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PEDIATRIA (SÃO PAULO) 2010;32(4):274-80 274 n ARTIGO DE REVISÃO Resumo Objetivos: Abordar, por meio de revisão de lite- ratura, as manifestações bucais predominantes e as precauções que devem ser tomadas para o trata- mento odontológico de crianças com diabetes mellitus tipo 1. Fontes pesquisadas: Artigos advindos de base de dados (Bireme e PubMed) relacionados à diabetes mellitus tipo 1 e ao trata- mento odontológico. Síntese dos dados: Após a revisão da literatura, destaca-se a presença de várias manifestações bucais em crianças com diabetes mellitus tipo 1. Além disso, torna-se evidente que o tratamento destes pacientes deve ser interdisci- plinar, já que o controle glicêmico, obtido por meio da reeducação alimentar e aplicações regulares de insulina, proporcionarão à criança diabética melhoria da qualidade de vida e melhores chances de sucesso ao tratamento odontológico, uma vez que em crianças com glicemia controlada ocorre redução de alterações bucais, como xerostomia, periodontite, gengivite, cárie dental e infecções oportunistas. Também se ressaltam os cuidados que devem ser tomados no atendimento odontológico destas crianças, para que recebam um tratamento odontológico seguro, efetivo e voltado para suas reais necessidades. Conclusão: Crianças diabéticas devem receber atenção odontológica criteriosa, visto que estão mais sujeitas a xerostomia, perio- dontite, gengivite, cárie dental e infecções opor- tunistas, principalmente quando a glicemia não está bem controlada. A identificação destas alte- rações bucais pelo cirurgião-dentista pode indicar essa condição e um encaminhamento ao médico responsável deve ser realizado. Durante o atendi- mento desses pacientes no consultório odontoló- gico, cuidados como antibioticoterapia profilática, horário das consultas, dieta, tratamento de compli- cações bucais e monitoramento do controle glicê- mico devem ser tomados. Descritores: Diabetes mellitus tipo 1. Saúde bucal. Manifestações bucais. Assistência odontológica. Abordagem odontológica em pacientes com diabetes mellitus tipo 1 Dental management in patients with diabetes mellitus type 1 Patrícia Motta Fernandes1, Cristiane Tomaz Rocha2, Iza Teixeira Alves Peixoto3, Ivna Fernandes Queiroz4, Paulo Nelson Filho5, Alexandra Mussolino de Queiroz6 1 Professora Mestre da Faculdade de Odontologia da Universidade para o Desenvolvimento do Estado e da Região do Pantanal (UNIDERP/Anhanguera). 2 Mestre e Doutoranda em Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto-Universidade de São Paulo (USP). 3 Doutoranda em Microbiologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba-Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). 4 Médica Intensivista do Hospital Fernandes Távora, Fortaleza, CE. 5 Professor Titular da disciplina de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto-Uni- versidade de São Paulo (USP). 6 Professora Doutora da disciplina de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto- Universidade de São Paulo (USP). AbORDAgEm ODOnTOLógIcA Em PAcIEnTES cOm DIAbETES mELLITUS TIPO 1 275Abstract Objectives: To discuss, through a literature review, the predominant oral manifestations and emphasized the precautions to be taken by the dental treatment of children with type 1 diabetes mellitus. Resear- ched sources: Papers from the database (Bireme and PubMed) related to type 1 diabetes and dental treat- ment. Data source: After review of the literature, there is the presence of several oral manifestations in children with type 1 diabetes mellitus. Furthermore, it becomes clear that their treatment must be interdis- ciplinary, since the glycemic control achieved through diet and regular applications of insulin will provide better quality of life for diabetic children and improve chances of dental treatment success. In children with controlled glicemy, there is a decline of some oral mani- festations such as dry mouth, periodontitis, gingivitis, dental caries and opportunistic infections. Also it is emphasized that care must be taken in the dental care of these children to receive dental treatment safe, effective and focused on their real needs. Conclusion: Diabetic children should receive dental care judiciously, since they are more susceptible to dry mouth, periodon- titis, gingivitis, dental caries and opportunistic infec- tions, especially when glicemy is not well controlled. The identification of these oral diseases by the dentist may suggest this condition and