
tada do núcleo do poder, ga-
nhouR$7,6bilhõesparacons-
trução de novos navios, nu-
ma operação criticada den-
tro da área econômica. Já a
Força Aérea, ainda mais dis-
tantedobolsonarismo,man-
teve seu cronogramadepro-
gramas estratégicos, comoo
caça Gripen ou o cargueiro
C-390Millenium. IgorGielow
Pesquisa diz que brasileiro temorgulho dopaís,mas está triste
são paulo Pesquisa doData-
folhamostra que dois terços
dos brasileiros têm orgulho
do país,mas aomesmo tem-
posemostrampessimistase
desanimados quando insta-
dosaexpressarossentimen-
tos que ele provoca.
Olevantamentoouviu2.069
pessoasportelefone,paraevi-
tar contato pessoal durante
apandemia, nosdias 25 e 26.
A margem de erro é de dois
pontos paramais oumenos.
É a primeira queda abrup-
ta desde que o índice de or-
gulhosos subiu, a partir do
menor índice na série histó-
rica, iniciadaem2000.Eleha-
via sidoregistradoemjunho
de2017,quandohouveempa-
teentrevergonhaeorgulho,
no auge da crise do governo
Michel Temer (MDB).
Damesma forma, aumen-
tou o número daqueles que
sesentemmaisenvergonha-
dos do que orgulhosos, de
22%para 29%.
Foramfeitasváriaspergun-
tasacercadosentimentoque
oBrasilprovocanaspessoas,
e aí o quadro émenos róseo.
O retrato é de umpaís triste,
desanimado e commedo do
futuro, embora ao mesmo
temposedigamaistranquilo.
Estão tristes com o Brasil
63% dos ouvidos, enquanto
34%sedizem felizes. Por ou-
tro lado, dizem ter raiva ao
pensar nopaís 42%, enquan-
to52%afirmamestartranqui-
los—umainversãoemrelação
à pesquisa de julha de 2019.
Declaram-se desanimados
59%, ante 39% que dizem o
contrário. Têm medo sobre
o futuro danação 57%, e 41%
dizemconfiarnele.Para69%,
osentimentodeinsegurança
se sobrepõe ao de seguran-
ça (30%)aopensarnoBrasil.
Os entrevistados se divi-
demquandoquestionadosse
têmmais medo ou esperan-
ça: 53% adotam o tom posi-
tivo e 46%, o negativo.
Chamaaatençãoaprepon-
derância de sentimentos ne-
gativosassociadasànaçãoen-
tremulheres e jovens de 16 a
24anos.Essesgruposlideram
osíndicesdaquelesquesedi-
zemmaisdesanimados,com
medodo futuro, infelizes, in-
segurosesemesperança.Ape-
nasnoquesitodaraivaqueo
Brasil faz a pessoa passar os
maisbravossãoosmaisricos
(acimade10saláriosmínimos,
48%)einstruídos(comcurso
superior, 50%).
Hárelativahomogeneidade
regionalnosquesitoslevanta-
dos, coma exceçãomais evi-
denteacercadohumornoSu-
deste, a região mais populo-
sa do país, que concentra os
principais centros urbanos.
Ali, aqueles que têm raiva ao
pensar no Brasil empatam
em 47% com os que se sen-
temmais tranquilos.
Empresários são, de lon-
ge, os mais otimistas quan-
doocorteéaocupação.Nada
menosque80%dizemsentir
orgulho do país, além de es-
tarem esperançosos (72%) e
tranquilos (66%).
Comoseriaalgoprevisível,
a empolgação opõe aqueles
queconsideramogovernoJa-
irBolsonarobomouótimoe
osqueo julgamruimoupés-
simo. Dos primeiros, 80%se
dizem orgulhosos do Brasil,
enquantonosegundogrupo
44%sedizemcomvergonha.
Omesmo se repete, de for-
ma espelhada, em todos os
quesitosde sentimentos: en-
quanto75%dosqueaprovam
Bolsonaro se dizem tranqui-
los,64%dosqueorejeitames-
tão com raiva do Brasil, e as-
simpor diante.
A pandemia do novo coro-
navírus impactadeformadi-
ferenteaspercepçõesdobra-
sileiro.Quando se cruzamas
respostas com o fato do en-
trevistado ter tido Covid-19
ou conhecido algumdoente,
não hámudanças ante os ín-
dices gerais aferidos.
Já quando o cruzamento é
comograude adesão ao iso-
lamentosocial,principalme-
dida para o combate à disse-
minação do vírus, fica claro
que ignorar riscos traz uma
medidadeconfortopsíquico.
Quãomaisnormalmentevive
o entrevistado,menos senti-
mentosnegativoseleexprime.
