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TEMA 1 - Arte Clássica

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você a uma leitura crít ica desta narrativa: uma, possível ent re muitas, história das artes 
no Ocidente. 
3.1 A arte clássica 
O assunto da arte grega foi, de fato, o homem e, um pouco menos, a mulher. Mesmo 
quando representado de forma geométrica, quase abstrata, o objeto primeiro do art ista 
era o homem. Isso é verdadeiro ainda mais quando as condições da sua técnica o permi-
tiam imita r mais aproximadamente, ou até mesmo melhorar, a natureza. Essa natureza 
"melh orada" será o cânone clássico' para os sécu los futuros. As ações, as aspirações 
do homem, são mostradas na arte grega na figu ra de deuses ou de heróis mais frequen-
temente do que na figura de mortais, e muitas vezes em posições e vestes que, apesar de 
perte ncerem ao mundo próprio deles, representam gregos do passado heroico ou deuses 
que se comportavam como homens (Boardman, 1986, p. 275). 
As imagens de heróis mitológicos continham mensagens de narrativas simples, mas 
talvez refletissem também problemas dos mortais no mundo contemporâneo. Um deus 
na arte grega t inha o corpo e a postura de um atleta mortal perfeito, ou de uma bela, 
maternal ou sábia mulher. Traços sobrenaturais, como seres com muitas pernas ou braços, 
híbridos ou monstruosos eram, em geral, evitados, exceto em representações de histórias 
populares ant igas: os monstros parecem muito possíveis e podemos até acreditar em cen-
tauros, que, mesmo horríveis, estão ali mais para serem derrotados do que para ameaçar 
ou aterrorizar. Animais são muito menos importantes e decorativos e a paisagem não tem 
mais relevância do que o mobiliário. Quando comparada a outras artes ant igas, como a 
dos egípcios e a dos persas, em sua obsessão por demônios ou túmulos, pela aparência 
1 o cânone clássico foi definido por volta do século V a.e. e representa o conjun to das normas que serviriam, 
nos séculos futuros, como modelos e padrões para a beleza. 
dos reis e pelo ritua l das cortes, pode-
mos ver quão diferente era a arte grega 
(Harrison, 1885, p. 2). 
No período que se estendeu da morte 
de Alexandre, o Grande (323 a.C.), durante 
todo o reinado grego dos ptolomeus no 
Egito, até a conquista do Egito pelos roma-
nos (30 a.C.), chamado modernamente de 
período helenístico, houve um renovado inte-
resse pela escultura, num ambiente de cu l-
tu ra tomado por reis ricos e extravagantes. 
Ao saquea r as cidades gregas de Siracusa 
e Tarento, no final do século 111 a.e., e 
Cori nto, no ano de 146 a.e., Roma teria 
um imenso afluxo de arte. O gosto que 
Roma adquiriu pela arte grega levou a uma 
cont ínua demanda por novas obras nesse 
estilo que se sucedeu ao do período clás-
sico. Muitos escultores mudaram-se para 
Roma. Três deles - Agessandro, Polidora e 
Atenodoro, como menciona Plínio, o Velho 
(1885 [77 d.C.], Capít ulo 4) - foram os 
autores da escultura Laocoontee seus filhos 
(Figura 3.1), outrora no pa lácio de Tito e 
que foi encont rada nas escavações fe itas 
ali na Renascença. O movimento trágico 
Figura 3.1 - Laocoonte e seus filhos, 
de Agesandro, Atenodoro e Polidoro 
AGESANDRO; ATENODORO; POLIDORO. Laocoonte e 
seus filhos. Ca. 40 a.e. , escultura em mármore. Museu 
do Vaticano, Roma. 
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Figura 3.2 - Discóbolo palombara, de Míron 
MÍRON. Discóbolo palombara. Ca. 400 a.e. , escultura, 
cópia romana em mármore, 124 cm. Palazzo Massimo alie 
Terme, Museo Nazionale Romano. 
dessa estátua é um dos temas do ensaio 
Laokoi.in (1766), de Gotthold Ephraim 
Lessing, um dos primeiros clássicos de 
crít ica da arte, em que se debate a beleza 
como lugar estético privilegiado e os limi-
tes entre as artes. Essa estátua, de t rês 
escultores de Rodes, uma pequena ilha no 
Mediterrâneo, constitu iu-se influência fun-
damental para toda a escultura barroca e, 
por meio do ensaio de Lessing, para toda 
a arte do romantismo em virtude de seu 
movimento e expressividade extremos. 
