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O USO DE ANIMAIS TAXIDERMIZADOS COMO MATERIAIS DE ENSINO EM FINS DO SECULO XIX E COMECO DO XX

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O USO DE ANIMAIS TAXIDERMIZADOS COMO MATERIAIS DE 
ENSINO EM FINS DO SÉCULO XIX E COMEÇO DO XX 
 
José Maurício Ismael Madi Filho 
P.E.P.G em Educação: História, Política e Sociedade – PUC/SP 
madi.mauricio@hotmail.com 
 
Palavras – chave: Materiais didáticos, Taxidermia, Cultura Material Escolar 
 
Introdução 
 
A pesquisa sobre o uso de animais taxidermizados como materiais didáticos 
parte da inquietação inicial de se tentar compreender sua presença nos Gabinetes de 
Zoologia no Colégio Marista Arquidiocesano
1
. 
Segundo Escolano, a valorização das fontes materiais da escola permite observar 
a cultura escolar, da qual os objetos são reflexos, conforme o autor “a tecnologia não é 
neutra e sua incorporação à prática escolar comporta sempre valores culturais 
incorporados à sua materialidade física e funcional” (Escolano, 2007, p. 18). 
A presença de animais taxidermizados nas prateleiras dos gabinetes de História 
Natural é de grande valor museológico por documentar as práticas sobre a natureza, nos 
estimular a questionar e investigar os processos técnicos aludidos às finalidades e usos 
desses objetos, além de nos permitir indagar o passado escolar em sua relação com a 
cultura geral, mais especificamente, de fins do século XIX e inicio do XX, elucidando a 
compreensão da apropriação desses elementos como materiais escolares. 
A investigação mais aprofundada sobre o assunto levou-nos ao conhecimento de 
que a utilização desses materiais (taxidermizados) não foi uma peculiaridade do Colégio 
Marista Arquidiocesano. 
O objetivo específico deste texto é, portanto, oferecer uma discussão sobre a 
maneira pela qual, animais taxidermizados foram requeridos como materiais escolares. 
Para dar suporte a essa discussão, dividimos o texto em duas partes. Na primeira, 
pretendemos relacionar a renovação do currículo escolar e da metodologia de ensino 
que gerou demanda por novos materiais didáticos, na segunda parte apresentaremos 
brevemente o desenvolvimento técnico da taxidermia, condição imprescindível para a 
formação de coleções zoológicas. 
mailto:madi.mauricio@hotmail.com
 
 
Da renovação curricular e pedagógica da escola 
 
O século XIX é considerado um marco para a renovação do currículo escolar, 
para a modificação e incremento da mobília e da arquitetura escolar, para a implantação 
da seriação escolar, entre outras, para a renovação da pedagogia escolar que implicou 
em considerável aumento dos materiais didáticos. 
A respeito das mudanças curriculares e pedagógicas, Valdemarin (2004) no 
estudo desenvolvido sobre as Lições de Coisas, observou que a renovação dos saberes 
escolares tomou corpo em função do descontentamento veiculado em diversos 
documentos (enquetes, pareceres sobre o ensino) contra o caráter pouco utilitário da 
instrução. Os críticos da educação (europeus e norte-americanos) apontavam que o 
sistema vigente formava alunos com domínios insuficientes em escrita, leitura e cálculo, 
uma vez que o método de ensino era baseado em memorizações, em imposições de 
conteúdos, o que prejudicava a compreensão do alunado (Valdemarin, 2004, p. 103). 
Não apenas a insuficiência metodológica do ensino considerado “tradicional” em 
relação à leitura, à escrita, o cálculo, estava posta, como par e passo a ela, estava sendo 
gestada na escola e desenvolvida na sociedade uma mudança de expectativa sobre o 
saber escolarizado. Não só o método de ensino foi questionado, mas os próprios saberes 
elementares escolarizados até então, foram alvo de descrédito, quanto à 
responsabilidade de formar o que era entendido como o “homem moderno”. 
A reorganização curricular e pedagógica se processou nos diferentes níveis da 
escola, do Jardim da Infância ao Secundário. 
O Ensino Secundário que se embasava no estudo das Humanidades também 
passou por mudanças. Sua formação essencial se fazia pelo estudo das línguas antigas 
(grego e latim), pelos exercícios de memorização, recitação, pelo estudo da gramática e 
da retórica (Chervel; Compère, 1999, p. 149). 
Este tipo de educação postulou sua distância em relação ao utilitarismo, em 
relação às finalidades ligadas ao mundo do trabalho que se industrializava e se 
diversificava. Sua preocupação era com a conformação moral do alunado, pelo estudo 
de textos sacros ou de outros selecionados segundo a conveniência. Seu intuito era 
preparação das elites para a ocupação dos quadros liberais. Esse modelo marcou sua 
hegemonia por mais de quatro séculos, relegando ao ensino de ciências, um caráter 
meramente secundário. 
Esse grau instrucional, que era restrito a uma elite condutora formada por 
notáveis e profissionais liberais, passou a sofrer pressões no sentido de desenvolver e 
abrigar as Ciências em seu currículo muito em função da modificação do perfil da elites, 
favorecida pela ascensão social dos técnicos, dos industriais, dos comerciantes 
(Belhoste, 1996, p. 29). 
 Chervel e Compère (1999) chamam a atenção para o fato de que as Ciências no 
currículo do Secundário estiveram sob a égide das Humanidades, ou seja, seu estudo 
deveria concorrer para a cultura geral do alunado, sem vinculação imediata com o 
mundo do trabalho. 
No entanto, a modificação dos currículos do Ensino Primário e Secundário não 
ocorreu de maneira passiva, segundo Souza (2000) 
 
