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A (DES) NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

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A (DES) NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
THE UNNECESSARY FOR PROOF OF BAD FAITH IN THE REPETITION OF UNDUE IN THE CODE OF CONSUMER PROTECTION 
Kamila Lacerda Mikulik [footnoteRef:1] [1: Discente da Escola de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. ] 
Wallace Fabricio Paiva Souza [footnoteRef:2] [2: Professor ] 
RESUMO: O presente artigo demonstrará o instituto da repetição dos indébito nas relações consumeristas e a aplicação do dispositivo nas jurisprudências. Será demonstrada a evolução histórica do direito do consumidor e apresentado os critérios sociais se sua criação, sendo no aspecto da função de ordem pública e a função social. No tocante às cobranças indevidas, será abordado os tipos de cobranças indevidas, com pagamento e sem pagamento, o posicionamento da jurisprudência em relação ao momento em que se deve restituir; e o problema central, abordaremos os critérios que devem ser seguidos para a concessão da repetição dos indébito, bem como a decisão do STJ, ao afirmar que, para o pagamento em dobro, o consumidor deve provar a má-fé do fornecedor, além de desrespeitar o princípio da inversão do ônus da prova, o referido posicionamento, fere o princípio da Harmonização, boa-fé e equilíbrio.
Palavras-chave: Direito do Consumidor. Repetição do Indébito. Má-Fé. Erro Justificável. Artigo 42 parágrafo único do CDC. Boa-Fé.	
ABSTRACT: The present article will demonstrate the institute of the repetition of the indébito in the consumerist relations and the application of the device in the jurisprudence. It will demonstrate the historical evolution of consumer law and presented the social criteria if its creation, being in the aspect of public order function and social function. Regarding undue charges, the types of undue charges, with payment and without payment, will be addressed, the positioning of jurisprudence in relation to the moment in which it must be restored; and the central problem, we will address the criteria to be followed for granting the repetition of indébito, as well as the decision of the STJ, stating that, for double payment, the consumer must prove the supplier's bad faith, in addition to disrespect the principle of reversal of the burden of proof, said position, hurts the principle of Harmonization, good faith and balance.
Keywords: Consumer Law. Repetition of Undue. Bad Faith. Justifiable error. Article 42 of the CDC. Good Faith.
1 INTRODUÇÃO
Muito se tem discutido a respeito da repetição do inédito nas cobranças indevidas, o art. 42 parágrafo único do CDC, dispõe de forma clara que se tratando de cobrança indevida, deverá o fornecedor restituir o valor em dobro, contudo, salvo engano justificável. 
Assim, estramos em uma grande discussão, quando podemos classificar como erro justificar ou má-fé do fornecedor, ressalta – se ainda que, a responsabilidade civil no código de defesa do consumidor é fundada na responsabilidade objetiva, não decorrente de culpa para sua confirmação. 
A jurisprudência do STJ tem oscilado em seus desfeitos, quer hora não aceitando o erro justificável, quer hora a necessidade de comprovação da má-fé. É notório que está se torno uma prática habitual das empresas cobrarem indevidamente de seus consumidores se embalando na exceção apresentada pelo parágrafo único do artigo 42 do CDC, estão usando de forma descabida a “desculpa” de que o simples vínculo entre consumidor e fornecedor justificam a possível cobrança indevida, argumentando ainda, que essas cobranças decorrem de erro sistêmico. 
Analisaremos a linha tênue que a jurisprudência está tomando, pois, cada caso em que se exige a comprovação da má – fé, para exigir um direito já garantido, além de ferir o direito da inversão do ônus da prova (pois o consumidor sendo vulnerável, o CDC prevê que o ônus da prova recai para o fornecedor -art. 6°, VIII do CDC- , direito também previsto no código de processo civil, em seu art. 378, que se aplica subsidiariamente ao CDC), fere também o princípio social que é base para a criação do CDC, tornando essas decisões um retrocesso ao avanço que foi criar a lei consumerista, e ficando cada dia mais próximos das previsões do código civil de 1916, colocando a soberania contratual (predominância do direito privado) acima do social, e induzindo o consumidor, deixar de ser vulnerável e colocando – o de forma equiparada as grandes empresas de hoje, com um enorme capital.
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DO CONSUMIDOR
O Código de Defesa do Consumidor é um código que trata da preocupação social, por mais que ele tenha se consolidado com a sociedade pós-moderna, a previsão para as ações consumeristas existe há muito mais tempo. Uma das primeiras legislações que continham a previsão de leis consumeristas foi o Código de Ur-Nammu em meados dos anos 2040 a.C.[footnoteRef:3] havia nele a previsão de reparação em pecúnia por danos causados, ainda que não sendo de modo especifico e objetivo, é a primeira menção a uma futura proteção ao Consumidor. [3: OLIVEIRA, Júlio Moraes. Curso de Direito do consumidor completo, 4° edição. Belo Horizonte, Editora D’Plácido 2017. V. 2 p. 31. Vide MAMEDE, Gladston. Direito Empresarial Brasileiro, Empresa e atuação empresarial. 2. Ed. Atualizada com o novo Estatuto da Microempresa : Lei complementar 123/06. São Paulo. Editora Atlas, 2008. V. 1 p. 1.] 
A segunda e mais famosa menção a proteção ao consumidor é no famoso Código de Hamurabi de 1770 a.C.[footnoteRef:4], tão conhecido pelo famoso “olho por olho, dente por dente”. O código de Hamurabi tem grande prestigio no direito, pois é considerado o mais antigo Código da humanidade, nele encontra-se as primeiras menções as relações de trabalho, família, propriedade e escravidão, e é primordial para as relações de consumo, pois, de forma mais direta, em sua lei de nº 108, vislumbra-se os primeiros passos para a proteção do consumidor ao afirmar que, “ Se uma dona de taverna não aceitar grãos de acordo com o peso bruto em pagamento por bebida, mas aceitar dinheiro, e o preço da bebida por menor do que o dos grãos, ela deverá ser condenada e atirada na água”(Código de Hamurabi 1770 a.C., lei 108). [4: É o nome do sexto rei da antiga Babilônia, o código é famoso pela citação “olho por olho, dente por dente”.] 
