Buscar

miocardiopatias

Prévia do material em texto

P á g i n a | 1 
 
Definição 
• A Miocardite é uma doença inflamatória do miocárdio causada por infiltração de 
células do complexo imune, que segue com injuria cardíaca. 
• Espectro variado de apresentações clínicas que variam desde as mais sutis às 
mais complexas. 
• Diagnosticada por critérios histológicos, imunológicos e imunoquímicos. 
• Descrita como “um infiltrado inflamatório do miocárdio com necrose e/ou 
degeneração dos miócitos adjacentes”. 
• Manifesta-se em pessoas aparentemente saudáveis e pode resultar em ICC 
rapidamente progressiva (muitas vezes fatal) e arritmia, embora numa 
percentagem elevada dos casos tenha um curso benigno e sem sequelas. 
Epidemiologia 
• Dificilmente estimada pelas apresentações diversificadas e a pouca realização 
de biopsias. 
• Cerca de 0,2 a 12% da população e 9,6% dos pacientes com IC. 
• Maior prevalência no sexo masculino, em jovens adultos, sendo a principal causa 
de morte súbita com < 40 anos de idade e crianças. 
Etiologia 
Pode ser por causas infecciosas ou não infecciosas, sendo a mais prevalente 
secundária a infecção viral. 
• Há prevalência do adenovírus, parvovirus e herpes. 
• No Brasil, também é prevalente a infecção pelo Trypanosoma cruzi, fazendo 
miocardite dilatada chagásica. 
• Pode ser causada por hipersensibilidade hipereosinofílica de fármacos ou 
agressão tóxica direta do miocárdio. 
• Doenças sistêmicas autoimunes como Churg-Strauss e sínd. Hipereosinofílica, 
miocardite de células gigantes e sarcoidose também são causas potenciais. 
• Colagenoses, como artrite reumatoide, dermatomiosite e LES também causam. 
• Pode acontecer no período periparto. 
Fisiopatologia 
Virais: 
• Fase aguda: Viremia – perda de miócitos por necrose graças a ação direta do 
vírus, além de efeitos citotóxicos dos mediadores inflamatórios e produção do 
estresse oxidativo associado a disfunção endotelial e isquemia. O vírus ativa o 
sistema imune, que causa um infiltrado inflamatório com células NK e 
Isabela Terra Raupp 
P á g i n a | 2 
 
macrófagos. Essas células 
produzem citocinas, que 
podem danificar os miócitos 
na dependência de tempo e 
exposição da célula. Acaba 
resultando em necrose 
miocárdica e resposta 
imune aumentada para 
liberar os agentes. 
Acontece por volta do 4° 
dia. 
• Fase subaguda: infiltrado de 
linfócitos T segue invadindo 
os miócitos, fazendo dano 
celular. Há também 
infiltração de linfócitos B. A 
resposta imune humoral 
causa lesão dos miócitos, 
que libera miosina na 
circulação e a presença dessa proteína induz a liberação de anticorpos e 
estimulação de mais linfócitos CD4, aumentando a lesão cardíaca. Acontece 
entre o 4° e o 14° dia. 
• Crônica: Deposição de colágeno no interstício miocárdico com fibrose evoluindo 
para dilatação, disfunção e insuficiência cardíaca. Pode ser causada por 
complexos imunes pós infecção ou autoimunidade ou ainda por persistência 
viral, que resulta em disfunção ventricular e arritmias. Acontece do 15° dia até o 
90° dia. 
 
 
Bacterianas: 
P á g i n a | 3 
 
• Agressão direta aos miócitos, induzida pela produção de toxinas e resposta 
inflamatória intensa com elevados níveis de citocinas e infiltrado de células NK 
e macrófagos. 
 
Induzida por drogas: 
• Partículas são fagocitadas pelas células de defesa, causando resposta de 
hipersensibilidade retardada, que libera IL-5, que é estimulante de eosinófilos, 
com aumento da hipersensibilidade e maior lesão miocárdica. 
 
Síndrome hipereosinofílica: 
• é representada com intenso infiltrado inflamatório eosinofilico no miocárdio, 
promovendo liberação de mediadores altamente agressivos aos miócitos, que 
leva a necrose e perda da estrutura miocárdica. 
 Miocardite de células gigantes: 
• é uma forma autoimune de agressão miocárdica caracterizada por infiltrado de 
células gigantes multinucleadas, células T, eosinófilos e histiócitos. A presença 
de células CD8 promove lesões miocárdicas. A liberação de citocinas 
inflamatórias e mediadores de estresse oxidativo leva a intensa agressão as 
células miocárdicas com perda de miócitos e reposição por fibrose. 
 