No ano 18 a.e., o filósofo e político 
romano Marco Túlio Cícero, em um tra-
tado de retórica endereçado a Bruto, faz 
um breve relato da história da estatuária 
e da pintura grega, perguntando-se quem, 
entre aqueles que prestam alguma atenção 
às coisas menores (isto é, às artes), não 
teria notado o progresso que elas haviam 
feito de uma rigidez inicial na imitação da 
realidade em direção à perfeição e à beleza 
(Cícero, 2013 [18 a.C.], p. 70) . De Policleto 
(que esteve ativo entre 460 e 410 a.C.), 
Cícero diz que suas estátuas são ainda 
mais belas que as de Míron (Figura 3.2) e 
que parecem-lhe mesmo perfeitas. A arte 
da escultura grega - Policleto e Míron tra-
balharam somente em bronze - sobrevive 
para nós em numerosas cópias romanas 
em mármore, mas transmitiu-se também 
no ideal, apontado por Cícero, de repre-
sentação da rea lidade como critério da 
beleza, contra o qua l os escultores das 
eras sucessivas terão de confronta r-se. 
O Doríforo (em grego, literalmente, lan-
ceiro, Figu ra 3.3) fo i a estátua mais famosa 
de Policleto. A pose em que a figura apoia 
seu peso em um só pé, chamada contrap-
posto, teve sua invenção atribuída por 
Plínio, o Ve lho (1885 [77 d.C.]), a Policleto e 
tornou-se parte importante da fama deste 
escultor (mesmo que j á existisse há pelo 
menos 50 anos antes dele). Contrapposto é 
uma pose frequente entre as figu ras clás-
sicas encontradas nos frisos no Partenon, 
esculpidos pelo terceiro dentre os gran-
des escultores clássicos gregos, Fídias, e 
nas ca riátides do Erecteion (Figura 3-4), 
atribuídas a seu aluno Alcamenes. Repare 
que o equilíbrio, no qual um membro de 
Figura 3.3 - Doríforo, de Policleto 
POLICLETO. Doríforo. 450 a.C. 1 escultura, cópia romana 
de Pompeia em mármore, 212 cm. Museu Arqueológico 
Nacional, Nápolis. 
Figura 3.4 - Cariátides do Erecteion 
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apoio de um lado do corpo é contraposto a um elemento relaxado do outro, dá às estátuas 
descanso e movimento, contração e expansão, ajustados e equilibrados à perfeição. Essa 
pose produz um maravilhoso senso de se renidade, dignidade e ordem, de autoconfiança 
e autonomia. É de fato mais fácil permanecer em pé nessa posição do que rigidamente 
ereto. A ausência de esforço inerente ao contrapposto foi sempre reconhecida por artistas 
gregos ta rdios e pelos romanos, que nunca se cansaram de usá-lo. Parte da importân-
cia que os ideais - de equil íbrio que se opõe à rigidez - da estatuária grega conservarão 
nos milênios seguintes se deve à crítica feita pelos intelectuais romanos ( por exemplo, 
pelo próprio Cícero [2016] em De inventione l, p. 1-5) que sustentam que a sabedoria, a 
eloquência e a arte de governar desenvolveram-se por uma ligação natural entre ética, 
estética e moral, fusão que contribuiu pa ra o desenvolvimento da cultura dos homens e 
que deveria ser conse rvada. 
Por outro lado, o Doríforo parece ser a estátua criada por Policleto para demonstrar 
os princípios de proporção apresentados em um tratado seu chamado Kanon. O t ratado 
só nos é conhecido por citações e menções de outros escritores, mas sabemos que ele 
articulava um sistema de proporções da figura humana, no qua l uma unidade se torna o 
módu lo que determina o tamanho de outra parte do corpo. Por exemplo: a altura total da 
estátua equivale a sete vezes o taman ho da cabeça. Calculados numa esca la matemática 
simp les, as razões entre os comprimentos se conformam a uma harmonia abstrata, que, 
acredita -se hoje, refletiria a crença pitagórica• numa harmonia universal, análoga às relações 
matemáticas na música, que expressa riam a natureza essencial do cosmo e do homem. 