Disputas e debates marcaram a configuração do currículo do ensino primário e 
secundário no Ocidente, no decorrer do século XIX. Nesse processo estiveram 
em jogo a substituição de uma cultura literária pela cultura científica no ensino 
secundário e a difusão de conhecimentos úteis de natureza social, moral e cívica 
no ensino primário. A renovação pedagógica e a constituição de currículos 
modernos não alteraram, contudo, o caráter de distinção de classe próprio da 
educação burguesa: o ensino secundário de cultura geral para a formação das 
elites e o ensino primário voltado para a formação dos trabalhadores. (Souza, 
2000, p.14). 
 
 
Houve uma considerável ampliação da grade curricular que passou a ser 
composta de novas matérias como: História, Geografia, Desenho, Educação Física, 
Instrução Cívica, Trabalhos Manuais, Ciências Físicas e Naturais, História Natural. 
A renovação curricular foi acompanha de perto pela renovação da metodologia 
de ensino. Se, por um lado, leitura, escrita e cálculo, não satisfaziam mais as exigências 
da sociedade, por outro, o próprio método de ensino calcado na memorização e na 
retórica, foram alvos de críticas durante o século XIX. 
A aquisição, a apropriação do conhecimento é o ponto central que marcou a 
distância entre o dito “ensino tradicional” para o renovado método de ensino. No 
primeiro o conhecimento era apreendido pela memorização e repetição das sentenças, 
uma vez que o conhecimento já estava inscrito nas palavras. No segundo, o 
conhecimento deveria abandonar a retórica verbalista, repetitiva e adotar as coisas, a 
concretude dos objetos e de seus conteúdos para a posterior formulação das abstrações 
dos conceitos. 
A utilização do método intuitivo de Ensino para o Primário e de sua 
generalização metodológica para o Secundário, preconizava o estímulo dos sentidos e, 
sua educação por meio da observação, do contato direto com as coisas, estabeleceu a 
imprescindibilidade das coisas para o desenvolvimento do método. Segundo Souza 
(2007): 
O requisito da observação direta ou das “noções empíricas” devido à 
adoção do método intuitivo levou os profissionais da educação 
daquele período a estabelecerem uma dependência direta entre o 
método e o uso de materiais escolares quase como condição sine qua 
non. Para tudo era necessário material: para o ensino de aritmética, do 
sistema métrico decimal e da geometria: cartas de Parker, compassos, 
contadores mecânicos, quadro de geometria, tabuinhas, contador de 
mão e de pé, caixa de formas geométricas, cadernos de aritmética. 
Para o ensino de linguagem: coleção de abecedáriose de cartões 
parietais para leitura, ardósias, cartas de alfabeto, cadernos de 
caligrafia. Para o ensino de geografia e história: globo terrestre, 
tabuleiros de areia, quadros de história do Brasil, mapas. Para o ensino 
de ciências física e naturais: laboratórios, museus, quadros Deyrolle, 
estampas, quadros de história natural, esqueleto humano, bússola, 
microscópios, peças anatômicas, mapas de física. Para o desenho: 
esquadros, modelo para desenho. Para trabalhos manuais: caixa de 
tornos, pranchetas para modelagem, máquinas de costura (...) Ver e 
ouvir tornaram-se funções fundamentais num modo de perceber a 
apreensão do conhecimento em que a cultura material e visual 
atrelaram-se permanentemente (Souza, 2007, pp. 175 – 176). 
 
