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A INFLUÊNCIA NORTE AMERICANA NO GOLPE DE 1964, NO BRASIL: A OPERAÇÃO BROTHER SAM 1 Ingrid do Prado Guimarães 2 RESUMO O artigo busca analisar como os Estado Unidos da América (EUA) influenciaram no golpe de Estado de 1964, que derrubou o presidente brasileiro João Goulart assim como derrubou outros presidentes latino-americanos. Num contexto de Guerra Fria, as circunstancias internas dos países latino-americanos possibilitaram que os interesses norte americanos intervissem na estrutura política dos governos da América Latina através de uma política externa norte-americana intervencionista. Palavras-chave: Ditadura militar, Estados Unidos, golpe de Estado, Operação Brother Sam, Política Externa. 1 INTRODUÇÃO No começo da década de 1960, o conflito bipolar entre o bloco socialista liderado pela União Soviética (URSS) e o bloco capitalista liderado pelos Estados Unidos se acentua depois da morte de Stálin na URSS e da intervenção militar norte- americana no sudeste asiático. Esses acontecimentos reacenderam a disputa expansionista e a corrida armamentista e nuclear entre as superpotências. No meio do conflito bipolar, a América Latina representava um campo particular da rivalidade entre Washington e Moscou. Com a Revolução Cubana de 1959, a política externa norte- americana mudaria completamente suas políticas para os países latino-americanos. A expansão comunista passou a ser a principal preocupação de Washington na região, e assim os governos nacionalistas se tornaram uma ameaça aos interesses da superpotência norte-americana. Ameaça que seria combatida pela diplomacia e 1 Artigo da disciplina de Política Externa Brasileira II, realizado sob orientação do Professor Rafael Balardin, na Universidade Federal do Pampa – Campus Sant’Ana do Livramento. 2 Acadêmica do quinto semestre do Bacharelado em Relações Internacionais, na Universidade Federal do Pampa – Campus Sant’Ana do Livramento. inteligência norte-americana, influência que resultaria em intervenções militares ou golpes de estados pela América Latina. 2 CONTEXTO INTERNACIONAL Com o fim da Segunda Guerra Mundial e o começo da Guerra Fria os países latino-americanos começaram a sofrer influência econômica e política dos Estados Unidos. Os EUA queriam deixar claros seus interesses hegemônicos no continente americano e sua postura anticomunista. Portanto para evitar o avanço socialista os Estado Unidos passaram a dar “apoio aos governos que, independentemente de sua natureza, mantivessem uma postura anticomunista enérgica” (MOREIRA, 2010, p.197), e a favorecer o desenvolvimento capitalista no continente americano através do Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird). Houve descontinuidade nos governos democráticos de alguns países latino-americanos, interrompidos por golpes de Estado civis e/ou militares apoiados internamente por setores populares e externamente pelos Estados Unidos. Além das intervenções diretas os EUA pressionavam os governos latino-americanos indiretamente através de organismos internacionais como a Organização dos Estados Americanos (OEA), tratados como o Tratado do Rio de 1947 (Tiar) e programas como o de Segurança Militar de 1949, estratégias que possibilitaram mobilizar os países latino-americanos contra a ajuda similar do bloco soviético. Com receio de que o Brasil, o maior país do continente sul-americano, se tornasse um regime socialista assim como Cuba em 1959 os Estados Unidos começa a articular uma ajuda militar e logística para a queda de João Goulart caso ele tendesse para a esquerda: a Operação Brother Sam. 3 A INFLUÊNCIA NORTE-AMERICANA NO GOLPE DE 1964 Em agosto de 1961, João Goulart assumia a presidência em meio a crise política deixada pela renúncia de Jânio Quadro. Crise política que culminou na substituição do regime presidencialista pelo governo parlamentarista. A continuidade dos princípios da Política Externa Independente (PEI), desapropriações de companhias norte-americanas (AMFORP, do setor de energia elétrica, e a ITT, de telecomunicações) e as reformas sociais, de cunho