As esculturas do período - das quais alguns exemplares antigos tornaram-se famosís-
simos a partir da Renascença - têm agora uma beleza não mais idealizada, e sim rea lista e 
personificada. As figuras tornam-se de fato tridimensionais, no sent ido que são pensadas 
para ser vistas não mais frontalmente, mas de todos os ângulos. São mais dramáticas e2 Pitágoras foi um matemático grego que viveu no sécu lo VI a.e. e susten tava que exist ia uma relação de 
harmonia entre a na tu reza e os nú meros. 
narrativas. Um exemplo dessa dramatici-
dade é a figu ra de Nice, a deusa da vitó-
ria, de Samotrácia, hoj e no Louvre, em 
Paris, posando como se estivesse sobre a 
proa de um navio velej ante, com suas rou-
pas agitadas como se batidas pelo vento 
(Figura 3.5). 
Duas outras esculturas do período pre-
cisam ser lembradas, pelo imenso peso 
que tê m no imaginário contemporâneo, 
fato que nos permite entender melhor 
como a vida "póstuma" da ob ra de arte 
pode se desenrolar. Afrodite nua, ou quase 
nua, é um assunto comum entre as está-
tuas helenísticas. A mais conhecida hoje é 
a Vênus de Mi/o (Figura 3.6), que foi encon-
t rada numa escavação em 1820. A parte 
de cima de seu corpo mostra um delicado 
t ratamento da pele, abdômen e braço 
arredondados e um cabelo de fina tex-
tura. Ela certamente não é uma escultu ra 
do período clássico, pois suas curvas são 
mais pronunciadas do que as do cânone. 
As pernas têm uma posição mais dinâmica, 
com o joelho esquerdo se projetando e o 
t ronco mais torcido. A roupa é redobrada, 
dando a impressão de que cairia devido 
Figura 3.5 - Nicedi Samotrácia, de Pitócrito 
PITÓCRITO (?). Nice di Samotrácia. 200-180 a.C. 
1 escultura em mármore, 245 cm. Museu do Louvre, Paris. 
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Figura 3.6 - Vênus de Mito, 
de Alessandro di Antiochia 
ANTIOCHIA, Alessandro di. Vênus de Mil o. Ca. 130 a.C. 
1 escultura em mármore, 202 cm. Museu do Louvre, Paris. 
ao peso, se não fosse a mão ( perdida) que 
a sustenta (Stansbury-O'Donnell, 2015, 
p. 363). Seu prestígio decorre não ape-
nas de sua óbvia beleza, mas em parte 
também da propaganda pelas autorida-
des francesas de que se t ratava de um 
tesouro ainda maior do que outra Vênus, 
a de Médici, que havia sido devolvida à 
Itá lia em 1815, com a queda de Napoleão 
(Bonazzoli; Robecchi, 2013). 
A ida da Vênus de Médici (Figura 3,7) 
e do Apolo do Belvedere (Figura 3.8) para 
Paris havia representado um dos maiores 
esforços de Napoleão, em seu saque das 
obras de arte ita lianas, pois eram conside-
radas as duas melhores estátuas clássicas 
existentes 3• Vênus, ou Afrodite, a deusa 
grega do amor, é representada em uma 
pose fugit iva, como se houvesse sido sur-
preendida no momento em que emerge 
do mar, como evocado pelos golfinhos a 
seus pés. É uma cópia do sécu lo I a.e. de 
3 Napoleão, quando da conquista de Roma, saqueou 
as pr incipais esculturas clássicas que pertenciam 
à Igrej a. Essas obras somente foram devolvidas 
à Itália quando Napoleão foi deposto, em 1815. 
Figura 3.7 - Vênus de Médici, 
de Cleomene di Apollodoro 
APOLLODORO, Cleomene di. Vênus de Médici. Ca. 100 a.C. 
1 escultura em mármore. Galleria degli Uffizi, Florença. 
Figura 3.8 - Apolo do Belvedere, de Leocares 
LEOCARES. Apolo do Belvedere. Ca. 350 a.C. 1 escultura 
em mármore. 224 cm. Pio-Clementino, Vaticano. 
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uma escultura que segue o tipo da Afrodite de Cnido, uma das mais famosas criações do 
escultor ateniense Praxíteles no século IV a.e. Foi numerosamente copiada, sugerindo 
inclusive a pose no Nascimento de Vênus (Figu ra 3.9), de Sa ndro Botticelli (Havelock, 1995, 
p. 79). Já do Apolo do Belvedere se desconhecem autoria e procedência, mas é considerado 
uma cópia romana de um original grego perdido. Redescoberto no Renascimento, o Apolo 
foi exposto no pátio do Belvedere no Vaticano a part ir de 1511, e deste recebeu seu nome. 
