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TESE_FINAL_EUGENIO_FUENTES_PEREZ_JUNIOR

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Universidade do Estado do Rio de Janeiro 
 Centro Biomédico 
 Faculdade de Enfermagem 
 
 
 
 
 
Eugenio Fuentes Pérez Júnior 
 
 
 
 
 
 
Submissão, dominação e resistência dos trabalhadores de enfermagem no 
contexto neoliberal à luz de Pierre Bourdieu 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2019
Eugenio Fuentes Pérez Júnior 
 
 
 
 
 
 
 
 
Submissão, dominação e resistência dos trabalhadores de enfermagem no contexto 
neoliberal à luz de Pierre Bourdieu 
 
 
 
 
 
 
 
Tese apresentada como requisito parcial para 
obtenção do título de Doutor, ao Programa de 
Pós-Graduação em Enfermagem da 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 
Área de concentração: Enfermagem, Saúde e 
Sociedade. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Orientadora: Prof.ª Dra. Helena Maria Scherlowski Leal David 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2019
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
CATALOGAÇÃO NA FONTE 
UERJ/REDE SIRIUS/CBB 
Bibliotecária Adriana Caamaño CRB7/5235 
 
 
Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta tese, 
desde que citada a fonte. 
 
_______________________________________ _________________________ 
Assinatura Data 
 
P438 Pérez Júnior, Eugenio Fuentes. 
 Submissão, dominação e resistência dos trabalhadores de enfermagem 
no contexto neoliberal à luz de Pierre Bourdieu / Eugenio Fuentes Pérez 
Júnior. - 2019. 
 175 f. 
 
 Orientadora: Helena Maria Scherlowski Leal David 
 Tese (doutorado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 
Faculdade de Enfermagem. 
 
 1. Enfermagem do trabalho. 2. Emprego. 3. Precarização do trabalho. 
4. Saúde do trabalhador. 5. Neoliberalismo. 6. Dominação-Subordinação. 7. 
Bourdieu, Pierre, 1930-2002. I. David, Helena Maria Scherlowski Leal. II. 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Faculdade de Enfermagem. III. 
Título. 
 
 CDU 
614.253.5 
Eugenio Fuentes Pérez Júnior 
 
 
Submissão, dominação e resistência dos trabalhadores de enfermagem no contexto 
neoliberal à luz de Pierre Bourdieu 
 
 
Tese apresentada como requisito parcial para 
obtenção do título de Doutor, ao Programa de 
Pós-Graduação em Enfermagem da 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 
Área de concentração: Enfermagem, Saúde e 
Sociedade. 
 
Aprovada em 09 de setembro de 2019. 
Banca Examinadora: 
 _________________________________________________ 
Prof.ª Dra. Helena Maria Scherlowski Leal David (Orientadora) 
Faculdade de Enfermagem - UERJ 
__________________________________________________ 
Prof.ª Dra. Norma Valéria Dantas de Oliveira Souza 
Faculdade de Enfermagem - UERJ 
__________________________________________________ 
Prof.ª Dra. Cristiane Helena Gallasch 
Faculdade de Enfermagem - UERJ 
__________________________________________________ 
Prof. Dr. Ricardo Luiz Coltro Antunes 
Universidade Estadual de Campinas 
__________________________________________________ 
Prof. Dr. José Augusto Pina 
Fundação Oswaldo Cruz 
 
 
 
 
 
 
Rio de Janeiro 
2019 
DEDICATÓRIA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico esta pesquisa a todos os trabalhadores de enfermagem que diariamente se 
dedicam em prol do cuidado aos seres humanos e, que mesmo experimentando pouca 
autonomia e reconhecimento se mantêm resistindo e acreditando na construção de uma 
enfermagem de excelência, e indispensável ao bem-estar das pessoas. 
A todos os parentes e amigos que me incentivaram e de alguma forma contribuíram 
para o meu crescimento. 
AGRADECIMENTOS 
 
 
À minha mãe Lucy de Mendonça Perez e ao meu pai Eugenio Fuentes Perez, pelo 
exemplo de luta e perseverança que sempre me deram, acreditando na educação como 
caminho para o meu crescimento pessoal. Sem dúvida nenhuma sem vocês não teria chegado 
até aqui! 
À minha avó Maria José Machado de Mendonça (in memória), que me preparou para 
enfrentar o mundo e vencer minhas limitações, sempre acreditando em meu potencial. Você 
com certeza é a razão de tudo isso. Quanta saudade! 
À minha madrinha e segunda mãe Antonieta Almeida Paredes, pelo amor, carinho e 
cuidado comigo, e por acompanhar sempre de perto cada passo da minha vida. Muito 
obrigado por ter me ensinar a ser sempre uma pessoa melhor a cada dia. Só você sabe como é 
especial para mim! 
À minha orientadora Prof.ª Dra. Helena Maria Scherlowski Leal David por toda 
paciência, generosidade em todas as etapas de minha formação como pesquisador. 
Aos Professores, Dra. Norma Valéria Dantas de Oliveira Souza, Dra. Cristiane Helena 
Gallasch, Dr. Ricardo Coltro Antunes, Dr. José Augusto Pina, Dra. Márcia Thereza Luz 
Lisboa e Dra. Clarissa Terenzi Seixas, minha gratidão pela disponibilidade de compartilhar 
seus conhecimentos enriquecendo a pesquisa e a minha formação. 
Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem UERJ, pela atenção 
e zelo no atendimento as minhas dúvidas e necessidades acadêmicas. 
A todos familiares e amigos que mesmo distante sempre estiveram na torcida pela 
minha conquista. Cada palavra de incentivo e coragem sempre serão lembradas. Muito 
obrigado pelo carinho de vocês! 
A todos os docentes e amigos do Departamento de Enfermagem Médico Cirúrgica da 
Faculdade de Enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro pelo apoio e 
incentivo. 
Aos docentes da área de Enfermagem Clínica da Faculdade de Enfermagem da 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro por todo carinho e suporte nos momentos de 
dificuldades. Sem o apoio de cada um de vocês não seria possível concluir esta jornada. Muito 
grato por todo carinho e consideração. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Não basta saber ler que “Eva viu a uva”. É preciso compreender qual a posição que 
Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse 
trabalho. 
Paulo Freire 
RESUMO 
 
 
PÉREZ JÚNIOR, Eugenio Fuentes. Submissão, dominação e resistência dos trabalhadores 
de enfermagem no contexto neoliberal à luz de Pierre Bourdieu. 2019. 175f. 
Tese (Doutorado em Enfermagem) - Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do 
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. 
 
O objeto deste estudo são as relações de submissão, dominação e resistência dos 
trabalhadores de enfermagem no sistema capitalista neoliberal sob a ótica do pensador Pierre 
Bourdieu. Objetivos foram: identificar os fatores relacionados à precarização do trabalho de 
enfermagem que constituem em violência simbólica e material impetrada ao trabalhador; 
compreender como se processa a dominação e submissão do trabalhador de enfermagem 
diante das violências vivenciadas em seu cotidiano de trabalho à luz de pensamento de Pierre 
Bourdieu; analisar as repercussões da precarização da força de trabalho da enfermagem para a 
saúde do trabalhador. Estudo do tipo descritivo, exploratório de abordagem qualitativa, 
realizada em uma faculdade de Enfermagem no estado do Rio de janeiro. Participaram 22 
enfermeiros que exerceram suas atividades há pelo menos um ano, em regime de contratação 
precarizado. A coleta de dados ocorreu nos meses de maio a junho de 2018, nos cursos de 
Pós-graduação de uma faculdade de Enfermagem pública no estado do Rio de Janeiro, através 
de entrevista semiestruturada. A técnica utilizada para tratamento das informações foi a 
triangulação de dados. A pesquisa obedeceu aos pressupostos e às exigências da Resolução 
número 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde e foi aprovada sob o número CAAE: 
74414417.6.0000.5282. A triangulação dos dados fez emergir 4 categorias empíricas. 
Vivencias dos trabalhadores de enfermagem relacionada a reestruturação produtiva, 
dominação e submissão do trabalhador de enfermagem, resistênciados trabalhadores de 
enfermagem e mecanismos de contra resistência e repercussões da precarização deste sobre a 
saúde do trabalhador de Enfermagem. Conclui-se que há fatores relacionados com às 
transformações do mundo do trabalho vivenciados pelos trabalhadores no processo de 
precarização laboral que se constituem em violências simbólicas impetradas aos trabalhador e 
que funcionam como mediadoras para captação da subjetividade dos profissionais, 
conduzindo-os à aceitação de condições inadequadas de trabalho e de vida, contribuindo para 
a dominação e a submissão, além de utilizar o medo e a desesperança como elementos que 
imobilizam e desapropriam o trabalhador de suas formas de resistência. 
 
Palavras-chave: Enfermagem. Emprego. Capitalismo. Violência no trabalho. 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
PÉREZ JÚNIOR, Eugenio Fuentes. Submission, domination and resistance of nursing 
workers in the neoliberal context in the light of Pierre Bourdieu. 2019. 175f. 
Tese (Doutorado em Enfermagem) - Faculdade de Enfermagem, Universidade do Estado do 
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2019. 
 
