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1 História do Mundo Bíblico Antigo 2 História do Mundo Bíblico Antigo IBETEL Site: www.ibetel.com.br E-mail: ibetel@ibetel.com.br Telefax: (11) 4743.1964 - Fone: (11) 4743.1826 R. Gal. Fco. Glicério, 1412 – Centro – Suzano/SP – Cep 08674-002 3 História do Mundo Bíblico Antigo (Org.) Profº. Pr. VICENTE PAULA LEITE História do Mundo Bíblico Antigo 4 Apresentação Estávamos em um culto de doutrina, numa sexta-feira destas quentes do verão daqui de São Paulo e a congregação lotada até pelos corredores externos. Ouvíamos atentamente o ensino doutrinário ministrado pelo Pastor Vicente Paula Leite, quando do céu me veio uma mensagem profética e o Espírito me disse “fale com o pastor Vicente no final do culto”. Falei: - Jesus te chama para uma grande obra de ensino teológico para revolucionar a apresentação e metodologia empregada no desenvolvimento da Educação Cristã. Hoje com imensurável alegria, vejo esta profecia cumprida e o IBETEL transbordando como uma fonte que aciona apressuradamente com eficácia o processo da educação teológico-cristã. A experiência acumulada do IBETEL nessa década de ensino teológico transforma hoje suas apostilas, produtos de intensas pesquisas e eloqüente redação, em noites não dormidas, em livros didáticos da literatura cristã com uma preciosíssima contribuição ao pensamento cristão hodierno e aplicação didática produtiva. Esta correção didática usando uma metodologia eficaz que aponta as veredas que leva ao único caminho, a saber, o SENHOR e Salvador Jesus Cristo, chega as nossas mãos com os aromas do nardo, da mirra, dos aloés, da qual você pode fazer uso de irrefutável valor pedagógico- prático para a revolução proposta na gênese de todo trabalho. E com certeza debaixo das mãos poderosas do SENHOR ser um motor propulsor permanentemente do mandamento bíblico: “Conheçamos e prossigamos em conhecer ao Senhor...”. Por certo esta semente frutificará na terra boa do seu coração para alcançar preciosas almas compradas pelo Senhor Jesus. Dr. Messias José da Silva In memorian 5 História do Mundo Bíblico Antigo Prefácio Este Livro da História do Mundo Bíblico Antigo, parte de uma série que compõe a grade curricular do curso em Teologia do IBETEL, se propõe a ser um instrumento de pesquisa e estudo. Embora de forma concisa, objetiva fornecer informações introdutórias acerca dos seguintes pontos: Evolução ou criação: Criação, A Idade do Homem, Pré-história, História, Classificação, Antigas Civilizações; Povos e Nações do Mundo Bíblico Antigo: Noé, Semitas, Acádios, Cananeus, Suméria e Mesopotâmia. Esta obra teológica destina-se a pastores, evangelistas, pregadores, professores da escola bíblica dominical, obreiros, cristãos em geral e aos alunos do Curso em Teologia do IBETEL, podendo, outrossim, ser utilizado com grande préstimo por pessoas interessadas numa introdução a História do Mundo Bíblico Antigo Finalmente, exprimo meu reconhecimento e gratidão aos professores que participaram de minha formação, que me expuseram a teologia bíblica enquanto discípulo e aos meus alunos que contribuíram estimulando debates e pesquisas. Não posso deixar de agradecer também àqueles que executaram serviços de digitação e tarefas congêneres, colaborando, assim, para a concretização desta obra. Profº. Pr. Vicente Leite Diretor Presidente IBETEL 6 Declaração de fé O que é doutrina? À luz da Bíblia, doutrina é o ensino bíblico normativo, terminante, final, derivado das Sagradas Escrituras, como regra de fé e prática de vida, para a igreja, para seus membros. Ela é vista na Bíblia como expressão prática na vida do crente. As doutrinas da Palavra de Deus são santas, divinas, universais e imutáveis. A palavra "doutrina" vem do latim doctrina, que significa "ensino" ou "instrução”, e se refere às crenças de um grupo particular de crentes ou mesmo de partidários. O Velho Testamento usa a palavra leqach, que vem do verbo laqach, "receber". O sentido primário é "o recebido". Aparece com o sentido de "doutrina" ou "ensinamento", como lemos "Goteje a minha doutrina como a chuva" (Dt 32.2); "A minha doutrina épura" (Jó 11.4); "Pois vos dou boa doutrina; não deixeis a minha lei" (Pv 4.2). Com o passar do tempo a palavra veio significar o ensino de Moisés que se encontra no Pentateuco. As palavras gregas para "doutrina", no Novo Testamento, são didaque e didaskalia, que significam "ensino". Essas palavras transmitem a idéia tanto do ato de ensinar como da substância do ensino. A primeira aparece para indicar os ensinos gerais de Jesus: "E aconteceu que, concluindo Jesus este discurso, a multidão se admirou da sua doutrina" (Mt 7.28). "Jesus respondeu e disse-lhes: A minha doutrina não é minha, mas daquele que me enviou. Se alguém quiser fazer a vontade dele, pela mesma doutrina, conhecerá se ela é de Deus ou se eu falo de mim mesmo” (Jo 7.16,17). A mesma palavra aparece para "doutrina dos apóstolos" (At 2.42), que parece ser uma indicação das crenças dos apóstolos. A segunda tem o mesmo sentido e aparece em Mateus 15.9 e Marcos 7.7. É, portanto, nas epístolas pastorais que elas aparecem com o sentido mais rígido de crenças ou corpo doutrinal da igreja - a Teologia propriamente dita. O que é Credo? Credo vem do latim e significa "creio", e desde muito cedo na história do Cristianismo é mais que um conjunto de crenças. É uma confissão de fé. Ele tem como objetivo sintetizar as doutrinas essenciais do cristianismo para facilitar as confissões públicas, conservar a doutrina contra as heresias e manter a unidade doutrinária. Encontramos no Novo Testamento algumas declarações rudimentares de confissões fé: A confissão de Natanael (Jo 1.50); a confissão de Pedro (Mt 16.16; Jo 6.68); a confissão de Tomé (Jo 20.28); a confissão do Eunuco (At 8.37); e artigos elementares de fé (Hb 6.1- 2). 7 História do Mundo Bíblico Antigo O IBETEL crê: O IBETEL professa fé pentecostal alicerçada fundamentalmente no que se segue: Cremos em um só Deus eternamente subsistente em três pessoas: o Pai, o Filho e o Espírito Santo (Dt 6.4; Mt 28.19; Mc 12.29). Na inspiração verbal da Bíblia Sagrada, única regra infalível de fé normativa para a vida e o caráter cristão (2Tm 3.14-17). No nascimento virginal de Jesus, em sua morte vicária e expiatória, em sua ressurreição corporal dentre os mortos e sua ascensão vitoriosa aos céus (Is 7.14; Rm 8.34; At 1.9). Na pecaminosidade do homem que o destituiu da glória de Deus, e que somente o arrependimento e a fé na obra expiatória e redentora de Jesus Cristo é que o pode restaurar a Deus (Rm 3.23; At 3.19). Na necessidade absoluta no novo nascimento pela fé em Cristo e pelo poder atuante do Espírito Santo e da Palavra de Deus, para tornar o homem digno do reino dos céus (Jo 3.3-8). No perdão dos pecados, na salvação presente e perfeita e na eterna justificação da alma recebidos gratuitamente na fé no sacrifício efetuado por Jesus Cristo em nosso favor (At 10.43; Rm 10.13; 3.24-26; Hb 7.25; 5.9). No batismo bíblico efetuado por imersão do corpo inteiro uma só vez em águas, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, conforme determinou o Senhor Jesus Cristo (Mt 28.19; Rm 6.1-6; Cl 2.12). Na necessidade e na possibilidade que temos de viver vida santa mediante a obra expiatória e redentora de Jesus no Calvário, através do poder regenerador, inspirador e santificador do Espírito Santo, que nos capacita a viver como fiéis testemunhas do poder de Jesus Cristo (Hb 9.14; 1Pe 1.15). No batismo bíblico com o Espírito Santo que nos é dado por Deus mediante a intercessão de Cristo, com a evidência inicial de falar em outras línguas, conforme a sua vontade (At 1.5; 2.4; 10.44-46; 19.1-7). Na atualidade dos dons espirituais distribuídos pelo Espírito Santoà Igreja para sua edificação conforme a sua soberana vontade (1Co 12.1-12). Na segunda vinda premilenar de Cristo em duas fases distintas. Primeira - invisível ao mundo, para arrebatar a sua Igreja fiel da terra, antes da grande 8 tribulação; Segunda - visível e corporal, com sua Igreja glorificada, para reinar sobre o mundo durante mil anos (1Ts 4.16.17; 1Co 15.51-54; Ap 20.4; Zc 14.5; Jd 14). Que todos os cristãos comparecerão ante ao tribunal de Cristo para receber a recompensa dos seus feitos em favor da causa de Cristo, na terra (2Co 5.10). No juízo vindouro que recompensará os fiéis e condenará os infiéis, (Ap 20.11-15). E na vida eterna de gozo e felicidade para os fiéis e de tristeza e tormento eterno para os infiéis (Mt 25.46). 