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Crime consumado e crime tentado (art. 14 do Código Penal). Antes de ingressarmos nas análises da consumação e da tentativa, faz-se mister compreender o iter criminis (caminho do crime). O caminho do crime é composto pelas seguintes fases: A) Cogitação (cogitatio); B) Preparação (atos preparatórios); C) Execução (atos de execução); D) Consumação. Cogitação (fase interna): Trata-se do momento interno da infração. Só há crime na esfera psíquica, na mente do sujeito, que ainda não exteriorizou nenhum ato. Essa fase é totalmente irrelevante para o Direito Penal, uma vez que cogitationis poenam nemo patitur. Um dos elementos do fato típico é a conduta, que pressupõe exteriorização do pensamento. Enquanto a ideia criminosa não ultrapassar a esfera mental, por pior que seja, não se poderá censurar criminalmente o ato. Se uma pessoa, em momento de ira, deseja conscientemente matar seu desafeto, mas nada faz nesse sentido, acalmando-se após, para o Direito Penal a ideação será considerada irrelevante. Pode-se falar, obviamente, em reprovar o ato do ponto de vista moral ou religioso, nunca porém à luz do Direito Penal. Mesmo quando a vontade de cometer o delito é verbalizada, não se tem, como regra, ilícito penal algum, salvo se tal manifestação oral puder violar ou periclitar algum bem jurídico, como se poderia imaginar nos casos de injúria (art. 140), ameaça (art. 147) ou incitação ao crime (art. 286). Preparação (fase externa): Os atos preparatórios ou conatus remotus verificam-se quando a ideia extravasa a esfera mental e se materializa mediante condutas voltadas ao cometimento do crime. Este, portanto, sai da mente do sujeito, que começa a exteriorizar atos tendentes à sua futura execução. Nessa etapa, como regra, o Direito Penal não atua. Atos considerados meramente preparatórios não são punidos criminalmente. Exemplo: o sujeito que, pretendendo matar seu inimigo (cogitação) e possuindo porte de arma de fogo, apodera-se do instrumento bélico (preparação) e, em seguida, desloca-se até as proximidades da residência do ofendido, sendo surpreendido pela polícia antes de sacar a arma ou mesmo de encontrar-se com a vítima visada, não comete crime algum (não se aplica o Estatuto do Desarmamento, uma vez que ele possui porte de arma). Atenção: os atos preparatórios, em regra, são impuníveis. Contudo, se os atos de preparação configurarem delitos autônomos, haverá punição. Exemplos: art. 288 do CP (associação criminosa); art. 291 do CP (petrechos para falsificação de moeda); art. 5º da Lei nº 13.260/2016 (Lei antiterrorismo) etc. Execução (fase externa): A terceira etapa do iter criminis se atinge com o primeiro ato de execução (conatus proximus). Cuida-se de uma das questões mais árduas em Direito Penal estabelecer a exata fronteira entre os atos preparatórios e os executórios. Trata-se de problema de suma importância, pois, enquanto os atos preparatórios são, como regra, penalmente irrelevantes, os executórios são penalmente típicos, tanto que, se o sujeito os iniciar, será punido ainda que haja a interrupção involuntária de seu agir (dar-se-á, nesse caso, a tentativa — art. 14, II, do CP). É certo que só será possível falar em execução se estivermos diante de um ato idôneo e inequívoco tendente à consumação do crime. A dificuldade está em estabelecer precisamente qual é esse ato. A doutrina apresenta alguns critérios: Critério material: a execução se inicia quando a conduta do sujeito passa a colocar em risco o bem jurídico tutelado pelo delito (Hungria); Critério formal-objetivo: só há início de execução se o agente praticou alguma conduta que se amolda ao verbo núcleo do tipo. Nenhum dos critérios se mostra totalmente satisfatório. O primeiro, por ser demasiado amplo, e o segundo, excessivamente restrito. Consumação (fase externa): Há consumação (ou summatum opus), de acordo com o Código Penal, quando se fazem presentes todos os elementos da definição legal do delito (art. 14, I). Em outras palavras: total subsunção da conduta do sujeito com o modelo legal abstrato. Pode-se dizer, ainda, que essa fase final do iter criminis é atingida com a produção da lesão ao bem jurídico protegido. Igualmente importante é definir a linha divisória da consumação. Esse momento é fundamental para determinar a quantidade da pena imposta, o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva (art. 111, I, do CP) e o foro competente para o processo e julgamento da infração (art. 70 do CPP). Crime consumado: o momento da consumação varia conforme a natureza do crime, vejamos: