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AULA 3 (P1) DR ALEXANDRE PSIQUIATRIA - SÍNDROME DE DEPENDÊNCIA ALCOÓLICA


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AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE 
ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 
06/03/2020 
 
1 
SÍNDROME DA DEPENDÊNCIA ALCOÓLICA (SDA) 
Ø Pra gente entender qualquer dependência química 
existe um conceito central clínico, conceito biológico 
que é o sistema chamado de sistema de recompensa. 
SISTEMA DE RECOMPENSA 
Ø O sistema de recompensa está envolvido em vários 
comportamentos de impulsos compulsivos, 
compulsão alimentar, por exemplo. 
 
Ø O sistema de recompensa é um circuito cerebral que 
foi descoberto por volta de 1970, 1980. Ele tem a 
função de gerar nossos comportamentos de busca, 
evitar a dor e buscar o prazer. 
Ø Esse sistema funciona desde que a gente nasce. Cada 
experiência de prazer gera uma marca neste sistema. 
Ø Já no circuito de liberação de dopamina aquele prazer 
gera uma marca de memória. Esse sistema funciona 
com essa liberação dopaminérgica. A partir do 
momento que aquele estímulo passa, aquele prazer 
passa, o sistema fica hipercarregado e ele 
desencadeia comportamentos de busca. 
Ø Então a pessoa tende a buscar de novo aquele prazer. 
Ø Então desde que a gente nasce, cada um de nós tem 
uma marca biológica pra isso. Então, por exemplo, às 
vezes eu com a minha biologia, meu sistema de 
recompensa é mais ágil que o seu, por exemplo. É 
aquele bebê, por exemplo, que fica satisfeito com 
meia mamadeira e às vezes o outro bebê precisa de 
duas mamadeiras. Então já é o indício de como cada 
pessoa, cada indivíduo lida com a questão do prazer 
e a busca do prazer. 
Ø Então o neurologista alemão descobriu, através de 
pesquisa com ratos, que existia um circuito que 
quando estimulado ele liberava comportamento de 
busca e recompensa. 
Ø Então estudando este sistema e equiparando com a 
anatomia humana, ele descobriu que no humano 
existe um circuito formado pela área tegmentar 
ventral (que ela funciona na entrada ali do cérebro), 
substância negra, hipocampo, hipotálamo, amígdala, 
núcleo accumbens e projeções frontais. 
Ø Então o circuito de recompensa funciona mais ou 
menos assim: 
• O estímulo chega na área tegmentar ventral ou 
regiões próximas. E a resposta final dele é no lobo 
frontal. 
• O lobo frontal vai liberar a substância final do 
sistema de recompensa que é a dopamina. 
Ø Então toda a experiência humana de prazer o 
neurotransmissor final é a dopamina, que acontece 
no lobo frontal. 
Ø Por exemplo, a cocaína vai atuar em receptores 
serotoninérgicos e dopaminérgicos. 
Ø O álcool a mesma coisa. Vai tocar os receptores 
GABA. Só que o GABA tem conexões com o sistema 
de recompensa em que vai liberar dopamina aqui. 
Então a via final é dopaminérgica. 
Ø Cada substância psicoativa toca o sistema de 
recompensa através de um receptor. Por exemplo, o 
álcool vai tocar o sistema de recompensa através do 
GABA. A heroína vai tocar o sistema de recompensa 
através de receptores opióides. Cocaínas e 
anfetaminas através de receptores serotoninérgicos e 
noradrenérgicos. Nicotina através de receptores 
nicotínicos. 
Ø Então o mecanismo da dependência envolve esse 
sistema aqui: 
• Consumo da substância 
• Sistema de recompensa 
• Dopamina 
• Euforia 
• Bem estar 
• Acabou aquele estímulo o sistema de recompensa 
entra em tensão e repete o consumo. 
Ø O uso abusivo (dependência psicológica) funciona 
como um mecanismo psicológico que a pessoa acha 
que ela tem o controle e ela acha que vai estimular o 
sistema de recompensa dela na hora que ela quiser. 
Então, por exemplo, eu fiz uma prova hoje, quero 
relaxar. Depois da prova a gente vai tomar uma 
cervejinha. Mas o que acontece é que de 10 pessoas 
que fazem isso, 2 ou 3 por questões genéticas, por 
questões socioculturais ou outras questões, não vão 
conseguir ficar só nisso. E aí ele vai tomar a cervejinha 