Diagnóstico 
A confirmação diagnóstica só é possível após análise histológica obtida pela biopsia 
endomiocárdica do VD. 
Infecção 
bacteriana
Toxinas
Citocinas e 
infiltrado 
de 
Citocinas e 
infiltrado 
de células 
células
Lesão do 
miócito
Partículas 
fagocitadas 
por céls. de 
defesa
hipersensibili
dade 
retardada
IL - 5 Eosinófilos
Maior
hipersensibili
dade
Lesão 
miocárdica
P á g i n a | 4 
 
. 
 
Clínica 
• Bastante variável. 
• Forma subclínica: Dilatação e disfunção ventricular assintomática. 
• Aguda: Insuficiência cardíaca descompensada, choque cardiogênico, dor 
precordial (mimetizando doença coronariana), palpitações, síncope, lipotimia ou 
morte súbita. 
• 30% dos pacientes tem infecção respiratória, GI ou sistêmica pela infecção viral. 
• Insuficiência cardíaca aguda, arritmias ventriculares e atriais. 
• Necrose causa a presença de arritmia malignas – desequilíbrio da atividade 
elétrica. Principal causa é por macrorrentrada nesse local, que vai gerar ponto 
de entrada e saída. 
• Pode simular síndrome coronariana aguda, com dor similar a anginosa, 
alterações no ECG e elevações nos marcadores de necrose miocárdica. 
• Pode se manifestar como alteração no ECG: Distúrbio de condução AV de grau 
variável, associada ou não a bloqueio de ramo. Em formas avançadas, os 
pacientes apresentam baixo débito cardíaco pelo BAV total com ritmo de 
escape. 
(1) rash, febre, eosinofilia periférica sugerem miocardite por 
hipersensibilidade; 
(2) cardiomiopatia dilatada associada com timoma, distúrbios 
autoimunes, taquicardia ventricular ou bloqueios avançados 
sugerem miocardite de células gigantes; 
(3) arritmias ventriculares e bloqueios avançados também podem 
estar presentes na sarcoidose. 
Avaliação laboratorial 
P á g i n a | 5 
 
• Marcadores laboratoriais de agressão inflamatória: VHS, PCR, leucometria 
podem estar elevados ou inalterados. 
• Biomarcadores de necrose miocárdica: depende da fase evolutiva, e se mantem 
em platô por mais tempo. Elevação de troponinas é mais comum e elevadas 
confere pior prognóstico 
• Pesquisa etiopatológica: Doenças sistêmicas inflamatórias autoimunes, 
sorologias virais, doença de chagas. 
 
ECG 
Dependem da fase evolutiva. 
• Fase aguda: distúrbios de repolarização e bloqueios atrioventriculares – padrão 
sugestivo de isquemia coronariana com infra ou supradesnível do segmento ST 
de região cardíaca específica ou difusa. Pode se apresentar com taquicardia 
sinusal, arritmias, complexos QRS de baixa voltagem e alterações difusas na 
repolarização ventricular. 
• Subaguda e crônica: Remodelamento de câmaras – sobrecarga ventricular, 
bloqueio de ramo ou ambos. Pode se apresentar com aumento de amplitude do 
QRS. 
 
Taquicardia sinusal com 
desvio de eixo dI positivo 
e avf negativo e DI, avl e 
v5 e v6 tem inversão da 
onda t – sugere isquemia 
subepicárdica lateral ou 
miocardite. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Ecocardiograma 
• Achados inespecíficos. 
• Mostra alterações na contração ventricular, que são indistinguíveis as 
isquêmicas. 
• Disfunção ventricular é incomum. 
• É auxiliar na realização de biopsia endomiocárdica. 
RMN 
• Identifica injúria miocárdica inflamatória e lesões cicatriciais. 
P á g i n a | 6 
 
