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COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR Wagner da Silveira Assunção Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Definir e apresentar o consumo socialmente responsável. � Discutir a ética no processo de consumo. � Conceituar a sustentabilidade e a sua relação com o consumo sustentável. Introdução O consumo socialmente responsável, como o próprio nome indica, en- volve práticas responsáveis de compra e uso de produtos. Neste capítulo, você vai ver como isso pode ser uma oportunidade para as empresas. Consumo socialmente responsável O consumo socialmente responsável, como o próprio nome indica, envolve práticas de compra e uso consciente de produtos e serviços, o que indica sensatez e atenção social. Mas, para compreender melhor esse novo conceito ou esse novo modo de interação na sociedade moderna, você primeiro precisa compreender o que é o consumo. A prática do consumo acompanha a sociedade há séculos e ganha força com a revolução industrial, ou seja, é algo já incorporado ao modo de vida do ser humano. Contudo, nas últimas décadas ganhou mais força e novos estímulos, passando a ser considerado não mais uma forma de atender às necessidades básicas do ser humano, mas às suas necessidades psicológicas, sociais e de estima. E todo esse consumo desenfreado tem reflexos. Como você sabe, a Terra tem recursos naturais limitados e as sociedades são economicamente e culturalmente desiguais, o que provoca descontrole e desequilíbrio social e material. Assim, ao mesmo tempo em que o consumo aumenta, afetando os recursos naturais e levando à exploração de determinadas sociedades por pequenos grupos ou interesses individuais, a sociedade começa a discutir o consumo responsável. Hoje, muitos setores buscam se informar, refletindo e decidindo mudar hábitos de compra. Assim, há uma busca crescente por produtos que não tenham tanto impacto negativo sobre determinados grupos sociais. Nesse cenário, diversas empresas estão aderindo ao marketing das causas (ou marketing social) e ao marketing verde, entre outros tipos de marketing que têm como foco central a diminuição do impacto ambiental e/ou a desigualdade social e econômica. Quando estas duas forças, sociedade e empresas (privadas e públicas), conseguirem realmente mudar processos e procedimentos, poderá haver uma mudança capaz de reverter a atual forma agressiva e predatória de consumo. Fabi, Lourenço e Silva (2010, p. 6 apud SILVA; GOMÉZ, 2010, p. 48) indicam que o consumo consciente é “[...] o ato ou decisão de compra ou uso de serviços, de bens industriais ou naturais, praticado por um indivíduo, levando em conta o equilíbrio entre a satisfação pessoal, as possibilidades ambientais e os efeitos sociais de sua decisão”. Desse modo, surge para Vieira (2010, p. 48 apud SILVA; GOMÉZ, 2010) o envolvimento do consumidor como ator cidadão. Nesse sentido, o consumidor percebe sua responsabilidade e atua por meio do consumo socialmente responsável, tido como equivalente ao consumo consciente. Por meio da atualização e da complementação de diferentes conceitos de consumo socialmente responsável desenvolvidos ao longo do tempo e utilizando mais de 11 estudos, François Lecompte e Valette-Florence (2004 apud CAMPOS, 2010) desenvolveram uma definição de consumo socialmente responsável. Para esses autores, esse consumo consiste na compra de produtos e serviços percebidos como causadores de um impacto positivo (ou menos negativo) sobre o ambiente físico ou sobre a sociedade. Também está em jogo a utilização do poder de compra para demonstrar preocupações sociais ou ambientais. Assim, os consumidores socialmente responsáveis consideram a consequência social de seu consumo e utilizam seu poder de compra para influenciar a sociedade (FRANÇOIS LECOMPTE; VALETTE-FLORENCE, 2006 apud CAMPOS, 2010, p. 17). Segundo Fittipaldi (2012, p. 10), movida por uma nova consciência, a sociedade passa a praticar o chamado “consumo socialmente responsável”, “consumo cidadão”, “consumo ecologicamente correto” ou “consumo cons- ciente”. Além disso, passa a questionar a empresa que, por exemplo, registra altos