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FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Avaliação Final da Disciplina 
Coordenação do Trabalho da Escola I
PROFESSOR: ROMUALDO PORTELA DE OLIVEIRA
São Paulo
Junho de 2011
1. Você é a favor da gestão democrática da educação? Por que? Como ela deve ser?
Sim. Acredito que a gestão democrática da educação esteja intimamente relacionada à melhoria da qualidade na educação. Isso porque a partir de práticas e formas de organização do trabalho escolar que promovam a autonomia e que permitam mecanismos de participação no interior das decisões, as estruturas criadas a partir destes elementos permitem que as decisões e ações que derivem delas estejam relacionadas ao beneficio coletivo e democrático. A educação deve ser concebida a partir da ótica da gestão democrática, desde a criação de órgãos de gestão que permitam a representatividade de todos os indivíduos direta ou indiretamente envolvidos no processo educativo, na qual as decisões tomadas no interior destas organizações tenham sua legitimidade garantida, além de proporcionar um local para o debate de opiniões e incentivar a participação nas decisões. Tal incentivo é necessário pois “tendo em conta que a participação democrática não se dá espontaneamente, sendo antes um processo histórico em construção coletiva, coloca-se a necessidade de se preverem mecanismos institucionais que não apenas viabilizem mas também incentivem práticas participativas dentro da escola pública.( PARO, 1998,p.46) Tais órgãos podem ser o Conselho Escolar, o Conselho de Classe, a Associação de Pais e Mestres e o Grêmio Estudantil. Além disso, a escola deve garantir a participação legítima e coletiva da construção e aplicação do projeto político pedagógico, tomando o cuidado para que este documento não se torne apenas um produto esvaziado de significado, preenchendo apenas as obrigações burocráticas de sua existência. O projeto político pedagógico da instituição deve ser um documento que condense os objetivos e metas da escola, assim como suas propostas de ação e a explicitação dos princípios que regem a proposta pedagógica, todos construídos coletivamente, da mesma forma que a busca por se fazer concretizar tais objetivos seja também coletiva, ou seja, um projeto uno e em consonância com as diretrizes ali expostas, sendo o eixo orientador que dá significado às atividades desenvolvidas pela escola.
Portanto, a gestão democrática da educação deve garantir a construção coletiva e participativa de todos os segmentos da escola, permitindo que efetivamente a prática seja democrática, reflexiva e que caminhe para buscar a autonomia. 
2. A luz dos princípios apresentados por Crahay, como você analisaria a escola brasileira hoje? (Tome como referência onde fez estágio)
Crahay propõe que existem duas formas de se conceber a noção de justiça: a meritocrática e a corretiva. A primeira supõe que seja justo dar mais àqueles que possuem melhor desempenho. Já a segunda pressupõe que todos tem direito ao mesmo tratamento, e quando se trata de situações em que há a desigualdade entre os indivíduos, esta justiça prevê alguma forma de compensar o menos favorecido, estabelecendo assim o equilíbrio. A partir desta consideração, Crahay busca analisar os princípios que norteiam determinadas ideologias pedagógicas, cada qual valendo-se de uma concepção de justiça. Para tanto, analisa os sistemas pedagógicos que defendem a igualdade de oportunidades,a igualdade de tratamento e a igualdade de conhecimentos.
Com base de minhas observações realizadas no estágio, pude observar o cotidiano de uma escola estadual de ensino médio. À luz dos princípios apresentados por Crahay, acredito que a tendência das instituições escolares no Brasil é semelhante à ideologia da “igualdade de oportunidades”, na qual supõe-se que as capacidades ou aptidões individuais dos alunos sejam naturais e que depende somente deles para que o êxito educacional possa ser alcançado. Esta ideologia supõe a noção de justiça meritocrática. Idéias como esforço individual, iniciativa e competição estão profundamente enraizadas no pensamento educacional do cenário brasileiro. Por isso, consideram justo a aplicação de um modelo meritocrático, legitimando formas de seleção como o vestibulinho – avaliação que seleciona os melhores alunos para o ingresso à escola, conforme a ETEC da qual observei em meu estágio. Além disso, aceitam naturalmente um ensino elitista, em que admitem-se formas diferentes de educação para desempenhos diferentes. Negam as diferenças iniciais como socioeconômicas, desigualdade no acesso das oportunidades educacionais, etc. Há ainda presente no discurso pedagógico das escolas brasileiras fragmentos da ideologia da “igualdade de tratamento”, pois acredita-se que todos os alunos, quando expostos ao mesmo ensino e condições de aprendizagem , tenham as mesmas capacidades para aprender, vestindo a escola de uma falsa neutralidade e imparcialidade, ignorando a problemática das desigualdades iniciais, e ainda gerando ainda mais desigualdade escolar, contribuindo para a reprodução das desigualdades sociais. Além disso, crêem estar oferecendo uma ação pedagógica igual a todos, sem perceber que acentuam a diferença entre os favorecidos e não favorecidos –ao não realizar em suas práticas a discriminação positiva, isto é, negar que todos são iguais e portanto submeter os desfavorecidos a tratamentos diferenciados. Em consonância com a justiça corretiva, esta ideologia,quando transportada ao ambiente escolar, como no caso brasileiro, traz implicações graves no desempenho dos alunos, adotando formas de avaliação iguais sem levar em conta as dimensões particulares dos alunos, como as especificidades e habitus da classe social da qual eles provem. 
