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Revista do advogado - principios constitucionais

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Associação dos Advogados de São Paulo Rua Álvares Penteado, 151 Centro cep 01012 905 São Paulo SP tel (11) 3291 9200 www.aasp.org.br
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Constitucionais
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Princípios 
Constitucionais
Princípios 
ISSN-0101-7497
Ano XXXII Nº 117 Outubro de 2012
DIRETORIA
Presidente Arystóbulo de Oliveira Freitas
Vice-Presidente Sérgio Rosenthal 
1º Secretário Leonardo Sica
2º Secretário Fernando Brandão Whitaker
1º Tesoureiro Luiz Périssé Duarte Junior
2º Tesoureiro Alberto Gosson Jorge Junior
Diretor Cultural Roberto Parahyba de Arruda Pinto
Assessor da Diretoria Luís Carlos Moro
REVISTA DO ADVOGADO
Conselho Editorial: Alberto Gosson Jorge Junior, 
Arystóbulo de Oliveira Freitas, Cibele Pinheiro Marçal 
Cruz e Tucci, Dina Darc Ferreira Lima Cardoso, Eduardo 
Reale Ferrari, Fernando Brandão Whitaker, Leonardo 
Sica, Luís Carlos Moro, Luiz Antonio Caldeira Miretti, Luiz 
Périssé Duarte Junior, Marcelo Vieira von Adamek, Nilton 
Serson, Paulo Roma, Pedro Ernesto Arruda Proto, Renato 
José Cury, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Roberto 
Parahyba de Arruda Pinto, Roberto Timoner, Rogério de 
Menezes Corigliano, Sérgio Rosenthal e Sonia Corrêa da 
Silva de Almeida Prado
Ex-Presidentes da AASP: Walfrido Prado Guimarães, Américo 
Marco Antonio, Paschoal Imperatriz, Theotonio Negrão, 
Roger de Carvalho Mange, Alexandre Thiollier, Luiz Geraldo 
Conceição Ferrari, Ruy Homem de Melo Lacerda, Waldemar 
Mariz de Oliveira Júnior, Diwaldo Azevedo Sampaio, José de 
Castro Bigi, Sérgio Marques da Cruz, Mário Sérgio Duarte 
Garcia, Miguel Reale Júnior, Luiz Olavo Baptista, Rubens 
Ignácio de Souza Rodrigues, Antônio Cláudio Mariz de 
Oliveira, José Roberto Batochio, Biasi Antonio Ruggiero, 
Carlos Augusto de Barros e Silva, Antonio de Souza Corrêa 
Meyer, Clito Fornaciari Júnior, Renato Luiz de Macedo 
Mange, Jayme Queiroz Lopes Filho, José Rogério Cruz e 
Tucci, Mário de Barros Duarte Garcia, Eduardo Pizarro 
Carnelós, Aloísio Lacerda Medeiros, José Roberto Pinheiro 
Franco, José Diogo Bastos Neto, Antonio Ruiz Filho, Sérgio 
Pinheiro Marçal, Marcio Kayatt e Fábio Ferreira de Oliveira
Diretor Responsável: Sérgio Rosenthal
Jornalista Responsável: Reinaldo Antonio De Maria 
(MTb 14.641)
Coordenação-Geral: Ana Luiza Távora Campi Barranco Dias
Capa: Aline Vieira Barros - AASP
Revisão: Ana Marson, Elza Doring, Leandro Freitas, Milena 
Grassmann Bechara e Paulo Nishihara - AASP
Editoração Eletrônica: Patricia Black - AASP
Administração e Redação: Rua Álvares Penteado, 151 - 
Centro - cep 01012 905 - São Paulo-SP
tel (11) 3291 9200 - www.aasp.org.br
Impressão: Intergraf Indústria Gráfica Ltda.
Tiragem: 93.150 exemplares
A Revista do Advogado é uma publicação da Associação 
dos Advogados de São Paulo, registrada no 6º Ofício de 
Registro de Títulos e Documentos de São Paulo, sob nº 997, 
de 25/3/1980.
© Copyright 2012 - AASP
A Revista do Advogado não se responsabiliza pelos 
conceitos emitidos em artigos assinados. A reprodução, no 
todo ou em parte, de suas matérias só é permitida desde 
que citada a fonte.
Solicita-se permuta. Pídese canje. On demande I’échange. 
We ask for exchange. Si richiede lo scambio.
Toda correspondência dirigida à Revista do Advogado 
deve ser enviada à Rua Álvares Penteado, 151 - Centro - 
cep 01012 905 - São Paulo-SP.
SUMÁRIO
5 Nota do Coordenador.
José Diogo Bastos Neto
7 O fundamento constitucional da filiação socioafetiva. 
Antônio Carlos Mathias Coltro 
19 Direito fundamental à previsibilidade das decisões judiciais. 
Bruno Dantas 
31 Implicações da função social da propriedade na posição do credor por 
alienação fiduciária – Bem essencial no processo de falência. 
Daltro de Campos Borges Filho 
50 Princípios constitucionais e direito de imagem. 
Ênio Santarelli Zuliani
Andréa de Almeida Brunhari 
76 A nova discussão a respeito dos princípios constitucionais. 
Fabio de Campos Lilla 
Fabiana Ribeiro Bastos 
83 Garantia constitucional do processo justo: eficiência e garantismo.
Fábio Ramazzini Bechara 
90 O Conselho Nacional de Justiça e a efetividade dos princípios 
constitucionais. 
Felipe Locke Cavalcanti 
98 O princípio constitucional da solidariedade e sua aplicação no Direito 
Privado.
Francisco Eduardo Loureiro
Amanda Palmieri Fração 
111 O princípio da proporcionalidade e a reforma da legislação penal. 
José Eduardo Cardozo
Marivaldo de Castro Pereira
116 Garantias constitucionais da publicidade dos atos processuais e da 
motivação das decisões no Projeto do CPC. 
José Rogério Cruz e Tucci 
124 A Constituição Federal confitente e o princípio da progressividade dos 
direitos trabalhistas.
Luís Carlos Moro 
135 O princípio da igualdade na jurisprudência recente do Supremo 
Tribunal Federal. 
Luiz Armando Badin
Flávio Marques Prol
144 Liberdade de expressão e biografias. 
Manuel Alceu Affonso Ferreira 
150 Desafios atuais do direito de defesa. 
Márcio Thomaz Bastos 
162 Relevância constitucional do crédito rural como alicerce do direito à 
alimentação. 
Massami Uyeda 
165 Princípios constitucionais econômicos e princípios constitucionais 
sociais.
Paula A. Forgioni 
177 Medidas provisórias e súmulas vinculantes: riscos à separação de Poderes? 
Pedro Vieira Abramovay
Adriana Lacombe Coiro
184 Deixem em paz a presunção de inocência. 
Pierpaolo Cruz Bottini 
195 O princípio constitucional da vedação do confisco tributário. 
Roberto Barrieu 
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http://www.aasp.org.br/
Nota do Coordenador
José Diogo Bastos Neto
Advogado.
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A o ser convidado para coordenar a Revista do Advogado tendo como tema os princípios constitucionais, que compreendem os valores fundamentais da ordem jurídica 
pátria, confesso que tive o seguinte pensamento: será que este 
assunto despertaria real interesse em nossos associados, advogados de 
militância, companheiros de armas, que se valem de nossa revista não 
só como fonte de conhecimento, mas precipuamente como utilitária 
ferramenta capaz de auxiliá-los no dia a dia do exercício da profissão? 
Esta dúvida, entretanto, logo se dissipou, pois a pluralidade de 
questões tratadas pelos nossos qualificados colaboradores, operadores 
do Direito de trincheiras diversas, tornou assunto essencialmente 
conceitual em verdadeiro manual prático de relevância para o exercício 
profissional cotidiano. Mais que isso, os textos que compõem esta 
Revista do Advogado, ao transitarem por diversas áreas do Direito sob 
a ótica fluida dos princípios que permeiam a carta política, trazendo- 
-os ao plano prático, tornou a assimilada expressão Constituição 
Cidadã mais próxima de todos nós. Boa leitura. 
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Sumário
1. Principiando
2. Constituição e vida
3. Finalizando
 Bibliografia
1 Principiando
Cuidando da filiação, entendida como “[...] o 
liame jurídico existente entre pai ou mãe e seu 
filho” (VENOSA, 2002, p. 268), e esclarecendo 
o art. 1.603 do Código Civil (CC) ser ela com-
provada pela certidão do nascimento inscrito no 
registro civil, seu art. 1.596 (que não encontra 
equivalência no Código anterior) reitera o pre-
visto no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, 
confirmando a igualdade de tratamento quanto 
aos filhos, no tocante a que e conforme Guilher-
me Calmon Nogueira da Gama (2001, p. 76), 
é preciso desdobrar em dois aspectos, sem que 
se confundam entre si, ainda que relacionados, 
por aludir-se, como na norma constitucional, à 
equivalência de qualificação relativamente aos 
filhos, sem discriminação quanto à igualdade 
dos direitos entre eles, compreendendo, na lição 
de Cláudia Lima Marques (1999, p. 32), duas 
O fundamento constitucional da 
filiação socioafetiva. 
Antônio Carlos Mathias ColtroDesembargador do TJSP (5ª Câmara de Direito 
Privado). Vice-presidente do TRE-SP. Corre-
gedor regional eleitoral em São Paulo. Presi-
dente do IBDFAM-SP (2010/2011) e do IBDC 
(2012/2013). Mestre em Direito das Relações 
Sociais (PUC-SP). Membro das Academias 
Paulista de Direito e Paulista de Magistrados. 
