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Preconceito e discriminação a base da violência sexual contra a mulher

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1
PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO: A BASE DA VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA A MULHER
Débora Ramos Portela – Orientadora: Taiana Lavinne
1.0 INTRODUÇÃO
 
As mulheres invadiram as universidades e conquistaram cargos de chefia. As mulheres saíram nas ruas em busca de igualdade profissional e travaram uma luta contra o preconceito e a discriminação social. Atualmente, o mercado de trabalho conta com a ascensão cada vez maior da população feminina e apesar da jornada não ter sido fácil, algumas barreiras foram rompidas. "Sabemos que hoje, comparado com o início da década de 70, há muitas conquistas do feminismo, acompanhadas pelo trabalho do Direitos Humanos. Mas não pode haver ilusão de que o caminho está vencido. Cada avanço conquistado mostra que alguma coisa deve ser melhorada. 
Os números da atualidade paulista revelam mesmo que a batalha das mulheres tem muitos obstáculos a vencer. Segundo o estudo realizado pelo serviço de apoio às vítimas de violência da cidade de São Paulo a maioria das denúncias é das mulheres (58,9%) e dentre elas, 25,33% são estudantes e 23,01% possuem entre 0 e 10 anos.
"A violência é uma das formas mais perversas de discriminação contra a mulher. No Brasil, pesquisas revelam que este tipo de ação violenta compromete 10,5% do Produto Interno Brasileiro (PIB), com gastos de saúde e faltas no trabalho. E grande parte dos crimes acontece no próprio ambiente familiar, o que intimida as denúncias e atrapalha a punição", afirma a psicóloga Tânia Regina Côrrea.
 Outro dado que aponta desvantagem da mulher em relação ao homem está no mercado de trabalho. De acordo com último balanço divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), ainda que o sexo feminino represente 40,3% da população economicamente ativa (PEA), cerca de 31% delas recebem salários inferiores ao dos homens, embora tenham nível de escolaridade igual ou superior.
A valorização do trabalho feminino, a igualdade aos privilégios e gratificações dos empregos dos homens e o fim da violência física e moral são os três principais objetivos das entidades feministas que defendem as mulheres contemporâneas.
O movimento feminista e a revolução sexual, de fato, provocaram grandes transformações no mundo moderno no que se refere aos direitos e deveres das mulheres, conseguindo dar um grande salto na condição feminina nos três últimos séculos, seja no âmbito público, seja no privado. Corroborando nosso pensamento, Birman (2001) vai afirmar que, do direito de votar ao de poderem ser educadas, o percurso das mulheres foi marcado por um longo debate, com progressos e retrocessos. A década de 60, diz o autor, e as consequentes revoluções sociais e sexuais dela resultantes foram o divisor de águas de um longo processo de mudança cujos 6desdobramentos e consequências nos registros psicológicos, éticos e políticos ainda não temos condições de prever.
É o que podemos observar no tocante às identidades masculinas, femininas, homossexuais e heterossexuais, sem se reduzir meramente a estas, dada a multiplicidade das tipologias sexuais hoje vigentes.
2.0 PRECONCEITO E DISCRIMINAÇÃO CONTRA A MULHER
Durante anos, nossa sociedade construiu, em torno de si e no senso comum, um estereótipo relacionado ao sexo feminino, primeiro passo para a construção das bases do preconceito e da discriminação.
O estereótipo, na acepção de Marilena Chauí (1996/1997), vai referir-se, por um lado, a um "conjunto de crenças, valores, saberes, atitudes que julgamos naturais, transmitidos de geração em geração sem questionamentos, e nos dá a possibilidade de avaliar e julgar positiva ou negativamente 'coisas e seres humanos" (p. 116). Por outro lado, para a autora, o senso comum é a crença jamais questionada de que a realidade objetiva e subjetiva do mundo existe tal como nos é dada, cristalizando as ideias acerca do mundo, dos sujeitos e das ideias construídas histórica e socialmente ao longo do tempo.
Por muito tempo, a cristalização de muitos dos conceitos de que o direito deveria estar a serviço dos homens, denominados os mais fortes, serviram para construir falsas ideias e moldar muitos dos preconceitos contra o sexo feminino. Vale lembrar que as próprias mulheres participaram inequivocamente desses ideários construídos, ao longo dos últimos três ou quatro séculos.