lucros, mas agride o meio ambiente, ou não prioriza a qualidade na fa- Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade2 bricação de produto; realiza bons negócios, mas explora a mão de obra infantil ou desrespeita os funcionários; lidera transações comerciais bilionárias, mas atende mal o cliente no pós-venda, ou usa procedimentos escusos para obter vantagens (corrupção, manipulação de balanços, formação de cartéis). São atitudes incompatíveis. E o consumidor bem informado está cada vez menos disposto a aceitar tais contradições. Ética no processo de consumo Solomon (2016, p. 7) afirma que o comportamento do consumidor é, na ver- dade, um processo contínuo e não se restringe ao que ocorre no instante em que o consumidor efetua o pagamento e recebe em troca uma mercadoria ou um serviço. Como em todo processo, são previstos estágios durante o ato da compra: a pré-compra, a compra e o pós-compra (Figura 1). Esse processo se inicia com a identificação de uma necessidade, um motivo para a realização da compra, que pode ser estimulado pelo marketing e direcionado para determinada marca ou produto. Depois vem o ato da compra em si, por intermédio da aquisição. Por último, há as questões relacionadas ao pós-compra, que começam com o consumo e a satisfação gerada por ele e terminam com o descarte do produto. Figura 1. Estágios do processo de compra. Fonte: Solomon (2016, p. 7). 3Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade Esse processo de consumo é influenciado por várias decisões de marke- ting, que podem ser abordadas do ponto de vista ético/moral. Essas decisões envolvem desde a escolha da matéria-prima até a redução de custo por mão de obra infantil, o descarte consciente ou o consumo viciante, como de álcool ou cigarro. Kotler (2012, p. 687) afirma que determinadas práticas são claramente antiéticas ou ilegais, como suborno, roubo de segredos comerciais, propaganda falsa e enganosa, contratos de exclusividade e vinculação, falhas de qualidade ou segurança, garantias falsas, rotulagem imprecisa, fixação de preços ou discriminação indevida e barreiras à entrada e à concorrência predatória. Segundo Kerin et al. (2007, p. 94), a cultura também serve como uma força socializadora que dita o que é moralmente certo e justo. Isso significa que os padrões morais são relativos a determinadas sociedades. Esses padrões frequentemente refletem as leis e as regulamentações que afetam o compor- tamento social e econômico, o que pode criar dilemas morais. Por exemplo, a empresa Levi Strauss decidiu encerrar a maior parte de seus negócios na China devido ao que chamou de “abusos difundidos contra os direitos humanos”. De acordo com o seu vice-presidente de marketing corporativo, “[...] existem maravilhosas oportunidades comerciais na China. Porém, quando as questões éticas colidem com o apelo comercial, tentamos assegurar a ética como um trunfo. Para nós, as questões éticas precedem todas as demais”. (KERIN et al., 2007, p. 94). Por outro lado, o consumidor começa a escolher ou rejeitar determinadas marcas ou produtos que adotam práticas não éticas. Mas as práticas relativas à ética esbarram na cultura de países e regiões diferentes. No Brasil, por exemplo, existem regiões que acreditam na vaquejada como esporte e geram grande consumo em torno dos produtos e serviços relacionados a esse evento. Por outro lado, vários consumidores de outras regiões abominam essa prática, rejeitando as marcas apoiadoras. Assim, o próprio consenso sobre o que é ético pode variar e mascarar aquilo que realmente requer maior atenção. A economia depende do consumo para seu crescimento, e os processos empresariais podem ser éticos, baseados em uma boa relação com clientes e estimulados pelo marketing. Paraisso, é necessário respeitar a cultura, a legalidade, o meio ambiente e a sociedade, assim como lucrar com a ética comercial. Solomon (2016, p. 132) afirma que os consumidores têm uma opinião mais favorável sobre os produtos de empresas que se comportam eticamente. A ética comercial engloba regras de conduta que orientam ações no mercado; são os critérios com base nos quais a maioria das pessoas de uma cultura