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UNIVERSIDADE CRUZEIRO DO SUL CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE BACHARELADO EM PSICOLOGIA ALINE DE JESUS DA GAMA BEATRIZ FRUTUOSO SILVA DEBORAH SOARES ACIOLY SANTOS EDUARDA SANTOS DE ALMEIDA FABIO JIORDANO FERNANDA DA SILVA PEREIRA GIOVANNA ARAÚJO ABADE MARIA GABRIELA DE LIMA ROSANA CÉLIA DE LIMA TAIZ AMANDA POMPEU PEREIRA EM DEFESA DA LUTA ANTIMANICOMIAL A única maneira de ser sadio nesse mundo é ser louco SÃO PAULO 2020 ALINE DE JESUS DA GAMA BEATRIZ FRUTUOSO SILVA DEBORAH SOARES ACIOLY SANTOS EDUARDA SANTOS DE ALMEIDA FABIO JIORDANO FERNANDA DA SILVA PEREIRA GIOVANNA ARAÚJO ABADE MARIA GABRIELA DE LIMA ROSANA CÉLIA DE LIMA TAIZ AMANDA POMPEU PEREIRA EM DEFESA DA LUTA ANTIMANICOMIAL A única maneira de ser sadio nesse mundo é ser louco Trabalho apresentado ao curso de Psicologia da Universidade Cruzeiro do Sul, como requisito para compor a nota em Psicologia Social e Práticas Integrativas II Orientador: Prof. Ms. Claudio José Cobianchi SÃO PAULO 2020 Sumário 1. Introdução ........................................................................................................... 1 2. Síntese do livro “Manicômios, Prisões e Conventos” de Erving Goffman .... 2 3. Desenvolvimento Teórico .................................................................................. 6 3.1 – Artigo 1: Entre Loucos e Manicômios: História da Loucura e a Reforma Psiquiátrica no Brasil ................................................................................................ 6 3.2 Artigo 2: Reforma Psiquiátrica e Inclusão Social: Um estudo com familiares de doentes mentais ..................................................................................................... 11 3.3 Artigo 3: Reforma psiquiátrica: estratégias para resistir ao desmonte ............. 13 4. Investigação prática ......................................................................................... 16 4.1 – Perguntas ...................................................................................................... 17 4.2 – Cronograma .................................................................................................. 19 5. Conclusão ......................................................................................................... 21 6. Referências ....................................................................................................... 25 1 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho tem por objetivo conhecer instituições que promovam a saúde mental e procurar observar o papel desempenhado pelo psicólogo(a) junto à equipe multiprofissional, em busca de um esboço analítico da instituição investigada. Infelizmente, por motivos de força maior, devido à pandemia do COVID-19, não foi possível realizar a visita a uma instituição total. Entretanto, os(as) autores(as) do relatório resolveram articular documentários, filmes, artigos e textos abordados em aula, dentre outras fontes. O relatório começa com a síntese do livro “Manicômios, prisões e conventos” de Erving Goffman, na tentativa de conhecer melhor as chamadas “instituições totais”. Em seguida, apresenta três artigos que foram considerados de suma importância pelo grupo para a defesa de tese do relatório: a luta antimanicomial. Tem-se o intuito de contar a história da loucura, o surgimento de instituições que prometem tratar os doentes e a importância da reforma psiquiátrica. A loucura é uma condição que compromete a produtividade do ser humano, que sofre preconceito de sua família e até mesmo da instituição que o recebe. A reforma psiquiátrica foi uma epifania que ajudou a diminuir parte do preconceito ainda latente. O movimento antimanicomial se originou a partir dos questionamentos de sua eficácia, sob denúncia de maus-tratos. A invisibilidade por parte da mídia, de políticas públicas e da sociedade em geral são alguns dos fatores que levaram o Poder Público a criarem leis importantes para a extinção dos manicômios. Entretanto, em 2016, após o golpe que levou ao impeachment da presidente Dilma Rousseff, iniciou-se um ataque às conquistas pela luta manicomial e tal atitude, inconsequente e esdrúxula, vem ganhando força com publicações de Portarias e Emendas Constitucionais pelo governo Bolsonaro. Destarte, não se pode calar diante do desmonte que ganha força. Problemas mentais não devem ser encarados como estigmas, mas como um outro modo de ser e de se objetivar no mundo. O conceito de “normalidade” é uma construção social histórica, atrelada a muitas ideologias dominantes e por interesses corporativos. Seria insano afirmar que a única forma de ser sadio nesse mundo é ser “louco”? 2 2. SÍNTESE DO LIVRO “MANICÔMIOS, PRISÕES E CONVENTOS” DE ERVING GOFFMAN Todas as instituições possuem tendências de pensamento que englobam o “mundo” desse local e seu “fechamento” é realizado a partir da relação social com o mundo externo e por proibições de saída. Tais estabelecimentos são chamados de “instituições totais”. Os funcionários se sentem superiores aos internados e os internados inferiores aos funcionários. Por vezes, nessas instituições, é oferecido um trabalho ao internado. Porém, não como visto em sociedade, mas sim, com diferenciações de horários e pagamentos. Em algumas instituições é feita uma troca com o internado, onde o mesmo deve realizar seu trabalho em troca de alimento, descanso etc. Quando não realizado o trabalho de uma maneira significativamente correta, o mesmo acaba recebendo um castigo. É comum os internados chegarem às instituições totais com crenças e culturas familiares. Nessas instituições, crenças e culturas são corrompidas e ocorre o “desculturamento”. Caso o internado volte para a sua vida social, ele será incapaz de enfrentar alguns aspectos de sua vida diária. Essa “desculturalização” mantém a tensão entre o mundo doméstico e o mundo institucional e é usada como estratégia para controlar os internados. As equipes privam por controles dos pacientes: manter internado aqueles que realmente precisam e que tenha patologia para estar ali. Há uma triagem (classificação) dos pacientes, uma forma contraditória no trabalho da equipe dirigente, pois eles têm que manter os internos obedientes. Porém, ao mesmo tempo de forma humanitária e mantendo as normas da instituição. Práticas institucionais internas mostram solidariedade e compromisso em grupo. Essas festas podem ser o Natal, onde os internos decoram a instituição, tem mordomias que geralmente não tem no ano todo. Essas cerimônias forçadas são, muitas vezes, para mostrar uma realidade que não existe: um lugar todo enfeitado, internos limpos e bem tratados, comida saborosa e outros “perfumarias”. Mas, na realidade, está muito longe de ser dessa forma. Uma das representações das cerimônias é o psicodrama. 