referral to a medical treatment should be performed. During treatment of these patients in the dental office, precautions as use of prophylactic antibiotics, appointment hour, diet, treat- ment of oral complications and monitoring of glycemic control should be taken. Keywords: Diabetes mellitus, type 1. Oral health. Oral manifestations. Dental care. Introdução O diabetes melittus tipo 1 (DMT1) é uma das doenças endócrinas mais sérias da infância e adoles- cência1, representando cerca de 15% dos casos de diabetes2, e sendo ocasionado pela destruição progres- siva das células pancreáticas produtoras de insulina devido a um processo autoimune3. A insulina é um hormônio que atua fundamental- mente na regulação do metabolismo dos carboidratos e sua ausência resulta na diminuição da entrada de glicose nos tecidos e o consequente aumento do seu nível no sangue, conhecido como hiperglicemia, caracterizando o quadro de DMT14-6. A incapacidade de reabsorção de todo este excesso de glicose pelos rins resulta em glicosúria, que desencadeia a elevação da eliminação de urina (poliúria), a ser compensada pelo aumento da ingestão de líquidos (polidpsia). Além disso, como a glicose não consegue entrar na célula, provoca perda de peso e, dessa forma, um aumento da fome (polifagia)7,8. Assim, estes pacientes são geralmente magros e estão propensos, se não tratados, à cetoacidose. Esta condição é caracterizada pelo aumento no número de corpos cetônicos no sangue, que leva a uma acidose metabó- lica, provocando desidratação ou poliúria5. Quando os sintomas manifestam-se, geralmente antes dos 30 anos de idade, a destruição já é grave, requerendo sempre tratamento com insulina e dieta balanceada9. Sua incidência tem aumentado em países desenvol- vidos dos anos 50 até os dias atuais, com uma previsão alarmante que dobraria em crianças abaixo de 5 anos em 202010. No Brasil, um estudo recente demonstrou que a incidência do DMT1 aumentou 9,6 vezes após 20 anos de acompanhamento. Neste trabalho, a inci- dência variou de 2,82 casos para cada 100 mil crianças, em 1987, para 27,20 casos para cada 100 mil em 2002, ano que apresentou a maior incidência11. O diagnóstico do DMT1 é baseado tanto nos sinais e sintomas sistêmicos, quanto nos sinais e sintomas bucais, que incluem gengivite, periodontite, infecções fúngicas bucais recorrentes e dificuldade de cicatri- zação. Assim, os cirurgiões-dentistas podem exercer um papel importante no diagnóstico do DMT1 em seus pacientes infantis, devendo ainda ter conhe- cimento a respeito dos cuidados a serem adotados durante o atendimento odontológico, bem como dos possíveis riscos. Em virtude do aumento da prevalência e da inci- dência do DMT1 e da escassez de estudos abordando as alterações bucais e os cuidados odontológicos nesses pacientes, o objetivo deste trabalho é, por meio de uma revisão de literatura, abordar as manifestações bucais predominantes e ressaltar as precauções que devem ser tomadas frente ao tratamento odontológico de crianças com DMT1. Manifestações bucais em crianças com DMT1 Várias alterações bucais podem ser observadas em crianças com DMT1, porém estas são variáveis e observadas, geralmente, em pacientes diabéticos não controlados12,13, sendo elas: • Xerostomia e disfunção das glândulas salivares, com consequente diminuição do fluxo salivar e da capacidade tampão da saliva3,9,14-19; • Cálculos dentários9,20; PEDIATRIA (SÃO PAULO) 2010;32(4):274-80276 • Aumento dos níveis de glicose salivar15,17; • Sensação de queimação na mucosa bucal9; • Desenvolvimento dental acelerado, geralmente em crianças mais jovens, porém atraso no desenvolvi- mento dental em crianças com idade mais avançada21-23; • Alteração na microbiota bucal (com predo- minância de colônias de Candida albicans e Strep- tococcus hemolíticos), provocando maior susceptibi- lidade a infecções, como candidíase bucal e queilite angular15,19,24,25; • Perdas dentárias23,26; • Hálito cetônico; • Alterações de forma, tamanho e textura da língua; • Paladar alterado; • Retardo na cicatrização de feridas. Entretanto, as manifestações bucais que ocorrem com maior frequência e, portanto, merecem destaque são a doença periodontal e a cárie dentária. Doença periodontal O diabetes mellitus (DM) é uma das condições sistêmicas que aumentam a susceptibilidade à doença periodontal8. Apesar da baixa ocorrência de doenças periodontais em crianças, esta é a complicação bucal mais comum da DM, ocorrendo em alta prevalência, independentemente da idade1,8,18,23,27-30. Devido