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METODOLOGIA E PRÁTICA DE ENSINO DE MATEMÁTICA Arlete Almeida 2 SUMÁRIO EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS ................................................................ 3 CONCEPÇÕES DO ENSINO DE MATEMÁTICA .................................................................. 15 PERCURSOS PARA O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO MATEMÁTICO ............... 37 OS JOGOS E O ENSINO DA MATEMÁTICA ....................................................................... 48 ESTRATÉGIAS PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA........................................................... 54 AVALIAR EM MATEMÁTICA ............................................................................................ 63 3 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA NOS ANOS INICIAIS Apresentação A Educação Matemática sofreu muitas influências para se tornar o que é hoje. Vamos elencar alguns enfoques que, de certa forma, influenciaram nas decisões e rumos do ensino desta área do conhecimento. Abordaremos documentos importantes para o ensino no Brasil como os Parâmetros Curriculares Nacionais (diretrizes que orientam a educação no Brasil) e a BNCC (Contempla as aprendizagens essenciais para a educação no Brasil). Ambos têm importância fundamental e devem ser levados em consideração ao se elaborar o currículo escolar e o plano de aula. 1.1 Trajetória e influências - Educação Matemática A Comissão Internacional de Instrução Matemática, criada em 1908 por Felix Klein, representou um grande impulso para a Educação Matemática. Com o surgimento de novas tecnologias, diversos países perceberam a necessidade de uma modernização no ensino dessa importante disciplina. Alguns movimentos considerados inovadores tiveram pouca influência na Educação Matemática. Um notório exemplo é a Escola Nova que não teve muito sucesso por não dar a atenção necessária ao que se passava com a criança e nem com a sociedade. Presente na concepção do ensino, o behaviorismo teve grande influência na prática dos educadores em geral, assim como na Educação Matemática, porém, com o passar do tempo, observou-se que os processos de aprendizagem têm propostas e objetivos diferentes de treinamentos. 4 O debate sobre a importância do fator motivação para o processo de aprendizagem se tornou mais relevante a partir das contribuições de Jean Piaget. Neste período, compreender como um indivíduo aprende passou a ser foco de discussões e de pesquisas. As teorias de Vigotsky ganharam ênfase ao tratar da construção do conhecimento. Esse importante autor morreu em 1934, porem suas teorias só se tornaram conhecidas na década de 60. Estimuladas por essas produções teóricas, diversas discussões a respeito do ensino da Matemática passaram a ser realizadas. Como resultado, surge a Educação Matemática, ganhando força com os Congressos Internacionais de Educação Matemática – ICME. A partir da década de 50, o Brasil passou a ter ampla participação na Educação Matemática, coincidindo com o movimento da Matemática Moderna. 1.2 Os diferentes enfoques dados ao ensino da Matemática Todo ensino se desenvolve por meio de um processo e, neste quesito, a Matemática não é diferente. Ao longo do tempo, essa disciplina sofreu várias influências que, de certa forma, contribuíram para levantar discussões sobre como ensinar e com qual objetivo. No enfoque condutista, pretendia-se melhorar a aprendizagem por meio da análise de tarefas para uma área de conteúdos, oferecendo como resultado um procedimento detalhado para uma aprendizagem sequencial. Entre as décadas de 70 e 80, foi elaborado um projeto pela UNICAMP que adotava essa abordagem. A ideia era, em vez de dizer que a geometria é importante, realizar uma série de atividades em cima de materiais, ou seja, conduzia-se um processo. A ideia central era aplicar o currículo. Na abordagem da Matemática Moderna, o enfoque era na descrição sistemática da Matemática reorganizada para destacar considerações estruturais, apresentada em linguagem uniforme e com grande precisão. O princípio básico de Bourbaki, a educação de conteúdos a partir de axiomas, também ocupou um lugar fundamental no ensino da Matemática. 5 Baseado nas teorias de Bruner e Dienes, temos o enfoque estruturalista, onde as estruturas das ciências eram apropriadas para promover processos de aprendizagem de uma maneira ótima, justificando, assim, os esforços realizados para orientar a reforma curricular científica. Bruner propõe o currículo espiral que consiste na ideia de que um mesmo tópico deve ser abordado várias vezes durante a “vida letiva” de um aluno, aumentando a profundidade conferida a cada nova oportunidade. Deve-se retomar os assuntos para que a criança se familiarize com eles; quando essa ligação não ocorre, existem prejuízos no aprendizado. No livro “As seis etapas do processo ensino aprendizagem”, Dienes (1972) propôs seis etapas que serviam como passagem do pensamento concreto para o abstrato. A criança levanta hipóteses na sequência das etapas até chegar à abstração. Por esta razão, o planejamento das aulas deveria respeitar esse processo. O enfoque formativo parte de dois pressupostos: O primeiro é que toda educação escolar busca dotar o estudante de um conjunto ótimo e básico de capacidades cognitivas, atitudes afetivas e motivação. O segundo é que esses fatores podem ser descritos em função de traços de personalidade. O objetivo desse currículo é iniciar os processos de aprendizagem, mas não os determinar. A ideia de formação tornou-se muito forte, removendo parte da importância da Matemática para a contextualização e formação de um estudante crítico. O ensino integrado se desenvolveu ao mesmo tempo e sob a mesma base cognitiva teórica que o enfoque formativo, mas propunha-se a ir além das meras afirmações sobre os métodos e considerava, também, problemas relacionados ao conteúdo. É afirmado que os problemas da realidade determinam os conteúdos do ensino. Para os adeptos do Ensino Integrado, o currículo é muito mais que um programa e deve incluir objetivos, conteúdos, métodos e procedimentos de avaliação. 6 1.3 O Ensino da Matemática nos PCNs Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) foram publicados em 1997 pelo Ministério da Educação e Cultura. Constam nesse documento, os objetivos que devem ser alcançados em cada etapa de formação, e que devem nortear a prática dos professores. Nos PCNs, a organização da escolaridade aparece em ciclos. Nos dois primeiros ciclos, do 1º ao 5º ano, as áreas do conhecimento foram divididas para que houvesse uma maior integração entre elas. Fonte: Brasil (1997). Foi elaborado um livro para cada área do conhecimento. Desta forma, temos os PCNs para Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Naturais, Arte, Educação Física, história e Geografia. Em Matemática, existe uma divisão de blocos de conteúdo em: 7 Números e operações; Espaço e Forma; Grandezas e Medidas; Tratamento da Informação. A proposta é que o docente planeje e faça a articulação entre os diferentes blocos. Os conteúdos conceituais e procedimentais são organizados em dois ciclos. Neles constam os objetivos, conteúdos e avaliações que deverão ser cumpridos em um ano letivo. Ao fim do documento, existe um conjunto de orientações didáticas com destaque para alguns conteúdos. Saiba mais É importante que você conheça muito bem os parâmetros curriculares nacionais. Afinal, neste documento estão contidas importantes diretrizes para o planejamento de um docente. Ele pode ser lido, na integra, por meio do seguinte link: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro03.pdf 1.4 O Ensino da Matemática na BNCC Os conteúdos mínimos previstos parao Ensino Fundamental estão fixados na Constituição Federal em seu artigo 210º, no qual está assegurada a formação básica comum. A Lei de Diretrizes e Bases (1996), em seu artigo 26º, determina que a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e Ensino Médio deveriam ter uma Base Nacional Comum Curricular; e que o conteúdo complementar seria responsabilidade de cada sistema de ensino. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro03.pdf 8 A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), é um documento normativo que define as aprendizagens essenciais que todos os estudantes devem desenvolver ao longo da educação básica, de forma progressiva e por áreas de conhecimento. Trata-se de um referencial nacional obrigatória para a elaboração dos currículos e das propostas pedagógicas dos sistemas e das redes escolares dos estados, do DF e dos municípios. Com o objetivo de construir uma sociedade mais justa e democrática, a BNCC apresenta as 10 competências Gerais que envolvem os aspectos cognitivos e socioemocionais para o desenvolvimento integral do estudante, levando em consideração sua dimensão intelectual, física, emocional, social e cultural. Saiba mais Acesse o link abaixo para conhecer as 10 Competências Gerais da BNCC: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/#introducao#a-base-nacional- comum-curricular Para atender as aprendizagens essências da BNCC, vamos conhecer sua estrutura, com foco no Ensino Fundamental. