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Quarta-feira, 3 de junho de 2020 | Diário | Ano XVI | N.º 4257 | € 2.50 Diretor André Veríssimo | Diretor adjunto Celso Filipe Crescimento dos inativos esconde desemprego de 8% Navigator avalia alternativas no negócio do papel O CEO, António Redondo, diz que o grupo está a olhar para a pasta, o “tissue” e produtos alternativos ao plástico. Pagamento de dividendos deve avançar até ao final do ano. “Custo reputacional” do Novo Banco acaba este ano EMPRESAS 14 e 15 PRIMEIRA LINHA 4 e 5 EMPRESAS 16 e 17 A taxa reportada pelo INE para abril, de 6,3%, ainda não conta a história toda sobre o impacto da crise. Forte subida da população inativa indica que desemprego é muito mais elevado. O que está a mudar na logística e nas cadeias de abastecimento. A polémica tem dominado a vida da instituição. Presidente garante que reestruturação é para fechar em 2020. ESPECIAL 20 e 21 PRIMEIRA LINHA 6 Segurança social Empresas que não queiram reabrir arriscam perder acesso ao lay-off Sustentabilidade Compras a produtores locais ganham força com a pandemia Investimento de 105 milhões é inaugurado no final de julho nas antigas caves da Croft e da Taylor’s. World of Wine abre em Gaia sem previsão de visitas EMPRESAS 18 Parlamento alarga proteção a diabéticos e hipertensos ECONOMIA 10 e 11 PRIMEIRA LINHA 8 e 9 Comércio Restaurantes rejeitam proteções em acrílico HOMEPAGE 2 Imobiliário Suíça Mexto investe 30 milhões nos Olivais Ti ag o So us a D ia s 2 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 HOME PAGE OPINIÃO HOME PAGE A pós três anos a in-vestir em Portugal apenas no segmen-to de luxo, com um valor total de apro- ximadamente 200 milhões de eu- ros, a suíça Mexto avança agora para o primeiro projeto destinado à classe média portuguesa. Fonte oficial da Mexto indicou ao Negócios que o novo empreen- dimento, designado O’Living, re- presenta “um investimento de 30 milhões de euros”. O novo projeto, localizado nos Olivais, em Lisboa, conta com a assinatura do arquiteto Miguel Saraiva, do ateliê Saraiva e Asso- ciados, e é composto por dois edi- fícios com um total de 86 aparta- mentos. Os apartamentos terão tipolo- gias de T1 a T3 duplex e áreas en- tre os 70 metros quadrados (m2) e os 180 m2, contando com gara- gem individual. O projeto inclui ainda cinco unidades de retalho com áreas de 97 m2 a 198 m2, mas que poderão ser tornadas numa loja única para acomodar um su- permercado, refere a Mexto, em comunicado. A empresa considera que o novo empreendimento, para o qual assinou recentemente a es- critura do lote, vem dar resposta à “à falta de oferta destinada ao mercado residencial nacional”. O empreendimento O’Living aposta numa “oferta de qualida- de, com uma arquitetura versátil e com preços em linha com a pro- cura nacional”, considera Elson Angélico, diretor-geral e “partner” da Mexto, citado no comunicado. “Temo-nos apercebido do in- teresse crescente por este tipo de produto imobiliário e por isso fez todo o sentido enquadrar a quali- dade da Mexto neste segmento”, acrescenta. Um portefólio de luxo Entre os projetos já desenvolvidos ou em curso em Portugal, a imo- biliária helvética conta, por exem- plo, com o Avencas Ocean View Residences, em Carcavelos. Este edifício com nove apartamentos apresenta preços que oscilam en- tre os 1,4 milhões de euros para um T2 de 170 m2 e os 2,5 milhões para um T4 duplex com 342 m2. A Mexto tem ainda o em- preendimento Prior do Crato, em Alcântara, o Ajuda Garden Resi- dences, o Maison Eduardo Coe- lho, no Príncipe Real, o São Gens Townhouse, no Castelo de São Jorge, ou a Rodrigo da Fonseca Prime Residences, onde um T3 de 140 m2 custa 1,35 milhões de eu- ros. A empresa imobiliária suíça entrou em Portugal em 2016 no mercado residencial de luxo e conta já com cerca de 200 milhões de investimento. Este empreendimento é a primeira incursão no segmento de classe média. PEDRO CURVELO pedrocurvelo@negocios.pt O projeto situado nos Olivais contará com 86 apartamentos destinados às famílias portuguesas, diz a Mexto. Suíça Mexto investe 30 milhões nos Olivais “O impacto da pandemia afetará de forma mais gravosa as novas gerações.” FILIPE SANTOS Em três anos de atividade em Portugal, a Mexto já investiu cerca de 200 milhões. PÁGINA 28 “A nossa relação com as marcas é ditada pelas emoções, bem mais do que pela razão.” LUÍS NAZARÉ PÁGINA 30 “A democracia húngara é uma verdade meramente formal. A verdade verdadinha, é que essa democracia não existe.” FRANCISCO MENDES DA SILVA PÁGINA 27 “Ao sacar o outro Costa da cartola está apenas a entreter a malta.” CAMILO LOURENÇO PÁGINA 27 DR QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | HOME PAGE | 3 DIA P ortugal está a ser vítima do seu próprio sucesso no tu-rismo. O peso que ele atingiu na economia coloca-nos entre os países mais atingidos pela pandemia. Mas esse sucesso será também uma força na retoma que outros não têm: desde que o consigamos preservar. O Negócios promoveu ontem um debate sobre o Turismo no âmbito da iniciativa PME no Radar, em que ficou bem patente o di- lema que o setor vive. Rodrigo Machaz, o diretor-geral da Memmo Hotels, descreveu os sentimentos contraditórios da reabertura: de um lado, a alegria e a emoção de ver o negócio voltar a existir, do ou- tro, a enorme apreensão sobre o que ele vai ser nos próximos me- ses. “Borboletas na barriga e uma enorme azia.” Para um setor que parou por completo, os últimos meses fo- ram de custos sem qualquer receita. O lay-off ajuda, mas pouco. As linhas de crédito de nada servem. O mesmo aconteceu, de res- to, na restauração. Reféns do tráfego aéreo, da abertura de fron- teiras, do controlo efetivo da pandemia e do regresso da confian- ça, as taxas de ocupação nos próximos meses não dão qualquer garantia de sustentabilidade. Depois do verão a incógnita é ainda maior. Quem não sentiria azia? O que for feito nos próximos meses e até ao final do ano vai de- terminar se o país consegue preservar a sua capacidade instalada e competências num setor vital para a retoma e para o equilíbrio do saldo externo. No meio de tanta incerteza, há uma previsibili- dade que tem de chegar o quanto antes: os apoios e as medidas que serão tomadas para suportar o turismo. Que ajudas haverá a fundo perdido? Os vistos gold vão ser rea- nimados para incentivar o turismo residencial? Chitra Stern, dos hotéis Martinhal, revelou que há uma maior procura por cidadãos de Hong Kong e da África do Sul em busca da segurança e hospi- talidade que Portugal oferece. E o regime dos residentes não ha- bituais? Todos salientam o elevado número de novos turistas que as rotas criadas pela TAP para os EUA e o Brasil trouxeram – para quando uma solução que dê estabilidade à companhia aérea? O Governo está a negociar, e bem, corredores com países emis- sores, como a Alemanha. Não está apenas nas suas mãos. A União Europeia tem de definir regras claras e iguais para todos, que trans- mitam confiança aos turistas e a quem os recebe. Claro que os privados são a chave sem a qual a retoma não che- gará. Há que repensar estratégias e encontrar oportunidades na inovação, na transição digital, no turismo associado à educação superior, na sustentabilidade. “O Ronaldo da economia portuguesa não foi o ministro das Fi- nanças, foi o turismo”, disse às tantas Rodrigo Machaz. Precisa- mos mesmo que o craque volte à sua antiga forma. EDITORIAL Turismo, azia e borboletas 11% ANDRÉ VERÍSSIMO Diretor averissimo@negocios.pt BCP dispara à boleia do setor bancário que espera pelo BCE Variação este ano: -45,46% Valor em bolsa: 1.671 milhões de euros O Banco Comercial Português fechou o dia a valer 11,06 cêntimos por ação, um máximo desde 25 de março des- te ano, subindo mais de 10%. Num dia em que o setor da banca na Eu- ropa esteve em ganhos, à espera que o BCE forneça novos estímulos ao se- tor, na reuniãoda próxima quinta- -feira. O banco liderado por Miguel Maya garantiu, assim, uma subida que diminuiu para 48% a queda anual que está a protagonizar. AÇÃO FOTOFRASE NÚMERO 10,38% Manequins a fazerem figura de corpo presente A pandemia de covid-19 obrigou a apertadas regras de distanciamento social nos espaços públicos. Para contrariar esta sensação de vazio e também como forma de impor o distanciamento, o café Varuna Gezgin, em Istambul, teve a ideia de ocupar esse espaço com manequins que fazem figura de corpo presente. Além de serem uma ótima operação de marketing. Fotografia: Erdem Sahin/EPA Se Trump tivesse cérebro, mesmo que fosse 99% cínico, ele diria algo que unisse as pessoas. O governo francês antecipa uma queda no PIB de 11% este ano. A previsão inicial era de 8%. “ GREG POPOVICH Treinador de basquetebol dos San Antonio Spurs Miguel Maya viu as ações do BCP dispararem. A taxa de desempre-go caiu em março para 6,2%, revelou ontem o Instituto Nacional de Esta- tística. Este é um valor mais baixo do que o do mês passado, do que o verificado três meses antes e do que o do mesmo mês de 2019. Para abril, o cálculo provisório – que é bastante falível, assume o or- ganismo de estatísticas – indica uma subida muito ligeira, para 6,3%. Mas onde estão, afinal, os desempregados da era covid-19? Estão escondidos entre a popula- ção inativa, explicam os especia- listas. Não fosse este efeito, a taxa estaria agora na casa dos 8%. Não é nenhuma teoria da conspiração, nem nenhuma deci- são premeditada pelo INE, mas a taxa de desemprego reportada para o mercado de trabalho por- tuguês não está a contar a história toda do que se está a passar no país. Segundo os dados do INE, a taxa de desemprego baixou, quan- do todos os economistas e espe- cialistas têm vindo a alertar para a previsível subida do desempre- go, na sequência das medidas de confinamento aplicadas à econo- mia para travar o contágio pelo novo