 
A ampliação significativa dos materiais escolares foi acompanhada do 
incremento da indústria voltada para o mercado escolar que tanto desempenhou o papel 
de atender a demanda da escola como ensejou a comercialização de seus produtos. 
Um dos locais apropriados para a difusão de novas ideias educacionais, bem 
como, para comercialização de novos materiais, foram as Exposições Universais. As 
Exposições Universais são fenômenos da consolidação do capitalismo. Tendo ocorrido 
primeiramente em Londres em 1851, elas se caracterizavam como a manifestação do 
progresso. Nelas, os mais variados fabricantes expunham seus produtos para os diversos 
ramos da atividade humana, inclusive para a educação que foi um setor que ao longo 
das Exposições foi ganhando sua centralidade (Kuhlmann Jr., 2001) pelos discursos que 
a envolviam como um agente da modernidade e pelo potencial mercadológico de seus 
produtos (mobiliários, padrões arquitetônicos, materiais didáticos, entre outros). 
Em 1862, na Exposição de Londres, a educação passou a dividir o espaço que 
antes cabia à indústria, à agricultura, às artes e à ciência, 
 
desde então, a educação obteve cada vez mais destaque, chegando a ocupar 
espaços privilegiados nessas mostras, obtendo, em algumas delas, o prestígio de 
ser posta como o primeiro grupo na ordem de classificação (Kuhlmann Jr, 2001, 
p. 31). 
 
Já em 1855, na segunda Exposição Universal, o catálogo francês, “Recueil des 
Pièces et Documents Officiels concernant L’Exposition Universelle de 1855” marca a 
presença de fabricantes industriais que comercializavam seus produtos para as Ciências 
e para a Educação. A oitava classe da classificação realizada pelo “Recueil...” era a das 
“Arts de précision, Industries se rattachant aux Sciences et à l’Enseignement” que 
estava dividida em 7 seções. A 6ª seção “Modèles, Cartes, Ouvrages Instruments et 
Appareils destinés à l’enseignement des sciences, des lettres et des arts libéraux” e a 7ª 
“Matériel de l’Enseigenement élémentaire” foram classificadas como destinadas a 
priori ao ensino, ou seja, eram exposições de fabricantes que reuniam produtos para 
serem absorvidos pela escola. Os produtos expostos eram bastante variados, passando 
pelos destinados ao uso ensino da leitura, escrita, cálculo, desenho, música, geometria, 
geografia, mineralogia, ciências físicas, químicas. O material destinado ao ensino de 
zoologia eram coleções e preparações zoológicas de todas as espécies. 
Entretanto, a utilização de preparações zoológicas, em que pese animais 
taxidermizados, requereu um intenso desenvolvimento técnico que foi almejado desde a 
Renascença (Paulus, 1943). Portanto, seus objetivos não buscavam atender as 
prerrogativas da escola. 
 
