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Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com RITMO E DANÇA Profª Esp. Thais Marques 1º e 2º Semestre Licenciatura Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com FACSUL- FACULDADE DE MATO GROSSO DO SUL CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA LICENCIATURA – 1º e 2° SEMESTRE - 2017.2 DISCIPLINA: RITMO E DANÇA PROF. THAIS CRISTINE DE OLIVEIRA MARQUES CONCEITO DE MOVIMENTO: O movimento é a forma como nos revelamos, nos expressamos e como nos relacionamos com o outro e com o mundo. Assume diversas funções ao longo de nossa vida: caráter funcional-utilitário: como quando nos movemos para subir uma escada, ou pegar um objeto, por exemplo; caráter lúdico: como quando brincamos de roda; caráter essencialmente expressivo: como quando dançamos. No entanto, em todas essas e outras diferentes funções, o movimento sempre nos expressa e nos revela. Mas por que nos importa estudar sobre o corpo e o movimento quando o assunto são manifestações rítmicas e expressivas? Você arrisca um palpite? Pois bem. Quando falamos em movimento como elemento constituinte do corpo, estamos falando de todos os movimentos: Entende agora porque precisamos nos voltar para nós mesmos e para nossos movimentos? Precisamos ativar nossa consciência corporal para percebermos nossos próprios ritmos. Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Fundamentos da Consciência Corporal Consciência corporal é um termo velho conhecido nosso. Não é mesmo? Diz respeito a capacidade de percebermos nosso corpo, de senti-lo. Coordenação Motora O termo coordenação motora diz respeito à capacidade de organizarmos nossos movimentos em resposta a um estímulo cerebral. Nessa organização, fatores específicos são trabalhados, como equilíbrio, ritmo, direção, reflexo, criação/transformação e independência de movimentos. Quanto mais aguçamos nossa consciência corporal, melhor desenvolvemos a capacidade de coordenarmos nossos movimentos, sejam eles para fins utilitários, lúdicos ou expressivos, como vimos anteriormente. Lateralidade – Chamamos de lateralidade a capacidade que temos de perceber e utilizar conscientemente, ao mesmo tempo ou em separado, nossos dois lados: direito e esquerdo. Desenvolvemos essa capacidade concentrando-nos em nossas ações, praticando movimentos bilaterais (os dois lados ao mesmo tempo) simétricos ou assimétricos e praticando movimentos unilaterais (apenas um dos lados). Para a noção de lateralidade, é preciso termos consciência de nosso eixo corporal, essa linha imaginária que demarca nossa simetria. Ritmo no Senso Comum Para o senso comum, no geral, ritmo é uma palavra associada diretamente e unicamente à música. Nesse entendimento, ele diz respeito à velocidade de execução de uma música – se ela p “rápida” ou “lenta”, como se diz no dia-a- dia – e, também, a nossa capacidade de acompanhar essa música com sincronia. É comum ouvirmos alguém dizer: “- Essa música tem um ritmo acelerado!” ou “- Você não tem ritmo!” (quando uma pessoa não consegue executar determinados passos de uma dança em sincronia com a música tocada). Também chamamos de ritmo os diferentes estilos musicais. O ritmo do samba, do frevo, do Carimbó, do xote, do galope etc. Pois bem. Pensar ritmo relacionado à música é apenas uma das formas de entender ritmo. É possível ampliarmos esse conceito, pois ritmo não está associado apenas ao som. 2 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Diversidade de Ritmos Você entende agora por que dissemos que todos nós temos ritmo? Por que mesmo quando não conseguimos acompanhar o ritmo de uma determinada música, nossos movimentos têm um ritmo próprio de organização. Todo nosso ser tem um ritmo próprio. Assim como nós, os grupos, a sociedade, o universo têm um padrão rítmico de organização. É por isso que falamos numa diversidade de ritmos. Veja alguns a seguir. Ritmo Fisiológico - Chamamos de fisiológico o ritmo com que acontecem nossas funções vitais. Respiração, batimentos cardíacos, sono e vigília, o ciclo menstrual feminino, nossa necessidade de alimentação, funcionamento de nosso intestino, tudo em nós obedece a um ritmo próprio. Esses ritmos não estão isolados uns dos outros. Eles se influenciam e transformam permanentemente, alterando, inclusive, outras esferas de nosso ser, como nosso humor, nosso raciocínio etc. Observe. Nosso pulso cardíaco tem um ritmo. Quando o alteramos demais, sofremos. Quando alteramos demais nosso ritmo respiratório, nossos movimentos e emoções são afetados e, assim, nosso cérebro não consegue raciocinar direito. Quando não respeitamos nossa necessidade de manter um ritmo de sono e vigília, todo nosso ser sofre. Há o ritmo digestivo, da fome e da saciedade, dos movimentos peristálticos... Engordamos ou emagrecemos sem saúde, por exemplo, se desrespeitamos esse ritmo. Precisamos aprender a observar e respeitar, às vezes a reeducar nossos ritmos. Ritmo Interno e Ritmo Pessoal - O ritmo interno engloba o ritmo fisiológico, é influenciado por ele, mas abarcam, também, outros elementos de nosso ser como nossa personalidade, nossa educação, nossa cultura. Ele se mostra em nossa maneira de pensar, de andar, de falar; em nossas reações emocionais. Passa a se chamar ritmo pessoal quando entramos em contato com outras pessoas. é a forma como nos relacionamos, como integramos nosso movimento com o movimento dos outros. É sempre relativo ao grupo em que estamos inseridos. às vezes somos considerados “calmos” em casa, mas no trabalho somos tidos como “agitados”, por exemplo, ou o contrário. 3 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Ritmo Grupal É a forma de organização dos movimentos de um grupo. É o resultado da coordenação dos vários ritmos pessoais que compõem aquele grupo. Não é apenas o ritmo com que os seus membros dançam juntos, percebe? Vai além disso. É a forma como ele se apresenta em todos os momentos de suas ações de grupo. Quantas vezes, na sua prática docente, você se deparou com turmas mais “interessadas” ou mais “apáticas? Quantas vezes você disse - Ah! Essa turma é muito danada! Ou - Ah! Essa turma é muito devagar! Pense, como mais um exemplo, nas torcidas organizadas. Muitas delas têm ações violentas. Muitas pessoas ali, individualmente, não se comportariam daquela forma mas, quando em grupo, se deixam levar por um movimento negativo e prejudicial. O comportamento de tribo dos adolescentes, também, é característico da importância e do papel do grupo para os seres humanos. Somos seres sociais. Precisamos do sentimento de pertencimento a um grupo. Quando entendemos que o ritmo de um grupo é o resultado da coordenação dos ritmos individuais, percebemos, também, como temos importância em cada grupo de que fazemos parte. E mais, percebemos como nos identificamos mais com certos grupos que com outros. Ritmo Universal - É o ritmo de funcionamento do universo. é uma ideia ampla, que engloba muitos ritmos diferentes. E é uma ideia importante, pois a todo o momento, ele nos influencia e nós a ele. Aqui está incluída a forma como a Terra se movimenta ao redor do Sol, as estações do ano e suas alternâncias climáticas, os diversos ciclos da natureza, enfim. 4 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Já pensaram que o ritmo com que a Terra gira ao redor do Sol determina o ritmo das marés? E que o ritmo com que temos as mudanças de luastambém está relacionado a isso? E que as estações têm seu ritmo definido por esses movimentos, entre outros fatores? E que o ritmo de crescimento das plantas segue esses ritmos? Os ritmos humanos também compõem o ritmo universal, também fazemos parte da natureza! Há o crescimento das cidades, o desenvolvimento dos transportes e comunicações, o ritmo de nosso consumo etc. Nós, seres humanos, temos descompassado o ritmo universal quando interferimos de modo inadequado e egoísta na natureza; nossas ações têm alterado as marés, as tempestades, o ritmo de crescimento das plantas, as estações... O aquecimento global é fruto das ações humanas sobre o mundo, ações que desrespeitam as necessidades de funcionamento saudável do planeta, alteram seu ritmo, e agora se voltam contra nós mesmos. Conceito de Ritmo na Música Vimos que ritmo é sempre um movimento de alternância entre um determinado fenômeno e sua ausência, é a forma como esse movimento está organizado. Na música não é diferente. O fenômeno aqui é o som e a ausência do som é a pausa. Então, o ritmo é a forma como os sons e as pausas se organizam. Lacerda (1966) diz que ritmo “p a maneira como se sucedem os valores na música”, e esses valores, a que ele se refere, são os sons e as pausas. O ritmo é um dos componentes da música, junto com a melodia e a harmonia. Almir Chediak (1986, p.41) diz que música “é a arte dos sons. É constituída de melodia, ritmo e harmonia. Melodia é uma sucessão de sons musicais combinados. Ritmo é a duração e a acentuação dos sons e das pausas. Harmonia é a combinação dos sons simultâneos.” Nesse momento, para nós o importante é entendermos o ritmo. Se juntarmos as definições dos dois autores citados acima, veremos que elas se completam. A maneira como os sons e as pausas se sucedem na música vai depender da duração e da acentuação deles. Experimente dizer um “a” prolongado seguido de dois “as” curtos. Repita essa sequência. Vamos lá, não fique com vergonha, e divertido! 