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/#introducao#a-base-nacional-comum-curricular http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/#introducao#a-base-nacional-comum-curricular 9 Na BNCC, são apresentadas as competências específicas de cada área do conhecimento. Elas estão relacionadas aos seus respectivos componentes curriculares. No caso específico da Matemática, ela é área e componente curricular, assim são apresentadas competências específicas para Matemática. Etapas Ensino Médio Ensino Fundamental Educação Infantil Ensino Fundamental dos Anos Inicias Ensino Fundamental dos Anos Finais Áreas do conhecimento Linguagens Matemática Ciências da Natureza Ciências Humanas Ensino Religioso 10 Saiba mais Para conhecer mais sobre a organização da BNCC em relação as outras etapas, consulte o site: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/ Em relação à Matemática, temos o ensino da Álgebra desde os anos iniciais, a educação financeira e o letramento matemático. Os objetos do conhecimento podem ser associados a uma ou várias habilidades, também, descrevem conteúdos, conceitos e processos. Eles estão associados em unidades temáticas que são: Números; Álgebra; Geometria; Grandezas e medidas; Probabilidade estatística. As habilidades foram alinhadas de forma a garantir a progressão das aprendizagens e são evidenciadas no organizador curricular. Veja o exemplo abaixo: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/ 11 1.5 O Ensino de Matemática nos anos iniciais De acordo com a BNCC (2017), é importante valorizar as situações de aprendizagem lúdicas nos anos inicias, pois trata-se de uma fase em que ocorrem mudanças em diversos aspectos da vida da criança e, muitas vezes, a ruptura poderá se tornar um obstáculo para o ensino. Desde os anos iniciais, esses estudantes podem ser colocados para resolver problemas com os números naturais e racionais, envolvendo diferentes significados e respeitando a maturidade da faixa etária. Ao se depararem com problemas, é possível desenvolver a argumentação, explorando as possibilidades de solução e com intervenções que estimulem o estudante a criar hipóteses e elaborar estratégias. Segundo a BNCC (2017), no caminho para o Letramento Matemático, é possível desenvolver habilidades referentes à leitura, escrita, ordenação de números naturais e números racionais. Também, é fundamental apresentar, aos estudantes, tarefas que envolvam o processo de medição, assim eles observarão que, em alguns contextos, os números naturais não são suficientes para responder à situação, criando o interesse para a ampliação desse conjunto numérico para os números racionais. Todo esse processo de aprendizagem com foco na resolução de problemas e no letramento pode ser desenvolvido em outras unidades temáticas como, por exemplo, a álgebra que será objeto de estudo desde os anos iniciais para dar início a estruturação e desenvolvimento do pensamento algébrico. Unidades temáticas Objetos de conhecimento Habilidades Números Contagem de rotina; Contagem ascendente e descendente; Reconhecimento de números no contexto diário: indicação de quantidades, indicação de ordem ou indicação de código para a organização de informações. (EF01MA01) Utilizar números naturais como indicador de quantidade ou de ordem em diferentes situações cotidianas e reconhecer situações em que os números não indicam contagem nem ordem, mas sim códigos de identificação. 12 Conclusão Nesse bloco estudamos sobre as diferentes correntes que influenciaram historicamente na Educação Matemática. Vimos as propostas de ensino e como essas demandas impactavam a forma de ensinar. Abordamos, também, alguns enfoques que movimentaram a reflexão sobre o ensino de Matemática. Para atender as demandas do ensino, em 1997 foram publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais que apresentam os blocos de conteúdo e dividem a educação básica em dois ciclos, explicitando o que deve ser abordado em cada um deles. Considerando que a constituição já previa um documento que normatizasse o ensino em todo país, temos em 2017, a publicação da BNCC que tem como foco a formação integral do estudante e apresenta as aprendizagens essências que precisam ser desenvolvidas ao longo da educação básica. Por intermédio da análise desses importantes documentos, vimos que a Matemática se apresenta, nos anos iniciais, por meio do desenvolvimento da argumentação e raciocínio, utilizando a resolução de problemas desde o início da fase de transição entre a Educação Infantil e o os primeiros anos do Ensino Fundamental. Saiba mais O vídeo a seguir explica as mudanças provocadas na Matemática pelos novos BNCC. É muito importante ter clareza de como essas propostas vão impactar na sala de aula. https://www.youtube.com/watch?v=HrychTmv7vQ https://www.youtube.com/watch?v=HrychTmv7vQ 13 Referências: BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: matemática. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro03.pdf>. Acesso em: 03 jun. 2019. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 de dezembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>. Acesso em: 05 jun. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 05. jun. 2019. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília: MEC/CONSED/UNDIME, 2018. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/>. Acesso em: 04.jun.2019 DIENES, Z, P. As seis etapas do processo de aprendizagem em matemática. São Paulo: Editora Pedagógica Universitária, 1972. MOVIMENTO PELA BASE NACIONAL COMUM. Matemática na BNCC. 2018. (4m50s). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=HrychTmv7vQ>. Acesso em: 09 ago. 2019. PIRES, C, M, C. Currículos de Matemática: da organização linear à ideia de rede. São Paulo: FTD, 2000. PIRES, C, M, C. Educação Matemática e suainfluência no processo de organização e desenvolvimento curricular no Brasil. São Paulo. Disponível em: <encurtador.com.br/kMNQW>. Acesso em: 06 jun. 2019. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro03.pdf http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/ 14 SILVA, L, C, D. PIETROPAOLO, R, C. Um Estudo sobre as Contribuições de Felix Klein para a Introdução das Transformações Geométricas nos Currículos Prescritos de Matemática do Ensino Fundamental. Revista do programa de pós-graduação em educação matemática da universidade federal de mato grosso do sul (ufms). Mato Grosso do Sul. Volume 7, Número 14 – 2014 – ISSN 2359 – 2842. Disponível em: <http://seer.ufms.br/index.php/pedmat/article/view/886>. Acesso em: 23 maio 2019. http://seer.ufms.br/index.php/pedmat/article/view/886 15 CONCEPÇÕES DO ENSINO DE MATEMÁTICA Apresentação Neste bloco você vai estudar sobre o ensino de Matemática a partir do Letramento e da Resolução de Problemas, conforme apresenta na BNCC. Essa compreensão é fundamental, uma vez que o aprendizado não deve ser limitado aos cálculos e a reprodução de procedimentos dos algoritmos. A atuação direta do estudante por meio de atividades que oportunizam o raciocínio e a argumentação a partir dos conhecimentos consolidados é essencial. Outro aspecto importante para o ensino de Matemática é a Resolução de Problemas, que tem como princípios o raciocínio e a argumentação. Vamos estudar sobre os problemas convencionais e não convencionais que podem ser trabalhados no âmbito da sala de aula. Por fim, para consolidar o estudo que envolve a resolução de problema, você irá conhecer a Teoria dos Campos Conceituais. 2.1 Letramento Matemático O Letramento Matemático é um dos principais focos da BNCC e, apesar de ser muito discutido, ainda não foi consolidado nas práticas escolares. Para que essa situação seja mudada, precisamos no apropriar desse conceito. Letramento matemático definido como as competências e habilidades de raciocinar, representar, comunicar e argumentar matematicamente, de modo a favorecer o estabelecimento de conjecturas, a formulação e a resolução de problemas em uma variedade de contextos, utilizando conceitos, procedimentos, fatos e ferramentas matemáticas. (BNCC, 2017,p. 266) 16 Ao desenvolver o Letramento matemático, considere os aspectos simbólicos, formais e técnicos da linguagem específica da Matemática. Deve-se, também, envolver outras habilidades como a de compreender, interpretar e resolver situações-problema, envolvendo contextos matemáticos e sociais. A utilização dessas habilidades permite o desenvolvimento dos processos cognitivos que compõem o chamado pensamento matemático. Habilidade Processos cognitivos Representar Dominar a linguagem matemática. Em outras palavras, fazer diferentes representações, a partir do ato de ler e interpretar. Pode ser um indicador de aprendizagem. Argumentar Ser capaz de defender suas ideias com base em argumentos coerentes com a situação proposta; de estabelecer conjecturas; de usar os recursos para criação; e, desta forma, desenvolver autonomia na expressão. Reconhecer Buscar na memória um conceito ou a uma situação semelhante que o permite se sentir familiarizado com o objeto de conhecimento em questão. Aplicar Ter o conhecimento solicitado, ser capaz de busca-lo na memória e aplica-lo em determinado contexto. Analisar Olhar para uma situação, identificar elementos para compreende- la e, então, ter condições para avaliar e produzir sua análise. Seja oralmente ou por escrito. Assim, ao trabalhar com o Letramento Matemático, não devemos nos limitar a trabalhar com foco nas terminologias, dados e procedimentos. Essa ideia deve ser ampliada para que seus estudantes possam articular elementos para resolver demandas do seu cotidiano e da sociedade, por meio da apropriação das ideias da Matemática. 