Nosentidocontrário, quão
mais isolado, mais angustia-
dossãoossentimentosexpres-
sosdemedo,tristezaeinsegu-rançacomopaís. IgorGielow
coronavírus poder
SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020 A7
Presença demilitares no governo divide população
Opinião sobre a presenção de militares no governo
Em%
5
Não sabe
43
Sim, deveriam
ter cargos
52
Não deveriam
ter cargos
51% entre homens
62% entre quem ganha mais de dez salários mínimos
67% entre empresários
50% entre moradores do Sul
57% entre mulheres
56% entre quem ganhar até dois salários mínimos
60% entre funcionários públicos
53% entre moradores do Centro-Oeste/Norte
Tem mais orgulho do que vergonha ou mais vergonha
do que orgulho de ser brasileiro?
Em%
70% entre quem tem mais de 60 anos
80% entre empresários
73% entre moradores do Nordeste
81% entre quem aprova o governo Bolsonaro
35% entre quem ganha mais de dez salários mínimos
35% entre estudantes
33% entre moradores do Sudeste
44% entre quem reprova o governo Bolsonaro
Mai.20Dez.19Jun.17
0
100
Não sabe/Outras respostas
Mais vergonha do que orgulho
Mais orgulho do que vergonha
3
29
67
2
22
76
3
47
50
Sentimento em relação ao Brasil de hoje, em %
Fonte: Pesquisa Datafolha realizada em 25 e 26 de maio, com 2.069 brasileiros adultos que possuem telefone celular em todas as regiões e estados do país. A margem de erro é de
dois pontos percentuais, para mais ou para menos
Não sabe
Não sabe
Não sabe
Não sabe
Não sabe
Não sabe
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
mai.
20
jul.
19
24 e 25.
out.18
2.out.
18
Tranquilo
Feliz
Animado
Seguro
Com confiança no futuro
Commais esperança
do que medo
Com raiva
Triste
Desanimado
Inseguro
Commedo do futuro
Commais medo
do que esperança
6
3
1
1
2
1
52
63
59
69
57
53
42
34
39
30
41
46
5
2
1
1
2
1
27
79
78
88
62
59
68
18
21
11
36
40
0
100
0
100
0
100
0
100
0
100
58% entre homens
50% entre quem tem
ensino superior
75% entre
estudantes
48% entre
empresários
66% entre moradores
do Nordeste
60% entre quem está
vivendo normalmente
na pandemia
89% entre quem
rejeita o governo de
Bolsonaro
58% entre quem
aprova o governo
Bolsonaro
66% entre quem tem
de 16 a 24 anos
48% entre homens
72% entre
empresários
61% entre estudantes
a eeeA8 SEGUNDA-FEIRA, 1° DE JUNHO DE 2020
mundo
-DaigoOliva e Rafael Balago
sãopaulo Emcimadeumcarro
dapolíciadestruído,ummani-
festantepula repetidasvezes.
Rodeadoporcentenasdepes-
soas, ele abre os braços e, em
seguida,sejogaemcimadaslu-
zesdeemergênciadaviatura.
Pareceumdascenasfinaisde
“Coringa”,maséNovaYorkem
mais uma noite de protestos
emdiversascidadesdosEUA.
No quinto dia consecutivo
de atos pelo fim da violência
policialcontranegrosnopaís,
quecomeçounosábado(30)e
adentrou amadrugada deste
domingo (31), imagens como
essasemultiplicaram,desafi-
ando toques de recolher im-
postosamaisde20municípi-
oseconvocaçõesadicionaisde
soldadosdaGuardaNacional.
Na maior parte do domin-
go,asmanifestaçõesseguiram
pacíficas, como, por exem-
plo, emumamarcha emNo-
vaYork.Houve,porém,regis-
tros de confrontos entre ati-
vistaseagentesdesegurança
naFiladélfia,emSantaMoni-
ca e em SanDiego, assim co-
mona capitalWashington.
EmMinneapolis,umcami-
nhão-tanque avançou sobre
os ativistas, mas ninguémfi-
couferido, segundoumates-
temunhada agência de notí-
cias Reuters. Omotorista foi
retirado do caminhão e es-
pancadopormanifestantes.
Fora do país, marchas tam-
bémforamrealizadasemBer-
lim e Londres, ondemanifes-
tantes se ajoelharam na Tra-
falgarSquare,bradaramgritos
como“semjustiça,sempaz”e
marcharamatéasededoParla-
mentoeaembaixadadosEUA.
Desde quarta, atos ocorre-
ramemaomenos75cidades
americanas, segundo levan-
tamentodoNewYorkTimes,
com registro de quatromor-
tes e aomenos 1.700prisões.
Assim,asmanifestaçõesde-
sencadeadas pela morte de
GeorgeFloyd, homemnegro
cujopescoçofoiprensadono
chão pelo joelho de umpoli-
cialbranco, jánãose limitam
aMinneapolis, onde o crime
ocorreu,eespalham,aomes-
mo tempo, reações contra o
racismoeviolêncianas ruas.
