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A infância e a marginalizaçao em capitaes de areia

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E LETRAS 
COORDENAÇÃO DO CURSO LICENC. PLENA EM LETRAS/PORTUGUÊS 
 
 
 
 
 
 
PAULA FERNANDA DA SILVA SOUSA 
 
 
 
 
 
 
INFÂNCIA E MARGINALIZAÇÃO EM CAPITÃES DA AREIA, DE JORGE AMADO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AMARANTE - PI 
2014 
 
 
PAULA FERNANDA DA SILVA SOUSA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
INFÂNCIA E MARGINALIZAÇÃO EM CAPITÃES DA AREIA, DE JORGE AMADO 
 
 
 
Monografia apresentada ao curso de 
Licenciatura Plena em Letras/Português 
da Universidade Estadual do Piauí, como 
requisito obrigatório para a obtenção do 
grau de Licenciada em Letras/Português. 
 
Orientador: Prof. Me. Dheiky do Rêgo 
Monteiro Rocha. 
 
 
 
 
 
 
AMARANTE - PI 
2014 
 
 
PAULA FERNANDA DA SILVA SOUSA 
 
 
 
 
INFÂNCIA E MARGINALIZAÇÃO EM CAPITÃES DA AREIA, DE JORGE AMADO 
 
 
Monografia apresentada ao curso de 
Licenciatura Plena em Letras/Português 
da Universidade Estadual do Piauí, como 
requisito obrigatório para a obtenção do 
grau de Licenciada em Letras/Português. 
 
 
 
 
 
Aprovada em: ____ de ________________ de _______. 
 
 
 
 
Banca Examinadora: 
 
_________________________________________________ 
Prof. Me. Dheiky do Rêgo Monteiro Rocha – UESPI 
Presidente 
 
_________________________________________________ 
Profa. Dra. Maria do Socorro Rios Magalhães – UESPI 
Primeira Examinadora 
 
__________________________________________________ 
Profa. Me. Soraya de Melo Barbosa Sousa – UESPI 
Segunda Examinadora 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
À minha família, pelo eterno apoio. 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
A Deus, primeiramente, pela força, saúde, sabedoria e coragem para atingir 
os objetivos aos quais me propus. 
A toda equipe de docentes que constituíram o curso de Licenciatura Plena em 
Letras Português da Universidade Estadual do Piauí – UESPI, especialmente ao 
meu orientador Prof. Me. Dheiky do Rêgo Monteiro Rocha, pelo apoio, dedicação 
e disponibilidade com que acompanhou a elaboração deste trabalho. 
Ao meu querido esposo Francisco de Assis de Sousa, pelo apoio e 
incentivo durante a realização do curso e pelos conselhos para que eu não 
desistisse. 
A minha mãe Maria da Paz da Silva, meus avos: Maria de Jesus e Agripino 
Caridade, aos meus irmãos: Katia Maria, Viviane Patrícia, Lis Rayane e Paulo 
Henrique que sempre acreditaram que eu era capaz. 
Aos colegas de curso pelos momentos que compartilhamos juntos, muitos 
deles, felizes e outros tristes, mas o que fica são as boas lembranças, em especial a 
Jane dos Santos silva pelo apoio no decorrer da elaboração desse trabalho. Ao 
meu colega Claudionor Ramalho Santana, pelas dicas. 
E a todas as pessoas que, direta e indiretamente, cooperaram para a 
concretização deste trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
[...] Guerreiros, sonhadores aventureiros, deslocados das semelhanças sociais, 
insensatos, metamorfoseados, pela sua sensibilidade e pelo seu sonho, em 
demônios, para uns, e em deuses, para outros. Como gente, porém, não passam de 
Guerreiros, livres lutadores que encaram o desafio permanente de sustentar, com 
fortaleza, a fragilidade do seu sonho, sozinhos na margem esquerda da ordem 
vigente, esse sonho marginalizado, amaldiçoado pelos que não são capazes de 
entender a beleza da criação [...] 
 