17 2.2 Práticas de Letramento Matemático As práticas de letramento matemático supõem a utilização das ideias matemáticas para realizar a leitura de mundo e, a partir dos resultados obtidos, fazer inferências e verificar a validade desses resultados. Isso implica em, por exemplo, ao resolver um problema, verificar se o valor obtido é razoável para a situação. Nessas práticas, deve-se trabalhar com contextos diversos em situações do cotidiano, também, os contextos da própria Matemática. Isso implica, por exemplo, na verificação de padrões para observar propriedades e, então, fazer generalizações. Essas atividades devem ter como foco o raciocínio e a argumentação, proporcionando ao estudante oportunidades de fazer o uso de conceitos e ferramentas matemáticas para estabelecer conjecturas e se apropriar de procedimentos para resolver situações. Por todas essas razões, como professores, nossas práticas não devem se limitar à proposições em que os estudantes resolvam cálculos e procedimentos, mas sim, que realizem investigações e explore situações que vão além de cálculos mecânicos. Para Boaler (2008), atividades podem ser trabalhadas por meio de diversas representações. Quando, por exemplo, se faz o uso de componentes visuais, podem ser criadas tarefas desafiadoras e acessíveis que permitem a reflexão e argumentação entre grupos de estudantes, aumentando, assim, a possibilidade de aprendizado. Saiba mais Para ampliar seu conhecimento, faça a leitura do Capítulo 5 do livro “Mentalidades Matemáticas: estimulando o potencial dos estudantes, por meio da matemática criativa, das mensagens inspiradoras e do ensino inovador” que está disponível na “Minha Biblioteca”. Seu conteúdo complementa a discussão sobre as práticas de Letramento Matemático. 18 2.3 Resolução de Problemas A resolução de problemas pressupõe um estudante ativo e participativo, pois se trata de uma atividade que requer uma coordenação complexa que envolve diferentes níveis de pensamento lógico. Durante a sua execução, o aluno se manifesta; faz escolhas; e valida ou invalida a solução encontrada. Se a atividade for em grupo, haverá, ainda, interação, discussão e a chegada a um consenso. O ensino de resolução de problemas não pode se limitar a obtenção de uma solução, portanto é preciso evitar que a tarefa se torne um treino ao trabalhar somente problemas do mesmo tipo. O processo cognitivo por trás da resolução de problemas é muito rico, pois desenvolve a comunicação, a compreensão e a tomada de decisão. Competências indispensáveis para a trajetória escolar. Onuchic (1999) afirma que a “resolução de problemas envolve aplicar a matemática ao mundo real, atender a teoria e a prática de ciências atuais emergentes e resolver questões que ampliam as fronteiras das próprias ciências matemáticas”. O ensino por resolução de problemas é o caminho para a formação de cidadãos matematicamente letrado, pois oferece muitas contribuições para a Educação Matemática: As aulas se tornam mais investigativas e interessantes; O estudante se torna protagonista, ficando mais preparado para enfrentar novas situações por ter tido a oportunidade de pensar de forma produtiva; A prática matemática passa a ter mais significado, afinal é aplicada em contextos do cotidiano ou da própria Matemática. Segundo Dante (1988), um problema “é a descrição de uma situação onde se procura algo desconhecido e não temos previamente nenhum algoritmo que garanta a sua solução”. 19 Problemas podem ser apresentados de forma escrita ou oral. Eles são, normalmente, utilizados nas aulas de matemática e retirados de livros didáticos. Para Pereira (1989), o termo “situação problema” designa situações gerais do cotidiano que exigem do indivíduo reflexão para chegarem uma solução. No ambiente escolar, é comum presenciarmos o uso de situações-problema que buscam simular ocorrências reais. Este tipo de exercício é muito produtivo, desde que bem planejado e elaborado. Nos anos iniciais, aproximar situações para que os estudantes se apropriem das estratégias e se apoiem nos conteúdos para resolvê-las é uma abordagem muito eficiente, proporcionando aos alunos uma reflexão para aplicar os conceitos matemáticos em situações simuladas a partir do cotidiano. Você vai observar que, em geral, os materiais que apresentam a resolução de problema, pouco exploram a diversidade e a riqueza dessa proposta, mas se você souber identifica- los, poderá torna-los mais interessantes e desafiadores. Existem diversos tipos de problema, a seguir conheceremos mais a respeito deles: - Problemas convencionais: Os dados são apresentados na ordem em que serão utilizados; as frases são curtas e, para que o estudante resolva, existem, no texto, palavras que explicitam a operação a ser realizada. Em sua viagem a feira, Ana gastou R$ 24,00 para comprar frutas e R$ 13,00 para os demais produtos. Qual foi o valor total desembolsado? Observe que os valores já estão explícitos e na ordem a ser calculados. A palavra-chave “total” indica que se trata de uma adição: - Resolução: 24,00 + 13,00 = 37,00 20 - Problemas não convencionais: Apresentam textos mais elaborados. Os desafios exigem do estudante raciocínio e organização de estratégias. O contexto envolve personagens em situações diferentes, podendo ser resolvidos por diferentes abordagens e, em algumas situações, podem ter mais de uma solução. Cintia tinha 25 lápis. Ela deu certa quantia ao seu irmão e ainda ficou com 35. Descubra quantos lápis foram dados por ela. Observe que esse problema não tem solução, apesar disso, é importante promover esse tipo de situação, assim os estudantes podem argumentar, refletir e chegar a um consenso. A soma de dois números naturais é 15. Quais são esses os dois números? Observe que, nesse caso, não existe uma única solução. Os estudantes podem imediatamente responder 10+5, porém o professor pode questionar e validar outras respostas. Será que existe apenas uma solução? O que acham? Dessa maneira, encontrar todas as soluções possíveis passa a ser um desafio para toda a turma. - Resolução: (Neste caso, existem 8 soluções) 0 + 15 = 15 4 + 11 = 15 1 + 14 = 15 5 + 10 = 15 2 + 13 = 15 6 + 9 = 15 3 + 12 = 15 7 + 8 = 15 21 Carlos tem 5 bolinhas de gude. Flávio tem 4 a mais que Carlos. João tem mais bolinhas de gude que os dois juntos. Quantas bolinhas tem João? Observe que, nessa situação, existem infinitas soluções. Esse é problema que envolve a compreensão das palavras chave “tem a mais”, pois aqui não basta realizar a soma e sim compreender o que está sendo solicitado. - Resolução: Carlos: 5 bolinhas de gude Flávio: 5 + 4 = 9 bolinhas de gude. João: tem mais bolinhas que os dois juntos. Sendo 5+9=14, sabemos que João possui mais de 14 bolinhas. Desta forma, o valor pode ser 15,16,17,18,19,20; enfim. Existem infinitas soluções. 2.4 Teoria dos Campos Conceituais e do Campo Aditivo - Os campos conceituais Existe um consenso de que conceitos são construídos a partir do momento que passam a fazer sentido para o indivíduo, transformando-se em conhecimento. Para que um conhecimento seja consolidado, ele não pode ser pensado isoladamente, pois os conceitos não são compreendidos de forma separada. Os conceitos já adquiridos pelos indivíduos se unem para a construção de novos. Assim, cada indivíduo edifica seu conhecimento. Segundo Vergnaud (1986), os conhecimentos se organizam em campos conceituais e os conceitos só fazem sentido a partir de situações que colocam em jogo conceitos, procedimentos e representações. É importante lembrar que os conhecimentos não são exclusivos do âmbito escolar, consideramos, também, aqueles adquiridos em situações das práticas sociais e da resolução de problemas. 22 Nas práticas sociais e escolares, podemos nos deparar com dois tipos de situações. A primeira demanda o uso de competências já desenvolvidas e prevê uma conduta automatizada para lidar imediatamente com a situação. A segunda exige competências ainda não desenvolvidas e requer do indivíduo um tempo maior para refletir, explorar e avaliar a situação, fazendo uso de diversos esquemas mentais, ou seja, de outros conhecimentos para atuar na nova situação. Gérard Vergnaud, [diretor de pesquisa do Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS) da França], discípulo de Piaget, amplia e redireciona, em sua teoria, o foco piagetiano das operações lógicas gerais, das estruturas gerais do pensamento, para o estudo do funcionamento cognitivo do "sujeito-em- situação". Além disso, diferentemente de Piaget, toma como referência o próprio conteúdo do conhecimento e a análise conceitual do domínio desse conhecimento (Moreira, 2009 apud Franchi, 1999). - Teoria dos Campos Conceituais Não se trata de uma teoria didática, mas sim da compreensão das rupturas para a formação do conhecimento. Para Vergnaud (1996), as diferentes áreas do conhecimento podem ser ensinadas na perspectiva dos Campos Conceituais, por meio de variados problemas, conteúdos, situações, estruturas e relações. Em Matemática, ele concebeu as estruturas aditivas conhecidas como Campo Aditivo e as estruturas multiplicativas conhecidas como Campo Multiplicativo. Uma estrutura, por mais simples que seja, envolve vários conceitos. Um conceito por mais simples que seja, envolve várias situações, portanto vamos tratar de campos conceituais e não de conceitos. 