3. A escola pode ser eficaz e democrática? Justifique.
Segundo Sammons, o autor que concebe a escola eficaz, a “liderança eficaz exige clareza, evitar formas de trabalhar muito autocráticas como democráticas demais, julgamentos cuidadosos de quando tomar uma decisão autônoma e de quando envolver outros, e o reconhecimento da eficácia do papel da liderança nos diferentes níveis da escola.( BROOKE,SOARES, 2008). Ou seja, a escola eficaz sugere que o papel do gestor deve estar no limite entre a liderança que considera mecanismos de participação coletiva e a liderança individual e centrada exclusivamente nas diretrizes concebidas ao papel que lhe cabe. Porém, o autor também sugere que a escola progride melhor quando “todos os professores sentiam que suas opiniões estavam representadas e levadas a sério nos processos decisórios” (BROOKE; SOARES, 2008, p.19). Ou seja, há a consciência da importância de se garantir a gestão democrática da escola, na qual estejam garantidos os mecanismos de tomadas de decisões participativos e coletivos. Já para Crahay, que busca compreender se seria possível a escola ser justa, considera, em sua análise, que na medida que a educação esteja pautada na justiça, conseqüentemente se torna também eficaz. Esta justiça pode ser transportada para o pensamento da escola democrática, pois, a busca por uma escola democrática,na qual a organização do trabalho e a tomada de decisões derivem de ações coletivas, através de um processo decisório participativo, esta pode ser, na medida, também eficaz, capaz de promover uma educação eficaz. Porém, não se pode concluir que somente através da garantia de uma gestão democrática, ou seja, em seu âmbito administrativo, a escola automaticamente se torne eficaz. Esta deve estender sua dimensão democrática para sua ação pedagógica e educativa, para a partir daí, se tornar um possível caminho para a escola eficaz. 
4. Que implicações para a gestão escolar você identifica a partir das transformações em curso na sociedade?
A sociedade contemporânea passa por profundas transformações, especialmente no setor econômico, que reflete-se intensamente em todas as demais áreas, inclusive a social. Tais transformações, ligadas ao surgimento de novas tecnologias que permitirama reestruturação nas formas de trabalho até então predominantes, estão ligadas à transição do pólo dinâmico da economia: o capital deixou de se concentrar predominantemente na indústria e agora concentra-se na informação.A indústria diminuiu, apesar do um crescimento elevado em produtividade, os empregos vão cada vez mais decrescendo, tanto em oferta de vagas quanto em existência das profissões, já que muitas não são mais necessárias. 
Além das transformações econômicas, as mudanças políticas também geraram implicações para a educação: a crescente onda neoliberal vem diminuindo os direitos sociais e a obrigação do Estado em oferecê-los, uma vez que o pensamento predominante sugere o Estado mínimo, no qual o mercado seria o grande regulador da economia.
Dado este panorama, que já foi classificado como período “pós-industrial” e hoje prefere-se “sociedade do conhecimento ou informação”, são nítidas as transformações que penetraram no interior de todos os setores da sociedade, inclusive na educação: Passa-se dos controles do processo para o controle dos produtos, eliminam-se os níveis intermediários dedicados ao controle; A educação passa a ser vista como uma mercadoria; Começa-se a observar a crescente entrada de capitais privados no âmbito educacional; - Ocorre a crescente descentralização da gestão escolar e de seu financiamento, a centralização da avaliação das instituições escolares.
A mercantilização da educação refere-se ao processo neoliberal que tende a percebê-la cada vez menos como um direito social e sim como um serviço, do qual se aplicam as mesmas leis do mercado, isto é, visto como um gerador de lucros, atribuindo um valor para o acesso ao conhecimento, permitindo a entrada de investimento de capital privado no processo do ensino, como nos matérias curriculares didáticos ou nas relações de contrato de trabalho.