após a prova. De repente no outro dia vai continuar 
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tomando. E aí ao invés de tomar a cervejinha só na 
quarta-feira para ver o jogo do Flamengo e sábado 
para ir para a noitada, vai querer tomar todo dia. Aí 
começa o conceito de uso abusivo. O uso abusivo já 
indica que a pessoa acha que tem o controle e que vai 
se dar prazer na hora que quiser. 
Ø Aí começa a questão da dependência ao álcool 
(dependência química). O álcool é uma substância, 
que das substâncias psicoativas ele talvez seja a 
substância mais orgânica que tenha. Orgânica porque 
no nosso organismo existem várias reações químicas 
que os radicais de álcool fazem parte delas. Então o 
organismo assimila o álcool com uma familiaridade 
muito grande. Não só nosso cérebro, mas nossos 
órgãos também. O álcool faz parte de várias vias 
metabólicas do nosso corpo. Se você oferta uma 
substância que nosso corpo produz a natureza muda 
todo seu trabalho contando com aquela substância. 
Isso que é uma característica de uma substância que 
causa dependência. O organismo tem o processo de 
acomodação, de formar novos receptores, modificar 
a estrutura neuronal. 
Ø E quando esse neurônio já começa a modificar a 
estrutura dele porque ele está recebendo álcool a 
vontade, ele não precisa trabalhar mais dentro 
daquele ciclo, ele muda a estrutura dele. Uma vez que 
ele muda a estrutura dele já começa a entrar no 
processo da dependência propriamente dita. 
Ø Então a dependência seria uma escada além do uso 
abusivo. O uso abusivo ainda é uma dependência 
psicológica. Mas quando fala dependência química já 
indica que houve uma neuro adaptação do sistema 
nervoso desses neurônios. Esses neurônios ficaram 
enrijecidos porque foi ofertado álcool durante um 
certo tempo. Os receptores dele foram diminuídos, a 
estrutura química dele desde de seu DNA projetou e 
considerou esse neurônio engessado. Uma vez que 
esse neurônio fica engessado ele fica para o resto da 
vida. 
Ø Então quando a gente fala dependência química, ou 
dependência física que era o conceito antigamente, 
indica que já houve uma neuro adaptação, uma 
neuromodulação e que esse neurônio agora já 
funciona de uma forma engessada. 
Ø Um dos primeiros preceitos do AA (alcoólicos 
anônimos), por exemplo, é reconhecer que está 
impotente perante o álcool. Isso tem em função dessa 
modificação neuronal. Porque a pessoa dependente 
tem que entender que estrutura neuronal dela já 
enrijeceu. Então quando a pessoa entra no AA a 
pessoa tem que admitir que o sistema de recompensa 
dele já não funciona, ele já não controla mais o 
sistema de recompensa dele porque houve uma 
modificação da estrutura química dele. Então uma 
vez que a pessoa tem uma dependência etílica ela vai 
ter para o resto da vida. Então é outro preceito do AA: 
uma vez dependente, dependente para o resto da 
vida, um dia de cada vez. 
Ø Esses preceitos do AA, eles acabam que confluem 
nessa questão química e biológica. Eles existem por 
causa dessa química. 
Ø E aí não é só para o álcool. Qualquer substância 
química que produza dependência o conceito vai ser 
o mesmo. É álcool, cocaína, opióides, 
benzodiazepínicos. 
Ø Um adolescente de 13, 14 anos ainda tem processos 
cerebrais de maturação neuronal. Esse neurônio 
desse jovem de 13, 14 anos ainda está em processo 
de formação de axônios, dendritros. Ele ainda está 
finalizando o processo de neurodesenvolvimento. 
Não que ele vai formar mal os neurônios. Os 
neurônios dele ainda estão emitindo sinapses, 
conexões. Se esse jovem começa a beber com 12, 13, 
14 anos, uso abusivo ainda não, mas passou do uso 
abusivo para gerar alteração das estruturas neuronais 
logicamente ele vai ter uma tendência muito mais 
rápida de desenvolver a síndrome da dependência ao 
álcool. Tem a questão do tempo. Ele começa a beber 
com 15, 16 anos. Aos 18 passa na faculdade e 
aumenta o consumo. E existem outros fatores 
psicológicos também. Por exemplo: 
 
 
 