Vânia Maria Resende 
 
 
 
RESUMO 
 
 
O objetivo desta monografia é estudar aspectos relativos à infância que implicaram a 
marginalização das crianças e adolescentes na obra Capitães da Areia, do escritor 
baiano Jorge Amado. O foco da análise é a relação infância e marginalização, 
sustentada pelo ideário da ficção de 1930, pelos conceitos teóricos relativos à 
infância e pelos aspectos identificados, que são criança/família, criança/adulto e 
criança/rua, articulados por meio dos elementos da narrativa: personagens e 
narrador. A escolha do objeto de pesquisa justifica-se em razão da presença 
relevante da produção literária de Jorge Amado, que contempla as questões da 
seara social; e sendo essa obra também um veículo para essas discussões, isso 
fortalece o debate atual sobre a representação da infância, no âmbito da margem 
social, ou seja, da exclusão. Para se conseguir êxito nesta pesquisa, recorreu-se 
aos estudiosos, como Silva (2010), Bueno (2006), Duarte (1996), alguns que tratam 
da historiografia e crítica literária; sobre as questões relacionadas aos aspectos 
sociológicos, fundamenta-se em Ariès (1981), Ambires (2010), Mata (2010) e 
Pauletti (2012), que apresentam ideias sobre a infância; e sobre a marginalização de 
crianças e adolescentes, Gomes (2005), Mello (2006), entre outros. As fontes de 
estudo foram obtidas pela pesquisa bibliográfica, de textos acadêmicos impressos, 
bem como do meio eletrônico. O resultado da análise aponta que a infância 
marginalizada na literatura de Jorge Amado configura-se com o necessário apoio da 
família, do adulto e das relações sociais, constituídas no cerne da vida social, 
implicando o progresso individual e coletivo vivenciado pela criança. 
 
 
Palavras-chave: Ficção de 1930. Jorge Amado. Infância. Marginalização. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
This study aims to analyse the aspects related to the childhood that lead to 
marginalization of children and teenagers in Capitães da Areia, written by Jorge 
Amado, born in the State of Bahia, Brazil. The focus is the relation between the 
childhood and marginalization, supported by the ideology of fiction in the decade of 
1930, by the theory concepts related to childhood and by the aspects identified, that 
are kid/ family, kid/ adult and kid/streets, articulated through the elements of the 
story: characters and the narrator. The choice of the subject of this research is 
justified due to the relevant literary production of the cited Brazilian author, that 
highlights social questions; being this book a link to these discussions, this 
empowers the current debate about the childhood representation in literature while 
the social limitation, namely exclusion. To be successful with his work, we turn to the 
contribution of a few scholars, such as Silva (2010), Bueno (2006), Duarte (1996), 
just to name some who deal with historiographical and literary criticism; about topics 
concerning sociological aspects, based on Ariès (1981), Ambires (2010), Mata 
(2010) e Pauletti (2012), who present ideas about childhood and childhood´s and 
adolescents’ marginalization, Gomes (2005), Mello (2006), among others. The 
resources were the literature research, printed publications and by eletronical means, 
using the internet. The result indicates that the marginalized childhood in the Jorge 
Amado´s literature needs the family and adult support and social relations, all of them 
constituted in the social life, which implies in the individual e environment progress 
experienced by the child. 
 