The object of this study is the relations of submission, domination and resistance of 
the nursing workers in the neoliberal capitalist system under the perspective of Pierre 
Bourdieu's thought, whose objectives were: to identify the factors related to the 
precariousness of nursing work that constitute symbolic violence and material imposed on the 
worker; to understand how the domination and submission of the nursing worker is handled in 
the face of the violence experienced in his daily work in the light of Pierre Bourdieu's 
thinking; to analyze the repercussions of the precariousness of the nursing workforce on the 
health of the worker. This is a descriptive, exploratory, qualitative study, carried out at a 
Nursing School in the state of Rio de Janeiro. Twenty-two nurses who worked for at least one 
year participated in a precarious contracting regime. The data collection took place in the 
months of May to June 2018, in the graduate courses of a public nursing faculty in the state of 
Rio de Janeiro, through a semi-structured interview. The technique used to treat the 
information was the triangulation of data. The research obeyed the assumptions and 
requirements of Resolution number 466/2012 of the National Health Council and was 
approved under the number CAAE: 74414417.6.0000.5282. The triangulation of the data 
gave rise to four empirical categories. Experiences of nursing workers related to productive 
restructuring, domination and submission of the nursing worker, resistance of nursing workers 
and counter resistance mechanisms and repercussions of the precariousness of work on the 
health of the nursing worker. It is concluded that there are factors related to the 
transformations of the world of work experienced by the workers in the process of labor 
precarization that constitute symbolic violence imposed on the worker and that act as 
mediators to capture the subjectivity of the professionals, leading them to the acceptance of 
inadequate working and living conditions, contributing to domination and submission, and 
using fear and hopelessness as elements that immobilize and expropriate the worker from his 
forms of resistance. 
 
Keywords: Nursing. Job. Capitalism. Violence at work. 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
 
Tabela 1 – 
 
 
 
Figura 1 – 
 
 
Tabela 2 – 
 
 
Figura 2 – 
 
Tabela 3 - 
Quadro 1- 
 
Produção científica de enfermagem sobre precarização do trabalho de 
enfermagem e sua repercussão para o serviço de enfermagem e a saúde 
dos trabalhadores, por ano de publicação. Rio de Janeiro, 
2017.............................................................................................................. 
Produção sobre submissão e dominação do trabalhador de enfermagem 
no sistema capitalista neoliberal na Biblioteca Digital Brasileira de Teses 
e Dissertações (BDTD). Rio de Janeiro, 2017............................................. 
Mapeamento da produção de teses e dissertações sobre submissão e 
dominação do trabalhador de enfermagem no sistema capitalista 
neoliberal. Rio de Janeiro, 2017.................................................................. 
Esquema representativo da técnica de triangulação de dados. Rio de 
Janeiro, Brasil, 2017.................................................................................... 
Características laborais dos entrevistados. Rio de Janeiro, Brasil, 2018.... 
Demonstrativo de formação das categorias de análise segundo os núcleos 
de significação............................................................................................. 
 
 
 
31 
 
 
32 
 
 
33 
 
97 
99 
 
171 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
 
ABEn 
ANED 
BDTD 
BID 
BVS 
CAGED 
CAPES 
CGT 
CLT 
CNPq 
CNS 
CREMERJ 
CUT 
EPA 
FMI 
IBGE 
LILACS 
MTIC 
OIT 
OMC 
OSHA 
OSS 
PCB 
PNAD 
PSE 
PT 
PUBMED 
 
 
SCIELO 
Associação Brasileira de Enfermagem 
Associação Nacional de Enfermeiras Diplomadas 
Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações 
Banco Internacional de Desenvolvimento 
Biblioteca Virtual em Saúde 
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados 
Conselho Federal de Educação 
 Central Geral dos Trabalhadores 
Consolidação das Leis Trabalhistas 
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico 
Conselho Nacional de Saúde 
Conselho Regional de Medicina 
Central Única dos Trabalhadores 
United States Environmental Protection Agency 
Fundo Monetário Internacional 
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde 
Ministério do Trabalho Indústria e Comércio 
Organização Internacional do Trabalho 
Organização Mundial do Comércio 
Occupational Safety and Health Administration 
Organização Social de Saúde 
Partido Comunista Brasileiro 
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 
Programa Seguro-emprego 
Partido dos Trabalhadores 
Free resource that is developed and maintained by the National Center for 
Biotechnology Information (NCBI), at the U.S. National Library of Medicine 
(NLM), located at the National Institutes of Health (NIH) 
Scientific Eletronic Library Online 
SUS 
TCLE 
UERJ 
UNE 
Sistema Único de Saúde 
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 
Universidade do Estado do Rio de Janeiro 
União Nacional de Estudantes 
 
 
SUMÁRIO 
 
 
 CONSIDERAÇÕES INICIAIS........................................................................... 13 
1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ..................................................................... 38 
1.1 O contexto neoliberal........................................................................................... 38 
1.1.1 A restruturação produtiva....................................................................................... 42 
1.1.2 
1.1.3 
1.2 
1.2.1 
1.2.2 
 
1.3 
1.4 
1.5 
1.5.1 
1.5.2 
1.5.3 
2 
A precarização do trabalho..................................................................................... 
O processo de precarização do trabalho de enfermagem....................................... 
A teoria social e seus conceitos em Pierre Bourdieu......................................... 
Os conceitos de habitus e campo por Pierre Bourdieu........................................... 
O conceito de capital, poder simbólico e violência simbólica por Pierre 
Bourdieu................................................................................................................. 
O contexto histórico, econômico, social e cultural da Enfermagem................ 
Resistência dos trabalhadores no contexto neoliberal...................................... 
A saúde do trabalhador.......................................................................................A saúde do trabalhador no Brasil........................................................................... 
Riscos à saúde do trabalhador no ambiente hospitalar........................................... 
Riscos psicossociais e estresse ocupacional........................................................... 
MÉTODO.............................................................................................................. 
48 
50 
53 
55 
 
60 
65 
69 
80 
83 
87 
89 
91 
2.1 Tipo de pesquisa................................................................................................... 91 
2.2 Campo e participantes da pesquisa.................................................................... 92 
2.2.1 Critérios de inclusão e exclusão............................................................................. 93 
2.3 Aspectos éticos da pesquisa................................................................................. 94 
2.4 Coleta de dados..................................................................................................... 94 
2.5 
3 
3.1 
3.2 
 
3.3 
3.4 
 
Plano de análise.................................................................................................... 
RESULTADOS..................................................................................................... 
Características gerais dos participantes............................................................. 
1ª Categoria – Vivencias dos trabalhadores de enfermagem relacionada a 
reestruturação produtiva..................................................................................... 
2ª Categoria - Dominação e submissão do trabalhador de enfermagem......... 
3ª Categoria - Resistencia dos trabalhadores de enfermagem e mecanismos 
de contra resistência............................................................................................. 
96 
99 
99 
 
100 
129 
 
139 
3.5 
 
4ª Categoria - Repercussões da precarização do trabalho sobre a saúde do 
trabalhador de Enfermagem............................................................................... 
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 
 
139 
145 
 REFERÊNCIAS .................................................................................................. 
APÊNDICE A – Carta de anuência para autorização de pesquisa........................ 
APÊNDICE B – Termo de consentimento livre e esclarecido............................. 
150 
168 
169 
 APÊNDICE C - Roteiro para entrevista e coleta de dados................................... 
APÊNDICE D – Quadro das categoriais analíticas.............................................. 
ANEXO - Parecer consubstanciado do CEP..................................................... 
 
170 
171 
172 
 
 
 
 
 
13 
 
CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
 
Motivações 
 
 
Este estudo tem por objeto as relações de submissão, dominação e resistência dos 
trabalhadores de enfermagem no sistema capitalista neoliberal sob a ótica do pensamento de 
Pierre Bourdieu. O interesse em estudar questões relacionadas à sujeição dos trabalhadores de 
enfermagem vem se desenvolvendo ao longo de minha trajetória profissional. Ou seja, no 
exercício profissional pude observar por diversas ocasiões, situações em que os trabalhadores 
de enfermagem, contratados através de vínculos temporários, assumiam posturas de 
subserviência diante de condições indignas de trabalho, como falta de condições para 
realização das tarefas, trabalho intenso e repetitivo, com número reduzido de profissionais e 
elevada carga de trabalho, além de baixos salários e insegurança devido à falta de estabilidade 
e ausência de garantias sociais e protetivas dos trabalhadores. 
Após concluir a Graduação em Enfermagem em 1995 venho exercendo minhas 
atividades profissionais por quase duas décadas na área gerencial e assistencial de 
enfermagem. Nesse período pude observar tanto no setor privado quanto no público uma 
crescente inserção dos trabalhadores de enfermagem nos postos de trabalho com vínculos de 
contratação temporários, por meio de terceirizações por cooperativas, fundações e 
Organizações Sociais de Serviços de Saúde (OSS). 
A contratação por vínculos não estáveis, principalmente no serviço público, tem sido 
utilizada com frequência pelas esferas municipal, estadual e federal como estratégia para 
reposição imediata da força de trabalho devido ao déficit de profissionais para atender às 
necessidades de saúde da população (SANTINI et al., 2017). O que se observa é a inserção de 
trabalhadores sem seus direitos trabalhistas garantidos e em condição de desigualdade com 
outros profissionais da mesma categoria admitidos por vínculos estáveis, ou seja, aqueles 
admitidos através de concursos públicos e regidos por legislação específica que garantiam 
maior estabilidade, segurança e direitos em relação aos demais. 
Como exemplo, pode-se citar a composição das equipes de enfermagem, 
principalmente nos serviços públicos, onde encontram-se enfermeiros e técnicos de 
enfermagem, admitidos por concursos públicos com direitos trabalhistas e sociais garantidos, 
14 
 