• Permite avaliar o edema miocárdico secundário ao processo inflamatório. 
• Apresenta especial valor nos pacientes com marcadores de necrose micárdica 
e coronárias normais na angiografia. 
Angiotomografia computadorizada 
• Usada para diagnostico diferencial de dor torácica, mas tem a desvantagem de 
usar contraste. 
Medicina nuclear 
• Avaliação ventricular esquerda. 
• Avaliação da presença de inflamação cardíaca. 
• Identificação dos subtipos de miocardites 
• Monitoração da respostaterapêutica 
Biopsia endomiocárdica (BEM) 
• Padrão-ouro para diagnóstico de miocardite, pesquisa de persistência viral 
cardíaca e outras doenças não-inflamatórias. 
• Define a necessidade e o tipo de terapêutica adotada. 
• Investigação do fator causal. 
• Favorece o prognostico ao determinar o tratamento imunossupressor em casos 
de miocardite de células 
gigantes, eosinofílica 
necrotizante e sarcoidose. 
• Para pacientes tratados 
previamente com agentes 
quimioterápicos e que 
possam ter feito 
miocardite, ela é 
reservada para casos de 
evolução desfavorável 
associada a dúvida 
quanto a disfunção 
cardíaca. 
• Análise patológica: 
critérios de Dallas para 
miocardite com presença 
de células inflamatórias e necrose de miócitos. 
o Borderline: ausência de necrose. 
o Fulminante: causada geralmente por miocardite linfocítica difusa com 
edema intersticial e miocitólise e reponde ao tratamento 
imunossupressor. 
o Células gigantes: Inflamação crônica difusa com células gigantes em 
pacientes que geralmente tem doenças autoimunes. 
o Necrotizante eosinofílica: infiltrado inflamatório difuso e predomínio de 
eosinófilos com extensa necrose. 
o Aguda: Diferentes intensidades de inflamação, com infiltrado linfo-
histocitário, edema intracelular e intersticial e presença de miocitólise 
focal ou difusa. 
P á g i n a | 7 
 
o Crônica ativa: miocardite linfocítica ativa ou borderline, com alterações 
degenerativas da fibra com hipertrofia e fibrose intersticial. 
o Doenças de depósito: colorações específicas para amiloide, ferro, 
mucopolissacarídeos. 
o Cardiotoxicidade: extensa lise fibromuscular, ruptura mitocondrial e 
vacuolização intramiocito na microscopia eletrônica. 
Tratamento 
1. Medidas gerais: 
• Restrição dietética do sódio a 2-3g/dia. 
• Restrição hídrica entre 1000 e 1500mL/dia 
em fase sintomática. 
• Cessação do tabagismo e etilismo. 
• Não associas anti-inflamatórios não 
hormonais em fase aguda com insuficiência 
cardíaca. 
• Não realizar exercícios vigorosos por 6 
meses após a fase aguda. 
• Não realizar vacinação enquanto houver 
doença. 
 
2. Suporte terapêutico geral: 
• Modular o sistema RAA atenua a progressão da disfunção ventricular, 
diminuindo a fibrose, necrose e inflamação. 
• Inibidores da enzima de conversão (IECA) e bloqueadores da recepção 
de angiotensina (BRA) são usados em todos os pacientes com disfunção 
ventricular, com doses 
progressivas até seu máximo, 
recomendado o uso até 
normalização da função 
ventricular. 
• Bloqueio beta-adrenérgico: 
reduzir atividade simpática e 
níveis de noradrenalina, 
impedindo a progressão da 
disfunção miocárdica. BB são 
utilizados em todos os 
pacientes com disfunção 
ventricular e insuficiência 
cardíaca manifesta, com doses progressivas até as máximas 
recomendadas e até normalização da função ventricular, com no mínimo 
1 ano. 
• Anticoagulantes orais: miocardite + fibrilação atrial paroxística ou 
permanente, trombos intracavitários ou fenômenos tromboembólicos 
prévios. 
3. Terapia específica 
• Imunossupressão: suprimir a atividade inflamatória e autoimune. É indicada em 
pacientes com BEM negativa para pesquisa viral e positiva para atividade 
inflamatória. 
P á g i n a | 8 
 
o Essa terapia não melhora a sobrevida em relação a terapia convencional. 
o Pacientes com IC crônica com miocardite ativa sem presença de infecção viral, 
a terapia mostrou benefícios na melhora clínica, com redução dos diâmetros 
cavitários, melhora da função ventricular e regressão da atividade inflamatória. 
o Miocardites autoimunes, eosinofilica por hipersensibilidade, sarcoidose ou por 
células gigantes, a terapia de corticoides ou associada à ciclofosfamida (LES). 
Mostrou benefício na função ventricular e sobrevida. 
o Pós-viral: Prednisona + azatiprina por 6 meses. 
 