nacionalista, foram fortemente questionadas por setores conservadores da sociedade brasileira e pelos lideres estadunidenses. A partir deste contexto os militares começaram a se articular, acusando o governo de João Goulart de ameaça comunista, buscando respaldo com a sociedade civil, empresários e “forças externas” para derrubar o governo. Inicialmente o Departamento de Estado adotou uma política de “cooperação cautelosa” devido a ajuda financeira norte-americana prestada ao Brasil, apesar do caráter independente da política externa brasileira. Buscando manter uma boa relação com o governo brasileiro, o embaixador norte-americano Lincoln Gordon respeitou a posição independente do Brasil na Conferencia da OEA de Punta Del Este: de reatar as relações comerciais com a URSS e de oposição às sanções de Washington contra Cuba. Porém em 1962, a política externa norte americana em relação ao governo Goulart mudou devido à pressão dos setores conservadores da sociedade brasileira. Preocupado com o rumo do Brasil os Estados Unidos, através da CIA e da embaixada americana, passam a colaborar com a oposição do governo Goulart. As autoridades norte-americanas começaram a usar sua ajuda financeira estrategicamente para condicionar e modificar as políticas de João Goulart, e a propagar o fracasso econômico de Goulart através de uma campanha de agitação da opinião pública. Outro meio de intervenção norte-americana na política interna brasileira foi o investimento de aproximadamente cinco milhões de dólares na missão de desestabilizar as eleições parlamentares e estaduais de outubro de 1962. A ajuda militar norte- americana na organização e operação da Escola Superior de Guerra e a revalidação do Acordo Militar bilateral de 1952 confirmavam o potencial de uma intervenção armada no Brasil caso o governo Goulart virasse uma “ameaça comunista”. Uma vez que as políticas de Goulart afetavam os interesses norte-americanos, a diplomacia e os organismos americanos de assistência começaram a intensificar sua campanha de desprestigio do governo brasileiro. A não subscrição das medidas de “auto-ajuda” prescritas pela Aliança para o Progresso e pelos programas de estabilização econômica do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, e a reativação de uma lei de remessas de lucros que afetava o capital estrangeiro gerou uma posição mais agressiva do Departamento de Estado, que deixou claro seus objetivos: “Promover e fortalecer em todos os setores da vida brasileira forças democraticamente orientadas que possam conter os excessos não democráticos ou anti-democráticos de Goulart ou de seus partidários esquerdistas ou ultranacionalistas... e facilitar a sucessão mais favorável possível caso uma crise do regime leve à remoção de Goulart, e em todo caso nas eleições de 1965” 3 O governo de João Goulart passa a sofrer, então, pressão interna e externa. Externamente, os Estados Unidos questionava a sua legitimidade e pressionava para que o governo brasileiro abandonasse suas políticas, como a reforma agrária e a expropriações de empresas. Internamente, os operários e camponeses também criticavam as políticas do governo brasileiro. Preocupado com um possível golpe comunista no Brasil que poderia se propagar para outros países da América Latina, os Estados Unidos começaram a apoiar o golpe do Marechal Humberto Castelo Branco, considerado um “homem de confiança” pelos líderes de Washington, e utilizar os estamentos militares como instrumento de influencia política e ideológica. A estreita relação entre o Departamento de Estado e a Forças Armadas brasileira possibilitou a Operação Brother Sam, movimento militar que incluía a mobilização de uma força navalda sede do Comando Sul Norte-Americano no Panamá para um possível apoio armado no litoral brasileiro caso houvesse resistência. 3. 