dividindo o mesmo ambiente laboral com profissionais de enfermagem contratados por 
vínculos temporários sem as mesmas garantias. 
Cabe ressaltar que durante minha prática observei que os profissionais de enfermagem 
contratados com vínculos temporários não tinham direito a afastamento do trabalho por 
motivo de doença, quando adoeciam e não compareciam ao trabalho eram demitidos. Os 
contratos não permitiam férias, nem a possibilidade de progressão da carreira. Além dessas 
questões, muitas vezes tinham suas escalas fixadas em finais de semana e feriados, e em 
postos de trabalho que exigiam maior demanda de esforço físico e mental, como setores de 
alta complexidade. 
Como gestor de enfermagem vivenciei as dificuldades de gerenciar o serviço de 
enfermagem em uma unidade hospitalar do Sistema Único de Saúde (SUS), em que a maioria 
da força de trabalho era composta por profissionais em regime precarizado de trabalho. 
Somente uma pequena proporção de trabalhadores estava sob o regime estatutário. Os 
trabalhadores sob o regime de precarização experimentavam insegurança quanto à 
manutenção do emprego, à multiplicidade de vínculos. Vivenciaram desigualdades em relação 
aos trabalhadores de mesmo cargo na instituição, aumento da carga horária de trabalho e 
consequentemente, isso resultava em desmotivação inclusive por causa de baixos salários. 
Os trabalhadores não estáveis como descrito por Zylberstajn, Stein e Zylberstajn 
(2017) em geral recebem menores salários que os demais, fato que acaba por contribuir para 
que o trabalhador tenha dois ou mais vínculos de trabalho como uma estratégia para aumentar 
sua renda. Os baixos salários e a multiplicidade de vínculos, por sua vez, acarretam 
impossibilidade do trabalhador para investir em sua qualificação e aperfeiçoamento, 
contribuindo para que vivencie cada vez mais a dificuldade de manter-se no mercado de 
trabalho. 
Estudos de Felli (2012) e Gomes et al. (2016) descrevem que falta de segurança na 
manutenção do emprego determinada pela não estabilidade do contrato de trabalho faz com 
que haja maior rotatividade de pessoal de enfermagem, pois diante de uma oportunidade 
melhor de trabalho o abandono do vínculo não estável ocorre quase que imediatamente, e isso 
repercute negativamente no processo de gestão do serviço de enfermagem e na qualidade do 
serviço prestado. 
Ao desenvolver atividades de gestão do serviço de enfermagem em uma unidade 
hospitalar de referência de atendimento de urgência, emergência e trauma cirúrgico pude 
observar que a falta de contratação por vínculo estável reforça a alta rotatividade dos 
trabalhadores de enfermagem. Tal condição, inclusive, constitui em um fator limitante para o 
15processo de trabalho da enfermagem com vistas à assistência de qualidade, uma vez que a 
complexidade do serviço de enfermagem exige pessoal com habilidades e competências em 
termos de formação, especialização e treinamento constante. Além da dificuldade de 
manutenção de um grupo de trabalho treinado, a substituição frequente da força de trabalho 
acarreta prejuízos econômicos, devido à perda do investimento realizado no treinamento do 
profissional para a melhoria da qualidade e segurança do serviço prestado, com a saída 
constante de profissionais da instituição. 
Ainda no que concerne à instabilidade relacionada à manutenção do emprego é 
relevante destacar que diante da insegurança, os trabalhadores acabam por submeter-se a 
condições de trabalho indesejáveis, tais como carga horária excessiva, receber menores 
salários e vivenciar a desigualdade de direitos trabalhistas em comparação aos demais 
profissionais da mesma categoria. A admissibilidade de tal realidade laboral se dá pela 
necessidade de sua subsistência (ANTUNES, 2014; ANTUNES; POCHMANN, 2008; 
CASTEL, 2013; FELLI, 2012; GOMES et al., 2016; SOUZA; MENDES, 2016b). 
A convivência entre trabalhadores de enfermagem com vínculos estáveis trabalhando 
em conjunto com outros sob o regime de precarização permitiu observação de 
comportamentos distintos em cada um dos grupos. Via-se nos profissionais sob o regime 
precarizado de trabalho que mesmo diante de condições desiguais e desfavoráveis como já 
citadas, estes apresentavam uma postura de submissão às regras do trabalho, até o limite de 
suas capacidades físicas e emocionais. Ao passo que já os trabalhadores com vínculos estáveis 
eram mais resistentes à imposição de condições de trabalho adversas, embora em 
determinados momentos se apresentassem como agentes que perpetravam aos demais 
trabalhadores as mesmas condições que ora repudiavam, ou seja, reservavam as piores tarefas 
àqueles sem estabilidade. 
Via-se também alguns trabalhadores estáveis reivindicando e não aceitando a forma 
desigual de tratamento, a qual eram submetidos os trabalhadores não estáveis, principalmente 
no que se refere à impossibilidade de afastamento por doença e escalas de trabalho desiguais. 
Ao considerar que essas características observadas no cotidiano dos trabalhadores sem 
vínculos estáveis interferem no processo de trabalho, cabe ressaltar, também, que tais 
condições expõem os trabalhadores a situações de estresse ocupacional, contribuindo, assim, 
para sofrimento no trabalho, adoecimento e aumento no absenteísmo (FRANCO; DRUCK; 
SELIGMANN-SILVA, 2010; GONÇALVES et al., 2015; SELIGMANN-SILVA, 2011). 
Com o objetivo de melhor elucidar minhas inquietações sobre a submissão, dominação 
e resistência dos trabalhadores de enfermagem, sempre presentes como pano de fundo entre as 
16 
 
condições laborais, o processo de trabalho e seus impactos sobre os trabalhadores, ingressei 
no mestrado acadêmico onde desenvolvi a dissertação “Inovações tecnológicas em terapia 
intensiva: repercussões para a saúde do trabalhador de enfermagem e o processo de trabalho”. 
Pude me familiarizar com questões relacionadas aos fatores intervenientes às incorporações 
tecnológicas, à organização do trabalho, à influência da precarização sobre o trabalhador de 
enfermagem e ao processo de trabalho, de forma objetiva e subjetiva (PÉREZ JÚNIOR, 
2012). 
O estudo sobre as inovações tecnológicas permitiu identificar que fatores relacionados 
às condições de trabalho e aos trabalhadores de enfermagem são importantes para a prática de 
enfermagem segura e de qualidade. No entanto, as questões relacionadas às condições 
inadequadas de trabalho, como falta de materiais, falta de manutenção preventiva e corretiva e 
alta rotatividade dos profissionais pela contratação temporária eram obstáculo para a 
capacitação e treinamento em serviço, pois, dificultavam o exercício profissional (PÉREZ 
JÚNIOR, 2012). 
Ao refletir sobre o tema da precarização, como aluno no curso de mestrado, pude 
verificar várias condições relacionadas à baixa valorização da força de trabalho na 
enfermagem. Contratações sem estabilidade, diminuição dos direitos dos trabalhadores, 
condições inadequadas de trabalho como: falta de insumos, sobrecargas e intensificação do 
trabalho são exemplos frequentes no dia a dia dos trabalhadores de enfermagem. Assim, essas 
questões relacionadas ao trabalho me causaram uma inquietação: por que trabalhadores de 
enfermagem mesmo diante de condições inadequadas e/ adversas de trabalho acabam por 
manter uma postura de subserviência? O que me motivou a aprofundar os estudos sobre as 
relações de submissão, dominação e resistência do trabalhador de enfermagem no sistema 
capitalista neoliberal. 
Com base nessa inquietação continuei meus estudos acadêmicos, e, através da leitura 
de estudos relacionados à precarização do trabalho, fui me aproximando da sociologia do 
trabalho por tratar-se de um ramo da sociologia que busca compreender as relações sociais e o 
mundo laboral. Participando das disciplinas oferecidas pelo Programa de Pós Graduação, na 
linha da saúde do trabalhador tive meu primeiro contato com obras Pierre Bourdieu e sua 
teoria social que descreve que a relação social se dá no interior de um segmento do social 
(campo), onde a dinâmica social é regida pelas lutas em que os indivíduos e grupos (agentes) 
procuram manter ou alterar as relações de força e a distribuição das formas de capital 
específico. 
17 
 
 Com apoio dos estudos e reflexões realizados na disciplina: Pierre Bourdieu e a 
produção social da cultura, do conhecimento e da informação comecei a perceber a 
importância dos estudos desse autor sobre a construção da realidade social. Outrossim, 
percebi também como a adequação de é condição sine qua non para compreender dinâmica 
social relacionada à submissão, dominação e resistência dos trabalhadores de enfermagem 
presentes na realidade do trabalho. 
 
 
Objeto e a contextualização do problema 
 
 
As transformações ocorridas no mundo a partir do desenvolvimento tecnológico e 
científico promoveram mudanças no trabalho e nas organizações. A necessidade de 
organizações mais flexíveis, adaptadas para atender novas exigências do mercado globalizado 
e competitivo influenciaram as relações laborais, acirrando a exploração dos trabalhadores 
com novas formas de inserção no mercado, impactando nas dinâmicas sociais, no processo de 
trabalho e na saúde dos trabalhadores (OLIVEIRA et al., 2016). 
O desenvolvimento científico e tecnológico ocorrido no século XVIII, provocou 
transformações socioeconômicas e políticas que atingiram a classe trabalhadora. A Revolução 
Industrial na França, Inglaterra e, tardiamente na Alemanha promoveu o surgimento de uma 
nova fase do capitalismo marcada pela introdução de máquinas no processo de produção. 
Logo, que passaram a substituir a força de trabalho humana com objetivos de produzir em 
larga escala, com menor custo e, consequente, obtenção de maior lucro (MONTAÑO, 2010). 
A principal característica do sistema capitalista de produção é a acumulação de 
riquezas e, para tal, alguns autores da economia clássica foram inovadores em suas épocas ao 
desenvolverem estratégias de organização e controle do trabalho com vistas a obtenção de 
lucro. Frederick Winslow Taylor e Henry Ford, nas últimas décadas do século XIX e início do 
século XX, instituíram formas de controle do trabalho e da produção através do domínio do 
tempo de execução das tarefas e pela inserção, no caso de Ford, das esteiras de produção. 
Ambos promoveram a produção em grande escala aumentando a acumulação de riquezas pela 
exploração do trabalho (RIBEIRO, 2012; SENNETT, 2014; SOUZA; MENDES, 2016). 
 Com a crise do sistema do taylorista e fordista, nos anos 1970, juntamente com a crise 
estrutural do capitalismo, os detentores do capital buscaram novas estratégias para 
lucratividade como aincorporação de algumas características do modelo japonês, que, nesta 
18 
 