Além disso, outras implicações geraram grande impacto para a gestão escolar, como conseqüências das reformas educacionais contemporâneas, especialmente aquelas que se referem à descentralização da gestão escolar e a crescente centralização dos mecanismos de avaliação. Tais conseqüências referem-se ao mecanismo de poder e controle que sutilmente foram transferidos das mãos da escola e passaram a se deter no poder do Estado: o controle sobre o que ensinar, como ensinar, o currículo e o comportamento da escola está totalmente concentrado, isto é, centralizado em torno do aparelho estatal. Apesar do discurso estar cada vez mais associado à autonomia das instituições escolares e de sua gestão, quem controla os conteúdos cada vez mais é o Estado através das avaliações sistêmicas, que adquiriram grande peso e importância no cenário educacional, e tal controle é brando pois ocorre pelos resultados (produtos) e não sobre os processos (a forma da qual o ensino e os conteúdos são ministrados no cotidiano escolar).
5. Levando-se em conta os conteúdos trabalhados no curso, elabore e responda uma questão.
-> Elabore um texto que exponha as principais diferenças entre as concepções de desigualdade escolar presentes nos seguintes textos: 
· ARROYO, M. A escola possível é possível? In. Da escola Carente à Escola Possível. São Paulo, Loyola, 1989. 
· HOWE II, H. Carta de Entrga do Relatório sobre igualdade de oportunidades educacionais – U.S. Commissioner of Educaion e COLEMAN, J.S. Desempenho nas escolas públicas, ambos em BROOKE, N. & SOARES, J.F. Pesquisa em eficácia escolar: Origens e Trajetórias. Belo Horizonte, Ed. Da UFMG, 2008.
· SAMMONS, P. As características-chave das escolas eficazes.In. BROOKE, N. & SOARES, J.F. Pesquisa em eficácia escolar: Origens e Trajetórias. Belo Horizonte, Ed. Da UFMG, 2008.
Todos autores tratam do tema da desigualdade social e desigualdade escolar, e discorrem sobre de que modo a escola, através de diferentes concepções, pode intervir e alterar tais desigualdades. Além disso, expressam diferentes posições nas formas de entender a ação da escola e na escola e sua relação com a sociedade e conseqüentemente, com a desigualdade.
O texto que expõe as conclusões das quais Coleman chegou em seu relatório, surgiu no contexto de 1960, quando o governo americano encomendou um estudo que buscava compreender o panorama educacional. O estudo feito por Coleman concluiu que a escola tem pouca condição de incidir sobre a desigualdade social.Em sua abordagem o autor enfatiza as desigualdades já existentes na sociedade e acredita que essas desigualdades iniciais se tornam desigualdades escolares, que conduzem o destino do aluno no interior da instituição escolar. Acredita também que a escola acentua e reforça tais desigualdades e que as políticas de combate à elas deve ocorrer fora do ambiente escolar, diretamente na sociedade.
Já o texto que trata do movimento das escolas eficazes surge como reação a esta visão descrita anteriormente. Esta concepção defende que há desigualdades produzidas e reforçadas no ambiente escolar. Seus autores conseguirem demonstrar, através de estatísticas, a parcela de interferência da escola no âmbito da desigualdade, por isso defendem que estas podem e devem ser combatidas no âmbito da escola, ou seja, em suas práticas no seu interior, para reduzir a desigualdade. Recaem diversas críticas sobre esta teoria, inclusive atribuindo a elas a característica de “padecer da ilusão pedagógica”, pois ainda que aleguem que as desigualdades sociais são importantes, na tentativa de compensá-las em seu interior, as escolas eficazes acabam abstraindo-as do campo social, acreditando que através da educação eficaz as desigualdades sociais seriam regeneradas.Esta concepção não discute a estrutura social, e sim propõe medidas e modelos de educação que visem uma educação que não reforce as desigualdades sociais. 
Já no texto de Arroyo, há uma visão com bastante ênfase na importância de se pensar a educação das camadas excluídas, com uma visão politizada da ação educativa. Para o autor, ainda que reconheça a importância da ação no interior da escola, acredita que não seja possível pensar em um projeto de educação abstraindo-se a condição de vida dos alunos fora da escola, pois esta deve compreender e ter consciência de classe para realizar a transformação.Ainda segundo Arroyo, é necessário se pensar em uma escola possível para os filhos das camadas subalternas, não apenas inserindo-os na escola. Esta escola deve ser de qualidade e isenta da dicotomia entre escolas para elite e escolas para operários. Além disso, deve contar com um corpo docente com formação adequada, conscientes de sua função na estrutura política e com salários dignos. Para Arroyo, a escola é um instrumento de reprodução das classes sociais , e o combate à desigualdade só poderá ocorrer a partir de uma profunda transformação da estrutura social.