Durante o passar dos séculos, o Direto ao Consumidor foi se tornando mais notável, o seu ápice foi com a primeira Revolução Industrial que ocorreu em meados do século XVIII, como todos já estudamos na educação básica, a revolução industrial é marcada pela grande ascensão das máquinas, saltando na frente dos produtos artesanais e manuais, mais conhecido como “manufatura”. Com a inserção das máquinas no mercado, surgiu os serviços em grande escala, substituindo ainda mais as ferramentas manuais para grandes máquinas e grandes produções. 
Aproximadamente 100 anos depois da primeira revolução industrial, surgem os equipamentos movidos a eletricidade, os motores de combustão, os produtos químicos e físicos, as diversas formas de utilização do aço, e, um dos maiores saltos para aquela época, o início da tecnologia, começa a surgir no mercado os produtos tecnológicos, bem como a divulgação dos telégrafos e o projeto para o telefone. Com todas as mudanças que as revoluções industriais proporcionaram, a sociedade entrou para uma nova esfera, nos tornamos uma sociedade de massas, movida a grandes produções e regida por grandes avanços tecnológicos. 
Com todo esse avanço e cada dia mais o ser humano sendo substituído por máquinas para a realização dos produtos (que em sua grande maioria era produzido em massa), se tornou extremamente necessário uma proteção para o consumidor, as grandes empresas estavam sempre cercadas de complexidade para solucionar as demandas, que apareciam nas suas mais variadas formas. Naquele momento vimos a necessidade de uma regulamentação. 
2.1 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Como visto anteriormente, com o advento das revoluções industriaise da grande aceleração na produção em massa dos produtos e consequentemente o aumento do consumo, a sociedade enxergou a necessidade de uma regulamentação nas relações consumerista, pois, era notório que em relação aos fornecedores de produtos, comparados aos consumidores, o consumidor era vulnerável nessa relação. 
No Brasil não havia uma lei que definisse o Direito do Consumidor, ainda que soubéssemos da grande necessidade de regulamentar as relações de consumo, ainda mais depois da grande evolução na indústria e no comércio, não tínhamos pensado em uma solução.
Adotando uma maneira de “remediar”[footnoteRef:5] a necessidade de uma nova legislação específica, o legislador, optou por utilizar o Código Civil de 1916, para suprir a demanda consumerista da época. O impasse em se aplicar o código de 1916 nas relações de consumo é que se trata de uma lei regida pelo princípio da “Pacta Sunt Servanda”, em que seu fundamento é a obrigatoriedade dos contratos e que seu cumprimento se dará de qualquer maneira. Trazer uma legislação que tinha como primordial as ações privadas e, repudiava qualquer forma de ação social, para regulamentar uma lei que visa o elo mais vulnerável, era um absurdo. [5: Remediar do dicionário português quer dizer reparar uma situação, corrigir, consertar, atenuar etc.] 
Outro ponto em desfavor do CC/1916, era a desigualdade entre as partes, sempre foi notório que os fornecedores de produtos e serviços sempre tiveram mais “força” em relação aos consumidores, isso obviamente se dava principalmente por seu poder econômico, com isso, era inviável exigir uma igualdade entre as partes, afastando assim, o princípio que rege os contratos. Mais um grande problema nesse cenário é que a Responsabilidade Civil da época, era a responsabilidade subjetiva, sim, aquela que decorre de culpa, ao analisar a situação do Consumidor nessa relação contratual, era impossível que o consumidor tivesse qualquer tipo de êxito nas relações consumeristas na época. O consumidor se obrigava em um contrato que era desigual, prejudicial e se fosse necessário qualquer demanda em face dos fornecedores, era necessário que ele demonstrasse a culpa, o que francamente, não tem a menor possibilidade, uma vez que os consumidores encontravam dificuldades até mesmo para falar com o fornecedor, quem dirá, p reduzir provas contra ele.
Por fim, a tentativa de “regulamentar” as relações de consumo foi muito boa, um avanço, pois ao reconhecer a necessidade, vem as possibilidades de oferecer uma solução, ainda que os primeiros passos, sejam falhos. Pontes de Miranda de forma sublime e pioneira (como sempre) dizia: “diante da liberdade de contratar, praticamente traduzível em liberdade, para os fortes, de impor sua vontade aos fracos” ( Daniel Sarmento. Diretos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Justin, 2004.p. 303), depois dessas palavras, não se faz necessário mais nenhum comentário sobre a tentativa de aplicar o Código Civil de 1916, um código que valoriza as relações privadas, para atender as relações sociais.
Dada a incompatibilidade do referido código com o que se esperava de um código de Direito do Consumidor, a primeira menção para a elaboração da lei consumeristas surgiu com a nossa Carta Magna, que determinou em seu art. 48 das disposições finais e transitórias da Constituição Federal de 1988, a obrigação de formar uma comissão para que no prazo de 120 dias apresentassem um código de defesa do consumidor [footnoteRef:6], indo além, a proteção do Consumidor ganhou grande destaque, uma vez que foi classificada como direito fundamental em nossa Constituição, estando consagrada no Art. 5°, XXXII. [6: Art. 48 ADCT. O Congresso Nacional , dentro do prazo de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do Consumidor.] 
Art. 5° Todos são iguais perante alei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e os estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do Consumidor.