coronavírus. A taxa está correta e respeita os critérios que sempre respeitou: são consideradas desempregadas as pessoas que, não tendo traba- lho, fizeram diligências ativas para o encontrar e estavam disponíveis para começar a trabalhar. A ques- tão é que com o confinamento da economia, muitas das pessoas que caíram em situação de desempre- go não puderam procurar traba- lho, ou não estavam disponíveis por estarem a cuidar dos filhos ou de alguém doente, explica o pró- prio INE. Isto atirou muitas destas pes- soas para a lista dos inativos, em vez de serem contabilizados como desempregados. E o mais prová- vel é que, num prazo relativamen- te curto e à medida que a econo- mia for sendo desconfinada, pas- sem a ser considerados desempre- gados – porque voltam a poder procurar trabalho. A este efeito, soma-se o das pessoas em lay-off. Segundo da- dos avançados pela ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, na semana passada, este apoio protegeu já 804 mil trabalhado- res. A generalidade destas pessoas estará a ser contabilizada como empregada, porque não perdem mais de metade da sua remunera- ção, mesmo estando sem ativida- de, nem perde o vínculo à empre- sa. Mas teme-se que muitas delas acabem por se ver numa situação de desemprego, quando as empre- sas avaliarem os novos níveis de atividade do pós-confinamento. Uma subida previsível “Os últimos dados do INE mos- tram que há cerca de 102 mil em- pregos a menos do que em janei- ro. E mostram que há mais de 130 mil novos inativos”, nota Francis- co Madelino, ex-presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Ao mesmo tempo, poderá haver quem, estan- do em lay-off, apareça como de- sempregado ou como inativo, ad- mite, lembrando as situações em que no inquérito estas pessoas res- pondem não ter disponibilidade para o trabalho, ou ter perdido mais de 50% da sua remuneração (porque anteriormente faziam horas extraordinárias, por exem- plo). Conjugando os vários efeitos, “há pelo menos 100 a 110 mil pes- soas que se arriscam a vir a ficar desempregadas”, analisa. Isto im- plica que “a taxa de desemprego andaria na casa dos 8%”, não fos- sem os constrangimentos do in- quérito ou dos conceitos. João Cerejeira, economista e PRIMEIRA LINHA COVID-19 Aumento dos inativos esconde desemprego de 8% Com a pandemia de covid-19, e as medidas de confinamento, a expectativa é de subida da taxa de desemprego, mas os números do INE ainda não mostram isso. A explicação está nos inativos – é que o mercado não está bom nem para procurar trabalho. MARGARIDA PEIXOTO margaridapeixoto@negocios.pt TAXA DE DESEMPREGO ESTÁVEL Taxa de desemprego (% da população ativa) Nos primeiros meses deste ano, a taxa de desemprego manteve-se estável, pouco acima dos 6%. A expectativa é de uma subida em breve. Fonte: INE PESO DOS INATIVOS DISPARA Número de pessoas inativas (em milhares) e taxa de inatividade (em %) Os dados até abril, ainda provisórios, dão conta de uma subida significativa do número de inativos e do seu peso no total da população. Fonte: INE +134,4 INATIVOS Este é o aumento dos inativos em abril, face a janeiro deste ano, segundo dados preliminares do INE. -102,7 EMPREGADOS Esta foi a descida do número de empregados em abril, face a janeiro. Os dados ainda são preliminares. 4 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 As restrições ao movimento por motivos de saúde pública dificultaram a ida dos desempregados aos centros de emprego. David Cabral Santos professor na Universidade do Mi- nho, corrobora a ideia: “Muitos dos classificados agora como ina- tivos vão parar a desempregados”, antevê. Além disso, lembra que a probabilidade de os inativos vin- dos dos setores do turismo virem, nos próximos meses e admitindo que a economia começa a reabrir, a ser considerados desemprega- dos é grande. Além disso, “no final do ano escolar vão também tran- sitar muitos jovens para o desem- prego”, antecipa, explicando que os processos de recrutamento es- tão também interrompidos, ou muito lentos. Por tudo isto, diz, é natural que “o desemprego que habitualmente aparece no segun- do trimestre se prolongue por mais tempo”. A previsão preliminar do Go- verno para a taxa de desemprego este ano é de 10%, idêntica à da Comissão Europeia. Um indicador que permite contor- nar as dificuldades metodológicas do INE é o número de desemprega- dos inscritos nos centros de empre- go. No mês de abril, inscreveram-se mais 74% do que no mesmo mês do ano passado e mais 23% do que no mês anterior, mostram os dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). No final do mês de abril, o stock total de desempre- gados inscritos nos centros de em- prego atingia assim 392.323 pes- soas. Um quarto (25,3%) eram tra- balhadores não qualificados e 21,1% eram trabalhadores de servi- ços pessoais, de proteção e segu- rança e vendedores. Havia ainda 11,9% de trabalhadores qualifica- dos da indústria, construção e artí- fices e 11,5% eram pessoal adminis- trativo. MP Desempregados inscritos disparam QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | PRIMEIRA LINHA | 5 PRIMEIRA LINHA COVID-19 O novo mecanismo de lay-off que o Governo está a preparar para depois de junho será atribuído principalmente às em- presas que retomem a atividade, sendo modelado consoante a que- bra de faturação das empresas. As pistas sobre o novo meca- nismo foram dadas pela ministra do Trabalho, Solidariedade e Se- gurança Social no final de uma reunião da Concertação Social, que decorreu nesta terça-feira. “Neste momento estamos a adaptar o lay-off para ter um ins- trumento que apoia o regresso à atividade das empresas. Não esta- mos a apoiar a suspensão da ativi- dade, mas o regresso das empre- sas”, afirmou Ana Mendes Godi- nho. Segundo a governante, a grande prioridade é apoiar a ativi- dade. Ou seja, as empresas que mantiverem a atividade suspensa arriscam-se a perder o acesso ao lay-off. Ainda assim, as empresasque tiverem de manter portas fe- chadas por causa de normativos legais, como por exemplo as dis- cotecas, que continuam sem data para abrir, “continuam a ter as re- gras do lay-off”. O mecanismo extraordinário de lay-off simplificado, que está em vigor até ao final deste mês, aplica-se a empresas com encer- ramento ou paragem total ou par- cial da empresa, com quebras de faturação de pelo menos 40%. Agora o objetivo é apoiar a ativi- dade. Além disso, a governante disse que a “evolução do apoio” vai assentar também numa modela- ção em função da quebra de fatu- ração. O apoio terá fases e inten- sidades diferentes, para chegar a quem mais precisa, acrescentou Ana Mendes Godinho. A ministra recusou dar mais detalhes sobre a nova medida, dei- xando para o Conselho de Minis- tros da próxima quinta-feira. Parceiros desiludidos À saída da reunião, os parceiros sociais lamentaram que tenham sido apresentados poucos porme- nores sobre o Plano de Estabiliza- ção Económica e Social, sobretu- do sobre o prolongamento do lay- -off simplificado. “Foi uma desilusão. Estáva- mos à espera de um plano, mas não ouvimos nada de concreto”, resumiu ao Negócios Sérgio Mon- te, secretário-geral-adjunto da UGT. Também o líder da CIP, An- tónio Saraiva, disse que da reunião não saíram grandes novidades. Além do anunciado pela mi- nistra à comunicação social, hou- ve mais uma pista deixada na reu- nião: em setembro deve estudada a isenção das contribuições sociais pagas pelas empresas em nome do empregador, para que fique “inde- xada à dimensão da empresa”, dis- se Sérgio Monte. A reunião de concertação social desta terça-feira não foi conclusiva e os parceiros saíram descontentes. A ministra sugeriu que as empresas que persistam em ficar fechadas perderão os apoios do lay-off. A ministra Ana Mendes Godinho deixou ontem desapontados os parceiros sociais que esperavam apoios mais concretos. SUSANA PAULA susanapaula@negocios.pt Empresas que optem por não reabrir arriscam perder lay-off Miguel A. Lopes Não estamos a apoiar a suspensão da atividade, mas o regresso das empresas. ANA MENDES GODINHO Ministra do Trabalho “ Foi uma desilusão. Estávamos à espera de um plano, mas não ouvimos nada de concreto. SÉRGIO MONTE Secretário-geral adjunto da UGT “ 6 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 A reabertura da economia, como era expectável, está a ter um im- pacto positivo na atividade das empresas: há mais empresas de portas abertas, há menos empre- sas com perda de volume de ne- gócios e há mais trabalhadores ao serviço. Os dados são do Instituto Na- cional de Estatística (INE) e do Banco de Portugal (BdP), que ontem completaram dois meses de um inquérito às empresas so- bre a evolução da covid-19. Os da- dos recolhidos incluem o mês de abril, de estado de emergência e de duras medidas de contenção social e económica, e o mês de maio, que ditou o início do des- confinamento. “Em geral, e como seria ex- pectável, esta comparação reve- la uma melhoria, embora ligeira, da situação das empresas”, afir- ma o INE. A percentagem de em- presas em funcionamento, ainda que algumas ainda parcialmen- te, aumentou de 83% na primei- ra semana de inquérito para 91% nesta última quinzena de maio. O inquérito foi evoluindo com a pandemia: inicialmente as ques- tões eram colocadas semanal- mente; desde maio que são feitas de 15 em 15 dias. Apesar de a grande maioria das empresas continuar a repor- tar perdas no volume de negócio, há agora também uma recupera- ção: em abril 80% diziam ter que- bras nas receitas, contra 75% agora em maio. No estado de emergência, quase metade das empresas dizia ter reduções iguais ou superiores a 50%; ago- ra, esta proporção de empresas também desceu. Nestes dois meses, houve também um aumento dos traba- lhadores efetivamente ao servi- ço. Em abril, 60% das empresas reportaram uma redução do nú- mero de