época, despontou como modelo vitorioso ao apresentar crescimento econômico por meio da 
reformulação dos processos de produção mesmo em meio à crise do sistema capitalista. O 
modelo conhecido como toyotismo apresentou-se como uma saída à queda do nível de 
produtividade e ao aumento da obtenção de lucro através da flexibilização das relações de 
trabalho e da produção (RIBEIRO, 2015). 
Como características da reformulação do trabalho promovidas pelo toyotismo e a 
inserção tecnológica temos a adoção de práticas como: part time, ou contratação por horas e/ 
ou pequenos períodos, diminuindo o custo da mão de obra, o método kanban que permite um 
controle sobre os detalhes de uma produção, como informações sobre quando, quanto e o que 
produzir e o just in time, sistema de produção caracterizado pela produção sobre demanda 
(RIBEIRO, 2012, 2015). 
Como consequência da reformulação do processo produtivo verifica-se que as relações 
de trabalho também sofreram modificações, tais como: a flexibilização, a liberalização e a 
precarização do trabalho que promoveram: diminuição dos direitos dos trabalhadores, 
acirrando as lutas pelos direitos do trabalho, à diminuição da oferta do emprego e aumento do 
desemprego, aumento da duração da jornada de trabalho, diminuição dos salários e a 
disseminação de práticas que articulam os pressupostos da liofilização organizacional, através 
da eliminação, transferência, terceirização e enxugamento de unidades produtivas, da empresa 
enxuta (lean production), as condições de baixa (ou nenhuma) proteção do trabalhador, que 
despontam como resultado dessa nova configuração do trabalho (ANTUNES, 2012, 2014; 
ANTUNES; PRAUN, 2015). 
Neste contexto, o crescente desenvolvimento tecnológico e a inserção de 
equipamentos cada vez mais avançados impactaram as organizações exigindo reformulações e 
adequações constantes na gestão laboral, tendo como foco principal a exploração da força de 
trabalho como meio para a diminuição dos custos da produção, expansão do mercado e maior 
lucratividade (CASTEL, 2013). 
O desenvolvimento das tecnologias mais avançadas como os computadores, os 
circuitos eletrônicos, a microeletrônica, o microchip, a nanotecnologia etc. somados ao grande 
desenvolvimento das tecnologias de produção, informação e biotecnologia, nos séculos 
seguintes contribuíram para expansão dos mercados consumidores bem como a quebra das 
barreiras protecionistas dos mercado nacionais, que teve início no século XX (ARRUDA, 
2012). 
O processo de globalização e internacionalização do mercado, ocorrido a partir dos 
anos 1970, propagou a necessidade de uma reestruturação no modo de produção do sistema 
19 
 
capitalista. A crise mundial do capitalismo exigiu a substituição dos modelos de produção 
taylorista-fordista por outros modelos mais flexíveis, ajustáveis ao novo modelo de produção 
e acumulação de capitais (LAINO, 2008). 
A crise do capitalismo alavancou a adoção de medidas políticas e econômicas para a 
reestruturação do sistema de acumulação de capitais, conhecido como neoliberalismo. Essas 
doutrinas políticas e econômicas têm por base: a mínima participação estatal na economia, a 
pouca intervenção do governo no mercado, principalmente promovendo a redução da 
proteção social do trabalho, a adoção de políticas de privatização de empresas estatais, a livre 
circulação de capitais, a desburocratização do estado, a diminuição do tamanho do estado 
exceto no que diz respeito aos aparelhos de repressão, o aumento da produção, ou seja, a 
desregulamentação do mercado e do trabalho e a ampla defesa dos princípios econômicos do 
capitalismo, tornando as empresas mais flexíveis (ANTUNES, 2012, 2014; ANTUNES; 
PRAUN, 2015; LAINO, 2008; SOUZA; MENDES, 2016b). 
A flexibilização das organizações caracteriza-se por uma série de estratégias 
implementadas a partir da reestruturação produtiva, que tem por objetivo alterar as 
regulamentações do mercado e das relações de trabalho dentre as quais está a precarização do 
trabalho (SOUZA; MENDES, 2016b). 
Para Castel (2013), a precarização do trabalho é um processo decorrente da evolução 
do capitalismo moderno que diante das novas exigências tecnológicas e econômicas apresenta 
três aspectos importantes: a desestabilização dos trabalhadores estáveis, a instalação na 
precariedade de diferentes trabalhadores e o aumento do desemprego. 
A precarização da força de trabalho no contexto da acumulação flexível do capital é 
caracterizada por contratos de trabalho não regulamentados, trabalhos informais, modalidades 
diferenciadas de emprego como terceirizações e contratos temporários, todos com redução 
dos direitos e garantias sociais dos trabalhadores. Ademais, a precarização caracteriza-se pela 
descontinuidade do trabalho, a incapacidade dos trabalhadores no controle sobre as tarefas, a 
falta de proteção do trabalhador e a baixa remuneração (ANTUNES, 2012, 2014; ANTUN 
 I ; MACHADO; PENA, 2011; OLIVEIRA et al., 2016). 
No Brasil, a reestruturação produtiva ganha maior visibilidade a partir da década de 
1990 com a implementação da agenda neoliberal estabelecida pelos países centrais e imposta 
aos países em desenvolvimento para manutenção do sistema capitalista. A reforma política, 
social e econômica adotada no país, sob a égide de promover o desenvolvimento, adotou as 
seguintes exigências do capital internacional: a abertura do comércio, a desregulamentação 
dos processos produtivos e das relações de trabalho, incentivando a flexibilização das 
20 
 
organizações e tendo a precarização do trabalho como principal estratégia de exploração da 
força de trabalho (ANTUNES, 2012, 2014; MONTAÑO, 2010). 
A herança deixada ao Estado brasileiro pela ditadura militar, devido à falta de 
investimentos externos, o baixo crescimento do país após 1974 e a crise da dívida externa 
com graves consequências econômicas e sociais favoreceu a adoção do ideário neoliberal com 
a imposição de ajustes macroestruturais. Ajustes que culminaram em fragmentação do 
trabalho, adoção de contratos por terceirização, redução da interferência do Estado na 
economia, redução de postos de trabalhos, diminuição da proteção jurídica nas relações de 
trabalho, retração das organizações sindicais e substituição das políticas universalistas por 
políticas focalizadas e implementadas através de parcerias público-privadas sob o argumento 
de serem essas mais eficientes (ANTUNES, 2012; ANTUNES; SILVA, 2004; VIEIRA; 
CHINELLI, 2013). 
Nas décadas seguintes, o processo de reestruturação política e econômica brasileira 
desenvolveu-se afetando todos os setores de produção até a atualidade. O setor saúde também 
sofre direta e indiretamente com as alterações advindas da reestruturação produtiva neoliberal, 
uma vez que age de forma nociva nos vínculos de trabalho, principalmente pelo enxugamento 
da máquina pública, diminuindo a oferta e a qualidade do serviço prestado (AMORIM et al., 
2012). 
O setor saúde é um importante ramo da economia brasileira gerando mais de 10% da 
massa salarial do setor formal, em torno de 3,9 milhões de postos de trabalho. O uso intensivo 
e diversificado de mão de obra é outra característica marcante do setor, e a esfera pública 
representa o seu maior empregador. No entanto, devido à inserção de trabalhadores por meio 
de outras modalidades que não o concurso público, como estipulado pela Constituição Federal 
de 1988, o Sistema Único de Saúde enfrenta um grave problema, isto é, a precarização do 
trabalho em áreas essenciais que deveriam ser estruturadas por profissionais qualificados e 
inseridos diretamente nele. No entanto, verifica-se um considerável volume de contratações 
de serviços por terceirizações (MACHADO; VIEIRA; OLIVEIRA, 2012). 
Sabe-se que o direito à saúde para todo brasileiro foi consolidado após a Constituição 
Federalde 1988, por meio do SUS, regulamentado pela lei n. 8.080/90. Sua idealização e 
construção consiste em uma conquista social decorrente do movimento de reforma sanitária 
desencadeado durante a redemocratização do Estado e que trouxe avanços à saúde pública 
brasileira, especificamente no âmbito de sua organização (SCHIMITH et al., 2017). Nesta 
perspectiva de ordem social, o atual sistema de saúde foi concebido em consonância com um 
21 
 