“Nada existe de permanente a não 
ser a mudança.” (Heráclito)
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ordens de situações, uma positiva e a outra ne-
gativa, pois, 
“Em primeiro lugar tratou de positivamen-
te afirmar a igualdade de direitos independen-
temente da origem dos filhos (havidos ou não 
da relação de casamento ou por adoção) e, em 
segundo lugar, negativamente, através da proibi-
ção de designações discriminatórias”.
Por conta disso e diversamente do sistema 
anterior, onde reconhecida a filiação como legí-
tima ou ilegítima,1 alterou-se o sistema a partir 
de 1988, em face da Constituição promulgada, 
reiterada a norma, depois, pelo CC de 2002, 
inadmitindo-se, a contar de então, qualquer di-
ferença quanto à natureza da filiação, que seria, 
ocorrendo, discriminatória.
Afastou-se, assim e conforme Luiz Edson Fa-
chin (1999, p. 15), a consideração a que “[...] os 
filhos tidos fora do casamento fossem excluídos 
da cidadania jurídica, pois embora fossem filhos, 
no sentido natural, direito algum tinham em ho-
menagem à ‘paz e a honra’ das famílias matrimo-
nializadas”, em que “Segredos conservavam uma 
decência aparente da família e instituíam a ‘men-
tira jurídica’”, hipocrisia inadmissível, pois tanto a 
ordem civil quanto a constitucional reconhecem 
“[...] a ampla igualdade entre os filhos, quer os bio-
lógicos, havidos na relação de casamento ou não, 
quer os não biológicos, que integram a categoria 
dos adotivos”, na referência de Giselda Maria F. 
Novaes Hironaka (2000, p. 63).
Como corolário, assinala Gustavo Tepedino 
(1993, p. 231): 
“Hoje, ao revés, não se pode ter dúvida quan-
to à funcionalização da família para o desen-
volvimento da personalidade de seus membros, 
devendo a comunidade familiar ser preservada 
(apenas) como instrumento de tutela da dig-
nidade da pessoa humana e, em particular, da 
criança e do adolescente”.
Se alguma diferenciação for possível, concer-
nirá unicamente a serem os filhos advindos, ou 
não, do casamento, sem qualquer distinção relati-
vamente à natureza da filiação.
Assim e conforme Sérgio Gischkow Pereira, 
“Não mais há que falar em filhos legítimos e 
ilegítimos: a única classificação possível é entre 
filhos matrimoniais e extramatrimoniais (a úni-
ca, mas significativa diferença, entre estas duas 
categorias, é que os segundos devem ajuizar ação 
investigatória de paternidade)”.2
Nem poderia ser diferente, em uma Cons-
tituição cujo preâmbulo alude ao exercício 
dos direitos sociais e individuais, à liberdade, 
segurança, ao bem-estar e desenvolvimento, à 
igualdade e justiça como valores supremos de 
uma sociedade fraterna, pluralista e sem pre-
conceitos, fundada na harmonia social e cujo 
art. 1º afirma, dentre outros, serem fundamen-
tos republicanos, a cidadania e a dignidade da 
pessoa humana, dispondo o 3º, como um dos 
objetivos fundamentais da República, a edifi-
cação de uma sociedade livre, justa e solidária, 
acentuando o art. 226, § 7º, como direito fun-
damental disperso e alicerçado nos princípios 
da dignidade da pessoa humana e da paterni-
dade responsável, ser o planejamento familiar 
livre decisão do casal, competindo ao Estado 
propiciar recursos educacionais e científicos 
para o exercício desse direito, vedada qualquer 
forma coercitiva por parte de instituições ofi-
ciais ou privadas, sem olvidar, no art. 227, e 
na mesma condição, ser dever da família, da 
sociedade e do Estado assegurar à criança, ao 
adolescente e ao jovem, com absoluta priori-
dade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, 
à educação, ao lazer, à profissionalização, à 
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade 
e à convivência familiar e comunitária, além 
1. Determinava o art. 337 do Código de 1916 serem legítimos os 
filhos concebidos na constância do casamento, mesmo que viesse a 
ser anulado ou nulo, se contraído de boa-fé.
2. TJRS, Ap. Cív. nº 595163114, cit. por Guilherme Calmon 
Nogueira da Gama (2001, p. 78 e nota n. 162). 
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de colocá-los a salvo de toda forma de negli-
gência, discriminação, exploração, violência, 
crueldade e opressão.
Em verdade e como ponderado pelo ministro 
Waldemar Zveiter: 
“Mudou a época, mudaram os costumes, 
transformou-se o tempo, redefinindo valores e 
conceituando o contexto familiar de forma mais 
ampla que com clarividência pôs o constituinte 
de modo o mais abrangente, no texto da nova Car-
ta. E nesse novo tempo não deve o Poder Judi-
ciário, ao qual incumbe a composição dos litígios 
com olhos postos na realização da Justiça, limitar-
-se à aceitação de conceitos pretéritos que não se 
ajustem à modernidade”.3 
Como consequência tanto do fundamento re-
publicano da dignidade da pessoa humana quan-
to do enunciado nos arts. 226, § 7º,4 e 227, caput,5 
da CF, além da garantia de que a família, base 
da sociedade, tem especial proteção do Esta-
do (art. 226, caput), viu-se o constituinte obri-
gado a reconhecer, como referido pelo ministro 
Valdemar Zveiter, a mudança da época, dos costu-
mes, bem como a transformação do tempo, rede-
finindo valores e conceituando o contexto familiar 
de forma mais ampla, inserindo, no conceito de 
família ou da entidade familiar, tanto o casamento 
quanto a união estável e o ente monoparental, con-
forme se vê no quanto descrito no art. 226.
Como era lógico, não poderia o espírito cons-
tituinte imaginar a gama de situações passíveis 
de inserção na Carta Constitucional, ocupando-
-se, todavia, daquelas que o dia a dia apresentava 
como já admitidas ou percebidas pela sociedade e 
objeto, inclusive, de consideração judicial e acer-
ca das quais se impunha o reconhecimento legis-
lativo, de sua atitude resultando o reconhecimen-
to de aspectos novos e a própria possibilidade de o 
intérprete procurar a solução para as lacunas que 
se fossem verificando presentes e as exceções que 
a rotina da vida fosse formulando, tarefa em que 
a produção judicial acabou por, em atividade que 
se pode considerar como laboratorial, produzir 
efetiva e grande contribuição, a indicar o acerto 
da afirmação de Benjamin Cardozo (1978, p. 29), 
quanto a serem as leis 
“[...] necessárias não para reprimir as forças 
através das quais se desenvolve o direito criado 
pelos juízes, mas para estimulá-los. A regra de 
emancipação não deve prender-se em pormeno-
res. Deve falar a linguagem dos princípios gerais 
que, uma vez declarados, serão desenvolvidos e 
expandidos, prescrevendo a analogia a maneira 
de aplicação e os limites de extensão”.
Dessa maneira e analisando caso de adoção 
não julgado antes que falecesse o adotante, ad-
mitiu-a o Superior Tribunal de Justiça (STJ),6 
reconhecendo, ademais, a importância da socio-
afetividade na solução de questões submetidas 
Não poderia o espírito 
constituinte imaginar a gama de 
situações passíveis de inserção 
na Carta Constitucional.
3. REsp nº 526-SP 1989/0009532-3, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, 3ª 
T., DJ de 19/11/1990, p. 13257, RSTJ, vol. 15, p. 260.
4. “§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana 
e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre deci-
são do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais 
e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma 
coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.”
5. “Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à 
criança, ao adolescente e ao jovem, comabsoluta prioridade, o direito 
à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à 
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e 
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, 
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
6. “ADOÇÃO PÓSTUMA. Prova inequívoca. O reconhecimento 
da filiação na certidão de batismo, a que se conjugam outros elemen-
tos de prova, demonstra a inequívoca intenção de adotar, o que pode 
ser declarado ainda que ao tempo da morte não tenha tido início o 
procedimento para a formalização da adoção. Procedência da ação 
proposta pela mulher para que fosse decretada em nome dela e do 
marido pré-morto a adoção de menino criado pelo casal desde os 
primeiros dias de vida. Interpretação extensiva do art. 42, § 5º, do 
ECA. Recurso conhecido e provido” (REsp nº 457.635-PB, Rel. Min. 
Ruy Rosado de Aguiar, 4ª T., j. 19/11/2002, DJ de 17/3/2003, p. 238).
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ao Judiciário,7 sem restringir a interpretação o 
fato de o casal adotante ser homossexual,8 res-
surgindo a discussão quanto aos efeitos da deno-
minada adoção à brasileira (em que o adotado 
foi registrado como filho biológico dos pais, não 
o sendo), o mesmo se dando quanto aos casos 
em que, feito o registro e surgindo posterior dú-
vida do pai quanto à paternidade, veio a sub-
meter-se ao exame judicial ação negatória de 
paternidade, nela se constatando a inexistência 
de vínculo biológico, mas a presença de forte 
socioafetividade entre investigante e investiga-
do, circunstância apta a impedir a desvalia do 
registro, nesta9 e naquela10 hipótese, de tudo se 
verificando o relevo dado ao princípio do supe-
rior interesse da criança11 e à doutrina da pro-
teção integral, os quais, embora não previstos 
de forma expressa na CF, resultam evidentes da 
leitura que se faça de vários de seus dispositivos, 
com destaque para aqueles já mencionados nes-
tas notas e que necessariamente acabam por não 
poder ser olvidados em propostas e alterações 
7. “O reconhecimento de paternidade é válido se reflete a existência 
duradoura do vínculo socioafetivo entre pais e filhos. A ausência de 
vínculo biológico é fato que por si só não revela a falsidade da de-
claração de vontade consubstanciada no ato do reconhecimento. A 
relação socioafetiva é fato que não pode ser, e não é, desconhecido 
pelo Direito. Inexistência de nulidade do assento lançado em regis-
tro civil” (REsp nº 878.941-DF, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 
de 17/9/2007). 