avalia o Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade4 que é certo e o que é errado, bom ou ruim. Esses valores universais incluem honestidade, confiabilidade, imparcialidade, respeito, justiça, integridade, consideração pelos outros, responsabilidade e lealdade. Um estudo de 2009 investigou a opinião dos chineses a respeito de marcas ocidentais. Os pesquisadores descobriram que as interpretações dependiam da perspectiva de cada um em relação à história das reações entre China e Ocidente. Foram identificados quatro diferentes narrativas (temas) em sua amostra: o Ocidente como libertador; como opressor; como subjugado; e como parceiro. Dependendo da narrativa que as pessoas endossavam, elas viam as marcas ocidentais como instrumentos de democratização, dominação, símbolo de supremacia asiática (porque determinadas marcas chinesas começam a ganhar força) ou instrumento de progresso econômico, o que ajudaria a China a desenvolver sua economia em parceria com os Estados Unidos e a Europa Ocidental. À medida que a ética de consumo global se dissemina, os rituais e as preferências pelos produtos em diferentes culturas tornam-se homogeneizados. Por exemplo, alguns habitantes urbanos da Turquia muçulmana agora celebram o Natal, apesar de o oferecimento de presentes não ser habitual, nem em aniversários, em várias partes do país. Na China, a febre do Natal está atraindo a nova classe média, como pretexto para comprar, comer e festejar. As pessoas estão adquirindo árvores de natal, ornamentos e objetos da religião cristã (embora os vendedores ambulantes que mascateiam imagens de Jesus e Maria nem sempre consigam identificar quem são). Os consumidores chineses estão aderindo ao Natal porque veem a celebração desse feriado como algo internacional e moderno, não como uma celebração cristã tradicional. O governo estimula esse costume porque aumentam os gastos com consumo. Para tornar o Natal ainda mais animado, a China exporta anualmente cerca de US$ 1 bilhão em produtos natalinos. Além disso, suas fábricas produzem US$ 7,5 bilhões em brinquedos que pessoas do mundo inteiro colocam embaixo de suas árvores de Natal. Fonte: Solomon (2016, p. 115). Consumo sustentável A Organização das Nações Unidas (ONU) estabelece que o desenvolvimento sustentável se baseia em três pilares: desenvolvimento econômico, desen- volvimento social e proteção ambiental. Essa definição demonstra como os três pilares são interdependentes: não há como pensar em sustentabilidade apoiando-se apenas em dois deles. 5Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade Segundo o Ministério do Meio Ambiente (BRASIL, 2018), a Agenda 21 Global, assinada na Rio 92, traz em seu quarto capítulo a relevância de se atentar para o consumo como causador de diferentes impactos ambientais e sociais. O consumo sustentável envolve a escolha de produtos que utilizam menos recursos naturais em sua produção, que garantem emprego decente aos que os produziram e que são facilmente reaproveitados ou reciclados. Significa comprar aquilo que é realmente necessário, estendendo a vida útil dos produtos tanto quanto possível. Você consome de maneira sustentável quando suas escolhas de compra são conscientes, responsáveis, com a compreensão de que terão consequências ambientais e sociais — positivas ou negativas. Uma mudança de comportamento leva tempo e exige maturidade do ser humano, mas é acelerada quando toda a sociedade adota novos valores. A expressão “sociedade de consumo” foi cunhada para denominar a sociedade global baseada no valor do “ter”. No entanto, o que se observa agora são os valores de sustentabilidade e justiça social fazendo parte da consciência coletiva, no mundo, e também no Brasil. Esse novo olhar sobre o que deve ser buscado por cada um promove a mudança de comportamento, o abandono de práticas nocivas de alto consumo e desperdício e a adoção de práticas conscientes de consumo. Para o Portal do Consumo Responsável, o modelo de desenvolvimento socioeconômico atual se baseia no estímulo ao consumismo. Assim, ter é mais importante do que ser. Além disso, “[...] os recursos da natureza estão à disposição dos interesses da sociedade de consumo”. Nesse sentido, se entende “[...] que esse modelo de desenvolvimento é insustentável e que a melhor maneira de transformá-lo é por meio da prática de um outro tipo de consumo, que estimule outras práticas de produção, serviços, colaboração etc.”