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UNIVERSIDADE FEEVALE Júlia Pinheiro da Silva Matrícula: 0265068 DOLO EVENTUAL X CULPA CONSCIENTE Professor Lisandro Luis Wottrich Teoria do Delito Novo Hamburgo (RS), 08 de Maio de 2020. 1. Introdução Através deste trabalho, busco conduzir a expressa classificação do crime de duas formas, culposo ou doloso de acordo com a conduta do agente, realizar um estudo entre dolo eventual e culpa consciente buscando por fim sanar a dúvida entre um e outro. O fato é que existe uma real distinção entre ambos, são dois institutos do Direito Penal parecidos e com efeitos práticos diferentes, sendo necessários analisarmos todas as diligencias possíveis em alguns aspectos ou características que para o Direito Penal é de primordial importância, uma vez que a condenação ou absolvição pode depender, em certos casos, de pequenos detalhes. Conforme versa Nussi (2019, p. 211): “Essa distinção é tecida pela doutrina, pois a lei penal não a indica em nenhum dispositivo. A criação doutrinária, com reflexo na jurisprudência, traz a grave falha de gerar insegurança no campo penal. Em sã consciência, distinguir entre culpa consciente e dolo eventual é uma tarefa de pura adivinhação. Na maioria dos casos, inexistem provas certas do que se passa na mente do agente, no momento de sua conduta. O que será que ele disse para si mesmo? Esperava que não acontecesse ou lhe era completamente indiferente? Haver-se-ia de buscar a confissão do sujeito, admitindo que assumiu o risco do segundo resultado. Mas ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Restam outras provas, como as testemunhais, difíceis de alcançar nesse cenário”. 2. Culpa Consciente Culpa consciente é aquela em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta, acreditando sinceramente, que este resultado não venha a ocorrer, não é assumido ou aceito pelo agente, que cofia na sua não-ocorrência. O resultado é claramente previsto pelo agente, que espera “inocentemente” que não ocorresse ou que poderia evitá-lo. Segundo Bitencourt, “dolo seria a conduta consciente voltada a realizar o tipo objetivo, orientado pelo conhecimento de suas elementares no caso concreto” (2012, p. 426). No mesmo sentido é o entendimento de Brandão que afirma que o dolo é: “a consequência e vontade da realização dos elementos objetivos do tipo” (2010, p.173). Para a doutrina, o dolo é composto de dois elementos, o cognitivo e o volitivo. Sendo o primeiro a consciência de que a prática de determinado ato vai de encontro a um tipo descrito na norma. Enquanto que o segundo elemento diz respeito a vontade de realizar tal conduta, razão pela qual, resta claro que um não subsiste sem o outro (Bitencourt, p. 426). Alerta Bitencourt para o fato de que: a consciência do dolo abrange somente a representação dos elementos integradores do tipo penal, ficando fora dela a consciência da ilicitude, que hoje, como elemento normativo, está deslocada para o interior da culpabilidade (p. 427). Segundo Bitencourt (2019, p. 394) “Há culpa consciente, também chamada culpa com previsão, quando o agente conhece a perigosidade da sua conduta, representa a produção do resultado típico como possível (previsibilidade), mas age deixando de observar a diligência a que estava obrigado, porque confia convictamente que ele não ocorrerá”. E de acordo com Brandão: no dolo a consciência refere-se a percepção dos elementos objetivos do tipo... além disso, a consciência também deve abranger o curso casual da conduta, que conduz até percepção do resultado (p.177). 