8. “Direito Civil. Família. Adoção de menores por casal homosse-
xual. Situação já consolidada. Estabilidade da família. Presença de 
fortes vínculos afetivos entre os menores e a requerente. Imprescin-
dibilidade da prevalência dos interesses dos menores. Relatório da 
assistente social favorável ao pedido. Reais vantagens para os adotan-
dos. Artigos 1º da lei 12.010/09 e 43 do estatuto da criança e do ado-
lescente. Deferimento da medida” (REsp nº 889.852-RS, Rel. Min. 
Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 27/4/2010, DJe de 10/8/2010).
9. “RECURSO ESPECIAL - AÇÃO NEGATÓRIA DE PATERNI-
DADE C/C RETIFICAÇÃO DE REGISTRO CIVIL - EXISTÊN-
CIA DE VÍNCULO SOCIOAFETIVO NUTRIDO DURANTE 
APROXIMADAMENTE VINTE E DOIS ANOS DE CONVI-
VÊNCIA QUE CULMINOU COM O RECONHECIMENTO 
JURÍDICO DA PATERNIDADE - VERDADE BIOLÓGICA QUE 
SE MOSTROU DESINFLUENTE PARA O RECONHECIMEN-
TO DA PATERNIDADE ALIADA AO ESTABELECIMENTO 
DE VÍNCULO AFETIVO - PRETENSÃO DE ANULAÇÃO 
DO REGISTRO SOB O ARGUMENTO DE VÍCIO DE CON-
SENTIMENTO - IMPOSSIBILIDADE - ERRO SUBSTANCIAL 
AFASTADO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - PERFILHA-
ÇÃO - IRREVOGABILIDADE - RECURSO ESPECIAL A QUE 
SE NEGA PROVIMENTO. I - O Tribunal de origem, ao contrário 
do que sustenta o ora recorrente, não conferiu à hipótese dos autos 
o tratamento atinente à adoção à moda brasileira, pois em momento 
algum adotou a premissa de que o recorrente, ao proceder ao reco-
nhecimento jurídico da paternidade, tinha conhecimento da inexis-
tência de vínculo biológico; II - O ora recorrente, a despeito de as-
sentar que tinha dúvidas quanto à paternidade que lhe fora imputada, 
ao argumento de que tivera tão somente uma relação íntima com a 
genitora de recorrido e que esta, à época, convivia com outro homem, 
portou-se como se pai da criança fosse, estabelecendo com ela vínculo 
de afetividade, e, após aproximadamente vinte e dois anos, tempo sufi-
ciente para perscrutar a verdade biológica, reconheceu juridicamente 
a paternidade daquela; III - A alegada dúvida sobre a verdade 
biológica, ainda que não absolutamente dissipada, mostrou-se Ô
Ô irrelevante, desinfluente para que o ora recorrente, incentivado, 
segundo relata, pela própria família, procedesse ao reconhecimento 
do recorrido como sendo seu filho, oportunidade, repisa-se, em que 
o vínculo afetivo há muito encontrava-se estabelecido; IV - A tese 
encampada pelo ora recorrente no sentido de que somente proce-
deu ao registro por incorrer em erro substancial, este proveniente da 
pressão psicológica exercida pela genitora, bem como do fato de que 
a idade do recorrido corresponderia, retroativamente, à data em que 
teve o único relacionamento íntimo com aquela, diante do contexto 
fático constante dos autos, imutável na presente via, não comporta 
guarida; V - Admitir, no caso dos autos, a prevalência do vínculo 
biológico sobre o afetivo, quando aquele afigurou-se desinfluente 
para o reconhecimento voluntário da paternidade, seria, por via 
transversa, permitir a revogação, ao alvedrio do pai registral, do es-
tado de filiação, o que contraria, inequivocamente, a determinação 
legal constante do art. 1.610, Código Civil; VI - Recurso Especial a 
que se nega provimento” (REsp nº 1078285-MS, Rel. Min. Massami 
Uyeda, 3ª T., j. 13/10/2009, DJe de 18/8/2010).
10. “RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DECLARA-
TÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE FILIAÇÃO. INTERESSE. EXIS-
TÊNCIA. I. O pedido deduzido por irmão, que visa alterar o registro 
de nascimento de sua irmã, atualmente com mais de 60 anos de idade, 
para dele excluir o pai comum, deve ser apreciado à luz da verdade so-
cioafetiva, mormente quando decorridos mais de 40 anos do ato inqui-
nado de falso, que foi praticado pelo pai registral sem a concorrência 
da filha. II. Mesmo na ausência de ascendência genética, o registro 
da recorrida como filha, realizado de forma consciente, consolidou 
a filiação socioafetiva, devendo essa relação de fato ser reconhecida 
e amparada juridicamente. Isso porque a parentalidade que nasce de 
uma decisão espontânea deve ter guarida no Direito de Família. III. 
O exercício de direito potestativo daquele que estabelece uma filiação 
socioafetiva, pela sua própria natureza, não pode ser questionado por 
seu filho biológico, mesmo na hipótese de indevida declaração no as-
sento de nascimento da recorrida. IV. A falta de interesse de agir que 
determina a carência de ação é extraída, tão só, das afirmações daque-
le que ajuíza a demanda – in status assertionis –, em exercício de abs-
tração que não engloba as provas produzidas no processo, porquanto 
a incursão em seara probatória determinará a resolução de mérito, nos 
precisos termos do art. 269, I, do CPC. Recurso não provido” (REsp 
nº 1259460-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., j. 19/6/2012, DJe de 
29/6/2012).
11. Este, conforme Tânia da Silva Pereira e Carolina de Campos 
Melo (2001), “[...] princípio dirigente de nosso ordenamento jurídico”.
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legislativas12 e em decisões judiciais conforme, 
dentre outras, as referidas anteriormente e que 
tiveram em conta, como se pode notar de seu 
teor, o mesmo interesse.
Do quanto se vem expondo e aindaque de ma-
neira restrita, pode-se aferir o que a partir da CF de 
1988 foi possível levar em consideração, no âmbito 
do Direito de Família, quanto à importância atri-
buída à família, nas formas em que se possa mani-
festar, e às relações a ela próprias e suas consequên-
cias, seja no espectro legislativo, seja no judicial, e 
principalmente no de interesse a este espaço e que 
diz respeito à filiação decorrente da socioafetivida-
de, assunto sobre o qual são deduzidas as considera-
ções a seguir e que têm – segundo aqui se entende 
e sobretudo – nítido viés constitucional.
2 Constituição e vida
Dúvida inexiste de que, ao se falar em dignidade 
da pessoa humana, em tal instituto se tenha como 
implicitamente insertos, no que toca à sua concei-
tuação, aspectos de ordem socioafetiva e psicológica, 
pouco importando que a tanto não se tenha referido 
de maneira específica a CF ou a legislação ordinária, 
naquilo que lhes coubesse, tanto por serem inerentes 
àquela tais circunstâncias quanto por ser facilmente 
possível aferir, em determinadas disposições legais, 
sua correlação com tais aspectos.
Desde logo se há considerar, como escrito por 
Giovana Crepaldi Caldeira (2011), que
“Formular o conceito de dignidade da pessoa 
humana foi e continua sendo objeto de aprimora-
mento entre os autores de várias ciências, dentre 
elas, filosófica, social e jurídica. Tal razão decor-
re certamente da polissemia atribuída à palavra 
dignidade. Portanto, não há como tal conceito 
ser apresentado de forma fixa, embora seja possí-
vel delimitar suas características essenciais. Além 
disso, não se pode desprezar a diversidade cultu-
ral das sociedades atuais, sendo que há divergên-
cias entre as mesmas se certos atos se enquadram 
como dignos ao homem ou não. Essas constituem 
as principais razões para a não elaboração de uma 
definição imutável sobre a dignidade humana. 
Nesse sentido, Edilsom Pereira de Farias (1996, p. 
50) ressalta: ‘O princípio em epígrafe – a Dignida-
de da Pessoa Humana – é um princípio semântico 
e estruturalmente aberto, de ‘abertura valorativa’, 
o que faz com que o mesmo seja em grande parte 
colmatado pelos agentes jurídicos no momento 
da interpretação e aplicação das normas jurídi-
cas. Assim, em razão de o princípio da dignidade 
da pessoa humana ser uma categoria axiológica 
aberta, considera-se inadequado conceituá-lo de 
forma fixista’”. 
Esse melhor interesse deve ser considerado, 
outrossim, ao lado da doutrina da proteção in-
tegral, encontrando-se aquele e esta, como é fácil 
concluir e no que tange à filiação (aqui considera-
da em moldura ampla), na percepção aberta e já 
mencionada do em que possa consistir a cláusula 
da dignidade da pessoa humana, em que, mais 
do que o aspecto técnico, há que se ter em conta o 
intuitivo, na apreensão de seu exato alcance.
Ademais e se valor foi dado pelo legislador ao as-
pecto biológico da filiação, conforme se constata à 
leitura do que a este respeito há no CC, também se 
há ter em conta que a adoção da dignidade como 
fundamento republicano e o uso do vocábulo no 
art. 227 da CF, afirmando ser “dever da família, 
“Uma Constituição é, por assim dizer, 
a miniatura política da fisionomia de 
uma nacionalidade.” (Rui Barbosa)
12. Como a ocorrida com a inserção no ECA da denominação sobre 
em que consiste a família extensa: “Art. 25 - Entende-se por família natu-
ral a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descenden-
tes. Parágrafo único - Entende-se por família extensa ou ampliada aquela 
que se estende para além da unidade pais e filhos ou da unidade do casal, 
formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente 
convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. (Incluído pela 
Lei nº 12.010, de 2009)”, o mesmo se dando quanto à observação do seu 
art. 23 e dirigida a que “A falta ou a carência de recursos materiais não 
constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder 
familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)”.