 
Neste brilhante texto, a Constituição deixa claro que o Estado, seja ele Executivo, Legislativo ou Judiciário, tem o dever de agir de forma positiva aos interesses dos consumidores. Como forma de máxima proteção ao direito do consumidor . Nossa constituição ressaltou ainda, mais dois artigos para resguardar a legislação Consumerista, sendo o art. 24, VIII da CF/88, que determina a competência concorrente da União, dos estados, e do Distrito Federal quanto a responsabilidade por danos auferidos aos consumidores; e, o artista. 170, V, CF/88, que prevê:
Art. 170, V. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
V – Defesa do Consumidor.
 
Como se vislumbra, a Constituição Federal de 1988, tratou de garantir o direito do Consumidor no rol de direitos fundamentais, no rol das competências e na chamada Constituição Econômica. Ainda que muito bem programada e detalhada, a lei consumeristas não foi elaborada conforme o prazo de cento e vinte dias, como determinava o artigo. 48 do ADCT, nosso CD só foi concluído no dia 11/09/1990, sendo que nossa Carta Magna foi promulgada em 05/10/1988.
O código de Defesa do Consumidor, foi criado pela Lei de n°8078/90, em 11 de Setembro de 1990, sendo publicada em 12 de Novembro do mesmo ano. Por ser uma lei mais que aguardada e que seus resultados inovaram a sociedade Brasileira, foi decretado em seu art. 118, que o prazo de vacatio legis[footnoteRef:7] seria de cento e oitenta dias, sendo assim, o CDC só entrou em vigor no dia 11 de Marco de 1991.[footnoteRef:8] [7: Vacatio legis é o prazo legal para uma lei entrar em vigor.] [8: OLIVEIRA, Júlio Moraes. Curso de especialização Direito do Consumidor Completo -4 ed. Belo Horizonte. Editora D’Plácido 2017. P. 69.] 
O CDC foi criado como uma lei ordinária, sendo considerada um grande avanço para o direito Brasileiro, pois, foi a primeira norma com cunho de ordem pública e interesse social ao mesmo tempo (art. 1° do CDC), sendo a primeira norma a visar os interesses dos vulneráveis (Consumidores). Essa característica inovadora não é por acaso, o efeito social do CDC se dá porque ele é uma norma principiológica, ele é regido por uma série de princípios sociais, que são formados por valores e objetivando o bem comum para todos. Pablo Lôbo explana que “o código de defesa do consumidor é uma lei eminentemente principiológica, com vasta utilização não só de princípios, mas de conceitos indeterminados” (Pablo Lôbo. Direito civil – obrigações .SP. Saraiva 2011.p.76).
Outra característica primordial dessa nova norma é que, de forma pioneira no Brasil, começamos a adotar a teoria do Diálogo das Fontes, sendo aquele que requer uma comunicação com as outras legislações de forma simultaneamente, esse conceito é aplicado de forma direta no art. 7° do CDC, ao falar que os direitos garantidos por esse código, não excluem os outros decorrentes de tratados e convenções ou costumes e equidade[footnoteRef:9]. [9: Art. 7° os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.] 
Conforme Cláudia Lima, existe três tipos de diálogos entre as fontes, sendo em primeiro lugar, diálogo Sistêmico, aquele em que a lei serve de base conceitual para outra; segundo, diálogo da Complementaridade e Subsidiariedade, aquele que quando uma lei tem seus esforços esgotados, a outra lei o completa; e por fim, o diálogo Coordenador e Adaptação Sistemática, sendo aquele que se dá reciprocamente entre as leis.[footnoteRef:10][10: BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do Consumidor.p.128] 
A teoria do Diálogo das Fontes é reconhecido e admitido pelo STJ, como podemos avaliar no acórdão do Recurso Especial n° 1.126.673, em que expõe :
“Deve ser utilizada a técnica do Diálogo das Fontes para harmonizar a aplicação concomitantemente de dois diplomas legais ao mesmo negócio jurídico; no caso as normas específicas que regulamenta os títulos de capitalização e o CDC, que assegura aos investidores a transparência e as informações necessárias ao perfeito conhecimento jurídico do produto.” 
(STJ – REsp n° 1.126.673/ SP- 4° Turma – Rel. Min. João Otávio Noronha – Dje 09.06.2011)[footnoteRef:11] [11: ] 
Após este contexto histórico-elucidativo, fica clara a evolução do nosso Código de Defesa do Consumidor, e como ele inovou em suas normas de cunho social.
3 O INSTITUTO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
A regulamentação legal do Instituto da Repetição do Indébito está presente nas disposições das Práticas Abusivas, seção V da Cobrança de Dívida do Código de Defesa do Consumidor.
Impossível seria tratar das cobranças indevidas, sem antes das cobranças de dívidas em si. O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 42 prevê a licitude das cobranças de dívidas, sejam elas na esfera Judicial ou Extrajudicial. O que muitos confundem é que, às práticas proibidas pelo referido artigo, são as cobranças Vexatórias, ameaças, constrangimento e etc..., ao abordar essas vedações, o CDC espera que os fornecedores (empresas), hajam de Boa-Fé ao realizar suas cobranças, preservando a dignidade dos seus consumidores.
Cláudia Lima Marques afirma que:[footnoteRef:12] [12: MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do Consumidor. 6° edição. São Paulo. Revista dos tribunais. 2011.p.137.] 
“[...] civilmente o exercício de um direito não constitui coação ou constrangimento; logo, improcedem as formações radicais de que a norma do artista. 42 impediria a cobrança de dívidas no Brasil, a partir da entrada em vigor do CDC. A norma do artista 42 instituiu um mínimo ético da conduta, qual seja, não expor o consumidor a ridículo, não ameaçá – lo com meias verdades – como aquelas comuns em cartas de cobrança, ameaçando – o de prisão, quando se sabe da estrita regulamentação legal sobre o assunto-, não importa um constrangimento ao consumidor, como impedi – lo de entrar no estabelecimento comercial etc. Mas repita – se que a cobrança, judicial e extrajudicial, da dívida é e continua sendo um direito do fornecedor que, porém, de se limitar a parâmetros de civilidade normal.” 