. (PORTAL..., 2018, documento on-line). Kotler, Kartajaya e Setiawan (2010, p. 5) ainda afirmam que, em épocas de crise econômica global, o marketing 3.0 adquire relevância ainda maior para a vida dos consumidores. Afinal, eles são afetados por rápidas mudanças e turbulências nas esferas social, econômica e ambiental. Mas o futuro, segundo Kotler (2012, p. 690), reserva muitas oportunidades para as empresas. Por outro lado, as forças dos ambientes socioeconômico, cultural e natural vão impor novos limites às práticas de marketing e de negócios. As empresas capazes de inovar em soluções e valores de maneira socialmente responsável são as que têm maior probabilidade de sucesso. O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor afirma que, para se fazer uma revolução na produção e no consumo, é necessário agir em pelo menos três frentes: Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade6 � os consumidores devem mudar hábitos cotidianos de consumo; � as empresas devem oferecer informações, produtos e serviços mais sustentáveis para os consumidores; � as políticas públicas devem ser integradas e estimular padrões mais sustentáveis de produção e consumo. O consumo sustentável se confunde com o consumo consciente, priorizando o “ser” em detrimento do “ter” e considerando a origem do que se consome e seu impacto social, ambiental e econômico. No link a seguir, você pode conferir o teste de consumo consciente do Instituto Akatu (2018): https://goo.gl/NUrgjG AKATU. Teste do consumo consciente. São Paulo, 2018. Disponível em: <http://tcc.akatu. org.br/>. Acesso em: 13 mar. 2018. BRASIL. O que é consumo sustentável. Ministério do Meio Ambiente, Brasília, DF, 2018. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/produ- cao-e-consumo-sustentavel/conceitos/consumo-sustentavel>. Acesso em: 24 fev. 2018. CAMPOS, R. E. A influência dos valores pessoais no comportamento socialmente respon- sável. 2010. 94 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Administração) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010. Disponível em: <http:// www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/29670/000769549.pdf?sequence=1>. Acesso em: 24 fev. 2018. FITTIPALDI, M. Ética nas empresas: muito além de uma estratégia de comunicação e marketing. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 12, n. 138, 2012. Disponível em: <http:// 7Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade https://goo.gl/NUrgjG http://tcc.akatu/ http://org.br/ http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/produ- http://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/29670/000769549.pdf?sequence=1 eduem.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/18504/9946>. Acesso em: 24 fev. 2018. KERIN, R. A. et al. Marketing. 8. ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2007. KOTLER, P. Administração de marketing. 14. ed. São Paulo: Pearson Education, 2012. KOTLER, P.; KARTAJAYA, H.; SETIAWAN, I. Marketing 3.0: as forças que estão definindo o novo marketing centrado no ser humano. Rio de Janeiro: Campus, 2010. PORTAL DO CONSUMO RESPONSÁVEL. O que é? 2018. Disponível em: <http://consu-moresponsavel.org.br/carta-politica/>. Acesso em: 13 mar. 2018. SILVA, M. E.; GÓMEZ, C. R. P. Consumo Consciente: o papel contributivo da educação. Revista Reuna, Belo Horizonte, v. 15, n. 3, 2010. 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Acesso em: 24 fev. 2018. Consumo, responsabilidade ética e sustentabilidade8 http://eduem.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/18504/9946 http://moresponsavel.org.br/carta-politica/ http://revistas.una.br/ https://www.akatu.org.br/ http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/rio20/temas-em-discussao-na- https://idec.org/ Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. Conteúdo: Página em branco
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