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da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao 
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o 
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, 
ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignida-
de, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar 
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda 
forma de negligência, discriminação, exploração, 
violência, crueldade e opressão”, acabam por se 
constituir em verdadeira exposição de princípios 
inerentes ao princípio do superior interesse e à 
doutrina da proteção integral e inserem tal dispo-
sição constitucional no catálogo dos direitos fun-
damentais esparsos e que não perdem tal caracte-
rística em face do fato de não estarem descritos no 
Título II, Capítulo I, da CF.
Por outro lado e do que consta no art. 227, bem 
como do enunciado do preâmbulo constitucional, 
ao se referir à fraternidade, o mesmo se dando 
quanto ao seu art. 3º, incisos I e III, ao aludir à 
solidariedade e à dignidade, tudo a fundamen-
tar a doutrina do superior interesse e da proteção 
integral, tem-se como perfeitamente admissível 
asseverar a presença do afeto como atinente e na-
tural às relações familiares, nas várias formas em 
que possa ela se manifestar,13 com relevo para as 
relativas à paternidade/maternidade e filiação.
Apropriada, aqui, a citação a artigo doutriná-
rio de Andreaze Bonifacio de Souza (2008), que 
a tal circunstância ao afeto se refere da seguinte 
maneira: 
“Decerto o princípio da afetividade, entendi-
do este como o mandamento axiológico fundado 
no sentimento protetor da ternura, da dedicação 
tutorial e das paixões naturais, não possui previ-
são legal específica na legislação pátria. Sua ex-
tração é feita de diversos outros princípios, como 
o da proteção integral e o da dignidade da pessoa 
humana, este também fundamento da República 
Federativa do Brasil. Essa derivação não o torna, 
porém, subsidiário ou inexistente, ao contrário, 
ele vem sendo bastante contemplado pelos tribu-
nais, sobretudo em relação ao Direito de Família, 
regendo com autonomia as questões pertinentes 
à chamada paternidade socioafetiva. Destacando 
essa conjuntura, complementa Tartuce (2006, p. 
3) que ‘mesmo não constando a palavra afeto no 
Texto Maior como um direito fundamental, po-
demos dizer que o afeto decorre da valorização 
constante da dignidade humana’. A louvável re-
dação do artigo 3º da Lei 8.069/90 – Estatuto da 
Criança e do Adolescente – inspirada na Declara-
ção Universal dos Direitos da Criança, da qual o 
Brasil é signatário, também contempla o aludido 
axioma. Eis a redação in verbis: ‘A criança e o ado-
lescente gozam de todos os direitos fundamentais 
inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da pro-
teção integral de que trata esta Lei, assegurando- 
-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as opor-
tunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o 
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual 
e social, em condições de liberdade e de digni-
dade’. Ao nosso sentir, também o Código Civil, 
em seu artigo 1.638, inciso II, considerou, mesmo 
que por via reflexa, o princípio da afetividade, ao 
dispor que: ‘Perderá por ato judicial o poder fami-
liar o pai ou a mãe que deixar filho em abandono’. 
Desde logo, adianto que uma interpretação restri-
tiva sobre a norma acima não se coaduna com a 
sistemática constitucional deste país. Lembro bem 
13. “Art. 1.511 - O casamento estabelece comunhão plena de vida, 
com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. 
[...]
Art. 1.565 - Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamen-
te a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos en-
cargos da família.
[...]
Art. 1.567 - A direção da sociedade conjugal será exercida, em cola-
boração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e 
dos filhos.[...]
Art. 1.723 - É reconhecida como entidade familiar a união estável 
entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, 
contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição 
de família.
[...]
Art. 1.724 - As relações pessoais entre os companheiros obedecerão 
aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento 
e educação dos filhos.”
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aqui do pensamento de Ferrara, para quem a inter-
pretação devia ser objetiva e desapaixonada, equili-
brada, porém não revolucionária, sem perder a au-
dácia, mas sempre atenciosa e respeitadora da lei. 
Compreender, pois, que o termo ‘abandono’ vai 
além do aspecto material, para alcançar o aspecto 
moral entre os pais e sua prole, pode até configu-
rar uma exegese revolucionária ou audaciosa, mas 
acima de tudo é uma reverência à lei que a expri-
me. Portanto, os pais são obrigados a absterem-se 
de abandonar afetivamente os filhos. O abandono 
afetivo, expressão de sentido bastante elástico, sig-
nifica mais que privar os filhos de amor, carinho 
e ternura. Ela representa, acima de tudo, priva-
ção de convivência, a omissão em sua forma mais 
erma e sombria. O mesmo que inclinar a mente 
infantojuvenil a entender seus genitores como me-
ros personagens da reprodução, figuras estanques 
e frias que a deixam por muito tempo ou mesmo 
por toda a vida à míngua de uma amizade pura, 
exilando-a a um desenvolvimento indigno, vulne-
rável e solitário”.
A adequação do quanto exposto nesse artigo 
pode-se verificar à leitura de dispositivos do CC, 
como, por exemplo, os arts. 1.511, 1.565, 1.566 a 
1.569, 1.583, parágrafos e incisos, 1.588 a 1.590, 
1.584, § 5º, 1.634 e incisos, 1.723 e 1.724, dentre 
outros, além do restante da legislação e nos quais 
se constata como sua razão de ser a ligação afetiva 
que existe ou deve orientar os membros da famí-
lia, com fundamento tanto na dignidade que cada 
um merece como nos demais princípios próprios 
ao ente familiar. 
Afinal e conforme Paulo Lôbo (2011, p. 73), 
“[...] o princípio da afetividade é o princípio que 
fundamenta o direito de família, na estabilidade 
das relações socioafetivas e na comunhão de vida”.
Tal o relevo que a afetividade merece que men-
ciona Paula Roberta Corrêa dos Santos Arruda 
(2011): 
“A aplicabilidade do princípio da afetividade 
está inteiramente ligada ao princípio da dignida-
de da pessoa humana, exercendo sem dúvida o 
principal fundamento das relações familiares, não 
sendo difícil concluir que o princípio da afetivida-
de possui fundamento constitucional”.
O acerto dessa conclusão não é difícil consta-
tar se for levado em conta o cuidado, na acepção 
jurídica que lhe é atribuída e que o caracteriza 
como princípio, em atenção “[...] à valorização 
preponderante do homem face aos demais seres 
e coisas, culminando-se no entendimento de que 
o homem é o valor originário de todos os demais 
valores, que seriam, portanto, valores derivados”, 
na bem lançada acepção de Roberta Tupinambá 
(2008, p. 356), que se refere, outrossim, ao fato de 
os princípios serem normas, pois o sistema jurí-
dico positivado é insuficiente à solução dos casos 
que o dia apresenta e nesta hipótese naturalmente 
surge o cuidado como princípio jurídico implí-
cito no ordenamento jurídico pátrio, na menção 
de Roberta Tupinambá (op. cit., p. 361), cuidan-
do-se, como adverte, de 
“[...] um novo campo de compreensão do prin-
cípio da dignidade da pessoa humana, no qual o 
cuidado se revela, inicialmente, como verdadeiro 
subprincípio dentro da sistemática jurídica atual, 
sendo compreendido, finalmente, como um princí-
pio implícito no da dignidade da pessoa humana”.
E como princípio, atua o cuidado como nor-
ma, já que, como esta, destina-se aquele à regula-
ção dos casos que dele necessitem, especialmente 
quando não tenham sido objeto de positivação pelo 
Direito,14 tendo verdadeira ligação com a afetivi-
dade, em razão da maneira como regulamentadas
O sistema jurídico positivado é 
insuficiente à solução dos casos 
que o dia apresenta. 
14. Cf., a respeito, Norberto Bobbio (1999, p. 158). 
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as relações familiares e a amplitude deferida a 
partir da CF de 1988 à forma como elas possam 
se manifestar, orientando o legislador e os pretó-
rios acerca da necessidade de revisão do conceito 
singular que antes permeava a família, de forma 
a passar ela a ter significado plural e destinado 
a uma comunhão plena de vida, com base na 
igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, 
em que homem e mulher assumem mutuamente 
a condição de consortes, companheiros e respon-
sáveis pelos encargos da família, segundo a dic-
ção dos arts. 1.511 e 1.565 do CC, aplicáveis tanto 
ao casamento quanto à união estável, nas formas 
como passíveis de caracterização.
Revendo o conceito do que antes era o ente fa-
miliar, “O texto constitucional, em especial nos arts. 
226 e 227, assimilou o marco da nova família, com 
contornos diferenciados, priorizando a necessidade 
da realização da personalidade dos seus membros, 
ou seja, a família-função, em que subsiste a afetivi-
dade, que, por sua vez, justifica a permanência da 
entidade familiar”, na letra de Roberta Tupinambá, 
que conclui, com apoio em Rodrigo da Cunha Pe-
reira: “Esta é a família constitucionalizada”.
Atento à preocupação do constituinte com a 
nova visão imposta à moldura da família, ocupou-
-se o legislador ordinário com a inserção, no CC 
de 2002, de novidade antes inexistente e consubs-
tanciada no art. 1.593, afirmando que “O paren-
tesco é natural ou civil, conforme resulte de con-
sanguinidade ou outra origem”.
