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AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 1 SÍNDROME DA DEPENDÊNCIA ALCOÓLICA (SDA) Ø Pra gente entender qualquer dependência química existe um conceito central clínico, conceito biológico que é o sistema chamado de sistema de recompensa. SISTEMA DE RECOMPENSA Ø O sistema de recompensa está envolvido em vários comportamentos de impulsos compulsivos, compulsão alimentar, por exemplo. Ø O sistema de recompensa é um circuito cerebral que foi descoberto por volta de 1970, 1980. Ele tem a função de gerar nossos comportamentos de busca, evitar a dor e buscar o prazer. Ø Esse sistema funciona desde que a gente nasce. Cada experiência de prazer gera uma marca neste sistema. Ø Já no circuito de liberação de dopamina aquele prazer gera uma marca de memória. Esse sistema funciona com essa liberação dopaminérgica. A partir do momento que aquele estímulo passa, aquele prazer passa, o sistema fica hipercarregado e ele desencadeia comportamentos de busca. Ø Então a pessoa tende a buscar de novo aquele prazer. Ø Então desde que a gente nasce, cada um de nós tem uma marca biológica pra isso. Então, por exemplo, às vezes eu com a minha biologia, meu sistema de recompensa é mais ágil que o seu, por exemplo. É aquele bebê, por exemplo, que fica satisfeito com meia mamadeira e às vezes o outro bebê precisa de duas mamadeiras. Então já é o indício de como cada pessoa, cada indivíduo lida com a questão do prazer e a busca do prazer. Ø Então o neurologista alemão descobriu, através de pesquisa com ratos, que existia um circuito que quando estimulado ele liberava comportamento de busca e recompensa. Ø Então estudando este sistema e equiparando com a anatomia humana, ele descobriu que no humano existe um circuito formado pela área tegmentar ventral (que ela funciona na entrada ali do cérebro), substância negra, hipocampo, hipotálamo, amígdala, núcleo accumbens e projeções frontais. Ø Então o circuito de recompensa funciona mais ou menos assim: • O estímulo chega na área tegmentar ventral ou regiões próximas. E a resposta final dele é no lobo frontal. • O lobo frontal vai liberar a substância final do sistema de recompensa que é a dopamina. Ø Então toda a experiência humana de prazer o neurotransmissor final é a dopamina, que acontece no lobo frontal. Ø Por exemplo, a cocaína vai atuar em receptores serotoninérgicos e dopaminérgicos. Ø O álcool a mesma coisa. Vai tocar os receptores GABA. Só que o GABA tem conexões com o sistema de recompensa em que vai liberar dopamina aqui. Então a via final é dopaminérgica. Ø Cada substância psicoativa toca o sistema de recompensa através de um receptor. Por exemplo, o álcool vai tocar o sistema de recompensa através do GABA. A heroína vai tocar o sistema de recompensa através de receptores opióides. Cocaínas e anfetaminas através de receptores serotoninérgicos e noradrenérgicos. Nicotina através de receptores nicotínicos. Ø Então o mecanismo da dependência envolve esse sistema aqui: • Consumo da substância • Sistema de recompensa • Dopamina • Euforia • Bem estar • Acabou aquele estímulo o sistema de recompensa entra em tensão e repete o consumo. Ø O uso abusivo (dependência psicológica) funciona como um mecanismo psicológico que a pessoa acha que ela tem o controle e ela acha que vai estimular o sistema de recompensa dela na hora que ela quiser. Então, por exemplo, eu fiz uma prova hoje, quero relaxar. Depois da prova a gente vai tomar uma cervejinha. Mas o que acontece é que de 10 pessoas que fazem isso, 2 ou 3 por questões genéticas, por questões socioculturais ou outras questões, não vão conseguir ficar só nisso. E aí ele vai tomar a cervejinha após a prova. De repente no outro dia vai continuar AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 