Os estereótipos, os preconceitos e a discriminação contra as mulheres precisam ser analisados, estudados, pensados, repensados, proibidos, vigiados e punidos sob todas as formas, não obstante a diversidade multicultural em que vivemos até mesmo dentro de um mesmo país, e, acima de tudo, deve ser analisado o sentido irracional de se pensar que um ser humano possa ser humilhado e desprezado por razões de identidade de gênero. A esse sentimento de desconsideração e desmerecimento do outro ou da concepção de que esse outro, por algum motivo, possa ser alguém de menor valor e possuir menos direitos que chamamos de preconceito. Vejamos, então, como alguns autores o definem.
O preconceito pode ser encontrado nos mais diversos setores da sociedade. Assim, pode ter origem nos mais diversos modos, pode escolher suas vítimas e agir de modo violento e irracional sem que ao menos possamos nos dar conta.
A violência e a agressão contra mulheres, negros e homossexuais, até bem pouco tempo, eram práticas consideradas tão comuns que passavam despercebidas como formas de violência em nossa sociedade, onde os grupos oprimidos escondiam o seu sofrimento sem poder sequer denunciá-lo ou compreendê-lo. As mudanças de consciência na sociedade, se é que de fato existem – dado o contingente de crimes cometidos contra esses atores sociais nos últimos anos – traduzem uma nova interpretação da realidade ora vigente.
E não foi por menos que muitos movimentos de minoria se formaram e se organizaram para reivindicarem seus direitos aos governantes. O problema do preconceito e da discriminação contra a mulher se torna, portanto, um problema de inclusão e de exclusão de indivíduos em uma dada sociedade. Os que não podem participar da grande maioria são colocados à margem, e, por isso mesmo, devem lá ficar e sofrer as consequências que lhes são impostas pela chamada maioria (nesse caso, masculina).
Cabe lembrar que a inclusão social foi neutralizada pelo valor negativo atribuído pela condição da diferença de cor, raça, sexo e classe, entre tantas outras diferenças, e marcou a sociedade brasileira durante séculos, o que resultou em uma sociedade hierarquizada, onde os vários segmentos das sociedades de massa não têm acesso nem a direitos nem a deveres como a grande maioria dos incluídos (Bandeira & Batista, 2002) (não seria melhor denominá-los grande minoria?). Ora, somos regidos por um sistema de classes em que a maior parte da concentração de riquezas se encontra nas mãos de uma parcela muito pequena da população; porém, parece ser exatamente em prol dessa pequena grande maioria que as leis têm se voltado, ou seja, para dar, exatamente aos mais favorecidos, mais direitos e privilégios do que à grande minoria, portanto, à classe dos excluídos.
Percebemos que algumas dessas formas de violência estão encarnadas na conformação do próprio caráter do indivíduo, moldando formas de agir, pensar e sentir, comportar e lidar com o sujeito que está à nossa volta. Esses modelos de violência serão traduzidos em comportamentos de preconceito para com o nosso semelhante, construindo, assim, o pilar de toda discriminação e violência contra o sujeito contemporâneo. Não obstante essas formas particulares de ensejar o caráter e o comportamento do sujeito, o preconceito carrega em si mesmo sua própria etimologia A discriminação ocorre justamente quando essa atitude ou esse ato-pensamento cria uma distinção entre os outros ou sobre os outros; gera, então, um tratamento diferencial e, em consequência, um preconceito.
Assim temos alguns tipos de preconceito que são tão rigidamente criados e difundidos nas sociedades de massa que começam a fazer parte da cultura de um povo através de estereótipos. A crença de que negro não é gente, negronão presta, índio é vagabundo, todo homossexual é efeminado e toda mulher loira é burra são exemplos disseminados em nossa cultura e estão tão enraizados no nosso imaginário que passam desapercebidos nas formas mais sutis de nosso discurso, de forma velada ou explícita. O preconceito também pode estar vinculado à inclusão de um indivíduo em uma categoria, perfilando, assim, uma identidade grupal hegemônica a partir da atribuição de um conjunto de características negativas, fixas e imutáveis ao grupo. Assim, quanto mais um indivíduo se identifica com as características desse grupo, mais passa a fazer parte dele, vindo a sofrer as consequências pela sua inclusão no grupo discriminado.