Assim e uma vez mais invocando Roberta 
Tupinambá (op. cit., p. 366), 
“O acréscimo do termo ‘outra origem’ abriu es-
paço para várias interpretações e deu assento para 
o conceito da socioafetividade. A afetividade inva-
diu a ciência jurídica, transcendendo aos aspec-
tos especificamente psicológicos e sociológicos, 
imbuindo a família afetiva dos mesmos propósitos 
da família biológica, pois o que estaria em xeque 
seriam os vínculos de amor e afeto que unem uma 
entidade familiar”.
Por conta disso e de acordo com João Paulo 
Cunha, citado pela autora, 
“A árvore genealógica hoje tem mais galhos e 
eles estão cada vez mais intrincados. Com isso, os 
laços de parentesco, por si sós, não são garantia 
de nada. Como dizia Bernard Shaw, ninguém é 
melhor por ter nascido em determinado país ou 
família. O nacionalismo doentio, como familiaris-
mo, é deturpação do valor verdadeiro. Amor não 
tem genética nem latitude...”.15
Fica claro, assim, o acerto do relevo atribuído à 
socioafetividade como condição apta à atribuição 
da situação paterno/filial a alguém, segundo as nor-
mas e princípios constitucionais e legais aplicáveis.
A força do afeto, da intenção de a alguém se 
dedicar, dele cuidando e tratando-se como filho, 
independentemente de vínculo biológico, surge 
como razão mais do que suficiente à afirmação 
sobre prestar-se a caracterizar a filiação. 
Afinal e consoante Deise Cristina Smania 
Machado (2009), “Pai é quem cria. A verda-
deira paternidade está intrínseca ao ato de 
vontade ao desejo de ser pai, sem a premissa 
de ser ela biológica ou não. O vínculo afeti-
vo sobrepõe-se aos laços oriundos da consan-
guinidade. O afeto, carinho e dedicação são 
dados ao filho afetivo simplesmente pelo fato 
de o pai possuir amor pelo filho e vice-versa”, 
em autêntica prática da solidariedade e respeito à 
dignidade humana do filho, observados, assim, o 
enunciado do art. 227 da CF e princípios outros 
aplicáveis, com relevo para o do cuidado.
De extrema adequação, em face do quanto 
até aqui considerado, o exposto em precedente do 
STJ,relatado pelo ministro Massami Uyeda e que 
se passa a transcrever:
“[...] sobreleva deixar consignado que a invali-
dade dos atos jurídicos que refletem no estado das 
15. Segundo a autora, o texto é do artigo “Quanto menos família 
melhor”, publicado no Boletim nº 24 do IBDFAM, p. 5, jan./fev. 
2004.
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pessoas não pode ser tratada da mesma maneira 
daquela que eventualmente pode eivar os demais 
atos da vida civil, isto porque aqueles geram efei-
tos que não se circunscrevem na esfera meramen-
te patrimonial e, portanto, de disponibilidade 
das pessoas. Nesta linha de raciocínio é inviável 
deixar de reconhecer que a adoção, ainda que à 
moda brasileira, gera para o registrado a posse do 
estado de filho. É dizer, em outras palavras, que, 
a despeito de não corresponder à verdade real, a 
posse do estado de filho gera uma aparência de 
modo a fazer com que todos manifestem a cren-
ça em uma realidade que, na verdade, não existe, 
mas nem por isso merece ficar à margem da tu-
tela jurídica, notadamente diante do fato de que 
se formam laços afetivos entre o registrando e o 
registrado, vínculos estes que muitas vezes são até 
mais fortes do que os sanguíneos. Daí, portanto, 
ser ‘necessário ter uma visão pluralista da famí-
lia’ (Dias, Maria Berenice. Manual de Direito das 
Famílias. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 
2007, p. 41). A família, nos tempos modernos, não 
se perfaz apenas por aquelas pessoas com as quais 
se têm ligações biológicas, senão também com 
aqueloutras pelas quais se mantêm um elo de afe-
tividade. No caso dos autos, colhe-se de uma aná-
lise objetiva das peças processuais que a recorrida 
fora registrada em 1965 como sendo filha de A. T. 
S., hoje falecido, e H. A. T. S. Passados longos 38 
anos (em 16/12/2003), a segunda esposa e viúva 
de A. T. S. (recorrente) pretende desconstituir o 
registro civil de nascimento de S. A. T., recorri-
da, o que, em última análise, significa o próprio 
desfazimento de um vínculo de afeto que foi cria-
do e cultivado entre a registrada e seu ‘pai’ com 
o passar do tempo. Outra questão que chama a 
atenção desta Relatoria é o fato de que, conforme 
consignado nas Instâncias de origem, nem mes-
mo o declarante manifestou, em vida, sua vonta-
de de desconstituir o ato de ‘adoção’. Ora, se nem 
mesmo aquele que procedeu ao registro, tomando 
como sua filha que sabidamente não é, teve a ini-
ciativa de anulá-lo, não se pode admitir que um 
terceiro (na espécie, a viúva deste) assim o faça. 
Ademais, a própria concepção da adoção à bra-
sileira traz consigo a ideia de que o sujeito tinha 
conhecimento de que não estava a registrar filho 
próprio, sendo, portanto, incompatível com a no-
ção de erro. É dizer, portanto, que quem adota à 
moda brasileira não labora em equívoco, ao revés, 
tem pleno conhecimento das circunstâncias que 
gravitam em torno de seu gesto e, ainda assim, ul-
tima o ato. Nestas circunstâncias, nem mesmo o 
pai, por arrependimento posterior, pode se valer 
de eventual ação anulatória postulando descons-
tituir o registro, afinal nemo auditur propriam 
turpitudinem allegans. De um lado, há de conside-
rar que a adoção à brasileira é reputada pelo orde-
namento jurídico como ilegal e, eventualmente, 
até mesmo criminosa (artigo 242 do Código Pe-
nal). Por outro lado, não se pode ignorar o fato de 
que este ato gera efeitos decisivos na vida da crian-
ça adotada, como a futura formação da paterni-
dade socioafetiva. Da mesma forma, a reflexão 
sobre a possibilidade de o pai-adotante pleitear a 
nulidade do registro de nascimento deve levar em 
conta esses dois valores em rota de colisão (ilegali-
dade da adoção à moda brasileira, de um lado, e, 
de outro, repercussão dessa prática na formação 
e desenvolvimento do adotado). Com essas pon-
derações, em se tratando de adoção à brasileira, a 
melhor solução consiste em só permitir que o pai-
-adotante busque a nulidade do registro de nasci-
mento, quando ainda não tiver sido constituído o 
vínculo de socioafetividade com o adotado. Após 
formado o liame socioafetivo, não poderá o pai- 
-adotante desconstruir a posse do estado de filho 
que já foi confirmada pelo véu da paternidade so-
cioafetiva” (REsp nº 1088157-PB, Rel. Min. Mas-
sami Uyeda, 3ª T., j. 23/6/2009, DJe de 4/8/2009).
Da mesma forma e atendendo ao quanto constitu-
cionalmente determinado, bem como aos princípios 
aplicáveis, cabe a referência a trecho de julgado outro 
da mesma corte, relatora a ministra Nancy Andrighi:
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“[...] o cuidado, na lição de Leonardo Boff, re-
presenta uma atitude de ocupação, preocupação, 
responsabilização e envolvimento com o outro; en-
tra na natureza e na constituição do ser humano. 
O modo de ser cuidado revela de maneira concreta 
como é o ser humano. Sem cuidado ele deixa de ser 
humano. Se não receber cuidado desde o nascimen-
to até a morte, o ser humano desestrutura-se, defi-
nha, perde sentido e morre. Se, ao largo da vida, não 
fizer com cuidado tudo o que empreender, acabará 
por prejudicar a si mesmo por destruir o que estiver 
à sua volta. Por isso o cuidado deve ser entendido 
na linha da essência humana (apud Pereira, Tânia 
da Silva. Op. cit. p. 58). Com fundamento na pa-
ternidade responsável, ‘o poder familiar é instituído 
no interesse dos filhos e da família, não em proveito 
dos genitores’ e com base nessa premissa deve ser 
analisada sua permanência ou destituição. Citando 
Laurent, ‘o poder do pai e da mãe não é outra coisa 
senão proteção e direção’ (Principes de Droit Civil 
Français, 4/350), segundo as balizas do direito de 
cuidado a envolver a criança e o adolescente.
Sob a tônica do legítimo interesse amparado na 
socioafetividade, ao padrasto é conferida legitimi-
dade ativa e interesse de agir para postular a desti-
tuição do poder familiar do pai biológico da crian-
ça. Entretanto, todas as circunstâncias deverão ser 
analisadas detidamente no curso do processo, com 
a necessária instrução probatória e amplo contradi-
tório, determinando-se, outrossim, a realização de 
estudo social ou, se possível, de perícia por equipe 
interprofissional, segundo estabelece o art. 162, § 1º, 
do Estatuto protetivo, sem descurar que as hipóteses 
autorizadoras da destituição do poder familiar – que 
devem estar sobejamente comprovadas – são aquelas 
contempladas no art. 1.638 do CC/02 c.c. art. 24 do 
ECA, em numerus clausus. Isto é, tão somente dian-
te da inequívoca comprovação de uma das causas de 
destituição do poder familiar, em que efetivamente 
seja demonstrado o risco social e pessoal a que esteja 
sujeita a criança ou de ameaça de lesão aos seus di-
reitos, é que o genitor poderá ter extirpado o poder 
familiar, em caráter preparatório à adoção, a qual 
tem a capacidade de cortar quaisquer vínculos exis-
tentes entre a criança e a família paterna. O direito 
fundamental da criança e do adolescente de ser cria-
do e educado no seio da sua família, preconizado 
no art. 19 do ECA, engloba a convivência familiar 
ampla, para que o menor alcance em sua plenitude 
um desenvolvimento sadio e completo. Atento a isso 
é que o Juiz deverá colher os elementos para decidir 
consoante o melhor interesse da criança. Diante dos 
complexos e intrincados arranjos familiares que se 
delineiam no universo jurídico – ampliados pelo en-
trecruzar de interesses, direitos e deveres dos diversos 
componentes de famílias redimensionadas –, deve o 
Juiz pautar-se, em todos os casos e circunstâncias, no 
princípio do melhor interesse da criança, exigindo 
dos pais biológicos e socioafetivos coerência de ati-
tudes, a fim de promover maior harmonia familiar 
e consequente segurança às crianças introduzidas 
nessas inusitadastessituras” (REsp nº 1106637-SP, 
Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., j, 1º/6/2010, DJe 
de 1º/7/2010).