Ø Beber é uma forma de prazer muito palpável, muito 
prática. Em termos psicanalíticos, a gente está numa 
mesa, pegar um copo de cerveja e tomar é como 
pegar o seio (mama) da mãe e dar uma boa mamada. 
A gente bebeporque é uma forma muito rápida, 
muito prática de você se dar um prazer oral. Isso não 
tem nada de errado. Cada um de nós tem formas de 
se proporcionar prazer. A gente bebe porque dá um 
certo prazer pra gente, é gostoso mesmo. 
Ø O problema é que uma coisa é a gente beber pra 
relaxar, para se dar prazer. Outra coisa é quando a 
gente descobre que qualquer psíquico que a gente 
tem a gente usa o álcool para abafar este conflito. Aí 
já começa a ser o problema. Uma coisa é você beber 
para se dar prazer, relaxar para ver o jogo do 
Flamengo na quarta-feira. Agora quando você 
começa “Ah, briguei com minha namorada. Vou 
beber!”, “Ah, tô feliz porque ganhei tal coisa, não sei 
Por que a gente bebe? 
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o que eu faço com isso. Vou beber!”, “Tive um 
problema lá no meu emprego com meu patrão. Tô 
com raiva!” e para abafar aquela raiva vai beber. 
Quando a pessoa sai desse nível de se dar um prazer 
e começa a usar o álcool para abafar conflitos, e que 
também é uma forma muito mais prática do que a 
pessoa encarar o conflito, o uso do álcool passa a ser 
o mecanismo de defesa do ego muito patológico. 
Ø E é o que geralmente acontece. A dependência do 
álcool vai chegando num ponto que o uso abusivo a 
pessoa começa a usar o álcool para aliviar conflitos 
internos. Cada vez mais a gente vai fazendo isso. 
Ø Então se você pegar uma adolescente, que está numa 
fase de viver conflitos, dele falar, dele questionar, 
dele enfrentar as coisas, e de repente ele começa a 
beber muito cedo, ao invés dele aprender a lidar com 
os conflitos dele ele vai jogar isso no álcool. Então até 
a psicodinâmica dele vai ficar alterada. 
Ø A classe médica está muito comprometida porque os 
nossos conflitos, os nossos trabalhos, relações 
pessoais e familiares muito ruins, trabalhando 
demais, pouco valorizado, condições de trabalho 
ruins. A nossa classe médica usa o álcool como um 
mecanismo de defesa para abafar os problemas. 
Ø Então cada vez mais as pessoas tem usado estratégias 
de fora, cada vez mais tem enfrentado menos os 
conflitos. Então é assim que inicia a dependência, a 
parte psicodinâmica da coisa. 
Ø Existem vários fatores. A dependência vem tipo um 
tripé: tem a parte genética (parte biológica), a parte 
social (parte sociocultural) e tem a parte psicológica. 
Esses fatores são interdependentes. Por exemplo, 
uma pessoa que tem uma história familiar, vários 
entes com etilismo, por exemplo, já se pode 
desconfiar que ele tem uma parte biológica 
susceptível à dependência etílica. A parte 
sociocultural, por exemplo, se essa pessoa é de uma 
família que tem o hábito de sempre beber em 
churrasco, se convive num ambiente que é 
estimulado, os pais são alcoólatras, etilistas, todo 
aquele meio é um fator. E se é uma pessoa 
psicologicamente mais retraída, que não consegue 
expressar direito as emoções, que é uma pessoa 
muito fechada, que não consegue lidar com a parte 
emocional, que tem a inteligência emocional mais 
comprometida é outro fator. São indícios que a gente 
vai usando clinicamente pra ver se a pessoa vai ter 
mais tendência à isso. 
Ø Você pode ver que a pessoa que tem mais tendência 
a ficar dependente ao álcool geralmente é uma 
pessoa mais fechada, tem uma dificuldade de lidar 
com a parte emocional dela. O exemplo que vou é o 
caso de uma paciente que foi agredida pelo marido e 
ele esfaqueou ele pelo pescoço. E ele já tinha feito 
isso umas 2, 3 vezes com ela. A paciente foi internada, 
operada, salvaram a vida dela. Ela estava na UTI e a 
direção do hospital proibiu esse marido de ir visita-la. 
Depois chamaram o psiquiatra para dar um parecer. 
Quando o psiquiatra chegou e conversou com ela, e 
ela contou o caso ela falou “Doutor, eu quero pedir só 
uma coisa. Pede o pessoal do hospital para liberar a 
visita dele. Eu gosto muito dele. Apesar dele ter feito 
tudo isso comigo eu amo meu marido. Eu tenho muito 
conflito com ele, eu sei que eu tenho. Mas eu amo 
ele. E esses conflitos com ele eu resolvo eles com 
álcool, com a minha cachaça. Todo conflito que eu 
tenho eu continuo bebendo, eu abafo, mas eu quero 
a presença dele aqui.” Então é uma fala desta pessoa 
mostrando que subjetivamente ela tem um 
mecanismo de abafar o conflito dela com o álcool. E é 
o que geralmente as pessoas fazem. O álcool entra 
como um remédio de fácil acesso, barato e que tem 
muitos efeitos colaterais. Os efeitos colaterais nós 
vamos ver, vocês já sabem, vão estudar em várias 
clínicas. 
Ø Mas mostrando que cada vez mais o mundo está 
caminhando para que nós olhemos cada vez menos 
para nossa subjetividade. Tipo, “Ninguém sabe o que 
eu sinto, os meus conflitos. Nem eu mesmo olho pra 
mim mesmo, o que é conflito dentro de mim. Quando 
vem eu já abafo. Eu prefiro abafar!” 
 