23 - Campo aditivo Segundo Vergnaud (1996), o Campo Conceitual das Estruturas Aditivas é o conjunto das situações cujo tratamento implica em uma ou várias adições ou subtrações ou uma combinação destas operações; também é o conjunto dos conceitos, teoremas e representações simbólicas que permitem analisar tais situações como tarefas matemáticas. No campo aditivo, é importante considerar os métodos que o estudante escolhe para resolver os desafios; diferentemente de uma abordagem tradicional que tem o foco no enunciado, os procedimentos diversos devem ser discutidos e valorizados nas discussões em sala de aula. É na elaboração dos enunciados que podemos diferenciar os problemas, tornando-os mais simples ou mais complexos. Estruturas aditivas envolvem problemas simples de relações entre o todo e suas partes. Esses são os problemas de comparação, onde ocorre um confronto entre duas quantidades para se encontrar a diferença. Vejamos, agora, alguns tipos de problema: Problemas de composição - São aqueles em que as duas partes se juntam para formar o todo. Saiba mais Se você desejar explorar mais sobre a Teoria dos Campos Conceituais, sugiro que leia o artigo “Contribuições da Teoria dos Campos Conceituais para a Formação de Conceitos Matemáticos” Disponível por meio do seguinte link: <encurtador.com.br/klxKL> 24 - Composição – encontrar o estado final Em um jogo, Clarice estava com 23 pontos e, na rodada seguinte, ganhou mais 10. Com quantos pontos ela ficou ao final da rodada? - Composição – encontrar o estado inicial Em um jogo, Clarice estava com alguns pontos, na rodada seguinte, ganhou mais 15, ficando com um total de 46. Qual era a pontuação inicial de Clarice? 10 33 = Estado inicial Acrescentar Encontrar o estado final (indicação no enunciado) + 23 15 46 = Encontrar o Estado inicial Estado final + ? 25 - Composição – encontrar o estado intermediário Em um jogo, Clarice estava com 23 pontos e, na rodada seguinte, ganhou mais alguns, ficando com 49.Quantos pontos ela ganhou? Problemas de transformação - São aqueles em que ocorre uma alteração do estado inicial por meio de uma situação positiva (aditiva) ou negativa (subtrativa) para obter o resultado. - Transformação positiva Ana e João tinham 45 jogos de vídeo game. Ganharam outros 8 de amigos. Quantos jogos eles possuem agora? 45 53 8 = Estado inicial Transformação positiva Encontrar o estado final (indicação no enunciado) ? 49 = Estado inicial Estado final + 23 Encontrar o Estado intermediári + 26 - Transformação negativa Ana e João tinham 45 jogos de vídeo game, sendo que 8 não eram deles. Quantos jogos pertenciam eles? Os problemas de transformação positiva e negativa, também, podem se apresentar quando temos alguma transformação desconhecida, da qual sabemos os estados iniciais e finais. - Transformação positiva – estado inicial desconhecido Ana e João tinham alguns jogos de vídeo game, ganharam mais 7 dos seus tios, ficando com 33. Quantos jogo Ana e João tinham inicialmente? 45 37 8 = Estado inicial Transformação negativa Encontrar o estado final (indicação no enunciado) ? 33 7 = Estado inicial desconhecido Transformação positiva Estado final - + 27 - Transformação positiva – estado intermediário desconhecido Ana e João tinham 45 jogos de vídeo game, ganharam mais alguns dos seus tios, ficando com 53. Quantos jogos eles ganharam? - Transformação negativa– estado intermediário desconhecido Ana e João tinham 45 jogos de vídeo game, doaram alguns para seus primos, ficando com 33. Quantos jogos eles doaram? Os problemas de comparação - São aqueles em que as quantidades entre duas partes são comparadas, relacionando-as. Nesse caso, não existe uma transformação dos valores, o que temos é a ideia de comparação entre os dois estados estabelecidos. 45 53 ? = Estado inicial Transformação positiva desconhecida Estado final 45 33 ? - = Estado inicial Transformação negativa desconhecida Estado final + 28 Nesses tipos de problemas, existe o valor de referência. Para efeito de comparação, o referido em geral é o valor que se busca a partir da relação apresentada. - Comparação – valor de referência conhecido Carlos tinha 35 figurinhas e Antônio tinha 10 a mais que Carlos. Quantas eram as figurinhas de Antônio? Observe que sabemos a quantidade de figurinhas de Carlos, logo ela é o referente. Não sabemos a quantidade de Antônio, logo ela é o referido. A relação dada é “Antônio possui 10 a mais que Carlos”. Nesse caso, a comparação é positiva, portanto temos uma adição. - Comparação – valor de referência e o referido são conhecidos, busca-se a relação Carlos tem 35 figurinhas e Antônio tem 12. Quantas figurinhas Antônio precisa comprar para ter a mesma quantidade que Carlos? Nesse caso, estamos procurando a relação entre a quantidade de figurinhas. Os problemas passam a ser interessantes, quando alteramos a posição da pergunta. Isso gera diversas situações. 29 - Comparação – valor de referência desconhecido e referido conhecido Antônio tem 28 figurinhas. Ele tem 8 a menos que Carlos. Quantas figurinhas tem Carlos? No exemplo acima, o referente é a quantidade de figurinhas de Carlos, o problema evidencia uma perda, porém para resolver essa situação a operação é de adição. 2.5 Teoria dos Campos Conceituais – Campo Multiplicativo Em continuidade com a Teoria dos Campos Conceituais, nossos estudos terão como foco a resolução de problemas, fazendo uso das estruturas multiplicativas. Segundo Vergnaud (1996), as estruturas multiplicativas envolvem diversas situações em que estão presentes a multiplicação e a divisão entre dois números, incluindo a combinação entre essas duas operações. De acordo com Vergnaud (1996), é possível abordar várias classes de problemas no campo multiplicativo. É importante distingui-las para que o estudante possa reconhecer as diferentes estruturas e usar os procedimentos adequados para a solução. Situações associadas à proporção simples: São problemas que envolvem as ideias de multiplicar e/ou dividir. Um pacote de bala custa R$ 3,00. Se Ana comprar 5 pacotes, quanto gastará? 30 - Resolução: O estudante pode fazer a proporção, encontrando as quantidades até chegar em 5 pacotes: 1 pacote: R$ 3,00 2 pacotes: R$ 6,00 3 pacotes: R$ 9,00 4 pacotes: R$ 12,00 5 pacotes: R$ 15,00 Ainda pode fazer diretamente: 1 pacote custa R$ 3,00, logo, ao se multiplicar 5 pacotes por R$ 3,00, obtém-se R$ 15,00. Essa ideia está ligada à multiplicação. A proporcionalidade presente aqui é 1 está para 3, assim como 5 está para 15. Situações associada à proporção: São problemas que envolvem as ideias de multiplicar e/ou dividir. Sérgio comprou 24 camisetas para o time de futebol por R$ 1440,00. Cada jogador vai pagar a sua. Qual o valor de cada camiseta? 31 - Resolução: Os tipos de problema que apresentam essas ideias são os mais comuns nas práticas sociais e os mais frequentemente trabalhados nas aulas de matemática. Situações associada a multiplicação comparativa: São problemas muito utilizados em situações do cotidiano e nas práticas escolares. Carlos tem 35 figurinhas e Antônio tem o dobro. Quantas figurinhas possui Antônio? Nessa situação, temos uma comparação envolvendo o dobro. São problemas de multiplicação comparativa aqueles que envolvem situações de dobro, triplo, quádruplo etc. Antônio tem R$ 45,00. Esse valor é o triplo da quantia que Ana possui. Quanto dinheiro Ana tem? - Resolução: Para saber qual a quantia de Ana, sabendo que Antônio possui o triplo, devemos fazer 45: 3 = 15. Podemos, também, encontrar a terça parte de 45. Nesse problema, temos uma situação de comparação envolvendo a relação triplo/terça parte. 1440 24 - 144 60 00 32 Situações associadas à configuração retangular: São problemas importantes, pois contém uma organização em linha e colunas. O estudante deve perceber que o produto é obtido multiplicando o número de objetos disposto na linha pelo número de objetos dispostos na coluna. Em uma sala as cadeiras estão dispostas em 8 fileiras e 6 colunas. Qual o total de cadeiras nessa sala? - Resolução Os estudantes podem fazer desenhos para representar as cadeiras. Outros podem realizar a operação: 8 x 6 = 48. Esse tipo de situação é pouco desenvolvida na prática escolar, mas é importante, pois poderá contribuir, futuramente, para a compreensão do produto de medidas. Situações associadas à combinação: São problemas que desenvolvem o raciocínio combinatório. Ao trabalhar com essas situações, você está desenvolvendo o conceito de plano cartesiano. 33 Ana vai viajar levando 3 saias e 6 blusas. Quantos trajes diferentes ela pode vestir mudando suas saias e blusas? - Resolução A ideia da combinação é verificar quantos trajes diferentes é possível vestir. Camisas Saias Vermelha Branca Azul Roxo Verde Amarela Lilás (L.V) (L,B) (L, A) (L.R) (L, V) (L, A) Rosa (R,V) (R,B) (R,A) (R,R) (R,V) (R,A) Vermelha (V,V) (V,B) (V,A) (V,R) (V,V) (V,A) Logo, será possível obter 18 trajes diferentes. Conclusão De acordo com a BNCC, o Letramento Matemático deve ser praticado nas aulas de Matemática com o objetivo de desenvolver o raciocínio e a argumentação, a partir dos conceitos, ferramentas e procedimentos matemáticos. O ensino nãodeve se limitar a resolver cálculos e repetir os procedimentos de forma mecânica. É a partir de atividades bem planejadas que se desenvolve as competências que um estudante deve adquirir durante sua trajetória escolar. 