3 Muitos pacientes são internados por motivos que poderiam ter sido usados pelas pessoas que cometem agressão a diversos casos, como de um alcoólico ou de uma filha rebelde. A definição para a sociedade de “doente mental”, são essas citadas acima. Pode-se dizer que os “doentes mentais” sofrem sim, mas não de doença mental, mas sim, de outras circunstâncias. Na carreira do pré-paciente existem também outros aspectos importantes a seremmencionados em relação às pessoas. A primeira “pessoa mais próxima” do paciente, que seria a pessoa em que ele mais considera próxima, que seria a pessoa que daria abrigo e conforto ao paciente quando ele precisasse. Em segundo lugar o “denunciante”: a pessoa que seria a responsável por ter dado início junto com o paciente sobre a sua vida no hospital. E em terceiro lugar estão os “mediadores”, que seria responsável pelos cuidados dos pré-pacientes, para onde ele é levado. Aqui inclui médicos, advogados, clinicas entre outros serviços. Sendo a terceira pessoa nesse processo, tende que as relações da pessoa mais próxima do paciente, faz visitas continuas, para dar a impressão de que tudo que está sendo feito com ele e de que ele vai ficar bem novamente. O paciente nas primeiras visitas pede para que a pessoa o tire daquele lugar, intensificando o sentimento de abandono e pede privilégios para que aquele lugar seja menos ruim do que está sendo. E a pessoa mais próxima apenas finge que não ouve ou se nega a fazer esses favores que o ele faz a ela. Depois, a pessoa mais próxima volta para a sua realidade sendo uma pessoa livre e cheia de vontade e desejos, fazendo assim descaso com que o paciente passa e sente naquele momento. É neste momento em que o paciente tem a certeza que tudo não passa de uma hipocrisia, um típico caso de abandono e total traição de quem o ajudou a estar hospitalizado. No último estágio do pré-paciente, ele conclui que foi abandonado ou não pela sociedade e não tem mais vinculo ou relações com as pessoas que eram mais próximas do dele. O pré-paciente pode ficar mais calado e fechado. Ao entrar no hospital, pode não se sentir conhecido pela sociedade e evitar qualquer contado com pessoas com quem ele venha a desenvolver algum vínculo reciproco; e quando algum parente vai visitá-lo, pode se recusar a querer falar e ver a pessoa justamente por causa da quebra de vinculo que ouve. Quando o paciente passa a aceitar a sua nova vida, sua nova posição entra como se fosse uma linha de segregados que seria igual aos campos de 4 concentração e presídios com trabalho forçado, no qual é estabelecida uma rotina diária para a pessoa. Ao mesmo tempo em que o paciente passa por situações humilhantes, eles aprendem a se virar no internato com poucos alimentos para as refeições, bancos de madeiras totalmente desconfortáveis e um pequeno lugar para dormir. Nas instituições, cada paciente tendia a verificar que seu mundo estava dividido em três partes separadas de maneira semelhante para os que estavam na mesma posição de privilégio. Em primeiro lugar, havia os lugares situados fora dos seus limites; em segundo lugar, havia o espaço de vigilância; E em terceiro, o espaço não regularizado pela autoridade usual da equipe dirigente. Eram encontrados vários “esconderijos fixos”, mais frequentemente nos territórios e locais livres, que eles criavam para guardar seus bens mais valiosos. As tarefas ocupacionais especializadas podem ser divididas em duas categorias: uma em que profissional encontra o público por meio de seu trabalho e outra em que isso não se repete e o trabalho serve apenas para os participantes de sua organização de trabalho. Quaisquer que sejam as condições sociais do paciente, independente do caráter específico de sua perturbação, ele pode ser tratado nesse ambiente como alguém cujo problema pode ser enfrentado, ainda que não tratado, pela aplicação de uma única interpretação psiquiátrica técnica. Um dos problemas na aplicabilidade do modelo de serviço à medicina está no fato de que parte do mandato oficial do hospital psiquiátrico público é proteger a comunidade do perigo e dos aborrecimentos de certos tipos de má conduta. Entretanto, cada vez que o hospital psiquiátrico atua como hotel provisório, destinado a lidar com indivíduos que não podem ficar na comunidade externa, o modelo de serviço é contradito. Outro problema do modelo de serviço, refere-se ao caráter, sobretudo involuntário, da admissão em um hospital psiquiátrico. Na psiquiatria, existe um esforço formal para agir como se o problema fosse de tratamento, não de julgamento moral, mas isso não é mantido de forma coerente. É difícil manter a neutralidade ética na prática da psiquiatria, pois a perturbação do paciente está intrinsecamente ligada a uma forma de agir que ofende as testemunhas. Em nossa sociedade, a maneira padronizada de tratar tais ofensas é castigar o transgressor, 5 negativa e corretivamente. Portanto, a sociedade atua com essa suposição em todos os itens, em todas as minúcias da vida. Sem algum equivalente funcional, seria impossível a manutenção da ordem social. A ação médica é apresentada ao paciente como um serviço individual, mas na instituição que o recebe há um disfarce do modelo de serviço médico. Do ponto de vista da instituição, o psiquiatra deve oferecer seus serviços porque o doente mental clama, voluntária ou involuntariamente, pelo tratamento. Os ajustamentos do paciente em relação à instituição são apenas os sintomas da sua enfermidade. Esses aspectos da profissão do médico psiquiatra, orientam-se pela ideologia institucional. O que a sociedade vê como mau comportamento, o médico tem que classificar como patologia. Essa mesma patologia requer tratamento, pois significa a incapacidade do paciente para viver em sociedade. O sucesso da cura é resultado de um trabalho eficaz do hospital, mas o fracasso refere-se à perturbação da doença do paciente. Enfim, para sair do hospital ou para manter-se bem na instituição, os doentes mentais têm de demonstrar que aceitam o lugar que lhes foi atribuído, apoiando o papel profissional daqueles que os mantêm em tais condições. Cada modelo contém um sistema de tipificações automáticas que orientará a vida, sobretudo cotidiana dos indivíduos. Na sociedade ocidental, esses esquemas diferenciam-se pela institucionalização do conhecimento dito especializado, entre servidor (especialista) e servido (não-especialista). O contato entre esses dois mundos, baseia-se em uma lógica arbitrária, ainda que legítima, pois o servido é apenas um cliente da relação de serviço ou, às vezes, é apenas um mero objeto do servidor. 