 
 
 
Ø É uma coisa complexa. Vamos supor que ela teve um 
pai que era alcoólatra e que batia na mãe. Então ela 
cresceu aprendendo ver que amar é isso, é a pessoa 
bater. Enquanto o pai batia na mãe, na cabeça dela 
ela estruturou que quem ama bate. Então ela se sente 
amada mesmo que o marido, agressivamente, atua. 
Ø Psicanalisticamente falando o amor não é só um amor 
direto. Existe um amor que é masoquista. Às vezes a 
pessoa se sente amada quando alguém agiu 
sadicamente com ela, de acordo com a estrutura dela 
com o que ela viveu na infância. Então por incrível que 
pareça, para essa mulher tudo isso que esse marido 
faz para ela, é um ato de amor. 
 
 
 
Como a psicanálise explica esse desejo da mulher de 
ainda querer estar perto do marido? 
E com relação ao marido? 
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Ø Já com esse marido é outra dinâmica. Vamos supor 
que esse marido seja misógino, ou seja, esse marido 
foi uma criança que cresceu tendo uma certa aversão 
à figura feminina. Então é uma coisa muito dúbia 
dentro dele. Ao mesmo tempo que ele se casou com 
ela, que ele gosta dela, ele tem sentimentos aversivos 
à figura feminina. E quando ele bebe ele libera isso. 
Isso é um exemplo, pode não ser o caso. 
Ø Isso pode ser devido ao fato da mãe, que ele amava, 
não ficou só com ele. Ela tinha outros filhos, e a mãe 
dava carinho aos outros filhos. E ele se sentia 
rejeitado quando a mãe cuidava também dos outros 
irmãos. Então ele não conseguiu ver que a mãe é uma 
figura que é dele, mas é dos outros. O próprio 
narcisismo dele queria a mãe só pra ele. Então na vida 
dele é um adulto onde as mulheres existem só para 
servi-lo. Qualquer coisa que essa mulher fizer, por 
exemplo, fazer uma visita à mãe dela ele sente ciúme, 
sente vazio e agride essa mulher, por exemplo. É um 
exemplo grosseiro, mas é só para mostrar. 
Ø Então a dinâmica dessa mulher mostra as escolhas 
subjetivas que ela fez e o álcool entra como 
mecanismo de defesa para deixar isso guardado. 
Ø Então quando a gente bebe, o beber para relaxar é 
uma coisa legal, muito boa. Mas a gente tem que ficar 
atento quando a gente começa a beber para apagar 
conflitos dentro da gente. Porque é uma forma muito 
ruim. Quando a gente começa a usar o álcool com 
essa finalidade é hora de parar, procurar fazer uma 
terapia, procurar ajuda profissional. 
 