5 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com É isso: o ritmo aparece quando pontuamos o metro, ou seja, quando acentuamos os sons ou mudamos a sua duração e a duração das pausas. 6 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Propriedades Importantes do Som: Duração: Como falamos antes, a duração é o tempo de produção do som, é o quanto ele dura. Altura: é a propriedade do som de ser grave, médio ou agudo. O mugido de uma vaca é grave; já o canto de um pássaro, um bem-te-vi, por exemplo, é agudo. Entre eles há sons intermediários, ou médios. Duas coisas são muito importantes aqui: 1) essa é uma propriedade relativa, ou seja, ela nasce da comparação de sons. Por isso, um mesmo som pode ser grave num momento, ou médio em outro, a partir do elemento de comparação. O mugido da vaca, por exemplo, pode ser considerado médio se comparado ao mugido de um touro, mais grave ainda. Entende? 2) no senso comum, falamos de altura nos referindo ao que se chama nos aparelhos de som e tv de volume. Na teoria musical, esse volume é a intensidade do som (veremos a seguir) e não sua altura. Ok? Cuidado, então! Se falarmos a um músico “por favor, abaixe essa música,” ele irá mudar a tonalidade com que executa a música, deixando- a mais grave, e não diminuir o volume na caixa de som. Intensidade: é a propriedade do som ser mais fraco ou mais forte; assim como a altura, é uma propriedade relativa. Aqui, sim, falamos do volume dos aparelhos de som. Timbre: é a qualidade do som que nos permite identificar sua origem; é como a sua identidade. é o timbre que nos faz reconhecer se o som é de piano ou de flauta, por exemplo, mesmo sem vermos os instrumentos sendo tocados. Expressividade Musical Entendemos por expressividade musical a capacidade da música de transmitir algo, seja uma ideia, uma imagem, uma sensação, uma emoção. E como ela faz isso conosco! Não é mesmo? Por que será que a música nos emociona tanto? Dentre as formas de arte, ela parece ser a que mais rapidamente nos atinge, nos emocionando, nos incomodando, nos alegrando etc... Nossas reações à música são variadas pois as expressões musicais são muito diferentes e porque nós temos também formas diferentes de escutar e sentir a música. Vamos por partes. 7 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Em que se baseia a expressão musical? A expressão musical nasce da organização dos sons a partir daqueles elementos que vimos antes, principalmente a melodia, o ritmo e a harmonia. Há músicas em que o aspecto rítmico é preponderante, chama mais nossa atenção e há aquelas em que a melodia nos fala mais forte. No ritmo sentimos a batida da música e a velocidade com que nos conduz; na melodia sentimos as variações para onde ela nos leva. Através de seus elementos, a música é capaz de modificar nossos estados físicos, mentais e emocionais. Músicas fortemente marcadas pela percussão nos mobilizam quase que imediatamente a dançar ainda que seja apenas batendo o pé no chão, acelerando nossos batimentos cardíacos. Músicas essencialmente melódicas nos acalmam, nos trazem lembranças, podem nos alegrar ou entristecer. Percussão Definição de Percussão Segundo o Dicionário Aurélio Percussão. [ Do lat. tard. percusu. ] S.f. 1. Ato ou efeito de percutir. 2. Choque ou embate entre dois corpos. 3. Jur. Incidência fiscal direta sobre o contribuinte. [Cf. nesta acepç., incidência(3).] 4. Med. Forma de exame físico, de que há técnicas diversas, e que consiste em aplicar a uma área pequenos golpes, com extremidade de quirodáctilo, borda de mão ou instrumento próprio, para, de acordo com o fim em vista, obter sons que podem ser normais ou anormais, ou pesquisar anormalidades de reflexo (12). 5. O conjunto de instrumentos de percussão (q.v) Enciclopédia e Dicionário KOOGAN/HOUISS PERCUSSÃO s.f. Choque resultante da ação brusca de um corpo sobre o outro. / Operação elementar de funcionamento de uma arma de fogo, no curso da qual o percussor, ferindo a espoleta, provoca a detonação. / Méd. Método de exame clínico que permite descobrir pelo som ( ausência do som ou sonoridade ) o estado de ingurgitamento ou vacuidade de um órgão. // Arma de percussão, arma de fogo portátil que funciona por percussão. // Instrumento de percussão, nome genérico que designa os instrumentos da 8 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com orquestra de que se tira o som batendo; compreende principalmente os timbales, o bumbo, os pratos, o triângulo, bem como o vibrafone, os sinos e xilofone. A percussão corporal A percussão corporal utiliza o corpo humano como fonte sonora, com amplas possibilidades de timbres. Combinando sons do corpo como palmas de mãos, estalos de dedos e batidas no peito já é possível tocar uma infinidade de ritmos. O grande "barato" da percussão corporal é a possibilidade de se tocar em grupo, combinando os sons e aproveitando a sonoridade de cada corpo, que é única! Efeitos e Influências da Música Sobre os Seres Humanos Por atingir diretamente nossos estados emocionais, a música tem uma importante influência sobre nós. Mas não é apenas nas nossas emoções que a música nos influencia. Pesquisas nas áreas de neurociência têm comprovado que as partes do cérebro responsáveis pelo aprendizado musical e pelo aprendizado matemático estão próximas. Crianças que estudam música na pré-escola desenvolvem mais seus raciocínios lógico e matemático do que as que não estudam. O aprendizado musical desenvolve em nós, também, a sensibilidade auditiva. Tornamo-nos capazes deperceber diferenças sutis nos sons e, assim, apreciá-los ou rejeitá- los mais. A música exerce, ainda, forte influência sobre nosso desejo de movimento. Ela parece falar diretamente aos nossos músculos! Maria Fux (1983) diz que não conseguimos ouvir plenamente a música sem dançar! Ao longo da história da humanidade, a música teve diferentes funções: mágicas, curativas, religiosas, socialização e entretenimento, expressivas etc. Todas essas funções atestam a importância que a música teve e tem em nossas vidas, desde sempre. Hoje usamos a música para diversos fins como: Musicoterapia, que é uma forma de tratamento que utiliza a música para solucionar problemas de ordem física, mental e emocional; Expressão artística da música, que nos emociona; Musica embalando danças sociais; Musica criando ambientações. 9 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com A Música em sua Atividade Docente Como podemos utilizar a música em nossas aulas? Podemos utilizá-la para modificar o ritmo grupal de nossa turma; como ambientação para práticas motoras; como instrumento para o desenvolvimento rítmico, etc. Que músicas podemos e devemos utilizar em nossas classes? Além dos aspectos rítmicos e de altura melódica, devemos também, levar em consideração o que transmite, culturalmente, a música utilizada. As músicas de um povo o representam culturalmente e, na educação, estamos preservando e remodelando nossa cultura. Será que devemos utilizar qualquer música que toca na rádio? Você já prestou atenção em algumas cantigas de roda como Atirei o pau no gato ..... ; Eu sou pobre, pobre, pobre ... ; Sambalelê precisava, é de uma boa lambada ....... ????? E em letras que reforçam preconceitos, incitam atitudes inadequadas, reproduzem atitudes de desrespeito do ponto de vista da cor, do gênero, da cultura, das limitações ... História da Dança Pode-se pensar na dança, originalmente, como expressão natural da simples pulsão vital da existência corporal, “uma ação não somente da totalidade do corpo humano; mas ação transposta ao mundo, numa espécie de espaço-tempo, totalmente distinto daquele da vida prática” (VALÉRY, 1957 apud ELIA, 1992, p.21). Ou, por assim dizer, a manifestação livre e espontânea de um organismo que, para além de sua função biológica regida pelo caráter cíclico e temporário da natureza, tece uma rede de relações com o mundo, extrapolando sua estrita funcionalidade e fisicalidade. Pulsão ou libido segundo a psicanálise trata-se da tendência permanente, e em geral inconsciente, que dirige e incita a atividade do indivíduo. 10 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Assim, tanto quanto outras expressões poéticas, para Huizinga (1993), a dança emerge de um mundo próprio, na região do imaginário, do encantamento, do êxtase e do prazer. Não encerra utilidade nem verdade e não se exerce em função de um benefício futuro, mas em função de si mesma, dando voz à expressividade sensório-motora do ser. O autor ressalta que, originalmente, a dança desempenhou uma função vital, social e religiosa nas culturas primitivas, fertilizada e nutrida pelas celebrações que ocorriam dentro de certos limites temporais e espaciais. Supõe-se que, nesse contexto, a busca de satisfação de qualquer espécie de impulso estético residia submersa na experiência do ato ritual realizado em ambiente propício que suscitava o arrebatamento e o entusiasmo. Desde então, a dança ratifica tradições culturais e participa da sociabilidade e da organização coletiva de corporeidades. Esses são, para Huizinga, os aspectos primordiais que denotam a íntima afinidade da dança, do ritual e do jogo; entretanto, o autor considera, ainda, que essa afinidade se manifesta, antes, na própria imaginação criadora. Em sua concepção, desde nossa mais tenra idade há, na simples repetição de uma movimentação rítmica, na espontaneidade de movimentos abstratos ou na expressão de um estado de espírito, a intervenção de um elemento lúdico. Mesmo considerando a existência de diferentes práticas em culturas arcaicas, quer se trate de danças sagradas, mágicas ou ritualísticas, ou simplesmente como manifestação social e festiva, Huizinga (1993, p. 184) afirma que a dança “p sempre em todos os povos e em todas as épocas, a mais pura e perfeita forma de jogo”. Contudo, admite que nem todas as formas de dança apresentam essa qualidade lúdica em sua plenitude, devido às diversas transformações sofridas ao longo da história, que acabaram por lhe atribuir requinte e estilo, em detrimento da liberdade e espontaneidade que a caracterizavam. Quanto a isso, veremos que, já em seus primórdios, é possível detectar certos padrões de organização que oferecem indícios da tendência à complexidade que caracterizará, em parte, sua evolução. Historiadores acreditam que, para o homem primitivo, o motivo de sua dança é sempre vida, força, abundância e saúde. Existia, no êxtase alcançado pela dança, algo de vital, de comunhão com a natureza e de perpetuação da espécie, sendo esse arrebatamento, supostamente, o elemento lúdico predominante. 