Desenvolvimento técnico da taxidermia 
 
Taxidermia é um processo que visa a conservação das peles dos animais e seu 
preenchimento com substâncias específicas que, mesmo após a sua a morte, o 
taxidermizado mantêm a aparência de vida. É condição técnica imprescindível para a 
“naturalização” dos animais de forma duradoura. Esta técnica impulsionou os estudos 
da zoologia no século XIX por garantir à longevidade das preparações, por permitir que 
os animais por ela preparados pudessem ficar expostos nos Gabinetes de Zoologia e 
mais tarde, a oferta de animais taxidermizados, acabou sendo absorvida pela escola. 
O significado da palavra é revelador de sua técnica. Formada por radicais gregos 
onde taxi significa forma e derma, pele. Portanto, taxidermia é a arte de dar forma à 
pele. O Nouveau dictionnaire des origines, inventions et découvertes dans les arts, les 
sciences datado de 1827, atesta que taxidermia é um termo novo, criado para exprimir a 
montagem, preparação e conservação dos animais. (Noel; Carpentier, 1827, p. 708). 
Embora o termo fosse novo na época da publicação do referido dicionário, as 
tentativas de conservação dos animais, lhe são muito anteriores. 
O primeiro a documentar qualquer progresso com a conservação dos animais foi 
o naturalista Réaumur (1683-1757). Réaumur compreendeu que a questão da 
conservação dos animais mortos era fundamental para o aumento e durabilidade das 
coleções. O autor indicava que a forma mais correta de trabalhar com os animais era 
descarná-lo e preenche-lo com palha ou lã, ou ainda vestir a pele em um molde próprio 
para a espécie escalpelada, de maneira que conservasse a aparência de vida. 
Aconselhava ainda mergulhar os pássaros em solução alcoólica e depois tratá-los com 
sal, alúmen e canfora. Fornos poderiam ser usados no processo de dessecação. Feito 
todo o processo, os animais estariam prontos para serem guardados em embalagens de 
vidro ou de madeira, totalmente lacrada para evitar a entrada de insetos. Entretanto, a 
conservação sucumbia com o passar do tempo. O prolongado contato com álcool 
deteriorava os animais, o sal e o alúmen juntamente com forno utilizado para secagem 
da gordura, acabavam desfigurando os animais (Farber, 1979, p. 553). 
Turgot (1721 - 1789), outro conhecido naturalista, em Memoire instructif sur la 
maniere de rassembler, de preparer, de conserver et d’envoyer les diverses curiosites d’ 
Histoire Naturelle indicava a desnudação completa e aplicação de alúmen calcinado na 
pele do animal, juntamente com substâncias aromáticas, como pimenta ou cânfora, na 
tentativa de evitar a corrupção das peles pelos insetos. Seus postulados não avançaram 
muito em relação à Reáumur, visto que em seus métodos os animais deveriam continuar 
sendo lacrados em embalagens e mesmo assim, continuavam sendo atacados por 
insetos. 
O naturalista inglês Kuckahn aconselhou o uso de verniz, terebintina, canfora e 
composto seco a base de salitre, alúmen, súlfur, almíscar, pimenta e tabaco. Também 
prescreveu o uso de armação de madeira para o peito dos pássaros e o uso de fios de 
ferro para sustentar o corpo do animal, cedendo-lhe uma pose realista. Posteriormente, o 
pássaro deveria passar pelo forno para sofrer um processo de dessecamento. (Farber, 
1979, p. 555). 
Todavia, ainda que houvesse a preocupação desse naturalista com a montagem 
mais realista do animal ele não poderia ser exposto, deveria continuar sendo guardado 
em embalagens lacradas. 
Corrosivos foram usados para tentar impedir a ação das pragas, mas esses 