• Antivirais: Promove a eliminação viral e impede a replicação. 
o A infusão subcutânea de interferon-beta (INFB) em pacientes com 
cardiomiopatia dilatada e persistência viral demonstrou eliminação 
viral com melhora da 
capacidade funcional 
ventricular, além de 
eliminação viral. 
o A imunoglobulina IV atua 
como anti-inflamatório, 
reduz a resposta imune e 
antiviral. Seu uso na 
cardiomiopatia dilatada 
de início recente 
demonstrou benefício na 
função ventricular, 
P á g i n a | 9 
 
reduziu a carga viral e a inflamação, com consequente melhora 
clinica e da função ventricular. 
• Imunomodulação: reduzir a agressão inflamatória e autoimune através da 
remoção e modulação de possíveis agentes agressores envolvidos na patogênese 
da miocardite. 
o Terapia de imunoadsorção por palsmaferése seletiva: retira 
autoanticorpos específicos associados a terapia IG-IV para 
imunomodulação inflamatória de citocinas e produção de 
autoanticorpos. Usado em pacientes com cardiomiopatia 
inflamatória crônica com níveis séricos elevados de autoaticorpos 
contra neurorreceptores do miocárdio. Mostrou melhora clínica e 
da função ventricular. 
o Pentoxifilina: anti-inflamatória, reduz interleucinas e fatores de 
necrose tumoral, reduzindo a cardioagressão. Usada em 
cardiomiopatia dilatada com IC crônica e na cardiomiopatia 
periparto. 
Situações especiais 
1. Tratamento de arritmias e prevenção da morte súbita: 
• Taquicardias supraventriculares (FA e flutter) podem induzir ou agravar o 
IC. A abordagem é cardioversão elétrica ou química, e podem receber 
drogas antiarrítmicas pós-cardioversão (amiodarona). Se recorrente, 
pode-se fazer ablação por cateter ou controle da frequência ventricular. 
Se não sustentada e assintomática não devem receber terapias 
específicas. 
• O implante de cardiodesfibrilador (CDI) está indicado em pacientes com 
terapia medicamentosa otimizada que desenvolvem cardiomiopatia 
dilatada na fase crônica da miocardite. 
 
 
P á g i n a | 10 
 
 
2. Miocardite fulminante: 
• Curso agudo da doença rapidamente progressivo com ICC classe IV e 
choque cardiogênico e de alta letalidade se não tratado. A viral ocorre 
usualmente pela persistência de alta viremia em indivíduos susceptíveis 
com persistência da ativação de linfócitos T e formação de anticorpos. 
Existem estratégias especificas para as condições clínicas, como uso de 
imunoglobulinas em miocardites virais, uso de corticoides em pacientes 
com sarcoidose ou células gigantes. O tratamento suporte é dado por 
drogas vasoativas, suporte hemodinâmico e se necessário assistência 
circulatória com circulação extracorpórea (ECMO) e ventrículos artificiais 
paracorporeos, como ponte para a recuperação ou transplante cardíaco. 
3. Miocardite Chagásica 
• Manifestação varia conforme grau de acometimento, podendo se 
apresentar como taquicardia sinusal, baixa voltagem do QRS, distúrbios 
de condução, alteração no intervalo QT, sinais de alteração de 
repolarização ventricular, arritmias e insuficiência cardíaca. 
• Suspeitar em pacientes em regiões endêmicas. 
• Pode estar associado a sinais de infecção sistêmica: 
hepatoesplenomegalia, febre e sinais de entrada do parasita. Podendo 
acometer a pele com chagomas e eritemas, meningoencefalite e 
acometimento da medula óssea. 
• Apresenta forma congênita que cursa com icterícia, hemorragia cutânea 
e sinais neurológicos. 
• O diagnóstico é através da 
localização do parasita no miocárdio 
ou na circulação. 
• Tratamento da forma aguda ou 
reativada: benzonidazolba 5-
10mg/kg/dia durante 30 a 60 dias 
para adultos e 15mg/kg/dia para 
crianças. Como alternativa nas 
reativações se pode usar o 
alopurinol. 
• miocardite crônica: após longo período 
de latência pós infecção aguda, pode se 
• apresentar com bradicardia e distúrbios 
de condução do ramo direito. Os 
mecanismos envolvidos são lesões 
neurogências, microvasculares, 
apoptose, processo inflamatório crônico, fibrose, persistência parasitária e 
autoimunidade. 
Prognóstico• Varia de acordo com a causa, dados clínicos e hemodinâmicos, como fração de 
ejeção e pressão arterial pulmonar. 
• A BEM pode contribuir para avaliação do prognóstico. 
• Vários estudos sugerem que os pacientes com miocardite fulminante e 
comprometimento hemodinâmico à sua apresentação têm melhores resultados 
do que aqueles com miocardite aguda sem características fulminantes. 
P á g i n a | 11

Continue navegando