Na madrugada de domin-
go, de Los Angeles aMiami e
Chicago,osprotestosmarca-
dosporgritosde“nãoconsigo
respirar”, fraseditaporFloyd
enquanto era sufocado, co-
meçaram pacificamente an-
tesdesetornaremtumultuo-
sos,comruasbloqueadaspor
ativistas,carros incendiados,
saqueseatéespancamentos.
Dooutro lado, as forçasde
segurançareagiramemcenas
de barbárie. Em Nova York,
dois carros da polícia atro-
pelaramdezenasdemanifes-
tantes que tentavam impe-
dir a passagemdos veículos.
Em Atlanta, na Geórgia,
dois jovens negros foramar-
rancadosàforçadedentrode
um carro por policiais que
usavam o que parecem ser
armas de choque. Nas ima-
gens transmitidas pela CBS,
as vítimas não oferecem re-
sistência e, mesmo assim,
sãotratadascombrutalidade.
Em Salt Lake City, o canal
ABC4flagrouumagentecom
escudoempurrandoumido-
so de bengala. Namesma ci-
dade, outra cena de selvage-
ria. Em reação a umhomem
branco que ameaçava mani-
festantes com arco e flecha,
ativistaslincharamoagressor.
Viaturasforamincendiadas
naFiladélfia,elojas,saqueadas
em Los Angeles. Agentes em
Richmond, na Virgínia, tive-
ramdeserhospitalizadosde-
vidoaferimentos,eumapes-
soa foimorta em Indianápo-
lis,ondeumvice-chefedepo-
líciadissequeodepartamento
recebeutantosrelatosdedis-
parosqueperderamaconta.
Além da morte na última
madrugada, um homem foi
morto em St. Louis, Minne-
sota, no sábado, ao ficar pre-
so entre dois caminhões, en-
quantoumdeles tentavama-
nobrar para escapar de um
bloqueio na estrada. Na sex-
ta,emDetroit,umhomemde
21anosfoimortopordisparos
feitosdedentrodeumcarro.
Em Minneapolis, na quar-
ta, Calvin Horton Jr. foi mor-
toporumtirodisparadoper-
Protestos ignoramtoquesderecolher,
eEUAtestemunhamcenasdebarbárie
Manifestações antirracismo ocorremnoite após noite no país enquanto repressão policial aumenta
todeumalojaqueestavasen-
dosaqueada.Houvetambém
amorte de um segurança de
umprédiofederalemOakland,
cujarelaçãocomosatosainda
é avaliadapelas autoridades.
À CNN Melvin Carter, pre-
feito de St. Paul, pediu “paz,
e não paciência”, frase repe-
tida por Keisha Lance Bot-
toms, prefeitadeAtlanta.Ao
menos 170 lojas foram dani-
ficadas durante os protestos
emSt. Paul, segundoCarter.
Nos últimos dias, muitos
jornalistas também foram
agredidospelas forças de se-
gurança—e,àsvezes,porma-
nifestantes.Nasexta(29),afo-
tógrafaLindaTiradolevouum
tiro de bala de borracha no
olho esquerdo enquanto co-
briaosatosemMinneapolis.
A repórterKaitlinRust, do
canalWave 3News, e o foto-
jornalista JamesDobson fo-
ramalvosdebalasdepimen-
taporpoliciaisquepareciam
mirar a jornalista. Ao vivo,
ela gritava “estousentoatin-
gida, estou sento atingida!”.
NosarredoresdaCasaBran-
ca, ativistas, por suavez, ata-
caramumcorrespondenteda
FoxNewsesuaequipe,pegan-
do omicrofone do profissio-
naleoatingindocomoobjeto.
O presidente dos Estados
Unidos,DonaldTrump,defen-
dequeascidadesajamdema-
neiramaisduracontraosma-
nifestanteseacusouoqueele
chamade anarquistaseanti-
fascistasdeseremosrespon-
sáveispelaondadeviolência.
Asmanifestaçõesatingem
opaísemummomentodeli-
cado.Pormaisdedoismeses,
milhões de pessoas tiveram
de ficar em suas casas para
retardarapropagaçãodoco-
ronavírus,que jámatoumais
de 100mil pessoas nos EUA.
As medidas adotadas para
combateraCovid-19 levaram
àpiorcriseeconômicadesde
aGrandeDepressão, com40
milhões de desempregados.
Odebatesobreosplanospa-
rareabrir lojasealiviarrestri-
ções em cidades fechadas fi-
couemsegundoplano,agora
queaviolênciapolicialgerou
manifestações de fúria. No
entanto, a situação desper-
ta a preocupação de especi-
alistasemsaúde,quetemem
umanovaondade contágio.
Floyd,cujamorteprovocou
aondadeatos,haviaperdido
o emprego como segurança
em um restaurante por con-
tadasmedidasdeisolamento
socialparaconterapandemia.
Nascido em Houston, foi
acusado de assalto a mão ar-
madaem2007e,em2009,con-
denadoacincoanosdecadeia.
Ao deixar a prisão,

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