produtos acabavam danificando completamente o animal. Era aconselhado descarná-lo 
completamente e, posteriormente, recheá-lo com algodão ou palha e uma pasta 
preservativa feita, além do alúmen e da cânfora, de tabaco, pimenta, dentre outras 
substâncias destinadas a lhes conferirem bom aroma. Entretanto, as conservações 
duravam pouco tempo e os animais logo voltavam a sofrer com a ação dos parasitas. 
Muitas outras substâncias foram utilizadas na tentativa de preservação das peles: 
verniz de terebintina, óleos, essências, nitratos, enxofre, almíscar. No entanto, até a 
primeira metade do século XVIII, todas as técnicas se revelaram insatisfatória para a 
preservação de longa duração e os animais conferiam aos gabinetes de curiosidade, um 
valor efêmero (Paulus, 1943, p.5). 
Ainda que os métodos supracitados não tenham alcançado êxito para a 
conservação dos animais,houve uma constante busca pela melhor técnica, que traria 
resultados mais desejáveis do que os obtidos até então. O interesse pela técnica que 
traria melhores resultados nas preparações extrapolava a orla dos naturalistas e envolvia 
interesse de caçadores, pequenos colecionadores, proprietários de Gabinetes de 
Curiosidades, que se valiam dos animais como um ornamento, como uma peça de 
coleção. Enfim, já no século XVIII havia um mercado consolidado para o animal 
despojado de sua vida no mundo natural e tornado objeto cultural. 
 Marcel Paulus (1943), percorrendo a história da taxidermia, e valendo-se de 
uma publicação de Desallier d’Argenville de 1780, afirmou que, nessa época, havia na 
Europa, cerca de 800 gabinetes de curiosidades de História Natural. Por esse dado, não 
é difícil perceber a inserção cultural que os animais naturalizados possuíam e nem o 
jogo de interesses que estavam por trás da descoberta de um bom método de 
conservação. 
O naturalista francês Manesse (1743 - 1820) ficou conhecido por seus métodos 
representarem um significativo avanço para as naturalizações dos animais. Segundo ele, 
a raiz dos problemas para se evitar que as preparações fossem consumidas por insetos 
não estava na utilização de venenos, mas sim, na eliminação da gordura presente nas 
peles dos animais. Para ele, a gordura em estado de putrefação era o grande chamariz de 
insetos. O naturalista argumentava que a retirada completa da gordura aliada ao 
tratamento da pele, seria capaz de livrar os animais montados dos parasitas. Seu método 
consistia na desnudação completa do animal e na eliminação dos folículos de gordura, 
para posteriormente montar os animais com enchimento (palha, lã ou linho) e 
substâncias aromáticas. Ele atestava que desde que desenvolveu seu método em 1762 
até a 1786 (data da escrita da primeira edição do seu livro) seus animais não foram 
corrompidos mesmo estando expostos, apenas abrigados da chuva (Manesse, 1800, p.8). 
Aqui temos um ponto importante. Manesse não conseguiu que suas preparações 
tivessem a perspectiva de conservação que pudessem atingir muito mais tempo que o 
descrito acima. Entretanto, seu trabalho foi bastante significativo por permitir que os 
animais pudessem ficar expostos e não mais lacrados em caixa ou em vidros. 
Anos mais tarde, Becouer (Farmacêutico em Metz - França) desenvolveu uma 
fórmula para um sabão composta de arsênico. Becouer nunca divulgou sua fórmula em 
vida, entretanto ela foi popularizada no artigo Taxidermie publicado no Nouveau 
Dictionnaire d'histoire Naturelle (1803–1804) redigido por Louis Dufresne, chefe de 
trabalho zoológico do Museu de Paris. Além da eliminação dos folículos de gordura, a 