Não obstante, para Marilena Chauí, o preconceito possui quatro marcas significativas. A primeira delas é a familiaridade, ou seja, o preconceito exige que tudo seja familiar, próximo, compreensível e imediatamente transparente. Nesse caso, ele é inteiramente penetrado por nossas opiniões e indubitavelmente não tolera o complexo, o opaco, o ainda não compreendido. Nesse caso, o preconceito é julgado único, extraordinário, e está inserido no quadro de ideias e juízos preconcebidos, encarregados de dar sentido ao mundo visto, mas nunca dito ou pensado. Um exemplo disso está no preconceito contra aquilo que nunca foi visto antes; para muitos, a forma como a mídia tem transmitido a imagem dos palestinos, principalmente dos mulçumanos, tem provocado em muitos americanos o ódio irracional, disseminando o preconceito contra eles.
A segunda marca do preconceito, segundo Marilena Chauí, exprime sentimentos de medo, angústia, insegurança e conjura (ou esconjura) diante do desconhecido, transformando tais sentimentos em ideias certas sobre as coisas, os fatos e as pessoas, criando assim, estereótipos, isto é, modelos gerais de coisas, fatos e pessoas por meios dos quais se julga tudo quanto ainda não se havia visto. As ideias sobre 	o negro, o índio, a mulher loira e o homossexual, comentados anteriormente, servem de exemplo para a construção dos estereótipos.
A terceira marca é admirar o que não se compreende e, portanto, a propensão a reduzir o desconhecido ao já conhecido e indubitável, ou seja, o preconceito é um obstáculo ao conhecimento e à transformação, é conservador e ignorante. Não é à toa que muitos dos preconceitos perpetrados contra a mulher demoraram a ser derrubados e têm resquícios nos seus primórdios, como, por exemplo, a diferença nos salários das mulheres que compartilham empregos semelhantes aos dos homens ou a na identificação da sexualidade do gênero feminino.
E, por fim, o preconceito é intrinsecamente contraditório, ou seja, ama o velho e deseja o novo, confia nas aparências, mas teme que tudo o que reluz não seja ouro; teme a sexualidade, mas deseja a pornografia, afirma a igualdade entre os humanos, mas, é racista e sexista. Segundo Marilena Chauí, o preconceito se julga senhor de uma realidade transparente que, na verdade, é opaca e oculta medos e angústias, dúvidas e incertezas.
3.0 COMO ENTENDER A VIOLÊNCIA DE GÊNERO
Do ponto de vista, não compreendemos a violência contra as mulheres apenas como um ou vários atos sistematizados de agressão contra o seu corpo, seja da ordem do abuso sexual, seja do espancamento, da tortura física ou psicológica. No nosso entender, a violência que a mulher sofre está no seu dia a dia, incorporada e enraizada no imaginário social coletivo da nossa sociedade, de homens, mas também de mulheres, que legitimam a subordinação do sujeito feminino ao domínio do poder masculino. A violência contra as mulheres está velada no mascaramento e na subordinação da nossa linguagem cotidiana, no uso de expressões e de diversos jogos de linguagem, nas palavras de duplo sentido, na criação de referenciais para dar conta de uma realidade que não é a mais condizente com o seu papel na sociedade, também na criação de estereótipos que moldam formas singulares de preconceito e discriminação através de personagens da vida cotidiana, tais como a doméstica, a dona de casa, a professorinha, a mãe e a garota de programa estilo exportação, entre tantos outros tipos, cuja imagem se transformou em um objeto tão vendável quanto qualquer outro produto de consumo, com o corpo explorado através da mídia, além de servir às leis imperativas do comércio e do turismo sexual.
Quando um grupo social legitima papéis que não necessariamente condizem com a realidade desses mesmos atores sociais, cria um sistema de crenças que será disseminado no imaginário social coletivo. Esse sistema de crenças vai legitimar, por sua vez, a violência física ou sexual (também poderia legitimar qualquer outra), estabelecendo como norma a condição do homem como herdeiro único do sistema patriarcalista, machista e viril bem como do capitalismo selvagem do qual fazemos parte.