9 História do Mundo Bíblico Antigo Sumário Apresentação Prefácio Declaração de fé CAPÍTULO 1 Evolução ou criação 1.1. Criação 1.2. A Idade do Homem 1.3. Pré-história 1.4. História 1.5. Classificação 1.6. Antigas Civilizações CAPÍTULO 2 Povos e Nações do Mundo Bíblico Antigo 2.1. Noé 2.2. Semitas 2.2.1. Características dos povos semitas 2.2.2. Evolução das culturas semitas 2.2.3. Povos semitas na antiguidade 2.2.4. Povos semitas atuais 2.3. Acádios 2.3.1. História 2.3.2. Organização política e econômica 2.4. Cananeus 2.5. Suméria 2.5.1. História 2.5.2. Civilização Suméria 2.6. Mesopotâmia 2.6.1. Resenha histórica 2.7. Ur 2.8. Babilônia 2.9. Dinastia amorrita 2.10. Dinastia cassita 2.11. O novo império babilônico 2.12. Decadência 2.13. Cultura e sociedade 2.14. Síria 2.14.1. Geografia física 2.14.2. Clima e hidrografia 2.14.3. População 2.14.4. História 2.14.5. Assíria 2.14.6. A cultura assíria 10 2.15. Egito 2.15.1. Geografia física 2.15.2. Hidrografia 2.15.3. Língua 2.15.4. Economia 2.15.5. História 2.15.6. Arqueologia 2.15.7. Inícios da moderna egiptologia 2.15.8. Escavações no século XX 2.15.9. Dinastias 2.16. Fenícia 2.16.1. História 2.16.2. Economia 2.16.3. Sociedade e política 2.16.4. Religião 2.16.5. História 2.17. Grécia antiga 2.17.1. Civilização micênica 2.17.2. Idade do bronze 2.17.3. Civilização micênica 2.17.4. Período arcaico 2.17.5. Período clássico 2.17.6. Guerra do Peloponeso 2.17.7. Pérsia 2.17.8. Dinastia aquemênida 2.17.9. Reino selêucida 2.17.10. Império arsácida 2.18. Macedônia 2.18.1. Hegemonia macedônica e decadência 2.19. Domínio romano 2.19.1. Civilização Helenísticas 2.19.2. Roma antiga 2.19.3. Origens da cidade 2.19.3. Monarquia 2.19.4. República 2.19.5. Expansão territorial 2.19.6. Invasão dos gauleses 2.19.7. Conquista da Itália 2.19.8. Expansão mediterrânea 2.19.9. Evolução da sociedade romana 2.19.10. Ditaduras e guerras civis 2.20. Império 2.20.1. Otávio Augusto 2.20.2. Decadência do império 2.20.3. Legado de Roma 2.21. Israel 2.21.1. Geografia física 11 História do Mundo Bíblico Antigo 2.21.2. Geologia e relevo 2.21.3. Clima e hidrografia 2.21.4. Flora e fauna 2.21.5. População 2.21.7. Economia 2.21.8. Agricultura 2.21.9. Energia e mineração 2.21.10. Indústria 2.21.11. Transportes 2.21.12. Sionismo 2.21.13. Colonização da Palestina 2.21.14. Independência 2.21.15. Instituições políticas 2.21.16. Sociedade e cultura Referências 12 Capítulo 1 Evolução ou criação A evolução é o ponto de vista predominante, proposto pela comunidade científica e educacional do mundo atual, em se tratando da origem da vida e do universo. Quem crê, de fato, na Bíblia deve atentar para estas quatro observações a respeito da evolução. 1. A evolução é uma tentativa naturalista para explicar a origem e o desenvolvimento do universo. Tal intento começa com a pressuposição de que não existe nenhum Criador pessoal e divino que criou e formou o mundo; pelo contrário, tudo veio a existir mediante uma série de acontecimentos que decorreram por acaso, ao longo de bilhões de anos. Os postulantes da evolução alegam possuir dados científicos que apóiam a sua hipótese; 2. O ensino evolucionista não é realmente científico. Segundo o método científico, toda conclusão deve basear-se em evidências incontestáveis, oriundas de experiências que podem ser reproduzidas em qualquer laboratório. No entanto, nenhuma experiência foi idealizada, nem poderá sê-lo, para testar e comprovar teorias em torno da origem da matéria a partir de um hipotético “grande estrondo”, ou do desenvolvimento gradual dos seres vivos, a partir das formas mais simples às mais complexas. Por conseguinte, a evolução é uma hipótese sem “evidência” científica, e somente quem crê em teorias humanas é que pode aceitá-la. A fé do povo de Deus, pelo contrário, firma-se no Senhor e na sua revelação inspirada, a qual declara que Ele é quem criou do nada todas as coisas (Hb 11.3); 3. É inegável que alterações e melhoramentos ocorrem em várias espécies de seres viventes. Por exemplo: algumas variedades dentro de várias espécies estão se extinguindo; por outro lado, ocasionalmente vemos novas raças surgindo dentre algumas das espécies. Não há, porém, nenhuma evidência, nem sequer no registro geológico, a apoiar a teoria de que um tipo de ser vivente já evoluiu doutro tipo. Pelo contrário, as evidências existentes apóiam a declaração da Bíblia, que Deus criou cada criatura vivente “conforme a sua espécie” (Gn 1.21,24,25); 4. Os crentes na Bíblia devem, também, rejeitar a teoria da chamada evolução teísta. Essa teoria aceita a maioria das conclusões da evolução naturalista; apenas acrescenta que Deus deu início ao 13 História do Mundo Bíblico Antigo processo evolutivo. Essa teoria nega a revelação bíblica que atribui a Deus um papel ativo em todos os aspectos da criação. Por exemplo, todos os verbos principais em Gênesis 1 têm Deus como seu sujeito, a não ser em Gn 1.12 (que cumpre o mandamento de Deus no v. 11) e a frase repetida “E foi a tarde e a manhã”. Deus não é um supervisor indiferente, de um processo evolutivo; pelo contrário, é o Criador ativo de todas as coisas (Cl 1.16). 1.1. Criação “Cremos que a criação tem sua origem na pessoa de Deus. Ele se revela na Bíblia como um ser infinito, eterno, auto-existente e como a Causa Primária de tudo o que existe. Nunca houve um momento em que Deus não existisse. Conforme afirma Moisés: “Antes que os montes nascessem, ou que tu formasses a terra e o mundo, sim, de eternidade a eternidade, tu és Deus” (Sl 90.2). Noutras palavras, Deus existiu eterna e infinitamente antes de criar o universo finito. Ele é anterior a toda criação, no céu e na terra, está acima e independe dela (1Tm 6.16; Cl 1.16). Deus se revela como um ser pessoal que criou Adão e Eva “à sua imagem” (Gn 1.27). Porque Adão e Eva foram criados à imagem de Deus, podiam comunicar-se com Ele, e também com Ele ter comunhão de modo amoroso e pessoal. Deus também se revela como um ser moral que criou tudo bom e, portanto, sem pecado. Ao terminar Deus a obra da criação, contemplou tudo o que fizera e observou que era “muito bom” (Gn 1.31). Posto que Adão e Eva foram criados à imagem e semelhança de Deus, eles também não tinham pecado. O pecado entrou na existência humana quando Eva foi tentada por Satanás em forma de serpente (Gn 3; Rm 5.12; Ap 12.9). Deus criou todas as coisas em “os céus e a terra” (Gn 1.1; Is 40.28; 42.5; 45.18; Mc 13.19; Ef 3.9; Cl 1.16; Hb 1.2; Ap 10.6). O verbo “criar” (hb.”bara”) é usado exclusivamente em referência a uma atividade que somente Deus pode realizar. Significa que, num momento específico, Deus criou a matéria e a substância, queantes nunca existiram. Com relação ao homem, Deus o criou com o seguinte propósito: (1) A criação da terra deu-se para prover um lugar onde o seu propósito e alvos para a humanidade fossem cumpridos. a) Criou Adão e Eva à sua própria imagem, para comunhão amorável e pessoal com o ser humano por toda a eternidade. Deus projetou o ser humano como um ser trino e uno (corpo, alma e espírito), que possui 14 mente, emoção e vontade, para que possa comunicar-se espontaneamente com Ele como Senhor, adorá-lo e servi-lo com fé, lealdade e gratidão; b) Desejou de tal maneira esse relacionamento com a raça humana que, quando Satanás conseguiu tentar Adão e Eva a ponto de se rebelarem contra Deus e desobedecerem ao seu mandamento, Ele prometeu enviar um Salvador para redimir a humanidade das conseqüências do pecado (Gn 3.15). Daí Deus teria um povo para sua própria possessão, cujo prazer estaria nEle, que o glorificaria, e que viveria em retidão e santidade diante dEle (Is 60.21; 61.1-3; Ef 1.11,12; 1Pe 2.9); c) A culminação do propósito de Deus na criação está no livro do Apocalipse, onde João descreve o fim da história com estas palavras: “...com eles habitará, e eles serão o seu povo, e o mesmo Deus estará com eles e será o seu Deus” (Ap 21.3). (Bíblia de Estudo Pentecostal, estudo sobre a Criação pág.31). 1.2. A Idade do Homem “Ao certo, nada se sabe quanto à idade do homem. A única narrativa que temos, para exame, é o capítulo 5 do livro de Gênesis. Por este relato, sabemos que Adão com 130 anos teve o terceiro filho. Partindo desta declaração, contando as idades de cada personagem, segundo verificamos, o dilúvio teve lugar 1.650 anos depois de Adão. Entretanto discute-se muito os dados oferecidos neste capítulo. Por outro lado, crê-se que a declaração de que Adão tinha 130 anos quando nasceu Sete deve referir-se à idade depois de cair no pecado. Pensa-se que teriam decorrido muitos anos, centenas mesmo, antes da queda, e talvez Moisés se louvasse na vida de Adão, como um de nós, e não antes, quando ele era como os anjos em sua inocência. Qual será a verdade? A nossa curiosidade e o nosso desejo de saber nos impelem para o desconhecido, e ficamos impacientes porque não podemos resolver os nossos problemas. Os que aceitam como razoável a cronologia de Gênesis louvam-se no fato de os 1.650 anos, de Adão ao dilúvio, eram o suficiente para que a terra se povoasse numa boa extensão e para que o gênero humano atingisse o desenvolvimento creditado no livro de Gênesis. Comparando algumas épocas entre si, chegamos à conclusão de que a idade antediluviana do mundo, nos tempos de Cristo, não oferecia qualquer semelhança com o nosso mundo. Da civilização européia nada existia; dos atuais conhecimentos científicos também nada existia; Entretanto, são apenas 1.950 anos. O mundo se transformou completamente durante estes séculos. Portanto, a mesma idade para o mundo antediluviano não parece de todo fora de propósito. Os evolucionistas necessitam de muitos milhões de séculos para a espécie humana se desenvolver ou evoluir, até atingir a humanidade que nós conhecemos; mas o evolucionismo é uma especulação sem qualquer base científica, e os seus cálculos devem ficar 15 História do Mundo Bíblico Antigo fora de cogitações. Os que entendem que a humanidade se desenvolvia mais lentamente nos tempos antigos admitem 10.000 anos para a idade do homem, e alguns documentos caldaicos, sem qualquer valor científico, favorecem esta crença. A história do Egito deve estender-se quanto muito, a 5.000 anos a.C., incluindo o período pré-histórico. Os egípcios vieram da Caldéia, devendo, portanto, esta região ser bem mais velha. A primeira onda humana, que teria atingido ali em 4500 a.C. ou 5000, o que faz coincidir com o estabelecimento desta gente no Egito, visto que os primeiros seres humanos que chegaram à Europa eram do mesmo estoque hamítico. Talvez a mesma onda se dividisse, seguindo uma parte para o sul, estabelecendo-se no Egito, e a outra dirigindo-se para o norte, atingindo a Germânia. Se estes cálculos puderam ser positivados, o homem deve agora ter chegado a 6.900 anos depois do dilúvio. Então 1650 anos seriam suficientes para o estabelecimento e desenvolvimento da espécie antes do dilúvio. A ciência tem feito grandes progressos, mas há ainda muito a investigar. Talvez a nossa raça não seja tão velha como se julga. Mil anos bastam para que o gênero humano produza grandes civilizações. As investigações continuam e ninguém deve desanimar de poder obter maiores conhecimentos através destas investigações. Os últimos dois séculos trouxeram mais conhecimentos da história antiga do que todos os milênios que os precederam. Se um historiador do princípio do século 18 ressuscitasse agora, ficaria envergonhado de tanta ignorância reinante nos seus dias. Os últimos 50 anos deram ao mundo um desenvolvimento maior do que 2.000 anos anteriores. Portanto, 1600 anos seriam suficientes para desenvolver uma população que não iria muito além dos limites que nós hoje conhecemos como Oriente Médio”. (Mesquita, Antônio Neves. Povos e Nações do Mundo Antigo. Pág. 30). 