funcionários; em maio, a proporção de empresas com esse problema diminui para 48%. Os dados mostram que a maioria das empresas (71%) con- tinua a não notar diferenças no pessoal ao serviço efetivamente na segunda quinzena de maio. Mas dos 19% que já tiveram um aumento dos trabalhadores ao serviço justificam essa melhoria com a redução do número de pes- soas em lay-off (citado por 66% das empresas). No entanto, o te- letrabalho e o trabalho presencial alternado continuam a ser opção da mesma proporção das empre- sas. Por outro lado, entre abril e maio houve um aumento das em- presas que beneficiaram das me- didas de resposta à pandemia de- finidas pelo Governo, à exceção do lay-off simplificado. Em par- ticular, destaca-se o aumento da percentagem de empresas que recorreram à suspensão do paga- mento de obrigações fiscais e contributivas (20% em maio contra 12% em abril) e à morató- ria ao pagamento de juros e capi- tal de créditos já existentes (17%, contra 10%). Ainda assim, a pro- porção das empresas que não planeiam beneficiar das medidas apresentadas pelo Governo au- mentou ligeiramente, estando entre os 53% e 61% em maio, consoante a medida. As empresas de alojamento e restauração, que foram as mais afetadas pelas medidas de con- tenção, são agora as que mais re- cuperam: as empresas do setor com as portas abertas subiram de 45% para 58%. Além disso, 26% destas empresas reportaram au- mento no pessoal efetivamente ao serviço. SUSANA PAULA Em maio, foram menos as empresas que reportaram uma redução dos trabalhadores ao serviço. Atividade empresarial cresce, mas de forma ligeira Com o desconfinamento, a atividade empresarial começa a recuperar da covid-19: há mais empresas de portas abertas, menos redução do volume de negócios e mais trabalhadores ao serviço. Setor da restauração e alojamento é o que mais recupera. Paulo Calado Apesar dos sinais de melhoria, a covid-19 continua a ter impac- tos negativos na atividade das empresas portuguesas. Principais efeitos da covid nas empresas TOME NOTA 8% DAS EMPRESAS CONTINUAM FECHADAS Na segunda quinzena de maio, houve um ligeiro aumento das empresas que voltaram a reto- mar a atividade, sendo agora 92%. No entanto, há ainda 8% das empresas encerradas: a quase totalidade de forma tem- porária. Só 1% das empresas fe- charam definitivamente. 73% COM QUEBRA NO VOLUME DE NEGÓCIOS Apesar de ter havido uma me- lhoria, na segunda quinzena de maio a grande maioria das em- presas (73%) continua a repor- tar quebras no volume de negó- cios. Dessas empresas, 31% de- clarou reduções iguais ou supe- riores a 50% à pré-pandemia. 45% COM MENOS TRABALHADORES Face à situação expectável sem pandemia, 45% das empresas referiram um impacto negativo no pessoal ao serviço efetiva- mente a trabalhar na segunda quinzena de maio. Nas duas se- manas anteriores, 50% das em- presas ainda reportavam redu- ções nos trabalhadores. MAIOR RECURSO ÀS MEDIDAS DO GOVERNO Entre as medidas de resposta à covid-19, 21% das empresas já beneficiaram da suspensão do pagamento de obrigações fis- cais e contributivas, 17% da mo- ratória ao pagamento de juros e capital de créditos já existen- tes e 9% do acesso a novos cré- ditos com juros bonificados ou garantias do Estado. No entan- to, as empresas que não pre- veem recorrer a estas medidas de apoio voltaram a aumentar, atingindo valores entre 54% e 62% consoante as medidas. 91% ATIVIDADE Em maio, 92% das empresas já tinham regressado à atividade. Em abril, eram apenas 83% as que continuavam a laborar. QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | PRIMEIRA LINHA | 7 M ais de duas sema-nas depois da rea-bertura, os restau-rantes ainda ten- tam servir doses reforçadas de confiança aos clientes. A ocupa- ção diária continua “fraca”, segun- do associações do setor, com ní- veis inferiores a 30%. Esse é um dos principais motivos que está a levar os empresários a rejeitar a brecha aberta na semana passada pelo Governo, que pretende ali- viaros limites impostos à ocupa- ção dos espaços. A resolução do último Conse- lho de Ministros, que renovou o estado de calamidade, determina que a “ocupação no interior do es- tabelecimento seja limitada a 50% da respetiva capacidade” ou, em alternativa, devem ser “utilizadas barreiras físicas impermeáveis de separação entre os clientes que se encontrem frente a frente e um afastamento entre mesas de um metro e meio”. A medida terá um impacto “re- sidual”, antecipa Ana Jacinto, se- cretária-geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Simila- res de Portugal (AHRESP). “Os empresários não têm clientes. A taxa de ocupação é inferior a 50% pelo que, para a maioria dos res- taurantes, a medida é irrelevante. Tomara o setor estar com ocupa- ções de 50%. Além disso, está sempre tudo a mudar, e os empre- sários devem ter cautela quando fazem este tipo de investimento”, ressalva a porta-voz da AHRESP. Também junto dos associados da Associação Portuguesa de Ho- telaria, Restauração e Turismo (APHORT), a medida “não foi re- cebida com entusiasmo”, revela António Condé Pinto, presidente da organização. Os primeiros sinais “indicam claramente que a maior parte dos empresários não vai aderir” à pos- sibilidade de instalar barreiras de acrílico nas mesas, em troca do au- mento de capacidade das salas. Também Tiago Carvalho, fun- dador da União de Restaurantes de Braga de Apoio à Covid19 (Ur- bac19), afirma não ter “conheci- mento de nenhum restaurante” que vá aproveitar a possibilidade, entre os cerca de 150 espaços que a associação representa. “Os restaurantes não têm es- tado cheios. Durante a semana a ocupação tem rondado os 20% a 25%. Só aos fins de semana é que alguns conseguem atingir a lota- ção máxima permitida, sobretu- do os que têm esplanada”, aponta o porta-voz da APHORT. “Não há clientes. Nem 20% das salas estão a ser ocupadas”, corrobora Tiago Carvalho, que fala em quebras de faturação na ordem dos 60% a 70% já durante o desconfinamento. É por isso, acrescenta o res- ponsável da APHORT, que “a maior parte dos empresários não está disposta a fazer um investi- mento avultado num equipamen- to que requer mais gastos, e que daqui a algumas semanas poderá já nem ser necessário”. E mesmo que optem por ins- talar as barreiras, os empresários não vão poder contar com o apoio do programa Adaptar, criado pelo Governo para financiar a compra de equipamento de proteção. “A linha para as microempresas es- gotou em 10 dias”, lembra Ana Ja- cinto. “É como comer nas Finanças” Entre os empresários ouvidos pelo Negócios, a opinião é unâni- me. “Sou contra divisões com acrí- licos, prefiro que as pessoas te- nham espaço”, declarou o empre- sário e chef José Avillez, durante a iniciativa PME no Radar, orga- nizada esta terça-feira pelo Negó- cios e o Santander, e centrada na retoma do turismo. “Estamos a fa- lar de uma experiência de entre- tenimento e não num simples ato de alimentação. Com a colocação de barreiras, parece que estamos a comer nas finanças. Não é essa a experiência que queremos dar ao cliente e, se assim for, as pessoas vão preferir ficar em casa”. Nos restaurantes do grupo Olivier, os acrílicos também não vão fazer parte do menu. “Prefe- rimos faturar menos do que impor essa barreira. Os acrílicos desvir- tuam o conceito da restauração e não são confortáveis para os clien- tes”, explica ao Negócios o diretor de marketing do grupo, Joel Pires. Para catapultar a retoma da restauração, os empresários e as- sociações defendem a adoção “ur- gente” de outro tipo de medidas, “que têm de ser a fundo perdido”, ressalva Tiago Carvalho. Para o empresário de Braga , a restaura- ção precisa que o lay-off simplifi- cado seja prolongado até ao final do ano, com o Estado a garantir 50% dos salários. O apoio a fundo perdido, “que pode passar pela redução do IVA e da TSU”, é também a solução pedida por José Avillez. O empre- sário acredita que “tudo vai voltar a ser como era”, mas nunca antes da primavera de 2022. “Vai dar muito trabalho re- construir um setor que foi tão im- portante na recuperação da crise anterior. Nesta altura do ano, de- víamos estar a alimentar mais três milhões de pessoas. O limite de 50% à ocupação dos restaurantes é um falso problema”, ressalva o empresário Para António Condé Pinto, o principal travão é “a falta de con- fiança nos espaços fechados”. O lí- der da APHORT também não poupa críticas à proliferação de medidas de desconfinamento, que classifica como “fator de pertur- bação” da retoma. PRIMEIRA LINHA COVID-19 Restaurantes rejeitam investimento em acrílicos A restauração já pode funcionar com mais de 50% da lotação, em troca de barreiras que separem os clientes. A medida não convence os empresários, que preferem “perder dinheiro”. Em Paris, o designer francês Christophe Gernigon apresentou a sua criação em acrílico, o Plex’Eat, no restaurante H.A.N.D. Com a colocação de barreiras, parece que estamos a comer nas finanças. Não é essa a experiência que queremos dar aos clientes. JOSÉ AVILLEZ CEO do Grupo José Avillez “ A taxa de ocupação é inferior a 50%, pelo que, para a maioria dos restaurantes, a medida é irrelevante. ANA JACINTO Secretária-geral da AHRESP “ANA SANLEZ anasanlez@negocios.pt 8 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 O Governo vai reforçar a dota- ção das linhas de crédito ga- rantido pelo Estado, atual- mente de 6,2 mil milhões de euros e já praticamente esgo- tada, anunciou o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, esta terça-feira, 2 de junho, no Parlamento. Desta vez, a prio- ridade serão as micro e as pe- quenas empresas. “Temos capacidade de abrir novas linhas de crédito, esta- mos autorizados pela Comis- são Europeia, e vamos fazê-lo”, declarou Siza Vieira, acrescen- tando que “a experiência com as atuais linhas de crédito foi importante para continuar a