34 A resolução de problemas não deve estar centrada, somente na resposta final, mas também no processo cognitivo. O professor deve explorar problemas além dos convencionais para desenvolver as competências cognitivas e socioemocionais de seus alunos. Discutir, refletir e validar a solução são etapas fundamentais para avaliar o processo de consolidação das aprendizagens. Aprendemos que é necessário mobilizar vários conceitos para consolidar o conhecimento. Conceitos estes que vão se constituindo ao longo do tempo. Segundo Vergnaud (1996), é por isso que falamos em Teoria dos Campos Conceituais. Esses conhecimentos vão além do ambiente escolar, pois o indivíduo aprende em todos os ambientes em que está inserido. Essas experiências são utilizadas para desenvolver as competências necessárias para resolver problemas e situações das mais simples às mais complexas. Considerando a Matemática, Vergnaud trata dos campos conceituais aditivos e multiplicativos. O campo aditivo se desenvolve a partir das estruturas aditivas e, em sua perspectiva, a resolução de problemas é um caminho para desenvolver os conteúdos matemáticos, uma vez que, para resolver situações-problema, os estudantes devem se apoiar em conhecimentos específicos da disciplina. Outro aspecto importante é a diversificação dos enunciados dos problemas, pois promove discussões e reflexões desafiadoras em sala de aula. O campo multiplicativo se desenvolve por meio de estruturas multiplicativas, em outras palavras, se aplica a situações que envolvam a multiplicação e a divisão. A aplicação de diferentes tipos de problema, também, contribui para este campo conceitual, pois o estudante pode experimentar situações diversas que contribuem para o desenvolvimento do pensamento matemático. Ao longo do capítulo, foram apresentados exemplos que relacionam a teoria e a prática. 35 Referências: BOALER, J. Mentalidades Matemáticas: estimulando o potencial dos estudantes, por meio da matemática criativa, das mensagens inspiradoras e do ensino inovador. Porto Alegre: Penso, 2008. BRASIL. Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Brasília: MEC/CONSED/UNDIME, 2018. Disponível em: <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/>. Acesso em: 04 jun. 2019. DANTE, L, R. Criatividade e resolução de problemas na prática educativa matemática. Rio Claro: Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Tese de Livre Docência, 1988. FONSECA, M, C, F, R. (org.). Letramento no Brasil: habilidades matemáticas. São Paulo: Global, 2004. MAGINA, S. Contribuições da teoria dos campos conceituais para a formação de conceitos matemáticos. Disponível em: <encurtador.com.br/klxKL>. Acesso em: 22 ago. 2019. MOREIRA, M, A. A Teoria dos Campos Conceituais de Vergnaud: o ensino de ciências e a pesquisa nesta área. Investigações em Ensino de Ciências. UFRGS, v 7(1), p. 7-29, 2002. Disponível em: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/141212/000375268.pdf?sequen ce=1>. Acesso em: 13 ago. 2019. MOREIRA, M, A. Subsídios Teóricos para o Professor Pesquisador em Ensino de Ciências: Comportamentalismo, construtivismo e humanismo. Porto Alegre, 2009. Disponível em: <http://moreira.if.ufrgs.br/Subsidios5.pdf>. Acesso em: 13 ago. 2019. ONUCHIC, L, R. Ensino-aprendizagem de matemática através da resolução de problemas. In: BICUDO, M, A, V. (Org.) pesquisa em educação matemática: concepções e perspectivas. São Paulo: Editora UNESP, 1999. p. 199-218. PEREIRA, T, M. Resolução de Problemas. In: PEREIRA, T, P.(org.) Matemática nas séries iniciais. Rio Grande do Sul: Editora UNIJUÌ, 1989. p. 277-292. http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/ https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/141212/000375268.pdf?sequence=1 https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/141212/000375268.pdf?sequence=1 http://moreira.if.ufrgs.br/Subsidios5.pdf 36 SMOLE, K, S. (org.). DINIZ, M, I. (org.). Ler, escrever e resolver problemas: habilidades básicas para aprender matemática. Porto Alegre: Editora Artmed , 2001. TOLEDO, Marília. Toledo Mauro. Teoria e prática de matemática: como dois e dois. 1° ed. São Paulo: FTD, 2010. P. 120-162 VERGNAUD, G. A Teoria dos Campos Conceituais. In BRUB, J. Didática das Matemáticas. Tradução Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto Piaget, 1996, p.155-191. VERGNAUD, G. Multiplicative conceptual field: what and why? In: GUERSHON, H; CONFREY, J. (1994). (Eds.) The development of multiplicative reasoning in the learning of mathematics. Albany, New York: State University of New York Press, pp. 41-59, 1994. 37 PERCURSOS PARA O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO MATEMÁTICO Apresentação Neste bloco, vamos explorar os grandes temas a serem desenvolvidos nos cinco anos iniciais do Ensino Fundamental. Essas Unidades Temáticas devem ser desenvolvidas de acordo com os objetos de conhecimento e conforme a maturidade do aluno. Para isso, estudaremos alguns pontos essenciais de direcionamento quanto às práticas em sala de aula. Esses estudos, entretanto, não se finalizam aqui, pois é preciso sempre pesquisar e se atualizar para ampliar as possibilidades do seu trabalho junto aos seus futuros alunos. Ao final desse bloco, devemos ser capazes de observar aspectos quantitativos e quali- tativos presentes em diferentes situações; além de estabelecer relações entre eles, utili- zando conhecimentos relacionados aos números; à álgebra; às grandezas e medidas; à geometria; e a probabilidade e estatística. 3.1 Números O número está presente na história e no contexto social. As crianças, ao chegarem na fase escolar já tiveram, de alguma forma, contato com números. É fundamental explorar essas vivências para partir do que os alunos já sabem e ampliar seus repertórios. Nos anos inicias, o ensino dos números é tido como prioridade, tendo como justificativa que as crianças, desde muito pequenas, já realizam contagem e respondem perguntas como: “Quantos anos você tem?”, “Qual o número de telefone da sua casa?” “Qual o número da sua casa?”. É a partir desse conhecimento que o ensino de números se fundamenta, além da apropriação do sistema de Numeração Decimal (SND). 38 Outra justificativa de igual importância é a necessidade da criança ser capaz de articular o uso dos números para outros campos da Matemática como a Geometria; Grandezas e Medidas; Álgebra e Probabilidade; e Estatística. Essa habilidade pode ser extrapolada e aplicada em situações práticas. Objetivo este que pode ser alcançado por meio da resolução de problemas. É possível trabalhar com a correspondência um a um para desenvolver nos alunos a habilidade de contagem. Em outras palavras, desenvolver no aluno a capacidade de estabelecer relações de correspondência entre elementos de duas ou mais coleções por meio da comparação de objetos. A partir da comparação, é possível explorar as quantidades, com questões como “onde tem mais?”, “onde tem menos?”. Podemos fazer isso com o auxílio de imagens com a abaixo e, desta forma, auxiliar os alunos a desenvolver controle sobre quantidade. A organização por meio de agrupamentos sempre facilitou o processo de contagem, principalmente em situações em que se tinha uma grande quantidade de elementos e a correspondência um a um demandaria muito trabalho. Esta estratégia deu origem aos registros e, consequentemente, aos variados sistemas de numeração. Por meio dela, é possível organizar os objetos de forma a não esquecer de nenhum e evitar a contagem de um mesmo elemento mais de uma vez. Vejamos um exemplo: Coleção A Coleção B39 Para desenvolver essas habilidades, é fundamental que o aluno tenha sentido numérico. Esse conceito se define como a capacidade de utilizar recursos para resolver situações que envolvam Matemática, a partir de seus significados. Pode incluir o uso de códigos, a contagem e o valor monetário. Em outras palavras, é a capacidade de reconhecer e lidar com a função social do número nos campos da Matemática. Na segunda metade do século XX, o ensino de números passou por uma forte tendência ao uso de materiais estruturados (material dourado e a barrinhas de Cuisenaire) e de outros objetos que possibilitam o trabalho com a contagem (palitos e fichas). O objetivo era desenvolver o pensamento numérico, passando pela ideia de juntar, tirar e trocar, servindo como uma ferramenta de transição do concreto ao abstrato. Atualmente, existem discussões a respeito do uso desses materiais, pois por meio deles, a numeração ensinada perde suas características fundamentais como a compreensão da posicionalidade. Aspecto importantíssimo para a compreensão dos números. Apesar disso, se planejarmos o uso desses objetos de forma adequada, considerando seus aspectos negativos e atentando-se para não criar obstáculos no percurso de aprendizagem; essa prática pode trazer benefícios. Autores como Lerner e Sadovsky (1996) apoiam o trabalho com números a partir da leitura e escrita com o objetivo de desenvolver a compreensão das regularidades do sistema. Um exemplo seria a relação entre uma coleção de objetos variados e o conceito de valor posicional. A contagem se caracteriza pela utilização dos números para determinar a quantidade de objetos presentas em uma coleção. O uso da oralidade para fazer esse reconhecimento aproxima o aluno e auxilia no processo. Em resumo, o estudante, em voz alta, atribui um número a cada objeto, seguindo uma ordem fixa (um, dois, três...); ao chegar no último item, ele terá a quantidade total de objetos do conjunto. É importante salientar que o fato do aluno ser capaz de realizar a contagem não implica que ele tem a compreensão dos elementos de um determinado conjunto. Objetos agrupado s Objetos espalhados 40 Além de observar as sequências e as regularidades, deve-se explorar as diferentes formas de contagem. Os estudantes podem contar “um a um”, “dois a dois”, e assim sucessivamente, mas sempre fazendo as relações entre os objetos e a quantidade. Os materiais utilizados podem auxiliar nesse processo, porém os conceitos matemáticos necessitam da intervenção do professor para serem construídos. Explorar os números a partir das suas funções é um caminho para trabalhar, não somente o seu aspecto ordinal e cardinal, mas também para pensar no uso dos números, a partir das suas relações e significados. Para aprender os números, não é necessário que a criança já identifique os símbolos numéricos nem que ela tenha uma escrita convencional. Se considerarmos a trajetória e as vivências que ela teve fora da escola, juntamente com seus conhecimentos prévios, seremos capazes de fazer intervenções para sistematiza-los. Saiba mais É sugerida a leitura de “O Fantástico Mundo dos Números: a matemática do zero ao infinito” que está disponível na “Minha Biblioteca”. O livro aborda a história dos números e como se constituíram os sistemas de numeração. Essa leitura vai contribuir para fundamentar seus conhecimentos a respeito dos números. 