2 tomando. E aí ao invés de tomar a cervejinha só na quarta-feira para ver o jogo do Flamengo e sábado para ir para a noitada, vai querer tomar todo dia. Aí começa o conceito de uso abusivo. O uso abusivo já indica que a pessoa acha que tem o controle e que vai se dar prazer na hora que quiser. Ø Aí começa a questão da dependência ao álcool (dependência química). O álcool é uma substância, que das substâncias psicoativas ele talvez seja a substância mais orgânica que tenha. Orgânica porque no nosso organismo existem várias reações químicas que os radicais de álcool fazem parte delas. Então o organismo assimila o álcool com uma familiaridade muito grande. Não só nosso cérebro, mas nossos órgãos também. O álcool faz parte de várias vias metabólicas do nosso corpo. Se você oferta uma substância que nosso corpo produz a natureza muda todo seu trabalho contando com aquela substância. Isso que é uma característica de uma substância que causa dependência. O organismo tem o processo de acomodação, de formar novos receptores, modificar a estrutura neuronal. Ø E quando esse neurônio já começa a modificar a estrutura dele porque ele está recebendo álcool a vontade, ele não precisa trabalhar mais dentro daquele ciclo, ele muda a estrutura dele. Uma vez que ele muda a estrutura dele já começa a entrar no processo da dependência propriamente dita. Ø Então a dependência seria uma escada além do uso abusivo. O uso abusivo ainda é uma dependência psicológica. Mas quando fala dependência química já indica que houve uma neuro adaptação do sistema nervoso desses neurônios. Esses neurônios ficaram enrijecidos porque foi ofertado álcool durante um certo tempo. Os receptores dele foram diminuídos, a estrutura química dele desde de seu DNA projetou e considerou esse neurônio engessado. Uma vez que esse neurônio fica engessado ele fica para o resto da vida. Ø Então quando a gente fala dependência química, ou dependência física que era o conceito antigamente, indica que já houve uma neuro adaptação, uma neuromodulação e que esse neurônio agora já funciona de uma forma engessada. Ø Um dos primeiros preceitos do AA (alcoólicos anônimos), por exemplo, é reconhecer que está impotente perante o álcool. Isso tem em função dessa modificação neuronal. Porque a pessoa dependente tem que entender que estrutura neuronal dela já enrijeceu. Então quando a pessoa entra no AA a pessoa tem que admitir que o sistema de recompensa dele já não funciona, ele já não controla mais o sistema de recompensa dele porque houve uma modificação da estrutura química dele. Então uma vez que a pessoa tem uma dependência etílica ela vai ter para o resto da vida. Então é outro preceito do AA: uma vez dependente, dependente para o resto da vida, um dia de cada vez. Ø Esses preceitos do AA, eles acabam que confluem nessa questão química e biológica. Eles existem por causa dessa química. Ø E aí não é só para o álcool. Qualquer substância química que produza dependência o conceito vai ser o mesmo. É álcool, cocaína, opióides, benzodiazepínicos. Ø Um adolescente de 13, 14 anos ainda tem processos cerebrais de maturação neuronal. Esse neurônio desse jovem de 13, 14 anos ainda está em processo de formação de axônios, dendritros. Ele ainda está finalizando o processo de neurodesenvolvimento. Não que ele vai formar mal os neurônios. Os neurônios dele ainda estão emitindo sinapses, conexões. Se esse jovem começa a beber com 12, 13, 14 anos, uso abusivo ainda não, mas passou do uso abusivo para gerar alteração das estruturas neuronais logicamente ele vai ter uma tendência muito mais rápida de desenvolver a síndrome da dependência ao álcool. Tem a questão do tempo. Ele começa a beber com 15, 16 anos. Aos 18 passa na faculdade e aumenta o consumo. E