fa- zer chegar dinheiro às empre- sas ao longo do ano”. O minis- tro da Economia não adiantou qual será a dotação das novas li- nhas de crédito. O Governo português tem autorização de Bruxelas para conceder garan- tias estatais até ao limite de 13 mil milhões de euros. Já foram lançadas linhas no valor de 6,2 mil milhões, que se somaram a uma inicial de 400 milhões. So- bram, assim, 6,6 mil milhões de euros em garantias estatais que poderão ser concedidas. Sobre as novas linhas, Pedro Siza Vieira esclareceu apenas o Governo de que está a “discutir com o sistema bancário a me- lhor forma de satisfazer a pro- cura que não foi satisfeita”. E fo- ram as micro e as pequenas em- presas que ficaram com maio- res necessidade de crédito sem resposta, esclareceu. Na semana passada, segun- do os dados do IAPMEI que fo- ram avançados pelo Negócios, já tinham sido aprovadas ope- rações de financiamento no va- lor total de 6,2 mil milhões de euros, mas menos de um terço deste montante tinha chegado às empresas. Entretanto, o montante das operações já con- tratadas entre a banca e as em- presas acelerou e, até à data, se- gundo revelou Pedro Siza Viei- ra, totaliza 3.583 milhões de eu- ros. “Estas linhas fizeram che- gar às empresas, em dois meses, o equivalente a um trimestre de todo o crédito concedido pela banca. O sistema bancário aca- bou por fazer chegar muito cré- dito às empresas”, sublinhou o ministro que adiantou, ainda, que também o programa Adap- tar, destinado a apoiar as em- presas no regresso à atividade, está perto de esgotar. No que diz respeito ao pe- ríodo inicial do regime de lay- -off simplificado, Siza Vieira revelou que foram aprovados 99 mil pedidos e foram feitos pagamentos de 321 milhões de euros, que correspondem a 99,9% dos pedidos aprovados. Foram ainda feitos 46.448 pe- didos de prorrogação do regi- me especial de lay-off e pagos 130 milhões de euros. RAFAELA BURD RELVAS Governo vai reforçar linhas de crédito garantidas pelo Estado As linhas de crédito de 6,2 mil milhõesde euros estão praticamente esgotadas e o Governo vai lançar novas linhas, assegurou Pedro Siza Vieira. Em Paris, o designer francês Christophe Gernigon apresentou a sua criação em acrílico, o Plex’Eat, no restaurante H.A.N.D. Christophe Petit Tesson/EPA 46 LAY-OFF Foram feitos 46.448 pedidos de prorrogação do regime especial de lay-off e pagos 130 milhões de euros neste âmbito. QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | PRIMEIRA LINHA | 9 10 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 ECONOMIA Devem os diabéticos e hipertensos que não possam realizar tele-trabalho ter direito a faltas justificadas ao abrigo do regime especial criado no âmbito da pandemia? PSD, PCP e Bloco entendem que sim e pediram a apreciação parlamen- tar do diploma do Governo que inicialmente previa que assim fos- se, mas depois foi alterado, fican- do os doentes em causa impedi- dos de invocar a sua patologia para justificar as ausências ao trabalho. O PAN está de acordo, e vai apre- sentar também uma iniciativa e o CDS-PP entende igualmente que estas faltas devem ser justificadas. Contas feitas, e com a discussão parlamentar agendada para esta quinta-feira, há um consenso entre a oposição no sentido de que os doentes hipertensos e diabéticos voltem a constar no rol das patolo- gias que permite que as faltas ao trabalho sejam consideradas justi- ficadas e, durante 30 dias, pagas pelo empregador. Tudo indica que a alteração seja aprovada na vota- ção de sexta-feira. Em traços gerais, o diploma que agora vai ser apreciado no Par- lamento determinou a criação de um regime excecional de proteção dos trabalhadores com doenças crónicas e imunodeprimidos, cujas funções não possam ser desempe- nhadas à distância. Estas pessoas “podem justificar a falta ao traba- lho mediante declaração médica, desde que não possam desempe- nhar a sua atividade em regime de teletrabalho ou através de outras formas de prestação de atividade”. Quatro dias depois da publica- ção do diploma, o Governo fez uma retificação ao mesmo, retirando da lista de doenças que dão lugar a fal- ta justificada os diabéticos e os hi- pertensos. Estas patologias podem ter diferentes graus de gravidade, sendo que, como o Negócios então escreveu, de acordo com as estima- tivas da Direção-Geral da Saúde (DGS), as diabetes têm uma taxa de prevalência junto da população en- tre os 20 e os 79 anos de 13%, o que se traduz em cerca de um milhão de pessoas. No caso da hipertensão, os números oficiais apontam para APRECIAÇÃO PARLAMENTAR Parlamento alarga proteção a diabéticos e hipertensos São discutidas esta quinta-feira três apreciações parlamentares do diploma do Governo que criou um regime excecional de proteção para os trabalhadores com doenças crónicas, excluindo diabéticos e hipertensos. PSD, PCP e Bloco querem voltar a incluí-los e tudo indica que conseguirão derrotar o PS na votação na sexta-feira. O Parlamento debate esta quinta-feira as propostas do PSD, PCP, Bloco de Esquerda e PAN. Votações serão na sexta-feira. Pedro Ferreira FILOMENA LANÇA filomenalanca@negocios.pt “ Só queremos corrigir uma situação que a própria comunidade médica vê como de elementar justiça. RICARDO BATISTA LEITE Deputado do PSD É incompreensível uma retificação para retirar pessoas do regime especial, principalmente porque doentes com diabetes e hipertensos são de especial risco e vulnerabilidade em relação à covid-19. MOISÉS FERREIRA Deputado do Bloco de Esquerda Temos de ser reativos e não esperar que as pessoas descompensem para depois lhes reconhecer o direito à falta justificada. JOÃO DIAS Deputado do PCP Tem de haver uma regra com um critério clínico, em função do que o médico disser. ANA RITA BESSA Deputada do CDS “ QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | ECONOMIA | 11 Publicidade A informação que temos, da DGS, é que estas pessoas continuam a ser grupo de risco para a covid- -19. Não faz sentido excluí-las. BEBIANA CUNHA Deputada do PAN “ uma taxa de prevalência de 27%, pouco mais do que dois milhões de pessoas. Claro que o número das pessoas que poderiam solicitar bai- xas justificada seria muito menor porque muitas destas pessoas estão reformadas e entre as que traba- lham uma parte poderá exercer as suas funções a partir de casa. Descompensados estão protegidos, diz o Governo A retificação foi polémica e muito contestada e a explicação que viria a ser dada publicamente, de que os hipertensos e diabéticos descom- pensados continuam ao abrigo do regime excecional de proteção la- boral para imunodeprimidos e doentes crónicos no âmbito da pan- demia de covid-19 não foi, contudo, considerada suficiente. “Não faz sentido. Temos de ser reativos e não esperar que as pessoas descompen- sem para depois lhes reconhecer o direito à falta justificada”, sublinha João Dias, do PCP. “E onde é que essa explicação do Governo está na lei?”, questiona, por seu turno, Ri- cardo Batista Leite, do PSD. Também para o Bloco de Es- querda a resposta não é suficiente. Ao retirar estas doenças do regime especial, “a imagem que passa, mesmo para os médicos de família que teriam depois de emitir a justi- ficação, é que estas pessoas não fa- zem parte do regime excecional de proteção”, sublinha o deputado Moisés Ferreira. Além disso, acres- centa, há outro aspeto importante, à luz da última lei que regula agora o teletrabalho e segundo a qual os doentes imunodeprimidos ou com doenças crónicas podem exigir à entidade empregadora continuar em teletrabalho. “Se não se mudar a lei, estes doentes ficam também fora do regime de teletrabalho a pe- dido”, sublinha o deputado. Esta terça-feira, a Associação Protetora dos Diabéticos de Portu- gal veio apelar ao Governo para que “reavalie a exclusão das pessoas com diabetes do regime excecional de proteção para que não sejam obrigadas a voltar a local de traba- lho, expondo-se ao risco de com- plicações associadas à covid-19”. Também a Sociedade Portu- guesa de Hipertensão, através de declarações à Lusa do seu presi- dente, Vítor Paixão Dias, entende que a opção do Governo , revela um “mau princípio” e poderá ter sido tomada “numa perspetiva orça- mental, porque há muitos hiper- tensos e diabéticos”. Os apelos deverão encontrar eco junto do Parlamento. Os pedi- dos de apreciação parlamentar apontam todos no sentido de in- cluir as duas doenças de novo no conjunto das suscetíveis de, depois de uma apreciação médica, conce- der ao doente faltas justificadas. O PAN vai apresentar ainda uma ini- ciativa no mesmo sentido, disse ao Negócios a deputada Bebiana Cu- nha, salientando que “a informação que temos é que estas pessoas con- tinuam a ser grupo de risco para a covid-19 pela DGS”, pelo que a ex- clusão não faz sentido. “Tudo o que vá neste sentido, nós acompanha- mos”, garante. O CDS-PP não tem iniciativa própria, mas também está contra a opção do Governo, embo- ra sublinhe que tenha sempre de “haver um critério clínico”. “Acom- panharemos a proposta do PSD”, diz a deputada Ana Rita Bessa. 