 
 
Ø Diante dessa questão subjetiva dela a situação mostra 
como a medicina é uma ciência da subjetividade. Pela 
objetividade você não deixaria, mas subjetivamente 
se você entendeu que o mundo dela, se você 
realmente entrou em sintonia com ela, se você se 
colocou no lugar dela entendendo isso aí você 
liberaria. 
Ø Vamos supor que a diretoria do hospital fale que ela 
não vai ver mais o marido, que ela vai para uma clínica 
psiquiátrica fechada por 90 dias. Aí corre o risco dela 
se matar. São situações difíceis. Aí entra a questão do 
subjetivo. 
Ø O álcool é uma substância contra a subjetividade. 
Ø Quando a gente senta para beber, às vezes, a gente 
evita falar da nossa subjetividade mesmo e usa o 
álcool como uma coisa para abafar isso.Às vezes 
ainda seria muito mais saudável se você é meu amigo, 
a gente sentar, eu estou chateado com alguma coisa. 
Agora se eu começar a beber falando isso, logo vai 
atuando, daqui a pouco já está rindo. Então é um 
mecanismo de defesa do ego, mas é muito 
patológico. 
Ø Aqui mostrando de novo o sistema de recompensa 
receptores, locus cerulens, núcleo accumbens, área 
tegmentar ventral. 
Ø Cada dependência vai atuar no sistema de 
recompensa, neste neurônio central chegando lá na 
via final dopaminérgica. Acetilcolina lá nos receptores 
nicotínicos, o álcool no GABA, no glutamato, cannabis 
lá nos canabinóides, os opiáceos nos receptores 
opióides. 
Ø Eu vou mostrar um caso para você que geralmente é 
o que acontece. A dependência alcoólica hoje é dia 
não é uma dependência isolada mais. Geralmente, 
quando a pessoa se envolve numa dependência 
alcoólica, já existem outras drogas associadas. Aquela 
dependência alcoólica pura e propriamente dita hoje 
em dia já é mais difícil de acontecer. 
Ø Então por exemplo neste caso: um rapaz, 43 anos, se 
envolveu num acidente de carro com vítima. É o mais 
novo de 3 irmãos, boa socialização, bom desempenho 
escolar. Fumava e bebia com amigos na sua 
adolescência. Na maioria das vezes ficava mais 
alterado que seus colegas. Isso já é um indício, já é um 
sinal de que essa pessoa pode ter a propensão 
biológica. Experimentou cocaína, heroína, 
anfetaminas e barbitúricos. Quando adulto jovem 
desistiu da faculdade no primeiro semestre após ter 
sido reprovado por falta. Aí já começa aquela questão 
da baixa tolerância à frustração. A dependência 
alcoólica vai se instalando e qualquer coisa que 
frustra a pessoa já tende a abandonar. Continuou 
com abuso de álcool e tendo oscilações de humor. 
Dificuldades em relações afetivas e sociais. Isso 
porque relação social e afetiva exige uma boa 
capacidade subjetiva. Então a dependência vai 
minando isso também. Qualquer conflito afetivo, ao 
invés dele resolver o conflito e vivenciar o conflito, ele 
vai deslocando para o álcool. O uso de cocaína a 
família tinha uma certa negação disso. Começou a 
pegar empregos de baixa remuneração nesse 
período. Aos 20 anos ele pediu ajuda da família, ele 
reconheceu o alcoolismo. 
Ø Isso é um fato muito importante. Existe um estudo 
que mostra que toda pessoa dependente passa por 4 
fases. Existe uma fase, que é a fase 1, que a pessoa 
dependente não tem crítica nenhuma de sua 
dependência. Nesta fase você abordar alguém para 
fazer tratamento é muito difícil porque a 
E libera o marido para ver ela? 
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dependência está tão assimilada à estrutura dela que 
ela não vê aquilo como problema. Na segunda fase a 
pessoa já começa a ter alguns períodos que ela 
questiona isso. “Acho que estou bebendo demais. 
Acho que desse jeito eu vou parar mal”. Na terceira 
fase a pessoa já começa a ter algumas atuações 
práticas pra isso, tipo ela já marca um médico 
(“Doutor, eu vim aqui porque tenho bebido muito, 
acho que eu preciso de uma ajuda”). Ela já começa a 
ter comportamentos pra tentar lutar contra a 
dependência. Nesta fase 3 o tratamento já consegue 
ser eficaz. E na fase 4 a pessoa já fala assim “Doutor, 
eu reconheço que eu não posso mais com o álcool! 
Faça o que o senhor quiser pra mim, me ajuda. Estou 
entregue em suas mãos, eu preciso de sua ajuda pra 
eu realmente parar com isso”. Geralmente a pessoa 
na fase 4 já se envolveu com a polícia já perdeu a 
família, já perdeu dinheiro. Então quando a pessoa 
chega neste nível o sucesso para o tratamento é 
muito maior. A pessoa já entrou naquele primeiro 
preceito lá do AA, que é reconhecer que eu sou 
impotente perante o álcool. Ou seja, reconhecer que 
dentro dela já existe a dependência química. 
Ø Aí a família custeou a internação dele, e ele usou o 
dinheiro para passar 3 semanas na farra com os 
amigos. A família o aceita em casa novamente. Passou 
2 anos sem abusar de álcool e drogas. Agora arrumou 
um bom emprego e manteve-se nele. No final deste 
período o foi descoberto roubando este 
estabelecimento. 
Ø Então é muito comum isso. A dependência gera 
alguns comportamentos impulsivos antissociais. Às 
vezes aquilo foi tão apreendido na época que ele 
usava maconha, que usava cocaína, de burlar algumas 
questões sociais que isso aparece de novo. Furtos, por 
exemplo. 
Ø [FIGURA] Aqui só mostrando o dano cerebral de uma 
pessoa de 46 anos normal e a outra que usa álcool. 
Aquilo que a gente falou da alteração da estrutura 
neuronal aqui dá para ver perfeitamente. 
Ø Aos 28 anos ele foi responsável pela morte de uma 
pessoa por acidente de trânsito. Aguarda julgamento 
por homicídio. O exame toxicológico apontou para o 
uso de múltiplas substâncias no momento do 
acidente. 
Ø Esse caso é só uma ilustração que vocês vão cansar de 
ver isso na prática médica de vocês em pronto 
socorros. Pessoas nessas fases de dependência à 
múltiplas drogas, cocaína e álcool geralmente mais 
comuns. 
 
