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ECOLOGIA DE SISTEMAS AULA 3 Prof.a Tânia Zaleski 2 CONVERSA INICIAL A existência e a persistência de espécies de animais e vegetais no planeta estão diretamente relacionadas às chances individuais de produção de descendentes férteis. Reproduzir com sucesso é a meta de cada indivíduo e o parâmetro que mede seu desempenho entre os outros indivíduos de sua espécie. Sobreviver o suficiente para reproduzir com sucesso é uma condição sine qua non. É, também, o problema central enfrentado, evolutivamente, por qualquer espécie de organização simples ou complexa, vivente ou extinta. Mas qual é chave para superar esse problema? Qual é a fórmula para persistir neste planeta ao longo de milhares e milhões de anos, como algumas espécies tem conseguido? Não há uma resposta simples para estas questões. Sabe-se que cada organismo vivo apresenta um conjunto próprio de características que - possibilitam uma elevada chance de deixar descendentes. Ou seja, uma chance individual que, no contexto coletivo ou populacional, define as taxas de renovação das gerações de indivíduos e a continuidade das populações, bem como da própria espécie. Este conjunto de características inclui elementos básicos que determinam a “história da vida” de um indivíduo e que os cientistas chamam de Bionomia. São considerados elementos que definem como um indivíduo nasce, quanto cresce, quanto vive, quando e quanto reproduz, quando morre. Elementos que interagem entre si e com os componentes bióticos e abióticos do ambiente, cujo resultado é a sobrevivência de descendentes que, por sua vez, terão “histórias” muito similares. Esta é o nosso assunto para a aula de hoje, não deixe de acompanhar mais detalhes nos vídeos. TEMA 1: INTERAÇÕES ENTRE ATRIBUTOS DAS POPULAÇÕES E AS VARIAÇÕES DE AMBIENTE Sabe-se que a diversidade de histórias de vida é quase tão grande quanto a de espécies conhecidas. Há organismos que vivem centenas de anos e outros que vivem minutos. Já outros organismos produzem milhões de potenciais descendentes e organismos que investem todo o esforço na sobrevivência de 3 um único; são incontáveis soluções para um problema comum. Conhecer estes mecanismos, é desvendar a evolução das histórias de vida, compreender a diversidade natural atual, a história das extinções e prever as chances das populações, espécies e linhagens evolutivas de persistirem futuro, frente à transformação dinâmica do meio ambiente, inclusive aquelas induzidas pelo homem. Pense na sua história de vida, ou seja, tudo o que você já fez, até o dia de hoje, desde seu nascimento. Todos os acontecimentos, todas as suas escolhas e todas as suas renúncias definem o que você é hoje e como será seu sucesso biológico (ou seja, seu sucesso reprodutivo). As histórias de vida, de uma forma geral, podem ser descritas pela alocação de energia, investimento na reprodução, início da maturidade, número de episódios reprodutivos, número e tamanho das proles e longevidade. As histórias de vida são moldadas pelos tipos de corpos e estilos de vida e as respostas evolutivas a fatores vivos e ambientais, como as condições físicas, a fonte alimentar, relação com predadores, parasitas, entre outros. A combinação dos eventos sequenciais determinados geneticamente e a sua interação com condicionantes ambientais atuais são alvo da seleção natural. Assim, as histórias de vida, inclusive a sua, é um eterno e constante trade-off, ou seja, um conflito de escolhas. Vamos ver um pouquinho mais sobre cada um destes conflitos no nosso próximo tópico, a reprodução versus o crescimento. TEMA 2: TRADE-OFF: REPRODUZIR OU CRESCER O trade-off, entre reproduzir-se ou crescer, determina que os organismos não podem, ao mesmo tempo, ser extremamente eficientes no crescimento e fazer um investimento máximo em reprodução. Isto ocorre porque o bom desempenho em relação a uma função implica em prejuízo em relação a uma outra função. A energia obtida por um organismo é destinada ao seu crescimento, considerando-se que crescimento envolve a energia obtida por meio da alimentação, subtraída da energia utilizada para manutenção das funções metabólicas e do que é eliminado em forma de excretas. O débito de energia deste processo será dividido entre crescimento somático (corresponde ao aumento do tamanho corporal) e reprodutivo (refere-se ao investimento no desenvolvimento e capacitação das estruturas reprodutivas). Como a 4 fecundidade é um fator diretamente dependente do tamanho corporal nas espécies com crescimento indeterminado (plantas, peixes, repteis), quanto maior o tamanho da