conjunto de necessidades sociais de saúde as quais imprimem um caráter ético-moral que 
defendem a saúde como direito de todo cidadão. 
A fim de que se cumpra a premissa de manutenção da ordem social prevista na 
constituição e que no âmbito da saúde, além da assistência desta, envolver a seguridade e 
assistência social, é imprescindível a atuação da enfermagem enquanto prática social. Neste 
contexto o trabalho da enfermagem é um componente fundamental nos sistemas de saúde, 
considerando a complexidade e as expectativas em torno das demandas de saúde da 
população. Sua abrangência envolve ações de promoção da saúde, prevenção, tratamento, 
reabilitação e monitoramento, além de controle de doenças crônicas, tanto em nível local, 
regional e nacional quanto internacional. Portanto, compreende ações que são construídas nos 
campos social e político (BACKES et al., 2014). 
Ainda no que diz respeito ao papel social do trabalhador de enfermagem, cabe 
ressaltar que a enfermagem no espaço nacional, assim como no internacional, vem ampliando 
seu espaço de atuação e assumindo cada vez mais posições decisivas e proativas no que se 
refere às necessidades de cuidado da população em suas diferentes dimensões. Assim, o 
cuidado de enfermagem é, portanto, um componente fundamental no sistema de saúde local, 
que apresenta seus reflexos a nível regional e nacional (BACKES et al., 2012). 
Backes et al. (2012, p.224) descrevem que “o cuidado de enfermagem se configura 
como prática social empreendedora pela inserção ativa e proativa nos diferentes espaços de 
atuação profissional, principalmente, pelas possibilidades interativas e associativas com os 
diferentes setores e contextos sociais” 
Souza e Mendes (2016), ao tratar do serviço de enfermagem no âmbito do sistema de 
saúde, descrevem que o trabalho de enfermagem é uma prática social do setor de serviços 
constituindo-se no âmbito do trabalho em saúde. Também é realizado nos diversos meios em 
que o processo de cuidado se faz necessário ao ser humano, utilizando como instrumento as 
práticas desenvolvidas nos pilares da clínica com objetivo de prevenir agravos, promover a 
saúde, atenção e reabilitação. 
No entanto, a prática de enfermagem depende diretamente da inserção de seus 
trabalhadores no sistema de saúde, porém a falta de políticas públicas consistentes para 
disponibilizar e regular a oferta de trabalho no SUS contribui para flexibilização das relações 
de trabalho na área pública. Nas últimas décadas, a adoção de modalidades de contratação de 
profissionais de saúde com vínculos não estáveis no serviço público. Desta forma, 
trabalhadores são contratados pelo órgão público, por meio de um vínculo temporário ou 
22 
 
informal, ou, ainda, através de terceirizações, ou organizações sociais de serviços (MORICI; 
BARBOSA, 2013). 
O trabalhador de enfermagem também foi afetado pela reestruturação do trabalho na 
saúde. A empregabilidade da equipe de enfermagem apresentou aumento após a expansão do 
SUS, mas acompanhada de uma maior precarização das relações de trabalhos e acarretando a 
multiplicidade de vínculos e o comprometimento dos direitos trabalhistas (SILVA et al., 
2013). 
Os trabalhadores da saúde, principalmente os de enfermagem, convivem 
rotineiramente com duplas ou triplas jornadas de trabalho, exercendo suas atividades com 
baixos salários e sem seus direitos trabalhistas garantidos. Somado a isso, vivem a constante 
ameaça de perda do emprego, condições tais que intensificam a submissão desses 
trabalhadores no processo de precarização e admissibilidade de condições indignas de 
trabalho (MACHADO; VIEIRA; OLIVEIRA, 2012). 
A precarização do trabalho por suas características de dominação do trabalhador 
através da insegurança, incerteza, sujeição, competição, proliferação da desconfiança e do 
individualismo, sequestro do tempo e da subjetividade acaba por afetar as demais dimensões 
da vida do trabalhador. Além de produzir desestabilização e vulnerabilidade social, com perda 
da autoestima, corrosão dos sistemas de valores e, em alguns casos, acarreta adoecimento 
físico e mental (FRANCO; DRUCK; SELIGMANN-SILVA, 2010). 
As repercussões da precarização sobre as relações do trabalho são mediadas no âmbito 
político pela objetivação do ideário neoliberal através da redefinição do papel dos Estados 
Nacionais, especialmente no que tange às mudanças realizadas na regulamentação jurídica das 
relações de trabalho, tendo como diretrizes o baixo investimento público, a descentralização e 
regressão dos direitos sociais, contribuindo assim para a vulnerabilidade social do trabalhador. 
Neste contexto, a adoção do ideário neoliberal no campo político permite a execução de 
estratégias como: a redução da força de trabalho, a regulação do mercado através de livres 
negociações, a contratação por vínculos sem garantias sociais, com remuneração mais baixa e 
com maior carga horária, corroborando, assim, com a precarização do trabalho (ANTUNES, 
2012, 2014; BREWER et al., 2012; JONES; SHERWOO I I 
 ; MACHADO; PENA, 2011). 
No campo econômico, a adoção da pragmática neoliberal, utilizando-se da 
precarização tem promovido a superexploração da força de trabalho determinada pela 
coexistência entre baixos salários, jornadas de trabalho prolongadas, sobrecarga de trabalho 
com fortíssimo aumento no ritmo e na intensidade, diminuição da força de trabalho e aumento 
23 
 
no desemprego estrutural. Em tais condições acirra-se a competição entre os trabalhadores; há 
a proliferação do individualismo e barateamento da força de trabalho traduzida em baixos 
salários, reforçando com isso, a submissão do trabalhador diante do risco de ter sua 
subsistência ameaçada pela falta de emprego (ANTUNES, 2012, 2004, 2014; ANTUNES; 
POCHMANN, 2008; FRANCO; DRUCK; SELIGMANN-SILVA, 2010; PINA; STOTZ, 
2015). 
A livre regulação do mercado sobre o trabalho, proporcionada principalmente pela 
política de mínima intervenção do estado como esfera reguladora de proteção do trabalhador, 
é outra repercussão econômica da precarização que subordina o emprego às demandas 
geradas pelo capitalismo. Desse modo, o trabalhador tem sua subsistência e a manutenção de 
suas condições de vida dependentes de mediações do mercado de trabalho, externas à sua 
vontade (LAINO, 2008; MI ; MACHADO; PENA, 2011). 
Ainda no contexto econômico, ressalta-se que tais mediações da precarização impõem 
ao trabalhador a noção de “trabalho livre” do sistema do capital ou seja, o trabalhador mesmo 
destituído do controle do processo produtivo, recebe pela alienação de sua capacidade de 
trabalho, por um determinado tempo, um salário para reconstituir e manter sua capacidade 
produtiva e dessa forma garante a continuidade da oferta da força de trabalho sempre que o 
capital dela demandar, tendo por base a separação do indivíduo que trabalha e suas condições 
de trabalho, condição imprescindível para que o trabalhador possa vender sua força de 
trabalho. Desta forma, torna o ser que trabalha a mais miserável das mercadorias (CEOLIN, 
2014). 
 Esta noção de que o trabalhador pode escolher livremente trabalhar ou não, é 
incorreta na medida em que não considera que diante da falta de emprego a única escolha 
possível e a de aceitar o trabalho nas condições em que são oferecidos ou o desemprego. 
Assim, é nessa tensão entre liberdade de escolha e necessidade de subsistência e que se 
produzem as formas de exploração, submissão.No campo social, as influências políticas e econômicas da precarização sob a égide do 
modelo neoliberal promoveram além da restruturação da produção a restruturação das classes 
sociais. O crescente desemprego e as perdas dos direitos sociais, contribuíram para 
intensificar as lutas de classes, ou seja, entre a chamada classe dominante, detentora do capital 
e a proletária assalariada, que tem sua subsistência baseada na venda de sua força de trabalho 
(ALVES, 2011a; LAINO, 2008; MONTAÑO, 2010; MUSTAFA; BENATTI, 2010). 
Ressalta-se nesse contexto a compreensão do sociólogo Rui Braga, pois descreve a classe 
24 
 
proletária precarizada como a fração mais mal paga e explorada do proletariado urbano 
(NETO, 2013). 
 Além das questões coletivas, a restruturação das relações entre trabalho e capital 
promoveram nos trabalhadores o estímulo ao individualismo e a competitividade sem limites. 
No que se refere à empregabilidade, os trabalhadores são submetidos tanto às exigências do 
mercado de trabalho quanto à especialização, à capacitação permanente e à 
multifuncionalidade. Desta forma, a precarização promove uma divisão de duas categorias de 
trabalhadores: os que estão aptos a atender as exigências do mercado e os que não possuem 
qualificações e acabam excluídos, formando, assim, um grande contingente de desempregados 
(ANTUNES, 2014; ANTUNES; POCHMANN, 2008; FRANCO; DRUCK; SELIGMANN-
SILVA, 2010). 
Outro aspecto relevante no contexto social e que tem repercussões sobre a 
subjetividade dos trabalhadores é a questão da desfiliação social proposta pelo sociólogo 
francês Robert Castel (2013). Ao analisar a restruturação das relações de trabalho e o contexto 
social, o sociólogo aponta que esse processo tem contribuído para o desenvolvimento da 
sociedade assalariada que depende da venda de sua força de trabalho para a subsistência, 
configurando uma nova questão social, marcada pela substituição do trabalho estável pela 
precarização do trabalho e pelo desemprego. 
 Neste aspecto, Castel apresenta a vulnerabilidade social e desfiliação como 
consequências das transformações do mundo do trabalho: 
O trabalhador vulnerável, consistem na verdade, naquele empregado que pode ser 
demitido a partir de qualquer necessidade da empresa e se tornar como consequência 
um desfiliado, caso esta ruptura do vínculo com o mercado de trabalho seja 
duradoura o suficiente para impactar as relações sociais mais amplas que cercam 
este trabalhador e que significam a sua outra ponta de integração e coesão social 
(laços familiares, de parentesco, redes de amizade, etc) (BRANDÃO, 2009, p.147). 
 