Assim, de acordo com as nossas proposições, a violência de gênero pode ser entendida como uma decantação do preconceito, da discriminação e do sentimento de intolerância pelos quais as mulheres vêm passando nos últimos dois séculos.
No Brasil, os reflexos desse tipo de violência se encontram em toda a parte. Militantes dos direitos humanos, cientistas políticos e sociais têm trabalhado constantemente na investigação, na denúncia e na publicação dos altos índices de violência cometidas contra as mulheres pelos homens, tais como os crimes cometidos pela classe média e classe alta que mobilizaram a imprensa, mostrando a necessidade de se punir e erradicar a violência contra as mulheres nos primeiros anos da década de 70.
4.0 VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
Segundo Soraya Rodrigues de Aragão, a violência contra a mulher não se trata apenas de um problema social e jurídico, mas também de saúde pública em que agressões sobrepostas e acumuladas, dependendo de sua gravidade e continuidade, podem ocasionar distúrbios mentais, afetivo-emocionais, problemas de incapacidade física, muitas vezes com danos irreversíveis. A violência contra a mulher, embora seja frequente, não é algo novo, podendo ocorrer em qualquer camada social, independente de condição socioeconômica e/ou grau de instrução. No entanto, este tipo de violência muitas vezes por ser corriqueiro, passa despercebido, banalizado ou normatizado, e consequentemente velado, invisível. Na realidade, qualquer tipo de violência, seja de que tipo for, trata-se de violação da dignidade, da ética e do respeito aos Direitos Humanos dos cidadãos.
Além disto, a violência contra a mulher não se trata apenas de um problema social e jurídico, mas também de saúde pública em que agressões sobrepostas e acumuladas, dependendo de sua gravidade e continuidade, podem ocasionar distúrbios mentais, afetivo-emocionais, problemas de incapacidade física, muitas vezes com danos irreversíveis. Embora a violência de gênero possa ser executada por ambos os sexos, os homens são predominantemente os agressores (em 80% dos casos).
Mesmo assim, com toda a problemática desvelada e evidente aos olhos públicos, as mulheres normalmente são tidas como culpadas pela violência praticada contra elas mesmas, sendo algo inadmissível. Neste estereótipo, são elas que não apresentam comportamento adequado, que não correspondem às expectativas criadas pela sociedade patriarcal e nem aos papéis de conduta que lhes foram impostos. São elas que muitas vezes não se submetem aos desejos, caprichos e ordens que lhes foram e continuam sendo determinados, e por este motivo são classificadas como rebeldes, precisando de dominação e correção, merecendo “justa punição”, ou pior, puro descaso.
Há mulheres que se sentem inadequadas e com sentimento de culpa por não corresponder a estas expectativas da masculinidade hegemônica, sofrendo consequentemente uma marginalização não somente social, mas por compactuar da crença de que elas próprias estariam infringindo regras e padrões sociais por não corresponder aos papéis pré-fabricados para elas e por elas tantas vezes pouco questionados- perpetuando a violência e tornando-a transgeracional. Faz-se necessário quebrar paradigmas, desconstruirpreconceitos e proceder à construção de novos valores mais humanos e salutares. E para este fim, proceder a uma percepção mais criteriosa destas construções do “ser mulher”, estruturadas sócio historicamente através da sociedade patriarcal é o primeiro passo para a sensibilização e percepção mais acurada do lugar que a mulher ocupa e compartilha, seja no espaço social que na vida privada.
Vale à pena salientar que normalmente a violência física pode estar sobreposta a outros tipos de violência, como a psicológica, a sexual, patrimonial, moral, entre outras.