 
Key Words: Fiction of 1930´s. Jorge Amado. Childhood. Marginalization. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 9 
2 JORGE AMADO NA FICÇÃO DE 1930 ........................................................... 11 
2.1 O Autor e sua Produção Literária ................................................................. 11 
2.2 O Contexto da Literatura na Década de 1930 .............................................. 16 
2.3 Apontamentos Críticos sobre a Produção Literária de Jorge Amado ....... 19 
3 INFÂNCIA: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS PERTINENTES ........................... 23 
3.1 Conceituando Infância ................................................................................... 23 
3.2 HistóriaSocial da Infância ............................................................................. 25 
3.3 Uma Infância à Margem ................................................................................. 32 
4 A INFÂNCIA EM CAPITÃES DA AREIA ......................................................... 35 
4.1 Infância e Marginalização ............................................................................. 36 
4.1.1 A construção das personagens ........................................................................ 38 
4.1.2 A voz do narrador ............................................................................................. 41 
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 46 
 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 49 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
Jorge Amado foi sem dúvida um dos maiores escritores do século XX, no 
Brasil. Ele utilizou a literatura para denunciar muitos problemas sociais existentes na 
sociedade baiana. Com uma obra vasta e enraizada aos tipos nacionais, ele soube 
criar um mundo onde os temas explorados surgiam uns dos outros, parecendo 
simples histórias à primeira vista, mas se olhadas de perto, mostram a profundidade 
de seus detalhes. 
Capitães da Areia, de 1937, surgiu num período em que o país estava 
passando por várias mudanças sociais. Essa obra não é apenas um romance de 
crianças abandonadas e marginalizadas, mas uma história com força e carácter 
social imensos. Por isso, escolhemos essa obra da produção de Jorge Amado para 
análise, submetendo-a a um olhar voltado para as representações da infância. 
Esta pesquisa tem como objetivo geral estudar alguns aspectos pertinentes à 
infância que implicaram a marginalização das crianças e adolescentes na obra 
Capitães da Areia. Logo em seguida, em se tratando dos objetivos específicos, 
pretende-se verificar a presença e importância da produção literária de Jorge Amado 
na ficção de 1930; discutir conceitos teóricos relativos à infância, desde o seu 
percurso histórico à evolução das suas condições e sentimentos na sociedade; e 
analisar a relação entre infância e marginalização na referida obra de Jorge Amado, 
evidenciando os aspectos criança/família, criança/adulto e criança/rua. 
Este trabalho constitui-se de uma pesquisa científica bibliográfica, do tipo 
exploratória, em que se observa o caráter de denúncia presente na obra de Jorge 
Amado, onde há representações da infância e sua marginalização e observa-se os 
aspectos sociais que podem contribuir para a referida marginalização, tendo em 
vista as relações da criança com a família, o adulto e, ainda, a rua. 
A título de citação, o presente trabalho baseou-se nos estudos de 
pesquisadores como: Bueno (2006) que trata da produção e de alguns aspectos do 
romance de 1930; Duarte (1996) que aborda a produção literária de Jorge Amado; 
Ariès (1981) que apresenta o surgimento e o conceito de infância na família e na 
sociedade. Outros autores também respaldaram esta pesquisa, como: Bosi (1994), 
ligado à historiografia e crítica literária; Ambires (2010) e Mata (2010), esses 
abordam em seus estudos a infância na literatura. 
10 
 
A estrutura da monografia compõe-se das seguintes seções: “Jorge Amado 
na Ficção de 1930”, desdobrando-se em três seções secundárias, onde mostramos 
a importância do escritor Jorge Amado na literatura brasileira, respaldado ainda 
sobre a sua vasta produção literária, bem como sua importância na literatura na 
década de 1930 (séc. XX) e alguns apontamentos críticos sobre sua produção 
literária. 
A segunda seção, denominada “Infância: pressupostos teóricos pertinentes”, 
desdobra-se na discussão da conceituação e história social da infância e alguns 
fatores que levam as crianças à marginalização. 
Por fim, na terceira seção, denominada “A Infância na Narrativa de Jorge 
Amado”, serão analisadas algumas representações da infância na narrativa de Jorge 
Amado, a partir da fundamentação sociológica discutida a respeito da infância e da 
marginalização, identificando isso por meio dos constituintes da narrativa, 
personagens e narrador. 
Ao produzirmos este trabalho, a nossa expectativa é a de que o mesmo 
poderá contribuir para o surgimento de novas pesquisas relacionadas à temática, 
pois esta é apenas uma das inúmeras leituras que pode ser feita da obra analisada, 
já que neste livro Jorge Amado utiliza personagens muito simples aparentemente, 
mas que guardam muitas particularidades pertinentes a novos estudos na área da 
literatura. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
11 
 
2 JORGE AMADO NA FICÇÃO DE 1930 
 
A presença do escritor baiano Jorge Amado na literatura brasileira é pontuada 
por uma produção voltada para as questões de ordem social, no que se refere, 
especialmente, nesta pesquisa, aos marginalizados ou abandonados, como os 
meninos de rua da narrativa Capitães da Areia (1937), que será aqui objeto de 
análise. Aliás, esse viés de produção interessado em apresentar a realidade social é 
matéria-prima de muitos escritores da ficção de 1930. 
Jorge Amado sempre se preocupou em retratar nas suas obras literárias as 
mazelas sociais de um povo. Ele se autodefinia como um revolucionário legítimo, um 
representante do povo e que se identificava com este e seus valores (BUENO, 2006, 
p. 24). 
 