3 Finalizando
“Na atualidade, o enfoque valorativo que orienta 
a formação dos vínculos de paternidade e 
filiação, em razão dos princípios constitucionais 
de assistência à criança (art. 227, CF) e de 
respeito à dignidade da pessoa humana, e, em 
especial, por força do art. 1.593 do atual CCB, 
privilegia a paternidade sociológica. 3. Assim, 
é possível extrair do ordenamento jurídico os 
fundamentos que conduzem ao reconhecimento 
da paternidade sociológica, revelada pela 
posse do estado de filho em condições de gerar 
efeitos jurídicos, tais como a manutenção 
da relação jurídica de paternidade sem que 
entre pai e filho haja identidade genética.” 16
16. Agravo de Instrumento nº 70012792412, 7ª Câmara Cível, 
TJRS, Rel. Luiz Felipe Brasil Santos, j. 7/12/2005.
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Do exposto, é perfeitamente possível con-
cluir sobre o acerto da conclusão dirigida a en-
contrar a filiação socioafetiva apoio na dignida-
de da pessoa humana e solidariedade, indo ao 
encontro dos princípios do superior interesse e 
na doutrina da proteção integral, além de en-
contrar adequada moldura no art. 227, caput, da 
CF e no princípio igualitário adotado no art. 5º, 
inciso IV, e no § 6º do art. 227, disto resultando 
como corolário o reconhecimento, quanto aos 
pais e filhos fruto da filiação socioafetiva, dos 
direitos e deveres previstos para uns e outros, no 
âmbito das relações familiares.
Trata-se de fenômeno decorrente não dos la-
ços sanguíneos, mas daqueles resultantes de uma 
construção pessoal e consequência do interesse e 
cuidado de um para outro dos nela envolvidos e 
que, de uma forma ou de outra, foi antevista pelo 
legislador do CC, ao dispor, no art. 1.593, referen-
te ao parentesco, sobre poder ele fundar-se tam-
bém em outra origem.
O posicionamento legal, doutrinário e juris-
prudencial, assim, teve e tem a sensibilidade acu-
rada para que fatos como o da socioafetividade 
pudessem e possam merecer a atenção devida, de 
sorte a que, com referência ao tema objeto des-
tes comentários e como ressaltado por Roberto 
Paulino de Albuquerque Júnior (2006), “Decer-
to não constituir exagero algum dizer-se que, no 
direito civil brasileiro contemporâneo, vige a pre-
valência do paradigma da socioafetividade, como 
regra geral do sistema”, com arrimo nas regras e 
princípios que advêm especialmente da CF, po-
dendo-se afirmar, induvidosamente, como estan-
do o seu reconhecimento inserido nas garantias 
constitucionais concernentes à filiação.
Como acertadamente escrito por Maria 
Christina Almeida (2001, p. 159-160), jurista 
com que nossas letras não contam atualmente, 
em razão de haver constituído nacional, pelo 
equilíbrio e razão com que posicionados seus 
pontos de vista, em firme reconhecimento à im-
portância da filiação afetiva e o que ela indica 
em termos de cuidado e respeito às normas cons-
titucionais pertinentes, 
“O novo posicionamento acerca da verdadeira 
paternidade não despreza o liame biológico da re-
lação paterno-filial, mas dá notícia do incremen-
to da paternidade socioafetiva, da qual surge um 
novo personagem a desempenhar o importante 
papel de pai: o pai social, que é o pai de afeto, 
aquele que constrói uma relação com o filho, seja 
biológica ou não, moldada no amor, dedicação e 
carinho constantes”. 
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Direito fundamental à 
previsibilidade das decisões judiciais. 
Bruno Dantas 
Conselheiro do CNJ. Doutorando e mestre em 
Direito pela Pontifícia Universidade Católica 
(PUC-SP). Ex-consultor-geral do Senado Fe-
deral. Membro da Comissão de Juristas que 
elaborou o anteprojeto do novo Código de 
Processo Civil (CPC). Professor da Escola da 
Magistratura do Estado do Rio de Janeiro 
(Emerj). 
Sumário
1. Introdução
2. Segurança jurídicae Estado de Direito
3. Os precedentes no projeto do novo Código de 
Processo Civil
4. O dever dos tribunais de velar pela uniformiza-
ção e pela estabilidade de sua jurisprudência
 Bibliografia
1 Introdução
Pode-se estabelecer como marco temporal do 
início das reformas institucionais do Poder Judi-
ciário brasileiro a edição da Emenda Constitucio-
nal nº 45, de 2004. 
O projeto do novo Código de Processo Civil 
(CPC) procurou enfrentar dois dos maiores males 
que afligem atualmente a sociedade brasileira na 
seara jurídica: a fragmentação e a instabilidade 
da jurisprudência. Em diversos pontos, o projeto 
revela verdadeira mitigação do rígido modelo de 
civil law que tradicionalmente conhecemos, apro-
ximando-nos em razoável medida da família do 
common law.1
Essa mitigação não deve ser atribuída ao aca-
so ou a alguma preferência exótica da Comissão 
1. Já analisamos com vagar esse fenômeno em nosso livro sobre re-
percussão geral, no capítulo em que realizamos digressão sobre a 
função paradigmática dos recursos (DANTAS, 2010, p. 70 e ss.).
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de Juristas que redigiu o anteprojeto. Deveu-se, 
isto sim, à compreensão sedimentada entre os es-
tudiosos do Direito Comparado de que também 
na dicotomia das grandes famílias do Direito as-
siste razão à máxima aristotélica de que in medio 
stat virtus.
A legislação brasileira, antes repleta de concei-
tos herméticos, taxativos – frutos da tradição positi-
vista que nos orientou por muito tempo2 –, viu-se, 
em especial a partir das duas últimas décadas do sé-
culo XX, inundada pelas novas técnicas de elabora-
ção legislativa cujo desenvolvimento acompanhou 
o novo momento pós-positivista de nossa história:3 
princípios, cláusulas gerais, conceitos vagos, etc.4
Se é verdade que as novas técnicas permitem 
que o ordenamento jurídico permaneça atualizado 
por mais tempo5 e que o Estado desempenhe com 
maior efetividade as tarefas advindas da ascensão 
do welfare state,6 é igualmente verdade que o papel 
desenvolvido pelos tribunais adquire relevo antes 
inimaginável em sistemas de civil law. Daí por que, 
face à ausência de experiência do Brasil no trato 
do novo fenômeno, é necessário conhecer soluções 
dos países que possuem uma construção teórica se-
cular sobre o papel da jurisprudência.
Entre as muitas novidades propostas pelo pro-
jeto do novo CPC, uma chama particular atenção.
Trata-se do art. 847 do projeto original (art. 
882 do texto final aprovado pelo Senado e remeti-
do à Câmara dos Deputados), cujo caput estabele-
ce que “os tribunais velarão pela uniformização e 
pela estabilidade de sua jurisprudência”.7
2. Sobre o ponto, explica Karl Engisch (1996, p. 206): “Houve um 
tempo em que tranquilamente se assentou a ideia de que deveria 
ser possível estabelecer uma clareza e segurança jurídicas absolutas 
através de normas rigorosamente elaboradas, e especialmente garan-
tir uma absoluta univocidade a todas as decisões judiciais e a todos 
os actos administrativos. Esse tempo foi o do Iluminismo”. 
3. Para uma abordagem direta e suficiente da crise do positivismo, 
ver o capítulo 1 de Bueno (2008). Tratamento mais analítico pode 
ser encontrado na Parte I de Marinoni (2008).
4. Teresa Arruda Alvim Wambier (2008, p. 61 e ss.) traz um roteiro 
bastante útil da evolução do papel dos princípios e da caracterização 
do juiz como agente de concretização dos direitos fundamentais.
5. Em 1976, Barbosa Moreira (1977, p. 10) já explicava esse fenômeno: 
“Para não enrijecer de modo exagerado a disciplina das relações sociais, 
dificultando a sua indispensável adaptação às mutáveis condições eco-
nômicas, políticas, culturais – cujo incessante dinamismo caracteriza as 
sociedades contemporâneas –, abstém-se o legislador de descer a minú-
cias na configuração das hipóteses de incidência, limitando-se a inserir 
na norma legal alguns dados genéricos ou elementos de referência, que 
compõem o ‘quadro’ a ser preenchido pelo aplicador da lei, mediante a 
utilização de padrões variáveis de acordo com as novas concepções do-
minantes no ambiente histórico e social. Cresce de frequência o uso das 
‘cláusulas gerais’, dos standards jurídicos, dos conceitos indeterminados; 
e em igual medida aumenta o vulto da tarefa do órgão judicial, chama-
do a assentar, caso por caso, por exemplo, se são ‘contrários à moral e aos 
bons costumes’ os atos em razão dos quais se quer privar o pai do pátrio 
poder (Cód. Civil, art. 395, III); ou se o locatário cumpriu a obriga-
ção de tratar a coisa alugada ‘com o mesmo cuidado como se sua fosse’ 
(Cód. Civil, art. 1.192, I, fine); ou se o ato praticado pelo mandatário 
exorbitou da ‘administração ordinária’ e por isso dependia de conces-
são de poderes expressos e especiais no instrumento do mandato (Cód. 