Realizar as cobranças das dívidas da forma correta, além de ser benéfico para a empresa, é importante, para resguardar os direitos da personalidade e a dignidade da pessoa humana. O primordial é que toda relação contratual Seja pautada pelo respeito mútuo. 
Nos casos relacionados às cobranças de dívidas, existe outro ponto de grande relevância; como já sabemos, o CDC tem por fundamento/característica, a adoção do Diálogo das Fontes. Sendo assim, no caso em comento, é perfeitamente possível a aplicação do Diálogo para maior visualização. Como cediço, são três as modalidades de diálogos das fontes (tratadas no tópico anterior), é a que podemos aplicar nesse caso é a Coordenação e Adaptação sistêmica das fontes, pois, o CDC e o CC/2002 são aplicados de forma recíproca quando se trata de pagamento em dobro. Vou explicar melhor.
O caput do art. 42 do CDC, trás as orientações e limitações em relação às cobranças de dívidas, agora, ao analisar o parágrafo único do referido artigo, determinamos a hipótese de cabimento para a repetição do Indébito (pagamento em dobro):
Art. 42, parágrafo único do CDC. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à Repetição do Indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescidos de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. 
Como pode ser observado, aquele que cobrado indevidamente, pode requerer a repetição do indébito. Agora, vamos analisar o art. 940 do CC/02, que revogou o art. 1531 do Código Civil de 1916, artigo este que deu origem ao arrependimento. 42, parágrafo único do CDC. 
Art. 940 CC/02. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição. 
Neste caso, aplica-se o diálogo das fontes, pois, o CDC a penalidade do pagamento em dobro nas cobranças de dívidas, são oriundas do direito do consumidor, ensejando assim, a cobrança na esfera Extrajudicial; agora, ao observar o dispositivo do código civil, vislumbramos a sutil diferença, ao afirmar “aquele que demandar (...)”, deixa claro o procedimento jurídico da ação, levando o casa direto para a esfera Judicial, isto porque o verbo usado foi demandar, ao contrário do usado no CDC, que usa o verbo cobrar.
Posto isto, é exatamente neste interim que aplicamos o diálogo das fontes, pois, as duas legislações, a indagação que distintas, possuem artigos com finalidades parecidas, contudo, aplicadas em esferas distintas, mas ainda assim, aplicam de forma recíproca. 
Após tratar da primeira parte do artigo. 42 do CDC, chegamos ao momento de elucidar todas as explicações em torno do parágrafo único do referido artigo. Entendemos de forma claro que, quando se cobrado indevidamente, o fornecedor é obrigado a restituir o valor de forma dobrada, o que pode ser que não seja tão claro, é que, a penalidade imposta ao fornecedor em realizar o pagamento dobrado quando se cobra indevidamente o consumidor, é com fins puramente pedagógicos, para que esses “erros”, muitas vezes justificados por “erro reorganizar sistêmico”, não aconteça tão frequentemente.
Já dizia Cláudia Lima Marques, “o fornecedor deve, como profissional, dominar todos os tipos de erros prováveis em sua atividade, erros de cálculo, impressão do valor errado por computador, troca de nome nas correspondências etc, [...]. Em matéria contratual, a noção de “ausência de culpa”, fica deslocada, pois o que há é dever, obrigação de cumprir o que se vinculou.” (MARQUES, Cláudia Lima. Manual de direito do consumidor.4°edição. São Paulo, r e vista dos tribunais. 2012.). 
Vale ressaltar que, a penalidade imposta ao fornecedor, na ótica do Consumidor é vista como reparação do dano patrimonial sofrido individualmente pelo Consumidor. Podemos dizer que muito se assemelha a danos morais, e a intenção é esta mesmo. O art. 6°, VI do CDC, classificado como o artigo responsável por tratar dos direitos básicos do Consumidor, nos mostra que é devido a reparação por danos patrimoniais e morais, neste ímpeto, é nítido que quando o Consumidor é cobrado de forma indevida, ele está sofrendo um dano patrimonial, que facilmente pode se tornar um dano moral, pois, desconheço um consumidor que seja, que tenha um fundo de emergência para possíveis cobranças indevidas. Todo transtorno causado pela cobrança indevida, seja qual for o tipo de transtorno, é passível de reparação, e essa reparação é com a dobra do valor, pois o pagamento simples, nada mais é que a devolução do valor que não pertence a empresa. 
A grande discussão sobre o parágrafo único do artigo. 42 do CDC (que é justamente o problema tratado neste artigo), é em relação ao final do parágrafo, ao falar que “[...] salvo hipótese de engano justificável.”, esse final é objeto de discussão pois dessa frase, o direito do consumidor, como figura vulnerável, v aí para várias vertentes.
Só o mero pensamento de se discutir, se o erro é justificável ou não, já fere os princípios do CDC, pois pensar em erro ou não, remete a análise de culpa, e como é sabido e já mencionado nesse próprio artigo, a responsabilidade civil aplicada no Código de Defesa do Consumidor é a Responsabilidade Civil Objetiva, quenão requer comprovação de culpa para aplicação da lei no caso concreto. Nesse sentido, não importa o que deu origem ao erro, não importante não é se o fornecedor agiu com culpa ou sem, o único ponto que deveria ser tratado é se houve o pagamento integral por parte do Consumidor, se sim, deve – se aplicar a penalidade do pagamento em dobro, ou, se não houve o pagamento da cobrança indevida por parte do Consumidor, neste caso, deveria analisar se é certo ou não aplicar a penalidade. 
GARCIA, L. M.[footnoteRef:13] Em sua obra eleva a ementa do STJ, em que demonstra a dupla função da penalidade ao fornecedor: [13: GARCIA, L. M. Lições de direito do Consumidor. Rio de Janeiro. Editora Lumen Júris. 2009.p.319.] 