6 3. DESENVOLVIMENTO TEÓRICO 3.1 – Artigo 1: Entre Loucos e Manicômios: História da Loucura e a Reforma Psiquiátrica no Brasil O artigo em questão tem o intuito de contar a história da loucura, o surgimento de instituições que prometem tratar os doentes e a importância da reforma psiquiátrica. A loucura é uma condição que compromete a produtividade do ser humano e que sofre preconceito de sua família e até mesmo da instituição que o recebe. A reforma psiquiátrica foi um evento que ajudou a diminuir parte desse preconceito que ainda existe. A Reforma Psiquiátrica, partindo dessa concepção, tem como foco as intervenções e trabalhos específicos, equipes multi e interdisciplinares e a mudança do conceito/visão de loucura e de hospitais psiquiátricos como manicômios, apontando uma melhoria na qualidade de vida e conquista ao que se refere em termos de cidadania aos pacientes psiquiátricos (RAMMINGER, 2002). Tal movimento trata-se, também, de uma produção social marcada pelas demandas atuais da saúde e sociedade em nosso tempo presente (FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 123). De acordo com Figueiredo, Delevati e Tavares (2014), o conceito de loucura é antigo e sofreu muitas mutações ao longo dos anos. Foi definido com base em perspectivas diferentes, e uma delas foi a possessão diabólica que teve seu apogeu na Idade Média, mas foi descartada tempos depois. A teoria que teve maior ênfase foi a de Hipócrates, que definia a loucura como uma patologia, na qual o principal sintoma era a insanidade. No século XIX, o foco foi redirecionado ao diagnóstico e tratamento da loucura.Pinel trouxe o diagnóstico implicado na observação prolongada, rigorosa e sistemática das transformações biológicas, mentais e sociais do paciente, que eram realizadas dentro no manicômio – que passou da condição de asilo onde se abriga, para a condição de cura/tratamento. Mas, apesar da rápida repercussão na Europa, a doutrina de Pinel foi logo ofuscada pelo emprego inadequado do tratamento, porém, aumentou-se o interesse pela explicação e tratamento da loucura a partir de 7 modelos organicistas. Com a volta da visão organicista na prática psiquiátrica, o manicômio deixa de ser recurso terapêutico e volta a ser um instrumento de segregação social (RAMMINGER, 2002, apud FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 125). A loucura passou, então, a ser um domínio exclusivo do ramo médico, a psiquiatria. É o que diz Figueiredo, Delevati e Tavares (2014), que ainda salientam que a mesma era tida como uma doença que necessitava de intervenções como tratamento e medicalização. Os manicômios eram uma forma de tratar os loucos; umas de suas funções era recolhê-los das ruas e mantê-los em isolamento junto de outras pessoas que faziam parte de minorias. Mais tarde, os manicômios passaram a ter função hospitalar. O intuito era, mesmo que com equipe desqualificada, tratar as pessoas. Tempos depois, os manicômios passaram a ser exclusivos para tratamento de doentes mentais. Mesmo as instituições tendo o intuito de receber somente pessoas com esses tipos de transtornos, o que verdadeiramente ocorria é que pessoas com epilepsia, alcoolistas, rebeldes, prostitutas, entre outras, representavam algum incômodo na sociedade. Os pacientes viviam em situações precárias, eram agredidos, morriam por passar frio, por não ter o que comer ou alguma doença. Essas instituições tinham como motivo para essas ações a necessidade de fazer uma higienização social, o que deixaria a sociedade daqueles considerados desprezíveis. Segundo Ramminger (2002), a partir do século XIX a defesa da existência de instituições manicomiais domina toda a Europa e foi considerado como a modalidade terapêutica mais eficaz, apesar do reconhecimento dos pontos negativos como violência, isolamento e as práticas coercitivas que eram justificadas como um mal necessário (FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 126). Figueiredo, Delevati e Tavares (2014) contam que, em 1852, no Rio de Janeiro, foi criado o Hospício D. Pedro II, o primeiro manicômio no Brasil. Como as demais instituições desse tipo, o objetivo era disciplinar pessoas e o modo como se comportavam, comportamentos esses que necessitavam de intervenção psiquiátrica. Essa maneira de ver o isolamento em manicômios e hospitais psiquiátricos como o único tratamento eficaz para a doença mental prevaleceu no país. Na Europa, depois da Segunda Guerra Mundial, começaram a surgir movimentos que pediam 8 pela mudança do método de tratar a doença mental, ou seja, que era contra a psiquiatria atual. Entre 1960 e 1980, houveram muitas mortes nos manicômios brasileiros, causadas pela superlotação, negligências com os internados e erros médicos cometidos nesses hospitais. Figueiredo, Delevati e Tavares (2014) detalham que na internação, o paciente era privado de liberdade e mantido em cativeiro. Nessa época, as reivindicações incentivaram a multiprofissionalidade nos hospitais psiquiátricos. Esse momento foi um marco para a psicologia, pois os profissionais da área começaram a fazer parte da saúde pública. Tal período provocou reivindicações trabalhistas, gerando discussões acerca do tratamento psiquiátrico no Brasil, que teve como consequência a demissão de estagiários e profissionais grevistas (AMARANTE, 1995, apud VASCONCELLOS, 2008). A partir de então, iniciaram grandes eventos para discussão do tema, tais como o V Congresso de Psiquiatria, o I Congresso Brasileiro de Psicanálise de Grupos e Instituições e o III Congresso Mineiro de Psiquiatria. No entanto, o Movimento da Luta Antimanicomial no Brasil surgiu de forma mais clara a partir do I Encontro Nacional de Trabalhadores da Saúde Mental em 1987, cujo lema era “Por uma sociedade sem manicômios”. Segundo Rotelli (apud RAMMINGER, 2002, p. 115), foi defendido neste evento: eliminar os meios de contenção presentes no tratamento, reestabelecer a relação do indivíduo com seu próprio corpo, reconstruir o direito e a capacidade de uso da palavra e dos objetos pessoais, produzir relações, espaços de interlocução, restituir os direitos civis, eliminando a coação, as tutelas judiciais e o estatuto da periculosidade, reativando uma base de inserção para poder ter acesso aos intercâmbios sociais (FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 128). De acordo com Figueiredo, Delevati e Tavares (2014), as propostas da Reforma Psiquiátrica foram chegando até o governo do país aos poucos, e com elas foram geradas as “Diretrizes para a Área da Saúde Mental”, redigida pelo Ministério da Saúde na década de 1980, defendendo que o tratamento seja extra-hospitalar, que a internação tenha um tempo limitado e que o doente e a família seja reintegrados, e incentivava a produção de pesquisas no ramo da saúde mental. 