pele passou a ser tratada com o sabão de Becouer, ou sabão de arsênico. A fórmula 
elaborada com essa substância química garantiu que as peles dos animais não fossem 
mais atacadas por insetos. O uso do arsênico nas conservações e preparações dos 
animais, desde então, foi muito difundido, sendo possível detectá-lo até o fim do século 
XX (Peqnot; Endt, 2002, p. 5). 
O desenvolvimento dos procedimentos técnicos do século XVII ao início do 
XIX permitiu que os animais não fossem degradados pela ação insetívora, garantiu que 
os animais pudessem ficar expostos com perspectiva muito longa de conservação. É 
significativo o fato do termo “taxidermia” ser um termo cunhado no início do século 
XIX. Esse progresso técnico foi muito importante para o desenvolvimento da Zoologia. 
Paulus (1943) narra a taxidermização de um elefante em 1817, feita no Jardin du 
Roy. Segundo o autor, foi fabricado um compasso especial para tirar as medidas do 
animal. O processo de escalpela durou mais de quatro dias e gerou um espólio de mais 
de 280 Kg de pele. Foi feita grande armação de madeira que antes de receber a pele do 
animal, em seu interior ocorreu um jantar para comemorar o procedimento. Ao término 
do trabalho, segundo o documento, foi proferida a seguinte frase: “É assim que se rende a 
aparência de vida a um dos maiores animais do globo, que antes não figurava nos museus senão 
como uma massa hedionda e desprovida de qualquer semelhança com a natureza” (Paulus, 
1943, p. 8). 
As taxidermizações deveriam alcançar a aparência de vida. Para tanto, as preparações 
deveriam representar as atitudes dos animais em vida. Olhos de vidro foram especialmente 
fabricados, com diversos tamanhos e com diversas cores, para serem alocados nos animais. A 
escolha dos olhos deveria ser minuciosa para representar o caráter do animal. 
O desenvolvimento técnico da taxidermia foi acompanhado da preocupação 
estética e artística, pois o animal tanto poderia ser um troféu ou um objeto de decoração, 
como um objeto de estudo em Museus ou em Gabinetes de Zoologia. Para a última 
finalidade, os naturalistas se preocuparam em render a cada exemplar taxidermizado, as 
características inerentes de sua espécie, para que pudessem ser apreciados no animal os 
trejeitos próprios de seu modus vivendi, sendo o objeto, fonte de informação confiável 
da natureza. Tal demanda, implicou no estudo dos animais vivos, de seus 
comportamentos, para posteriormente taxidermizá-los. Essa preocupação de muito 
naturalistas que acabou por unir conhecimento científico e arte. 
O naturalista Amédée Alléon (1889) dizia em seu Nouveaux procédés de 
taxidermie: experimentes et décrits, que a taxidermia foi capaz de conservar nos 
animais mortos, as cores vibrantes de suas penas ou pelos e seu movimentos graciosos. 
Que por meio dela, em um pequeno espaço se poderia reunir numerosos animais que 
povoam o mundo. Alléon insistia que a taxidermia permitia aos naturalistas realizar 
comparações entre animais de continentes diferentes sem sair de seu gabinete e que as 
preparações deveriam retratar os animais em seus aspectos característicos. 
Com efeito, o desenvolvimento técnico da taxidermia permitiu que, em um 
gabinete, em um museu, pudessem ser reunidos vários exemplares da fauna, dando um 
caráter informativo à reunião desses animais. O estudo sobre as características de cada 
animal em relação à representação de suas atitudes na natureza concorreu para que as 
espécies coligidas tivessem também um caráter educativo. 
 