3.2 Álgebra Segundo a BNCC, a unidade temática álgebra deve ser desenvolvida na escola desde os anos iniciais. Ao trabalhar esse conceito, o foco está no desenvolvimento do pensamento algébrico que é essencial para que o aluno seja capaz de utilizar modelos matemáticos para compreender, representar e analisar as relações matemáticas quantitativas (grandezas) e as estruturas matemáticas. Nos anos iniciais, o estudo da álgebra não se trata de fazer o uso de letras e outros símbolos para essa representação, mas sim de estudar as regularidades e as propriedades que envolvem os objetos matemáticos. Assim, em números, por exemplo, ao tratar da relação de igualde, é possível fazê-la, sem a necessidade de fórmulas ou símbolos. 41 Qual o número que somado com 8 resulta em 13? - Resolução 8 + ___ = 13 Aqui, o aluno precisa encontrar a outra parcela da adição, ou seja, o valor desconhecido. Este problema pode ser resolvido por meio da contagem. A criança fala/pensa: 8, 9, 10, 11, 12, 13. O aluno deve ser capaz de explorar as propriedades das operações presentes no objeto de aprendizagem: 2 x 3 = A partir da observação, o estudante pode explorar o que acontece e, futuramente, generalizar essa propriedade. 6 : 2 = Essa é uma das formas de se explorar as propriedades. 3 x 2 = 6 : 3= 3.3 Geometria A geometria estuda as formas e as relações entre os elementos a partir das figuras planas e espaciais; e da sua posição e deslocamento no espaço. Seu ensino envolve o desenvolvimento do pensamento geométrico nos alunos com o objetivo de ajuda-los a investigar e compreender as propriedades do mundo em que vivemos para, assim, elaborar hipóteses e ampliar o seu repertório para argumentar geometricamente de forma assertiva. 42 O pensamento geométrico envolve processos cognitivos que estão relacionados à percepção, ao trabalho com imagens mentais, abstrações, generalizações, discriminações, classificações de figuras geométricas, dentre outros. A movimentação é uma prática pedagógica importante para a formação deste pensamento, pois desenvolve noções de lateralidade; dentro e fora; e do uso de um ponto de referência para localizar a si mesmo ou outros objetos no espaço. Para esse tipo de prática, o aluno precisa usar o corpo. O registro externo do conteúdo aprendido pode ser feito por meio de desenhos, esquemas ou de forma oral. Outro ponto a ressaltar, é que o ensino da Geometria não se limita às figuras geométricas. Ele envolve, também, o trabalho com espaços; movimentação; e localização de pessoas e objetos no espaço. Também está presente nas práticas sociais e culturais nas quais os conhecimentos geométricos estão presentes nas mais diferentes culturas. O ensino da Geometria pode ser justificado pelas suas inúmeras aplicações práticas que incluem a localização e a movimentação em ruas e cidades; o uso do GPS; o intenso uso do conteúdo em engenharia, arquitetura e artesanato; dentre outros. A aproximação do aluno com a utilidade prática da disciplina permite a construção de relações que levam ao pensamento geométrico. Nos anos 1980, o casal Van Hiele estabeleceu um modelo para organizar o ensino da geometria considerando as habilidades psicológicas dos alunos. Segundo essa teoria, o pensamento geométrico se divide em cinco níveis: Níveis de pensamento geométrico Habilidade Nível 0 Básico - Visualização ou reconhecimento Identificar, comparar, e nomear as figuras geométricas com base em sua aparência global. Nível 1 Análise Analisar as figuras em termos de seus componentes; Reconhecimento de suas propriedades; Uso das figuras para resolver problemas. 43 Nível 2 Dedução informal Compreender deduções formais, entretanto não ser capaz de elaborar as próprias demonstrações; Perceber que uma propriedade depende da outra; Ter percepção da necessidade de uma definição precisa e de que uma propriedade pode decorrer da outra, argumentação, lógica informal e ordenação de classes de figuras geométricas. Nível 3 Dedução formal Ter a capacidade de compreender e elaborar deduções formais e reconhecer as condições necessárias para tal. Nível 4 Rigor Estabelecer teoremas em diversos sistemas e estabelecer comparações dos mesmos; Realizar deduções formais abstratas. Ao longo da escolarização, o pensamento geométrico vai sendo desenvolvido por meioda exploração dos objetos, do espaço e das ações de deslocamento que os alunos realizam quando são propostas a resolução de situações problema. Saiba Mais É sugerida a leitura do primeiro capítulo do livro “O ensino da Geometria na escola fundamental – três questões para a formação do professor dos ciclos iniciais” que está disponível na “Minha Biblioteca” para aqueles que desejarem ter uma compreensão mais profunda das discussões a respeito do ensino da geometria e as dificuldades que os alunos passam ao estudar essa disciplina. 44 3.4 Grandezas e Medidas As medidas são de grande importância para a compreensão da realidade, pois são usadas para quantificar as grandezas do mundo físico. No estudo das medidas, estão presentes as relações existentes entre elas as chamadas relações métricas que são aplicadas em questões sociais e em diferentes áreas do conhecimento. As medidas contribuem para a consolidação do conhecimento de outros importantes tópicos como a geometria, os números e a álgebra. As crianças já têm contato marcações envolvendo tempo, comprimento e quantidade no seu cotidiano, portanto, já sabem indicar coisas como o horário do almoço e quais pessoas são mais altas. Isso, entretanto, não significa que elas já tenham total compreensão dos atributos mensuráveis de um objeto e tão pouco o domínio dos procedimentos de medida. Por esta razão, na escola, é importante que sejam desenvolvidas situações diversificadas para que os alunos possam compreender os atributos do que será medido e o significado da medida. Nas atividades propostas para os alunos, é preciso considerar alguns aspectos fundamentais. Por exemplo, para qualquer atributo mensurável, o processo de medição precisa ser o mesmo. Para que isso seja possível, é necessário escolher adequadamente a unidade de medida. Medir é comparar a unidade escolhida com o objeto que se deseja medir, e, em seguida, verificar a quantidade de unidades e expressá-la por um número. O processo de medição pode utilizar padrões não convencionais ou convencionais. Os padrões de medidas convencionais são utilizados para otimizar a comunicação, mas cabe ressaltar que, para o aluno compreende-los, ele precisa experimentar outros padrões para elaborar hipóteses e fazer escolhas. 45 3.5 Probabilidade e Estatística Nos cinco anos iniciais, a proposta é a de que esses assuntos sejam trabalhados de modo a estimular os alunos a fazerem perguntas, estabelecerem relações, construírem justificativas e desenvolverem o espírito de investigação. Nessa proposta, os estudantes devem ser estimulados a ir além da leitura e da representação gráfica, devem se tornar capazes de analisar, descrever e interpretar sua realidade com base nos conhecimentos matemáticos que possuem. Faz parte dessa Unidade Temática, a análise combinatória, que possibilita ao aluno lidar com situações-problema que abordem diferentes tipos de agrupamento, contribuindo para a compreensão do princípio multiplicativo da contagem. Desenvolver trabalhos com o acaso e a incerteza é bem interessante, pois pode ser feito por meio de experimentos e de observações, coletando e organizando dados. Quanto à Probabilidade, é possível desenvolver propostas que apresentem fatos do cotidiano de natureza aleatória, assim, promovendo a compreensão e a identificação dos resultados possíveis desses acontecimentos. Outro ponto a se destacar é o desenvolvimento do pensamento estatístico que pode ser entendido como as estratégias mentais ligadas a tomada de decisões durante todas as etapas de um ciclo investigativo. Em muitas situações-problema da vida cotidiana, do estudo das ciências e da inserção da tecnologia; a incerteza e o tratamento dos dados estão presentes. O desenvolvimento de habilidades como coletar, organizar, representar e analisar dados em diferentes contextos, implica em fazer julgamentos com boa fundamentação para, então, tomar decisões adequadas. Conclusão Ao decorrer deste bloco, estudamos os grandes temas a serem desenvolvidos nos cinco primeiros anos do Ensino Fundamental. 