O valor do dano moral tem sido enfrentado no STJ com o escopo de atender sua dupla função : reparar o dano, buscando minimizar a doe da vitima e punir o ofensor, para que não volte a reincidir. 
STJ, REsp 715320/SC. Rel. Min. Eliana Calmon. Dje 11/09/2007.)
Com isso, a única discussão sobre o assunto, volto a dizer, é se houve ou não o pagamento da cobrança indevida. Antônio BENJAMIN e Cláudia MARQUES,[footnoteRef:14] “[...] há necessidade de o Consumidor tenha de fato, pago indevidamente. Não basta a simples cobrança, no art.940 do CC é suficiente a simples demanda [...]”.Demonstrando mais uma vez que, o STJ está dando enfoque para a discussão errada, pois é descabido aplicar a ressalva do art. 42 , parágrafo único do CDC. [14: BENJAMIN, Antônio; MARQUES, Cláudia Lima, ; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do Consumidor. 4° edição. São Paulo. Revista dos tribunais. 2012.] 
Para adentrar ao próximo tópico, se torna pertinente a fala de THOMAZ, A. C. M., que explana sobre as práticas abusivas “constituem comportamentos irregulares do fornecedor de produtos ou serviços, que se revelam incompatíveis com a boa-fé que se deve comportar.” ( Lições de Direito do Consumidor. Rio de Janeiro. Lumen Juris 2009.p.319)
4 PRINCÍPIO DA HARMONIA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO (BOA-FÉ E EQUILÍBRIO)
Para iniciar o ultimo tópico deste artigo, é necessário que fique clara a posição principiológica do CDC; e é de suma importância fixar bem o princípio da harmonia e a boa-fé, visando o equilíbrio nas relações consumerista. Júlio Moraes de Oliveira[footnoteRef:15], conceitua muito bem o princípio da Harmonização e boa-fé: [15: OLIVEIRA, Júlio Moraes. Curso de Direito do Consumidor Completo. 4° edição. Belo Horizonte. Editora D’Plácido. 2017.p. 120.] 
“[...] conforme disposto no artigo. 4°, III do CDC, trata – se da harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilidade da proteção do Consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.”
A importância do princípio da Harmonização é para estabelecer uma igualdade de tratamento entre consumidores e fornecedores, não abrindo margem para conclusões precipitadas em relação ao fato do Consumidor ser vulnerável se comparado ao fornecedor. É para deixar claro que ambas as partes possuem o dever de agir pautados na boa-fé, trazendo para a relação Consumidor | Fornecedor o equilíbrio da balança.
Outro princípio que anda intimamente com o da harmonização e previsto no mesmo dispositivo legal, é o princípio da boa-fé. O princípio da boa-fé previsto no CDC, trata – se da boa-fé objetiva, sua finalidade é fazer com que as partes (Consumidor e fornecedor) se comportem com fundamento na honestidade e lealdade. 
Ainda conforme Júlio Moraes de Oliveira, “o princípio da boa-fé objetiva atua como critério de interpretação e integração dos negócios jurídicos , um critério hermenêutico objetivo do qual o juiz deve se valer na busca da supressão das lacunas da relação contratual, de forma a preservar as justas expectativas das partes contratantes, sempre tendo como foco último as finalidades econômicas e sociais do contrato.” (Curso de Direito do Consumidor Completo. 4° edição. Belo Horizonte. Editora D’Plácido. 2017.p. 104 e 105.) Pode-se entender que a finalidade última do contrato seja a igualdade de tratamento entre as partes, ainda que o juiz tenha que agir de ofício, ele deve priorizar a harmonia e boa-fé, e não somente a vulnerabilidade do Consumidor. 
Nesse sentido, Paulo Luiz Netto Lobo pondera :
“Além dos tipos legais expressos de clausula abusiva, o Código de Defesa do Consumidor fixou a boa-fé como Cláusula geral de abertura, que permite ao aplicador ou interprete o tende de compatibilidade das clausulas ou condições gerais dos contratos de consumo. No inciso IV do art. 51, contudo, a boa-fé está associada ou alternada com a equidade (‘...Com a boa-fé ou a equidade’)
(Deveres Gerais de conduta nas obrigações civis, inclusive Questões Controvertidas no direito das obrigações e dos contratos. São Paulo : Método, 2005.p. 80.)
Desta forma, fica evidente a via continua que os precioso da harmonia, boa-fé e equidade andam, suas funções são garantir, não só para os consumidores, como também os fornecedores, a igualdade de julgamento, a honestidade e lealdade nas cláusulas contratuais, bem como uma análise justa em suas demandas. 
É claro que existem outros inúmeros princípios consagrados no CDC, contudo, fora abordado estes para maior assimilação na discussão do próximo tópico, em que trataremos sobre o entendimento do STJ em relação a repetição do Indébito e os princípios da harmonização, boa-fé e equidade estão sendo respeitados.
5 A JURISPRUDÊNCIA DO STJ
Como já vislumbramos nos momentos derradeiros do tópico 3, a grande discussão jurisprudencial sobre a repetição do Indébito, é a exceção apresentada pelo próprio art. 42, parágrafo único do CDC, em que, usa o engano justificável para desvincular a aplicação da sanção aos fornecedores, em face dos Consumidores. 
Precipuamente, necessário se faz reconhecer que, atualmente o posicionamento do STJ é em negar o pagamento em dobro, aceitando qualquer justificativa dos fornecedores que seja no âmbito do “engano justificável”, e só mudando o seu entendimento, caso provasse a má-fé do fornecedor, ou, o fornecedor não apresente as provas que embalam o engano justificável. 