1.3. Pré-história Entende-se por pré-história, nos esquemas cronológicos tradicionais, todo o período que abrange a atividade humana desde suas origens até o aparecimento da escrita. Primeiramente, a atividade humana insere-se numa conformação social e tecnológica orientada pela economia predatória, e em seguida pela economia de subsistência agrícola não-urbana (isto é, sem distinção cidade-campo). Chama-se em geral de proto-história a época de transição que se segue, quando as sociedades agrárias começam a reunir os primeiros elementos para a posterior aplicação da escrita. Caracteriza-se pelo começo da substituição da tecnologia da pedra pela do metal, em decorrência de maior necessidade produtiva e do aumento do consumo no interior das vilas. Nessa perspectiva, o advento da escrita constitui o marco convencional do princípio dos tempos históricos. 16 1.4. História Disciplina que se ocupa do estudo dos fatos relativos ao homem ao longo do tempo, a história se baseia na análise crítica de testemunhos concretos e verídicos. O vocábulo grego historía, que significa “conhecimento por meio de uma indagação”, deriva de hístor: “sábio” ou “conhecedor”. O termo latino história foi adotado por quase todos os idiomas ocidentais, com exceções como o alemão (Geschichte). São muitas as definições que se fizeram dessa disciplina. Para Johann Gottfried von Herder, é “o estudo do passado”, conceito que os gregos não haviam especificado. Marc Bloch definiu a história como a ciência dos homens no transcurso do tempo. Lucien Febvre destacou o processo de mudança contínua da sociedade humana como a base da história. Para Benedetto Croce, a história pode adotar elementos filosóficos em seu processo de conhecimento. 1.5. Classificação Devido à amplitude do objeto da história, foi preciso dividir seu campo de estudo em vários segmentos. Considerando-se o meio geográfico a ser estudado, a história é universal quando se refere a todas as sociedades humanas no mundo; é nacional no caso de se limitar à de um único país; é regional ou local para áreas geográficas definidas mas não nacionais. Assim, a história propriamente dita parte dos testemunhos escritos e foi, por sua vez, dividida em períodos que, embora de certo modo arbitrários, refletem grandes blocos bem definidos entre si: idade antiga, medieval, moderna e contemporânea. Pode-se falar também de história recente, no caso do estudo das últimas décadas, e de história geral para os panoramas históricos que abarcam todos os períodos. A história da arte ou da cultura ocupa espaço próprio. Cada uma dessas grandes seções em que se divide a história como disciplina acadêmica pode, por sua vez, ramificar-se emdiversos temas específicos, centrados em áreas geográficas ou períodos delimitados. 1.6. Antigas Civilizações As mais antigas civilizações da História surgem entre 4.000 a.C. e 2.000 a.C., às margens dos rios Tigre e Eufrates (Mesopotâmia), Jordão (Palestina), Nilo (Egito), Amarelo (China), Indo e Ganges (atuais Paquistão e Índia). A maioria desenvolve-se na região do chamado Crescente Fértil. Têm características 17 História do Mundo Bíblico Antigo comuns, como a escrita, a arquitetura monumental, a agricultura extensiva, a domesticação de animais, a metalurgia, a escultura, a pintura em cerâmica, a divisão da sociedade em classes e a religião organizada. As principais civilizações são a suméria, a acadiana, a babilônica, a assíria, a egípcia, a hebraica, a fenícia, a hitita, a cretense, a persa, a chinesa e a hindu. Apesar de estarem no Ocidente, os cretenses têm características comuns aos outros povos da Antiguidade oriental. 18 Capítulo 2 Povos e Nações do Mundo Bíblico Antigo Introdução Não é possível determinar os anos que escoaram entre a criação e o dilúvio. Toda a cronologia bíblica é insuficiente para nos aproximar da verdade. Nem isso importa ao historiador. De qualquer modo, parece que entre a criação e o dilúvio mediaram alguns séculos, vividos à margem do Éden pelos antediluvianos, dos quais Moisés dá uma boa lista. Não se tem idéia de grande povos e muito menos de impérios. Talvez pequenos grupos esparso pelos vales da Armênia e planícies da Mesopotâmia, atingindo o Golfo Pérsico, as planuras da pérsia e os altos do Líbano. Tudo pura conjectura, visto que nada de positivo se pode oferecer ao estudante. O mundo de nosso estudo é o pós-diluviano, visto que a arqueologia não tem podido ajudar a resolver o mistério do mundo primitivo, e a geologia ou paleontologia, não dispõe de dados seguros. Depois do dilúvio, segundo a narrativa bíblica, a família de Noé estabeleceu-se na Armênia, pois que a viagem descrita em Gênesis 11.2 indica o rumo do Ocidente, para a terra Sinear, ou seja, a terra de Sumer, das antigas narrativas. Estabelecidos aqui, fundaram diversas cidades mencionadas em Gênesis, muitas das quais estão atualmente identificadas como Acade, Babel, Ereque, Ur, e outras (Gn 10.10). 2.1. Noé Escolhido por Deus para perpetuar a humanidade após o dilúvio, Noé aparece na Bíblia como fundador da genealogia semítica e origem das raças do mundo. De acordo com o Gênesis, Noé era filho de Lamec e pertencia à nona geração depois de Adão. Era um patriarca nobre e piedoso e, por isso, quando Deus decidiu eliminar a corrupção dos homens com o dilúvio, escolheu-o para preservar a raça humana. Advertiu-o do que iria ocorrer e ordenou que construísse uma grande arca capaz de flutuar e nela guardasse um par de cada espécie animal. Tudo pronto, Noé, sua mulher, seus três filhos Sem, Cam e Jafé e as esposas destes embarcaram e sobreveio o dilúvio, que durou quarenta dias. Quando parou de chover, Deus 19 História do Mundo Bíblico Antigo estabeleceu com Noé e seus filhos uma aliança, pela qual não haveria mais dilúvio para devastar a terra, e renovou os preceitos firmados por ocasião da criação, com duas variações: os homens poderiam matar e comer animais; e o homem que matasse outro seria castigado por seus semelhantes. Mais tarde, Noé dedicou-se à agricultura e descobriu o vinho. Ao prová-lo, embriagou-se e ficou nu em sua tenda. Cam viu a nudez do pai e zombou dele. Sem e Jafé, porém, tomaram um manto e o cobriram respeitosamente. Ao saber do comportamento de Cam, Noé condenou o filho dele, Canaã, a ser escravo da estirpe de Sem, os semitas, tronco do qual surgiu o povo de Israel. 2.2. Semitas O critério lingüístico é o único que permite definir inequivocamente uma família de povos semitas e postular para eles uma unidade pré-histórica. Provêm da cultura desses povos a escrita alfabética e as três grandes religiões monoteístas do mundo -- judaísmo, cristianismo e islamismo. Semitas é o termo utilizado para designar um grupo de povos, entre os quais se destacam os árabes e os hebreus, que falam ou falaram línguas semíticas. A designação provém do livro bíblico do Gênesis, que menciona povos descendentes dos filhos de Sem. O texto bíblico arrola entre os semitas, no entanto, os elamitas e os lídios, cujas línguas têm outra raiz lingüística, e separa desse grupo os cananeus, “filhos de Cam”, povo de língua semítica. Modernamente, as línguas semíticas estão incluídas na família camito- semítica. O território ocupado originalmente pelos povos semitas era uma extensão contínua que compreendia boa parte do Oriente Médio, limitada ao norte pelas cordilheiras Taurus e Antitauro, a leste pelo planalto iraniano, e a oeste e ao sul pela costa árabe do mar Vermelho e do oceano Índico. 2.2.1. Características dos povos semitas Na família camito-semítica, ou afro-asiática, incluem-se as seguintes línguas: acadiano, ugarítico, fenício, hebraico, aramaico, árabe, etíope, egípcio antigo, copta, líbico, berbere, guanche, somali, gala, afar-saho e haúça. Em conseqüência das migrações, não se pode falar de um grupo étnico semita homogêneo, pois a diversidade de tipos raciais é muito grande. Ainda que todos sejam de raça branca, predominam as variedades armenóide, braquicéfala (crânios redondos), e mediterrânea-oriental, dolicocéfala (crânio alongado), além de inúmeros tipos mistos. Outros traços físicos são estatura 20 mediana, olhos e cabelos escuros e nariz adunco. A miscigenação com outros povos modificou em muitos casos esses traços. Originalmente, os semitas habitaram regiões áridas ou desérticas, de clima extremamente seco, salvo nos cursos de rios como o Eufrates e o Tigre, no litoral mediterrâneo e nos oásis. Em conseqüência, predominou entre eles o nomadismo, associado ao pastoreio e à agricultura irrigada e intensiva. O cristianismo, uma das três grandes religiões de origem semita, tornou-se universal. O judaísmo, pelo contrário, permaneceu restrito aos descendentes do povo de Israel. 