Em anos recentes, esse reconhecimento foi acompanhado por mudanças na forma como devemos responder a essa violência, atacando não as justificativas, mas as causas. O país tornou-se referência internacional com a Lei 11.340/2006 – a Lei Maria da Penha, cujo diferencial é a forma de abordar o problema, propondo a criminalização e a aplicação de penas para os agressores, mas também medidas que são dirigidas às mulheres para a proteção de sua integridade física e de seus direitos, além das medidas de prevenção destinadas a modificar as relações entre homens e mulheres na sociedade, campo no qual a educação desempenha papel estratégico. Apesar de tudo, o Brasil segue sendo um país violento para as mulheres. Anualmente são registradas centenas de ocorrências de violência doméstica, de violência sexual, além das elevadas taxas de homicídios de mulheres que, quando motivadas pelas razões de gênero, são tipificadas como feminicídios. Esses números expressam apenas uma parte do problema e comumente dizemos que a subnotificação é uma característica dessas situações. O medo, a dúvida, a vergonha são algumas das explicações para esse silêncio, mas novamente nos contentamos em olhar para justificativas e não para as causas. E se queremos mesmo mudar essa realidade, é preciso encarar que a desigualdade de gênero é estrutural das nossas instituições também, e se apresenta como um obstáculo a ser transposto se queremos tornar o direito formal em direito de fato, universal e acessível a todas as mulheres. A aplicação da Lei Maria da Penha é um exemplo, mas não é o único. De modo geral, mudamos leis, mas não a forma como as instituições funcionam. O sistema de Justiça segue atuando de forma seletiva e distribuindo de forma desigual o acesso à Justiça. Existem poucos serviços especializados para atender as mulheres em situação de violência. Faltam protocolos que orientem o atendimento. Falta capacitação para os profissionais cuja atuação é muitas vezes balizada por convicções pessoais e julgamentos de valor que nada tem a ver com os direitos humanos. Cresce um entendimento que dissocia a importância de ensinar gênero e sexualidade nas escolas das políticas de prevenção da violência. Texto de Wânia Pasinato é socióloga, especialista em gênero e políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres. Atualmente é assessora no Escritório USP Mulheres, da Universidade de São Paulo
5.0 VIOLÊNCIA SEXUAL CONTRA A MULHER
“A violência sexual é a mais cruel forma de violência depois do homicídio, porque é a apropriação do corpo da mulher – isto é, alguém está se apropriando e violentando o que de mais íntimo lhe pertence. Muitas vezes, a mulher que sofre esta violência tem vergonha, medo, tem profunda dificuldade de falar, denunciar, pedir ajuda.”
Aparecida Gonçalves, secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República.
De acordo com a OMS, violência sexual é “qualquer ato sexual ou tentativa de obter ato sexual, investidas ou comentários sexuais indesejáveis, ou tráfico ou qualquer outra forma, contra a sexualidade de uma pessoa usando coerção”. Pode ser praticada, segundo o organismo, por qualquer pessoa, independentemente da relação com a vítima, e em qualquer cenário, incluindo a casa e o trabalho.
5.1 No Código Penal brasileiro 
No Brasil, estupro é constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso – conforme definido no capítulo sobre os crimes contra a liberdade sexual do Código Penal, após as alterações promovidas em 2009 com a Lei nº 12.015.
5.2 Violência sexual na Lei Maria da Penha
A Lei Maria da Penha, por sua vez, descreve em seu artigo 7, alínea III, a violência sexual cometida em contexto de violência doméstica e familiar – ou seja, cometida por alguém da rede social da vítima e não por desconhecidos:
· Qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força;
· Que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade,
· Que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação;
· Ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos.
Em complemento ao Código Penal, a descrição na Lei Maria da Penha auxilia a evidenciar as diversas formas de violência sexual, que vão muito além do estupro. Isso é importante já que, segundo especialistas, estereótipos relacionados aos papéis sexuais, e exercidos desigualmente por homens e mulheres, ainda fazem, muitas vezes, uma violência desta gravidade não ser reconhecida.
5.3 Violência sexual no Brasil
“A violência sexual é um fenômeno universal, em que não existem restrições de sexo, idade, etnia ou classe social. Embora atinja homens e mulheres, as mulheres são as principais vítimas, em qualquer período de suas vidas. E as mulheres jovens e adolescentes apresentam risco mais elevado de sofrer esse tipo de agressão”.
Violência sexual: estudo descritivo sobre as vítimas e o atendimento em um serviço universitário de referência no Estado de São Paulo, por Cláudia de Oliveira Facuri et al. (Caderno de Saúde Pública, maio/2013).