11 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Assim, em seus primórdios, a dança é compreendida como naturalista, manifesta-se por meio de movimentos que imitam a força da natureza e traz a ideia de que, dançando, o homem pode apossar-se dessa força. Os registros pictóricos indicam que a dança é circular, extrovertida e coletiva, de gestos livres e desordenados, que tendem à repetição e à sincronia e ao uso de máscaras representativas de animais ou espíritos de entes antepassados. Em sua origem, é possível observar, com mais evidência, indícios do caráter mimético do jogo que irão permear toda a prática da dança por muitos séculos (SILVA, 2005, p. 81-82). Mimeses é a imitação ou representação do real, ou seja, a recriação da realidade. No entanto, ela também pode ser individual, introspectiva, espasmódica, extática e sem caráter imitativo. “O extrovertido atinge o êxtase, imitando tudo aquilo que pode ver; o introvertido o faz sentindo-se possuído pelo ser que está representando” (CAMINADA, 1999, p. 14). Pinturas rupestres, como esta ao lado, são os primeiros registros da dança primitiva de conotação mística. A imagem mais antiga foi encontrada em Lérida (Espanha), data de 8300 a. C. e mostra um ritual de fertilidade. Retornando às origens, pouco a pouco a dança começa a ser submetida a regras disciplinares e a assumir o aspecto de uma cerimônia formal na Antiguidade. Instala-se a preocupação com a coordenação estética dos movimentos, até então naturais e instintivos do corpo, prenunciando as chamadas danças espetaculares que transformarão, finalmente, a dança em exibição e entretenimento. Sua natureza lúdica permanece, mas mudam suas motivações e objetivos. Despoja-se do seu sentido religioso e ritualístico, enfatizando sua função lúdica de divertimento e passa a demandar execução perante um público, constituindo-se, fundamentalmente, em ação e objeto de representação. Na Grécia, berço da arte ocidental, a dança, o canto e a poesia existiam em relação de total interdependência, ocupando um lugar significativo na vida cívica e religiosa do povo. 12 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com As danças reverenciavam os deuses e integravam as cerimônias sociais e ritos de passagem. Dentre suas diversas manifestações, destacam-se, por suas singulares características, as festividades em honra a Dioniso. Nessas festividades, cultivava-se o espírito de liberdade e agitação incontrolável dos transes orgiásticos, com seu cortejo formado por multidões em desvario. Nas danças dionisíacas, os adeptosde Dioniso acreditavam sair de si pelo processo do êxtase e do entusiasmo. Possuídos pela loucura sagrada, superavam a condição humana e entravam em comunhão com o deus (BRANDÃO, 2000, p. 79-80). A liberdade primitiva dessas danças foi, igualmente, se transformando. Os movimentos formalizaram-se em composições denominadas de chorea, raiz da palavra coreografia, originando o teatro cantado e dançado nas suas formas primordiais: tragédia e comédia. Essas formas constituíram as bases do conceito de espetáculo cênico e marcaram o nascimento do teatro e da dança ocidentais. A expressividade das danças trágicas, que constitui a arte mimética, é o traço que a distingue das antecedentes danças puras ou de culto. Entre o período greco-romano e a Idade Média, duas visões de mundo contrapõem- se: se, para o grego, o ideal de perfeição consistia na harmonia de corpo e espírito, para o pensamento judaico-cristão, o corpo é veículo de pecado e de-gradação. Com a expansão da igreja cristã, a magia, a poesia, a liberdade e a espontaneidade da dança foram reprimidas durante um longo período da história medieval, mas nenhuma proibição logrou sufocá-la totalmente. No período medieval, marcado por numerosas calamidades, a dança cumpre um papel proeminente de entretenimento, oferecendo diversão e prazer, seduzindo a todos pelo esquecimento e pela alienação que proporciona. É possível perceber, já nessa etapa da história, como os traços lúdicos essenciais que identificam a dança com o conceito de jogo e 13 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com de ritual vão se descaracterizando, revelando outros aspectos lúdicos que insinuam sua predominância, denotando, ao final, uma clara tendência a dissociar-se do sentido de liberdade e mistério que primordialmente a envolviam, seja por perder progressivamente seus vínculos religiosos, enfatizando o divertimento que proporciona, em detrimento de sua função espiritual, seja por despojar-se da espontaneidade original, assumindo padrões de organização sistemática, seja ainda por converter-se em uma atividade espetacular, requerendo habilidades e aquisições pessoais. A dança qualificada de educada distancia-se do divertimento popular. A estratificação social determina duas correntes de dança: a camponesa e a aristocrata. Nas execuções populares, a dança simbolizava a coesão social, quase sempre como motivo de uma alegria ou de um estado comum; na aristocracia, mais refinada, a dança transforma-se em arte elaborada, sua concepção expansiva e imaginativa é substituída pela racionalização e pelas formas sóbrias e solenes. Acredito que o sentido do envolvimento, do fascínio e da imersão que o jogo suscita, liberando impulsos do inconsciente, encontra, no transe orgiástico, sua mais alta expressão. O êxtase do homem primitivo expressou simbiose com as forças do universo. No homem grego, significou uma identificação com a deidade de efeito purificatório e, no homem medieval, a necessidade de liberação de ímpetos reprimidos. O profundo significado da festa, da celebração, reside em sua função de fortalecer o elo social que une as pessoas em torno de valores, hábitos e crenças comuns. Neste contexto dança-se por divertimento, para compartilhar a alegria de estar juntos, em contraponto às adversidades da vida e, sobretudo, à inexorabilidade da morte. Dança-se para “catarsear”, gastar energia pela satisfação do excesso, como expressão de nossa vitalidade. Neste sentido 14 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com dançar significa estar de bem com a vida, aceitá-la como ela é: contraditória e cheia de imperfeições. Na transição para a Renascença, as transformações estruturais no modo de vida e de produção de riqueza refletiram-se na expressão artística. Prenuncia-se a dissociação da música e da poesia, o que resulta no rompimento da unidade inicial dessas linguagens; os temas sociais divorciam-se dos sagrados e a dança, definitivamente, recusa o mimetismo pela abstração. Abre-se caminho para o surgimento do espetáculo de dança formalmente idealizado e elaborado para o puro deleite estético e para a requintada diversão, denominado Ballet de cour (Balé da corte). A dança, expressando adoração não mais às divindades, mas ao rei, perde definitivamente o caráter ritualístico, tendo como finalidade prática demonstrar a força da realeza e seu poder econômico. Também se inicia a profissionalização, fator determinante à configuração da dança como atividade pertinente à subsistência. Seus padrões de organização implicam a manutenção de estruturas que geram e demandam trabalho em diferentes áreas. Esse é um fator relevante que se opõe ao sentido desinteressado do puro jogo, descaracterizando-o como atividade com finalidade em si mesma. Este é um período marcado pelo refinamento, pela elaboração e pela sofisticação que conferem ao ballet o status de sistema codificado de movimentos, expresso pelo termo Chorégraphie (Coreografia), até então inexistente. Neste contexto a clara tendência a exageros e excessos de ornamentos na ambientação carregada de alegorias, em uma demonstração da magnificência da vida na corte, poderia ser tomada como análoga às exorbitâncias das fantasias cosmogônicas dos mitos presentes nas expressões poéticas mais primitivas. Esse jogo com o extraordinário é compreendido por Huizinga (1993) como uma função lúdica típica, observada em diferentes manifestações do espírito humano. 