2.2.2. Evolução das culturas semitas A revolução neolítica, registrada a partir do ano 9000 a.C., período em que o homem conquistou as primeiras vitórias sobre a natureza mediante a domesticação de animais e a agricultura, ocorreu supostamente na antiga Mesopotâmia -- região povoada pelos semitas -- e no Egito. Na mesma área, por volta do ano 5500 a.C., surgiram sociedades organizadas, com estrutura estatal e diversificação das atividades econômicas, no que se conhece como a primeira revolução urbana, à qual se seguiu o surgimento dos grandes impérios da Assíria e da Babilônia. 2.2.3. Povos semitas na antiguidade Na parte baixa da Mesopotâmia, entre o rio Tigre, o golfo Pérsico, o deserto da Arábia e as colinas que marcam o limite com a alta Mesopotâmia, os assírios e os caldeus, em luta pelo domínio territorial, criaram grande número de cidades e se distinguiram pela capacidade guerreira e espírito expansionista, desenvolvendo uma das primeiras civilizações da antiguidade. Enquanto no interior se estendiam os grandes impérios, na região de Canaã, estreita faixa do litoral ocupada posteriormente pelos estados da Jordânia e Israel, desenvolveu-se a primeira civilização marítima e comercial, a dos fenícios. Estabelecidos antes da chegada dos filisteus e dos hebreus, que terminaram por expulsá-los, dominaram as margens do Mediterrâneo mais pelo intercâmbio comercial do que pelas armas. Por terem se fixado ao longo da seção média da costa, pouco atraente para os invasores, sobreviveram ao extermínio total. As cidades fenícias (Tiro, Sidon, Biblos etc.) não tinham boa comunicação por terra e várias expedições lançaram-se à conquista do mar, alcançaram o Atlântico e fundaram, em centros como Cartago (África) e Nova Cartago (Cartagena,Espanha), uma nova civilização semítica. Os gregos, em seus lugares de origem, e os romanos, na África e na Espanha, mais tarde dominariam esses povos. Outros povos semitas foram os amonitas, os moabitas e os edomitas, habitantes da antiga Palestina que sofreram os ataques dos filisteus (“povos 21 História do Mundo Bíblico Antigo do mar” procedentes da Grécia, não-semíticos) e dos hebreus, que finalmente os subjugaram. Nas colinas interiores próximas à costa do Mediterrâneo, os hebreus, em luta com cananeus e moabitas, criaram o judaísmo, primeira religião monoteísta. A grande expansão dos semitas ocorreu logo depois da fundação da religião islâmica pelos árabes, no século VII da era cristã. Os árabes pré-islâmicos foram os semitas de menor vocação religiosa. A assimilação progressiva da religiosidade se efetuou entre eles graças à convivência com os judeus, sobretudo depois da primeira diáspora babilônica, no século VI a.C., embora os cristãos (ortodoxos, jacobitas, monofisistas etc.) também os tenham influenciado. O islamismo se propagou rapidamente por meio da guerra santa prescrita pelo Alcorão e em pouco tempo foi levado da Espanha ao oceano Pacífico. 2.2.4. Povos semitas atuais Os dois grandes grupos semitas remanescentes são o árabe e o hebreu. Os judeus, israelitas ou hebreus eram integrantes de tribos semitas nômades que percorriam a área de terras férteis da Mesopotâmia até o Egito, através da Síria e da Palestina. Seu primeiro assentamento na Palestina, depois da longa permanência no Egito, deve ter ocorrido por volta do século XIII a.C. Os hebreus não formam uma raça homogênea, pois passaram por diferentes transformações étnicas nos muitos países a que foram levados pela dispersão ordenada pelos romanos. Depois da diáspora, no século I da era cristã, os grupos hebreus que ficaram na Ásia conservaram melhor suas características do que os que migraram para a África e a Europa. Os europeus formaram dois grandes subgrupos: sefarditas e asquenazitas. Estes últimos se estabeleceram na Europa central e nos países eslavos e, além da língua do país que os acolheu, mantiveram o iídiche (judeu-alemão). Os sefarditas migraram para a Espanha (Sefarad é o nome da Espanha em língua hebraica) e, ao serem expulsos em 1492, passaram à Itália, Europa central, império turco e Marrocos. Falam também a língua dos países em que residem, mas muito deles conservam ainda o castelhano tal como era falado no século XV. A habilidade dos judeus para o comércio e as finanças os levou a adquirir grande poder econômico nos países em que se fixaram, o que, somado à fidelidade à religião e à intolerância dos povos nativos, conduziu com freqüência a cruentas perseguições. No entanto, o genocídio mais brutal foi cometido pelo regime nazista na Alemanha, cuja perseguição sistemática levou ao extermínio de mais de seis milhões de judeus. O século XX assistiu ainda a dois acontecimentos que afetaram os semitas e alcançaram grande repercussão mundial, um de natureza política e outro, econômica. Por um lado, as nações semitas do Oriente Médio, submetidas 22 aos europeus no século XIX, conquistaram a independência no processo de descolonização iniciado após a segunda guerra mundial; por outro, o aumento do preço internacional do petróleo, produto do qual se encontram grandes reservas nos países árabes, forneceu os meios econômicos para que o Oriente Médio começasse a se desenvolver. A partir da criação do Estado de Israel, em 1948, em território palestino, intensificou-se a cisão entre árabes e judeus, o que levou a guerras e a uma situação de permanente conflito. As colônias judaicas mais importantes encontram-se nos Estados Unidos, na Rússia e nos demais países da Comunidade de Estados Independentes (CEI), no Reino Unido e na França. Os grupos judeus nos países árabes, numerosos antes das guerras entre eles, diminuíram sensivelmente. Os árabes constituem na atualidade um grupo muito mais numeroso que o dos judeus. Originários da península arábica formaram o grande núcleo semita que, a partir do quarto milênio anterior à era cristã, emigrou para o Oriente Médio. Em seu êxodo, seguiram duas direções principais: contornaram o golfo Pérsico e se estabeleceram na antiga Caldéia e, através da península do Sinai, chegaram ao litoral do Mediterrâneo. Os que permaneceram nos imensos desertos foram convertidos ao islamismo por Maomé e se lançaram à conquista do mundo a partir do século VII da era cristã. Posteriormente, o vasto império que formaram dividiu-se em numerosos estados. Em conseqüência dos ataques dos cristãos europeus, pelo Ocidente, e dos turcos, pelo leste, foram submetidos a diferentes poderes até o século XX, mas conseguiram converter ao islamismo outros povos, como os turcos e os persas. Os árabes têm a integração política dificultada pela diversidade de regimes políticos e pelas grandes diferenças econômicas, pois a riqueza dos países produtores de petróleo contrasta com a pobreza dos que carecem desse recurso. O território habitado pelos árabes, que não constitui um contínuo geográfico bem definido, compreende regiões da Ásia e da África e se estende do planalto do Irã até o oceano Atlântico, tendo como limite meridional o oceano Índico e as regiões orientais e ocidentais do deserto do Saara. Convivem com eles alguns povos de língua não árabe, como os berberes que, no entanto, costumam ser bilíngües. Alguns poucos grupos de língua árabe encontram-se fora desses limites, no Irã e no Sudão. 2.3. Acádios O primeiro império da Mesopotâmia foi estabelecido por um povo semita conhecido pelo nome de sua capital, Acad, situada em algum ponto da região entre os rios Tigre e Eufrates, próxima à Babilônia. A língua acádia é o 23 História do Mundo Bíblico Antigo elemento mais conhecido desse povo, que foi assimilado pela população suméria, dominante na região. 2.3.1. História Por volta do ano 2300 a.C., o chefe semita Sargão I, cujo nome significa “rei justo” ou “rei verdadeiro”, fundou a cidade de Acad e empreendeu bem- sucedidas campanhas bélicas, que estenderam seu domínio a toda a região mesopotâmica limitada ao sul pelo golfo Pérsico e ao norte pelo litoral mediterrâneo da Síria. Após a morte do fundador da dinastia acádia, nenhum dos herdeiros -- Rimush e Manishtusu -- mostrou-se capaz de controlar o vasto império. O poder militar acádio foi temporariamente restabelecido por Naram-Sin, que combateu os bárbaros das zonas montanhosas do norte (montes Zagros, alto Tigre e alto Eufrates), dominou o país de Mogan e sufocou uma revolta das cidades mesopotâmicas. Seu sucessor, Sharkali-sharri, continuou a luta contra os guti e os amorritas, povos montanheses dos Zagros e do Curdistão. Entre os anos de 2217 e 2139 a.C., aproximadamente, o poder da cidade e sua dinastia entrou em decadência até a completa desaparição. As cidades mesopotâmicas, dominadas pelos povos invasores, uniram-se novamente sob o domínio da dinastia de Ur. 2.3.2. Organização política e econômica A dinastia acádia uniu numa organização estatal comum as diversas cidades independentes que existiam na Mesopotâmia. O império sediado em Acad, onde residia o monarca, compunha-se de diversas províncias. As diferentes comunidades conservaram suas principais instituições sob a supervisão dos funcionários reais que constituíam uma poderosa máquina administrativa. A época foi de grande prosperidade econômica, baseada na agricultura, no artesanato e no comércio. As relações comerciais com a Síria, o golfo Pérsico e com o vale do Indo, que forneciam à Mesopotâmia matérias-primas como madeira, couro e pedras, estão descritas em diversos documentos. 