9 Foram realizadas duas Conferências Nacionais de Saúde Mental em 1987 e 1992, junto à inscrição da proposta do Sistema Único de Saúde (SUS) na Carta Magna de 1988, promovendo discussões e novas experiências no que diz respeito à loucura e ao sofrimento psíquico (AMARANTE; TORRE, 2001). Um dos pontos, também, defendidos pela Reforma é o trabalho interdisciplinar, e não apenas a simples presença de psicólogos, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais, mas sim, a valorização desses profissionais. A impossibilidade de solucionar tais problemas propiciou o surgimento de diversos modelos assistenciais, novas teorias e práticas (VASCONCELLOS, 2008 apud FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p.129). No fim da década de 1980, foram criadas as instituições assistenciais como o CAPS (Centros de Atenção Psicossocial) e o NAPS (Núcleos de Atenção Psicossocial). Figueiredo, Delevati e Tavares (2014) explicam que ambos proporcionam serviços como atendimento psicológico, terapia ocupacional, serviço social e outros. Infelizmente, o surgimento dessas instituições foi tardio e não teve o investimento necessário, limitando o atendimento e a atuação dos profissionais. Em 1989, com a Luta Antimanicomial, o Projeto de Lei nº 3657, proposta pelo Deputado Federal Paulo Delgado, previa a extinção progressiva dos manicômios, sendo substituídos por outros recursos assistenciais. Tal projeto reproduziu a Lei Italiana de 1978, que objetivou, de acordo com Goulart (2006, p. 12), “[...] o fim dos manicômios, entendidos aqui como metáfora a todas as práticas de discriminação e segregação daqueles que venham a ser identificados como doentes mentais [...]”. Seguido de um marco histórico em 1990, a Conferência Regional para a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica, realizada em Caracas. Nela, os países da América Latina, inclusive o Brasil, comprometeram-se a promover reestruturação da assistência psiquiátrica (HIRDES, 2009 apud FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 131). De acordo com Figueiredo, Delevati e Tavares (2014), depois da apresentação de todas as críticas à psiquiatria, foi aprovada em 2001, sob número nº 10.216, a Lei Nacional da Reforma Psiquiátrica. Ela trouxe mudanças significativas nos tratamentos psiquiátricos e na visão da sociedade sobre a doença mental. A lei assegurava os direitos das pessoas que tinham alguma doença mental, 10 bem como a proteção das mesmas. Em 1992, a criação da portaria ministerial nº 224, estabelecia unidade psiquiátrica em hospitais gerais e também quais e quantos profissionais seriam necessários para a formar uma equipe adequada. Porém, os avanços legislativos não foram o suficiente para solucionara questão manicomial. Há um grande problema nas representações e interpretações feitas pela sociedade. O debate dessas questões se faz necessário com o intuito de ressignificar o conceito, visando assim maior aceitação e inclusão dos doentes mentais. Discutir o tema pode conscientizar as pessoas, e consequentemente proteger os portadores de doença mental de preconceitos. A partir destes marcos, os serviços substitutivos aos manicômios/hospitais psiquiátricos passaram a ter privilégio, como os CAPS e NAPS, os leitos psiquiátricos em hospitais gerais e oficinas terapêuticas (HIRDES, 2009 apud FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 132). Os serviços substitutivos foram os principais avanços da Reforma Psiquiátrica, trazendo alternativas de tratamento com o objetivo de, principalmente, não reproduzir as bases teórico-práticas do modelo psiquiátrico clássico que “[...] fundou a noção de doença mental como sinônimo de desrazão e patologia, que fundou o manicômio como lugar de cura e que fundou a cura como [...] normalização” (AMARANTE; TORRE, 2001, p. 33, apud FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p. 132). É notável que a presença dos CAPS/NAPS refletiu uma mudança na concepção de tratamento dos pacientes psiquiátricos; onde antes a única instituição que receberia esses pacientes – com a função de recolher/excluir – eram os manicômios/hospitais psiquiátricos (FIGUEIREDO, DELEVATI, TAVARES, 2014, p 132). O artigo apresentado foi de extrema importância para o trabalho, de forma que ajudou a entender a trajetória da loucura em nossa sociedade, conceito que foi definido de diversas formas até os dias atuais. Essa condição é a grande “justificativa” pela exclusão de indivíduos e isolamento dos mesmos em manicômios. Foi possível também aprender mais sobre o olhar da psiquiatria e sobre a loucura, esse que foi durante anos muito negligente e que causou vários danos sociais e aos cidadãos que passaram pela experiência horrível de estar internado em um manicômio. O artigo estudado enfatiza bastante a Reforma Psiquiátrica, responsável por acabar com pesadelos reais, como o hospital psiquiátrico Colônia de Barbacena 11 e o Juqueri. Por meio dessa leitura, percebe-se os benefícios gerados depois da Reforma Psiquiátrica, todos bem significativos, apesar das limitações. 3.2 – Artigo 2: Reforma Psiquiátrica e Inclusão Social: Um Estudo com Familiares de Doentes Mentais O movimento antimanicomial se deu a partir do questionamento de eficácia de instituições manicomiais e engloba questões políticas, econômicas, culturais e históricas de um país. Está associado a um conjunto de iniciativas nos campos legislativo, jurídico, administrativo e cultural. A partir de denúncias de maus-tratos e a falta de assistência na mídia, iniciou- se um processo de motivação pública com alguns políticos sobre a saúde psicológica. A Reforma Psiquiátrica na contemporaneidade, procura não só questionar as instituições asilares e as práticas médicas, mas também humanizar a assistência aos doentes mentais, visando a reabilitação e inclusão social. Desde então, novos serviços para o cuidado da saúde mental foram criados, contando com a proposta de uma equipe multiprofissional. Tal proposta a distribuição de saber e poder são diluídos, articula-se de acordo com a multiplicidade dos problemas e as diferentes terapias, procurando apoiar, incluir e orientar a família. No entanto, a criação de novos serviços de apoio não é garantia de que a lógica manicomial será modificada, uma vez que ainda se