2.1 O Autor e sua Produção Literária 
 
O romancista, Jorge Amado de Farias, nasceu no dia 10 de agosto de 1912, 
na localidade Ferradas, pertencente ao município de Itabuna, no sul da Bahia. Filho 
do “Coronel” João Amado de Faria, fazendeiro de cacau, e de D. Eulália Leal 
Amado. Antes de completar dois anos de idade sua família muda-se para Ilhéus, 
passou toda a sua infância lá e foi onde aprendeu as primeiras letras. Cursou o 
secundário em Salvador e viveu a adolescência no mesmo lugar, onde teve os 
primeiros contatos com a vida popular, que marcaria profundamente a sua obra 
(SILVA, 2010; BOSI, 1994). 
Aos 14 anos, na Bahia, começou a trabalhar em jornais e a participar 
intensamente da vida literária, sendo um dos fundadores da Academia dos 
Rebeldes, juntamente com os grupos “Arco e Flecha” e do “Samba”. Esses grupos 
desempenharam um papel importante na renovação das letras baianas; faziam parte 
do grupo o poeta Sosígenes Costa, Aidano de Couto Ferraz, Clovis Amorim e o 
futuro historiador e folclorista Édson Carneiro, entre outros. 
Jorge Amado foi também redator de O Imparcial, baiano; de Hoje, paulista; da 
revista Dom Casmurro, carioca, e do semanário Para Todos, com Oscar Niemeyer e 
o irmão James. 
Em 1930, aos 18 anos de idade, no auge da Revolução Tenentista, Jorge 
Amado muda-se para o Rio de Janeiro e matricula-se na Faculdade de Direito, pela 
12 
 
qual se tornou Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, no entanto, jamais exerceu 
a advocacia. Estudou Direito porque seu pai queria que seu primogênito fosse um 
“Doutor”. Então, para não desapontar o pai, Jorge Amado prometeu que só voltaria a 
Salvador com o diploma na mão. 
 No ano de 1932, filia-se ao Partido Comunista Brasileiro e se envolve na 
Aliança Nacional Libertadora, influenciado pela humilde condição de vida dos 
operários e camponeses. 
 Em 1937, foi preso pela Polícia do Estado Novo, e nessa ocasião mais de 800 
exemplares da obra Capitães da Areia foram queimados numa praça pública de 
Salvador. O referido livro foi escrito quando o autor fez uma longa viagem pelo 
Brasil, América Latina e pelos Estados Unidos. 
 Em 1946, foi eleito deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro, mas 
no ano seguinte teve seu mandato suspenso em consequência da decretação de 
ilegalidade do partido. Em 1948, inicia uma viagem a vários países socialistas da 
Europa. E a partir de 1958, dedica-se a uma produção literária metódica, que lhe 
permitiu viverda literatura. 
Jorge Amado estreou na literatura em 1929, com a publicação da novela 
Lenita, escrita em colaboração com Dias da Costa e Edison Carneiro. 
Em uma entrevista publicada pelo Jornal Folha de São Paulo, em 09 de 
agosto de 1912, Jorge Amado afirmou: 
 
Acho a Bahia fundamental não só na cultura brasileira, mas no país 
como um todo. Primeiro porque o Brasil começou na Bahia. Vem de 
lá um fato fundamental para a cultura brasileira: a mistura de sangue, 
de raças e de culturas, a miscigenação e o sincretismo. [...] Tenho 
dois temas. Um é o tema rural, o estabelecimento da produção de 
cacau. A outra matriz do meu trabalho é a cidade da Bahia e sua vida 
popular. Mas os ambientes e os personagens se repetem. São os 
coronéis, os jagunços, as putas, a gente do povo. Sou incapaz de 
escrever sobre aquilo que não vivi. (AMADO, 1992, p. 4 apud SILVA, 
2011, p. 14) 
 
Podemos afirmar que Jorge Amado em suas obras literárias se preocupava 
em representar o regionalismo baiano, das zonas rurais do cacau e da zona urbana 
de Salvador, e ele mesmo nos diz com clareza porque faz isso: porque considera “a 
Bahia fundamental para a cultura” e porque “é incapaz de escrever sobre aquilo que 
não viveu”, ou seja, seus romances nascem da vivência concreta do universo que 
representam. 
13 
 