15 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Esboçando o inconformismo latente em relação ao convencionalismo do estilo clássico, com seus temas e formas esgotadas, segue-se o surgimento de um novo modelo, o Ballet d’action (Balé de ação), de Noverre. A coreografia e o dançarino protagonizam a cena, tendendo a romper com o sentido de unidade da dança, música e poesia nascida no jogo primitivo. Sucede o ballet narrativo que teve seu apogeu na era romântica de meados do século XVIII ao XIX. O ballet romântico transcende os limites do juízo lógico e deliberativo, restaura o espírito da fantasia, do miraculoso que nasce na poesia e do mito das culturas primitivas, enraizado no espírito lúdico. Tem-se, portanto, uma inversão na predominância da razão sobre a imaginação. Simultaneamente, consolida-se um vocabulário rígido e restrito de passos, posições, direções 16 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com e expressões, os quais se desenvolviam desde os séculos anteriores e que vai resultar no que conhecemos como a técnica clássica. No início do século XX forças de oposição aos padrões ditados pela escola do ballet clássico desencadeiam uma verdadeira revolução, marcada pelo retorno ao naturalismo, não mais como a primitiva expressão da perplexidade frente às forças da natureza, mas sob a perspectiva do ser diante de si mesmo e de sua natureza física, espiritual e emocional. Isso representou, igualmente, um retorno ao valor da expressividade, e o desejo de recuperar o sentido e a função espiritual da dança, há tempos relegados, ou mesmo quase extintos, dessa arte. Considero esses os aspectos fundamentais característicos da ludicidade que conduzirão os artistas dos tempos modernos na construção de novas trajetórias de criação. De um lado a nova dança busca expandir a experiência do corpo e do movimento de forma criativa e pessoal, respeitando seu funcionamento orgânico e sua ação natural, mais próxima da expressão espontânea do jogo primitivo; de outro, e com mais preponderância, propostas que valorizaram a técnica, a purezade linhas e o estilo personalizado comprometidos com reflexões de conteúdo social, político e, principalmente, psicológico, expondo os conflitos e emoções humanas. Essas preocupações podem ser constatadas com evidência nos propósitos e na simplicidade da dança de Isadora Duncan (1878-1927), precursora e mensageira da ruptura metodológica fundamental que se opõe aos cânones da dança clássica, cujo trabalho despontou nos Estados Unidos e floresceu no seio da cultura europeia. Inspirada na arte grega e nos fenômenos da natureza, ela procurava, nos movimentos primários do ser 17 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com humano, a sua realidade orgânica corporal. Experimentava uma movimentação similar àquela que emerge espontaneamente na brincadeira infantil, aludindo à memória ou à expressão de um comportamento autêntico inato, em contraposição à imagem etérea e artificial do ballet. Com outra abordagem, Ruth St. Denis (1877-1968) explicitava o desejo de restaurar o caráter ritualístico da dança, inspirando-se em divindades de civilizações da Antiguidade. Já Marta Graham (1894-1991) elegeu os temas mitológicos para interpretá-los à luz da nova psicanálise, em obras nas quais a subjetividade domina. Recorreu à percepção do ciclo respiratório orgânico para elaborar uma movimentação que se apoiava sobre o fluxo de contrações e relaxamentos, expressando os estados antagônicos da dor e do êxtase, desenvolvendo um sistema codificado que constituiu um estilo personalizado de sintaxe em dança moderna (ROSEMAN, 2004). Por uma via similar, Doris Humphrey (1895-1958) propôs outro dinamismo dialético, por meio da queda e da recuperação do equilíbrio, análogo à incerteza e à precariedade da existência, apontando para outra vertente de desenvolvimento técnico e expressivo. Não obstante as divergências observadas em suas posturas artísticas havia, sobretudo, na dança norte-americana de Isadora Duncan, Ruth St. Denis, Doris Humprey e Martha Graham, um aspecto significativo comum que as unia em seus princípios filosóficos e que de certa forma caracterizou o que conhecemos como a dança moderna norte- americana. Seus escritos, depoimentos e ensinamentos revelam uma singular religiosidade, oriunda de suas aguçadas percepções sobre a natureza sagrada do corpo e da intuitiva compreensão do significado sagrado e redentor da dança, elas não só revolucionaram a dança como também lograram ressurgir a convicção de que a dança é uma experiência sagrada e extática. Posso inferir que, nesse movimento, residia o desejo, consciente ou não, de resgatar o significado mais profundo e arcaico do espírito lúdico da dança, perdido desde que se tornou uma mera ostentação de adornos, reverências e habilidades. Outro caminho representa igualmente a vontade significativa de resgatar valores lúdicos primordiais: o pensamento de Rudolf Von Laban (1879-1955) torna-se o fundamento, o núcleo da dança livre da Europa Central e de todos os seus futuros desdobramentos, que surgem com a dança expressionista alemã e, posteriormente, com a dança-teatro. Sua visão global da dança, como forma de expressão ligada à vida do homem e 18 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com à imagem que ele faz de si mesmo, é precursora dos grandes temas que apareceram nas novas expressões da dança teatral do século XX. Esse sentido de unidade da dança e da vida, apreciado por Laban, encontra correspondência direta com o significado primitivo do jogo e do ritual. Angustiado com o impacto da civilização moderna, vista por ele como confusa e declinante, evoca em suas profundas memórias imagens de uma cultura festiva arcaica, relativamente viva em sua infância. O contato com as danças camponesas, procissões religiosas e até mesmo o júbilo das colossais paradas militares sensibilizaram-no para a percepção do movimento corporal como expressão de um modo de vida, cujo renascimento foi uma de suas grandes ambições (LAUNAY, 1992). O anseio manifesto pela adoção da verdade expressa o desejo de humanizar a dança, o criador moderno sente a angústia dos transtornos de uma época de dramas e guerras e, similarmente à intuição primitiva, procura estabelecer uma relação estreita, em nível psicológico e social, com os problemas do homem, seu meio e seu contexto histórico. Recria, portanto, um elo direto entre a dança e a cultura contemporânea. Podemos dizer que, a partir dessa premissa, a dança moderna assumiu função reflexiva, calcada em uma sobriedade dramática, em contraposição à função lúdica que se destina ao regozijo e ao prazer. Persistirá, todavia, na procura de novos sistemas de ensinamento e transmissão de técnicas variadas, o que, de certa forma, limitará a liberdade preconizada em seus propósitos, ainda que se oponha, radicalmente, à execução de um único padrão gestual, objeto da busca clássica acadêmica. De maneira geral, nas fases seguintes à radical ruptura que ocorreu no início do século XX, o sentido de jogo vai permear toda a atividade artística experimental que opera com elementos variáveis e muitas possibilidades, marcadas pela liberdade com que artistas e intérpretes se entregam às experiências de investigação de uma dança que expresse suas identidades. Surgem, assim, os happenings, apresentações que não eram propriamente espetáculos elaborados dentro dos padrões de encenação vigentes, mas acontecimentos que reuniam várias manifestações artísticas, aparentando um retorno ao espírito orgiástico dos rituais arcaicos em que a poesia, a música e a dança eram indissociáveis e todos deles participavam. Instaurouse a estética da liberdade característica do jogo. Chega também a época da abstração, do movimento despersonalizado e sem emoção. A dança volta a ser, paradoxalmente, uma arte formal de movimento, denunciando seu parentesco com a dança acadêmica. Em contraponto, outro impulso enfatiza a busca de 19 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com qualidades corporais valorizadas pela simplicidade e espontaneidade do gesto e dos movimentos. Um dos caminhos tomados para alcançar tal intento apontou para a exploração de movimentos funcionais, enfatizando as ações cotidianas e automáticas ignoradas no dia a dia. O habitual é levado para um lugar fora da vida prática, para o espaço fictício do jogo e inscrito no contexto da dança. Nessa dança, o natural e espontâneo têm agora como referências as ações ordinárias, sem qualquer relação com os impulsos mais íntimos e primordiais da existência, com as formas da natureza ou com a organicidade do corpo humano. Apesar do ecletismo inaugurado com a dança pós-moderna norte-americana, a dança- teatro alemã, o teatro físico inglês ou a nova dança francesa, é possível identificar um elemento lúdico preponderante: a improvisação. A atitude de flexibilidade ao indeterminismo proposto pelo recurso à improvisação se opõe às regras ou imperativos da construção coreográfica racional e técnica. Também se constituiu como fundamento de técnicas e linguagens de movimento, como o Contato Improvisação, e engendrou criações cênicas de caráter abstrato. O Contato Improvisação foi iniciado por Steve Paxton na década de 1960, e é um gênero de dança gerado a partir do contato de dois ou mais sujeitos dançantes, usando princípios dinâmicos do corpo. Para IANNITELLI (2000), a improvisação é um recursono qual, a priori, ocorre uma suspensão da intencionalidade, promovendo a expressão de conteúdos inconscientes, razão pela qual, entendo eu, foi e tem sido largamente utilizada na criação autoral contemporânea de poéticas singulares. Aautora acrescenta: 20 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Citação - As improvisações são baseadas numa disponibilidade e receptividade para o fluxo livre do movimento onde o corpo funciona, a um só tempo, como fonte e instrumento de criatividade [...]