existem outros fatores psicológicos também. Por exemplo: Ø Beber é uma forma de prazer muito palpável, muito prática. Em termos psicanalíticos, a gente está numa mesa, pegar um copo de cerveja e tomar é como pegar o seio (mama) da mãe e dar uma boa mamada. A gente bebeporque é uma forma muito rápida, muito prática de você se dar um prazer oral. Isso não tem nada de errado. Cada um de nós tem formas de se proporcionar prazer. A gente bebe porque dá um certo prazer pra gente, é gostoso mesmo. Ø O problema é que uma coisa é a gente beber pra relaxar, para se dar prazer. Outra coisa é quando a gente descobre que qualquer psíquico que a gente tem a gente usa o álcool para abafar este conflito. Aí já começa a ser o problema. Uma coisa é você beber para se dar prazer, relaxar para ver o jogo do Flamengo na quarta-feira. Agora quando você começa “Ah, briguei com minha namorada. Vou beber!”, “Ah, tô feliz porque ganhei tal coisa, não sei Por que a gente bebe? AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 3 o que eu faço com isso. Vou beber!”, “Tive um problema lá no meu emprego com meu patrão. Tô com raiva!” e para abafar aquela raiva vai beber. Quando a pessoa sai desse nível de se dar um prazer e começa a usar o álcool para abafar conflitos, e que também é uma forma muito mais prática do que a pessoa encarar o conflito, o uso do álcool passa a ser o mecanismo de defesa do ego muito patológico. Ø E é o que geralmente acontece. A dependência do álcool vai chegando num ponto que o uso abusivo a pessoa começa a usar o álcool para aliviar conflitos internos. Cada vez mais a gente vai fazendo isso. Ø Então se você pegar uma adolescente, que está numa fase de viver conflitos, dele falar, dele questionar, dele enfrentar as coisas, e de repente ele começa a beber muito cedo, ao invés dele aprender a lidar com os conflitos dele ele vai jogar isso no álcool. Então até a psicodinâmica dele vai ficar alterada. Ø A classe médica está muito comprometida porque os nossos conflitos, os nossos trabalhos, relações pessoais e familiares muito ruins, trabalhando demais, pouco valorizado, condições de trabalho ruins. A nossa classe médica usa o álcool como um mecanismo de defesa para abafar os problemas. Ø Então cada vez mais as pessoas tem usado estratégias de fora, cada vez mais tem enfrentado menos os conflitos. Então é assim que inicia a dependência, a parte psicodinâmica da coisa. Ø Existem vários fatores. A dependência vem tipo um tripé: tem a parte genética (parte biológica), a parte social (parte sociocultural) e tem a parte psicológica. Esses fatores são interdependentes. Por exemplo, uma pessoa que tem uma história familiar, vários entes com etilismo, por exemplo, já se pode desconfiar que ele tem uma parte biológica susceptível à dependência etílica. A parte sociocultural, por exemplo, se essa pessoa é de uma família que tem o hábito de sempre beber em churrasco, se convive num ambiente que é estimulado, os pais são alcoólatras, etilistas, todo aquele meio é um fator. E se é uma pessoa psicologicamente mais retraída, que não consegue expressar direito as emoções, que é uma pessoa muito fechada, que não consegue lidar com a parte emocional, que tem a inteligência emocional mais comprometida é outro fator. São indícios que a gente vai usando clinicamente pra ver se a pessoa vai ter mais tendência à isso. Ø Você pode ver que a pessoa que tem mais tendência a ficar dependente ao álcool geralmente é uma pessoa mais fechada, tem uma dificuldade de lidar com a parte emocional dela. O exemplo que vou é o caso de uma paciente que foi agredida pelo marido e ele esfaqueou ele pelo pescoço. E ele já tinha feito isso umas 2, 3 vezes com ela. A paciente foi internada, operada, salvaram a vida dela. Ela estava na UTI e a direção do