DIAGNÓSTICO DE DEPENDÊNCIA 
Ø Isso aqui é uma coisa importante de olhar e tentar 
guardar porque isso vai cair em prova. 
Ø Antigamente você fazia diagnóstico de uma 
dependência etílica existiam vários critérios. 
Ø Por exemplo, existia um critério que falava que a 
pessoa tinha o alcoolismo Dipsomania. Ou seja, a 
pessoa que bebe para abafar um problema. 
Alcoolismo fase inicial. 
Ø Com as classificações diagnósticas os critérios foram 
sendo mais operacionalizados. Então hoje em dias 
essas classificações antigas caíram por terra, e existe 
um critério que a gente tem que usar sempre. 
 
 
Ø Critérios: 
• A síndrome seria um forte desejo para consumir, ou 
seja, uma compulsão que já começa a aparecer de 
uma forma bem visível. 
• Dificuldade de controlar o uso em termos de início, 
término e nível de consumo. 
• Falta de controle achando que vai tomar só duas 
cervejinhas, e chega lá toma uma caixa. 
• Reações físicas como ansiedade, distúrbio do sono, 
depressão, convulsões, que indicam abstinência. 
• Necessidade de doses cada vez maiores 
(tolerância). 
• Abandono progressivo dos prazeres, do interesse. 
• Aumento do tempo para uso para se recuperar dos 
efeitos, que é uma relevância. 
• Persiste no uso apesar das consequências (perda da 
crítica). 
Ø Então pelo menos 3 destes critérios ao longo do 
último ano devem estar presentes. Isso é muito 
importante também. Você pergunta ao paciente se 
ao longo do último ano ele apresentou estes critérios. 
Ø Então hoje em dia o diagnóstico de uma dependência 
etílica tem que passar por estes critérios. 
Ø Isso é muito importante porque hoje em dia ela é 
subdiagnosticada. Apesar de existir todo 
conhecimento técnico da medicina é um diagnóstico 
que vai sendo deixado para o segundo plano. Um 
exemplo, às vezes você está num pronto socorro, 
você pega um paciente que tem esses critérios todos 
aqui. Um paciente que já tem uma ginecomastia, já 
tem telangiectasia. Você atende esse paciente, 
medica esse paciente, mas você não chama ele e fala 
que ele tem uma dependência etílica instalada, que já 
tem um quadro de alteração dos neurônios, que tem 
Existe síndrome de dependência? 
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um quadro que é progressivo, que o diagnóstico dele 
é esse. Chama a família e fala que ele tem o 
diagnóstico de uma dependência etílica já instalada. 
Isso aqui é irreversível, então precisa de ter um 
tratamento urgente, indica para um psiquiatra e para 
o AA. Isso a maioria de nós médicos não fazemos. 
Então o etilismo é subdiagnosticados. 
Ø Então é função do médico ter todo o conhecimento 
técnico para fazer um diagnóstico deste e colocar 
esse paciente no encaminhamento. (“síndrome de 
dependência etílica, encaminho com urgência”). 
Ø Então começa com o médico tendo conhecimento 
técnico pra fazer esse diagnóstico. Saber que é um 
processo irreversível, que é uma lesão neuronalque 
vai evoluir por todas aquelas fases. 
Ø Os tremores já são sinais de abstinência. Isso que eu 
quero que vocês leem para a próxima aula pra gente 
falar deles. 
 