. Existem várias formas de expressão do inconsciente. Por meio da improvisação na dança, seus conteúdos adquirem forma nos movimentos corporais (IANNITELLI, 2000, P. 54). Em minha experiência artística, isso se confirma, na medida em que é possível observar que as improvisações favorecem o rompimento de padrões aos quais o corpo do intérprete está condicionado, seja pelo trabalho técnico, seja pelo comportamento social. Compreendo, portanto, que se desprender de códigos assimilados implica projetar sobre o que foi absorvido do mundo exterior conteúdos interiores alimentados pelo imaginário, desenvolvendo a intuição criativa. Sobre isso, vale salientar que Laban (1978), em suas reflexões acerca da expressividade do corpo em experiências de improvisação, associa o impulso interior que precede o movimento, o qual denominou “esforço”, j busca de valores intangíveis e indescritíveis, servindo ao objetivo de espelhar os processos ocultos do ser interior. Conforme Launay (1992), para Laban, improvisar é, sobretudo, não se lembrar. É trabalhar para esquecer, para se dar a chance de ver emergir as múltiplas possibilidades de sua mobilidade, esquecer o estado presente do corpo a fim de acolher a pluralidade de estimulações da memória involuntária corporal, é precisamente adquirir uma experiência de movimento, um sabersentir que não se mede a não ser por sua eficácia sobre os nossos sentidos (LAUNAY, 1992, p. 69). De acordo com Bélec (1998, p.88), para Robert Ellis Dunn, a relação mútua entre improvisação e coreografia consiste em encontrar os meios de mobilizar o corpo, a fim de imprimir, no sistema nervoso, imagens cinéticas poderosas. Em seus ensinamentos, sublinhava a importância da interação entre movimento e imagem, a qual denominava “a lógica da improvisação”. Essa lógica, a qual compreendia os princípios maiores de sua pedagogia, estava na base de sua teoria e de sua prática. Para ele, era necessário dar tempo ao sistema nervoso para que ele registrasse a experiência de movimento sob a forma de uma lembrança, de uma imagem ou de um modelo corporal. Poder-se-ia, assim, rememorar a experiência e oferecer novas escolhas de movimento. A improvisação poderia, igualmente, ser colocada em cena num jogo livre de combinações de sequências pré-elaboradas ou até mesmo de movimentos independentes que 21 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com respondem simplesmente às relações com o espaço, o tempo, o ritmo, a gravidade, o peso e a manipulação de objetos, evidenciando as possibilidades cinéticas do corpo. Merce Cunningham, coreógrafo norte-americano, propôs um modo de composição que invoca o acaso por meio do jogo de dados, de moedas, de cartas ou outra forma de sorteio. Com esse procedimento, ele determinava, a cada espetáculo, as possíveis opções de ocupação do espaço; a ordem de movimentos numa frase; a sequência de frases na coreografia; o número de dançarinos ou partes do corpo a serem ativadas; o desenvolvimento do tempo e da dinâmica das ações a serem utilizadas por cada dançarino. A partir dessa escolha, no entanto, os dançarinos deveriam ser precisos, não havendo espaço para improvisações em cena. Cunningham buscava situações que refletissem a correlação arbitrária dos acontecimentos na vida. O autor defende ainda a ideia de que todo movimento, procedimento, lugar, indivíduo ou sugestão poderia ser material para a elaboração coreográfica, ressaltando o papel do indeterminismo e da imprevisibilidade dos resultados em seus princípios de criação. Nesse sentido destaca-se a dança teatro da alemã Pina Bausch, que despontou no início dos anos setenta. Em seu trabalho, o acaso pode estar encoberto no processo de construção das obras, uma vez que ela recorre às respostas individuais espontâneas e verdadeiras de seus intérpretes às indagações que enfocam a condição humana. Assim, produz um material diversificado que lhe serve para proceder a um jogo de justaposição de elementos contraditórios, sejam estéticos, filosóficos, expressivos ou comportamentais. O inesperado também pode vir exposto em seu produto final, na livre associação de cenas que se combinam em uma montagem aleatória, sem apresentar um fio condutor que dê indícios ou torne previsível as suas conexões e o desfecho do espetáculo. A imprevisibilidade também é utilizada no trabalho ousado e arrojado de Wim Vandekeybus e sua companhia, Última Vez. O coreógrafo que assina um estilo de movimento reconhecido por ser baseado no risco físico. Ao expor os dançarinos ao perigo de acidentes ou lesões tenta comunicar a precária experiência física, enfatizando a percepção do momento presente. O diálogo corporal dos intérpretes se estrutura sobre proposições abertas que se estabelecem em função de leis físicas que regem os corpos e objetos em movimento no espaço. Já o Teatro Físico do grupo inglês DV8, capitaneado por Loyd Newson, parece se construir sobre outro sentido, o do jogo dramático. O aleatório, de forma similar ao trabalho de Bausch, pontua a geração de material a partir de respostas dos intérpretes às tarefas e perguntas colocadas por Newson. Eu diria que, aqui, a organicidade das ações coreografadas 22 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com tem sua gênese em uma dada circunstância, na qual o indivíduo assume um determinado papel na resolução de um conflito, ou seja, um jogo dramático no qual o indeterminismo das respostas outorga uma legitimidade espontânea geralmente não observada em ações pré- concebidas. Vejo, por fim, na ideia de aprofundar a compreensão de jogo como elemento estruturante da criação em dança e recurso pedagógico para sua prática uma correspondência com os princípios arcaicos, de onde nasceram manifestações expressivas da humanidade. Cabe agora compreender como a experiência criativa da dança enquanto jogo se aplica ao contexto da educação corporal. Acredito que, neste sentido, além de favorecer a descoberta de novas concepções de vocabulário de movimento, representação poética, estruturação coreográfica e expressão pessoal, o jogo baseado na improvisação permite o fluxo constante de transformação das formas artísticas. Suscitando reações imprevisíveis dentro de novas percepções físicas, psicológicas e emocionais, o jogo se torna um importante recurso por meio do qual é possível promover a modulação do vocabulário corporal, alterando, indefinidamente, suas qualidades fundamentais, sua dinâmica e, por fim, sua expressão. Conceito de Dança Mas, qualquer movimento é dança? Quando subimos uma escada, por exemplo, estamos dançando? Não, não estamos. Podemos usar o movimento de subir uma escada para compor uma dança, ou até subir dançando, mas o movimento de subir realmente uma escada, naquele momento, não é o movimento de dança. Porquê? Por que a dança não é feita de movimentos utilitários, funcionais, no momento em que eles acontecem de fato. Esses movimentos são todos aqueles que praticamos em nosso dia-a-dia, para realizarmos nossas atividades. Eles têm uma função específica, uma utilidade prática: subir uma escada, levantar o copo para beber água, varrer a casa. Tome este último exemplo. Quando nos movemos para varrer a casa nosso movimento é feito para deixar a casa limpa, certo? Movemo-nos com a função de limpar. Não nos movemos pelo movimento em si mesmo. A dança tem outra função, não utilitária. Nos movemos pelo prazer do movimento,para socializarmos, para nos expressarmos. O movimento tem a intenção dele mesmo. 23 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com A dança pode ser definida, então, como o movimento intencional, simbólico, transcendente do ser humano através do qual ele expressa a si mesmo e sua relação com o mundo. Dentro desse conceito temos dois níveis de abrangência: a dança lato sensu (sentido amplo) e stricto sensu (sentido estrito, específico). A dança no sentido lato é esse movimento definido acima, de todo ser humano, próprio de sua essência individual e cultural. Repetindo: de todo ser humano. Se todo ser humano é corpo e movimento, todo ser humano dança. Não cabe dizermos: “Eu não sei dan.ar”. Todos sabemos dançar. Talvez você não saiba uma dança específica como o tango, por exemplo, mas isso não significa que não saiba dan.ar. Há um jeito de dan.ar que é só seu e é, dança. Entende? Maria Fux disse: “A dança está no homem, em qualquer homem da rua e p necessário desenterrá-la e compartilhá-la” (FUX, p.39). Fux p uma dançarina Argentina muito importante. Foi ela que criou a dança-terapia, uma forma de tratamento terapêutico feito a partir da dança. A dança em seu sentido lato, portanto, engloba as manifestações espontâneas, as danças folclóricas, as danças populares, as danças de salão, a dança como fonte de lazer, como instrumento terapêutico, como processo de auto-conhecimento e educação. Já em seu sentido estrito, a dança é a busca pela máxima expressividade do movimento corporal, resultando numa criação coreográfica, numa obra de arte. é o trabalho do dançarino profissional, do bailarino que, como todo profissional, deve se especializar no que faz, daí sua capacidade de executar movimentos tão diversos. Essa dança é comprometida com a