às alterações no sistema imunológico, a infecção perio- dontal torna-se mais grave e mais difícil de ser comba- tida nestes pacientes, podendo agravar o controle glicêmico. A presença de infecção periodontal grave pode também aumentar o risco para complicações, como micro e macroangiopatias8,12. A destruição periodontal acelerada em crianças está relacionada com o nível de controle metabólico, o que se torna bastante importante no tratamento de complicações periodontais nestes pacientes31. Segundo Bensch et al. 1, as gengivites são mais graves em crianças com diabetes e isso se torna mais compli- cado quando há o aumento do nível de glicose no sangue. Até os pacientes sob controle têm mais infla- mações gengivais, provavelmente devido às funções neutrofílicas alteradas. De acordo com Novaes et al.29, o índice de placa, o índice gengival e a perda óssea alveolar foram significativamente maiores entre pacientes diabéticos do que no grupo controle. Há também evidências de que a doença perio- dontal crônica pode comprometer o controle da DMT1, sugerindo que infecções periodontais podem ter repercussões sistêmicas32,33 e que a bacteriemia induzida por doença periodontal poderia causar elevação das citocinas pré-inflamatórias no soro, levando à hiperlipidemia e, finalmente, causando uma síndrome de resistência à insulina e contribuir para destruição das células beta pancreáticas3. Assim, o tratamento das infecções periodontais crônicas é essencial para o manejo do DM8. Desta forma, as infecções odontológicas em pacientes com DMT1 podem desregular o controle metabólico e o manejo de infecções periodontais em pacientes não-controlados pode ajudar a melhorar o controle glicêmico. Assim, higiene bucal adequada e consultas odontológicas frequentes são extremamente importantes para os pacientes com DMT134. Cárie dental Até recentemente, o consumo de açúcar era contraindicado na dieta dos indivíduos diabéticos, sendo esta conduta ainda adotada por muitos profis- sionais. Como a sacarose é o mais cariogênico dos açúcares, era possível supor que indivíduos com seu uso restrito tivessem menor ocorrência de cárie. No entanto, não há evidência de que uma dieta pobre em açúcares reduza a ocorrência de cárie dental nestes indivíduos8,13,35,36. Diversos estudos demonstram que a prevalência de cárie em pacientes diabéticos é maior15,18,19,23,24,37-42. Porém, outros mostram que esta prevalência é menor8,9,19,43-45 quando comparada a de indivíduos sadios. Estes resultados conflitantes decorrem do tempo de duração do DMT1, do consumo restrito de sacarose, da ocorrência de xerostomia, do conteúdo de glicose na saliva e no fluido gengival e da baixa taxa de fluxo salivar e capaci- dade tampão1,9,15,19,43,45, que interferem favorável ou desfavoravelmente no desenvolvimento de lesões de cárie dental. Alguns autores relatam, ainda, que a elevada prevalência de cárie dental em crianças com DMT1 ocorre devido à higiene deficiente e ao controle meta- bólico inadequado4,15,19,39,41-43. Atendimento odontológico da criança com DMT1 História médica Para minimizar o risco de urgências, o cirurgião- dentista deve considerar alguns aspectos antes de iniciar o tratamento odontológico. Primeiramente, deve-se avaliar a história médica, o grau do controle glicêmico na consulta inicial, determinando os níveis AbORDAgEm ODOnTOLógIcA Em PAcIEnTES cOm DIAbETES mELLITUS TIPO 1 277de glicose sanguíneos recentes, a frequência de episó- dios de hipoglicemia e a pressão arterial46. Além disso, devem-se investigar as medica- ções utilizadas, incluindo as dosagens e o tempo de administração, e ter critérios na prescrição de outras medicações, que podem alterar o controle glicêmico pela interferência com a insulina ou com o metabo- lismo de carboidrato47. Interação com o médico A criança diabética requer um atendimento de caráter interdisciplinar, já que necessita de monito- ramento constante do controle glicêmico. Assim, o cirurgião-dentista deve manter contato com o médico da criança, a fim de acompanhar a evolução da doença, que pode interferir no plano de trata- mento odontológico, e exigir exames para avaliação do nível de glicose no sangue48. As comunicações devem ser, ainda, bidirecio- nais. O médico deve estar à parte das manifestações bucais da doença, sendo este um sinal para auxiliá- lo a regular o nível de glicose sanguínea, bem como o cirurgião-dentista deve estar atualizado do grau de controle glicêmico para ajudar a manter a saúde bucal. Além disso, esta comunicação pode