46 Na unidade temática Números, deve-se considerar que, ao chegarem na escola, as crianças já tiveram contato com números e que é dever do professor partir da exploração desses conhecimentos para ampliar e organizar a aprendizagem. É fundamental planejar todo o trabalho em sala de aula. O uso de materiais manipulativos pode auxiliar nesse processo de construção do número, porém o professor deve ter atenção, pois algumas características do sentido de número não estão explícitas nesses recursos. Como foi determinado pela BNCC (2017), o ensino da álgebra deve se desenvolver desde os primeiros anos do Ensino Fundamental. É importante lembrar que, nos anos iniciais, esse ensino não deve ser feito por meio de uma abordagem com letras ou equações, mas com a proposta de desenvolver o pensamento algébrico, a partir da observação de padrões e propriedades. A respeito da Geometria, aprendemos os caminhos para o desenvolvimento do pensamento geométrico. Vimos, também, que o estudo da geometria está articulado a outros campos da Matemática, não se limitando ao ensino de figuras geométricas. Por fim, compreendemos a importância da movimentação para desenvolver importantes conceitos do pensamento geométrico. Em Grandezas e Medidas, vimos que o ato de medir exige a escolha da unidade de medida adequada. Aprendemos, também, que essa unidade temática está ligada aos números e à geometria. É possível realizar medições em vários contextos como “Área, perímetro, tempo, sistema monetário, dentre muitos outros. Tratamos da Probabilidade e Estatística que, também deve ser trabalhada nos primeiros anos do Ensino Fundamental com a proposta de trabalhar questões do cotidiano, desenvolvendo o raciocínio estatístico e probabilístico. Vimos, por fim, a importância de trabalhar com a incerteza e o acaso, sempre que possível, associadas a situações presentes no cotidiano dos alunos. 47 Referências: BAIRRAL, M, A; GIMÉNEZ, J. Geometria para 3º e 4º ciclos pela internet. RJ: EDU, 2004. BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Apoio à Gestão Educacional. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Brasília: MEC, SEB, 2014. BRASIL. Ministério da educação e do desporto e secretaria de educação fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Primeiro e Segundo Ciclos do Ensino Fundamental. Brasil, 1997. FONSECA, M, C; F, R et al. O ensino de Geometria na escola fundamental: Três questões para a formação do professor dos ciclos iniciais. 3ª ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2001. LERNER, D; SADOVSKY, P. O Sistema de numeração: um problema didático. In: PARRA, C; SIAZ, I.(Org.). Didática da matemática: reflexões psicopedagógicas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996, p.73-155. PIRES, C, M, C. Educação Matemática: Conversas com professores dos anos iniciais. São Paulo: Zapt, 2012. STEWART, I. O fantástico mundo dos números: a matemática do zero ao infinito. São Paulo: Zahar, 2016. VAN HIELE, P, M. Structure and Insight: A Theory of Mathematics Education. 1986. Academic Press. 48 OS JOGOS E O ENSINO DA MATEMÁTICA Apresentação Neste bloco, vamos estudar os jogos como estratégia para o ensino da Matemática, considerando seu caráter lúdico e seu potencial para estimular os estudantes para atuarem de forma ativa no processo de construção de conhecimento. 4.1 A importância dos Jogos nas aulas de Matemática Os jogos são uma das ferramentas que podem ser utilizadas para tornar as aulas mais dinâmicas e estimular a participação efetiva dos estudantes. Seu uso pode contribuir para um trabalho de formação de atitudes como enfrentar desafios, buscar soluções, desenvolver senso crítico, refletir para criação de estratégias,fazer escolhas avalia-las. Essas habilidades são necessárias para a aprendizagem em Matemática. Apesar de todos os benefícios, é preciso ter atenção para a escolha dos jogos e para o seu planejamento. O jogo aplicado sem intencionalidade não tem caráter pedagógico, por isso o professor precisar ficar atento e avaliar o momento certo para sua aplicação. Uma das principais vantagens do trabalho com jogos é a possibilidade de substituir atividades rotineiras. Por meio deles, o estudante participa de forma efetiva do processo de aprendizagem, socializa, interage e desenvolve sua criatividade, agindo como um fator de motivação para os estudantes. Segundo Piaget (apud INFLUENCIAS), a atividade direta do aluno sobre os objetos de conhecimento é o que ocasiona aprendizagem – o jogo assume a característica de promotor de aprendizagem. Ao ser colocado diante de situações de brincadeira, o aluno compreende a estrutura lógica do jogo e, poderá compreender a estrutura matemática presente neste jogo. Para Vygotsky (apud INFLUENCIAS), o jogo é visto como um conhecimento feito ou se fazendo, que se encontra impregnado do conteúdo cultural que emana da própria atividade. 49 Existem três aspectos que justificam a utilização do jogo na sala de aula: o caráter lúdico, o desenvolvimento de operações mentais e as relações sociais acionadas. Todos esses aspectos contribuem muito para o desenvolvimento de competências socioemocionais. 4.2 Como planejar a aula utilizando jogos pedagógicos. Para efetivar o trabalho com jogos em sala de aula, é preciso escolher o jogo e planejar as potencialidades de forma adequada para o que se pretende desenvolver. Desta forma, atribui-se um caráter metodológico e explora-se os objetos pedagógicos necessários para se chegar ao objetivo pretendido. A escolha do jogo deve estar articulada com os tópicos que as atividades rotineiras não foram capazes de abordar completamente, também, pode ser utilizado para iniciar uma abordagem dos objetos de conhecimento. Os materiais devem ser previamente selecionados e deve-se verificar se há material disponível para todos. Em geral, os jogos são realizados em duplas, trios ou grupos, portanto a orientação deve ser clara e acompanhada pelo professor. O controle do tempo é outro aspecto muito importante, pois se for dado tempo demais, é possível que os alunos se dispersem e percam o foco no objetivo. No momento de planejar, é necessário descrever os passos necessários para utilizar os jogos. Por exemplo: Seleção do material ou do jogo; Apresentar o material e problematizar a situação; Explicar como a turma será organizada. 50 Após a escolha do jogo, será necessário explicar as regras. Se interpretar as regras for parte do jogo, deve-se, somente, orientar os estudantes e permitir que eles leiam e discutam as regras. As possíveis intervenções do professor devem constar no planejamento para que o objetivo da aplicação seja alcançado. 4.3 Jogos para desenvolvimento do Cálculo Mental O cálculo mental permite aos estudantes estabelecer relações entre números a partir de suas propriedades. Nessa categoria de jogos, os alunos são estimulados a criar hipóteses a partir das relações dos padrões entre os números. Eles, também, são levados a desenvolver a capacidade de resolver problemas a partir de situações desafiadoras. As atividades que envolvem o cálculo mental, a oralidade e a parte prática dão significado ao exercício, desde que sejam feitas as devidas orientações e intervenções por parte do professor. Nesse sentido, também temos espaço para o desenvolvimento das competências socioemocionais. Os estudantes devem lidar com as emoções e trabalhar a autoconfiança, a empatia e a resiliência. 4.4 Jogos de estratégias Os jogos de estratégias são interessantes, uma vez que desenvolve no estudante a observação, a dedução e a antecipação. Nessa categoria de jogos, os estudantes precisam observar e avaliar a situação antes de tomarem uma decisão, sendo necessário, também, antecipar o resultado. Desta forma, mentalmente, o aluno faz o percurso da jogada com o objetivo de prever o seu desenrolar e, se for necessário, pensa em uma nova estratégia. Alguns jogos de tabuleiro, bingo e dominó podem ser utilizados para essa finalidade quando o objetivo for trabalhar a unidade temática Números. Esses jogos trabalham o raciocínio por meio de habilidades que requerem dos estudantes o planejamento de estratégias, pois não dependem do fator sorte. 51 4.5 Jogos geométricos Esses jogos têm como objetivo desenvolver a habilidade de observação e o pensamento lógico. Para isso, é feito o uso das figuras geométricas, observando suas propriedades e semelhanças. Por meio desse tipo de atividade, é possível desenvolver a observação em relação aos ângulos e as características dos polígonos. Os jogos geométricos podem ser utilizados para iniciar a abordagem em geometria. É possível, também, utilizá-los para consolidar temas já desenvolvido em sala de aula. Dependendo da faixa etária, pode-se trabalhar com a oralidade, desenho e registros. Vale ressaltar que as crianças, ao ingressar no Ensino Fundamental dos Anos Iniciais, já conhecem as formas geométricas, assim, a utilização desses jogos pode ser apropriada para que investiguem as propriedades dessas figuras. Para fazer isso, o professor pode fazer perguntas que mantenham o foco dos estudantes na observação das formas. É possível introduzir conceitos como simetria; semelhança de figuras; área e volume; dentre outros. Apresentamos, a seguir, um exemplo de jogo para essa finalidade: É possível, também, desenvolver atividades usando a tecnologia. A seguir, serão sugeridos alguns jogos que fazem uso desses recursos. Esse jogo tem como objetivo cobrir a área a partir de figuras geométricas. É possível trabalhar o conceito de área. Para atingir o objetivo, os estudantes desenvolvem suas capacidades de percepção e observação. Fonte: Elaborada pelo autor 52 O objetivo desse jogo é encontrar a área dos objetos, considerando a unidade de medida proposta. Ele pode ser acessado pelo link abaixo: https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/eleve-ao-quadrado/ Este jogo apresenta uma proposta semelhante ao anterior, entretanto é adicionado o fator profundidade. Desta forma, trabalha-se o conceito de volume. Ele pode ser acessado pelo link abaixo: https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/ohando-atraves-de-um-prisma/ Conclusão Os jogos que trabalham conceitos matemáticos não desenvolvem, somente, os aspectos cognitivos, pois, também, abordam aspectos emocionais. Desta forma, eles auxiliam no processo de aprendizagem e preparam o aluno a lidar com resultados inesperados. Apesar da grande diversidade de jogos, é necessário planejamento, intencionalidade e objetivos bem definidos para que seu imenso potencial possa ser explorado de maneira satisfatória. Caso esses requisitos sejam cumpridos, esta é, sem dúvida uma estratégia que alcança grandes resultados. Referências: BRASIL. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de Apoio à Gestão Educacional. Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Brasília: MEC, SEB, 2014. https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/eleve-ao-quadrado/ https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/ohando-atraves-de-um-prisma/ 53 MATFIC. Eleve ao quadrado. Jogo eletrônico. Nova escola. Disponível em: <https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/eleve-ao-quadrado/>. Acesso em: 15/08/2019. MATFIC. Olhando através de um prisma. Jogo eletrônico. Nova escola. Disponível em: <https://novaescola.org.br/arquivo/jogos/ohando-atraves-de-um-prisma/>. Acesso em: 15/08/2019. PIAGET, J. O nascimento da Inteligência na Criança. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. VYGOTSKI, L, S. A formação socialda mente. São Paulo: Martins Fontes, 1998. INFLUÊNCIAS dos jogos e desafios na educação matemática. Paraná: dia-a-dia- educação. Disponível em: <http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/1733-6.pdf>. Acesso em: 15/08/2019. 54 ESTRATÉGIAS PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA Apresentação A sala de aula é um ambiente de muitas possibilidades e é responsabilidade do professor transforma-las em situações de aprendizagem. Isso será feito por meio do planejamento e execução de estratégias que buscam ministrar determinados conteúdos. Uma das estratégias é o ensino da História da Matemática que permitirá aos estudantes entrar na história e compreender a evolução da Matemática como uma ciência viva. Quando o aluno compreende a perspectiva cientifica, é possível abordar a Modelagem Matemática. Essa estratégia consiste em mostrar aos alunos que, por meio de modelos matemáticos, é possível estudar tanto fenômenos naturais quanto fenômenos matemáticos. Os fenômenos, também, podem ser trabalhados por meio de outras estratégias. A investigação matemática valoriza o caminho que os estudantes percorrem para encontrar a situação dada. Nesse caso, por se tratar de uma investigação, não é possível prever qual será o resultado. Outra possibilidade é a utilização das tecnologias digitais que, combinada com as demais estratégias, torna o ensino mais dinâmico e possibilita o desenvolvimento das habilidades indicadas na competência 5 da BNCC (cultura digital). Por fim, você terá a oportunidade conhecer, pelo menos, uma prática de cada estratégia, mas lembre-se que esses são, apenas, exemplos e que cabe ao professor pesquisar, ampliar e diversificar as atividades, conforme a estratégia escolhida. 55 5.1 História da Matemática Um dos principais motivadores para ensinar a Matemática, seguindo uma perspectiva histórica é a possibilidade de levar o aluno a reconhecer que a Matemática e uma ciência viva. Em contexto didático, trata-se de uma oportunidade para desenvolver as características específicas do pensamento matemático. O uso da História da Matemática deve ser planejado para desenvolver atividades com o objetivo de construir nos alunos noções básicas de conceitos matemáticos. Essas atividades podem ter um caráter investigativo, se realizadas a partir de pesquisas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) referem-se à História da Matemática como uma forma de olhar os objetos de conhecimento de uma maneira mais crítica, além disso, afirma que: Conceitos abordados em conexão com sua história constituem-se veículos de informação cultural, sociológica e antropológica de grande valor formativo. A História da Matemática é, nesse sentido, um instrumento de resgate da própria identidade cultural. (BRASIL, 1997, p. 34). Assim, é possível fazer uso desse recurso para tornar as aulas de Matemática mais interessantes, em busca de tornar a aprendizagem mais significativa. 5.2 Modelagem Matemática A modelagem é um recurso com grande potencial para a aprendizagem Matemática, considerando que os estudantes têm a possibilidade de entrar em contato com os conteúdos a partir dos fenômenos naturais. Essa estratégia tem como fundamento levar os estudantes a aprender a aprender. Apesar de este ser o foco principal, a Matemática não precisa ser a única disciplina necessária para resolver a situação proposta. 56 Outro fator importante é a organização do trabalho em grupo, permitindo que os estudantes discutam, socializem e desenvolvam a competência da empatia, pois precisarão chegar a um consenso e desenvolver um modelo matemático para resolver a situação proposta. Assim, a competência matemática é exercitada para modelar fenômenos naturais, compreender os dados coletados e realizar outras possíveis ações a partir da aplicação das informações obtidas. 5.3 Investigação Matemática Em uma perspectiva diferente da Resolução de Problemas, a investigação matemática tem como foco o caminho a ser percorrido, sem saber aonde se chegará. O estudante decide qual caminho seguirá, mesmo que seja uma situação já vivida por outros. Não se trata de uma estratégia padrão, mas é benéfica, pois desenvolve a criatividade, a resiliência (quando o caminho escolhido não é o adequado) e a persistência (quando é necessário retornar ao início para percorrer outro caminho). A investigação matemática contribui para o desenvolvimento do pensamento matemático e exige que diversos conhecimentos e competências sejam colocados em prática. No decorrer do processo, o estudante poderá atribuir novos significados à aprendizagem de conteúdo. É preciso desenvolver a organização e o senso de pesquisa, para coleta, organização e seleção dos dados. A partir dos dados estruturados, são exercitadas as habilidades de argumentar e se comunicar matematicamente, por meio da leitura crítica das informações coletadas. A investigação abre possibilidades tanto para o trabalho em grupo quanto para o autônomo. Quando feito em sala, é necessário que se prepare cada aula, definindo objetivos que precisam estar claros para os estudantes. O planejamento precisa levar em conta diversos fatores como se a atividade é individual ou em grupo, qual a faixa etária dos alunos, quais são os conteúdos previstos para esta série. 57 Durante esse processo, o professor deve atuar com orientador, motivando os estudantes a persistirem na execução da tarefa, com boas intervenções. Segundo Ponte (2016), Em contextos de ensino e aprendizagem, investigar não significa necessariamente lidar com problemas muito sofisticados na fronteira do conhecimento. Significa, tão só, que formulamos questões que nos interessam, para as quais não temos resposta pronta, e procuramos essa resposta de modo tanto quanto possível fundamentado e rigoroso. Desse modo, investigar não representa obrigatoriamente trabalhar em problemas muito difíceis. Significa, pelo contrário, trabalhar com questões que nos interpelam e que se apresentam no início de modo confuso, mas que procuramos clarificar e estudar de modo organizado. 5.4 Tecnologias digitais Ainda que não seja comum ver essa prática sendo incorporada ao fazer do professor, é preciso investir na inclusão das tecnologias digitais como recurso da prática escolar. Segundo, PEROVANO, SALGADO E RANGEL (2018): Estudos apontam que as tecnologias de informação e comunicação vêm causando impacto significativo no processo de ensino e aprendizagem nas instituições de ensino, e que a utilização dessas tecnologias deve ser adequada à realidade do educando. O acesso às tecnologias vem ganhando espaço nas salas de aula, levando professores e alunos a mergulharem em novos conhecimentos, mais diversificados e em constante atualização. Ao tratar da tecnologia em Matemática, não podemos nos limitar à discussão do uso da calculadora. É preciso repensar o espaço escolar e agregar as tecnologias digitais. Esse tema está presente na Competência Específica de número cinco da BNCC (2017 p. 263) que se refere a “utilizar processos e ferramentas matemáticas, inclusive as tecnologias digitais disponíveis, para modelar e resolver problemas cotidianos, sociais e de outras áreas de conhecimento, validando estratégias e resultados”. 58 Inserir as tecnologias digitais nas práticas escolares tem como objetivo desenvolver a criticidade, a capacidade de analisar as informações para argumentar, e de disseminar conhecimentos. Assim, a compreensão das tecnologias digitais não pode se limitar ao seu uso, mas deve se tornar uma ferramenta potencial para agregar às práticas em sala de aula. Além disso, com o devido planejamento e objetivos, é possível fazer o uso de calculadoras, computadores, softwares dinâmicos e aplicativos no processo de aprendizagem.
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