Para Alves (2011) a precarização do trabalho contemporâneo seria não apenas um 
processo de degradação das atividades e do profissional como força de trabalho, mas do 
indivíduo, por meio de um novo metabolismo social do trabalho que se utiliza da fragilidade 
das relações como estratégia para tonar-se domável, complacente e submissa à força de 
trabalho. Assim, compreender a dimensão da barbárie social contida no processo de 
precarização do trabalho e nas condições da crise estrutural do capital poderá contribuir para 
esclarecer a submissão dos trabalhadores de enfermagem em condições tão adversas. 
Precarização vem sendo tratada na literatura como o processo decorrente da crise do 
capitalismo e caracterizada pela desregulamentação do estado sobre o trabalho e com 
prejuízos ao processo de trabalho e a saúde dos trabalhadores (ALVES et al., 2015; BILA, 
25 
 
2008; BREWER et al., 2012; DRUCK, 2011; FARIA; DALBELLO-ARAUJO, 2011; 
FRANCO; DRUCK; SELIGMANN-SILVA, 2010; GOIS, 2010; GONÇALVES, 2013; 
GONÇALVES et al., 2015; GUIMARÃES, 2009; JONES; SHERWOOD, 2014; PÉREZ 
JÚNIOR, 2012; RIBEIRO et al., 2014; SANTOS, 2007; SOUZA, 2015; VIEIRA; 
CHINELLI, 2013). 
Poucos estudos dedicaram-se a analisar as relações de poder, de submissão e 
dominação no contexto da precarização do trabalho. O estudo de Pereira (2000) concluiu que 
o hospital é o local onde imperam as relações de dominação, sendo a mais frequente a forma 
simbólica. No entanto, ressalta-se que o estudo se refere às relações entre profissionais de 
saúde e usuários do serviço. Busanello (2012) descreve que a submissão hierárquica e de 
valores que o enfermeiro está subordinado ao sistema produtivo neoliberal evidenciou-se em 
uma relação de alienação e opressão, resultando nos comportamentos de autoproteção, de 
redundância e de dominação dos trabalhadores de enfermagem. 
Observa-se que como consequência do modelo neoliberal e de precarização do 
trabalho sobre o processo produtivo foram identificadas repercussões negativas. Na saúde dos 
trabalhadores de enfermagem, por exemplo verifica-se: estresse, taquicardia, hipertensão 
arterial sistêmica, sonolência, esgotamento físico e mental, depressão, fadiga, cefaleia, dor 
epigástrica, irritabilidade (GONCALVES et al, 2014). 
Outro aspecto relevante no que diz respeito aos impactos gerados pelas contratações 
temporárias e com baixos salários sobre a saúde mental dos trabalhadores é a deterioração das 
relações interpessoais, pois esse modelo de contratação presente na precarização acarreta alta 
rotatividade de pessoal e a necessidade de novos treinamentos aos recém contratados, 
aumentando o retrabalho daqueles trabalhadores que permanecem. E esta situação, vivida 
continuamente, acaba por contribuir para o desgaste e o tensionamento das relações 
interpessoais, pois, rompe-se a solidariedade entre os trabalhadores (GONCALVES et al, 
2015). 
A precarização do trabalho ao possibilitar a degradação das condições deste pelos 
baixos investimentos, pela sobrecarga, intensificação e redução da força de trabalho, além do 
aumento da carga horaria trabalhada, tem contribuído em demasia para o adoecimento físico e 
mental dos trabalhadores. Ou seja, aumentam a ocorrência de acidentes de trabalho 
(SELIGMANN-SILVA,2011). 
Diante da contextualização do objeto apresentado e de alguns pressupostos iniciais 
emergiram as seguintes questões que nortearam este estudo: Como os trabalhadores de 
enfermagem permanecem trabalhando em condições inadequadas, sem recompensas ou 
26 
 
reconhecimentos, desgastando seus corpos e sua saúde? Que condições contribuem para que 
os trabalhadores de enfermagem se sujeitem a situações inadequadas de trabalho? Como os 
trabalhadores de enfermagem se organizam coletivamente para melhorar as condições de 
trabalho? Quais as repercussões da precarização do trabalho para os trabalhadores de 
enfermagem. 
No intuito de melhor compreender como se produzem as relações sociais neste 
contexto tão adverso e complexo utilizou-se o pensamento de Bourdieu. A escolha dos 
postulados teóricos e filosóficos de Pierre Bourdieu para a análise da realidade fundamentou-
se pelo fato de tratar-se de um importante cientista social contemporâneo que possui uma 
vasta obra e pesquisas sobre as relações e determinações sobre os fenômenos sociais 
(BOURDIEU, 1983c). 
Pierre Bourdieu foi um importante sociólogo e pensador francês, um dos mais 
proeminentes intelectuais da modernidade no âmbito das ciências humanas denominado e 
reconhecido como um polemista. Considerado um autor de leitura intrincada, difícil e em 
certos pontos até mesmo incompreensível ele foi autor de uma série de obras que 
contribuíram para renovar o entendimento da Sociologia e da Etnologia no século XX. 
 Bourdieu fez críticas aos que considerava servos do poder, afrontou o 
fundamentalismo de mercado que, na sua visão, distorce a lógica dos campos de produção 
cultural. Assim, sua teoria impulsionou e inovou os estudos na sociologia ao defender a 
praxiologia como uma opção para a análise sociológica que, por sua vez, é capaz de fazer 
reflexões sobre as diversas e distintas sociedades (MARTINEZ, 2015; NOGUEIRA; 
NOGUEIRA, 2002; SANTIAGO, 2012; VALLE, 2007). 
Pierre Bourdieu foi um dos principais intelectuais do século XX e um dos maisimportantes sociólogos contemporâneos. Foi Professor de sociologia no Colége de France, 
diretor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais e diretor da revista Actes de a 
Recherch em Sciences Sociales. Suas contribuições foram inúmeras para o pensamento 
contemporâneo, sempre com enfoque nas questões de educação, cultura, arte e, em seus 
últimos anos de vida, nos estudos de comunicação e de política. A respeito do vasto alcance 
de suas contribuições para o estudo das realidades sociais e suas mediações destacam-se três 
conceitos: campo, habitus e capital simbólico, centrais na análise das práticas sociais, suas 
relações de poder e os limites e regras de atuação individuais e coletivas (ASSUNÇÃO, 2016; 
MARTINEZ; TOZETTO, 2016; SANTIAGO, 2012; WACQUANT, 2002). 
Os conceitos de campos, habitus, capital simbólico, poder simbólico e violência 
simbólica serão imprescindíveis para a investigação proposta neste estudo. Para 
27 
 
compreendermos a construção das relações de submissão e dominação do trabalhador de 
enfermagem admitir-se-á o campo da saúde como base para a análise das relações sociais por 
tratar-se de um campo social (conforme estabelecido por Bourdieu) em que não só estão 
inseridos os agentes da enfermagem como os demais agentes envolvidos na saúde: médicos, 
administradores, fisioterapeutas, nutricionistas, entre outros. 
Ressalta-se que o campo social, adotado nessa pesquisa, é o campo da saúde. Na 
perspectiva de Bourdieu, o campo é o local onde as estruturas (regras, comportamentos, leis, 
definições de papeis e valores) estão estabelecidas ou estruturadas; onde há constante luta 
entre os agentes do campo para manutenção das regras estruturadas, e, consequente 
manutenção do poder dos grupos que controlam essas regras, ou contrapondo-se a essas 
estruturas em busca de reconhecimento e poder (BOURDIEU, 1976, 2004a, 2005; GARCIA, 
1996). É nesse campo de relações, e/ou disputas que pretende-se investigar a construção das 
relações de submissão e dominação do trabalhador de enfermagem no contexto neoliberal. 
Outro aspecto relevante a ser considerado é o fato de que a prática social se constrói 
com base nas estruturas e regras estabelecidas e consolidadas no campo. Bourdieu, durante 
sua trajetória, buscou desenvolver sua teoria de acordo com o conhecimento praxiológico que 
constitui-se da relação dialética entre o agente e a sociedade. Não ignora, dessa forma, os 
conhecimentos objetivista e subjetivista, porém, retoma de cada um suas contribuições, 
integrando-os ao invés de contrapô-los um ao outro (ALMEIDA, 2005; MARTINEZ, 2015; 
MARTINEZ; TOZETTO, 2016; THIRY-CHERQUES, 2006; WACQUANT, 2002). 
Para Bourdieu essa prática social só se explica através do habitus, que pode ser tratado 
como resultado de um trabalho de inculcação pela prática, em que o agente social interioriza, 
de modo sistemático e coerente, as estruturas de relações de poder, a partir do lugar e da 
posição que no campo ocupa e exterioriza em práticas as disposições que antes interiorizou 
(BOURDIEU, 1983a; CODATO; MORAES, 2006; MONTAGNER, 2006; THIRY-
CHERQUES, 2006). Neste sentido, por meio da identificação do habitus dos agentes, 
podemos investigar as relações estabelecidas e as bases em que foram originadas, bem como 
as relações de poder nelas contidas. 
Além do habitus, um fator que interfere diretamente na posição dos agentes no campo 
é o capital. Em suas análises, Pierre Bourdieu chamou a atenção para o fato de que os agentes 
são dotados de diferentes capitais que são acumulados no decorrer de sua trajetória. Toda via, 
não se trata só de capitais no sentido econômico (BONAMINO et al., 2010). O capital pode 
ser diferenciado em: econômico, cultural, social, e simbólico, este último relacionado aos 
28 
 