 
 
 
 
 
Ø [FIGURA] Aqui mostrando esse ciclo vicioso, como 
isso acontece. A família tenta controlar, vem 
chantagem, frustração, todo um comportamento 
destrutivo, mais ajuda, mais controle. É um ciclo 
vicioso que a dependência causa e existe no meio um 
fator que chama co-dependência. 
Ø É muito comum chegar num pronto-socorro uma 
paciente de 20 e poucos anos acompanhado da mãe. 
Esse paciente, por exemplo, já perdeu a família, já 
perdeu emprego, mora com a mãe atualmente. E a 
mãe leva dizendo que o filho não para de beber, não 
para de usar cocaína. Ao longo do acompanhamento 
você vai ver que essa mãe protege esse filho, ela 
continua dando dinheiro para ele. Ela continua 
aliviando os conflitos dele. Quando ele é preso ela vai 
lá e solta ele. Quando o médico interna ela vai na 
clínica e pede para dar alta. Então essa co-
dependência, a pessoa dependente coloca tantas 
outras pessoas dentro de um processo psíquico que a 
pessoa, sem perceber, se vê alimentando aquela 
dependência. 
Ø Então é um conceito psíquico muito comum de 
acontecer em qualquer dependência química. 
Sempre vai ter alguém que vai ter essa função de co-
dependente. E aí é importante no tratamento que 
essa pessoa co-dependente seja tratada também. 
Ø Então quando tem caso de um etilismo que existe 
uma pessoa co-dependente a gente chama essa 
pessoa e encaminha essa pessoa para um psicólogo, 
conversa com essa pessoa em particular, tenta 
mostrar que aquele comportamento dela está 
mantendo aquela dependência daquela pessoa. 
Muitas vezes essa pessoa não vai aceitar isso. Ela vai 
ficar com raiva da gente. Depois passa um tempo ela 
volta e diz que você realmente estava certo, que ela 
mantém essa dependência daquela pessoa. Mas é 
uma coisa muito importante desse tratamento. 
EVOLUÇÃO DA DEPENDÊNCIA ETÍLICA 
Ø Só pra terminar, agora eu falar um pouco de como 
seria a evolução natural de uma dependência etílica. 
Desde o uso abusivo até a fase final de qualquer 
dependência, que é a demência. 
 
 
 
 
 
 
 
Ø Todo etilismo crônico, todo etilismo não tratado vai 
evoluir para uma fase final de demência. 
Ø O paciente é aquele de 40 anos que bebeu a vida 
toda, parou de trabalhar, mora sozinho, que não 
consegue mais fazer nada, não consegue nem 
conversar direito. Parece que é uma demência numa 
pessoa mais jovem. 
Ø O alcoolismo evolui para a demência. Esse processo 
começa com o uso abusivo. 
Ø Do uso abusivo tem um marco principal do uso 
abusivo que é a síndrome de dependência alcoólica 
(SDA). Então esse é o marco principal. 
Ø Uma vez que iniciou a síndrome o que vai acontecer 
ao longo da vida são períodos de abstinência. Vai 
acontecer abstinência mais uso abusivo. 
• Uso abusivo 
• Dependência 
• Abstinência 
• Delirium tremens 
• Encefalopatia de Wernick-Korsakov 
• Blackouts 
• Amnésia 
• Convulsão 
• Demência 
SDA 
Delírio 
Tremens 
 
