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UM ESTUDO DIAGNÓSTICO SOBRE AS DIFCULDADES EM MATRIZES Maria Alice de Vasconcelos Feio Messias Pedro Franco de Sá Rubens Vilhena Fonseca Universidade do Estado do Pará alice.messias@gmail.com psa@digi.com.br rubens.vilhena@gmail.com 1. Introdução A dificuldade em aprender matemática tornou-se motivo de constantes discussões em meio à comunidade científica. Isso porque, o baixo desempenho dos alunos - apesar de se estender pelas diversas disciplinas - apresenta-se em matemática de forma ainda mais preocupante. Essa dificuldade tem sua origem nas séries iniciais e se estende até o segmento superior de ensino. Mas, afinal, por que desempenhos tão baixos na disciplina? Muitos estudiosos acreditam que o ensino repleto de conservadorismo é um fator relevante, já que os professores ensinam a partir de definições e exercícios de fixação, técnica respaldada pela maioria dos livros didáticos. Segundo autores como Sanches (2002), D’Ambrósio (1999) e Coll (apud Sanches, 2002), para obter uma aprendizagem mais significativa de matemática, é necessário que saibamos manipular a natureza dos conteúdos matemáticos. Sanches (2002) ressalta a importância do conhecimento expressivo de conceitos, princípios, procedimentos e estratégias para resolver problemas, do desenvolvimento de competências e habilidades e da relação da matemática com outras áreas de conhecimento, entre outras. D’Ambrósio (1999) destaca a importância de recuperar a presença de idéias matemáticas em todas as ações humanas devido à necessidade de descobrir que há uma forma matemática de estar no mundo. Coll (2000) apud Sanches (2002) afirma que: “(...) os conteúdos são elementos altamente relevante, já que constituem o eixo em torno do qual se estruturam as relações mútuas entre professores e alunos e são os elementos cultural mediador do desenvolvimento e da aprendizagem (...)” 2 Ao considerarmos o processo de ensino-aprendizagem em álgebra, percebemos que o tradicionalismo em meio ao uso abusivo de simbologias matemáticas em problemas algébricos é um dos principais responsáveis (senão o maior) pela descrença de que os conteúdos matemáticos possam de alguma forma, auxiliar indivíduos em circunstâncias cotidianas. No que concerne ao processo de ensino-aprendizagem de matrizes, podemos inferir que este se caracteriza pela utilização de regras que, de um modo geral, apresentam-se completamente desvinculadas da realidade dos alunos. Para Sanches (2002, p.6) o ensino de matrizes apresenta-se em “total descompasso com os avanços tecnológicos e com os estudos já realizados pela Psicologia Educacional”. Percebemos ainda, que poucos são os livros didáticos adequados para auxiliar o ensino de matemática, particularmente de matrizes, dado que muitos apresentam confusões conceituais, linguagem inadequada, raras contextualizações e exercícios repetitivos, o que prejudica o desenvolvimento do raciocínio lógico-matemático dos educandos. Considerando a importância de uma aprendizagem mais significativa de matemática e centrando o foco do estudo no conceito e operações básicas com matrizes, propusemo-nos a realizar uma pesquisa que visou responder duas questões centrais: Qual o procedimento mais adotado para ensinar matrizes? Quais as principais dificuldades apresentadas pelos alunos ao resolver questões referentes a matrizes? 2. Metodologia A amostra desta pesquisa contou com a participação de 109 universitários – 22 do 1º ano do curso de licenciatura em matemática da Universidade do Estado do Pará (UEPA) - 31 do 1º ano o curso de bacharelado em sistema de informação e 56 do 1º ano do curso de bacharelado em ciência da computação, ambos do Centro Universitário do Pará (CESUPA). A aplicação dos questionários foi realizada no período de 5 à 15 de Novembro de 2006. Optamos pelos alunos dos cursos citados acima devido ao fato deles terem estudado o assunto matrizes no ano anterior (3º ano do ensino médio) e porque o estudo de matrizes é muito importante para álgebra linear, disciplina estudada ao longo dos três cursos. 