2.4. Cananeus Na região de Canaã, situada no cruzamento de importantes civilizações antigas, mesclaram-se elementos culturais de diversas origens: egípcios, micênicos, cretenses, hurrianos e mesopotâmicos. O nome Canaã apareceem inscrições cuneiformes, egípcias e fenícias. No Antigo Testamento, a região é identificada com a Terra Prometida dos israelitas. A variação entre as diversas fontes históricas não permite 24 estabelecer precisamente os limites da região. Arqueólogos e historiadores costumam chamar de Canaã a área correspondente, nos tempos pré- históricos e pré-bíblicos, à Cisjordânia, com eventual inclusão da Fenícia e, por vezes, da Síria. A palavra viria de um vocábulo semítico referente à “púrpura avermelhada” de uma lã produzida na região. Os vestígios da ocupação humana em Canaã remontam aos períodos paleolíticos e mesolíticos, mas as primeiras cidades e aldeias fixas datam do neolítico. Na idade do bronze, durante a primeira metade do segundo milênio a.C., povos semitas começaram a aparecer na região; os amorritas, vindos do nordeste, tornaram-se então predominantes, e egípcios, hicsos e hurrianos também ali se estabeleceram. São dessa época os primeiros registros históricos. Entre os séculos XVI e XIII a.C., o domínio sobre Canaã era principalmente egípcio, ameaçado pelas investidas hititas. Ocorreram então incursões guerreiras de grupos nômades multiétnicos semitas, conhecidos como habirus, que os historiadores geralmente identificam como os primeiros hebreus. O declínio da dominação egípcia e hitita, ao final do século XII a.C., coincidiu com o estabelecimento dos israelitas, que ocuparam inicialmente as colinas e a área meridional, lutando contra clãs e povos locais. No século seguinte, os filisteus, aparentemente vindos de Creta, ocuparam a faixa litorânea meridional e fundaram uma aliança de cinco cidades-estados. No século X a.C., os israelitas, sob a liderança do rei Davi, derrotaram os filisteus e consolidaram sua vitória sobre o povo local, os cananeus, que terminaram por se extinguir. A partir de então, a região de Canaã tornou-se, na prática, a terra de Israel. As informações a respeito da religião seguida em Canaã antes da presença israelita provêm de achados arqueológicos ugaríticos, no litoral norte da Síria. O deus principal era El; as chuvas e a fertilidade constituíam o domínio de Baal. Outros deuses eram Reshef (da peste e do mundo inferior), Ashera (esposa de El) e Astartéia (deusa da fertilidade). A língua cananéia pertencia ao grupo semita e era próxima do hebreu arcaico. Foram os cananeus, ao que tudo indica, o primeiro povo a empregar o alfabeto: inscrições do fim da idade do bronze, encontradas na região, são tidas como a origem do alfabeto fenício. Além de tal alfabeto arcaico, empregava-se corretamente a escrita cuneiforme silábica da Mesopotâmia. Outro tipo, muito peculiar, de escrita cuneiforme foi descoberto no norte da Síria. 25 História do Mundo Bíblico Antigo 2.5. Suméria Com as escavações iniciadas em 1877 nas ruínas de Lagash, na Mesopotâmia, ao sul da Babilônia, Ernest de Sarzec descobriu os vestígios da mais antiga civilização humana, a da Suméria. Os sumérios inventaram a escrita cuneiforme -- mais antiga forma grafada para representar sons da língua, ao invés dos próprios objetos --, os primeiros veículos sobre rodas e os primeiros tornos de cerâmica. O território da Suméria localizava-se no extremo sul da Mesopotâmia, entre os rios Tigre e Eufrates, na área onde posteriormente se desenvolveu a Babilônia e que modernamente corresponde ao sul do Iraque, entre Bagdá e o golfo Pérsico. Nessa região desenvolveu-se a civilização dos sumérios, povo de origem desconhecida que, já no quarto milênio antes da era cristã, agrupava-se em cidades-estados. 2.5.1. História Antes da chegada dos sumérios, a baixa Mesopotâmia fora ocupada por um povo não pertencente ao grupo semita, modernamente conhecido como ubaida, termo derivado da cidade e al-Ubaid, onde foram encontrados seus primeiros vestígios. Primeira força civilizatória presente na área, os ubaidas estabeleceram-se no território entre 4500 e 4000 a.C. Drenaram os pântanos para a agricultura, desenvolveram o comércio e estabeleceram indústrias, entre as quais manufaturas de couro, metal, cerâmica, alvenaria e tecelagem. Mais tarde, vários povos semitas infiltraram-se no território dos ubaidas e formaram uma grande civilização pré-suméria. O povo conhecido como sumério, cuja língua predominou no território, veio provavelmente da Anatólia e chegou à Mesopotâmia por volta de 3300 a.C. No terceiro milênio, haviam criado pelo menos 12 cidades-estados: Ur, Eridu, Lagash, Uma, Adab, Kish, Sipar, Larak, Akshak, Nipur, Larsa e Bad-tibira. Cada uma compreendia uma cidade murada, além das terras e povoados que a circundavam, e tinha divindade própria, cujo templo era a estrutura central da urbe. Com a crescente rivalidade entre as cidades, cada uma instituiu também um rei. O primeiro rei a unir as diferentes cidades, por volta de 2800 a.C., foi o rei de Kish, Etana. Por muitos séculos, a liderança foi disputada por Lagash, Ur, Eridu e a própria Kish, o que enfraqueceu os sumérios e os tornou extremamente vulneráveis a invasores. Entre 2530 e 2450 a.C., a região foi dominada pelos elamitas procedentes do leste. Teve maiores conseqüências a invasão, pelo norte, dos acadianos, cujo rei Sargão de Acad integrou a Suméria a seu império. Sargão conseguiu ainda submeter os elamitas, antes de lançar-se à conquista das terras ocidentais, até a costa síria do 26 Mediterrâneo. Criou assim um modelo unificado de governo que influenciou todas as civilizações posteriores do Oriente Médio. Sua dinastia governou aproximadamente entre 2350 e 2250 a.C. Após o declínio da dinastia acadiana, por volta do ano 2150 a.C. o território foi invadido e devastado pelos gútios, povo semibárbaro originário dos montes Zagros, a leste da Mesopotâmia. Graças à reação do rei de Uruk, que expulsou os invasores, as cidades ficaram novamente independentes. O ponto alto dessa era final da civilização suméria foi o reinado da terceira dinastia de Ur, cujo primeiro rei, Ur-Nammu, publicou o mais antigo código legal encontrado na Mesopotâmia. Depois de 1900 a.C., quando os amorritas conquistaram todo o território mesopotâmico, os sumérios perderam sua identidade como povo, mas a cultura suméria foi assimilada pelos sucessores semitas. 2.5.2. Civilização Suméria A escrita cuneiforme surgiu na Mesopotâmia, no terceiro milênio anterior à era cristã. Escrevia-se sobre tábulas de argila, com estiletes de bambu. Depois, a tábula era endurecida ao sol ou em fornos. Graças a essa escrita, decifrada por lingüistas e arqueólogos, foi possível conhecer inúmeros aspectos da vida, religião e instituições da Suméria. Os sumérios possuíam uma rica literatura, que incluía poemas, epopéias, hinos, lamentações, provérbios etc. A criação poética mais notável foi o Gilgamesh, ao qual se somam os mitos de Tamuz e da deusa Nanai Ishtar de Uruk, do pastor Etana, do herói Adapa etc. Os templos e edifícios, em geral feitos de tijolos crus e cozidos, não se conservaram, pois os materiais empregados não resistiram ao passar dos séculos. Em compensação, além das tábulas, conservaram-se estelas e cilindros gravados, que eram utilizados como selos, além de esculturas em pedra. Os sumérios trabalhavam o bronze, o cobre, o ouro e a prata. 2.6. Mesopotâmia Berço de algumas das mais ricas civilizações humanas, a Mesopotâmia viu surgir os primeiros impérios, as primeiras cidades da antigüidade e algumas importantes invenções do homem, como a escrita e a legislação. A Mesopotâmia (em grego, região entre rios) está situada na região delimitada pelos rios Tigre e Eufrates, no sudoeste da Ásia. Embora seus limites variassem em diferentes períodos de sua história, de modo geral a Mesopotâmia abrangia, na antigüidade, o território do atual Iraque, ficando ao norte a cordilheira dos Taurus, que a separa da Armênia, ao sul o golfo Pérsico, a oeste a Assíria e a leste a Síria. O limite entre as regiões norte, 27História do Mundo Bíblico Antigo montanhosa, e a sul, plana, era a zona de Bagdá, onde mais se aproximam os rios Tigre e Eufrates. Os romanos as denominaram, respectivamente, Mesopotâmia e Babilônia. Muitos grupos étnicos tentaram fixar-se na região, e esses movimentos migratórios acabaram por fazer surgir importantes civilizações, como a dos assírios, que ocuparam a área montanhosa, e a dos sumérios e babilônios, instalados nas planícies do sul. A essência da cultura suméria se manteve mesmo após a desintegração do estado sumério e por isso pode-se, apesar da grande diversidade dos grupos étnicos, falar de uma civilização mesopotâmica. A Bíblia, o relato de Heródoto e os textos do sacerdote babilônio Berossos, estes datados de aproximadamente 300 a.C. eram, até o fim do século XIX, as únicas fontes de informação sobre a história da Mesopotâmia. As escavações iniciadas em meados do mesmo século, no território do Iraque, e a decifração dos caracteres cuneiformes permitiram avaliar o papel desempenhado pela Mesopotâmia na criação de sociedades urbanas mais evoluídas. A escrita cuneiforme foi empregada na Babilônia até o século I a.C. e o idioma, como língua erudita, até o primeiro século da era cristã. Com a decifração dessa escrita, foi possível descobrir a literatura da região, cujos épicos tiveram como um dos principais temas a sensação de instabilidade provocada pelo difícil controle dos rios Tigre e Eufrates. A escrita cuneiforme sobreviveu também ao domínio helenístico. A influência do grego era significativa, mas tudo indica que o aramaico se tornou a língua popular, em especial nos centros urbanos da época. 2.6.1. Resenha histórica Os primeiros imigrantes chegaram à Mesopotâmia no quarto milênio a.C. Fixaram-se no sul e ali criaram o que teria sido, segundo a tradição suméria, seu primeiro núcleo urbano, Eridu. O povoamento tornou-se mais intenso no milênio seguinte, com um novo movimento migratório, procedente do leste. Ao mesmo tempo, no norte, grupos de origem semítica formavam uma nova cultura, que assumiria gradativamente papel preponderante na região. As escavações comprovaram não haver nesse período uma separação estrita entre as duas regiões, na medida em que nomes semitas são encontrados entre os sumérios. A Mesopotâmia era, de todo modo, povoada por dois povos de origens distintas, o que explica as denominações de terra de Sumer (sul) e Acad (norte). As primeiras tentativas de organização de aldeias agrícolas na área de Acad foram registradas em sítios arqueológicos como Hassuna, Jarmo e Samarra. 