Segundo o 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2015), em 2014, foram registrados 47.643 casos de estupro em todo o país. O dado representa um estupro a cada 11 minutos.
É importante lembrar que, além da conjunção carnal, desde 2009, com a alteração no Código Penal, atos libidinosos e atentados violentos ao pudor também passaram a configurar crime de estupro.
6.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo Sérgio Gomes Da Silva, não é incomum, encontrarmos, nos dias atuais, grande preocupação por parte da sociedade com a constituição de identidades masculinas e femininas e com a problemática do sexo e do gênero. É interessante indagar, porém, como essas identidades podem se situar no mundo contemporâneo sem grandes conflitos identidários e sem grandes sofrimentos psíquicos por pertencer a essa ou a aquela identidade de gênero ou de sexo. O que podemos observar, ao longo dos últimos anos, é que minorias sexuais ou de gênero têm sofrido mais do que aqueles que pertencem à grande parcela dos incluídos no mesmo mundo patriarcalista, machista, capitalista, neoliberal e globalizado, cujo indivíduo se encerra cada vez mais em si mesmo, mantendo um culto ao individualismo e não encontrando outra saída a não ser infringir nos mais fracos o seu poder, mantido a ferro e a fogo ao longo da História.
Vítimas durante um longo período histórico, o que restava às mulheres senão lutarem pelos seus direitos, colocando a questão de gênero frente às suas reivindicações como minoria social? Foi a partir das reivindicações do movimento feminista e da própria sociedade civil, do direito ao voto, das garantias trabalhistas, da denúncia da opressão e da estrutura de classes, primando pela igualdade de direitos entre homens e mulheres, que governos de todo o mundo se reuniram, discutiram, avaliaram, analisaram os questionamentos e estabeleceram mecanismos internacionais em defesa dos direitos da mulher.
A busca por um ideal de solidariedade humana, a luta contra as discriminações e os preconceitos muito bem arraigados em nossa cultura e, principalmente,o desejo de uma sociedade mais tolerante, mais justa, menos violenta e eticamente possível é a crença absoluta de uma sociedade e de um grupo de pessoas que acreditam que vale a pena lutar por algumas utopias, pois elas se tornam ainda necessárias em um mundo onde o diferente nos é tão insuportavelmente estranho que passa a valer menos em relação a direitos ou deveres. A criação, portanto, de uma sociedade mais tolerante é também a criação de uma sociedade mais ética ao admitirmos ou reconhecermos o outro como se fosse um de nós, ou seja, ao passarmos a tolerar mais aquele que nos é semelhante.
Compreendemos, pois, que a luta pelos direitos humanos e contra a violência, o preconceito e a discriminação, não só contra as mulheres, mas contra todos aqueles que são vítimas, deve ser encarado como um mal a ser combatido, vigiado, punido e disciplinado.
É na crença de mudanças sociais, no engajamento ou não da militância dos direitos humanos por grupos sociais concebidos como minorias (negros, mulheres, trabalhadores rurais, sem-terra, sem teto, homossexuais, crianças, idosos, etc.), na possibilidade de ensinar os outros a tratar o nosso semelhante como um de nós, portanto, engajado na perspectiva da educação como mudança de atitude, de comportamento e de ideais de vida, é que poderemos criar uma sociedade mais justa, mais igualitária e eticamente possível. Pensar na igualdade que une os sujeitos pode não ser uma tarefa fácil, mas acreditamos ser esse um trabalho possível, na conquista e na primazia dos direitos humanos para as próximas décadas. 
 
7.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Chauí, M. (1996/1997). Senso comum e transparência. In J. Lerner (Org.), O preconceito (pp. 115-132). São Paulo: Imprensa Oficial do Estado.         [ Links ]
https://www.abraji.org.br/noticias/mulheres-ainda-sofrem-discriminacao-social
http://obviousmag.org/transmutacao_psicologica_do_ser_e_alquimia_da_vida/2017/11/violencia-contra-a-mulher-causas-consequencias-e-servicos-de-ajuda.html#ixzz6GQV9AG6y
https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2018/02/violencia-contra-mulher-wania-pasinato.html
https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/violencias/violencia-sexual/

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