3 A pesquisa foi realizada por meio das seguintes etapas: levantamento bibliográfico, formulação de protocolos de pesquisa, aplicação dos protocolos e sistematização dos resultados. A primeira etapa consistiu na realização de um levantamento bibliográfico com o intuito de (re) conhecer estudos voltados para o processo de ensino – aprendizagem em matemática. Nesse sentido, destacamos estudos como os de Lopes (2000) e Sanches (2002). A segunda etapa consistiu na formulação de protocolos de pesquisa a partir do referencial teórico e de nossa experiência na prática docente. O protocolo apresentava 9 itens (5 de cunho pessoal e 4 de cunho específico, em que foram propostas algumas questões referentes ao assunto). A quarta etapa consistiu na sistematização dos resultados que foram dispostos em quadros e gráficos que serão apresentados em tópicos posteriores. 3. Sistematização dos resultados Houve predominância de alunos do sexo masculino, com 79,81% e o restante (20,19%), do sexo feminino. A média de idade desses alunos era de 19 anos. Quanto à formação, a maioria dos alunos afirmou ter concluído o ensino médio em escola particular (68,8%), sendo que 85,32% dos alunos estudaram matrizes na 3ª série do ensino médio, como podemos verificar nos gráficos 1 e 2, respectivamente. Gráfico 1: Tipo de Escola 68,80% 31,20% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% Escola P o r c e n ta g e m Escola Particular Escola Pública Fonte: Pesquisa de campo, 2006. 4 Gráfico 2: Série que estudou matrizes 1,84% 12,84% 85,32% 0,00% 20,00% 40,00% 60,00% 80,00% 100,00% Série P o r c e n ta g e m 1º ano de ensino médio 2º ano do ensino médio 3º ano do ensino médio Fonte: Pesquisa de campo, 2006. No que concerne à dificuldade em matrizes, mais da metade dos alunos afirmou que matrizes não é um assunto fácil, como podemos perceber no gráfico abaixo: Gráfico 3: Classificação do assunto 58,71% 41,29% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% Matrizes P o rc en ta g em Difícil Fácil Fonte: Pesquisa de campo, 2006. No que se refere ao domínio ou lembrança dos conteúdos relacionados ao assunto, verificamos que poucos alunos acreditam, de fato, ter domínio acerca dos tópicos destacados, apesar de a maioria deles ter estudado os assuntos no ano anterior (3º ano do ensino médio). Alguns alunos não marcaram nenhuma das alternativas apresentadas. Dessa forma, consideramos que eles sequer lembraram ter estudado os tópicos. Os dados referentes a este item estão destacados no gráfico abaixo: 5 Gráfico 4: Conhecimento de matrizes 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% 100,00% D ef . m at riz es Re pr es . G en ér ic a M at riz q ua dr . M at riz tr ia ng . M at riz d ia g. M at riz id en t. M at riz n ul a M at riz tr an sp . M at riz in ve rs a Ig ua ld . d e m at riz es A di çã o de m at riz es M ul tip p / n º r ea l Pr od . e nt re m at riz . Eq ua ç. M at ric ia is D et er m in an te Lembro ter estudado Acredito ter domínio Fonte: pesquisa de campo, 2006. Quanto à metodologia utilizada no ensino de matrizes, os alunos tiveram a oportunidade de optar pela alternativa que melhor descrevia a metodologia utilizada pelos professores ao ensinar o conteúdo. A maioria dos alunos afirmou que o assunto fora apresentado partindo da definição, seguindo de exemplos, propriedades e exercícios. Os dados referentes a este item se encontram no gráfico abaixo: Gráfico 5: Metodologia aplicada 89,90% 2,75% 7,30% 0,05% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% 100,00% Matrizes P o r c e n ta g e m Definição-Exemplos- Exercícios Situação-problema - Formalizar Modelando situações reais Outras possibilidades Fonte: Pesquisa de campo, 2006. Diante do gráfico 5, percebemos que o assunto (matrizes) foi abordado de maneira tradicional, isto é, explorando o rigor e abstração da matemática. No item que os alunos deveriam optar pela alternativa que melhor definia uma matriz, propusemos as seguintes definições: a) “Denomina-se uma matriz uma tabela retangular com números reais em que é possível calcular valores das diagonais e do determinante.” 