Civil, art. 1.295, § 1º); ou se o litigante não podia ‘razoavelmente desco-
nhecer’ a falta de fundamento da pretensão ou da defesa deduzida, para 
que se haja de afirmar a sua responsabilidade por dano processual (Cód. 
Proc. Civil, art. 17, I); etc.”.
6. Habermas (1997, p. 173-174), dissertando sobre a “crise do Estado Ô
Ô de direito”, assevera: “O pivô da atual crítica ao direito, num Estado 
sobrecarregado de tarefas qualitativamente novas e quantitativamente 
maiores, resume-se a dois pontos: a lei parlamentar perde cada vez 
mais seu efeito impositivo e o princípio da separação dos poderes cor-
re perigo. Enquanto a administração clássica podia concentrar-se em 
tarefas de ordenação de uma sociedade econômica, entregue à autor-
regulação econômica, ela só devia intervir, em princípio, quando a 
ordem garantida pelo Estado de direito e pelo direito constitucional 
fosse perturbada. A lei geral e abstrata, que traduz fatos típicos em con-
ceitos jurídicos determinados e os associa a consequências jurídicas 
claramente definidas, tinha sido concebida em função desses casos; 
pois o sentido de ordem jurídica consistia em proteger a liberdade ju-
rídica das pessoas contra intromissões de um aparelho de Estado limi-
tado à manutenção da ordem. Tão logo, porém, a administração do 
Estado social foi tomada para tarefas de estruturação e de regulação 
política, a lei em sua forma clássica não era mais suficiente para pro-
gramar a prática da administração. [...] O leque das formas do direito 
foi ampliado através de leis relativas a medidas, leis experimentais de 
caráter temporário e leis de regulação, de prognóstico inseguro; e a 
inserção de cláusulas gerais, referências em branco e, principalmente, 
conceitos jurídicos indeterminados na linguagem do legislador, de-
sencadeou a discussão sobre a ‘indeterminação do direito’, a qual é 
motivo de inquietação para a jurisprudência americana e alemã”.
7. Eis o dispositivo em sua integralidade: “Art. 847 - Os tribunais velarão 
pela uniformização e pela estabilidade da jurisprudência, observando- 
-se o seguinte: I - sempre que possível, na forma e segundo as condições 
fixadas no regimento interno, deverão editar enunciados corresponden-
tes à súmula da jurisprudência dominante; II - os órgãos fracionários 
seguirão a orientação do plenário, do órgão especial ou dos órgãos fra-
cionários superiores aos quais estiverem vinculados, nesta ordem; III - a 
jurisprudência pacificada de qualquer tribunal deve orientar as decisões 
de todos os órgãos a ele vinculados; IV - a jurisprudência do Supremo 
Tribunal Federal e dos tribunais superiores deve nortear as decisões de 
todos os tribunais e juízos singulares do país, de modo a concretizar 
plenamente os princípios da legalidade e da isonomia; V - na hipótese de 
alteração da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal Ô
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Esse dispositivoremete a uma questão que 
tem sido discutida há muito tempo por proces-
sualistas nacionais renomados como Rodolfo de 
Camargo Mancuso (2001) e Teresa Arruda Alvim 
Wambier (2001): a divergência jurisprudencial e 
os seus efeitos nocivos para os jurisdicionados e 
para o próprio sistema jurídico. Na doutrina es-
trangeira, Jürgen Habermas (1997, p. 174) igual-
mente chama a atenção para a preocupação das 
jurisprudências americana e alemã relativas à cha-
mada “indeterminação do Direito”.
Esse ponto de discussão tem revelado que a mo-
derna metodologia do Direito aponta para ques-
tões cada vez mais sofisticadas. Karl Larenz (1966, 
p. 154), em meados do século passado, já afirma-
va que “ninguém mais pode afirmar seriamente 
que a aplicação das leis nada mais envolva do 
que a inclusão lógica sob conceitos superiores 
abstratamente formulados”. Sem dúvida, a her-
menêutica tem sido um dos campos prediletos 
dos filósofos do Direito desde a segunda metade 
do século XX.
O jusfilósofo alemão Robert Alexy (2001, p. 
17) aponta pelo menos quatro razões para justifi-
car o fato de que, em um grande número de casos, 
a afirmação normativa singular que expressa um 
julgamento envolvendo uma questão legal não é 
meramente a conclusão lógica derivada de formu-
lações de normas pressupostamente válidas, toma-
das junto com afirmações de fatos comprovada ou 
pressupostamente verdadeiros, o que rompe com 
o esquema clássico da lógica formal: 
“(1) a imprecisão da linguagem do Direito, (2) 
a possibilidade de conflitos entre as normas, (3) o 
fato de que é possível haver casos que requeiram 
uma regulamentação jurídica, que não cabem sob 
nenhuma norma válida existente, bem como (4) a 
possibilidade, em casos especiais, de uma decisão 
que contraria textualmente um estatuto”.
Os problemas interpretativos mencionados por 
Alexy são potencializados em sistemas de origem 
romano-germânica, que têm na lei a sua fonte 
primordial de direitos.8 Isso em razão da possibi-
lidade de cada juiz dar aos textos legais a inter-
pretação que melhor lhe convenha,9 embora haja 
autores a defender, corretamente a nosso ver, que 
a lei é vocacionada para uma única interpretação 
correta, dadas as mesmas condições fáticas e o 
mesmo momento histórico.10
No Brasil, especificamente, esse fato, combi-
nado com a riqueza do sistema recursal vigente 
e a postura contumaz da Fazenda Pública,11 e 12 
tem ensejado o assoberbamento dos tribunais 
superiores, instados, mediante dezenas de 
Ô e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos 
repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse 
social e no da segurança jurídica. § 1º - A mudança de entendimen-
to sedimentado observará a necessidade de fundamentação adequada 
e específica, considerando o imperativo de estabilidade das relações 
jurídicas. § 2º - Os regimentos internos preverão formas de revisão da 
jurisprudência em procedimento autônomo, franqueando-se inclusive 
a realização de audiências públicas e a participação de pessoas, órgãos 
ou entidades que possam contribuir para a elucidação da matéria”.
8. Vincy Fon e Francesco Parisi (2001, p. 4), em artigo destinado a 
fazer análise dinâmica dos precedentes judiciais nos sistemas da civil 
law, observam que “current theories are unable to explain why, in spite 
of emphasis on legal certainty and stability, the practice of Civil law 
systems in certain areas of the law is often characterized by instability 
and uncertainty. Traditional explanations focus on the lack of stare 
decisis (Mattei, 1988), different judicial cultures, political instability 
and different levels of separation of powers (Merryman, 1969)”.
9. Para uma abordagem completa sobre a questão da racionalidade da 
jurisprudência e o trabalho hermenêutico dos juízes, ver Habermas 
(2003, p. 241-295).
10. Por todos, ver Arruda Alvim Wambier (2000, p. 231).
11. Saulo Ramos (1999, p. 370-371), em palestra pronunciada na cerimô-
nia de aniversário do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, em 
13 de agosto de 1999, afirmara: “Não temos nada para impedir a prática 
da ilegalidade através de decisões em tese, circunstância que fez deste 
país o paraíso dos economistas e burocratas, grandes legisladores por 
portarias, fato que multiplica ao infinito as lesões individuais e os conse-
quentes pedidos de socorro ao Judiciário [...] Convenhamos, porém, que 
a mais terrível realidade brasileira está na resistência da tecnocracia aos 
pronunciamentos judiciais, sobretudo os da Corte Constitucional. Agen-
tes do governo cometem conscientemente várias inconstitucionalidades, 
estimulados pelo cálculo cinicamente contábil sobre quantos cidadãos 
lesados recorrerão ao judiciário e quantos deixarão de recorrer”.
12. Demonstração cabal do que se afirma é o recente Relatório 100 
maiores litigantes, elaborado pelo Departamento de Pesquisas Judi-
ciárias (DPJ) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e divulgado 
em março de 2011, que aponta o INSS (22,33%), a CEF (8,50%), a 
Fazenda Nacional (7,45%), a União Federal (6,97%) e o Banco do 
Brasil (4,24%) como os cinco maiores litigantes de todo o Poder Ju-
diciário nacional. Disponível em: <http://bit.ly/hvUz00>.
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milhares de casos repetitivos,13 a uniformizar 
entendimentos de todos os tribunais do país.
2 Segurança jurídica e Estado de 
Direito
O princípio da segurança jurídica é um dos 
pilares de sustentação do Estado Democrático 
de Direito e seu objetivo é proteger e preservar as 
justas expectativas das pessoas.14 Ensina, a propó-
sito, Recasens Siches (2006, p. 63):
“Debido al hecho de que el hombre se represen-
ta el futuro y se preocupa por éste, las satisfacciones 
actuales no son suficientes, mientras que se perciba 
el porvenir como incierto. Ese deseo de seguridad 
incita a la creación y al desarrollo de técnicas para 
evitar el daño que los peligros de la Naturaleza 
puedan producir; para dominar las fuerzas de la 
Naturaleza con el fin de ponerlas al servicio regular 
de las necesidades humanas; para garantizar unas 
buenas condiciones de vida; para prevenir enfer-
medades y para curarlas, etc. Ahora bien, tales de-
seos de seguridad llevan también – y esto lo que im-
porta subrayar aquí – a buscar el amparo del grupo 
social mediante normas e instituciones de Derecho 
positivo. En efecto, el deseo de seguridad es uno 
de los motivos radicales que lleva el hombre a pro-
ducir Derecho positivo, gracias al cual pueda, hasta 
cierto punto, estar cierto y garantizado respecto de 
la conducta de los otros, y sepa a qué atenerse res-
pecto de lo que uno pueda hacer en relación con 
ellos, y de lo que ellos puedan hacerle a uno”.