12 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 ECONOMIA A s reações críticas face às declarações de Do-nald Trump defen-dendo o uso de forças militares contra as manifesta- ções pela morte de George Floyd extravasaram fronteiras e chegaram a países onde não é costume ver comentários sobre os assuntos domésticos dos Es- tados Unidos. Da União Euro- peia ao Canadá, passando pelo Reino Unido, todos condena- ram a morte de George Floyd às mãos das autoridades policiais mas também a forma como o Presidente dos EUA está a lidar com o assunto. “Nós aqui na Europa, tal como as pessoas nos Estados Unidos, estamos chocados e es- tupefactos com a morte de Geor- ge Floyd”, disse Josep Borell. O alto representante da União Eu- ropeia para os Negócios Estran- geiros aproveitou também para sublinhar o “direito a protestos pacíficos” e condenar “todos os atos de violência e de racismo,de qualquer tipo”, apelando à con- tenção de todas as partes para re- duzir o clima de grande tensão a que se assiste hoje nos Estados Unidos. Do Canadá também veio uma reação forte. “Todos vemos com horror e consternação o que se passa nos Estados Unidos. É altura de juntar as pessoas, mas é tempo também de ouvir”, afir- mou o primeiro-ministro Justin Trudeau após uma longa pausa de 20 segundos. Na Alemanha, as declarações também soaram igualmente du- ras: o ministro dos Negócios Es- trangeiros, Heiko Maas, disse que os protestos nos EUA são “compreensíveis e mais do que legítimos”. “Apenas posso expri- mir a minha esperança de que os protestos pacíficos não conti- nuam a levar à violência, mas ainda mais a esperança de que estes protestos tenham um efei- to nos Estados Unidos”, afirmou, citado pelo Washington Post. Mesmo do Reino Unido, cujo primeiro-ministro tem mantido uma boa relação com a administra- ção de Donald Trump, vieram pa- lavras amargas: “A violência a que estamos a assistir é muito alarman- te. As pessoas têm de ser autoriza- das a protestar pacificamente”, dis- se um porta-voz de Boris Johnson. Trump “é parte do problema” Nos Estados Unidos, os protestos prosseguiram ontem, inflamados agora pelas declarações de Do- nald Trump sobre o recurso às forças militares para travar os protestos que têm conduzido a distúrbios e violência. “Sou o vos- so Presidente da lei e ordem. Vou mobilizar todos os recursos fede- rais disponíveis, civis e militares, para pôr fim aos motins e pilha- gens, para acabar com a destrui- ção e os fogos postos e para pro- teger os direitos dos americanos cumpridores da lei”, declarou Trump na noite de segunda-feira. A resposta do seu rival na cor- rida à Casa Branca surgiu no dia seguinte: “O Presidente dos Es- tados Unidos deve ser parte da so- lução e não o problema. Hoje, o Presidente é parte do problema e acelera-o”, disse Joe Biden, can- didato democrata às eleições pre- sidenciais. Outra reação notada, e con- tundente, foi a de Gregg Popovich, treinador dos San Antonio Spurs, equipa da NBA: “É mais impor- tante para ele (Trump) tranquili- zar o pequeno grupo de seguido- res que valida a sua insanidade. O sistema tem de mudar. Farei tudo o que puder para ajudar, porque é isso que os líderes fazem. Mas ele não pode fazer nada que nos coloque num caminho positivo porque ele não é um líder.” O senador democrata do Ore- gon, Ron Wyder, classificou as pa- lavras de Trump como um “dis- curso fascista” e a também sena- dora democrata, Kamala Harris, asseverou que “estas não são pa- lavras de um Presidente, são pala- vras de um ditador”. ESTADOS UNIDOS Comunidade internacional critica palavras de Trump Com os Estados Unidos imersos em protestos, uns agressivos, outros pacíficos, o Presidente americano subiu a parada ameaçando recorrer ao exército para pôr cobro às ações violentas. A reação foi imediata e extravasou fronteiras, com críticas vindas até de países aliados. Alyson Mcclaran/Reuters MANUEL ESTEVES mesteves@negocios.pt DAVID SANTIAGO dsantiago@negocios.pt As manifestações de indignação contra a morte de George Floyd multiplicam-se por todo o país. Todos vemos com horror e consternação o que se passa nos Estados Unidos. JUSTIN TRUDEAU Primeiro-ministro do Canadá “ A violência que estamos a ver é muito alarmante. As pessoas têm de poder protestar pacificamente. PORTA-VOZ DE BORIS JOHNSON “Nós aqui na Europa, tal como as pessoas nos EUA, estamos chocados com a morte de George Floyd. JOSEP BORELL Líder dos Negócios Estrangeiros UE “ Publicidade 14 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 EMPRESAS T rês anos depois de ter sido vendido aos norte-americanos do Lone Star, o No -vo Banco continua a estar no centro de várias polémicas. Há uma que se repete todos os anos: as injeções de capital que o banco pede ao Fundo de Resolu- ção para repor os rácios de capital. Um “custo reputacional” que An- tónio Ramalho, presidente da ins- tituição que resultou da resolução do Banco Espírito Santo (BES), garante que vai terminar este ano. “O custo reputacional que o BANCA “Custo reputacional” do NB é para terminar este ano António Ramalho, presidente do Novo Banco, garante que o processo de reestruturação ficará concluído este ano. E, com isto, terminará também o que chama de “custo reputacional” que o banco “suporta anualmente”. RITA ATALAIA ritaatalaia@negocios.pt 1 2 3 As polémicas em torno do Novo Banco O cheque que chegou sem auditoria concluída O Novo Banco já esteve envol- vido em várias polémicas este ano. E uma delas colocou An- tónio Costa e Mário Centeno em rota de colisão. Tudo por causa de uma “falha de comu- nicação” entre o primeiro-mi- nistro e o ministro das Finan- ças em torno da injeção de ca- pital de 1.035 milhões na ins- tituição financeira. Tudo aconteceu nos pri- meiros dias de maio depois de António Costa ter garantido ao Bloco de Esquerda que “até haver resultados da auditoria” que está em curso ao Novo Banco “não haverá qualquer reforço do empréstimo do Es- tado ao Fundo de Resolução” para financiar o banco. Mas a injeção tinha sido feita no dia antes, avançou o Expresso. Ao todo, já foram injetados 2,9 mil milhões do total possível de 3,89 mil milhões de euros. No dia seguinte, o primei- ro-ministro dizia que não ti- nha sido informado da trans- ferência, enquanto Mário Centeno garantia que não ti- nha sido feito “à revelia”. A questão, que quase levou à saí- da do ministro, acabou por fi- car resolvida. Em causa está a auditoria aos atos de gestão, entre 2000 e 2018, que a De- loitte está a realizar e que deve ficar fechada em julho. Arran- cou agora uma nova auditoria referente à nova injeção. Ao que apurou o Negócios, a Deloitte deverá também as- sumir esta análise – desta vez apenas aos atos de gestão em 2019 – considerando as limi- tações das outras auditoras. O aumento dos salários dos gestores Os salários da administração do Novo Banco foram outro dos motivos para a instituição financeira ficar novamente em foco. Isto depois de ter sido avançado que os rendimentos sofreram um aumento signifi- cativo desde que o banco foi vendido. Foi no mês passado que o Público escreveu que, desde que o fundo norte-americano Lone Star entrou no capital do banco, em 2017, os salários pa- gos à administração do Novo Banco, liderada por António Ramalho, dispararam 75%, considerando que a remune- ração anual dos seis gestores executivos do Novo Banco, em 2017, se fixou em 1.336.000 euros, mas não levando em conta que três desses adminis- tradores entraram em funções apenas em abril e maio, pelo que não receberam o ano com- pleto. Por isso, o jornal escla- receu depois que o aumento seria de 53%, assumindo um salário anual completo dos três gestores face a 2019. Nes- se ano, tal como o Negócios avançou, o salário do CEO do Novo Banco cresceu 4,7% em relação ao ano anterior. Este tema levou a que os deputados chamassem Antó- nio Ramalho ao Parlamento, numa audição ainda sem data definida. “Como nem os bónus foram pagos nem os aumentos existiram, será uma audição curiosa. Pena que ninguém te- nha perguntado. Poupar-se-ia tempo de antena”, comentou, no Twitter, o presidente exe- cutivo do Novo Banco. O bónus que o Fundo de Resolução recusou pagar Outra questão polémica foi a atri- buição de um prémio de perto de dois milhões de euros, diferido e condicionado ao cumprimento de metas, à gestão executiva do Novo Banco. A decisão foi tomada pela comissão de remunerações da ins- tituição financeira, tal como o Ex- presso avançou, num bónus que será pago em 2022, depois de con- cluído o plano de reestruturação. Esta questão agitou a opinião pública, mas também provocou uma discórdia com o Fundo de Resolução. O Expresso escreveu que o fundo se recusou a pagar o prémio, retirando esse valor da nova injeção de capital:transferiu 1.035 milhões, menos dois mi- lhões do que estava inicialmente previsto. De acordo com informação obtida pelo Negócios, no centro deste desacordo está o facto de o auditor do banco ter exigido que 2,9 INJEÇÕES O Novo Banco já pediu perto de 2,9 mil milhões ao Fundo de Resolução. 4,7 SALÁRIO O salário de António Ramalho cresceu 4,7% em 2019, face ao ano anterior. QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | EMPRESAS | 15 Novo Banco suporta anualmente só terminará com o sucesso do pro- cesso de reestruturação que este ano se pretende concluir”, afirma o gestor, que assumiu a liderança do banco em 2016, numa declaração escrita enviada ao Negócios. “Hoje estamos mais próximo deste obje- tivo e mais seguros da sua viabili- dade”, garante António Ramalho. O gestor mantém, portanto, o objetivo de concluir este processo este ano, apesar do impacto da pandemia. Ou seja, um ano antes do prazo definido com Bruxelas – de 31 de dezembro de 2021 – e po- dendo o mecanismo de capital contingente continuar até 2026. É este mecanismo que prevê as injeções de capital do banco pelo Fundo de Resolução, que têm criado celeuma. Há cerca de um ano, quando o presidente do Novo Banco anunciou que iria pe- dir 1.149 milhões de euros, com base nas contas de 2018, o minis- tro das Finanças acabou por en- viar um comunicado a anunciar uma auditoria. “Dado o valor ex- pressivo das chamadas de capital em 2018 e 2019 [1.900 milhões de euros], o Ministério das Finanças, em conjugação com o Fundo de Resolução, considera indispensá- vel a realização de uma auditoria para o escrutínio do processo de concessão dos créditos incluídos no mecanismo de capital contin- gente”, lia-se no documento. Mas o “cheque” deste ano foi ainda mais polémico a ponto de quase provocar uma crise política. Tudo aconteceu no início de maio depois de o primeiro-ministro ter garantido ao Bloco de Esquerda que “até