 Podemos dizer, então, que sua obra, além de regionalista, baseia-se nas 
observações diretas da realidade, outro ponto importante nas obras de Jorge Amado 
é que o autor se preocupou em fixar tipos marginalizados para, através deles, 
analisar toda uma sociedade. Em suas obras são abordados: pescadores, meninos 
de rua, trabalhadores da região do cacau, discriminação do negro e de prostituição, 
entre outros. Nas obras amadianas, principalmente as da década de 1930, deixam 
transparecer, a violência cotidiana, as desigualdades sociais entre a classe pobre, 
estigmatizada, e a classe mais prestigiada, a elite, as inquietações humanas, o 
sofrimento da classe mais popular, a miséria com que estas passavam. 
 Candido e Castello (1981, p. 13) assim consideram a obra do escritor: 
 
A importância de Jorge Amado veio do caráter seco, participante e, 
todavia lírico dos seus primeiros livros, que descrevem a miséria e a 
opressão do trabalhador rural e das classes populares. [...] Um dos 
traços característicos de sua maturidade foi à mistura de realismo e 
romantismo, de poesia e documento, voltando-se para os pobres, 
para a humanidade da gente de cor da sua terra, que apresenta com 
uma simpatia calorosa, um vivo senso do pitoresco, e, sempre, um 
imperativo de justiça social sobrepairando a narrativa. 
 
E para ilustrar o que mencionamos sobre a produção literária do autor baiano, 
citamos algumas obras: em O País do Carnaval (1931), por exemplo, serão 
destacadas as inquietações, as incertezas do personagem principal em relação ao 
Brasil, ou seja, um retrato crítico da imagem alegre e equivocada do Brasil. Em 
Cacau, seu segundo romance, escrito em 1933, retrata a vida sofrida dos 
trabalhadores nas plantações de cacau, na região de Ilhéus, Bahia. Em 1934, seu 
terceiro livro, Suor, ainda com a descrição da miséria brasileira, irá descrever a 
miséria dos moradores de uma comunidade. Jubiabá, escrito no ano de 1935, possui 
uma história voltada para o negro. Jubiabá conta a história de um dos primeiros 
heróis negros da literatura. O romance é central na obra do autor: as contradições 
entre o mundo do trabalho, o conflito racial, a ideologia, a luta e, de outro lado, a 
cultura popular, o universo das festas, o sincretismo religioso, a miscigenação e a 
sensualidade vão marcar toda a sua produção. Mar Morto (1936) é outro retrato do 
Brasil. O livro apresenta a história e os amores dos heróis pescadores, que em 
precários saveiros sobrevivem enfrentando o oceano. Narra a historia de amor de 
Guma e Lívia. Em 1937, Jorge Amado publica Capitães da Areia, uma história sobre 
os meninos de rua da Bahia, que andam em bando, cometem furtos, dormem em um 
14 
 
armazém abandonado na beira da praia e que cuidam uns dos outros. O 
personagem principal do romance é Pedro Bala que no final se transforma em um 
“militante proletário” (NASS, 2006). 
 Segundo Coutinho (2002), Jorge Amado mostra-se preocupado com o povo e 
com suas condições de vida, como se pode observar nos romances mencionados. 
 
A preocupação social, porém – que o testemunho sustenta a ponto 
de incorporar o povo como personagem e sua fala na linguagem 
literária – transborda para atingir ostensiva humanização. O mar, as 
terras do cacau e a cidade de Salvador não existem como palcos de 
narrativas ou suportes de aventuras. Existem efetivamente, em sua 
inteira representação plástica, como bases necessárias para que o 
romancista prove aquela humanização se fazendo o criador de tipos. 
(COUTINHO, 2002, p. 271) 
 