6 b) “Matriz é um conjunto de linhas e colunas mxn dispostas de tal forma que o sistema formado por elas seja homogêneo.” c) “Denomina-se uma matriz mxn uma tabela retangular formada por mxn números reais, dispostos em m linhas e n colunas.” d) “Denomina-se matriz mxn os elementos retangulares aij dispostos em m colunas e n linhas.” e) “Matriz é um conjunto do tipo mxn em que cada resultado é obtido operando os elementos das m linhas com os elementos da n colunas correspondentes.” A resposta mais coerente seria a da alternativa “c”. Entretanto, como podemos constatar no gráfico abaixo, a maioria dos alunos optou por outras alternativas. Gráfico 6: Definição de matrizes 2,75% 15,59%14,67% 44,03% 22,93% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% 40,00% 45,00% 50,00% Matrizes P o r c e n ta g e m Definição a Definição b Definição c Definição d Definição e Fonte: Pesquisa de campo, 2006. Verificamos anteriormente que pouco mais de 12% dos alunos acreditavam ter domínio acerca da definição de matrizes (gráfico 4). No gráfico acima obtivemos a confirmação deste fato, já que apenas 14,67% dos alunos assinalaram a alternativa correta. A dificuldade em definir “matrizes” pode ser um reflexo da forma como os conceitos são, normalmente, apresentados aos alunos que atuam como seres passíveis no processo de aprendizagem e cujos conceitos naturais são previamente ignorados. No item 9 do protocolo de pesquisa apresentamos as matrizes A e B destacadas abaixo: 8 0 A = 3 2 5 3 3 1 5 B = 2 6 3 7 Posteriormente, os alunos deveriam resolver as operações que lhes eram propostas a partir das matrizes A e B. Para facilitar a visualização dos resultados, dividimos o item 9 em três subitens (adição de matrizes, produto entre matrizes e cálculo de determinante). 3.1. Adição de matrizes Os alunos deveriam resolver A+B e, posteriormente, assinalar a alternativa correta. As alternativas propostas foram as seguintes: a) 8 0 5 4 8 b) 3 9 5 19 16 15 3 c) 3 9 5 1 4 3 3 d) 3 9 5 16 19 3 5 e) 3 8 5 2 19 9 5 A resposta mais coerente seria a da alternativa “b”. A maioria dos alunos assinalou a alternativa correta, como podemos visualizar no gráfico abaixo: Gráfico 7: Adição de matrizes 1,85% 79,81% 9,17% 2,75% 6,42% 0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00% Adição de matrizes P o r c e n ta g e m Alternativa a Alternativa b Alternativa c Alternativa d Alternativa e Fonte: Pesquisa de campo, 2006. Os dados referentes à questão acima mostrou que a grande maioria dos alunos não apresenta dificuldade quando se depara com itens relacionados à adição de matrizes. 3.2. Produto entre matrizes Os alunos deveriam resolver AxB e, posteriormente, assinalar a alternativa correta. As alternativas propostas foram as seguintes: 8 a) 8 0 2 4 5 b) 9 8 25 4 18 9 5 c) 24 8 5 47 59 45 25 d) 24 8 5 47 109 45 25 e) 4 8 5 7 9 45 25 A resposta mais coerente seria a da alternativa “d”. No entanto, como podemos perceber no gráfico abaixo, a maioria dos alunos optou por outras alternativas: Gráfico 8: Produto entre matrizes 41,28% 0% 7,33% 34,88% 16,51% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% 40,00% 45,00% Produto entre matrizes P o r c e n ta g e m Alternativa a Alternativa b Alternativa c Alternativa d Alternativa e Fonte: Pesquisa de campo, 2006. Apesar de mais de 30% dos alunos terem assinalado a resposta correta, os dados da questão acima ainda são preocupantes, pois um total de 65,12% optou por outras alternativas. Portanto, os alunos apresentam dificuldades no que concerne à resolução de itens relacionados ao produto entre matrizes. Os alunos confundem as operações com matrizes, principalmente o produto entre matrizes, porque muitos não analisam o número de linhas e colunas das matrizes – para verificar se há ou não possibilidade de resolver a operação – nem os artifícios para multiplicar os elementos das linhas e colunas (elementos da 1ª linha da matriz A com os elementos da 1ª coluna da matriz B e assim sucessivamente). 