Atualmente, os grandes doutrinadores e a jurisprudência, divergem sobre quando se deve incidir o pagamento em dobro (assunto já adiantado no tópico três), essa analise se da ao questionar se a mera cobrança indevida seja passível da penalidade; ou, para que o pagamento seja em dobro, é necessário que o consumidor realize o pagamento indevido. Contudo, o CDC ao afirmar em seu art. 42, parágrafo único, que em virtude de engano justificável, o fornecedor pode se eximir do pagamento em dobro, mudou o objeto da discussão da doutrina. Diante disso, ficou a cargo da jurisprudência determinar o que seria aceito como justificativa do engano aceitável. Em tentativa de consertar as inúmeras vertentes que as decisões podem tomar, determinou-se que, caso o fornecedor alegue o engano justificado, deverá realizar a restituição na modalidade simples, é necessário que se demonstre o que ensejou esse engano/erro, e, caso não demonstre, seria negado o pagamento simples e aplicada a penalidade da repetição do Indébito.[footnoteRef:16] [16: Decisão proferida em face do Bradesco. STJ, AgRg no REsp. 1.200.417. Rel. Min. Paulo Tarso, 3° Turma. Dje 20/08/2012.] 
Vejamos a ementa do STJ Ag REsp n 718.974 – RJ.[footnoteRef:17], que aborda exatamente a demonstração de engano justificável: [17: Agravo de instrumento n 718.974 – RJ. Fonte: stj.jusbrasil.com.br – pesquisado em 02/04/2019.] 
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 718.974 - RJ (2015/0126525-7) RELATORA : MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES AGRAVANTE : COMPANHIA ESTADUAL DE ÁGUAS E ESGOTOS - CEDAE ADVOGADOS : JAYME SOARES DA ROCHA FILHO FABIO LESSA BASTOS AGRAVADO : CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO MANCEBO ADVOGADOS : CRISTIANA HAMDAR RIBEIRO RODRIGUES DANIELA RABELLO DA CUNHA DECISÃO Trata-se de Agravointerposto por COMPANHIA ESTADUAL DE ÁGUAS E ESGOTOS - CEDAE, contra Decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que negou seguimento a Recurso Especial, fundamentado na alínea a do permissivo constitucional. Nas razões do Recurso Especial, a recorrente aponta contrariedade aos arts. 165 e 458, II e III, do CPC, ao defender que o acórdão recorrido não se encontra devidamente fundamentado. Alega a ocorrência de afronta ao art. 98 do Decreto 553/76, sob o argumento de que "a tarifa mínima é o produto do consumo mínimo mensal, por economia, pela tarifa unitária, para daí chegar-se ao mínimo consumido por cada economia" (fl. 403e). Acrescenta que houve contrariedade aos arts. 39, V, e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, "uma vez que, além do fato de não haver nenhum tipo de vedação legal para tal cobrança, a concessionária nem de longe obtém vantagem excessiva em face do consumidor, pois como visto, tal cobrança possui apenas o fito de manter o equilíbrio econômico-financeiro do contrato" (fl. 404e). Deduz que a cobrança pela tarifa progressiva tem respaldo legal e jurisprudencial, consoante previsto nos arts. 22, IV, e 30 da Lei 11.445/07, bem como pelo entendimento pacificado pela Súmula 407/STJ. Assevera a impossibilidade da repetição do indébito em sua dobra, por força da aplicação dos Decretos 22.872/96 e 556/796 Defende que deve ser observado o prazo prescricional trienal, nos termos do art. 206, § 3º, IV e V, do Código Civil. Requer, por fim, o provimento do Recurso Especial, para reformar o acórdão recorrido. Decido. A irresignação não merece prosperar. Quanto à alegada ofensa aos arts. 165 e 458, II e III, do CPC, não há que se falar em negativa de prestação jurisdicional, de vez que o voto condutor do acórdão recorrido apreciou fundamentadamente, de modo coerente e completo, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida. Vale ressaltar, ainda, que não se pode confundir decisão contrária ao interesse da parte com ausência de fundamentação ou negativa de prestação jurisdicional. De fato, não está o juiz obrigado a rebater, pormenorizadamente, todas as questões trazidas pela parte, citando os dispositivos legais que esta entende pertinentes para a resolução da controvérsia. A negativa de prestação jurisdicional se configura apenas quando o Tribunal deixa de se manifestar sobre ponto que seria indubitavelmente necessário ao deslinde do litígio. [...]
[...] Nesse sentido, conheço do agravo para negar-lhe provimento. I. Brasília, 22 de junho de 2015. MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES Relatora
 ( STJ - AREsp: 718974 RJ 2015/0126525-7, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Publicação: DJ 01/07/2015)
Essa decisão proferida pelo STJ, foi o que podemos chamar de mais aceitável ao tentar consertar esse deslize do CDC. Ainda que o direito básico do Consumidor, seja violado nessa esfera (6°,VIII CDC), não seria aceita apenas a alegação de engano justificável, seria necessário que o fornecedor demandasse de provas para embazar seus argumentos. Ocorre que, existe uma enorme divergência entre as turmas do STJ, com isso, as decisões nos casos de cobranças indevidas, não se solidificam. 
Neste impasse, a jurisprudência do STJ por muito tempo se firmou no entendimento de que, a repetição do indébito será devida quando comprovado que o fornecedor agiu de má -fé, afastando assim, o entendimento de que seria necessário demandar com provas o engano para requer a exclusão da penalidade. 