3. Dolo Eventual Ocorre quando o agente age ou deixa de agir, conhece do risco de produzir um resultado danoso a um bem jurídico penalmente tutelado através de sua conduta e se conforma caso este venha a acontecer. O dolo eventual não se consubstancia apenas em o agente, conhecendo do risco, não se abstém de agir, pois isso pode configurar culpa consciente. Não basta, pois, apenas o agir quando não deveria, pois isso caracteriza a imprudência, é imprescindível o conformismo sobre a possibilidade da ocorrência do resultado danoso. No art. 18, I do Código Penal denomina crime doloso, na modalidade eventual, como sendo: “Diz-se o crime: I – doloso, quando o agente assumiu o risco de produzi-lo”. (BRASIL, 1940). Nucci (2010, p. 205), por sua vez, conceitua o dolo eventual como sendo “a vontade do agente dirigida a um resultado determinado, porém vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não desejado, mas admitido, unido ao primeiro”. Segundo Bitencourt (p.174) “Adote-se a teoria do consentimento, que afirma haver dolo sempre que o agente representar mentalmente o resultado e consentir com a sua ocorrência, assumindo o risco de reproduzi-lo”. Conforme Bitencourt (2019, p. 397): “Na hipótese de dolo eventual, a importância negativa da previsão do resultado é, para o agente, menos importante do que o valor positivo que atribui à prática da ação. Por isso, entre desistir da ação ou praticá-la, mesmo correndo o risco da produção do resultado, opta pela segunda alternativa valorando sobremodo sua conduta, e menosprezando o resultado”. 4. Diferenciação Em razão de suas similaridades, o dolo eventual e a culpa consciente são compreendidos apenas no pensamento do agente, em sua consciência e interpretação dos possíveis resultados decorrentes de sua conduta, o que torna a separação e identificação dos dois institutos difíceis de serem realizadas na prática. O dolo eventual, ao contrário do dolo direto, não possui esse caráter acentuado de volição na causação do resultado danoso, mas, sim, de maneira menos acentuada, anui (concorda) com a sua realização, ante o desejo de execução de um fim alheio ou não ao crime. Já na culpa consciente, o violador da norma penal não deseja a busca de um delito, pelo contrário, até a repulsa, mas, por uma imprudência, negligência ou, imperícia, acaba-o causando. Sendo assim, pode-se dizer, em termos conceituais que a culpa consciente é caracterizada pela previsão de um resultado ser passível de acontecimento (previsibilidade objetiva), mas, apesar de acreditar seriamente que tal fato não se concretizará, o agente falha (por uma imprudência ou negligência) em sua conduta, violando o dever de cuidado. Conforme Bitencourt (2012, p. 377): “Duas teorias, fundamentalmente, procuram distinguir dolo eventual e culpa consciente: teoria da probabilidade e teoria da vontade ou do consentimento. Para a primeira, diante da dificuldade de demonstrar o elemento volitivo, o querer o resultado, admite a existência do dolo eventual quando o agente representa o resultado como de muito provável execução e, apesar disso, atua, admitindo a sua produção. No entanto, se a produção do resultado for menos provável, isto é, pouco provável, haverá culpa consciente. Para a segunda, isto é, para a teoria da vontade, é insuficiente que o agente represente o resultado como de provável ocorrência, sendo necessário que a probabilidade da produção do resultado seja incapaz de remover a vontade de agir, ou seja, o valor positivo da ação é mais forte para o agente do que o valor negativo do resultado, que, por isso, assume o risco de produzi-lo”. 5. Considerações Finais e Jurisprudência Tanto na culpa consciente, assim como no dolo eventual, os agentes não perseguiam o resultado, mas, tinham a consciência de que poderia provocar um mal a outra pessoa, ou seja, o risco era plenamente previsível. A culpa consciente, podemos caracterizar pela incredulidade, pois o sujeito tinha prévia consciência de que o resultado poderia ocorrer, não o desejava, porém, não foi capaz de fazer com que esta não ocorresse ou pode evitá-lo por suas habilidades. Exemplo cabível aeste, é do motorista que passa o sinal vermelho e bate em uma moto: ele não queria que o evento ocorre-se, acreditava que conseguiria desviar a tempo para não bater. O dolo eventual pode ser caracterizado pela “indiferença”, pois o sujeito mentaliza o evento e pensa “para mim é indiferente que ocorra, tanto faz, dane-se a vítima, pouco me importa que morra. Exemplo pontual ao caso, é o do motorista que dirige embriagado seu veículo, ou que pratica racha, vindo a causar um acidente de trânsito: o sujeito tinha consciência de que poderia causar um acidente, mas se prostrou indiferente a ocorrência do resultado. Tribunal de Justiça: Ementa PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. HOMICÍDIO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. EXCESSO DE LINGUAGEM. INOCORRÊNCIA. DOLO EVENTUAL X CULPA CONSCIENTE. EXAME QUE EXIGE APROFUNDAMENTO DO ACERVO PROBATÓRIO. QUALIFICADORA DA SURPRESA. INCOMPATIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL RECONHECIDO PARA AFASTAR A QUALIFICADORA. 