corre o risco do uso de práticas antigas com novas formas, pela falta de conhecimento dos profissionais às práticas antigas. De acordo com Giovanella e Amarante (1994) o aparato manicomial não é só a instituição psiquiátrica. Ele está diretamente ligado ao conjunto de olhares, ações e atitudes que criam limites e intolerâncias às diferenças. A maior parte dessas intolerâncias decorrem do saber psiquiátrico, que existe radicalmente no hospital psiquiátrico, mas que pode se entender as demais modalidades de assistências e nas relações cotidianas. De acordo com Costa-Rosa (2000): 12 Para haver mudança radical em relação ao modo asilar, não basta que haja variações nos dispositivos institucionais, mas é necessário, sobretudo, que eles superem também quantitativamente os recursos asilares, e que se estruturem segundo uma 'lógica' oposta à do hospital psiquiátrico. E segundo Maciel, Barros, Silva e Camino (2009): No Brasil, a partir dos anos 1980, ocorreram muitas modificações no sentido de procurar transformar a relação da sociedade com a loucura, que está cristalizada no asilo e na exclusão social. Foram criados serviços “alternativos” aos manicômios e realizadas reformas dos asilos e dos ambulatórios. Mas, embora essas experiências fossem ricas, de um modo geral, não tiveram impacto significativo sobre a qualidade da assistência e pouco contribuíram para a mudança da hegemonia hospitalar e das representações acerca da doença mental. Tratando-se da legislação, o Projeto de Lei nº 3.657/89, aprovado pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardodo em 2001, que depois se tornou a Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001, criada pelo deputado Paulo Delgado (PT-MG), que propôs a extinção de manicômios pela substituição por novos meios de atendimentos, tais como lares protegidos, Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) e hospitais-dias, tornando assim, difícil a internação involuntária, trazendo em discussão formas mais adequadas de tratamentos e atenção à saúde mental. Através disso, o Ministério da Saúde financiou programas alternativos de assistência à saúde mental, alguns deles sendo: Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), alas psiquiátricas em hospitais-dia, oficinais, etc. Barros (2003) destaca que: Ao representar uma política instituída pelos serviços de saúde mental, a desospitalização e a inclusão social devem considerar tanto os aspectos subjetivos dos pacientes quanto o universo social e cultural no qual se encontram. Portanto, pretender a transformação da instituição psiquiátrica sem considerar as portas de sustentação que a própria sociedade lhe 13 oferece é recair na ilusão de que, pela técnica, seria possível modificar a realidade. Retrata assim, o processo de desospitalização que ocorre no Brasil, visando a recuperação e inclusão social familiar do doente mental, sem pensar na família e na sociedade, que em sua grande maioria não sabem como lidar com um doente mental. No Brasil, o processo de desmonte dos hospitais psiquiátricos aconteceu sem a criação de uma rede de cuidados à saúde mental alternativa e qualitativa, que se atende não só a demanda de saúde mental, mas que inclusive a preparação da sociedade e inclusão do doente no ambiente sociofamiliar. De acordo com Spinola (2006), a política de saúde mental descuidou-se da formulação de um sistema integrado, deixando de lado a necessária interação entre os cuidados primários, secundários e terciários. Tanta a sociedade em que aquele doente é inserido, quanto sua família, devem estar preparados para a recepção do doente. Enfatiza-se aqui a prevenção primária e uma equipe preparada e qualificada nesse processo. O artigo foi escolhido por mostrar um outro lado da reforma psiquiátrica que pode ser facilmente esquecido. Chama à atenção a importância que a família e a comunidade têm na inclusão social do desospitalizado. É um estudo detalhado, que explica o início da reforma psiquiátrica até a contemporaneidade. E além de abordar a inclusão do desospitalizado, enfatiza a facilidade de reproduzir em lares protegidos (CAPS, NEAPS, etc.) o mesmo ambiente imposto nos hospitais psiquiátricos. 3.3 – Artigo 3: Reforma psiquiátrica: estratégias para resistir ao desmonte Delgado(2019) encara com preocupação o desmonte que vem sendo feito desde o governo Temer e nos primeiros anos do governo Bolsonaro sobre a política de saúde mental e seus enormes impactos. Assim, afirma que está em curso um processo acelerado de desmonte dos avanços alcançados pela reforma psiquiátrica e entre 2016 e 2019, o governo federal tomou as seguintes medidas: 14 1) Modificou a PNAB – Política Nacional de Atenção Básica, alterando os parâmetros populacionais e dispensando a obrigatoriedade da presença do agente comunitário de saúde nas equipes de saúde da família, com consequências imediatas de descaracterização e fragilização da atenção básica; 2) ampliou o financiamento dos hospitais psiquiátricos, concedendo reajuste acima de 60% no valor das diárias; 3) reduziu o cadastramento de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), em proporção ainda imprecisa, uma vez que o Ministério da Saúde deixou de fornecer os dados sobre a rede de serviços de saúde mental; 4) ampliou o financiamento para mais 12 mil vagas em Comunidades Terapêuticas; 5) restaurou a centralidade do hospital psiquiátrico, em norma já publicada, e recomendou a não utilização da palavra ‘substitutivo’ para designar qualquer serviço de saúde mental (embora seja medida esdrúxula do ponto de vista da gestão, tem uma intenção simbólica clara, de negar a mudança de modelo de atenção); 6) recriou o hospital-dia, um arcaísmo assistencial, vinculado aos hospitais psiquiátricos, sem definir sua finalidade, em evidente reforço ao modelo desterritorializado; e 7) recriou o ambulatório de especialidade, igualmente sem referência territorial. (DELGADO, 2019, p. 2-3) O autor afirma que a reforma psiquiátrica, construída ao longo dos anos, está sob risco e pontua algumas formas de resistência diante do esfacelamento: Primeiro, esta é a pior crise da democracia brasileira, desde o golpe de 1964, e representa uma ruptura do pacto democrático e social celebrado com a Constituição de 1988. O neoliberalismo autoritário que tomou o poder do Estado tem sustentações sólidas nas forças armadas, nas corporações de mídia, em parte da opinião pública, em parte das organizações religiosas, no judiciário, no governo dos Estados Unidos, na inflexão conservadora que domina parte do planeta neste momento. Privatização do Estado, desmonte do projeto de bem-estar