Esses seis romances são considerados como “Romances Proletários”, pois 
neles Jorge Amado se mostrava preocupado em defender as classes menos 
favorecidas (NASS, 2006). As violações dos direitos trabalhistas, as más condições 
de vida da maioria da população, o descaso e a crueldade das autoridades públicas 
contra os pobres, assim como inúmeras críticas feitas às classes dominantes nas 
páginas dessas obras, são tão explícitas que o governo ditador e anticomunista, 
implantado por Getúlio Vargas em 1937 (Estado Novo), apreendeu a edição do livro 
Capitães da Areia e os queimou em praça pública (DUARTE, 1996, p. 114). 
Jorge Amado viveu exclusivamente dos direitos autorais de seus livros. 
Casou-se com a escritora Zélia Gattai, autora de importantes obras, e com quem 
teve dois filhos. Viajou muito pelo país e pelo exterior. Recebeu vários prêmios 
literários, inclusive internacionais. Autor de mais de 40 obras literárias, editadas em 
55 países e traduzidas para 49 idiomas, ele experimentou gêneros diversos, entre 
eles o romance, a crônica, a biografia, o conto, a novela, o teatro, a poesia e os 
textos políticos. Suas obras foram adaptadas para o teatro, televisão, rádio e 
cinema. Foi membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), ocupante da cadeira 
de n° 23, tendo, como fundador, José de Alencar; como patrono, Machado de Assis; 
como antecessores, Lafayette Rodrigues Pereira, Alfredo Pujol e o seu conterrâneo 
Octávio Mangabeira. Tomou posse na ABL em 17 de julho de 1961, permanecendo 
durante 40 anos, sendo sucedido por Zélia Gattai, sua esposa, e por Luís Paulo 
Horta, atual ocupante (MELO FILHO, 2012). 
15 
 
Jorge Amado faleceu no dia 6 de agosto de 2001, quatro dias antes de 
completar 89 anos de idade. A pedido do escritor seus restos mortais foram 
cremados e as cinzas colocadas dentro de uma urna e sepultadas no jardim de sua 
casa no Rio Vermelho. Deixou para a nossa literatura obras de extremo valor e nos 
diversos gêneros literários (MELO FILHO, 2012). 
A produção de romances escritos pelo autor baiano compõe-se dos seguintes 
livros: O País do Carnaval (1931), Cacau (1933), Suor (1934), Jubiabá (1935), Mar 
Morto (1936), Capitães da Areia (1937), Terras do Sem Fim (1943), São Jorge dos 
Ilhéus (1944), Seara Vermelha (1946), Os Subterrâneos da Liberdade (1954; 3 
volumes: v. 1: Os Ásperos Tempos; v. 2: Agonia da Noite; v. 3: A Luz no Túnel), 
Gabriela, Cravo e Canela (1958), Os Pastores da Noite (1964), A espantosa batalha 
entre o espírito e a matéria (1966); Dona Flor e Seus Dois Maridos (1967), Tenda 
dos Milagres (1969), Teresa Batista Cansada da Guerra (1972), Tieta do Agreste 
(1977), Farda Fardão Camisola de Dormir (1979), Tocaia Grande (1984), O Sumiço 
da Santa (1988), A Descoberta da América pelos Turcos ou Os esponsais de Adma 
(1994), O Compadre de Ogum (1995) (PAULETTI, 2012, p. 32-33). 
A produção literária de Jorge Amado é notável, escrevendo também para o 
gênero novela, que são três: A Morte e a Morte de Quincas Berro D’água (1959), Os 
Velhos Marinheiros (1976), e escreveu em parceria Lenita (1929), com EdisonCarneiro e Dias da Costa. A respeito da produção endereçada à literatura infantil, o 
autor escreveu: O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá (1976), A Bola e o Goleiro 
(1984), O Capeta Carybé (1986). No campo da poesia, o baiano produziu seu único 
texto intitulado A Estrada do Mar (1938); e para o teatro Amor do Soldado (1947), 
ainda com o título O Amor de Castro Alves, 1958. Com relação aos seus contos, 
citamos: Sentimentalismo (1931), O homem da mulher e a mulher do homem (1931), 
História do carnaval (1945), As mortes e o triunfo de Rosalinda (1965), Do recente 
milagre dos pássaros acontecido em terras de Alagoas, nas ribanceiras do rio São 
Francisco (1979), O episódio de Siroca (1982), De como o mulato Porciúncula 
descarregou o seu defunto (1989). Já na área dos relatos biográficos, os seguintes 
textos: ABC de Castro Alves (1941), O cavaleiro da esperança (1945), O menino 
grapiúna (1981), Navegação de cabotagem (1992). E ainda como guias/viagens os 
textos a seguir: Bahia de Todos os Santos: guia de ruas e de mistérios (1945), O 
mundo da paz (viagens) (1951), Bahia Boa Terra Bahia (1967), Bahia (1970), Terra 
Mágica da Bahia (1984). Diante da volumosa produção do autor, ainda tem obras 
16 
 