fêmea, mais ovos ela irá produzir. Assim, se um ano o investimento em ovos for grande, o ano seguinte será marcado por uma redução no crescimento, reduzindo a fecundidade nos anos subsequentes. Logicamente este trade-off é dependente de outros atributos do organismo, como, por exemplo, a expectativa de vida; para organismos com vida longa, o maior investimento no crescimento deve ser privilegiado em relação ao investimento sobre a fecundidade, a cada ano. De forma inversa, espécies com pequenas chances de sobrevivência, por longos anos, devem evitar alocar grande quantidade de recursos para o crescimento, aproveitando sua potencial fecundidade na juventude. Utilizando-se de estratégias distintas, as espécies obterão o melhor ajuste, determinado pelo número de descendentes, capazes de se reproduzirem, que forem gerados. Outro conflito de escolhas semelhante ao acima apresentado diz respeito ao quando reproduzir: Reprodução atual ou futura? Vejamos em mais detalhes. TEMA 3: TRADE-OFF: REPRODUÇÃO ATUAL OU REPRODUÇÃO FUTURA Qual estratégia você considera biologicamente mais vantajosa? Iniciar a vida reprodutiva mais cedo e garantir ter o maior número de descendentes possíveis? Ou adquirir maior tamanho e mais experiência, garantindo, assim, uma prole de menor tamanho, porém mais resistente e com maiores chances de sobrevivência? Enquanto o investimento na sobrevivência garante a continuidade genética, consome tempo e recurso dos pais, reduzindo sua sobrevivência; criar filhotes, canaliza os recursos de um pai, fazendo com que ele produza menos filhotes no futuro (Ricklefs, 2003). É a respeito desse trade-off que trataremos agora. Uma história de vida otimizada é aquela que resolve os conflitos entre necessidades competidoras de sobrevivência e reprodução para o máximo de vantagens do indivíduo (Ricklefs, 2003). Imagine duas ninhadas de uma determinada espécie de ave, a primeira delas com 5 filhotes e a segunda com 3 filhotes. Você pode imaginar que a primeira terá um maior sucesso pois os pais garantiram um maior número de descendentes. Mas, considere a seguinte situação, um maior número de filhotes, implica em competição entre os irmãos, maior esforço, desgaste e risco dos pais para buscar alimentos aos seus filhotes. Assim, uma ninhada maior pode resultar 5 num maior sucesso reprodutivo, mas impõe um custo aos pais na forma de ninhadas futuras menores ou sobrevivência diminuída (Ricklefs, 2003). A variação das espécies entre os atributos de frequência de reprodução, número de filhotes por evento reprodutivo e idade da primeira maturação, ilustram as diferenças encontradas pelos organismos para resolver o conflito de demanda entre fecundidade, crescimento e sobrevivência, ou seja, reprodução atual ou futura. TEMA 4: TRADE-OFF: SEMELPARIDADE X ITEROPARIDADE A reprodução é um dos aspectos mais importantes da história natural dos seres vivos. É por meio dela que uma espécie permanece na história evolutiva e possibilita as variações nos animais, fazendo uso de recombinações e mutações. Em muitas espécies, este é o objetivo final de sua existência, tendo em vista de que morrem logo após a reprodução, possuindo um únicoevento reprodutivo ao longo da vida, estratégia reprodutiva conhecida como semelparidade. Já os organismos que apresentam vários períodos reprodutivos ao longo da vida são os iteróparos. A semelparidade é um evento mais comum em animais que apresentam vida curta. Estas espécies utilizam seus recursos, ao longo da vida, para crescerem, escaparem de predadores e, ao final da vida, investem todo seu recurso na reprodução. Em plantas são conhecidos os casos de agaves (plantas suculentas, algumas espécies utilizadas com fins ornamentais e outras na produção da tequila) e bambus. Estes dois grupos apresentam histórias de vida bem distintas. Os bambus são plantas ocorrentes em regiões de climas temperados quentes ou tropicais, formando aglomerações em ambientes perturbados. Após se estabelecerem em uma determinada área, reproduzem-se por crescimento vegetativo (reprodução assexuada) até atingirem um limite de expansão, quando lança mão da reprodução sexuada, por meio de sementes, o que possibilita colonizar novas áreas. A reprodução sexuada dependente de condições específicas de luz e umidade e ocorre de forma sincrônica, o que facilita a fertilização pelo vento e garante a produção de um grande número de sementes, possibilitando a permanência de exemplares, mesmo em caso de predação. Já os agaves ocorrem em climas áridos, com chuvas esparsas e ocasionais. Os agaves têm raízes curtas e fibrosas e coletam a água que percola 