rituais característicos de cada grupo social, as chamadas regras de boa conduta (ALMEIDA, 
2005). 
Bourdieu considera diferentes sistemas simbólicos, o mito, a língua, a arte, a ciência e 
a ideologia como instrumentos de conhecimento e construção que influenciam o mundo 
social. Descreve que essas estruturas são estruturadas, e, por meio delas, o campo social é 
também estruturado, assim como os agentes sociais que detêm maior capital simbólico 
acumulado exerçam uma forma de poder (BOURDIEU, 2007a, 2007b; GARCIA, 1996). 
O poder conferido aos agentes sociais, neste sentido, é denominado por Bourdieu 
como poder simbólico que tende a estabelecer e manter a ordem de forma a perpetuar o 
consenso no campo social e o poder nas mãos dos agentes dominantes (BOURDIEU, 2007a). 
A partir de todo o descrito, fica claro que a sociedade compreendida por Bourdieu é 
dividida entre grupos dominantes e grupos dominados (FERNANDES, 2010). Continuando 
sua análise, Bourdieu aponta que a dominação nos campos sociais se dá pela consumação da 
violência simbólica perpetrada pelos agentes dominantes sobre os dominados. Caracteriza que 
a violência simbólica é aquela à qual os agentes dominados não a reconhecem como 
violência, mas como uma ordem social inerente à realidade social. Desta forma, é sumamente 
inconsciente e age tanto a partir daqueles que sofrem como também naqueles que a exercem 
na medida em que uns e outros são em parte inconscientes ao exercê-la ou de sofrê-la 
(BOURDIEU, 2007a, 2016; BURAWOY, 2010; FERNANDES, 2010; MARTINEZ; 
TOZETTO, 2016). 
Pierre Bourdieu (2011), ao tratar do poder simbólico e da violência simbólica 
apresenta uma crítica às ideias neoliberais e à globalização. Considera que são estratégias de 
produção e reprodução simbólica voltadas a manter os ideais econômicos de acumulação de 
capitais no atual sistema financeiro. Bourdieu explica ainda que os sistemas simbólicos são 
responsáveis por produções simbólicas que funcionam como instrumentos de dominação: 
“É assim que os sistemas simbólicos cumprem a sua função política de instrumentos 
de imposição ou de legitimação da dominação, que contribuem para assegurar a 
dominação de uma classe sobre a outra (violência simbólica) dando o reforço da sua 
própria força às relações de força que as fundamentam e contribuindo assim, 
segundo a expressão de Weber para a domesticação dos dominados”. (B UR I U 
2011, p. 11). 
 
É diante desse contexto e com base nos postulados de Pierre Bourdieu sobre a 
construção, produção e reprodução de sistemas simbólicos e sua utilização como instrumento 
para construção de valores, e através deles imprimir a dominação simbólica, que se assume 
este referencial filosófico como o fio condutor dessa pesquisa. 
29 
 
Com base nos questionamentos realizados, define-se como objeto de estudo a 
submissão, dominação e resistência do trabalhador de enfermagem no contexto neoliberal à 
luz de Pierre Bourdieu. 
O presente estudo apresenta como pressuposto central ou tese a ser defendida, a 
compreensão de que: o sistema capitalista baseado na acumulação flexível do capital utiliza-
se de estratégias como a precarização do trabalho que impetram violência material e simbólica 
ao trabalhador de enfermagem, dificultando sua capacidade de reação às condições 
degradantes do trabalho. 
 
 
Objetivos do estudo 
 
 
A fim de se responder as questões que norteiam o presente estudo e confirmar ou 
refutar a tese formulada. Tem-se como objetivos 
a) identificar os fatores relacionados à precarização do trabalho de 
enfermagem que se constituem em violência simbólica e material 
impetrada ao trabalhador; 
b) compreender o processo de dominação e submissão do trabalhador de 
enfermagem diante das violências vivenciadas em seu cotidiano de trabalho 
à luz de pensamento de Pierre Bourdieu; 
c) analisar como os trabalhadores de enfermagem se mobilizam coletivamente 
no contexto de precarização do trabalho. 
d) analisar as repercussões da precarização da força de trabalho da 
enfermagem para a saúde do trabalhador. 
 
 
A produção do conhecimento na área da Enfermagem 
 
 
Para melhor delineamentodo estudo faz-se necessário a realização do levantamento da 
produção bibliográfica sobre a submissão e dominação do trabalhador de enfermagem no 
sistema capitalista neoliberal sob a ótica do pensamento de Pierre Bourdieu. 
30 
 
Em revisão integrativa sobre produção da enfermagem a respeito da precarização do 
trabalho de enfermagem e sua repercussão para o serviço de enfermagem e a saúde dos 
trabalhadores, publicados no período de 2010 a março de 2017, identificaram-se 2.220 
artigos, e, após a leitura de seus resumos, foram analisados quanto à abordagem acerca da 
temática proposta. Foram selecionados doze artigos que apresentavam relação com o objeto 
desse estudo, sendo oito de produção nacional e quatro internacionais. 
A busca foi realizada na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e que inclui as seguintes 
bases de dados: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), 
Scientific Eletronic Library Online (SCIELO); Base de Dados do portal de periódicos do 
Conselho Federal de Educação (CAPES); U.S. National Library of Medicine (PubMed) e 
Science Direct Online. A coleta de dados foi realizada entre os meses de janeiro de 2016 a 
março de 2017. 
Foram utilizados os seguintes descritores: seguridade and enfermagem, condições de 
trabalho and enfermagem e internacionalidade and enfermagem, seguido dos seus 
correspondentes na língua inglesa: social walfare and nursing, working conditions and 
nursing e internationality and nursing. 
Adotou-se como critérios para seleção dos artigos: os disponíveis na integra, de 
autoria de enfermeiros, publicados nos idiomas português, inglês e espanhol. Excluíram-se os 
artigos encontrados em mais de uma Base de Dados e os de acesso indisponível ou 
inconsistentes com o objeto de estudo proposto. 
Ao analisar a produção do conhecimento da enfermagem no que refere à precarização 
do trabalho constata-se que, no período de 2010 a 2013, houve uma produção inexpressiva 
sobre o tema com a publicação de apenas um artigo em cada ano, conforme tabela 1. A maior 
concentração da produção ocorre nos anos de 2014 e 2015 com quatro artigos em cada ano, 
mostrando que o tema é atual e pouco estudado na área da enfermagem. Dos doze artigos 
relacionados não se encontrou nenhum artigo que abordasse a dominação do trabalhador de 
enfermagem no sistema capitalista neoliberal sob a ótica do pensamento de Pierre Bourdieu. 
 
 
 
 
 
 
31 
 
Tabela 1- Produção científica de enfermagem sobre precarização do trabalho de enfermagem 
e sua repercussão para o serviço de enfermagem e a saúde dos trabalhadores, por 
ano de publicação, Rio de Janeiro, 2017. 
Ano Nº de artigos publicados 
2010 01 
2011 01 
2012 01 
2013 01 
2014 04 
2015 04 
Fonte: O autor, 2017. 
 
A análise da produção demonstrou que alguns estudos apontam que a precarização do 
trabalho em saúde e da enfermagem tem seu início concomitante com a reforma política 
ocorrida no Brasil na década de 1990. E de forma sistemática e apoiada pela ideologia liberal, 
implementou-se a flexibilização a partir da Reforma do Estado, pois adotou um modelo 
administrativo baseado na mínima intervenção do estado com regulamentação das relações, 
principalmente trabalhista pelo mercado (ALVES et al., 2015; BREWER et al., 2012; 
GONÇALVES et al., 2015; JONES, SHERWOOD 2014; RIBEIRO et al., 2014). 
Ao tratar dos impactos da precarização sobre o processo de trabalho da enfermagem os 
estudos de Druck (2011); Faria e Dalbello-Araujo (2011); Franco, Druck e Seligmann-Silva 
(2010); Pérez Júnior (2012); Vieira e Chinelli (2013) apontam: aumento da carga de trabalho 
e aos baixos salários, a escassez de material, a inadequação do quantitativo dos recursos 
humanos, a contratação de trabalhadores não concursados e a inadequação da planta física. 
Além de apontar que os profissionais sob o regime de precarização convivem rotineiramente 
em condições relacionadas à perda dos seus direitos e seguridade, que fomemtam a submissão 
desses trabalhadores à exploração e a aceitar condições indignas de trabalho diante da ameaça 
de perda do trabalho. 
Para ampliação da análise acerca da produção de conhecimento sobre o tema, realizou-
se busca na biblioteca digital brasileira de teses e dissertações (BDTD), esta por sua vez, 
organiza em um único banco de dados as informações sobre as teses e dissertações produzidas 
no país e por brasileiros no exterior dentro de programas de pós-graduação stricto sensu. 
32 
 
Utilizou-se como descritores: neoliberalismo e enfermagem; precarização e 
enfermagem; violência simbólica e enfermagem; submissão e enfermagem; globalização e 
enfermagem. 
A busca retornou um total de 435 trabalhos, entre teses e dissertações que após a 
verificação na íntegra de seus conteúdos e sua relação com a temática foram selecionados 11 
trabalhos para análise, conforme demonstrado na figura 1. 
 
Figura1- Produção sobre submissão e dominação do trabalhador de enfermagem no 
sistema capitalista neoliberal na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações 
(BDTD). Rio de Janeiro, 2017. 
 
Fonte: O autor, 2017. 
 