RECURSO ESPECIAL N° 1032952/SP (2008/0037003-7)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: BANCO DE BENS S/A
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Consumidor e Processual. Ação de repetição de indébito. Cobrança indevida de valores. Inaplicabilidade do prazo prescricional do art. 27 do CDC. Incidência das normas relativas a prescrição insculpidas no Código Civil. Repetição em dobro. Impossibilidade. Não configuração de má-fé. - A incidência da regra de prescrição prevista no art. 27 do CDC tem como requisito essencial a formulação de pedido de reparação de danos causados por fato do produto ou do serviço, o que não ocorreu na espécie. - Ante à ausência de disposições no CDC acerca do prazo prescricional aplicável à prática comercial indevida de cobrança excessiva, é de rigor a aplicação das normas relativas a prescrição insculpidas no Código Civil. - O pedido de repetição de cobrança excessiva que teve início ainda sob a égide do CC/16 exige um exame de direito intertemporal, a fim de aferir a incidência ou não da regra de transição prevista no art. 2.028 do CC/02. - De acordo com este dispositivo, dois requisitos cumulativos devem estar presentes para viabilizar a incidência do prazo prescricional do CC/16: i) o prazo da lei anterior deve ter sido reduzido pelo CC/02; e ii) mais da metade do prazo estabelecido na lei revogada já deveria ter transcorrido no momento em que o CC/02 entrou em vigor, em 11 de janeiro de 2003. - Na presente hipótese, quando o CC/02 entrou em vigor já havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional previsto na lei antiga, motivo pelo qual incide o prazo prescricional vintenário do CC/16. - A jurisprudência das Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ é firme no sentido de que a repetição em dobro do indébito, sanção prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, pressupõe tanto a existência de pagamento indevido quanto a má-fé do credor. - Não reconhecida a má-fé da recorrida pelo Tribunal de origem, impõe-se que seja mantido o afastamento da referida sanção, sendo certo, ademais, que uma nova perquirição a respeito da existência ou não de má-fé da recorrida exigiria o reexame fático-probatório, inviável em recurso especial, nos termos da Súmula 07/STJ. Recurso especial parcialmente provido apenas para, afastando a incidência do prazo prescricional do art. 27 do CDC, determinar que a prescrição somente alcance a pretensão de repetição das parcelas pagas antes de 20 de abril de 1985.
(STJ - REsp: 1032952 SP 2008/0037003-7, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 17/03/2009, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: 20090326 --> DJe 26/03/2009)
Visualiza-se nessa decisão que um dos requisitos para interposição, é a indicação da má-fé, são inúmeras as decisões nesse sentido, todas exigindo comprovação da má-fé; o problema de se exigir que se prove a má-fé do fornecedor é que, além de não ser claro que o fornecedor que estar agindo conforme os bons costumes (pois, um dos princípios do Código de Defesa do Consumidor é o da inversão do ônus da prova, resguardado em seu art. 6° VIII “ a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova à seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.”), e não o consumidor, o que é fácil de ocorrer, pois o consumidor (vulnerável), infelizmente, nem sempre recebe as informações de forma clara e precisa, e por muitas vezes, ele acha que o dever de provar a má-fé e apresentar a documentação, e incumbência sua. Outro problema é que, ao exigir a comprovação da Má-fé, muda-se a característica do próprio CDC, uma a vez que a responsabilidade nesse caso, será subjetiva, devendo analisar dolo e culpa.
Nota – se que a exigibilidade da responsabilidade objetiva nos casos de repetição do indébito, burocratiza as ações nesse condão. Com as tecnologias de hoje em dia, toda má-fé arguida em instâncias judicial será rebatida por erro sistêmico, pois hoje em dia tudo é informatizado, o que é não quer dizer que as empresas (fornecedores) devem ter mecanismos de precaução. 
Neste sentindo, Felipe Braga Netto[footnoteRef:18] afirma que: [18: BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de direito do Consumidor : à luz da jurisprudência do STJ. 13° edição. Revista ampliada e atualizada. Salvador : Ed. JusPodivm. 2018.p. 377 e 378.] 
“A jurisprudência do STJ, ao longo das décadas, oscilou na interpretação doparágrafo único do art. 42 do CDC : a) uma tese simplesmente exige que o consumidor prove a má-fé do fornecedor na cobrança, para que a devolução em dobro ocorra; b) uma outra tese, um pouco mais sofisticada, sustenta que a prova do “engano justificável” seja feita pelo fornecedor, e não pelo consumidor. Essa última é a nossa posição, porém não foi ela que prevaleceu na jurisprudência. O STJ, após alguma oscilação, tem se posicionado no sentido da primeira tese. Nesse sentido, “a repetição do indébito prevista no art. 42, parágrafo único do CDC, somente é devida quando comprovada a má-fé do fornecedor; em não comprovada a má -fé, é devida a restituição simples. Precedentes do STJ”. (STJ. AgInt nos EDel no REsp 1.316.734. Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Dje 19/05/2017).
Como visto, nessa grande explanação, o último posicionamento do STJ, é no sentido de que a má-fé deve ser provada, e nesse sentido, a prova deve decorrer do fornecedor e do Consumidor; ainda citando Felipe Braga Netto: “convém registrar que a jurisprudência do STJ, em geral, nas últimas décadas, na interpretação das normas do CDC, realizou um belíssimo trabalho. Foi muito além da liberalidade do CDC. O parágrafo único do art. 42 no entanto, foi uma das poucas exceções. Foi um dos poucos casos em que a jurisprudência passou a exigir algo que a lei não exigia – a prova da má-fé -, impondo ainda que essa prova Seja realizada pelo Consumidor.” (Manual de direito do consumidor : à luz da jurisprudência do STJ . 13° edição. Revista ampliada e atualizada. Salvador: editora JusPodivm. 2018.p. 378).
Atualmente, depois de eu toda a jurisprudência já lançada sobre o tema, esta sólido que deve-se demonstrar a má-fé das empresas, sendo demonstrado pelo consumidor ou fornecedor, e, mais um requisito, que elucida uma outra grande discussão, o pagamento em dobro nas cobranças indevidas, só será concedido mediante a comprovação da má-fé do fornecedor e quando o consumidor tiver realizado o pagamento da cobrança indevida. Neste interim, solidificou que só será paga a dobra quando o consumidor já tiver realizado o pagamento da cobrança, afastando a aplicabilidade da punição ao simples ato de cobrança (ainda que sem o efeito pagamento). Vale ressaltar que é obrigatório estar presente os dois requisitos para um possível pagamento em dobro.