social, pauperização, concentração de renda, punitivismo, cerceamento de liberdades individuais, acirramento do ódio e da desigualdade, são componentes do contexto trágico que estamos vivendo. A resistência deve partir de uma consciência aguda do momento político. Depois da defesa da democracia, combater a fragilização do SUS (o “SUS mínimo” proclamado pelo Ministro da Saúde) é tarefa da resistência. No campo da atenção psicossocial, há um vasto movimento de luta, formado por dezenas de milhares de profissionais diretamente implicados nos serviços, aliados a estudantes, usuários e 15 familiares. A trincheira da resistência está nos serviços territoriais. (DELGADO, 2019, p. 3-4) Não seria leviano afirmar que as medidas tomadas nos últimos anos, apresentam com clareza o desprezo, o descaso e a destruição da Coordenação de Saúde Mental no Brasil que vinha realizando um ótimo trabalho desde 2015. A nota técnica 11/2019-CGMAD/DAPES/SAS/MS. O site “Brasil de Fato”, publicou em 08/02/2019 uma reportagem sobre o tema: Com 32 páginas, o documento sobre as mudanças na Política de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas retira o protagonismo da política de redução de danos, adotada há 30 anos no país, após esforços do movimento de sanitaristas e de luta antimanicomial. O ex-ministro da Saúde no governo Dilma, Alexandre Padilha foi taxativo com relação à nota técnica do Ministério da Saúde, por meio de sua conta no Instagram: "Loucura não se prende, loucura não se tortura. A prática de liberdade é terapêutica para a loucura. Estou dizendo isso porque é muito grave, embora não seja ainda oficial, mas os rumores, as notas técnicas, as informações de dentro do Ministério do Bolsonaro de ampliar espaço para os antigos manicômios, autorizar hospitais psiquiátricos a adquirirem com recursos do Ministério da Saúde equipamentos para choque elétrico... Loucura não se prende, loucura não se tortura." (BRASIL DE FATO, 04 out. 2018. Entrevista concedida a Cecília Figueiredo). O artigo foi escolhido para denunciar o descaso e a tentativa de desfacelamento das políticas públicas que vinhan sido construídas, ainda que de forma lenta e consistente, e apresentando bons resultados. Não se pode ficar calado, passivo ou indiferente ao que vem acontecendo nos últimos quatro anos principalmente. O papel do psicólogo não é diferente do papel de cidadão. E como cidadão, deve-se lutar por igualdade e equidade nas mais diversas esferas da sociedade. O problema social também é um problema individual. 16 4. INVESTIGAÇÃO PRÁTICA Estávamos em processo de agendamento da visita técnica, de acordo com as instruções passadas sobre o trabalho e no aguardo da confirmação do dia com setor de Saúde Mental do Hospital Tide Setúbal. Inclusive, já tínhamos solicitado à universidade o documento pedido pela instituição (protocolo do CAA sob número 2023889248). Ocorre que, alguns dias depois, o Governo do Estado de São Paulo decretou o distanciamento social devido à pandemia do COVID-19, o que impossibilitou a realização da visita técnica. Até tentamos contato com a sra. Quezia, na tentativa de uma entrevista virtual, mas devido à alta demanda de pacientes e protocolos internos, não foi possível sua realização. Assim, fizemos uma consulta na internet para tentar responder algumas informações sobre a instituição. Segundo dados do site da Prefeitura de São Paulo, segue um breve relato da instituição: Hospital Municipal Tide Setúbal Instituição Pública R. Dr. José Guilherme Eiras, 123 - Vila Dr. Eiras, São Paulo – SP – CEP: 08010-220 Telefone: (11) 3394-8876 A unidade hospitalar iniciou suas atividades em 1959, precariamente, instalado à Rua Beraldo Marcondes, em uma casa de 5 cômodos. Contava nessa época com 12 Médicos, 20 profissionais de Enfermagem e 3 Ambulâncias. Atendia em média 600 pacientes ao mês. E assim, ficou conhecido como Pronto Socorro de São Miguel Paulista. Em 1967 foram transferidos para instalações mais amplas à Praça Campos Sales (atual Praça Padre Aleixo Monteiro Mafra), funcionando anexo ao Centro de Saúde Estadual. No dia 31/10/1968, foi inaugurado o que seria embrião das atuais instalações. Na Praça da Paz foi construído o “primeiro Hospital Municipal de Assistência Geral a entrar em funcionamento em São Miguel Paulista”. (Extraído do Documento Comemorativo: Histórias e Memórias da Secretaria de Higiene e Saúde da Cidade de São Paulo – 1985). Em 1975 estas ampliações foram sendo feitas tendo atingido o máximo que a área disponível permite. https://www.google.com/search?q=hospital+tide+setubal&oq=hospital+tide+setubal&aqs=chrome..69i57j0l7.4217j0j7&sourceid=chrome&ie=UTF-8 17 Hoje o Hospital atende em média 15.000 pacientes por mês, e conta com 172 leitos, divididos em Unidade de Pronto Socorro Adulto e de Pediatria, e Unidades de Internação – clínicas Médica, Pediátrica, Ortopédicas, Cirúrgicas, Obstétricas, Berçário, UTI Neo, UTI Adulto e Psiquiatria. O nome do Hospital homenageia Matilde Azevedo Setúbal nascida em 1925, que era carinhosamente conhecida como dona Tide Setúbal, casada com Olavo Setúbal, que foi Prefeito da cidade de São Paulo no período de 1975 a 1979. Em 11 de Setembro de 1975, foi criado o Corpo Municipal de Voluntariado, CMV, pela Senhora Matilde Azevedo Setúbal, no intuito de ajudar aos pacientes do então Hospital de São Miguel Paulista. Matilde Setúbal, juntamente com Olavo Setúbal, exerceram suas cidadanias, acolhendocom carinho e compreensão os mais necessitados, Matilde Setúbal fundou o corpo de voluntários nesta instituição, por isso a sua homenagem. https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/autar quia_hospitalar_municipal/noticias/?p=179132 Infelizmente, não foi possível a articulação do texto “Caracterização Institucional e Diagnóstico das Necessidades Psicossociais”. Cap.2, páginas 25 até 34, do livro “Intervenção Psicossocial – Aspectos teóricos, metodológicos e experiências práticas”, Kathia Maria Costa Neiva, Ed. Vetor (2010) com a proposta de caracterização da instituição. 4.1 – Perguntas As perguntas elaboradas pelo grupo eram as seguintes: 1) “Os funcionários, ou seja, a equipe tem um estereótipo dos pacientes internados, como sendo hostis e limitados”. (GOFFMAN, 1974, p.19). Essa visão se mantêm a mesma ou mudou? 2) “Se a estada do internado e muito longa, pode ocorrer, caso ele volte para o mundo exterior, o que já foi denominado "desculturamento”- lsto é, https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/autarquia_hospitalar_municipal/noticias/?p=179132 https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/saude/autarquia_hospitalar_municipal/noticias/?p=179132 18 “destreinamento” – que o torna temporariamente incapaz de enfrentar alguns aspectos de sua vida diária”. (GOFFMAN, 1974, p. 23). Aqui, existe a inserção de atividades culturais para que os pacientes possam ser estimulados? Se sim, quais são essas atividades? 