propor- cionar uma fonte de referência de novos pacientes com DMT1 ao cirurgião-dentista, devido ao encami- nhamento médico, possibilitando o controle da saúde bucal desses pacientes49. Antibioticoterapia profilática Pacientes com DM mal controlado são de risco a desenvolver complicações bucais, devido a sua susceptibilidade a infecções e, provavelmente, irão requerer terapia antibiótica de suporte50. Realização de cirurgias dentoalveolares envolvendo mucosa e osso com cobertura antibiótica pode ajudar a prevenir a dificuldade de cicatrização de feridas. Como infec- ções bucais requerem monitoramento rigoroso pelo profissional, culturas microbiológicas podem ser realizadas frente a infecções bucais agudas e terapia antibiótica efetiva deve ser prescrita46,50. Horário das consultas As consultas devem ser curtas e preferencialmente no período da manhã, pois, neste período, o paciente está mais controlado devido à primeira aplicação de insulina e com menor nível de estresse. Em caso de consultas prolongadas, principalmente se ultrapassar o horário de costume de refeição da criança, deve-se interromper o atendimento para uma refeição rápida, como, por exemplo, um copo de suco e, assim, evitar uma possível hipoglicemia do paciente6,7,12,35. Entretanto, se um choque hipoglicêmico ocorrer no consultório odontológico, o dentista deverá reco- nhecer os sintomas, como fraqueza, sialorreia, nervo- sismo, confusão, pele úmida e pálida, e tratar imedia- tamente. A respiração, pulso e pressão sanguínea estão normais. Frequentemente, um tremor é notado. Deve-se administrar também uma bebida com alto teor de carboidratos, como um suco de laranja ou um refrigerante e colocá-lo sob observação até que todos os sinais e sintomas tenham desaparecidos. Se o estado de hipoglicemia continuar, o paciente se tornará incons- ciente, a menos que seja administrada solução de 50% de dextrose (50ml) via endovenosa. Nessa situação, a administração de oxigênio e monitoração dos sinais vitais faz-se necessária. Em casos de pacientes cons- cientes não cooperativos, pode-se também lançar mão do glucagon (1mg intramuscular)1. Dieta O cirurgião-dentista deve orientar o paciente para que faça sua dieta normalmente no dia da consulta odontológica, evitando um quadro de hipoglicemia.É necessário também assegurar que o paciente esteja tomando suas medicações. Por exemplo, se o paciente evita tomar o café da manhã, mas toma a dose normal de insulina, o risco de um episódio de hipoglicemia aumenta. Para alguns procedimentos, como a sedação consciente, o cirurgião-dentista pode requisitar que o paciente altere sua dieta normal antes do procedimento. Nestes casos, a dose da medicação pode necessitar ser modificada em consulta com o médico do paciente47. Ajuste de insulina A maioria das formas de tratamento odontológico não interfere com o controle do DM. Contudo, cirurgia dentoalveolar, infecções bucofaciais e estresse oriundo de procedimentos odontológicos podem aumentar os níveis de glicose sanguínea e a necessidade de insulina metabólica, podendo requerer uma mudança no trata- mento médico da criança. Assim, pacientes contro- lados com insulina irão requerer dosagens maiores na presença de infecção bucal aguda50. Além disso, medicações usadas por dentistas podem requerer também ajuste no tratamento da DMT1. Por exemplo, grande quantidade de epinefrina pode antagonizar os efeitos da insulina e resultar em PEDIATRIA (SÃO PAULO) 2010;32(4):274-80 278 hiperglicemia. Contrariamente, hipoglicemia pode ser promovida por aspirina, sulfas e antidepressivos50. Monitoramento do controle glicêmico No tratamento odontológico de pacientes com DMT1, é necessário estabelecer o grau de controle da doença (mal ou bem controlada), determinado pelo nível de glicose sanguínea disponibilizado pelo médico do paciente. Mesmo que essas atualizações médicas sejam registradas na ficha odontológica a cada visita para guiar as decisões clínicas, o cirurgião-dentista pode usar um glicosímetro para medir os níveis de glicose pela ponta do dedo do paciente34,47. Tratamento das complicações bucais da DM O tratamento odontológico de pacientes contro- lados pode ser realizado da mesma maneira que o de pacientes não diabéticos, tomando-se apenas alguns cuidados. Entretanto, devido às condições sistêmicas destes pacientes, deve-se priorizar o tratamento odontológico preventivo, incluindo exames clínicos e radiográficos frequentes, instruções de higiene bucal, profilaxia e acompanhamento periódico da saúde periodontal34. Em