6 nas camadas de superfície do solo, após as chuvas. Nos períodos de seca, esta espécie passa por uma grande variação de umidade. Ambientes altamente variáveis, como nestes casos, favorecem a estratégia de semelparidade, tendo em vista de que a planta pode investir toda sua energia para se reproduzir num ano favorável. Os recursos armazenados serão utilizados para o grande evento reprodutivo em um “bom ano”. Em animais, um caso clássico desta estratégia ocorre com o salmão, quando as fêmeas convertem grande parte de sua massa corporal em ovos, e os machos utilizam sua energia lutando e fazendo corte às fêmeas. Esta espécie, ainda, realiza uma grande migração, rio acima, para chegar às suas áreas de reprodução. Como o custo é excessivamente elevado, é mais vantajoso realizar esta tarefa uma única vez e garantir o maior número de descendentes possíveis. De uma forma geral, a semelparidade parece surgir: quando a preparação para reprodução é muito custosa; em espécies que executam longas migrações para suas áreas de reprodução; quando o preço da reprodução é altamente variável e dependente de condições ambientais favoráveis. TEMA 5: TRADE-OFF: CRESCIMENTO X FECUNDIDADE O último trade-off que trataremos em nossa aula diz respeito ao compromisso entre fecundidade e crescimento. Muitas plantas, invertebrados, peixes, répteis e anfíbios não possuem um tamanho adulto definido, denominado crescimento indeterminado. Nestes organismos, a taxa de crescimento é mantida ao longo da vida, apresentando um decréscimo quando atingem a vida adulta. Para estas espécies, o tamanho corporal determina a fecundidade, por se tratar de um corpo maior, o qual suporta um maior número de ovos. A energia necessária para produzir os ovos possui a mesma origem da energia para investir em crescimento. Assim, uma fecundidade aumentada, em um determinado ano, refletirá em crescimento reduzido nos anos subsequentes. Considere o seguinte experimento realizado com peixes da espécie Poecilia reticulata, ocorrente em córregos na região de Trindad. Nas partes baixas do córrego, a espécie convive com espécies de predadores, em especial, predação realizada sobre os filhotes de Poecilia. Nas regiões mais altas do rio, somente Poecilia está presente, seus predadores não conseguem chegar. Pense um 7 pouco como você acha que será o padrão de tamanho e maturidade das populações de Poecilia, nos córregos nas partes baixas e nas partes altas? Nos locais onde a espécie é submetida a uma alta taxa de predação (partes baixas do córrego), os machos amadurecem antes e, consequentemente, atingem menores tamanhos; da mesma forma, as fêmeas investem na reprodução em detrimento ao investimento em crescimento. O oposto é observado nas partes altas, ausentes de predação, nas quais as fêmeas podem investir mais em crescimento e comportar maior número de ovos, futuramente. Os filhotes das regiões com maior predação são menores e mais abundantes em relação aos das partes mais altas. Considerando as ações humanas, em ambientes naturais, podemos identificar exemplos de forças de seleção. Por exemplo, pescarias comerciais tendem a retirar os indivíduos mais velhos e de maior tamanho de uma população, selecionando, assim, uma maturidade mais precoce. Uma alta mortalidade de adultos reduz o valor da reprodução futura e seleciona para um investimento na reprodução presente, em detrimento ao crescimento. NA PRÁTICA Neste exemplo prático, focamos o valor de uma área de alimentação. Toda a atividade de forrageamento inclui um risco de mortalidade. Assim, ao escolher uma área de alimentação, os animais devem considerar a qualidade do alimento e a segurança relativa deste ambiente. A escolha entre qualidade de alimentação e o risco de predação é conhecida como estratégia de forrageamento sensível ao risco. SÍNTESE Nesta aula, examinamos como os atributos das histórias de vida determinam sucesso ou fracasso reprodutivo. Vimos, também, que os indivíduos, a todo momento, estão fazendo escolhas a fim de maximizar o ajustamento da duração de vida e reprodução. Os principais atributos de vida incluem idade de maturidade, parição, fecundidade e longevidade que são dependentes das condições ambientais. 8 REFERÊNCIAS BEGON, M.; TOWSNEND, C. R.; HARPER, J. L. Ecologia: de indivíduos a ecossistemas. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. ODUM, E.P. & BARRETT, G. W. Fundamentos de Ecologia. 5. ed. São Paulo: Thomson. Learning, 2007. RICKLEFS, R.E. A economia da natureza. 5. ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2003. 503p.
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