Representa o deus Apolo logo depois de te r d isparado despreocupadamente uma flecha, 
com o o lhar estend ido a ver o que atingira. Considerado a representação ideal da perfei-
ção física masculina, aclamado como obra-prima e uma das mais importantes relíquias da 
Ant iguidade Clássica, foi ta lvez a escultura grega que mais influenciou a arte a partir da 
Renascença, de Michelangelo Buonarroti a Benvenuto Bernini (fa laremos deles mais adiante). 
Nas belas gravuras de Adão e Eva, que fez em 1504 (Figura 3.10), Albrecht Dürer usou como 
Figura 3.9 - O Nascimento de Vênus, de Sandro Botticelli 
BOTIICELLI, Sandro. O Nascimento de Vênus. Ca. 1485. , têmpera sobre tela: color.; 172,5 x 278,5 cm. Galleria degli Uffizi, 
Florença. 
modelos tanto a Venus de Médici quanto o 
Apolo do Belvedere. O fato de críticos, a par-
t ir da devolução e da propaganda francesa, 
terem desvalorizado ambas as obras e dei-
xado de perceber-lhes a beleza dá ideia de 
como é importante o desinteresse, que 
Kant sub linhava, na apreciação das artes. 
Se a beleza definiu para os sécu los 
futuros a arte grega da escultura, a tra-
gédia definiu a arte grega do teatro. As 
formas teatrais que hoje conhecemos 
descendem daquelas que se praticaram 
em Atenas no sécu lo V a.e. Os gregos 
promoviam diversos festivais anuais de 
teatro, em que novas peças eram pos-
tas em competição. Um único festiva l, as 
Grandes Dionísias, apresentava ao menos 
quinze novas peças cada ano, e nenhuma 
foi repetida no festiva l até a metade do 
século (e a partir daí exclusivamente o tea-
t ro de Ésquilo, que se tornara um clássico, 
era repetido). As Dionísias anuais foram 
celebradas por mais de um século e nelas 
foram apresentadas ao menos 900 tragé-
dias, um gênero cujos temas derivavam 
Figura 3.10 - A quedado homem 
(Adão e Eva), de Albrecht Dürer 
DÜRER,Albrecht. A queda do homem (Adão e Eva). 
1504. 1 gravura: p/b. 24,92 x 19,21 cm. 
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dos mitos e das narrativas heroicas; 300 comédias, que tratavam da polít ica, dos polít icos 
e dos usos do tempo; e 300 sátiras, que tomavam também de temas míticos como as 
tragéd ias, mas tratavam-nos comicamente. Nenhum dos três gêneros se misturava. Em 
Atenas havia ainda outros festivais: as Anteréstias, as Leneanas, as Dionísias rurais, todos 
com teatro. Em outras cidades havia ainda mais peças sendo escritas. Durante o período 
helenístico, todas as colônias e cidades gregas de alguma importância t iveram teatros 
como uma forma de promover ident idade cultural: era o local onde a polis se reunia para 
celebrar as antigas histórias e mitos, patrimônio comum dos cidadãos, que todo espectador 
grego conhecia. Sabemos hoje da existência de duzentos teatros gregos, e mesmo que 
não houvesse apresentações teatrais em todos eles, esta é certamente uma possibilidade. 
Do total inumerável, restaram-nos apenas 44 peças (Ashby, 1999, p. 2-4). 
A maior parte das tragédias que sobreviveram é de peças usadas para ensinar grego 
(sete de Ésquilo, sete de Sófocles, nove de Eurípedes) e escolhidas pelos professores de 
Bizâncio por seus valores literários, não por suas qualidades no palco. Medeia, por exemp lo, 
fora o último lugar no concu rso das Dionísias de seu ano, mas nenhuma das outras seis 
t ragéd ias vencedoras ou em segundo lugar sobreviveu (Ashby, 1999, p. 4). Há um outro 
grupo de dez tragéd ias de Eurípides que não foram escolhidas por mérito literário, mas 
sobreviveram como parte de um papiro de Alexandria que era uma coletânea de suas tra-
géd ias. Junto na coleção há a única sátira grega sobrevivente: Cíclopes. O que sa bemos 
das comédias depende das onze peças de Aristófanes que sobreviveram. A sátira que 
sobreviveu junta um pequeno detalhe ao estudo do entretenimento grego: "não importa 
o quão sombrias, deprimentes e pesadas as tragéd ias pudessem ser, todos voltavam para 
casa tendo dado boas risadas de uma farsa grotesca envolvendo as más ações dos deuses 
e de outras figu ras mitológicas" (Ashby, 1999, p. 6, tradu ção nossa). Isso porque a cada 
dia, durante os festivais, depois das tragédias era apresentada uma sátira. 