Denninger, citado por Habermas, afirma que 
os desafios do Estado Social – justificadores, em 
certa medida, da insuficiente regulamentação da 
administração do ponto de vista do Direito Cons-
titucional – fazem com que se transite de “um 
sistema da segurança jurídica para um sistema de 
segurança de vantagens jurídicas”, o qual modifi-
ca e dilui a proteção jurídica dos indivíduos.15
Embora a moderna doutrina subdivida o prin-
cípio da segurança jurídica em dois vetores,16 para 
os fins deste estudo é mais útil trilhar o caminho 
apontado por Teresa Arruda Alvim Wambier e en-
xergar a expressão no sentido de previsibilidade.17
De fato, se a jurisdição tem a função de prote-
ger direitos, especialmente os fundamentais,18 e se o 
exercício da jurisdição – que no passado foi lastreado 
num singelo esquema de lógica formal denomina-
do subsunção – passou modernamente a encerrar 
operação hermenêutica complexa, devido à gama de 
princípios constitucionais, cláusulas gerais e concei-
tos jurídicos indeterminados a serem considerados, 
a previsibilidade que a sociedade deseja deve brotar 
menos da lei e mais da atuação dos juízese tribunais.
Se, por um lado, a divergência judicial con-
cita a dialética e estimula o desenvolvimento do 
direito e o surgimento de soluções afinadas com 
a realidade social, por outro, não pode negar seu 
poder de estimular a litigiosidade no seio da so-
ciedade. Quando a mesma situação fática, num 
dado momento histórico, é decidida por juízes 
da mesma localidade de forma diametralmente 
antagônica, a mensagem enviada à sociedade é 
a de que ambas as partes têm (ou podem ter) 
razão. Ora, se todos podem ter razão, até mes-
mo quem, por estar satisfeito com o tratamento 
13. Atento ao novo fenômeno, o projeto do novo CPC descreve e 
oferece disciplina jurídica para o julgamento dos casos repetitivos, 
merecendo referência os arts. 883 e 930 a 941 da versão final aprova-
da pelo Senado Federal.
14. Conforme anota Roque Carraza no artigo “Segurança jurídica 
e eficácia temporal das alterações jurisprudenciais: competência dos 
tribunais superiores para fixá-las – questões conexas” (in FERRAZ 
JUNIOR; CARRAZZA; NERY JUNIOR, 2008, p. 41).
15. “Der Präventious-Staat” apud Habermas (1997, p. 177).
16. O vetor objetivo, atinente ao princípio da irretroatividade das 
leis, à proibição da ofensa ao ato jurídico perfeito, à coisa julgada e 
ao direito adquirido, e o subjetivo, vinculado com o desenvolvimen-
to teórico do princípio da proteção da confiança.
17. “Entendemos que, nesse contexto que vimos nos referindo, ao 
longo deste item, um dos valores que não pode ser desprezado é a 
segurança, tomada esta expressão no sentido de previsibilidade. 
Trata-se de um fenômeno que produz tranquilidade e serenidade 
no espírito das pessoas, independentemente daquilo que se garanta 
como provável de ocorrer como valor significativo. Não se trata, pois, 
de segurança da expectativa de que tudo deva ficar como está” 
(ARRUDA ALVIM WAMBIER, 2008, p. 57-58).
18 . Cf. Marinoni, op. cit., p. 137.
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jurídico que sua situação vinha recebendo, não 
havia batido às portas do Judiciário terá forte 
incentivo a fazê-lo.19
Evidentemente, esse fenômeno é algo nor-
mal no exercício da jurisdição em primeiro grau. 
Anormal é que a divergência judicial perpasse os 
tribunais, órgãos colegiados concebidos para dar 
trato algo mais qualificado às questões julgadas 
em primeiro grau. Anormal é que a divergência 
dos juízes de primeiro grau seja fundamentada em 
acórdãos divergentes de colegiados de um mesmo 
tribunal, como se não existisse ali órgão uno, mas 
aglomerado de sobrejuízes com competências in-
dividuais autônomas, o que contraria o princípio 
constitucional da colegialidade dos tribunais.
Vale dizer, normal é a jurisprudência dos tri-
bunais orientar a atuação dos juízes inferiores. 
Anormal é os tribunais oferecerem o insumo da 
imprevisibilidade e da insegurança jurídica para 
os magistrados das instâncias inferiores e a socie-
dade em geral.
3 Os precedentes no projeto do novo 
Código de Processo Civil
Os precedentes têm funções distintas nos sis-
temas do civil law e do common law.20 Embora 
nos sistemas romano-germânicos, como o nosso, 
possa haver situações em que as decisões vincu-
lam os órgãos jurisdicionais, essa não é a regra do 
sistema, que tem na lei a sua fonte primária de 
direito. Ao contrário, no common law, não obs-
tante as divergências entre os sistemas inglês e 
norte-americano, o respeito à eficácia vinculante 
dos precedentes é a força motriz que dá sustenta-
ção ao sistema, em razão da ausência de normas 
jurídicas escritas.
Isso porque, sendo a regra do common law a 
lex non scripta, se cada magistrado pudesse extrair 
livremente a sua compreensão em torno dos cos-
tumes que cercam determinado caso, o sistema 
seria absolutamente caótico e imprevisível. Note-
-se que essa liberdade é possível nas famílias de 
civil law em razão de a lei per se trazer segurança 
jurídica e conter, em si própria, um conteúdo que 
os cidadãos podem extrair, independentemente 
de ir ao Poder Judiciário buscar a tutela para um 
determinado direito subjetivo que afirmem viola-
do ou ameaçado. Assim, o que traz estabilidade e 
segurança jurídica aos países de common law, vez 
que a regra não é a lei escrita, é a obediência aos 
precedentes.21
A doutrina do precedente, adotada com pe-
culiaridades nos Estados Unidos e na Inglaterra, 
estatui que as decisões de casos anteriores muito 
semelhantes a novos casos devem ser repetidas 
nesses últimos.
A previsibilidade que a 
sociedade deseja deve brotar 
menos da lei e mais da atuação 
dos juízes e tribunais.
19. Embora este artigo não seja o local apropriado para maiores di-
gressões, chamamos a atenção do leitor para o fato de que economis-
tas há muito estudam a chamada “teoria dos incentivos”. Em artigo 
recente de nossa coautoria, publicado no jornal Valor, já tivemos 
oportunidade de ressaltar: “Em 2007, os economistas norte-ameri-
canos Leonid Hurwicz, Eric Maskin e Roger Myerson venceram o 
Prêmio Nobel de Economia por estabelecerem as bases da Teoria de 
Desenho de Mecanismos que, em linhas gerais, busca entender os 
incentivos com os quais se defronta um agente no momento de to-
mar uma decisão que afeta outros agentes e, entendendo esses incen-
tivos, criar regras de alocação de recursos que levem todos os agentes 
a agirem de forma ótima, de acordo com um critério previamente 
estabelecido” (DANTAS; MENEGUIN, 2010). Daí ser possível con-
cluir que, à luz da teoria dos incentivos, a divergência judicial em 
níveis elevados não é socialmente desejável.
20. Rodolfo de Camargo Mancuso (op. cit., p. 37-54) disserta sobre 
a natureza jurídica da jurisprudência, debruçando-se especialmente 
sobre o sistema da civil law. 
21. Concorda Cândido Rangel Dinamarco (1987, p. 153-154) ao as-
severar que o efeito vinculante do precedente na common law é dita-
do pela necessidade de estabilidade e segurança do direito, de modo 
que, onde há direito escrito, é desnecessário e mesmo desaconselhá-
vel que os tribunais estratifiquem sua orientação, trancando a dinâ-
mica do direito, pois é legítimo que haja evolução do direito, à vista 
da mobilidade social, do desenvolvimento e mudanças dos valores 
que formaram sua interpretação.
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A regra do precedente, porém, não é simples 
e automática. Hoje já há nos países anglo-saxões 
duas correntes que explicam-na: a estrita e a ate-
nuada. Ronald Dworkin (1999, p. 30) explica que 
a corrente estrita 
“obriga os juízes a seguirem as decisões ante-
riores de alguns outros tribunais (em geral de tri-
bunais superiores, mas às vezes no mesmo nível de 
hierarquia dos tribunais de sua jurisdição), mesmo 
acreditando que essas decisões foram erradas”. 
O professor norte-americano anota que essa 
corrente da doutrina do precedente varia de lugar 
para lugar: “é diferente nos Estados Unidos e na 
Grã-Bretanha, e difere de Estado para Estado nos 
Estados Unidos” (ibidem).
A corrente atenuada, por sua vez, exige que o 
juiz de alguma forma leve em consideração as de-
cisões anteriores sobre a mesma controvérsia, esta-
tuindo que ele deve seguir tais decisões a menos 
que as considere erradas o bastante para suplantar 
a presunção inicial em seu favor, conforme anota 
Dworkin (op. cit., p. 32).22
Tentando fazer uma rudimentar compara-
ção entre a doutrina do precedente dos países da 
common law e a eficácia persuasiva e vinculante 
da súmula do sistema brasileiro, observamos que a 
teoria atenuada da doutrina do precedente aponta 
um meio-termo entre força persuasiva e vinculan-
te da súmula. Interessante notar que o caminho 
ora trilhado pelo Brasil é diametralmente oposto 
ao que seguem os Estados Unidos e, mais recente-
mente, a Inglaterra.

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