classificadas como documento político/oratória: Homens e coisas do Partido 
Comunista (1946), Discursos (1993), Descoberta do mundo (literatura infantil), com 
Matilde Garcia Rosa (1933), Brandão entre o mar e o amor, com José Lins do Rego, 
Graciliano Ramos, Aníbal Machado e Rachel de Queiroz (1942), O mistério de 
MMM, com Viriato Corrêa, Dinah Silveira de Queiroz, Lúcio Cardoso, Herberto Sales, 
Rachel de Queiroz, José Condé, Guimarães Rosa, Antônio Callado e Orígenes 
Lessa (1962) (PAULETTI, 2012, p. 33). 
Por ser um autor de tão grande importância nas letras nacionais e de ter 
contribuído para que a literatura brasileira se tornasse mundialmente conhecida, a 
obra de Jorge Amado é merecedora deste trabalho de pesquisa acadêmica, que é 
pequeno diante de um escritor que tanto colaborou para a cultura e para a 
sociedade brasileira, criando personagens e temáticas representativas da vida social 
desse povo. 
 
2.2 O Contexto da Literatura na Década de 1930 
 
Para leitura e análise da representação da infância na obra Capitães da Areia 
(1937) de Jorge Amado, se faz necessário discorrermos, ainda que brevemente, 
sobre o contexto da literatura na década de 1930, respaldando a ideia de que muitos 
dos escritores dessa época preocupavam-se em materializar na literatura os 
aspectos da vida social. 
Jorge Amado integra um rol de escritores que participou ativamente, pela via 
estética, da vida social brasileira, haja vista que o autor pauta na sua literatura o 
interesse às questões contemporâneas. Alfredo Bosi (1994, p. 384) denomina o 
autor como socialista no capítulo “Tendências contemporâneas”, confirmando a 
participação marcante do escritor em prol dos que são postos à margem da 
sociedade. As denúncias partilhadas por Jorge Amado na sua obra literária nos 
apresenta a dimensão do seu vigor para dar visibilidade a grupos sociais que são 
desprovidos de alguma situação de progresso social. 
Segundo Luís Bueno (2006), o romance social de 1930 colaborou e ampliou 
as possibilidades para uma nova temática e para o surgimento de um novo tipo de 
protagonista. 
 
17 
 
A incorporação dos pobres pela ficção é um fenômeno bem visível 
nesse período. De elemento folclórico, distante do narrador até pela 
linguagem, como se vê na moda regionalista do início de século, o 
pobre, chamado agora de proletário, transforma-se em protagonista 
privilegiado nos romances de 30, cujos narradores procuram 
atravessar o abismo que separa o intelectual das camadas mais 
baixas da população, escrevendo uma linguagem mais próxima da 
fala. (BUENO, 2006, p. 23) 
 
Podemos observar que o romance de 30 do século passado foi muito 
importante, pois através dele os menos favorecidos ganharam voz na literatura 
brasileira e as condições em que viviam ganharam visibilidade. 
Os escritores da geração de 1930 se sentiam desafiados a retratar a 
sociedade brasileira, sua composição cultural e étnica, seus modos de 
sobrevivência. Essa preocupação servia para evidenciar os conflitos políticos, os 
problemas econômicos e a falsa noção de desenvolvimento. Os romancistas desse 
período produziram uma literatura realista que ascendia o subalterno à posição de 
herói, evidenciando personagens pouco contemplados pelos cânones (BUENO, 
2006). Assim, atribuindo notabilidade ao modo de viver desses sujeitos, diante das 
condições precárias enquanto indivíduos marginalizados pela maioria da sociedade. 
A década de 1930 se configurou em um período de incertezas políticas e 
econômicas, o Brasil almejava afirmações positivas de ordem e progresso, mas que, 
na realidade, o país estava imerso em desigualdades sociais e miséria. O objetivo 
dos escritores considerados da segunda geração moderna consistia em, a partir do 
texto literário, desnudar as realidades de um Brasil que iniciava a passos lentos o 
processo de industrialização, apresentando aos leitores uma consciência de 
subdesenvolvimento. Desse modo, escrevendo em suas obras representações das 
carências sociais de uma população para quem o progresso não chegava, 
explicitando a negação de direitos de um povo subalterno que não pode manter o 
sonho de progresso, pois estavam inseridos em condições subumanas. 
De acordo com Bueno (2006, p. 24), Jorge Amado se “autodefinia sendo um 
revolucionário, um representante legítimo do povo”. Bueno ainda afirma que ao 
tomar posse na Academia Brasileira de Letras, Jorge Amado discursou e fez uma 
observação sobre a sua geração e o romance brasileiro: 
 