3.3. Cálculo de determinante 9 Os alunos deveriam efetuar o cálculo do determinante da matriz B e, posteriormente, assinalar a alternativa correta. As alternativas propostas foram as seguintes: a) 6 5 b) 58 25 c) – 6 d) 28 5 e) 8 5 A resposta mais coerente seria a da alternativa “d”. Entretanto, como podemos perceber no gráfico abaixo, alguns alunos optaram por outras alternativas. Gráfico 9: Cálculo de determinante 10,09% 4,58% 38,53% 35,80% 11% 0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% 40,00% 45,00% determinante P o r c e n ta g e m Alternativa a Alternativa b Alternativa c Alternativa d Alternativa e Fonte: protocolo de pesquisa, 2006. Mais de 35% dos alunos assinalaram a alternativa correta, mas é importante destacar que um total de 64,2% optou por outras alternativas. Logo, a maioria apresenta dificuldade na resolução de questões que envolvam o cálculo de determinante, pois possivelmente, não estavam atentos para o “jogo de sinal” no decorrer da resolução da questão ou não lembravam como realizar o cálculo de determinante, já que apenas 22,93% dos alunos afirmaram ter domínio do assunto (gráfico 4). 4. Considerações Finais Os resultados obtidos nesta pesquisa nos subsidiaram a responder as questões propostas inicialmente (Qual o procedimento mais adotado para ensinar matrizes? Quais as principais dificuldades apresentadas pelos alunos ao resolver questões referentes a matrizes?). Em resposta à primeira questão detectamos que o procedimento adotado pelos professores para ensinar matrizes foi desenvolvido em meio a uma abordagem que se inicia com definição, seguindo de exemplos, propriedades e exercícios. Isto confirma a predominância do ensino de matrizes por meio de uma metodologia tradicional. 10 Em resposta à segunda questão, percebemos que muitos alunos apresentam dificuldades no que se refere ao conceito e resolução de operações com matrizes, principalmente o produto entre matrizes e cálculo de determinante. Os resultados também deixam claro que os estudantes chegam ao nível superior de ensino com significativas dificuldades em matemática. Essas dificuldades refletem a necessidade de novas metodologias para o ensino da disciplina em todos os níveis de ensino. O que fazer para melhorar esta situação? Acreditamos que se torna importante que os docentes encontrem novas alternativas para ensinar matemática e é nesse contexto que se encaixa a proposta de resolução de problemas. Ao resolver um problema, o alunonão “constrói um conceito, mas um campo de conceitos que tomam sentido num campo de problemas” (SÁ, p.66, 2005) e por isso, acreditamos, assim como Onuchic e Allevato (2005, p.230), que esta “metodologia pode contribuir sobremaneira para uma aprendizagem mais efetiva da disciplina”. É claro que para que isso ocorra, o professor deve avaliar a realidade da sala de aula para que ele se certifique de qual seria a melhor decisão a ser tomada. Além disso, é necessário um estudo mais profundo no que concerne ao ensino de matrizes para que este se torne ainda mais agradável e eficaz. 5. Referências D’AMBRÓSIO, Ubiratan. A história da matemática: Questões historiográficas e políticas e reflexos na educação matemática. In: Pesquisa em educação matemática: concepções e perspectivas. São Paulo: Ed. UNESP, 1999, p.97 – 115. LOPES, J.A. Livro didático: concepção, seleção e possibilidades frente a descritores de análise e tendências em educação matemática. Tese (Doutorado em educação matemática) UNICAMP, Campinas (SP), 2000. ONUCHIC, L.R; ALLEVATO, N.S.G. Novas reflexões sobre o ensino-aprendizagem de matemática através da resolução de problemas. In: Educação matemática pesquisa em movimento. São Paulo, Cortez, 2005, p.213-231. SÁ, P. F. A resolução de problemas: Concepções e sugestões para aulas de matemática. In: Traços. Belém, v.7, n.16, p.61-78, 2005. 11 SANCHES, M.H.F. Efeitos de uma estratégia diferenciada dos conceitos de matrizes. Dissertação (Mestrado em educação matemática) UNICAMP, São Paulo, 2002.
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