Ainda é grande a discussão sobre a temática, e ainda não há um posicionamento estável, exemplo disso, é que no dia 20 de Fevereiro de 2019, a 1° e 2° corte do STJ decidirá o rumo que a jurisprudência deve tomar no tocante ao pagamento em dobro das cobranças indevidas, no tocante da exigibilidade da má-fé. Após o voto do Ministro Hernan Benjamin, as turmas devem decidir se será ou não exigida a comprovação da má-fé. Na secessão em comento, o Ministro Herman votou em Embargos de Divergência, alegando que basta a culpa do credor para configurar a devolução em dobro, e não a comprovação da má-fé. Em plenário Hernan afirmou:[footnoteRef:19] [19: Processos EAREsp 664.888 – EAREsp 600.663 – EREsp 1413542 – EAREsp 676608 – EAREsp 622697. Fonte:m.migalhas.com.br – publicado em 20/02/2019. Acessado em 02/04/2019.] 
“exigir a comprovação doeria uma prova diabólica, um ataque frontal aos mais vulneráveis, pois são eles que sofrem com uma conta de luz ou telefone. (...) na linha de precedentes do STJ, a responsabilidade do estado é objetiva, e as concessionárias respondem objetivamente. (...) se a regra da responsabilidade civil objetiva impera em todas as relações do Estado, como admitir que nas relações de consumo, em que o próprio CDC estabelece uma condição de vulnerabilidade absoluta, vamos dizer que só nessa parte não será objetiva e será subjetiva?”
Ministro Herman Benjamin – sessão plenária do dia 20/02/2019. Pauta de Julgamento no°08/2019.[footnoteRef:20] [20: Embargos de Declaração na prestação de contas n°0601131-.2018.6.20.0000. ] 
Resta, como já fora observado, aguardar a decisão do STJ em que analisará o embargo imposto e, quem sabe, decisão tornará pacíficas as decisões em relação a repetição do indébito, demonstrando ou não a exigibilidade de comprovação da má-fé do fornecedor. Até que esse momento chegue, a aplicação nesses casos, será conforme a jurisprudência atual, sendo indispensável os requisitos apresentados, sendo, a má-fé e o efetivo pagamento da cobrança indevida, sendo ainda que, a comprovação da má-fé é encargo do fornecedor e Consumidor. 
6 CONCLUSÃO 
	
	Diante do exposto, é notório que o código de defesa do consumidor veio para inovar o ordenamento jurídico e, preencher as lacunas que o direito privado deixou quando se trata de direitos sociais. A formação do Código de Defesa do Consumidor é de se admirar, resguardado Constitucionalmente como direito fundamental e devendo ser garantidos por todos os entes federados, garante a importância que realmente se tem as relações consumeristas. 
	Como podemos analisar, o Consumidor é considerado pelo CDC vulnerável nas relações de consumo, isso decorre da disparidade que existe entre o consumidor e os fornecedores de produtos e serviços, e para deixar essa relação mais equilibradas, foram elaborados vários princípios para proteger a vulnerabilidade do consumidor. As demandas consumeristas aumentam cada dia mais, com todo o avanço tecnológico, e inevitável que o consumo aumente grandemente, e com ele, aumenta – se também, os riscos de erros, vícios e cobranças indevidas.
Na atualidade, os princípios garantidores da vulnerabilidade do Consumidor, estão sendo flexibilizados para corresponder a realidade dos fornecedores. É garantido ao consumidor pelo art. 6°, VI, que os danos causados em cunho patrimonial ou moral, é passível de reparação; ocorre que, todos os dias um consumidor é cobrado indevidamente, no art. 42, parágrafo único, encontramos a previsão que, quando o consumidor for cobrado indevidamente, o valor cobrado deverá ser restituído na modalidade dobrada (previsão essa também existente no código civil em seu art. 940), contudo o legislador pontua uma exceção à essa penalidade, e é neste ponto que encontramos problemas. 
O que vem acontecendo na jurisprudência é uma grande falta de comprometimento com os direitos do consumidor, ao tentar aplicar o engano justificável nas demandas, estão criando uma mutação jurisprudencial, pois, transformaram uma lei que a principio era regida pela responsabilidade objetiva, agora, em algumas partes (as que convém) aplica-se a responsabilidade subjetiva. O CDC é todo pautado na responsabilidade objetiva, mas somente o parágrafo único do art. 42 deve ser tratado com responsabilidade subjetiva. Ao exigir que o consumidor demonstre documentalmente a má-fé do fornecedor em realizar cobranças indevidas, além de ferir o direito básico de ser reparado por danos causados, fere a vulnerabilidade do Consumidor e também o direito constitucional de inversão do ônus da prova, uma vez que, quem deve demandar de provas é o fornecedor, e não o consumidor.
As jurisprudência atual sobre as cobranças indevidas, desestimula os consumidores a pleitear as devidas reparações, uma vez que limitam o acesso a justiça e retira o status de vulnerável do Consumidor. Ao concluir que as cobranças indevidas só serão restituídas na modalidade dobrada, se comprovada a má-fé do fornecedor, estimula que as empresas continuem com as mesmas práticas abusivas e cria um efeito de impunidade para esse ato.
O STJ deve solidificar as opiniões sobre a repetição dos indébito será de forma que sua decisão Seja justa para os consumidores e pedagógica para os fornecedores. A corrente que deveria ser seguida é aquela em que o fornecedor apresente documentos que comprovem o engano justificável, e que só assim, após a análise do magistrado, é que se decida aplicar ou não, a repetição, esse posicionamento seria justo com o CDC, bem como com o consumidor, pois uma vez que recai o ônus da prova para o consumidor, a função social do CDC, cai por terra.
	
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