hospital proibiu esse marido de ir visita-la. Depois chamaram o psiquiatra para dar um parecer. Quando o psiquiatra chegou e conversou com ela, e ela contou o caso ela falou “Doutor, eu quero pedir só uma coisa. Pede o pessoal do hospital para liberar a visita dele. Eu gosto muito dele. Apesar dele ter feito tudo isso comigo eu amo meu marido. Eu tenho muito conflito com ele, eu sei que eu tenho. Mas eu amo ele. E esses conflitos com ele eu resolvo eles com álcool, com a minha cachaça. Todo conflito que eu tenho eu continuo bebendo, eu abafo, mas eu quero a presença dele aqui.” Então é uma fala desta pessoa mostrando que subjetivamente ela tem um mecanismo de abafar o conflito dela com o álcool. E é o que geralmente as pessoas fazem. O álcool entra como um remédio de fácil acesso, barato e que tem muitos efeitos colaterais. Os efeitos colaterais nós vamos ver, vocês já sabem, vão estudar em várias clínicas. Ø Mas mostrando que cada vez mais o mundo está caminhando para que nós olhemos cada vez menos para nossa subjetividade. Tipo, “Ninguém sabe o que eu sinto, os meus conflitos. Nem eu mesmo olho pra mim mesmo, o que é conflito dentro de mim. Quando vem eu já abafo. Eu prefiro abafar!” Ø É uma coisa complexa. Vamos supor que ela teve um pai que era alcoólatra e que batia na mãe. Então ela cresceu aprendendo ver que amar é isso, é a pessoa bater. Enquanto o pai batia na mãe, na cabeça dela ela estruturou que quem ama bate. Então ela se sente amada mesmo que o marido, agressivamente, atua. Ø Psicanalisticamente falando o amor não é só um amor direto. Existe um amor que é masoquista. Às vezes a pessoa se sente amada quando alguém agiu sadicamente com ela, de acordo com a estrutura dela com o que ela viveu na infância. Então por incrível que pareça, para essa mulher tudo isso que esse marido faz para ela, é um ato de amor. Como a psicanálise explica esse desejo da mulher de ainda querer estar perto do marido? E com relação ao marido? AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 4 Ø Já com esse marido é outra dinâmica. Vamos supor que esse marido seja misógino, ou seja, esse marido foi uma criança que cresceu tendo uma certa aversão à figura feminina. Então é uma coisa muito dúbia dentro dele. Ao mesmo tempo que ele se casou com ela, que ele gosta dela, ele tem sentimentos aversivos à figura feminina. E quando ele bebe ele libera isso. Isso é um exemplo, pode não ser o caso. Ø Isso pode ser devido ao fato da mãe, que ele amava, não ficou só com ele. Ela tinha outros filhos, e a mãe dava carinho aos outros filhos. E ele se sentia rejeitado quando a mãe cuidava também dos outros irmãos. Então ele não conseguiu ver que a mãe é uma figura que é dele, mas é dos outros. O próprio narcisismo dele queria a mãe só pra ele. Então na vida dele é um adulto onde as mulheres existem só para servi-lo. Qualquer coisa que essa mulher fizer, por exemplo, fazer uma visita à mãe dela ele sente ciúme, sente vazio e agride essa mulher, por exemplo. É um exemplo grosseiro, mas é só para mostrar. Ø Então a dinâmica dessa mulher mostra as escolhas subjetivas que ela fez e o álcool entra como mecanismo de defesa para deixar isso guardado. Ø Então quando a gente bebe, o beber para relaxar é uma coisa legal, muito boa. Mas a gente tem que ficar atento quando a gente começa a beber para apagar conflitos dentro da gente. Porque é uma forma muito ruim. Quando a gente começa a usar o álcool com essa finalidade é hora de parar, procurar fazer uma terapia, procurar ajuda profissional. Ø Diante dessa questão subjetiva dela a situação mostra como a medicina é uma ciência da subjetividade. Pela objetividade você não deixaria, mas subjetivamente se você entendeu que o mundo dela, se você realmente entrou em sintonia com ela, se você se colocou no lugar dela entendendo isso aí você liberaria. Ø Vamos supor que a diretoria do hospital fale que ela não vai ver mais o marido, que ela vai para uma clínica psiquiátrica fechada por 90 dias. Aí corre o risco dela se matar. São situações difíceis. Aí entra a questão do subjetivo. Ø O álcool é uma substância contra a subjetividade. Ø Quando a gente senta para beber, às vezes, a gente evita falar da nossa subjetividade mesmo e usa o álcool como uma coisa para abafar isso.