Crimes materiais ou de resultado: consumam-se com a ocorrência do resultado naturalístico ou material (isto é, modificação no mundo exterior provocada pela conduta); Crimes de mera conduta: consumam-se com a ação ou omissão prevista e punida na norma penal incriminadora. Nesses delitos, o tipo penal não faz alusão a nenhum resultado naturalístico. Dessa forma, basta a conduta, positiva ou negativa, para que haja consumação; Crimes formais ou de consumação antecipada: apesar da alusão ao resultado naturalístico no tipo penal, não exigem, para fins de consumação, que ele ocorra, de tal modo que, praticada a conduta prevista em lei, o delito estará consumado; Crimes permanentes: têm a característica de a fase consumativa prolongar-se no tempo. Isso tem relevância jurídica não só na competência territorial (art. 71 do CPP) e no termo inicial do prazo prescricional (art. 111, III, do CP), como também na prisão em flagrante (art. 303 do CPP); Crimes culposos: assim como os crimes materiais, apenas estarão consumados com a ocorrência do resultado naturalístico; Crimes omissivos: Próprios: por serem infrações penais de mera conduta, basta a inatividade do agente para que haja consumação, sendo prescindível que à omissão se associe a ocorrência de algum resultado; Impróprios: sempre são materiais ou de resultado, de modo que só estarão consumados com a superveniência deste; Crimes qualificados pelo resultado: consumam-se com a ocorrência do resultado agravador; Crimes habituais: em face da exigência típica de reiteração de atos, só se consumam se o sujeito os pratica repetidas vezes. Uma só conduta, isoladamente, constitui fato atípico. CRIME TENTADO (ART. 14, II, DO CP) A tentativa (ou conatus) constitui a realização imperfeita do tipo penal. Dá-se quando o agente põe em prática o plano delitivo engendrado e, iniciando os atos executórios, vê frustrado seu objetivo de consumar o crime por motivos independentes de sua vontade. O Código Penal define-a no art. 14, II, quando diz que o crime se considera tentado quando, iniciada sua execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Desdobrando o Texto Legal em requisitos, encontram-se os seguintes: início de execução; não consumação; por circunstâncias alheias à vontade do agente. Sob a ótica da tipicidade, o art. 14, II, do CP, ao definir os elementos do crime tentado, constitui uma norma de adequação típica por subordinação mediata ou indireta, uma verdadeira extensão temporal da figura típica, que propicia alcançar condutas temporalmente anteriores ao momento consumativo. Obs.: a tentativa é uma causa de diminuição obrigatória, que será levada em consideração na terceira fase de dosimetria (aplicação da pena), provocando uma redução da sanção imposta, de um a dois terços. Punibilidade da tentativa De acordo com o Estatuto Penal: “salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços” (art. 14, parágrafo único). A lei prevê um decréscimo em limites variáveis, cumprindo ao juiz, na dosagem da reprimenda, considerar a proximidade da consumação como critério para estabelecer a fração pertinente. Logo, a redução da pena deve ser inversamente proporcional à distância da consumação.Espécies de tentativa (iter criminis percorrido): Perfeita (crime falho ou tentativa acabada): o agente percorre todo o iter criminis que estava à sua disposição, mas, ainda assim, por circunstâncias alheias à sua vontade, não consuma o crime. Ex.: o sujeito descarrega a arma na vítima, que sobrevive e é socorrida a tempo por terceiros. Apesar de ter esgotado a fase executória, não alcança o resultado por circunstâncias alheias à sua vontade; Tentativa imperfeita (tentativa inacabada): o agente é impedido de prosseguir na execução no seu intento, deixando de praticar todos os atos executórios à sua disposição. Neste caso, o sujeito ativo não logra executar todos os atos que pretendia; a execução é interrompida antes de ser esgotada. Ex.: o sujeito, munindo com seis projéteis a arma escolhida para matar seu desafeto, é impedido, por populares, de efetuar o segundo disparo, evitando a morte da vítima. Tentativa branca (incruenta): quando o objeto material não é atingido (o bem jurídico não chega a ser lesionado); Tentativa vermelha (cruenta): o oposto da tentativa branca, ou seja, o objeto material é atingido. Tentativa abandonada ou qualificada: nome dado por alguns doutrinadores à desistência voluntária e ao arrependimento eficaz (CP, art. 15). Tentativa inadequada ou inidônea: corresponde ao crime impossível (CP, art. 17).
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