3) Em relação aos objetos pessoais, “para dormir, devem ter apenas um o colchão, um cobertor, urna colcha e um travesseiro. Essas camas devem ser frequentemente examinadas pelo abade, por causa de propriedade particular que aí pode estar guardada. Se alguém for descoberto com algo que não recebeu do abade, deve ser severamente castigado”. Durante esses anos ocorreu na instituição algum caso relatado acima? (GOFFMAN, 1974, p. 19) 4) “AIém da deformação pessoal que decorre do fato de a pessoa perder seu conjunto de identidade, existe a desfiguração pessoal que decorre de mutilações diretas e permanentes do corpo - por exemplo, marcas ou perda de membros”. (GOFFMAN, 1974, p. 29). Já houve alguma ocorrência a cerca deste fato? 5) “O esquema de interpretação da instituição total começa a atuar automaticamente logo que o internado é admitido, pois a equipe dirigente tem a noção de que a admissão é prova prima facie de que essa pessoa deve ser o tipo de indivíduo que a instituição procura tratar.” (GOFFMAN, 1974, p. 77). Como essa interpretação ocorre e por quem na instituição? 19 4.2 - Cronograma Data Cronograma 07/02/2020 Professor passou o livro base “Manicômios, Prisões e Conventos”, escrito por Erving Goffman para leitura. 14/02/2020 Na semana, começamos a procurar o livro base indicado pelo professor e já iniciamos as leituras individuais do mesmo. 21/02/2020 Leitura individual do livro indicado pelo professor. Na semana, já começamos a procura pelo local da visita. 28/02/2020 Leitura individual do livro indicado pelo professor. 06/03/2020 Leitura individual do livro indicado pelo professor e realização das perguntas do livro base. Entramos em contato com a enfermeira Quezia Vieira Marinho, responsável pelo setor de Educação Permanente do Hospital Tide Setúbal para informações sobre a visita técnica no setor de Saúde Mental. Fomos orientados a enviar a solicitação da universidade e enviarmos uma solicitação direto para ela no seu e-mail pessoal. Também foi solicitado a declaração para a visita técnica via CAA online, com previsão de retirada no dia 17/03/2020. 13/03/2020 Assistimos e debatemos os filmes e documentários “Um estranho no ninho”, “Em nome da razão” e “Goulart de Andrade em Juqueri”. Envio das perguntas para o professor. 20/03/2020 Realização das sínteses individuais do livro indicado pelo professor. 27/03/2020 Devido à pandemia do COVID-19, não conseguimos realizar a visita técnica, pois o estado de São Paulo foi submetido ao 20 distanciamento social. 03/04/2020 Realização das sínteses individuais dos filmes, documentários e do livro indicados pelo professor. 10/04/2020 Reunião para escolha e debate dos artigos científicos pelo grupo. 17/04/2020 Começamos a realizar a síntese de grupo. 24/04/2020 Reunião para discutir sobre a visão de cada sobre o livro, filmes, artigos e documentários; continuamos a realizar a síntese de grupo. 01/05/2020 Finalizamos a síntese de grupo e conclusão da equipe. 08/05/2020 Trabalho em processo de formatação nas normas ABNT. 15/05/2020 Revisão em grupo das normas ABNT e conclusão do trabalho. 22/05/2020 Entrega do relatório para o professor. 21 5. CONCLUSÃO Com o decorrer das décadas, a loucura teve definições diferentes. Pinel decidiu que o melhor tratamento seria isolar o doente e observar como o mesmo se desenvolvia em termos biológicos e sociais. Os manicômios são o resultado do uso inadequado dos ideais de Pinel. Parte da realidade dessas instituições foram mostradas nos documentários, como “Em nome da razão”, “Goulart de Andrade em Juqueri” e escancaram a precariedade vivida pelas pessoas que “viveram” ali. Os internos sofriam com falta de camas, alimentos e até itens necessários para cuidados pessoais. Grande parte das pessoas não sofria de nenhuma doença mental, só estavam ali por serem rejeitadas pela sociedade, construções sociais descabidas. A maioria dessa população rejeitada era de pessoas consideradas improdutivas, que não poderiam alimentar o sistema capitalista, como deficientes físicos e alcoólatras. Por mais que a pessoa tenha entrado sem nenhum tipo de acometimento cerebral este, por sua vez, era adquirido em virtude das constantes mortificações do eu provocadas ali. Todos os internos eram “tratados” com as mesmas medicações e eram “cuidados” por uma equipe sem especialização ou formação alguma. O sofrimento pelo qual uma pessoa que é internada nesses hospitais psiquiátricos passa é imenso e vai desde a sua entrada até a sua saída, o que não é garantia para nenhum dos internados. O indivíduo, seja qual o motivo alegado para sua internação sofre humilhações de diversos tipos durante todo seu período como interno. A maioria não recebe visita de familiares ou das pessoas próximas; daí o grande sentimento de abandono. Essas famílias, quando sabem que um de seus membros está internado, podem passar a sentir vergonha pela condição vivida pelo internado e por isso não visitam e muito menos tocam no assunto. No caso de um familiar ser responsável ou ter contribuído para a internação, a pessoa colocada em isolamento pode se sentir traída por ver que o hospital não era aquilo que prometeram ser. Acerca da liberação do interno, há grandes dúvidas por parte do mesmo. Muitos passam a pensar se serão capazes de se adaptar a vida em 22 sociedade novamente e como ele vai lidar com as dificuldades e preconceitos por ter passado por aquele tipo de “tratamento” psiquiátrico. Getúlio Vargas, em 1934, no Decreto 24.559/1934 – art.11, abriu espaço para que familiares, igrejas ou quaisquer leigos, internassem indivíduos nos hospitais psiquiátricos, ao analisar territórios religiosos, relações familiares ou o direito de ir e vir. É obvio que configura uma relação injusta entre o internado e o que interna. O manicômio é um deposito de realidades da qual a sociedade joga fora o que enxergam como “feio”. O marido que interna sua esposa, na verdade, quer estar com outra que não “nega fogo”. A prostituta está internada, porque é feio alimentar seus filhos com a única forma em que ela foi capaz de arranjar e não cabe aqui julgamentos morais. O maconheiro está internado, pois queria atenção de seu pai e a única resposta que obteve foi amão estendida de um amigo influenciador, assim como ocorreu no filme “O Bicho de Sete Cabeças”. Vasconcelos (2000), no livro “O que é Psicologia Comunitária”, enfatiza