28 Do ponto de vista cultural, os grupos que habitavam a área no chamado período Obeid I eram atrasados em relação aos povos do sul, mas alguns centros, como Nínive, já se assemelhavam mais a cidades do que a aldeias. Os habitantes do norte expandiram-se para o sul, no século XXIV a.C., e fundaram um reino unificado sob o governo de Sargão, criador de uma dinastia semítica, cuja capital era a cidade de Acad. Os invasores não possuíam cultura própria, motivo pelo qual absorveram a cultura e as técnicas de guerra do sul. Assim, a transferência do centro do poder político, de início instalado na cidade de Acad, para Nínive ou Babilônia, não teve influência na evolução cultural da região. Com a terceira dinastia de Ur, cujos domínios incluíam a Assíria, praticamente completou-se a unificação da Mesopotâmia. O norte preservava apenas seu idioma semita, escrito, porém, em caracteres cuneiformes sumérios. Por volta de 2000 a.C., invasores elamitas e amorritas derrubaram essa terceira dinastia de Ur. Após um período de destruições, o sul voltou a prosperar, enquanto, no norte, Assur tornou-se independente e na Babilônia surgiu uma dinastia local, amorrita, apoiada pelos semitas acadianos. Após o período da dinastia cassita, a Babilônia perdeu sua influência política, ao mesmo tempo em que o poderio dos assírios cresceu consideravelmente. Nesse período, invasores indo-europeus criaram diversos estados na região, entre os quais o reino de Mitani. No século XII a.C., o poderio assírio chegou ao apogeu sob o reinado de Tukulti-Ninurta I. A Assíria dominava então toda a região localizada a leste do Eufrates. Os sucessores do soberano não conseguiram manter o território, cuja desintegração política foi motivada também pela chegada à região de diversas tribos de arameus, que aí fundaram vários reinos independentes. Nos séculos seguintes, os reinos arameus começaram a ser incorporados ao império da Assíria, a que a Mesopotâmia voltou a ficar subordinada. Nesse período, a ascensão de uma das tribos dos arameus, os caldeus, contribuiu de maneira significativa para a queda do poderio da Assíria e para o estabelecimento, no sul da região, do reino neobabilônico de Nabopolassar. Esse soberano firmou com Ciaxares, da Média, uma aliança que dividiu a Mesopotâmia entre medos e babilônicos, situação que se manteve até 539 a.C., quando a região foi transformada numa satrapia do império persa durante o reinado de Ciro. No período, registrou-se um florescimento cultural, em que a literatura, a religião e as tradições sumérias e babilônicas eram preservadas nas escolas dos templos. Em 331 a.C., a vitória de Alexandre o Grande sobre Dario III marcou o início da colonização macedônica. A Babilônia tornou-se então importante centro cultural, verdadeiro ponto de encontro entre as culturas grega e oriental. Com 29 História do Mundo Bíblico Antigo a morte de Alexandre, instalou-se uma dinastia selêucida que governou por pouco mais de um século. Por volta de 140 a.C., a Mesopotâmia foi incorporada ao império parta. 2.7. Ur Ao longo dos diversos períodos dinásticos do império sumério, Ur acumulou templos e riquezas e se tornou um núcleo de civilização da antiguidade. Ali teria vivido Abraão, por volta do século XVIII a.C. Ur foi uma importante cidade-estado situada a cerca de 225km da Babilônia, na Suméria. Erguia-se junto à antiga foz do rio Eufrates, que distava cerca de 16km da atual, e era circundada por terrenos férteis e irrigados. A fundação de Ur ocorreu por volta do quarto milênio antes da era cristã, quando chegaram à região camponeses procedentes do norte da Mesopotâmia. Há registros de que essa ocupação terminou durante uma série de inundações. Entre os séculos XXIX e XXIV a.C., Ur tornou-se capital do reino. Túmulos de reis da primeira dinastia de Ur, no século XXV a.C., com armas e tesouros em jóias de ouro, prata, bronze e pedras semipreciosas, atestam seu elevado nível artístico e de civilização, além da prática do sacrifício de servidores e mulheres do rei, que deveriam segui-lo no outro mundo. Há indícios de uma segunda dinastia, cujos quatro reis reinaram por pouco mais de um século. A chamada terceira dinastia, entre os séculos XXII ao XXI a.C., foi iniciada por Ur-Nammu. Em seu reinado foi erigido o grande zigurate de Sin. O império de Ur estendeu-se por um território quase tão vasto quanto o do império de Acad. Essa potência, no entanto, foi minada pelos amorreus e pelas revoltas dos elamitas. Embora habitada até o século I a.C., as mudanças verificadas no curso do Eufrates causaram o desaparecimento da cidade. As ruínas de Ur foram recuperadas graças às escavações realizadas por H. R. Hall, antes da primeira guerra mundial, e por Charles Leonard Woolley, nas décadas de 1920 e 1930. 2.8. Babilônia A capital da Mesopotâmia foi famosa por seu poderio e esplendor cultural e por seus belos edifícios e construções monumentais, entre elas os jardins suspensos, uma das sete maravilhas do mundo antigo. Fundada pelos acadianos (ou acádios) fora da zona de poderio sumério, a Babilônia ficava às margens do Eufrates, ao sul da futura Bagdá. Na origem, foi uma colônia comercial dentro do âmbito econômico sumério; mas, graças ao intenso tráfico mercantil e a sua estratégica posição geográfica, 30 transformou-se,depois da queda da Suméria, em cidade independente e próspera, capaz de impor seu poder sobre o resto da Mesopotâmia, antes da era cristã. No começo do segundo milênio a.C., vários povos de origem semita, procedentes do oeste, estabeleceram-se na Babilônia. Um desses povos foi o amorreu (ou amorrita, amorreano), que levou a Babilônia a seu máximo poder imperial, comparável apenas ao que conseguiu posteriormente com os caldeus. O nome Babilônia parece proceder do acádico Bab-ilu, que significa “porta de Deus”. A cidade sagrada, descrita pelo historiador grego Heródoto no século V a.C., foi descoberta por arqueólogos alemães no fim do século XIX da era cristã. Espalhava-se em torno do Eufrates e era protegida por altas muralhas, nas quais se abriam diversas portas de acesso. Dessas portas só se conservaram sete, entre as quais se destaca a de Ishtar. A cidade possuía numerosos palácios e templos, construídos sobre terraços de terra batida ou de adobe. Os palácios eram grandes edifícios com muitos aposentos, dispostos em torno de um pátio central e adornados com jardins, entre os quais se destacavam os chamados jardins suspensos, construídos em terraços sobre salas com tetos de pedra. Em meio aos edifícios dessa monumental cidade, os de caráter religioso sobressaíam pela imponência e elevado número. O principal era o grande templo dedicado a Marduk, Esagila (“casa de teto alto”), decorado com ouro e pedras preciosas. Ao norte desse ficava o Etemenanki (“templo dos alicerces do céu e da terra”), templo escalonado que possivelmente seria a torre de Babel citada na Bíblia. 2.9. Dinastia amorrita O fundador da dinastia real amorrita foi Sumu-abum, que governou de 1894 a 1881 a.C. Seus sucessores ampliaram os domínios da Babilônia mediante uma política de pactos e alianças com as cidades mais poderosas e ricas do território. Na primeira metade do século XVIII a.C., Hamurabi empreendeu a conquista da Mesopotâmia e criou o primeiro império babilônico. O caráter desse rei, conforme documentos que chegaram até nós, mostra traços de um homem astuto, prudente, diplomático, alheio a impulsos passionais e, fundamentalmente, grande conhecedor de sua época. Político hábil, Hamurabi conseguiu consolidar seu estado, alternando conquistas militares com reformas legislativas internas. 31 História do Mundo Bíblico Antigo Quando Hamurabi subiu ao trono, o reino babilônico limitava-se a noroeste com a Assíria, ao norte com a região de Eshnuna e a leste e sudeste com os domínios de Larsa. O monarca tornou a Babilônia potência hegemônica da Mesopotâmia. Aproveitando a morte de seu inimigo assírio Shamsi Adad I, enfrentou e venceu o rei de Larsa, Rim-Sin, arrebatando seus domínios. Depois combateu encarniçadamente e derrotou uma coalizão de povos e cidades (elamitas, assírios, gutis). Dessa forma a Mesopotâmia tornou-se submissa ao poder babilônico e Hamurabi reuniu sob sua autoridade toda a região compreendida entre o golfo Pérsico e o rio Habur. Estadista inteligente e civilizado, não se impôs de modo arbitrário ou violento, conservando os monarcas derrotados, na qualidade de vassalos, em seus respectivos tronos. Hamurabi foi o primeiro legislador conhecido da história. Deu impulso à organização judicial e ao trabalho legislativo. O famoso Código de Hamurabi, baseado na lei de talião, indica a preocupação do monarca em estender o direito sumério a todos os povos que habitavam os territórios do império. Com a morte de Hamurabi, a unidade mesopotâmica desapareceu. Seu filho Samsu-iluna combateu as sublevações de Elam, Suméria e Assur e enfrentou as invasões de povos como os hurrianos e os cassitas. Estes últimos, repelidos depois de uma primeira tentativa de colonização, penetraram depois lentamente em território babilônico. Apesar dos denodados esforços de Samsu-iluna para manter o império do pai, a unidade política se desintegrou. Alguns de seus descendentes, como Ammiditana e Amisaduqa, conseguiram esporádicas vitórias sobre as cidades rivais, mas com Samsuditana o poderio babilônico decaiu por completo. Apesar disso, a cidade continuou sendo um centro cultural, artístico e comercial