crianças com DMT1 mal controlado e/ou com infecções bucais, retornos mais frequentes e atenção meticulosa são requeridos, a fim de propor- cionar um acompanhamento mais rigoroso e trata- mento mais interventivo51. Desta forma, após anamnese e exame clínico criteriosos, um plano de tratamento individualizado deve ser desenvolvido juntamente com a família e outros profissionais envolvidos, considerando alguns aspectos, como idade, medicações (insulina ou agentes hipoglicemiantes bucais), padrões de dieta alimentar, fatores culturais e sociais e presença de complicações bucais e/ou sistêmicas34. Uso de drogas Com relação ao uso de vasoconstritores, estes podem ser empregados com segurança na maioria dos pacientes diabéticos em condições estáveis52. Entretanto, Barcellos et al.6 não recomendam o uso de soluções anestésicas contendo adrenalina, uma vez que este hormônio provoca a quebra do glico- gênio em glicose, podendo ocasionar hiperglicemia. Além disso, como o paciente diabético está sujeito à isquemia por causa da microangiopatia, esta condição pode agravar-se quando adrenalina for administrada. Vasoconstritores sintéticos do tipo felipressina35 ou anestésicos locais sem vasoconstritores podem ser utilizados com mais segurança6. Quando submetido a situações de estresse, o orga- nismo libera níveis consideráveis do hormônio adre- nalina na corrente sanguínea, podendo ocasionar um quadro hiperglicêmico. Assim, o cirurgião-dentista deve estabelecer um vínculo de confiança com seu paciente para minimizar os efeitos causados pelo estresse, utilizar medicamentos ansiolíticos35 ou realizar sedação consciente com óxido nitroso em casos mais extremos53. O ácido acetilsalicílico ou outras drogas não este- roidais podem potencializar a atividade da insulina, ocasionando quadros hipoglicêmicos. Em situações de dor com intensidade leve a moderada, é indicado o uso de dipirona ou paracetamol6,35. Quanto ao uso de antibióticos, não é necessário nos procedimentos odontológicos de rotina, mas na presença de infecções bucais devem ser prescritos, devido à baixa resistência e ao retardo da cicatrização em pacientes diabéticos6,12,35. Como estes pacientes apresentam alterações metabólicas que provocam susceptibilidade a infec- ções, dificuldade de cicatrização e fragilidade capilar (facilidade para hemorragia), quando descompen- sados não devem ser operados e, em caso de procedi- mentos mais invasivos, deve ser realizada antibiotico- terapia profilática, como já mencionado7,12,35. Ainda, pacientes que irão se submeter a procedi- mentos cirúrgicos maiores podem requerer ajuste nas dosagens de insulina. Algumas complicações da DM, tais como doença cardiovascular ou renal, terão efeitos no planejamento do tratamento odontológico47. Conclusão O aumento da incidência do diabetes mellitus tipo I na sociedade faz com que o cirurgião-dentista tenha grande chance de se deparar com um paciente nessas condições. Assim, é importante que este profissional conheça as manifestações bucais predominantes do diabetes mellitus tipo I, como xerostomia, periodon- tite, gengivite, cárie dental e infecções oportunistas e suspeite do diagnóstico de diabetes mellitus tipo I quando identificarem essas manifestações bucais em seus pacientes, devendo encaminhá-los ao médico. Além disso, alguns cuidados devem ser tomados durante o atendimento destes pacientes, como anti- bioticoterapia profilática, horário das consultas, dieta, tratamento de complicações bucais e, principalmente, monitoramento do controle glicêmico. AbORDAgEm ODOnTOLógIcA Em PAcIEnTES cOm DIAbETES mELLITUS TIPO 1 279Referências 1. Bensch L, Braem M, Acker KV, Willems G. Orthodontic treatment considerations in patients with diabetes melli- tus. Am J Orthod Dentofacial Orthoped. 2003;123(1):74-8. 2. Ramos INC, Markus C, Mota LQ. A diabete mellitus e sua importância na odontologia. JAO. 2000;3(21):33-6. 3. 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Trabalho realizado na Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto-Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil. Endereço para correspondência: Alexandra Mussolino de Queiroz Departamento de Clínica Infantil, Odontologia Preventiva e Social. Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto-USP. Avenida do Café, s/n – Ribeirão Preto, SP, Brasil – CEP 14040-904 E-mail: amqueiroz@forp.usp.br Submissão: 22/9/2010 Aceito para publicação: 21/11/2010 Revista_Pediatria_Nov_Dez_2010[1].pdf
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