Considerações finais 
 
A renovação curricular da escola nos níveis Primário e Secundário foi 
acompanhada da renovação da metodologia de ensino que requisitava a observação 
direta das coisas e o uso de diversos materiais e instrumentos científicos. 
Nesse ínterim, os animais taxidermizados passaram a figurar nos museus 
escolares e nos gabinetes de História Natural como materiais didático escolar. 
O desenvolvimento da taxidermia não teve, a priori, a finalidade de suprir a 
escola com esse tipo de material, no entanto, esse material foi apropriado pela escola. A 
pedagogia que requisitava objetos para a observação investigativa de professores e 
alunos foi ao encontro de animais taxidermizados. Os animais deveriam ser, portanto, 
observados, descritos isoladamente, depois confrontados com outros indivíduos, a partir 
desse procedimento, surgiria a classificação, segundo a metodologia que preconizava 
partir de um objeto concreto para se chegar ao conceito. 
O Colégio Marista Arquidiocesano investiu muito na reunião de taxidermizados 
nas primeiras décadas do século XX. 
O Colégio Marista Arquidiocesano possui um acervo material de 57 mamíferos, 
6 peixes, 2 anfíbios, 13 répteis, 68 aves, perfazendo um total de 146 exemplares de 
animais. Esse acervo é formado por animais taxidermizados, por esqueletos completos 
ou por parte do esqueleto (crânio, maxilar, pata). 
Os animais taxidermizados dos acervos são os seguintes. 
Exemplares de peixes: 2 Piranhas, 1 Peixe Trombeta. 
Exemplares de répteis: 1 Tartaruga da Mauritânia, 1Tartaruga Europeia, 2 
Jibóias, 1Iguana, 2 Teiús do cerrado, 4 Jacarés Tinga. 
Exemplares de mamíferos: 1 Gambá ou saruê, 1 Tamanduá Mirim, 1Tamanduaí,1 Morcego, 3 Tatus Galinha, 3 Porcos do Mato, 2 Gatos Maracajá, e Iraras, 1 Cachorro 
do Mato, 2 Saguis da Cara Branca, 1 Uacari Vermelho, 1 Cuxiú Preto, 1 Ouriço 
Cacheiro, 2 Esquilos, 1 Furão, 2 Onças pintada, 1 Gato mourisco ou Jaguarundi, 1 Gato 
do Mato, 1 Onça-parda ou Suçuarana. 
Exemplares de aves: 1 Gaviãozinho, 1 Gavião Preto, 1 Gavião Sauveiro, 2 
Gaviões Carijó, 1 Gavião Pega Macaco, 1 Gavião Pomba Grande, 1 Socó Boi, 2 
Socozinhos, 4 Socós Boi, 1 Garça Branca Pequena, 1 Garça Branca Grande, 1 Garça 
maguari ou socói, 1Bigua, 1Urubu Rei, 1 Zabelê, 1 Perdiz, 1 Anu Branco, 1 Alma de 
Gato, 1 Periquito estrela, 1 Arara Vermelha, 1 Saracura Três Potes, 1 Frango D'água 
Azul, 1 Arapaçu Escamoso, 1 Sanhaço Frade, 1 Sanhaço Azul, 2 Gralhas do Campo, 1 
Graúna ou Pássaro Preto, 2 Chopins, 1Anambé Preto, 1 Anambé Azul, 1 Jaçanã ou 
Piaçoca Cafezinho, 2 Queros – quero, 1 Gaivota, 1 Juruva ou Udu, 1 Martim Pescador 
Grande, 1 Jacu, 1 Faisão Dourado, 1 Mutum, 2 Araçaris Poca, 2 Tucanos de Bico Preto, 
1 Tucano Toco, 1 Araçari Castanho, 1 Pica-pau Verde Barrado, 1 Pica pau de topete 
vermelho, 1 Irerê, 1 Pavãozinho do Pará, 1 João Bobo, 1 Jacu Cigana, 1 Socó 
Dorminhoco (Savacu), 1 Galo da Serra, 1 Biguatinga, 1 Coruja de Orelha. 
Uma primeira leitura do material permite constatar que o acervo é bastante 
numeroso, composto por diversos indivíduos. Disso depreendemos o esforço da 
instituição para agrupar um excerto da natureza sob seu domínio. O desenvolvimento 
técnico da taxidermia permitiu que os animais fossem preparados de modo que 
expressassem suas características na natureza e mantivessem a aparência de vida, o que 
incorporou o potencial informativo e educativo às peças. 
 O estudo da Zoologia deveria ocorrer por meio do contato com esse material. 
Professores e alunos poderiam tecer o estudo de muitos indivíduos isolados e 
comparados entre si. O Colégio Marista Arquidiocesano oferecia o em contato com uma 
natureza morta e ao mesmo tempo “vivificada” pelo processo da taxidermia. 
 
Referências 
 
ALLÉON, Amédée. Nouveaux procédés de taxidermie: experimentes et décrits. Paris: 
Éditeur Roret, 1889. 
 
BELHOSTE, Bruno. Réformer ou conserver? La place dês sciences dans les 
transformations de l1enseignement secondaire em France (1900 – 1970). In: 
BELHOSTE, Bruno; GISPERT, Hélène; e HULIN, Nicole (dir.) Les sciences au Lycée. 
Um siècle de reformes des mathématiques et de la physique em France et à l’étranger. 
Paris: Vuibert/INPR, 1996, pp. 27 – 38. 
 
BOITARD, Pierre. Nouveau Manuel Complet du Naturaliste Préparateur: Deuxiéme 
Partie. Manuel Roret. Paris, Librairie Encyclopédique de Roret, 1890. 
 
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http://doc.ocim.fr/LO/LO105/LO.105(1)-pp.04-10.pdf
 
 
 
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Tal instituição iniciou seus trabalhos em 1858 (continua funcionando ainda hoje), acompanhou as 
mudanças dos métodos e a ampliação dos materiais de ensino. Conserva hoje um rico patrimônio escolar 
composto por diversos documentos, entre eles, uma série de objetos que eram destinados às aulas de 
Física, Química, História Natural, entre outras. Para uma compreensão mais aprofundada sobre o acervo 
do Colégio Marista Arquidiocesano, ver: BRAGHINI, Katya; PEDRO, Ricardo T.; PIÑAS, Raquel. 
Memorial do Colégio Marista Arquidiocensano de São Paulo. Invenção, Tradição e Escritas da História 
da Educação no Brasil IV Congresso Brasileiro de História da Educação (CBHE). Vitória, ES, 2011, pp. 
1-11

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