de primeira ordem, para onde acorriam viajantes e peregrinos de todo o Oriente Médio. Em 1595, o rei hitita Mursilis I atacou a Babilônia. A cidade foi arrasada e incendiada e seu rei, o último da dinastia amorrita, morreu na luta. 2.10. Dinastia cassita No início do século XVI a.C., os cassitas, procedentes dos montes Zagros, ocuparam a Babilônia e introduziram o cavalo e o carro como armas de guerra. Não conheciam a escrita, mas aceitaram e assimilaram a superior cultura babilônica. Agum II soergueu o estado. Conquistou Eshnuna, dominou Assur, submeteu os gutis e estendeu seu poder do Eufrates à cordilheira dos Zagros. Seus descendentes consolidaram o reino no terreno econômico, 32 graças ao comércio, embora no aspecto político a Babilônia se tenha conservado apenas como mais um estado dentro do universo mesopotâmico. A partir da segunda metade do século XIV a.C., os assírios começaram a intervir na política interna da Babilônia, atraídos por sua prosperidade. Depois do reinado de Burnaburiash II, que conseguiu manter a estabilidade política na cidade, as relações com a Assíria começaram a deteriorar-se. O rei assírio Salmanasar I iniciou uma política expansionista e, ao norte da Babilônia, os hititas também pretenderam imiscuir-se nos assuntos internos do império. Sob o reinado de Kashtiliash, a paz, que já durava três séculos, foi interrompida pela invasão de Tukulti Ninurta I, em 1234 a.C., que arrasou a próspera cidade, destruiu seus templos e palácios e prendeu seu rei. Crises no império assírio -- assassinato de Tukulti Ninurta I --, e no reino hitita -- agressões externas -- deram ao rei babilônico Adad-shun-natsir a oportunidade para reconstruir seu maltratado império e submeter o estado assírio. Depois de um período de paz, em que Meli-Shipak devolveu a prosperidade à Babilônia, os elamitas invadiram e saquearam a cidade, em 1153 a.C, levando para Susa a famosa pedra do Código de Hamurabi. 2.11. O novo império babilônico O fim do período cassita anunciou uma época obscura para a Babilônia, dominada sucessivamente por elamitas e assírios até o século VII a.C., quando os caldeus ascenderam ao poder. O fundador da dinastia caldéia foi Nabopolassar (reinou de 626 a 605), que, inspirado pelos deuses locais, Marduk e Nabu, empreendeu uma política expansionista orientada para a recuperação do antigo poderio da Babilônia. Nabopolassar, auxiliado pelo rei meda Ciaxares, moveu uma campanha contra Assur, que pretendia dominar o território mesopotâmico. Depois da vitória, os dois monarcas partilharam as terras conquistadas, e a Babilônia pôde reconstruir seu antigo império. Em seguida, Nabopolassar ordenou a conquista da Síria a seu filho Nabucodonosor, que, depois de cruzar rapidamente o Eufrates, destruiu Carchemish, conseguindo para a Babilônia a maior parte da Síria e da Palestina, anteriormente em poder dos egípcios. Após a morte do pai (605 a.C.), Nabucodonosor II assumiu o trono. Durante seu reinado (604-562), empreendeu várias campanhas militares que lhe renderam avultados butins e glória pessoal. Uma sublevação do reino de Judá obrigou-o a manter uma guerra cruenta que durou de 598 a 587 a.C., ano em que destruiu Jerusalém e deportou milhares de judeus (o “cativeiro da Babilônia” mencionado no Antigo Testamento). Nos anos seguintes, Nabucodonosor promoveu um intenso trabalho de reconstrução, reparando as cidades devastadas pela guerra. Com sua morte 33 História do Mundo Bíblico Antigo (562), sucederam-se as lutas internas pelo trono. Nabonido conseguiu o poder em 555 e governou até 539, mas, como não era de estirpe real, encontrou férrea oposição entre os sacerdotes de Marduk e alguns comerciantes ricos, que lideraram uma sublevação,com o apoio do rei persa Ciro II. Derrotado e prisioneiro dos persas, Nabonido foi, no entanto, tratado com moderação por Ciro, que lhe concedeu o cargo de governador de uma região da Pérsia. 2.12. Decadência A queda da Babilônia em 539 a.C. e sua incorporação ao império persa acarretou o fim da Mesopotâmia como região histórica independente. Sob o domínio dos persas aquemênidas, a cidade manteve seu esplendor. Em 522 a.C., Dario I sufocou uma revolta popular; mais tarde, Xerxes reprimiu outra insurreição e ordenou a destruição da estátua de Marduk, símbolo religioso da Babilônia. Alexandre o Grande a conquistou em 331 a.C. e, depois de reconstruir alguns de seus monumentos, morreu no palácio de Nabucodonosor, quando voltava da Índia. Durante a época selêucida, a cidade decaiu rapidamente, até desaparecer. 2.13. Cultura e sociedade Os babilônios estenderam seus conhecimentos a todos os ramos do saber, mas se destacaram principalmente pelas grandes descobertas matemáticas e astronômicas. Também cultivaram as artes e as letras com singular mestria. A epopéia de Gilgamesh, obra-prima da literatura babilônica, é um poema cujas primeiras compilações remontam a 2500 a.C.; misto de epopéia e alegoria, seus personagens principais são Enkidu e Gilgamesh. O primeiro representa a passagem do estado natural ao civilizado, enquanto Gilgamesh simboliza o herói que busca a imortalidade. O dilúvio universal também aparece mencionado nesse poema, quando Gilgamesh encontra Utnapishtim, o Noé babilônico, que lhe descreve a técnica de fabricação da nave que, a conselho de Ea, construiu para salvar-se do cataclismo. Outro poema épico conhecido é o Enuma elish (Quando no alto...), que trata da origem do mundo. A religião babilônica compreendia um grande número de deuses que, venerados nos templos, em muitos casos se assemelhavam aos homens. Para os babilônios, o homem foi criado por Marduk, a sua imagem, com barro e seu próprio sangue. O templo era a morada da divindade, enquanto o zigurate (torre) era o lugar destinado ao culto. Cada templo era administrado pelo sumo sacerdote, que, ajudado por sacerdotes menores, magos, 34 adivinhos e cantores, devia prestar contas ao rei, representante do deus Marduk. A sociedade babilônica tinha estrutura piramidal, com o rei, vicário (substituto) da divindade, no topo. O poder e as riquezas do soberano tornavam-no um homem respeitado e temido. Os funcionários reais, os sacerdotes e os grandes proprietários constituíam o suporte do monarca e formavam a categoria superior dos homens livres. Os escravos eram adquiridos por compra ou como resultado de butim de guerra. Numa terceira categoria social estavam os cidadãos humildes, cuja falta de recursos lhes impedia o acesso às categorias superiores, embora fossem livres. O homem livre podia possuir bens, terras ou dedicar-se à indústria ou ao comércio. Sua condição lhe permitia pertencer ao conselho da cidade, embora pudesse cair na escravidão se não pagasse no prazo devido as dívidas contraídas. A família era monogâmica e a instituição matrimonial se regia por um contrato, realizado pelo marido diante de testemunhas, no qual se estabeleciam os direitos e obrigações da esposa. O chefe de família exercia a autoridade e dispunha de total independência no manejo dos bens. Todas essas normas, contidas no código legislativo de Hamurabi, consolidaram a sociedade de forma estável e duradoura. Com o fim da próspera civilização babilônica, a Mesopotâmia deixou de ser terra de grandes impérios e converteu-se em objeto de conquistas das novas potências do mundo antigo. Sua cultura exemplar e sua organização legal são comparáveis ao brilho mais tarde alcançado por Atenas e Roma. 2.14. Síria A atual Síria -- que não coincide com a antiga região do mesmo nome, berço de antiqüíssimas civilizações -- esbarra na instabilidade política do Oriente Médio em sua tentativa de fugir ao subdesenvolvimento e enfrenta um aumento populacional difícil de assimilar num país na maior parte desértico. A Síria situa-se no Oriente Médio, na costa leste do mar Mediterrâneo, no extremo sudoeste do continente asiático. Ocupa uma superfície de 185.180 km2, com forma aproximadamente triangular. Limita-se ao norte com a Turquia; a leste e a sudeste com o Iraque; ao sul com a Jordânia; a sudoeste com Israel e Líbano; e a oeste com o mar Mediterrâneo. As colinas de Golan, no sudoeste de seu território, foram ocupadas em 1967 por Israel, que anexou a área unilateralmente em 1981. 35 História do Mundo Bíblico Antigo 2.14.1. Geografia física A Síria apresenta três zonas fisiográficas de oeste para leste: a planície litorânea, as montanhas e o deserto. De norte a sul, a faixa litorânea se estende por 180km entre a Turquia e o Líbano, com uma largura que varia entre 3 e 12km. Nessa região, a mais povoada do país, as inúmeras nascentes e lençóis de água subterrâneos permitem a prática da agricultura durante todo o ano. Na zona montanhosa, duas cordilheiras correm paralelas à costa: as cadeias do Líbano e do Antilíbano. A leste das montanhas estende-se a depressão de Gab, atravessada pelo rio Orontes. O ponto culminante do país é o monte Hermon (2.814m), na fronteira com o Líbano. Para o leste, estende-se o planalto ondulado do deserto da Síria, que desce suavemente em direção ao vale do rio Eufrates, procedente da Turquia. A altitude dessa região varia entre 300 e 500m. No deserto, situa-se um dos maiores afloramentos basálticos do mundo, com 33.700 km2, e no qual se acha o monte al-Duruz. 