haver resultados da audi- toria” que está em curso ao Novo Banco “não haverá qualquer refor- ço do empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução” para finan- ciar o banco. Mas a injeção tinha sido feita precisamente um dia an- tes, no prazo limite definido no con- trato, como o Expresso noticiou. No dia seguinte, António Costa dava uma explicação pública, di- zendo que não tinha sido informa- do da transferência. Uma “falha de comunicação”, considerou Mário Centeno, que quase saiu do Gover- no por conta desta polémica. Em causa está a injeção de 1.035 milhões de euros, referente às contas de 2019, que o Novo Banco recebeu do Fundo de Re- solução para reforçar os rácios de capital. Somando às outras inje- ções, falta agora perto de mil mi- lhões para o banco chegar ao tec- to máximo de 3,89 mil milhões. Injeção única pouparia dinheiro e polémica? Em cima da mesa chegou a estar a hipótese de uma injeção única. O Governo e o Banco de Portugal, através do Fundo de Resolução, bem como o Lone Star, dono de 75% do Novo Banco, chegaram a discutir essa possibilidade, tal com o Expresso escreveu em novem- bro do ano passado. E chegaram a ser avançados nú- meros. De acordo com o Público, esta injeção de uma só vez seria de 1.400 milhões de euros (tendo aca- bado por se fazer a de mil milhões ditada pelos resultados), o que per- mitiria uma poupança de 600 mi- lhões face ao valor máximo que o fundo pode injetar. Chegou entre- tanto uma pandemia com forte im- pacto na economia e na banca. Este cenário deverá ditar um aumento do crédito malparado, gerando no- vas perdas para o Novo Banco, o que poderá levar o banco a recor- rer à totalidade do dinheiro. 54 Os prejuízos de quase 5 mil milhões em quatro anos O Novo Banco foi vendido há três anos. Neste processo, 75% ficaram nas mãos do Lone Star e os restantes 25% do lado do Fundo de Resolução. E, ao longo deste período, o banco tem registado prejuízos avul- tados, com os resultados a se- rem pressionados pelas perdas associadas à venda de crédito malparado e imóveis. No total, entre 2016 e 2019, os prejuízos acumulados do Novo Banco chegam perto dos 5 mil milhões de euros, num período que foi marcado pela aposta na “limpeza” do crédito malparado. No ano passado, o Novo Banco ven- deu uma das maiores carteiras alguma vez transacionadas em Portugal, de perto de três mil milhões de euros. Isto além de outros dois portefólios, como o caso dos projetos Sertorius e Albatros, em Espanha, e da GNB Vida. Estas operações geraram perdas de 350 milhões de eu- ros para a instituição financei- ra liderada por António Ra- malho, no ano passado. A deputada Helena Rose- ta chegou a afirmar, no Parla- mento, que, na “limpeza do ba- lanço que o Novo Banco tem vindo a fazer, estão a ser vendi- dos ‘ativos imobiliários não es- tratégicos’, ao desbarato e com grandes perdas, ao primeiro que se apresente”. Fonte oficial do banco contra-argumentou, dizendo que o Novo Banco “não vende, nem pretende vir a vender, quaisquer imóveis a preços desajustados de valores de mercado”. A devolução do dinheiro se houver má gestão Depois das “falhas de comuni- cação” entre António Costa e Mário Centeno, os bónus atri- buídos aos gestores e os au- mentos salariais, também o contrato de venda do Novo Banco ficou em xeque. António Costa, em respos- ta à coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, afirmou no Parlamento que, “se a auditoria [da Deloitte] concluir que houve má gestão, o Fundo de Resolução tem toda a legitimidade para agir no sentido da recuperação do dinheiro que desembolsou” e que não tinha de o fazer. Como o Negócios avan- çou, caso venha a ser detetada uma violação grosseira e reite- rada de uma ou mais das obri- gações definidas no contrato assinado com o Lone Star – nomeadamente a obrigação de gestão sã e prudente -, o Fundo de Resolução pode de- nunciar o contrato e recorrer aos tribunais. Uma questão que levou o Bloco de Esquer- da a requerer o acesso ao con- trato, um pedido já aprovado por unanimidade. O conselho de administra- ção do Novo Banco também reagiu a esta questão, dizendo “não aceitar e lamentar pro- fundamente que o bom nome da instituição continue a ser usado como arma de arremes- so político e/ou manobras po- lítico-mediáticas”. O banco acredita ser “seguramente uma das entidades bancárias mais escrutinadas, tanto a ní- vel nacional como a nível eu- ropeu”. fosse criada uma provisão para o bónus. Um reforço com o qual o fundo não concordou, perante as recomendações europeias para que não sejam pagos prémios aos gestores dos bancos, num período marcado pela incerteza quanto ao impacto e duração da pandemia. Para esta entidade, não fazia sentido constituir uma provisão para algo que poderá não aconte- cer, penalizando entretanto os re- sultados do banco, explica fonte próxima, notando que esta ques- tão será novamente analisada pela comissão de remunerações, mas só em 2022, ano em que o paga- mento poderá, ou não, avançar. O custo reputacional que o NB suporta anualmente só terminará [com a conclusão] da reestruturação. ANTÓNIO RAMALHO CEO do Novo Banco “ 2 BÓNUS A comissão de remunerações do NB atribuiu um bónus de 2 milhões aos gestores. 350 PERDAS As carteiras de ativos vendidas em 2019 geraram perdas de 350 milhões de euros. 2017 VENDA O contrato de venda do Novo Banco foi assinado em outubro de 2017. 16 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 EMPRESAS A The Navigator Company vai desen-volver até ao fim do ano uma pesquisa de mercado para procurar com- preender quais vão ser os hábi- tos de consumo no futuro em consequência do novo corona- vírus. É que, com o encerramen- to de escolas e universidades e o recurso por parte de muitas em- presas ao teletrabalho, o grupo prevê já para o ano de 2020 uma quebra de 15% no volume do segmento de papéis finos de im- pressão e escrita não revestidos (“uncoated woodfree”, ou UWF), área na qual ainda emabril decidiu reduzir a produção. Por essa razão, o presidente executivo do grupo, António Re- dondo, disse, na conferência te- lefónica com analistas para apresentação dos resultados do primeiro trimestre deste ano, que “obviamente estamos a olhar para alternativas para de - senvolver o negócio”. “É cedo para saber o que vai acontecer estruturalmente no mercado UWF. Não sabemos qual o impacto do teletrabalho ou se, no futuro, as escolas vão ter um misto de online e aulas presenciais”, afirmou o respon- sável, revelando que o grupo está a analisar as mudanças nos há- bitos de consumo. António Redondo frisou que a Navigator está confortável com a sua posição neste merca- do, “mas isto só significa que te- mos tempo para ajustar”, disse. Entre as alternativas considerou que “a pasta é a mais imediata”, garantindo que a empresa “tem capacidade de estar mais pre- sente no mercado da pasta se for preciso”. Também no “tissue” – utilizado em produtos como pa- pel higiénico, rolos de cozinha ou lenços de papel – sublinhou que o grupo tem “capacidade de otimizar mais as operações” e “retirar mais valor do mercado”. Para o CEO da Navigator há ain- da produtos que, de alguma for- ma, estão relacionados com pa- pel, que são alternativos ao plás- tico, que irão “ter um desenvol- vimento mais forte nos próxi- mos anos”. Estes produtos re- presentavam há dois anos me- nos de 2% do portefólio da Na- vigator e hoje pesam cerca de 4,5%, disse. O grupo começou ainda em 2018 à procura de novos seg- mentos de negócio, estudando a possibilidade de produção de produtos alternativos ao plásti- co como copos descartáveis em papel, palhinhas ou cotonetes. “Queremos ter um papel na substituição do plástico e acha- mos que algumas das nossas má- quinas de papel podem ser adap- tadas facilmente para isso”, afir- mou António Redondo, frisando que “temos de ser adaptativos nas máquinas de papel mais pe- quenas para produtos que não sejam o tradicional papel”. Já as três máquinas maiores, acrescentou, “continuarão a ser muito competitivas na área do UWF”, sendo que neste seg- mento de negócio a estratégia passa pela “eficiência”. Aos ana- listas, o CEO da papeleira sub- linhou que a pandemia começou ainda em abril a ter um “impac- to significativo no mercado de papel”, sendo que quer na pasta quer no “tissue” as unidades do grupo têm continuado a funcio- nar normalmente. INDÚSTRIA Navigator avalia alternativas para enfrentar queda no papel O grupo vai analisar até ao fim do ano as mudanças que a pandemia provocou nos hábitos de consumo de papel. A Navigator quer olhar para alternativas, que podem passar pelo reforço na pasta e no “tissue” e por produtos alternativos ao plástico. MARIA JOÃO BABO mbabo@negocios.pt António Redondo, que é CEO da Navigator desde janeiro, participou segunda-feira num seminário online sobre exportações organizado pela Nova SBE. Queremos ter um papel na substituição do plástico e achamos que algumas das nossas máquinas de papel podem ser adaptadas facilmente para isso. “ Estamos a tentar perceber com um pequena pesquisa de mercado até ao fim do ano quais vão ser os hábitos de consumo daqui para a frente. ANTÓNIO REDONDO CEO da Navigator “ 70 INVESTIMENTO A Navigator decidiu cortar mais de metade do investimento que tinha previsto realizar este ano, adiando-o para 2021. 46 CUSTOS A produtora de pasta e papel estipulou uma meta anual de redução de custos fixos em 2020 de 46 milhões de euros, face a 2019. 