1. O habeas corpus não pode ser utilizado como substitutivo de recurso próprio, a fim de que não se desvirtue a finalidade dessa garantia constitucional, com a exceção de quando a ilegalidade apontada é flagrante, hipótese em que se concede a ordem de ofício (Precedentes). 2. A tarefa do julgador, ao motivar as decisões relacionadas ao Tribunal do Júri, revela-se trabalhosa, uma vez que deve buscar o equilíbrio, a fim de evitar o excesso de linguagem sem se descurar da necessidade de fundamentação adequada, conforme preceitua o art. 93, IX, da Constituição Federal. 3. No caso dos autos, não se verifica o alegado excesso de linguagem, porquanto o Juízo de primeiro grau, bem como a Corte de origem, limitaram-se a apontar dados dos autos aptos a demonstrar a existência de prova da materialidade e de indícios suficientes de autoria, em estrita observância ao disposto no art. 413, § 1º, do Código de Processo Penal, não se verificando, portanto, a emissão de qualquer juízo de certeza. 4. A pretensão da defesa de desclassificar a conduta do paciente encontra óbice na impossibilidade de revolvimento do material fático/probatório dos autos em sede de habeas corpus, porquanto, para perquirir se o acusado estaria severamente embriagado e assumira, ou não, os riscos e consequências de sua conduta, seria necessário o revolvimento de todo conteúdo fático-probatório dos autos, que deve ser definido pelo Tribunal do Júri. 5. Na espécie, foram apontados três elementos que podem sugestionar a presença do dolo eventual: o acusado dirigia sem habilitação, sob a influência de álcool, sendo a vítima atingida no acostamento da via. Assim, não há afastar a apreciação dos fatos pelo Juízo natural da causa, ou seja, o Tribunal do Júri. 6. Quanto à compatibilidade do dolo eventual com o recurso que impossibilita a defesa da vítima, tem prevalecido, no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, não ser possível a incidência da referida qualificadora. De fato, tratando-se de crime de trânsito, com dolo eventual, não se poderia concluir que tivesse o paciente deliberadamente agido de surpresa, de maneira a dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima. (HC 308.180/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2016, DJe 20/09/2016) 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para excluir a qualificadora da surpresa. Liminar ratificada. (STJ - HC: 454375 SP 2018/0141852-6, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 02/08/2018, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/08/2018) REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS NUCCI, Guilherme Souza. Código Penal Comentado, 19ª Edição. Ebook disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530985073/. Acesso em 07 de Maio de 2020. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 1 - Parte Geral, 25ª Edição. Ebook disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/books/9788553610037. Acesso em 07 de Maio de 2020. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus (HC 308.180/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/09/2016, DJe 20/09/2016) Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/pesquisarJurisprudencia.asp. Acesso em: 07 de Maio de 2020. BRANDÃO, Cláudio. Curso de direito penal: parte geral, 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 17ª ed. Rev. E atual. São Paulo: Saraiva, 2012. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 11.ed. Rio de Janeiro, Ímpetus, 2009.
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