Às vezes ainda seria muito mais saudável se você é meu amigo, a gente sentar, eu estou chateado com alguma coisa. Agora se eu começar a beber falando isso, logo vai atuando, daqui a pouco já está rindo. Então é um mecanismo de defesa do ego, mas é muito patológico. Ø Aqui mostrando de novo o sistema de recompensa receptores, locus cerulens, núcleo accumbens, área tegmentar ventral. Ø Cada dependência vai atuar no sistema de recompensa, neste neurônio central chegando lá na via final dopaminérgica. Acetilcolina lá nos receptores nicotínicos, o álcool no GABA, no glutamato, cannabis lá nos canabinóides, os opiáceos nos receptores opióides. Ø Eu vou mostrar um caso para você que geralmente é o que acontece. A dependência alcoólica hoje é dia não é uma dependência isolada mais. Geralmente, quando a pessoa se envolve numa dependência alcoólica, já existem outras drogas associadas. Aquela dependência alcoólica pura e propriamente dita hoje em dia já é mais difícil de acontecer. Ø Então por exemplo neste caso: um rapaz, 43 anos, se envolveu num acidente de carro com vítima. É o mais novo de 3 irmãos, boa socialização, bom desempenho escolar. Fumava e bebia com amigos na sua adolescência. Na maioria das vezes ficava mais alterado que seus colegas. Isso já é um indício, já é um sinal de que essa pessoa pode ter a propensão biológica. Experimentou cocaína, heroína, anfetaminas e barbitúricos. Quando adulto jovem desistiu da faculdade no primeiro semestre após ter sido reprovado por falta. Aí já começa aquela questão da baixa tolerância à frustração. A dependência alcoólica vai se instalando e qualquer coisa que frustra a pessoa já tende a abandonar. Continuou com abuso de álcool e tendo oscilações de humor. Dificuldades em relações afetivas e sociais. Isso porque relação social e afetiva exige uma boa capacidade subjetiva. Então a dependência vai minando isso também. Qualquer conflito afetivo, ao invés dele resolver o conflito e vivenciar o conflito, ele vai deslocando para o álcool. O uso de cocaína a família tinha uma certa negação disso. Começou a pegar empregos de baixa remuneração nesse período. Aos 20 anos ele pediu ajuda da família, ele reconheceu o alcoolismo. Ø Isso é um fato muito importante. Existe um estudo que mostra que toda pessoa dependente passa por 4 fases. Existe uma fase, que é a fase 1, que a pessoa dependente não tem crítica nenhuma de sua dependência. Nesta fase você abordar alguém para fazer tratamento é muito difícil porque a E libera o marido para ver ela? AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 5 dependência está tão assimilada à estrutura dela que ela não vê aquilo como problema. Na segunda fase a pessoa já começa a ter alguns períodos que ela questiona isso. “Acho que estou bebendo demais. Acho que desse jeito eu vou parar mal”. Na terceira fase a pessoa já começa a ter algumas atuações práticas pra isso, tipo ela já marca um médico (“Doutor, eu vim aqui porque tenho bebido muito, acho que eu preciso de uma ajuda”). Ela já começa a ter comportamentos pra tentar lutar contra a dependência. Nesta fase 3 o tratamento já consegue ser eficaz. E na fase 4 a pessoa já fala assim “Doutor, eu reconheço que eu não posso mais com o álcool! Faça o que o senhor quiser pra mim, me ajuda. Estou entregue em suas