inovação, com a criação estética, com o espetáculo. Elementos da Dança Quando falamos em elementos que compõem a dança, temos de lembrar de Rudolf Laban (1879-1958), que foi um bailarino e coreógrafo alem.o que estudou a fundo o movimento humano, influenciando não só as artes, mas muitos ramos da ciência. Laban se dedicou ao desenvolvimento de um método de análise do movimento que é utilizado e desenvolvido hoje em todo o mundo. Para Laban, todo movimento nasce de um impulso interno que ele chamou de esforço. Esse esforço gera uma ação-movimento e são ambos caracterizados pelos fatores 24 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com espaço, tempo, peso e fluência. Para Laban, as variações de qualidade desses fatores representam diferentes movimentos e, também, atitudes internas distintas. A dança e feita de movimentos. Assim, a obra coreográfica como um todo se constrói a partir desses mesmos elementos que compõem o movimento: o tempo, o espaço, o peso e fluência. Vamos usar aqui a análise de Lia Robatto (1994) que agrupa num mesmo item, o peso e a fluência, chamando-o de intensidade. Espaço O espaço, na dança, pode ser percebido a partir de duas referências: o espaço individual do dançarino, sua cinesfera, que, tendo como referência seu centro e eixo corporal, engloba seu espaço interno e externo, sem deslocamentos (assim como temos um ritmo interno, também temos um espaço interno a ser percebido); e o espaço cênico que é o espaço onde a dança acontece; ele vai além da cinesfera do dançarino e tem suas referências em pontos determinados a sua volta. Quando estudamos o espaço do movimento, observamos o seguinte: - Desenho do movimento: são as linhas que desenhamos com o percurso do nosso movimento. Por exemplo, podemos fazer movimentos que são retos ou curvos, angulares ou em voltas, simétricos ou assimétricos. Tudo em relação aos movimentos individuais mas, também, aos movimentos do grupo como um todo; 25 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com - Dimensão do movimento: podemos observar o movimento a partir de planos espaciais, que determinam sua dimensão. São eles: altura, quando o movimento enfatiza a verticalidade; largura, quando o movimento enfatiza a horizontalidade; e o plano transversal, que enfatiza a profundidade; - Proporção: relaciona o tamanho do dançarino à dimensão do espaço físico onde ele dança. Os movimentos podem ser, então, amplos ou restritos, largos ou estreitos, grandes e exagerados ou mínimos e sutis; - Níveis: os movimentos podem ser executados em três níveis: baixo que são executados no chão ou em posições muito fletidas, como por exemplo as quedas e rolamentos; alto, quando ocorrem com a elevação do dançarino para cima, como por exemplo, os movimentos com os braços para cima, pulos, saltos; e, o nível médio que é o intermediário entre o baixo e o alto; 26 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com - Direção: esse elemento mostra o percurso do movimento. Utiliza os planos e os níveis vistos acima para dizer onde o movimento tem início, para onde ele vai e por onde ele passa. As direções básicas seriam: frente e trás (plano transversal), lado direito e esquerdo (plano da largura), cima e baixo (plano da altura) e todas as diagonais intermediárias. Os conjuntos de movimentos podem apresentar direções convergentes ou divergentes entre si. Tempo O tempo é um dos elementos da dança que muito nos interessa nessa disciplina, pois ele tem relação direta com o ritmo. Quando estudamos ou criamos um movimento podemos descrevê-lo em seu fator tempo observando sua: - Duração: é o tempo decorrido entre o início e o fim de cada movimento, ou de suas pausas; é, também, o tempo da coreografia como um todo. Pode ser medido em minutos e em compassos, quando se utiliza a música; - Velocidade: diz respeito à variação da duração dos movimentos em relação a uma referência inicial. Os movimentos podem ir acelerando ou desacelerando em relação a essa referência. Vai do padrão mais lento ao mais rápido ou pode se manter uniformemente; Hora de praticar - Acentuação: são as marcas, o “relevo” que acontece no percurso do movimento; pode ser identificado por marcações rítmicas; Periodicidade: refere-se à incidência dos fatores de tempo que vimos acima. Ou seja, de quanto em quanto tempo, na coreografia, acontecem os acentos, as pausas, as acelerações ou as desacelerações etc. é a periodicidade que marca o ritmo da coreografia. 27 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Intensidade A intensidade nos fala da qualidade do movimento. é o como ele é feito. é determinada principalmente pelos fatores: Peso: chamamos de peso ao grau de evidência da resistência à força da gravidade durante nossa execução do movimento. Quando nos movemos estamos, a todo momento, enfrentando a gravidade. Se não fosse assim, não conseguiríamos nos levantar do chão, já que a gravidade está todo o tempo nos puxando para baixo. Não é mesmo? Pois então. Quando deixamos transparecer nosso esforço em enfrentar a gravidade, temos um movimento que se mostra pesado; já quando fazemos o movimento sem mostrar o esforço, temos um movimento de aparência leve. Pense num salto de uma bailarina. Ela não parece flutuar de tão leve? O trabalho muscular ali é enorme, mas ela, por estar muito treinada, não deixa transparecer. Para conseguir essa leveza, é preciso muita força muscular. O peso, também, tem relação com o nosso estado ativo ou passivo em relação ao movimento. Esforço: se refere ao grau de energia que despendemos na realização do movimento. Os movimentos, então, podem ser fortes ou fracos, tensos ou relaxados. Ritmo na Dança Assim comoaplicamos o conceito amplo de ritmo à música, vamos pensá-lo em relação à dança. Se o material desta linguagem é o movimento, o ritmo se dá pela organização dos movimentos e as pausas. Certo? É por isso que dizemos que pode haver ritmo na dança mesmo não havendo música. Podemos dançar sem música. A dança tem seu ritmo próprio. Acontece que a música nos estimula a dançar. Com ela sentimos muito prazer em executar os movimentos, sejam eles já conhecidos ou inventados por nós. Nesse dançar a música, sentimos vontade de acompanhar o ritmo que ela tem, casando sons e movimentos. É assim com as danças sociais, com as danças populares, folclóricas, de salão. Dançamos a música. 28 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com É por isso, também, que muitas músicas têm seu correspondente em movimento. Muitas vezes temos um só nome para um estilo de música e uma dança. é assim para o samba, o frevo, o xaxado, o carimbó e tantas outras manifestações rítmicas. Na dança artística contemporânea, também se dança a música, mas não se fica preso a ela, sempre. A música é uma expressão artística própria, assim como a dança, e os coreógrafos podem usá-la da forma que melhor convier a sua necessidade de expressão. às vezes se dança a música; as vezes se dança com a música, mas num ritmo que difere do dela; às vezes se dança o silêncio. Expressividade na Dança A expressividade na dança vem da verdade do movimento. Mas o que é isso? é a intenção do movimento, é a coerência entre o movimento que se faz e a intenção que o gerou. Essas intenções podem ser as mais variadas. Dançamos para expressar nossas emoções; para transmitir uma ideia; para nos divertir; para socializar etc. E expressividade da dança, quando somada à expressividade da música, nos leva a uma sensação de completude. As Danças Circulares “(.) Quando surgimos no espaço e nele nos movimentamos, temos que dar passos. A (.) escola de dança é a escola do caminhar. O fluxo contínuo da corrente do tempo recebe através do contato do pé do compasso. Através dos passos determinamos uma medida de te tempo e ao mesmo tempo uma medida no espaço. O passo torna mpo mensurável, de acordo com a música, o ato da dança no espaço e no tempo, vivenci vivenciável e possível de ser repetido. O nosso pensamento aprende com o pé a vel acertar o passo, e assim construímos uma coluna entre o céu e a terra”. (Wosien: . 2000, p.40). A primeira formação que o ser humano adotou no desenvolvimento da vida grupal e social foi a roda. Culturas antigas e culturas ligadas à terra perceberam a especialidade da forma circular para o estar e fazer junto. Nela passaram a representar os ciclos da natureza: o ritmo das estações, o tempo dos cultivos o pulsar dos movimentos do sol; da lua; das estrelas e dos planetas no céu; o ritmo da respiração e dos batimentos cardíacos , a vida e a morte. 