256 LIQUIDEZ Em março o grupo aumentou a liquidez para 256 milhões de euros e assegurou as necessidades financeiras para 2020. INVESTIMENTO CORTADO EM 88 MILHÕES Por causa da pandemia a Naviga- tor decidiu reduzir o plano de in- vestimento para este ano, dos 158 milhões de euros inicialmente pre- vistos para 70 milhões. No primei- ro trimestre, o grupo despendeu 22,7 milhões em investimento em manutenção, recorrente e ambien- te, um montante que fica aquém dos 32,5 milhões alocados nos pri- meiros três meses de 2019. As respostas do grupo à pandemia REVISÃO DO PROGRAMA DE REDUÇÃO DE CUSTOS Outra das medidas tomadas de imediato para preservar o grupo foi a revisão da profundidade das iniciativas de corte de custos, ten- do sido determinada uma meta de redução dos custos fixos para este ano de 46 milhões de euros, com- parativamente com 2019. O grupo já tinha um plano previsto para 2020 mas foi revisto, envolvendo toda a organização. TOME NOTA AUMENTO DA LIQUIDEZ NO IMEDIATO A Navigator decidiu ainda no final de março um aumento da liquidez imediata para 256 milhões de eu- ros, assegurando que todas as ne- cessidades financeiras para 2020 estão garantidas. O aumento da li- quidez resultou do incremento de linhas de crédito. Adicionalmente assegurou em abril 65 milhões de euros adicionais de financiamen- to de curto prazo. QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | EMPRESAS | 17 António Redondo, que é CEO da Navigator desde janeiro, participou segunda-feira num seminário online sobre exportações organizado pela Nova SBE. DR Papeleira ainda conta pagar dividendos até ao final do ano A The Navigator Company can- celou em maio passado a propos- ta de pagamento de 99 milhões de euros em dividendos, relativos ao exercício de 2019, mas o grupo ainda considera remunerar os acionistas até ao final deste ano. Na conferência telefónica com analistas para a apresentação dos resultados do primeiro trimestre, realizada na semana passada, An- tónio Redondo, CEO da Naviga- tor, explicou que devido à queda da procura de papel provocada pela pandemia o grupo decidiu es- tender a redução da produção e recorrer ao lay-off simplificado em junho. Um regime que, subli- nhou, pela legislação portuguesa, impede a empresa de pagar divi- dendos durante o período em que estiver a receber o apoio. Por essa razão, o conselho de administra- ção da papeleira alterou esse pon- to da ordem de trabalhos da as- sembleia-geral que se realizou a 28 de maio para os resultados se- rem integralmente aplicados na rubrica de reservas livres. Aos analistas, António Redon- do salientou que estes “tempos de grande incerteza requerem uma aproximação prudente”, adian- tando que quando a pandemia co- meçou o grupo construiu vários cenários, estimando que o pior pe- ríodo terá lugar entre abril e junho. Como garantiu, “até agora, os ce- nários mais drásticos não se con- firmam”, sendo que mesmo nos piores cenários a Navigator acre- dita ter possibilidade de remune- rar os acionistas, disse. “Como ve- mos hoje a situação acreditamos que a companhia vai ter possibili- dade, se os acionistas o quiserem, de pagar dividendos no final do ano”, afirmou o CEO. Nesse caso terão de ser os acionistas a convo- car nova assembleia-geral, uma vez que o conselho de administra- ção pode propor a distribuição de resultados mas não de reservas. Apesar de ter cancelado a en- trega de dividendos agora, o gru- po tinha já em janeiro entregue aos acionistas cerca de 100 milhões de euros através da distribuição de reservas livres. MARIA JOÃO BABO A decisão do grupo de recorrer ao lay-off simplificado em junho impede-o por lei, de pagar dividendos durante um período. António Redondo acredita que até ao final do ano a Navigator irá remunerar os acionistas. A produtora intensiva de enguias FindFresh foi licitada por três investidores, mas o leilão terminou sem atingir o valor mínimo fixado. Enguia da Foz com disputa online depois de afundar 12 milhões Colocada em leilão eletrónico por um valor base de 1,407 mi- lhões de euros, a primeira grande unidade de aquacultu- ra em Portugal destinada à produção intensiva de enguias, que faliu com dívidas de mais de 12 milhões de euros, deve- rá continuar na praça pública em busca de comprador. É que a primeira tentativa de venda, através de leilão on- line, terminou sem que fosse atingido o valor mínimo fixa-do pelos credores – a compe- tição fechou nos 996 mil eu- ros, muito abaixo do valor mí- nimo fixado de 1,217 milhões de euros. Houve um despique final, iniciado a dois minutos do ter- mo do leilão, quando surgiu uma licitação 10 mil euros aci- ma dos 956,5 mil euros ofere- cidos uns dias antes. Ora, de acordo com as regras desta competição, o fim da sessão só se verificaria após a ausência de licitações nos últimos cin- co minutos anteriores ou de- pois da hora-limite. Neste caso, ocorreram ainda três lan- ces, cada um 10 mil euros aci- ma do anterior. De acordo com fonte pró- xima do processo, as licitações foram acionadas por três in- vestidores, dos quais dois têm participação internacional. Mais: “Antes do leilão, tivemos a manifestação de interesse por parte de investidores suí- ços e ingleses, por exemplo, mas que não conseguiram vi- sitar a unidade devido à pan- demia”, garantiu a mesma fon- te ao Negócios. Demonstrado que ficou o interesse junto do mercado na compra da unidade industrial da falida FindFresh, tudo indi- ca que os credores, após deixa- rem achatar os tempos críticos em que vivemos, deverão vol- tar à carga com um novo pro- cedimento de venda do único ativo da insolvente empresa. Instalada na Figueira da Foz, a FindFresh, que surgiu no mercado com a marca pró- pria “Enguia da Foz”, entrou em atividade em maio de 2016 pelas mãos do seu mentor e principal acionista – o empre- sário Paulo Vaz. Financiada em oito mi- lhões de euros pelo banco pú- blico norueguês Eksportkre- ditt Norge e em 3,9 milhões pelo programa comunitário Promar, faturou apenas 100 mil euros em 2017 e 457 mil no ano seguinte. Parou na pri- mavera do ano passado e foi declarada insolvente em se- tembro com dívidas superio- res a 12 milhões de euros. RUI NEVES AQUACULTURA 1,4 VALOR BASE A produtora de enguias foi colocada à venda por 1,4 milhões de euros, com o valor mínimo fixado em 1,217 milhões de euros. 996 LICITAÇÃO O leilão online teve cinco licitações, com a disputa a fechar nos 996,5 mil euros, abaixo, portanto, do valor mínimo. 18 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 EMPRESAS A Fladgate agendou para o final do próximo mês a inauguração do World of Wine (WoW), um projeto turísti- co em que investiu 105 milhões de euros nos antigos armazéns da Croft e da Taylor’s que, como ou- tras marcas de vinho do Porto, saí- ram do centro histórico de Gaia. Este quarteirão cultural vai estar em modo de “abertura suave”, se- guindo o ritmo das contratações e as expectativas sobre o número de visitas, que também foram mode- rados devido à pandemia. “Estamos felizes com o rigor nas obras. A partir do momento em que surgiu a covid-19 tivemos de adaptar procedimentos e tive- mos atrasos na receção de mate- riais de fornecedores, mas não pôs em causa a data de abertura”, que antes do vírus já tinha sido adiada um mês face à estimativa original, relata ao Negócios o diretor-geral do grupo, Adrian Bridge. Sobre os visitantes anuais, que no lança- mento arriscou que chegariam a 560 mil, diz agora que “dado o contexto torna-se mesmo impos- sível” fazer uma previsão. “Temos condições de higiene e segurança para receber o merca- do nacional, sem constrangimen- tos. Não queremos apontar núme- ros, nem vamos estar reféns deles neste período. Queremos manter o investimento e acreditar que va- mos contribuir para a retoma do turismo no Porto e em Portugal, de forma cautelosa, progressiva e sustentada”, responde o gestor, lembrando que o setor “não de- pende apenas e só do seu traba- lho”. “Ainda assim, estamos cien- tes de que a vontade de viajar e de usufruir de experiências novas é inerente ao ser humano e intrín- seca nos hábitos”, completa. Com pontos em comum com a La Cité du Vin, em Bordéus (França), o WoW conta com seis museus – sobre vinho, copos, cor- tiça, chocolate, moda e design e a história da cidade Invicta –, nove espaços de restauração, uma es- cola de vinhos e várias lojas, num total de 55 mil metros quadrados. Quando abrirem todos os serviços vão trabalhar ali 350 pessoas. O recrutamento foi interrompido em meados de março devido ao novo coronavírus – o grupo colo- cou mais de 400 funcionários em lay-off – e recomeçou em maio com “as adaptações necessárias”. Turismo perde 50% Foi em 2010 que a casa de vinho do Porto entrou no setor turístico com o hotel The Yeatman, vizinho do WoW, reforçado depois com as compras do Infante Sagres (Por- to) e do Vintage House (Pinhão). Adrian Bridge, genro de Alistair Robertson (sócio maioritário e atual presidente não executivo da Fladgate), confia que “o mercado nacional pode ser um bom início de retoma”. Porém, com 85% da faturação do ramo hoteleiro de- pendente de clientes estrangeiros, prevê que “o decréscimo de recei- ta no setor seja de 50%” em 2020. No ano passado, o turismo contribuiu com 36 milhões para as vendas totais de 125 milhões de euros. A distribuição (Herita- ge e OnWine) valeu 27 milhões e o vinho gerou os restantes 62 milhões, enfrentando um “mo- mento desafiante”. O líder da Taylor’s, Croft, Fonseca e Krohn não arrisca “deduzir as perdas” quando exporta para 103 países, mas invoca os 328 anos da em- presa para concluir que “já foram ultrapassadas muitas crises e esta não será diferente”. TURISMO Projeto de 105 milhões abre em Gaia sem previsão de visitas O World of Wine arranca no final de julho no espaço reabilitado das antigas caves da Croft e da Taylor’s. A pandemia não atrasou as obras, mas adiou o recrutamento dos 350 trabalhadores e “impossibilita” a estimativa sobre o número de visitantes. O novo “vizinho de baixo” do hotel The Yeatman ocupa 55 mil metros quadrados no centro histórico de Gaia. Paulo Duarte ANTÓNIO LARGUESA alarguesa@negocios.pt 36 RECEITAS DO TURISMO Em 2019, o segmento turístico contribuiu com 36 milhões para a faturação recorde da Fladgate, a rondar os 125 milhões de euros. Não queremos apontar números, nem vamos estar reféns deles neste período [de incerteza]. ADRIAN BRIDGE Diretor-geral do grupo The Fladgate Partnership “ Publicidade Juntamos o cuidado à informação. SÁBADO 6 DE JUNHO NA COMPRA DO SEU JORNAL OFERTA Cuidar de nós é cuidar dos outros.Não s e tr at a de u m d is po si tiv o m éd ic o. N ão n os re sp on sa bi liz am os p el a su a ut ili za çã o in co rr et a. C on su lte a s in st ru çõ es q ue s e en co nt ra m n a em ba la ge m . I m ag em n ão c on tr at ua l. Pr es su põ e a aq ui si çã o do jo rn al . O fe rt a vá lid a na c om pr a da e di çã o do d ia . O CM e a KARCHER oferecem, no próximo sábado, dia 6, máscaras a todos os leitores do Correio da Manhã. A máscara é para uso pessoal/individual e não para fins médicos. .. 