As peças tinham, no máximo, t rês atores e o coro, uma voz coletiva. Todos os atores 
sempre usavam máscaras. No teatro grego a primeira fe rramenta era a voz, não a face. 
Mas, longe de esconde r o ator, a máscara t rágica projetava o ca ráter de seu personagempara a audiência. Assim, as máscaras permit iam a um mesmo ator ident idades alternativas, 
e ao autor apresentar seus personagens em termos de papéis sociais alteráveis. Mais que 
tudo, t raziam o público para dentro da peça, cada espectador projetando a sua própria 
imaginação na superfície da máscara. Uma das maiores descobertas do teatro grego é que 
a imaginação do público é o maior recurso teatral e que as convenções de atuação atrás 
de máscaras t razem essa imaginação vita l mente para a peça, com a qua l os espectadores 
preenchem as feições fixas de um personagem t rágico que foi arrebatado em situações 
que se t ransformam radicalmente (Rehm, 1992, p. 38-39). A t ragéd ia grega basicamente 
põe seus protagonistas em situações aterrorizantes, das quais eles têm ou não responsa-
bilidade, mas em que muito está em jogo, e o que é t rágico são justamente as ações que 
eles precisam tomar nessas situações (Rehm, 1992, p. 87). 
Assim como na escultura, Roma adquiriu no período helenístico o gosto pelo teatro 
grego, adaptando as t ragédias de Eurípides, Sófocles e de outros autores agora perdidos, 
assim como as peças de Menandro (de quem nos restou uma única) e de outros mestres 
da Nova Comédia helenística, fundindo-os com suas próprias tradições e fazendo con-
sideráveis mudanças tanto na substância quanto no modo de apresentação. Os textos 
dos romanos Sêneca, Plauto e Terêncio completarão com os textos gregos o corpus do 
teatro clássico que chegou até nós e que vem sendo componente central na formação 
da tradição cultura l do Ocidente desde a Idade Méd ia (Griffith, 2007, p. 13). Ainda hoj e, 
o teatro, nas concepções modernas do que sej a tragédia e do que seja comédia, traz as 
marcas do período clássico. 
Boa parte da herança arquitetônica romana foi fruto das extensas reformas iniciadas 
por Júlio César e levadas muito adiante por Augusto. Na história da arte ant iga, poucas 
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mudanças foram tão dramáticas como essas, realizadas nas duas primeiras décadas do 
Império de Augusto, sob o mode lo do classicismo da Atenas dos séculos V e IV a.e. O pro-
grama imperial de t ransformar Roma numa cidade de mármore baseou-se nos artesãos da 
pedra e em escultores em mármore e bronze de origem grega, que se haviam estabele-
cido, em Roma e em Nápoles, desde o fim da República, em oficinas controladas direta ou 
indiretamente por aristocratas romanos (Tore Ili, 1996, p. 946). Em parte pela presença de 
monumentos mais ou menos preservados, em parte pela reutilização de mármores daqueles 
préd ios em prédios medievais e renascentistas, e em parte pelo manual De architectura -
reencontrado em 1414, na Abadia de São Ga lo, na Suíça, escrito pelo arquiteto Vitrúvio 
(ca. 80 - ca. 15 a.C.) -, dessa época ficou, de fato, a imagem que temos da Roma Ant iga e 
que influencia a arquitetura ainda nos dias de hoje. 
3.2 A arte medieval 
Segundo Umberto Eco (1999, p. 13, t radução nossa), "A Idade Média retirou grande parte de 
seus prob lemas estéticos da Antiguidade Clássica: porém conferiu a ta is temas um signifi -
cado novo, introduzindo-os no sentimento do homem, do mundo e da divindade típicos da 
visão cristã". Enquanto para t ratar dos problemas estéticos e para propor cânones para a 
produção art ística a Antiguidade Clássica t inha os o lhos na natureza - e nela buscava uma 
racionalidade, mu itas vezes t raduzida em razões ent re números e proporções-, a cultura 
medieval mant inha seus o lhos nas ideias e nas formas criadas pela Antiguidade Clássica. 
"Boa parte da cultura med ieval é mais um comentário sobre a tradição cultu ral do que 
uma reflexão sob re a rea lidade" (Eco, 1999, p. 13, tradução nossa). 
Os mil anos que durou a Idade Média poderiam ser divididos em duas metades: da 
queda do Império Romano até o advento do Império Carolíngio, época de imensa crise em 
todos os sentidos; e, a partir do ano mil , que são os séculos em que nasceram as línguas 
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