2.14.2. Clima e hidrografia O clima sírio é mediterrâneo na estreita orla costeira e na região montanhosa ocidental, com precipitações relativamente abundantes e temperaturas médias moderadas, mas com uma longa estação seca de maio a outubro. No resto do país, o clima é desértico ou semidesértico, com chuvas escassas, além de verões e invernos mais rigorosos do que no litoral. Na costa, a temperatura média varia de 13°C em janeiro (inverno ) a 27°C em agosto (verão). No leste, esses números são de, respectivamente, 5°C e 40°C. O sistema de drenagem do país é, em sua maior parte, subterrâneo. Rochas porosas cobrem quase metade do território sírio e absorvem rapidamente as escassas chuvas. Sob a superfície, a água forma nascentes, rios e lençóis de água subterrâneos. O Eufrates é a principal fonte de água e o único rio navegável da Síria. A construção do dique do Eufrates, no norte, possibilitou o cultivo de algodão, cereais e frutas ao longo das margens do rio. O principal rio da região montanhosa é o Orontes, que nasce no Líbano, atravessa a depressão de Gab em direção ao norte, até penetrar na Turquia e desembocar no Mediterrâneo. 2.14.3. População Os árabes são o principal grupo étnico da Síria. Gregos, romanos e turcos dominaram sucessivamente o país, mas sua contribuição étnica foi desprezível se comparada à dos povos semitas da Arábia e da Mesopotâmia, como os arameus, assírios, caldeus e cananeus. As minorias étnicas mais 36 importantes são formadas por curdos, armênios, turcos, circassianos e assírios. O árabe é a língua oficial do país. Junto à fronteira com a Turquia, fala-se o curdo e o turco. Os armênios autóctones já haviam perdido seu idioma quando uma nova onda de refugiados, procedente da Turquia, estabeleceu- se em Damasco e Alepo depois da primeira guerra mundial, fugindo à perseguição empreendida pelo país vizinho. Os muçulmanos, distribuídos em diversas seitas, representam aproximadamente noventa por cento da população, e os cristãos menos de dez por cento. A população síria teve crescimento explosivo nas últimas décadas do século XX. A taxa de natalidade se manteve muito elevada, enquanto a de mortalidade diminuiu progressivamente, devido a melhorias sanitárias. O crescimento vegetativo da população aumentou, portanto, de forma acentuada na segunda metade do século XX:mais do que a produção de alimentos e o produto interno bruto. Além disso, após a implantação do estado israelense na Palestina em 1948, a Síria recebeu cerca de cem mil refugiados palestinos, e a população das colinas de Golan, ocupadas por Israel em 1967, refugiou-se sobretudo em Damasco. 2.14.4. História Inicialmente habitado por povos de origem semítica, o território hoje pertencente à Síria sofreu a invasão de elementos de outros grupos étnicos e, ao longo da história, dividiu-se em principados autônomos ou integrou impérios mais vastos. A civilização acadiana surgiu sob o governo de Sargão de Acad, conquistador semita do século XXIII a.C., mas foi destruída por um povo nômade do deserto, os amoritas, entre 2000 e 1800 a.C. Durante os séculos XVI e XV a.C., os povos egípcios e hurritas do reino de Mitani lutaram pelo controle da área. No século seguinte, a Síria passou às mãos dos hititas e sob seu domínio permaneceu até o século VIII a.C., quando os assírios dela se apossaram. Em 612 a.C., porém, as medas conquistaram Nínive, capital da Assíria, e ali imperaram até serem derrotados pelos persas, sob a liderança de Ciro. Dois séculos mais tarde, em 333 a.C., o território foi incorporado ao império de Alexandre o Grande. Depois da morte de Alexandre em 323 a.C., a Síria foi dividida entre Seleuco Nicator e Ptolomeu, em 301 a.C., e assim permaneceu durante quase cem anos, até que os selêucidas se assenhorearam de toda a região. A anarquia levou à desintegração do império. Em 64 a.C., a Síria caiu em poder de Roma e foi uma de suas províncias mais ricas até o século IV da era cristã, quando integrou-se ao império bizantino. 37 História do Mundo Bíblico Antigo 2.14.5. Assíria Famosos desde os tempos antigos pela crueldade e pelo talento guerreiro, os assírios também se destacaram pela habilidade na construção de grandes cidades e edifícios monumentais, como atestam as ruínas encontradas em Nínive, Assur e Nimrud. Estabelecido no norte da Mesopotâmia, o império assírio foi uma das civilizações mais importantes do Oriente Médio. Os primeiros povoadores conhecidos da região eram nômades semitas que começaram a levar vida sedentária ao longo do IV milênio a.C. Alguns dados atestam a formação, a partir do século XIX a.C., de um pequeno estado assírio, que mantinha relações comerciais com o império hitita. No século XV a.C., depois de longo período de submissão ao império da Suméria, o estado assírio, com capital em Assur, começou a tornar-se independente e a se estender. Puzur-Assur III foi o primeiro monarca que, livre da opressão suméria, empreendeu a expansão do reino. Graças ao apogeu comercial, os assírios puderam lançar-se, sob o reinado de Shamshi-Adad I (1813-1781 a.C., aproximadamente), às conquistas que tanta glória lhes trouxeram. O soberano concentrou esforços na construção de um estado centralizado, segundo o modelo da poderosa Babilônia. Suas conquistas se estenderam aos vales médios do Tigre e do Eufrates e ao norte da Mesopotâmia, mas foram barradas em Alepo, na Síria. Morto o rei, seus filhos não puderam manter o império em virtude dos constantes ataques de outros povos e dos desejos de independência dos súditos. A Assíria caiu sob o domínio do reino de Mitani, do qual se libertou em meados do século XIV a.C. O rei Assur-Ubalit I (1365-1330) foi considerado pelos sucessores o fundador do império assírio, também conhecido como império médio. Para consolidar seu poder, estabeleceu relações com o Egito e interveio nos assuntos internos da Babilônia, casando sua filha com o rei desse estado. Depois de seu reinado, a Assíria atravessou uma fase de conflitos bélicos com hititas e babilônios, que se prolongou até o fim do século XIII a.C. Quem afinal conseguiu impor-se foi Salmanasar I (1274-1245), que devolveu ao estado assírio o poder perdido. Esse monarca estendeu sua influência até Urartu (Armênia), apoiado num exército eficaz que conseguiu arrebatar da Babilônia suas rotas e pontos comerciais. Sob o reinado de Tukulti-Ninurta I (1245-1208), o império médio alcançou seu máximo poderio. A mais importante façanha do período foi a incorporação da Babilônia, que ficou sob a administração de governadores dependentes do rei 38 assírio. Com as conquistas, o império se estendeu da Síria ao golfo Pérsico. Depois da morte desse rei, o poder assírio decaiu em benefício da Babilônia. Passado um período de lutas contra os invasores hurritas e mitânios, a Assíria ressurgiu, no fim do século XII a.C., com Tiglate-Pileser I (1115-1077), que venceu a Babilônia numa campanha terrivelmente dura. Após sua morte, a Assíria sofreu o domínio dos arameus, do qual não conseguiu libertar-se até que Adad-Ninari II (911-891) subiu ao trono. Tukulti-Ninurta II (890-884) devolveu à Assíria a antiga grandeza e submeteu a zona de influência dos arameus, no Eufrates médio. Sucedeu- lhe Assur-Nasirpal II (883-859), o mais desumano dos reis assírios, que pretendeu reconstruir o império de Tiglate-Pileser I e impôs sua autoridade com inusitada violência. Foi o primeiro rei assírio a utilizar carros de guerra e unidades de cavalaria combinadas com a infantaria. Seu filho Salmanasar III (858-824), conquistador da Síria e do Urartu, foi igualmente cruel. O último grande império assírio iniciou-se com Tiglate-Pileser III (746-727), que dominou definitivamente a Mesopotâmia. Sua ambição sem limites o levou a estender o império até o reino da Judéia, a Síria e o Urartu. Salmanasar IV e Salmanasar V mantiveram o poderio da Assíria, que anexou a região da Palestina durante o reinado de Sargão II (721-705). O filho deste, Senaqueribe (704-681), teve que enfrentar revoltas internas, principalmente na Babilônia, centro religioso do império que foi arrasado por suas tropas. Asaradão (680-669) reconstruiu a Babilônia e atacou o Egito, afinal conquistado por seu filho Assurbanipal (668-627). No ano 656, porém, o faraó Psamético I expulsou os assírios do Egito e Assurbanipal não quis reconquistar o país. Com esse soberano, a Assíria tornou-se o centro militar e cultural do mundo. Depois de sua morte, o império decaiu e nunca mais recuperou o esplendor. 2.14.6. A cultura assíria Fruto das múltiplas relações com outros povos, a civilização assíria alcançou elevado grau de desenvolvimento. Entre as preocupações científicas dos assírios destacou-se a astronomia: estabeleceram a posição dos planetas e das estrelas e estudaram a Lua e seus movimentos. Na matemática alcançaram alto nível de conhecimentos, comparável ao que posteriormente se verificaria na Grécia clássica. O espírito militar e guerreiro dos assírios se reflete em suas manifestações artísticas, principalmente nos relevos que decoram as monumentais construções arquitetônicas. Representam sobretudo cenas bélicas e de caça, em que as figuras de animais ocupam lugar de destaque, como no relevo “A 39 História do Mundo Bíblico Antigo leoa ferida”. Também cultivaram a escultura em marfim, na qual foram grandes mestres, como se constata nos painéis de Nimrud, que sobreviveram à madeira dos móveis em que eram originariamente incrustados. A religião assíria manteve as ancestrais tradições mesopotâmicas, embora tenha sofrido a introdução de novos deuses e mitos. A eterna rivalidade entre assírios e babilônios chegou à religião com a disputa pela preponderância de seus grandes deuses, o assírio Assur e o babilônio Marduk. O império assírio sucumbiu ao ataque combinado de medas e babilônios. Sob as ruínas de uma esplêndida civilização, ficou a trágica lembrança de suas impiedosas conquistas e da ilimitada ambição de seus reis. 2.15. Egito Berço de uma das civilizações mais antigas do mundo, o Egito representa papel estratégico para a paz mundial no cenário contemporâneo do Oriente Médio. 2.15.1. Geografia física O Egito é um extenso deserto atravessado por um longo e fértil oásis: o
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