a relação da loucura como uma ameaça de extrema violência para a sociedade. Esse preconceito veio nos impedindo de adquirir sucesso na psicologia comunitária, uma vez que o louco não tem espaço na sociedade, pois é quase impossível estabelecer meios de conhecimento. A psicologia comunitária veio, exatamente para conscientizar os povos, desde as explicações sexuais básicas na SEXPOL, até o atual Psicodrama. A comunidade sem acesso a essas informações compartilha do preconceito do doente mental, pela falta de conhecimento. Infelizmente ainda hoje no Brasil, a depressão, alcoolismo e ansiedade são vistos como “frescura” e as outras diferenças como homossexualismo e o feminismo, são vistos como doenças mentais. O contexto religioso e a falta de informação transformam o próprio humano em um manicômio ambulante. A crítica e a superioridade, a falta do perdão social e o medo dessas realidades “estranhas” não nos tira o pensamento de infelizmente acreditar que, se uma nova lei manicomial existir, haverá pessoas corroborando com tais ideologias. Em defesa da luta antimanicomial é preciso ressignificar o conceito de loucura e de suma importância a inclusão de pessoas portadoras de algum tipo de doença mental. O preconceito ocorre porque a sociedade considera esses indivíduos improdutivos e gera uma ameaça à população que está “em uso pleno da razão”. A 23 partir de uma maior aceitação e compreensão, o indivíduo pode ter acesso a um tratamento de qualidade e também exercer seus direitos de cidadão. A saúde mental é indispensável para as pessoas e uma questão de cidadania. A Reforma Psiquiátrica foi o resultado de muitas lutas ao longo da história contra a forma como a loucura era concebida pela antiga psiquiatria. Por meio dela surgiu o consenso de que o ideal para o tratamento de doentes mentais seria que a equipe fosse multiprofissional. O movimento proporcional à criação de instituições voltadas para saúde mental que atendiam as pessoas da forma adequada, ou seja, sem excluí-las da sociedade, sem desaculturá-las ou profanar o seu eu de alguma forma. Como exemplo de tais instituições, temos o CAPS e os NAPS, que contribui de forma significativa para o tratamento dessas pessoas que em sociedade pode ser bem mais efetivo e produtivo. A oportunidade de mergulhar na história do processo e da luta da Reforma Psiquiátrica, deixou-nos um tanto quanto preocupados. Goffman (1974) afirma que, como atores, somos comerciantes da moralidade. Em toda sua teoria de ação social, ele mostra o quão “louco” podemos ser, na mesma dose que somos extremamente “normais”. Então, até que ponto podemos julgar a loucura alheia? Trata-se da relatividade e dos contextos que formam o sujeito. Em cenas do filme “Um Estranho no Ninho”, em específico, a história de Billy, faz-se nítida a falta de autonomia do sujeito, pois ele não se permitia uma liberdade. Sempre deveria passar a imagem de perfeição que a mãe gostaria e que a enfermeira Ratched o obrigava. Billy era um garoto normal, que se tornou gago com traumas da pressão social. Ao fazer amizade com o mais novo e rebelde integrante da Clínica Liberal (McMurphy), Billy se dá um ato de liberdade. É emocionante a nitidez da alegria e auto realização: ele já falava sem gaguejar e todos se emocionaram, não somente ele, mas como todos os outros pacientes se tornaram mais autônomos e esperançosos após a chegada de McMurphy. Infelizmente em manicômios, a felicidade dura pouco e, às vezes, nem existe: é um simples detalhe pessoal e realizador. Utilizado para ameaças, o senso de superioridade estabelecido no local é devastador, causando morte moral, morte do inconsciente (Lobotomia) e, em último caso, mas não o menos realizado, a morte física total. Billy, se sentiu acolhido e liberto de seus medos. Talvez tenha sido a sua 24 primeira relação sexual, já que a mãe não contribuía para seu desenvolvimento humano, fazendo do menino uma “criança” insegura. A moça com que Billy se relacionou, aproximou-se não apenas do seu corpo, mas foi capaz de amenizar a dor da sua alma. A enfermeira que tudo quer controlar, achou um absurdo esse ato humano. Ela como quase todos os outros manicomiais, age sem nenhum pudor ético, usando a amizade próxima que tem com a mãe de Billy para ameaçá-lo. Infelizmente, ele tira sua vida (ou tiraram dele?). Até quando ser “eu” incomoda outras pessoas? Será que ele se matou ou já vivia morto de si mesmo naquela clínica? Quantas pessoas foram internadas injustamente? No documentário “Holocausto Brasileiro” é relatado o descaso do governo com os pacientes, a falta de higiene e insumos para os cuidados diários, a falta de visita de familiares e o principal: a falta de liberdade, que nos faz questionar: O manicômio trata mesmo da cura? Como o isolamento faz parte de tratamento? O contexto em que os manicômios foram situados trouxe uma realidade entre a luta de classes e o preconceito estabelecido em nossa sociedade? Podemos afirmar que a luta Antimanicomial não termina ao ver manicômios fechados. A luta vai além de uma estrutura de concreto onde se estabelecem limites. Essa luta é atual e o nosso dever como futuros psicólogos(as) é conscientizar a sociedade, a estrutura principal e maior causadora de dor. A luta é com o homem. Um sujeito bem informado não trará malefícios para a sociedade, uma vez que passa por uma campanha pedagógica e de conscientização. Está na hora de atuarmos a favor da loucura, lutarmos não pela cura, mas pelo espaço do sujeito em sociedade, pois o social é um ato terapêutico. A importância está no entender: entender onde o indivíduo estabelece sua história, que elas deixa marcas e essas marcas quando entram de conflito com a sociedade podem ser nocivas. Mas o sujeito ainda esta lá, com sentimento, sem entender o que fez errado ou procurando formas para justificar. Ele ainda quer ser ouvido e ter chances de se recuperar. Ele quer ser humano, demasiadamente humano. 25 6. REFERÊNCIAS BRASIL. Esclarecimentos sobre as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes na Política Nacional sobre Drogas. Coordenação Nacional de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. 2019. Disponível em:<https:// www.abrasco.org.br/site/wp- content/uploads/2019/02/11_23_14_123_Nota_Te%CC%81cnica_no.11_2019_Esclarecime ntos_sobre_as_mudanc%CC A7as_da_Politica_de_Sau%CC%81de_ Mental.pdf>. Acesso em: 01 mai. 2020. ______. 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Buriti Filmes; Gullane Filmes; Dezenove Som e Imagem e Fabrica Cinema. UM estranho no ninho. Direção Milos Formam. EUA. 1976. 2h14.
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