29 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Adotaram-na em seus rituais de passagem (nascimento, iniciação à maioridade, união matrimonial, morte), em celebrações, ocasiões de reverência, temor, louvor, gratidão e oração à terra e à(s) divindades(s). O círculo é uma forma geométrica especial, por simbolizar a perfeição e a plenitude que o ser humano busca atingir. Na circunferência há “n” pontos que distam igualmente do ponto central. Todos os pontos - ou todas as pessoas que neles se encontram voltadas para o centro - têm a visão de todos os demais da roda e todos são igualmente importantes na composição final que é o círculo. Este contém o vazio, que ao mesmo tempo em que garante a distância entre as pessoas, é o vazio através do qual elas estão unidas e de onde pode emergir a criação feita por todos. Apenas compor a circunferência da roda já constitui uma criação, num espaço diferenciado e, possivelmente, sagrado. O círculo representa a aspiração humana a essa paz completa. O homem trilha sua vida aspirando retornar ao estado de plenitude total. Uns se apoiam na religião para se re-ligar, outros esperam que o parceiro lhes traga este aconchego e suprimento através do amor, do ato sexual, ou de ambos; há os que se utilizam das drogas, outros que ficam em ação e trabalho compulsivo para nunca sentir o estado de falta. Muitos vivem a combinação de vários recursos para acreditar que são plenos, ou chegar o mais próximo deste estado. Deseja-se estar num tempo/espaço/vivência com a unidade permanente. Por sua vez as Danças Circulares também brotam dessa aspiração humana de sair da separatividade e da falta e unir Céu. A Dança Circular tem esse nome e se torna Sagrada pelo fato de permitir que os participantes entrem em contato com sua essência, com seu EU superior, com a Centelha Divina , energia que nasce de Deus e atua em nós, trazendo a vida, a saúde e a paz, nesse momento temos a união do corpo (matéria) com o espírito. Essas danças são desenvolvidas visando ampliar o conhecimento, em direção ao bem estar físico, mental, emocional, energético e social, favorecendo a integração, comunicação, flexibilidade, percepção de si mesmo, sendo praticada em grupo, e ao estar em círculo, abre- se uma coreografia e conectados entre si reúnem energias em busca da harmonia da consciência do todo. Através dessa ligação, de mãos dadas, a energia flui e se espalha por todos. No circulo não existe hierarquia, e as atitudes cooperativas, onde os participantes do grupo podem ajudar a superar os erros dos outros manifestando o melhor de cada um. Inúmeros ritmos, cantos, danças, e culturas do mundo são vivenciadas. Em meio a 30 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com momentos de muita descontração e também momentos de introspecção, a pessoa que está na roda se percebe como um ser humano importante. Onde nasceram as Danças e como chegaram ao Brasil As Danças Circulares Sagradas, também chamadas de dança dos povos, surgiram das danças folclóricas, muito antes do Samba e do Rock, com raízes nas mais diversas culturas em todo o mundo. Bernhard Wosien (1908-1986), bailarino clássico, coreógrafo, pedagogo e pintor, nas décadas de 50/60 percorreu o mundo recolhendo e resgatando as danças de diferentes povos. Ele pesquisou e acreditava que dançar e caminhar são uma forma de meditar. “A ciência fala que quando caminhamos exercitamos o cprebro”. Em Findhorn, uma comunidade alternativa conhecida na década de 60 (hoje é uma Fundação em forma de vilarejo, localizada nas proximidades do Mar do Norte Escócia, com extenso programa de cursos voltados para o desenvolvimento humano), a pedido de um amigo, Bernhard Wosien, em 1976, ensinou pela primeira vez uma coletânea de Danças Folclóricas aos residentes deste lugar , com interesse de compartilhar as danças de roda que vivenciou e as danças que coreografou voltadas para o mesmo fim: re-ligar,meditar e transformar em ação grupal. A partir de Findhorn a arte de Bernhard espalhou-se pelo mundo afora de outras formas. Desde essa época, centenas de Danças foram incorporadas e foram chamadas de Danças Circulares. As Danças encontradas por ele foram de natureza alegre e vibrante. Foram denominados “solares”, movimentos ondulados e redondos. Mas ele coreografou, tambpm, as Danças introspectivas, chamadas "lunares", movimentos bem marcados como batidas de quadril, pois constatou que elas haviam desaparecidas . BRASIL A Dança Circular veio para o Brasil no meio da década de 80 pelas mãos (ou passos) de Sara Marriot. Uma mulher que residia em Findhorn e veio morar no Centro de Vivências Nazaré, em Nazaré Paulista, interior de São Paulo, onde iniciou um trabalho de educação holística. Como Nazaré Paulista foi inspirada em Findhorn e mantinha práticas de trabalho e sintonia grupal, as DançasCirculares se encaixaram com perfeição ao dia a dia de Nazaré. Ali foi criada a Dança e Meditação, onde as Danças são compartilhadas com muita 31 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com profundidade, como caminho de auto desenvolvimento. A partir desse momento houve uma disseminação pelo Brasil. As Danças Circulares vêm se espalhando pelas principais capitais (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Belém) e também pelo interior. Para dançar não são necessárias habilidades especiais, basta querer compartilhar da alegria de se dar as mãos na roda, com disponibilidade para ser mais um elo que dá, recebe e contribui para a criação grupal, com seu modo único e original de ser. Manifestações Rítmicas Expressivas As manifestações rítmicas expressivas em nossa cultura são muitas e de diferentes ordens.Há as manifestações puramente musicais. Há aquelas que são conjunção de dança e música. Essas últimas são as que mais nos interessam já que somos educadores físicos. Certo? O Brasil é muito rico em ritmos e festas populares, que são manifestações rítmicas por excelência. Segundo a obra de Gustavo Côrtes, “Dança, Brasil!” (Belo Horizonte: Ed. Leitura, 2000), temos como destaques em cada região, por exemplo: - No Norte: o Boi-Bumbá de Parintins; o Círio de Nazaré; a Festa de São Joaquim; a Festa do Çairé; a Marujada em Bragança Paraense. E danças como o carimbó, o retumbão, o lundu da Ilha do Marajó, o xote bragantino, o vaqueiro do Marajó, o marabaixo, o batuque, o siriá e o boi-de-máscara; - No Nordeste temos: Lavagem da Igreja do Bonfim na Bahia; Folguedos Natalinos em Alagoas; Bumba-meu-boi no Maranhão; Festas de São João de Campina Grande; de Caruaru e de Estancia; Carnaval em Recife, Olinda e Salvador; a Romaria em Juazeiro do Norte; e as danças guerreiro, frevo, xaxado, quilombo, caninha verde, maracatu, caboclinhos, ciranda, coco, capoeira entre outras; - No Centro-Oeste: Festa de São João em Corumbá; Procissão do Fogaréu; Festa do Divino; Festa de Nossa Senhora do Caacupé; e as danças da catira, chupim, cururu, siriri, engenho de maromba, cavalhada etc; - No Sudeste: Festa de São Sebastião (Alardo); Festa de Nossa Senhora do Rosário; Carnaval Carioca; Festa de Santa Cruz; Festa do Divino; e as danças: ticumbi, 32 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com congos ou congadas, moçambique, catopês, jongo, caboclinhos ou caiapós, folias de reis, marujos, são gonçalo, calango entre outras; - No Sul: Oktoberfest; Festa de Nossa Senhora dos Navegantes; Boi-de-mamão; Fandangos; Festa Nacional da Uva; e as danças caranguejo, chimarrita, pezinho, balaio, maçanico, rancheira, pau-de-fita, tatu, chula, tirana do lenço, xará-grande, anu, tonta e recortado entre outras. A Dança como manifestação cultural Partindo de uma compreensão da Educação Física como componente curricular que trata pedagogicamente da cultura corporal (SOARES et. al., 1992) e considerando a inserção da dança no currículo mediante uma perspectiva pós-crítica (NEIRA e NUNES, 2009), compreende-se a dança como manifestação da expressividade humana produzida e reproduzida conforme o contexto, crenças, valores e características de cada grupo social (SBORQUIA e PÉREZ GALLARDO, 2006). A argumentação desenvolvida pelos autores permite considerar a dança como artefato cultural produzido pela gestualidade sistematizada, passível, portanto, de tematização no interior do currículo da Educação Física. A concepção de cultura que atravessa a presente discussão toma como base a discussão travada no âmbito dos Estudos Culturais. Nelson, Treichler e Grossberg (1995) definem os Estudos Culturais como um termo de conveniência para uma gama bastante dispersa de posições teóricas e políticas. Sendo profundamente antidisciplinares, sinteticamente, pode-se dizer que partilham o compromisso de examinar práticas culturais do ponto de vista de seu envolvimento com, e no interior de relações de poder. Cultura se refere à dimensão 33 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com simbólica presente nos significados compartilhados por um determinado grupo. Cultura é aqui concebida como prática social, não como coisa ou estado de ser. Nesse enfoque, coisas e eventos do mundo natural existem, mas não apresentam sentidos intrínsecos: os significados são atribuídos a partir da linguagem. “Quando um grupo compartilha uma cultura, compartilha um conjunto de significados construídos, ensinados e aprendidos nas práticas de utilização da linguagem” (MOREIRA e CANDAU, 2007, p. 27). A discussão atual em torno da cultura nos mostra que a expansão cultural atual é sem precedentes na História. A cultura, no século XX, assumiu uma função primordial na história quanto à sua estrutura e à organização das sociedades, pois, em função de novas tecnologias e da consequente revolução das informações, ocorre maior produção, circulação e trocas culturais. Mais ainda, a indústria cultural ocupa espaço central como elemento mediador em vários momentos políticos, econômicos e sociais. O que isso sugere é que o cotidiano está sendo alterado constantemente e esse não detém autonomia, pois sua constituição depende da sua relação com o global. Vivemos em uma época em que os riscos de homogeneização cultural, fruto da expansão constante da lógica capitalista, são permanentes, porém não tão simples como possa parecer, afinal toda relação social implica força e luta. No campo teórico e político dos Estudos Culturais a cultura é entendida como espaço de luta, ou seja, qualquer transmissão cultural é sempre travada, disputada, conquistada e transformada pelos grupos envolvidos; uma construção que ocorre nas relações entre os diversos grupos sociais e entre seus membros (HALL, 2003). Atuar como professor de Educação Física na escola ou como profissional de Educação Física nas demais instituições sociais requer um posicionamento teórico sobre o conceito de cultura e a análise de suas implicações na constituição da vida social. A análise cultural parte da concepção de que o mundo cultural e social torna-se, na interação social, naturalizado: sua origem social é esquecida (HALL, 1997). A tarefa da análise cultural consiste em desconstruir, em expor esse processo de naturalização. É o caso, por exemplo, das danças da mídia quando produzidas unicamente para atender às demandas de mercado, acabam reproduzidas de forma acrítica no contexto educativo. Sborquia e Pérez Gallardo (2002) vão destacar a necessidade de análise e reflexão não só sobre sua transposição direta como também dos seus significados. Nas aulas de Educação Física não basta dançar, é necessário tematizar a dança em questão. 