1 OPERAÇÃO BROTHER SAM No dia 31 de março de 1964, os Estados Unidos aciona a Operação Brother Sam (Irmão Sam), enviando uma frota naval para o litoral brasileiro para auxiliar as Forças Armadas durante a queda do governo Goulart. A ajuda norte-americana no golpe é confirmada pelo seguinte telegrama do embaixador dos Estados Unidos, Lincoln Gordon para Washington (DC): “Nós estamos tomando medidas complementares com os patrocínios disponíveis, visando colaborar com o fortalecimento das forças de resistência. Elas incluem suporte sigiloso para comícios pró-democracia (a próxima grande manifestação será no dia 2 de abril no Rio, e outras estão sendo programadas), discreta referência ao fato de o USG [United States Government] estar profundamente interessado nos eventos, e encorajamento [do] sentimento democrático e anticomunista no Congresso, nas Forças 3 Políticas propuestas para el corto plazo — Brasil. 30/9/63. FRUS, 1961-1963, Vol. XII. Armadas, nos grupos de estudantes e líderes sindicais simpáticos à política norte-americana, na Igreja e no mundo dos negócios. Num futuro próximo, poderemos requisitar modestos fundos suplementares para outros programas sigilosos de ação.” 4 A Operação Brother Sam foi idealizada por Gordon e integrantes do Estado Maior e da Central Intelligence Agency (CIA), e tinha como objetivo oferecer apoio militar e logístico para as forças de resistência. A operação também incluía o abastecimento de petróleo, gasolina e derivados, armas e munição para os anti-Goulart. Telegramas e documentos liberados pela Biblioteca Lyndon Baines Johnson (Universidade do Texas) confirmaram a participação da Casa Branca no golpe de Estado de 1964, no Brasil. Operação historicamente negada por Gordon e demais lideres do governo norte-americano. 4 METODOLOGIA O principal método utilizado para a realização deste artigo foi a revisão bibliográfica. Foram consultados livros, textos utilizados em aulas e artigos disponíveis em revistas ou periódicos online, buscando construir um embasamento teórico mais detalhado sobre o acontecimento. Também foram vistos documentários e vídeos que abordavam a problemática do artigo, sendo que um deles, chamado “O dia que durou 21 anos”, documentário brasileiro sobre a participação do governo dos Estados Unidos no golpe de estado de 1964, no Brasil. Após o levantamento bibliográfico e a análise das informações, pode se afirmar que o governo dos Estados Unidos de fato influenciou no golpe civil-militar de 1964. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Documentos que comprovam a participação dos Estados Unidos em golpes de Estados ou operações de desestabilização de governos nos países latino-americanos são poucos quando não inexistentes, dificultando o estudo sobre um período marcado pela influencia norte-americana na América Latina. O envolvimento dos Estados Unidos no golpe de Estado de 1964, no Brasil, foi inicialmente negado por todas as autoridades estadunidense que afirmavam que o movimento que derrubou Goulart era 100% 4 Rio de Janeiro to State Department, Telegram, No. 48986, March 27, 1964, National Security File, Country File, Brazil, vol. 2, 3/65, Box 9, Lyndon B. Johnson Library. brasileiro e que nenhum funcionário do governo norte-americano esteve envolvido na derrubada de Goulart. Apenas com o tempo os planos dos Estados Unidos, da Operação Brother Sam vieram à tona com os poucos documentos e telegramas confidenciais que antes eram de acesso restrito. Há muito que esclarecer sobre o envolvimento do governo americano no golpe de Estado que aconteceu no Brasil em 1964 assim como nos outros golpes de Estados que aconteceram na mesma época no continente latino-americano REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CERVO, Amado Luiz. História da política exterior do Brasil. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008. GREEN, James N.; JONES, Abigail. Reinventando a história: Lincoln Gordon e as suas múltiplas versões de 1964. Rev. Bras. Hist., São Paulo , v. 29, n. 57, p. 67-89, jun. 2009 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102- 01882009000100003&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 5 jun. 2015. MOREIRA, Luiz Felipe Viel; QUINTEROS, Marcela Cristina; REIS DA SILVA, André Luiz. As Relações Internacionais da América Latina. Petrópolis: Vozes, 2010, p. 232-287.
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