mãos, eu preciso de sua ajuda pra eu realmente parar com isso”. Geralmente a pessoa na fase 4 já se envolveu com a polícia já perdeu a família, já perdeu dinheiro. Então quando a pessoa chega neste nível o sucesso para o tratamento é muito maior. A pessoa já entrou naquele primeiro preceito lá do AA, que é reconhecer que eu sou impotente perante o álcool. Ou seja, reconhecer que dentro dela já existe a dependência química. Ø Aí a família custeou a internação dele, e ele usou o dinheiro para passar 3 semanas na farra com os amigos. A família o aceita em casa novamente. Passou 2 anos sem abusar de álcool e drogas. Agora arrumou um bom emprego e manteve-se nele. No final deste período o foi descoberto roubando este estabelecimento. Ø Então é muito comum isso. A dependência gera alguns comportamentos impulsivos antissociais. Às vezes aquilo foi tão apreendido na época que ele usava maconha, que usava cocaína, de burlar algumas questões sociais que isso aparece de novo. Furtos, por exemplo. Ø [FIGURA] Aqui só mostrando o dano cerebral de uma pessoa de 46 anos normal e a outra que usa álcool. Aquilo que a gente falou da alteração da estrutura neuronal aqui dá para ver perfeitamente. Ø Aos 28 anos ele foi responsável pela morte de uma pessoa por acidente de trânsito. Aguarda julgamento por homicídio. O exame toxicológico apontou para o uso de múltiplas substâncias no momento do acidente. Ø Esse caso é só uma ilustração que vocês vão cansar de ver isso na prática médica de vocês em pronto socorros. Pessoas nessas fases de dependência à múltiplas drogas, cocaína e álcool geralmente mais comuns. DIAGNÓSTICO DE DEPENDÊNCIA Ø Isso aqui é uma coisa importante de olhar e tentar guardar porque isso vai cair em prova. Ø Antigamente você fazia diagnóstico de uma dependência etílica existiam vários critérios. Ø Por exemplo, existia um critério que falava que a pessoa tinha o alcoolismo Dipsomania. Ou seja, a pessoa que bebe para abafar um problema. Alcoolismo fase inicial. Ø Com as classificações diagnósticas os critérios foram sendo mais operacionalizados. Então hoje em dias essas classificações antigas caíram por terra, e existe um critério que a gente tem que usar sempre. Ø Critérios: • A síndrome seria um forte desejo para consumir, ou seja, uma compulsão que já começa a aparecer de uma forma bem visível. • Dificuldade de controlar o uso em termos de início, término e nível de consumo. • Falta de controle achando que vai tomar só duas cervejinhas, e chega lá toma uma caixa. • Reações físicas como ansiedade, distúrbio do sono, depressão, convulsões, que indicam abstinência. • Necessidade de doses cada vez maiores (tolerância). • Abandono progressivo dos prazeres, do interesse. • Aumento do tempo para uso para se recuperar dos efeitos, que é uma relevância. • Persiste no uso apesar das consequências (perda da crítica). Ø Então pelo menos 3 destes critérios ao longo do último ano devem estar presentes. Isso é muito importante também. Você pergunta ao paciente se ao longo do último ano ele apresentou estes critérios. Ø Então hoje em dia o diagnóstico de uma dependência etílica tem que passar por estes critérios. Ø Isso é muito importante porque hoje em dia ela é subdiagnosticada. Apesar de existir todo conhecimento técnico da medicina é um diagnóstico que vai sendo deixado para o segundo plano. Um exemplo, às vezes você está num pronto socorro, você pega um paciente que tem esses critérios todos aqui. Um paciente que já tem uma ginecomastia, já tem telangiectasia. Você atende esse paciente, medica esse paciente, mas você não chama ele e fala que ele tem uma dependência etílica instalada, que já tem um quadro de alteração dos neurônios, que tem Existe síndrome de dependência? AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 