Uso 
abusivo Demência Abstinência 
Síndrome 
Amnéstica 
Convulsão 
Encefalopatia 
de Wernick - 
Korsakov 
Alterações 
metabólicas 
AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE 
ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 
06/03/2020 
 
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Ø Na abstinência existe um quadro gravíssimo, no caso 
do álcool, que é o delirum tremens. É um quadro 
gravíssimo porque o sistema de recompensa 
conversa com o corpo através da hipófise. É o ACTH 
vai lá na suprarrenal, libera cortisol e o cortisol mexe 
com todo o organismo. Então no ciclo vicioso, durante 
os períodos de uso, abuso e abstinência o sistema de 
recompensa fica hiperativado. Na hiperativação dele 
a hipófise manda muita informação pra suprarrenal. 
Então o etilismo crônico, quando a pessoa tem a 
abstinência, existe uma abstinência que é grave onde 
existe um descontrole de todo o organismo, não só da 
parte psíquica como da parte orgânica. Então 
eletrólitos, cortisol, equilíbrio ácido básico. É um 
quadro clínico muito grave que tem mortalidade de 
10%. Geralmente é um paciente que tem que ser 
internado, receber altas doses de líquidos se não ele 
desidrata. Existe uma tempestade neurovegetativa, a 
pressão, por exemplo, sobe e desce, sudorese, 
confusão mental (que é aquele quadro de delirium, é 
uma alteração do nível de consciência), alucinações 
auditivas, alucinações visuais. Então esse aqui é o 
Delirium Tremens. 
 
 
Ø Já existia uma alteração clínica de eletrólitos. Então 
quando paciente está neste nível a confusão mental 
dele é porque ele está com quadro de alteração 
química muito grande. E essa alteração química só vai 
ser corrigida se ele for internado. Ele não vai corrigir 
isso em casa. 
Ø Esse paciente se não for internado e receber muito 
líquido, medir eletrólitos, se liberar ele pra casa tem 
altas chances do paciente morrer. 
Ø E o que acontece com nosso sistema de saúde atual é 
que não se consegue vaga para paciente com delirium 
tremens com facilidade. 
Ø O delirium tremens já indica alteração metabólica. 
Ø Então o que pode acontecer também ao longo dessa 
evolução é a pessoa começar a ter síndrome 
amnéstica. A síndrome amnéstica são alterações de 
memória, tipo Alzheimer mesmo, ou então 
passageiras, tipo blackouts. A pessoa tem lapsos, 
lacunas. Mas indica que se a pessoa começa a ter 
alteração mnêmica indica lesão neuronal. Então 
quando o etilista já começa a ter alteração de 
memória já pode imaginar que ele está no meio do 
caminho da demência, já começa a ter alterações. 
Ø Das síndromes amnésticas existe uma que é muito 
famosa, que é a encefalopatia de Wernick, onde 
existe uma lesão no cérebro causado pela glicose, 
onde a pessoa tem uma baixa de tiamina por causa do 
álcool e essa lesão causa um quadro de nistagmo, 
marcha atáxica, e problema de memória. Esse tripé 
tem o nome de encefalopatia de Wernick-Korsakov. 
Então a pessoa tem nistagmo, alteração de marcha 
(ataxia, uma marcha incoordenada), e alterações 
mnêmicas. Então quando a pessoa faz um quadro de 
Wernick-Korsakov indica que ele está além do meio 
do caminho. Ele já está evoluindo mais ainda para a 
demência. 
Ø O que pode acontecer numa fase mais final é a 
convulsão. Então vocês vão pegar muito no pronto 
socorro muito paciente etilista crônico que já chega 
fazendo quadro convulsivo. Aí você vai ver a pessoa 
não tem histórico de epilepsia, a convulsão dela é 
pela abstinência etílica. Já houve lesão neuronal, já 
tem alterações focais e diante da abstinência fica 
tendo crise convulsiva. Então quando a pessoa chega 
no nível de crise convulsiva ela já está chegando no 
quadro demencial. 
Ø Quando a pessoa passa por tudo isso existe um 
empobrecimento geral da vida dela aí é aquela 
pessoa etilista crônica que largou tudo, perdeu tudo, 
já não consegue nem conversar direito, tem graves 
alterações de memória, de interação. Essa pessoa já 
nem bebe mais direito. Bebe uma dose só e já fica 
alterada. Então é a fase final da abstinência. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Qual a diferença entre abstinência e Delirium 
Tremens?