20 | QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 NEGÓCIOS SUSTENTABILIDADE A sustentabilidade, nas suas três ver- tentes, e um maior interesse dos con- sumidores pelos produtos nacionais, tem levado as cadeias de retalho a aumen- tarem as suas compras nacio- nais e até locais, rentabilizando também da melhor forma as suas cadeias logísticas. Ondina Afonso, presidente do Clube de Produtores Continen- te (CPC), assegura ao Negócios que “independentemente da si- tuação económico-financeira do nosso país, a Sonae MC desen- volve, desde 1998, uma relação próxima com produtores do se- tor agroalimentar e agropecuá- rio – através do Clube”. Mas sa- lienta: “Ajudar os produtores por- tugueses no escoamento de pro- dutos essenciais, nesta fase de emergência nacional, foi e conti- nua a ser o objetivo do Continen- te ao abrir a integração de novos membros no CPC. Em março lançámos o convite e, em apenas duas semanas, acolhemos mais de 40 novos membros”. Também Bruno Pereira, ad- ministrador de compras do Lidl Portugal, nos diz que “faz parte da génese do Lidl o apoio à produção nacional ea garantia de um traba- lho de proximidade com os seus fornecedores e produtores nacio- nais, privilegiando parcerias de longo prazo”. E, “neste momento difícil, estamos conscientes da im- portância dos nossos compromis- sos perante um contexto adverso (…). Podemos afirmar que, na ca- tegoria de Frutas e Legumes, nos meses de março e abril, aumentá- mos a compra de artigos nacionais em aproximadamente 25%, quan- do comparado com o ano passa- do”. A presidente do CPC adianta que “já estávamos a aumentar as compras à produção nacional mesmo antes da pandemia. A tí- tulo de exemplo, no 1.º trimestre do ano, comprámos mais de 71,3 milhões de euros à produção na- cional, um aumento de cinco mi- lhões face ao período homólogo (…) de um modo transversal, em todas as categorias, desde a carne – com forte incidência junto dos produtores das raças autóctones – aos queijos tradicionais a frutos e legumes”. Setor dos queijos muito afetado com covid-19 Ondina Afonso refere que “de fac- to, os queijos tradicionais foram uma das categorias mais ‘fustiga- das’ com a crise sanitária e, como forma de ajudar ao escoamento de produtos únicos e de excelência, organizámos a Feira de Queijos de Portugal, onde ao final de três se- manas se venderam mais de 100 toneladas de queijos portugue- ses”. Bruno Pereira afirma igual- mente que “o Lidl está a traba- lhar com outros fornecedores não habituais, no seguimento do apelo do Ministério da Agri- cultura, para que os retalhistas alimentares associados da APED [Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição] aumentassem as suas compras a categorias de produto como, por exemplo, os queijos, por forma a garantir o escoamento de pequenos produtores, que vi- ram encerrados os seus canais tradicionais de venda. Nesse sentido, temos disponíveis no- vos queijos nacionais em loja, como forma de apoio à produ- ção nacional. O setor dos quei- jos está a ser bastante afetado pelo contexto da covid-19, ao perder, no canal Horeca, mui- tas das suas vendas”. O CPC trabalha com várias organizações de produtores “con- seguindo-se uma otimização no armazenamento e transporte (…) facilitando assim os processos lo- gísticos”, por seu lado, o Lidl “aposta já numa estratégia de sim- plificação da logística e da sua ca- deia de distribuição, prezando não só por uma otimização da ocupa- ção dos camiões, mas pela otimi- zação das rotas”, sulinha Bruno Pereira. A covid-19 levou as grandes cadeias de retalho a apostarem ainda mais na compra a produtores locais, reforçando uma estratégia que já vinham a implementar para aumentarem a sua sustentabilidade. O setor dos queijos foi um dos que mais sofreram com a crise sanitária. EMÍLIA FREIRE Pandemia reforça aposta em compras locais “A situação dos produtores nacionais motivou (…) ações por parte do Ministério da Agricultura, no sentido de promover o consumo junto das populações. NUNO RUSSO Secretário de Estado da Agricultura “Ajudar os produtores portugueses no escoamento de produtos essenciais, nesta fase de emergência nacional, foi e continua a ser objetivo do Continente. ONDINA AFONSO Presidente do Clube de Produtores Continente QUARTA-FEIRA | 3 JUN 2020 | SUSTENTABILIDADE | 21 1.000Número de produtores que se inscreveram na plataforma “Alimente quem o Alimenta”, criada pelo Ministério da Agricultura, para mitigar os efeitos da pandemia. DR Para responder à pandemia covid-19, o Ministério da Agricultura lançou um conjunto de medidas, “com o objetivo de assegurar o funcionamento do se- tor agrícola e mitigar as quebras de procura”, explica ao Negócios o secre- tário de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Nuno Russo. “A situação dos produtores nacionais motivou desde logo um conjunto de ações por parte do Ministério da Agricultura, no sentido de promover o consumo junto das populações, sensibilização dos grandes grupos de retalho alimentar para a compra destes produtos, dos mercados abaste- cedores ou das autarquias para se assegurar o funcionamento regular dos mercados locais e municipais”. Especificamente para as cadeias curtas, Nuno Russo adianta que “foram alargadas as possibilidades de escoamento, além dos mercados locais, incluindo apoios diretos às deslocações aos pequenos produtores. Para- lelamente, criámos a Plataforma ‘Alimente quem o Alimenta’ que, no se- guimento de uma campanha de incentivo ao consumo de produtos nacio- nais, a qual alcançou mais de quatro milhões de pessoas, procurou apro- ximar produtores e consumidores e agilizar o escoamento. Esta platafor- ma (https://www.alimentequemoalimenta.pt/) registou, no primeiro mês, a inscrição de cerca de mil produtores e, no mesmo período, obteve mais de cem mil interações”. Ministério apoia mercados locais e cadeias curtas “O Lidl está a trabalhar com outros fornecedores não habituais, no seguimento do apelo do Ministério da Agricultura. BRUNO PEREIRA Administrador de compras do Lidl As vias para uma logística mais sustentável As empresas de logística e trans- porte têm apostado em estraté- gias e iniciativas para tornarem as suas operações mais susten- táveis, com o objetivo de cum- prirem as metas da União Euro- peia (UE) ao nível da descarbo- nização da economia e da elimi- nação do desperdício, mas tam- bém pela imposição do merca- do e dos clientes. A sustentabilidade torna-se, assim, um importante fator de competitividade. O presidente da Associação Portuguesa de Logística (APLOG) diz ao Negócios que “a logística tem tido um papel determinante na procura e im- plementação das melhores prá- ticas ao nível da sustentabilida- de (…) em todas as dimensões da sua atividade”, ou seja, ao nível dos “ativos, processos, transpor- tes, energia e pessoas”, refere Raul Morais Magalhães. As embalagens têm um peso muito grande na logística e as empresas têm procurado dar resposta às metas da União Eu- ropeia (UE), nomeadamente ao objetivo de todas as embalagens de plástico serem reutilizáveis até 2030. A UPS, por exemplo, lançou no início do ano passado, um projeto inovador na área da reutilização e reciclagem de em- balagens. O sistema Loop, que elimina a dependência da utili- zação única de embalagens. Ou seja, os consumidores recebem as suas encomendas em emba- lagens duráveis e específicas para cada marca, que uma vez utilizadas, são recolhidas, lim- pas, recarregadas e reutilizadas noutras entregas. “Os resíduos sempre foram uma preocupação nesta ativida- de e têm constituído casos de es- tudo, quer na sua racionalização, quer no seu aproveitamento”, afirma o presidente da APLOG. Um desses casos é o projeto Zero Waste World lançado pela australiana Brambles, que de- tém a marca CHEP (paletes), e que se baseia em três pilares des- tinados a ajudar os clientes na Europa e Estados Unidos a re- duzir desperdício e melhorar a eficiência nas suas cadeias de abastecimento. Os pilares são a eliminação de desperdício, des- de o packaging de utilização úni- ca até aos produtos não “vendá- veis”; a erradicação de quilóme- tros em vazio; e o corte das ine- ficiências e melhoria da rastrea- bilidade na cadeia de abasteci- mento. No futuro, Raul Morais Ma- galhães considera que “a utiliza- ção de inteligência artificial, o re- curso crescente à automação e à digitalização é o caminho para uma logística mais sustentável” e “os recentes acontecimentos, crise pandémica, serão um ace- lerador destas tendências”. A covid-19 provocou altera- ções “a todos os níveis da cadeia de abastecimento” e o presiden- te da APLOG frisa que “o incre- mento das compras locais foi uma necessidade imediata nos últimos meses, caso contrário corríamos o risco de ter ruturas ou disrupções nas cadeias de abastecimento em particular nas alimentares e de bens de pri- meira necessidade”. Raul Morais Magalhães de- fende que “a crise provocada pela covid-19 veio, se necessário fosse, evidenciar algum
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