34 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Inspirado nos Estudos Culturais, o currículo da Educação Física traz para o interior da escola uma variada gama de manifestações corporais, às quais serão submetidas a um permanente processo de tematização. Seguindo o raciocínio de Corazza (2003), tematizar significa abordar algumas das infinitas possibilidades que podem emergir a partir das leituras e interpretações da prática social de uma dada manifestação. No trabalho de Freire (1980), tematizar implica em procurar o maior compromisso possível do objeto de estudo numa realidade de fato, social, cultural e política. O que se pretende com a tematização é uma compreensão profunda da realidade em foco, desenvolvimento da capacidade crítica dos alunos enquanto sujeitos de conhecimento, desafiados pelo objeto a ser conhecido. No decorrer das ações didáticas, é fundamentalque o professor de Educação Física acompanhe e ajude os alunos a identificar quais significados sobre a dança estão sendo produzidos nos diversos segmentos da sociedade, quais os efeitos que as diversas manifesta- ções da dança produzem sobre seus integrantes e como se constroem as relações históricas e de poder nesses grupos sociais, sem desprestigiar nem desqualificar qualquer dança, muito menos seus representantes. Ocorre que diante da força avassaladora da cultura midiática, as danças por ela e para ela produzidas invadem quase todos os ambientes disponíveis deixando pouco espaço para as demais manifestações rítmicas. Obviamente, tudo isso reflete nas representações que docentes e discentes elaboram acerca de qual dança deve ser tematizada na escola. O fato é que, geralmente, as danças populares e folclóricas são deixadas de lado e as midiáticas recebem toda a atenção, reproduzindo indefinidamente o ciclo de exaltação de determinados grupos em detrimento de outros. Folclore e Cultura popular Festeja-se o dia Internacional do Folclore em 22 de agosto, porque nessa data, no ano de 1846, pela primeira vez a palavra Folk-Lore foi publicada na revista Londrina “The Atheneum”, pelo arqueólogo inglês William John Thoms, propondo que se estudasse sistematicamente e preservasse tudo aquilo que na Inglaterra chamavam “Antiguidades Populares”. Referia-se Thoms, aos estudos dos usos e costumes, cerimônias, crenças, romances, refrões, superstições, contos, lendas, mitos, histórias. A palavra foi criada pela aglutinação dos dois termos anglo-saxônicos: Folk no sentido de povo e, lore no sentido de saber, ou seja, “saber tradicional do povo”. 35 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com A princípio, o conceito de Folclore é visto como a busca de preservar aquilo que estava se perdendo, bem como à concepção de certa espontaneidade do povo. Perspectivas que estavam contextualizadas numa Europa que se industrializava rapidamente. Entre a Antiguidade e a Idade Média, as manifestações populares, mesmo que provindas de diferentes grupos sociais, não chamavam a atenção pelas diferenças. É, sobretudo, no Renascimento que ocorrerá de fato uma diferenciação entre o que é do povo e o que é da elite. Exemplificando, o balé clássico tornou-se a dança das elites, enquanto outras manifestações foram negligenciadas. Embora, fosse percebida certa interação desses universos, aos poucos, vai se marcando, definitivamente, o que é popular em contraposição ao que é erudito. Apesar do estabelecimento de fronteiras, é interessante notar que os cidadãos eruditos, muitas vezes, identificam-se com o que é do povo, mas muito mais como estudiosos do que participantes, o que, em certa medida só faz aumentar as distâncias entre popular e erudito (OLIVEIRA, 2004). Afinal, é bem comum ver as tradições populares retiradas do seu habitat, analisadas e perscrutadas pelos eruditos e devolvidas às massas em escala industrial. O folclore está ligado à vida rural e campestre, algo bem próximo à cultura tradicional (OLIVEIRA, 2004). Enquanto conceito, o folclore abrange o específico e o permanente, o durável. Brandão (1982) adverte para o risco de se definir folclore como a pura sobrevivência intocada, dada a negação de sua condição dinâmica. A cultura do folclore é um codificador de identidades, de reprodução dos símbolos que consagram um modo de vida de classe. O folclore perdura, e aquilo que nele em um momento se recria, em outro precisa ser consagrado. Precisa ser incorporado aos costumes de uma comunidade e ali conservar-se através das gerações. Tradicionalmente, o saber popular que faz o folclore flui através de relações interpessoais. No caso das danças que constituem folclore de um povo, Sotero e Ferraz (2009) vão distingui-las segundo seus aspectos sagrado e profano. O sagrado faz parte da crença religiosa de um grupo social, estão presentes em cerimônias religiosas e buscam a ligação entre o homem e sua divindade. As danças profanas fazem parte do cotidiano pagão de um grupo social, estão presentes em comemorações. O sagrado e o profano, na opinião de Lara (1998), devem buscar uma relação dialógica na dança. Pois, ambos constituem duas formas de ser no mundo que se opõem e ao mesmo tempo complementam a vida dos indivíduos. 36 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Mato Grosso do Sul: cultura e folclore Mato Grosso do Sul, tendo seu território percorrido pelas correntes migratórias espanholas e portuguesas desde 1524 e, depois de oficializada a posse pela coroa portuguesa, sua situação geográfica de proximidade com as fronteiras do Paraguai e da Bolívia, oferece características histórico-culturais diferenciadas das demais regiões do país. Grande parte da superfície desse Estado é considerada a maior área inundável do continente americano - o Pantanal. Seus habitantes são pessoas simples e guardam em suas memórias, histórias que contam como se formou essa parte do continente, considerando que ali existia, há muitos anos, o mar de Xaraés. Encontram-se mitos como o Bicho Pé-de-garrafa, o Minhocão, o Mãozão, o Come-língua e outros, além de lendas como A tristeza do Tuiuiú, o João de Barro, o Guaraná, só para citar algumas. As danças folclóricas encontradas em Mato Grosso do Sul foram incorporadas através da convivência com migrantes e imigrantes, principalmente vindos de: São Paulo, Minas Gerais, Goiás, norte de Mato Grosso, Rio Grande do Sul e, de forma muito acentuada, do Paraguai. As danças: Caranguejo, Engenho Novo, Engenho de Maromba, Revirão, Sarandi, representam a região do Bolsão (nordeste do Estado); Catira de Camapuã e Campo Grande; Chupim, Polca de Carão e a brincadeira do Toro Candil são comuns nos municípios de fronteira com o Paraguai e Polca, Rasqueado, Chamamé, Xote, Mazurca e Vaneirão são apreciadas em todo o Estado; o Cururu e o Siriri são danças que representam a região do Pantanal. Composições Coletivas Convidamos você agora a ser o coreógrafo. Compor danças coletivamente não é difícil. é de fato um grande prazer e tem uma importância educacional enorme. Através da criação espontânea e coletiva, ajudamos nosso aluno a desenvolver sua expressão motora; a respeitar, conviver e construir a realidade (a dança) junto com o outro, sempre diferente dele mesmo; a aprender a adequar seu ritmo e seu espaço interno, pessoal, ao ritmo e espaço do grupo a que faz parte. Você pode lançar mão de qualquer dos elementos da dança para servir de estímulo para a criação do movimento. Por exemplo, propor aos alunos que criem um gesto e depois modifiquem ele modificando seu tempo, sua direção, seu nível; depois é só formar duplas ou trios onde cada aluno aprende o gesto do outro e os executa em conjunto. 37 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com Você pode, também, partir de estímulos materiais (bola, corda, elástico etc..), estímulos imaginários (sonhos, imagens, etc), estímulos emocionais (situações de alegria, tristeza, raiva, serenidade...) e estímulos factuais (narrativas reais do dia-a-dia, dos jornais etc..). Tudo pode virar dança! DANÇA NA ESCOLA 38 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com 39 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com 40 Prof. Esp. Thais Marques – professorathaismarques@gmail.com
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