6 um quadro que é progressivo, que o diagnóstico dele é esse. Chama a família e fala que ele tem o diagnóstico de uma dependência etílica já instalada. Isso aqui é irreversível, então precisa de ter um tratamento urgente, indica para um psiquiatra e para o AA. Isso a maioria de nós médicos não fazemos. Então o etilismo é subdiagnosticados. Ø Então é função do médico ter todo o conhecimento técnico para fazer um diagnóstico deste e colocar esse paciente no encaminhamento. (“síndrome de dependência etílica, encaminho com urgência”). Ø Então começa com o médico tendo conhecimento técnico pra fazer esse diagnóstico. Saber que é um processo irreversível, que é uma lesão neuronalque vai evoluir por todas aquelas fases. Ø Os tremores já são sinais de abstinência. Isso que eu quero que vocês leem para a próxima aula pra gente falar deles. Ø [FIGURA] Aqui mostrando esse ciclo vicioso, como isso acontece. A família tenta controlar, vem chantagem, frustração, todo um comportamento destrutivo, mais ajuda, mais controle. É um ciclo vicioso que a dependência causa e existe no meio um fator que chama co-dependência. Ø É muito comum chegar num pronto-socorro uma paciente de 20 e poucos anos acompanhado da mãe. Esse paciente, por exemplo, já perdeu a família, já perdeu emprego, mora com a mãe atualmente. E a mãe leva dizendo que o filho não para de beber, não para de usar cocaína. Ao longo do acompanhamento você vai ver que essa mãe protege esse filho, ela continua dando dinheiro para ele. Ela continua aliviando os conflitos dele. Quando ele é preso ela vai lá e solta ele. Quando o médico interna ela vai na clínica e pede para dar alta. Então essa co- dependência, a pessoa dependente coloca tantas outras pessoas dentro de um processo psíquico que a pessoa, sem perceber, se vê alimentando aquela dependência. Ø Então é um conceito psíquico muito comum de acontecer em qualquer dependência química. Sempre vai ter alguém que vai ter essa função de co- dependente. E aí é importante no tratamento que essa pessoa co-dependente seja tratada também. Ø Então quando tem caso de um etilismo que existe uma pessoa co-dependente a gente chama essa pessoa e encaminha essa pessoa para um psicólogo, conversa com essa pessoa em particular, tenta mostrar que aquele comportamento dela está mantendo aquela dependência daquela pessoa. Muitas vezes essa pessoa não vai aceitar isso. Ela vai ficar com raiva da gente. Depois passa um tempo ela volta e diz que você realmente estava certo, que ela mantém essa dependência daquela pessoa. Mas é uma coisa muito importante desse tratamento. EVOLUÇÃO DA DEPENDÊNCIA ETÍLICA Ø Só pra terminar, agora eu falar um pouco de como seria a evolução natural de uma dependência etílica. Desde o uso abusivo até a fase final de qualquer dependência, que é a demência. Ø Todo etilismo crônico, todo etilismo não tratado vai evoluir para uma fase final de demência. Ø O paciente é aquele de 40 anos que bebeu a vida toda, parou de trabalhar, mora sozinho, que não consegue mais fazer nada, não consegue nem conversar direito. Parece que é uma demência numa pessoa mais jovem. Ø O alcoolismo evolui para a demência. Esse processo começa com o uso abusivo. Ø Do uso abusivo tem um marco principal do uso abusivo que é a síndrome de dependência alcoólica (SDA). Então esse é o marco principal. Ø Uma vez que iniciou a síndrome o que vai acontecer ao longo da vida são períodos de abstinência. Vai acontecer abstinência mais uso abusivo. • Uso abusivo • Dependência • Abstinência • Delirium tremens • Encefalopatia de Wernick-Korsakov • Blackouts • Amnésia • Convulsão • Demência SDA Delírio Tremens Uso abusivo Demência Abstinência Síndrome Amnéstica Convulsão Encefalopatia de Wernick - Korsakov Alterações metabólicas AULA 3 (P1) – PSIQUIATRIA – DR. ALEXANDRE ALICIANE ROSA SOARES RODRIGUES 06/03/2020 7 Ø Na abstinência existe um quadro gravíssimo, no caso do álcool, que é o delirum tremens. É um quadro gravíssimo porque o sistema de recompensa conversa com o corpo através da hipófise. É o ACTH vai lá na suprarrenal, libera cortisol e o cortisol mexe com todo o organismo. Então no ciclo vicioso, durante os períodos de uso, abuso e abstinência o sistema de recompensa fica hiperativado. Na hiperativação dele a hipófise manda muita informação pra suprarrenal. Então o etilismo crônico, quando a pessoa tem a abstinência, existe uma abstinência que é grave onde existe um descontrole de todo o organismo, não só da parte psíquica como da parte orgânica. Então eletrólitos, cortisol, equilíbrio ácido básico. É um quadro clínico muito grave que tem mortalidade de 10%. Geralmente é um paciente que tem que ser internado, receber altas doses de líquidos se não ele desidrata. Existe uma tempestade neurovegetativa, a pressão, por exemplo, sobe e desce, sudorese, confusão mental (que é aquele quadro de delirium, é uma alteração do nível de consciência), alucinações auditivas, alucinações visuais. Então esse aqui é o Delirium Tremens. Ø Já existia uma alteração clínica de eletrólitos. Então quando paciente está neste nível a confusão mental dele é porque ele está com quadro de alteração química muito grande. E essa alteração química só vai ser corrigida se ele for internado. Ele não vai corrigir isso em casa. Ø Esse paciente se não for internado e receber muito líquido, medir eletrólitos, se liberar ele pra casa tem altas chances do paciente morrer. Ø E o que acontece com nosso sistema de saúde atual é que não se consegue vaga para paciente com delirium tremens com facilidade. Ø O delirium tremens já indica alteração metabólica. Ø Então o que pode acontecer também ao longo dessa evolução é a pessoa começar a ter síndrome amnéstica. A síndrome amnéstica são alterações de memória, tipo Alzheimer mesmo, ou então passageiras, tipo blackouts. A pessoa tem lapsos, lacunas. Mas indica que se a pessoa começa a ter alteração mnêmica indica lesão neuronal. Então quando o etilista já começa a ter alteração de memória já pode imaginar que ele está no meio do caminho da demência, já começa a ter alterações. Ø Das síndromes amnésticas existe uma que é muito famosa, que é a encefalopatia de Wernick, onde existe uma lesão no cérebro causado pela glicose, onde a pessoa tem uma baixa de tiamina por causa do álcool e essa lesão causa um quadro de nistagmo, marcha atáxica, e problema de memória. Esse tripé tem o nome de encefalopatia de Wernick-Korsakov. Então a pessoa tem nistagmo, alteração de marcha (ataxia, uma marcha incoordenada), e alterações mnêmicas. Então quando a pessoa faz um quadro de Wernick-Korsakov indica que ele está além do meio do caminho. Ele já está evoluindo mais ainda para a demência. Ø O que pode acontecer numa fase mais final é a convulsão. Então vocês vão pegar muito no pronto socorro muito paciente etilista crônico que já chega fazendo quadro convulsivo. Aí você vai ver a pessoa não tem histórico de epilepsia, a convulsão dela é pela abstinência etílica. Já houve lesão neuronal, já tem alterações focais e diante da abstinência fica tendo crise convulsiva. Então quando a pessoa chega no nível de crise convulsiva ela já está chegando no quadro demencial. Ø Quando a pessoa passa por tudo isso existe um empobrecimento geral da vida dela aí é aquela pessoa etilista crônica que largou tudo, perdeu tudo, já não consegue nem conversar direito, tem graves alterações de memória, de interação. Essa pessoa já nem bebe mais direito. Bebe uma dose só e já fica alterada. Então é a fase final da abstinência. Qual a diferença entre abstinência e Delirium Tremens?