As obras foram analisadas em seus resumos objetivando-se verificar a adesão de seu 
conteúdo à temática da submissão e dominação do trabalhador de enfermagem no sistema 
capitalista neoliberal e foram então selecionados 14 trabalhos que tratavam diretamente da 
temática. No entanto apenas 11 produções tinham como autores profissionais enfermeiros, as 
quais foram selecionadas para análise. Os trabalhos selecionados foram analisados na íntegra, 
buscando assim, identificar seus resultados, os quais são apresentados tabela 2 abaixo: 
 
 
 
 
33 
 
Tabela 2- Mapeamento da produção de teses e dissertações sobre submissão e dominação do 
trabalhador de enfermagem no sistema capitalista neoliberal. Rio de Janeiro, 2017.) 
ANO TÍTULO AUTOR TIPO INSTITUIÇÃO 
 2000 
Poder, violência e dominação simbólicos em um 
serviço público de saúde que atende a mulheres em 
situação de gestação, parto e puerpério 
Pereira, WR Tese USP 
2005 
Supervisão, flexibilização e desregulamentação no 
mercado de trabalho: antigos modos de controle, novas 
incertezas nos vínculos de trabalho da enfermagem 
Baraldi, S Tese USP 
2007 
O conflito nas relações no trabalho no contexto da 
flexibilização e reforma do estado: a terceirização às 
avessas 
Santos, ALPJ Dissertação FIOCRUZ 
2008 
A banalização da injustiça social no cotidiano de 
trabalho: a propósito da violência no trabalho e ameaça 
à saúde do trabalhador 
Bila, NIGFA Dissertação URFN 
2009 
As políticas de gestão do trabalho e da educação em 
saúde: limites e possibilidades diante da flexibilização 
do trabalho no sistema único de saúde 
Guimarães, TCF Dissertação FIOCRUZ 
2010 
A precarização do trabalho do enfermeiro na estratégia 
saúde da família: contribuição ao debate 
Gois, PS Dissertação UFRN 
2011 
A flexibilização das relações de trabalho da 
enfermagem no hospital universitário da universidade 
federal do espírito santo (1988-1998) 
Alves, SMP Dissertação UFES 
2012 
A produção de subjetividade do enfermeiro para a 
tomada de decisões no processo de cuidar em 
enfermagem 
Busanello, J Tese FURG 
2013 
A subjetividade do profissional da saúde pós-
reestruturação produtiva 
Gomes, D Tese UFSC 
2014 
O modelo neoliberal e suas repercussões para a saúde 
do trabalhador de enfermagem 
 Gonçalves, FGA Dissertação UERJ 
2015 
A interpretação do trabalho em enfermagem no 
capitalismo financeirizados: um estudo na perspectiva 
teórica do fluxo tensionado 
 Souza, HS Dissertação USP 
Fonte: O autor, 2017 
 
Ao analisar as pesquisas selecionadas identificou-se que apenas quatro estudos de 
doutorado abordaram a temática da precarização e da submissão do trabalhador, dos quais três 
o realizaram sob o enfoque dos impactos na subjetividade. Pereira (2000), ao analisar a 
dominação e o poder nas relaçõesno serviço de saúde hospitalar, identifica que esse espaço 
está imerso em relações de dominação e que o poder simbólico perpetrado através da 
violência simbólica é a forma de dominação predominante nas relações entre profissionais e 
34 
 
usuários. Ressalta-se que o estudo teve como objeto as relações de dominação dos usuários 
pelos profissionais. 
Já os estudos de Baraldi (2005), Busanello (2012) e Gomes (2013) identificaram que a 
relação entre a produção de subjetividade do enfermeiro e a tomada de decisões é mediada 
pelo sistema capitalista através da submissão hierárquica e de valores acarretando estresse e 
adoecimento. Esses estudos apontam que imposições na tomada de decisões, determinadas 
pela organização do trabalho e não pelo julgamento livre do profissional constituem-se em 
uma forma de violência praticada sobre os trabalhadores de enfermagem. Além disso, 
capturam sua subjetividade e promovem a dominação do trabalhador pelo sistema. 
Diversos estudos têm se debruçado sobre a temática das modificações promovidas 
pela adoção das ideias neoliberais através das políticas de estado mínimo e precarização do 
trabalho. E seus resultados apontam de forma quase unânime para a existência de relações 
conflituosas devido às diferenças entre trabalhadores precarizados e não precarizados no 
mesmo espaço, a sobrecarga de trabalho, a tensão e o estresse entre os trabalhadores, a 
ansiedade diante da insegurança, a desproteção social, a desestruturação dos serviços, a alta 
rotatividade e baixa autonomia dos trabalhadores e, por fim, o acirramento da exploração do 
trabalho (BILA, 2008; GOIS, 2010; GONÇALVES, 2013; GUIMARÃES, 2009; SANTOS, 
2007; SOUZA, 2015). 
A partir da análise desta produção observa-se que são escassos os trabalhos sobre a 
temática, e os poucos estudos realizados no âmbito da enfermagem não examinaram as 
lacunas de conhecimento que demostram quais mediações estão presentes entre o sistema 
produtivo e o trabalho real que conduzem o trabalhador à dominação e à submissão. 
 
 
Justificativa do estudo 
 
 
A crise do capitalismo e o surgimento do pensamento neoliberal tem promovido, 
desde o final da década de 1970, um acirramento da precarização estrutural do trabalho em 
escala global. O resultado de tal processo tem sido a adoção de privatizações, por parte das 
estruturas governamentais, impulsionadas pela razão econômica imposta pelos capitais 
financeirizados (bancos e multinacionais) contribuindo para a perda dos direitos trabalhistas 
conquistados pelas lutas sociais e do estado de segurança social em todas as partes do mundo 
(ANTUNES, 2014; ANTUNES; ALVES, 2004; OLIVEIRA et al., 2013a). 
35 
 
A nova divisão internacional do trabalho, caracterizada pela lioflização organizacional 
(ANTUNES, 2014) pela empresa enxuta e a perda parcial ou total da proteção do trabalho tem 
proporcionado a exposição do trabalhador à precarização e à intensificação do trabalho. A 
exigência do trabalhador multifuncional, polivalente e individualista, além da submissão a 
uma série de mecanismos de gestão pautados na pressão psicológica voltada para o aumento 
da produtividade e a diminuição drástica dos limites entre atividade laboral e espaço da vida 
privada promovem o desemprego estrutural e tem repercutido negativamente na saúde física e 
mental dos trabalhadores (ANTUNES; PRAUN, 2015). 
Neste contexto, estudar as relações de submissão e dominação do trabalhador de 
enfermagem no sistema capitalista neoliberal sob a ótica do pensamento de Pierre Bourdieu 
poderá auxiliar na compreensão dos fatores relacionados à submissão dos trabalhadores de 
enfermagem diante das violências simbólicas perpetradas pela precarização do trabalho e 
desta forma fornecer subsídios para uma ampla discussão em relação ao enfrentamento. 
 
 
Relevância e contribuições 
 
 
O estudo é relevante porque poderá ampliar a compreensão teórica com base na 
análise empírica a respeito da configuração do trabalho de enfermagem em suas práticas e 
realidades diárias a partir das vivências dos trabalhadores assalariados e submetidos ao 
sistema de exploração por meio de trabalhos precarizados. 
No Brasil, como em todo o mundo, os trabalhadores de enfermagem sob o regime da 
precarização convivem rotineiramente em condições relacionadas à perda dos seus direitos e 
seguridade social. Convivem também com condições de trabalho que fortalecem a submissão 
destes à exploração do sistema capitalista, aceitando, inclusive, condições indignas de 
trabalho e sem condições de exercer suas atividades profissionais com segurança e qualidade 
(FARIA; DALBELLO-ARAUJO, 2011). 
Acredita-se que a melhor compreensão das mediações existentes entre a relação do 
processo produtivo e o trabalho concreto poderá auxiliar na reflexão sobre novas 
possibilidades de enfrentamento às condições adversas vivenciadas pelos trabalhadores de 
enfermagem no contexto neoliberal. 
Outro aspecto relevante reside no fato de melhor compreender as repercussões do 
processo produtivo baseado nos fundamentos neoliberais sobre a saúde dos trabalhadores, e, a 
36 
 
partir desse ponto poder contribuir com reflexões que possam favorecer medidas que 
minimizem os afastamentos e absenteísmos provocados pelo adoecimento para a redução dos 
impactos econômicos e sociais para a instituição. Desta forma, concomitantemente, diminui-
se a sobrecarga gerada aos demais trabalhadores pela redução da força de trabalho devido ao 
absenteísmo, bem como incentivar o debate sobre a precarização do trabalho na enfermagem. 
Assim, sua relevância profissional e social aponta para a melhoria das condições de 
trabalho do profissional, para os cuidados prestados e automaticamente, refletindo em uma 
assistência segura e eficaz. 
A proposta deste estudo apresentada ao curso de doutorado da faculdade de 
enfermagem da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e inserido na linha de pesquisa do 
programa de pós-graduação stricto sensu: Trabalho, Educação e Formação Profissional em 
Saúde e Enfermagem e no grupo de pesquisas: “ onfigurações do mundo do trabalho, saúde 
dos trabalhadores e enfermagem” certificado pelo diretório de grupos de pesquisa do 
Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq) propõe contribuir 
da seguinte maneira: 
1. estabelecer, com base em uma abordagem teórica crítica, a partir da 
sociologia de Bourdieu, reflexão e análise à respeito das formas de 
submissão, dominação e resistência do trabalhador de enfermagem como 
categoria profissional e prática social. 
2. com a transferência dos conhecimentos mediante a divulgação dos 
resultados em eventos e publicação de artigos, processo que já vem sendo 
realizado e que tem despertado grande interesse por parte dos ouvintes em 
eventos de que tenho participado; 
3. inserção de conteúdos relativos à análise crítica da precarização do trabalho 
e seus riscos à saúde do trabalhador no ensino da graduação e 
especialização, pois a formação ainda tem se voltado para os aspectos 
técnicos e assistenciais, com pouca ênfase nos riscos inerentes à inserção 
do trabalhador ao processo de trabalho precarizado; 
4. ampliação do acervo de banco de dissertações e teses do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da UERJ, na 
linha de pesquisa “ Trabalho Educação e Formação em Saúde e 
 nfermagem” 
5. ampliação da produção de conhecimento de enfermagem sobre 
precarização dominação do trabalhador de enfermagem na perspectiva de 
37 
 
Pierre Bourdieu no grupo de pesquisa: configurações do mundo do 
trabalho, saúde dos trabalhadores e enfermagem do Programa de Pós-
Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da UER 
38 
 
1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 
 
 
1.1. O contexto neoliberal 
 
 
A concepção de ideário neoliberal foi formulada pela primeira vez em 1947 por 
Friedrich August von Hayek, economista e pensador austríaco, nascido

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