São os dois caminhos do nosso romance, nascendo um em Alencar, 
nascendo outro de Machado, indo um na direção do romance popular 
e social, com uma problemática ligada ao país, aos seus problemas, 
18 
 
às causas do povo, marchando o outro para o romance dito 
psicológico, com uma problemática ligada à vida interior, aos 
sentimentos e problemas individuais, à angustia e à solidão do 
homem, sem, no entanto, perder seu caráter brasileiro. (BUENO, 
2006, p. 31) 
 
Evidencia-se no trecho acima uma divisão de linhas seguidas em textos 
literários, onde há uma abordagem de temas sociais e outra linha que aborda a 
subjetividade do homem, ou seja, o seu íntimo. Estabelecendo uma relação com a 
obra a ser analisada em capítulo posterior, observa-se que além de conter a 
temática social, também é possível encontrar problemas subjetivos do homem, 
portanto não há uma divisão absoluta em relação ao romance popular e social e o 
psicológico. 
Entre as temáticas sociais presentes na obra, destacam-se: abandono, 
prostituição, violência etc. Essas temáticas são representadas por tipos humanos, 
onde uma personagem agrupa as características que servirão para determinar um 
grupo específico, ou seja, uma prostituta caracteriza todas as pessoas nessa 
condição. Assim, a personagem não é vista sob o ponto de vista individualista, isto 
é, “O romance, portanto, não tem mesmo protagonista, mas um conjunto de 
indivíduos que passam por experiências humilhantes.” (BUENO, 2006, p. 251). 
Na década de 1930 também havia os romances cíclicos. Para Bueno, os 
romances de Jorge Amado são mais interessantes, “pois somente no último volume 
de Capitães da Areia, havia a informação, na capa e no prefácio, de que se tratava 
de um romance cíclico1” (BUENO, p. 41-42). Nesse mesmo período, segundo 
Bueno, os escritores não seguiam uma mesma forma de atuação, pois “produziram 
manifestos e profissões de fé, fundaram revistas e formaram grupos, mesmo depois 
de estarem evidentes as diferenças dentro do grande grupo inicial.” (BUENO, 2006, 
p. 66). 
Muitos escritores da década de 1930 criaram obras literárias para mostrar as 
transformações do país, de forma positiva pela via da modernização. Pois nesse 
períodohavia uma falsa noção de desenvolvimento e de país novo. Para Bueno, o 
novo romance que surgiria naquela década está ausente de qualquer crença na 
 
1
 Na tentativa de apresentar um panorama da vida social, é que o romance brasileiro de 1930 deu vez 
ao romance cíclico, como o “Ciclo da Cana-de-Açúcar”, de José Lins do Rego, os “Romances da 
Bahia”, de Jorge Amado, entre outros. Ver a esse respeito: BUENO, Luís. Uma história do romance 
de 30. São Paulo: Edusp; Campinas: Editora Unicamp, 2006. 
19 
 
possibilidade de uma transformação positiva do país pela via da modernização 
(BUENO, 2006, p. 69). 
Outra característica do romance de 1930 é o fato de o proletário ser figura 
central no romance social. Bueno (2006, p. 118) destaca: “A arte proletária é, pois, a 
arte antiburguesa do período da luta de classes”. E o autor ainda assinala que “o 
romance só pode ser proletário se tiver ‘ar de revolta’, ou seja, se as massas neles 
enfocadas estiverem inclinadas a fazer revolução” (BUENO, 2006, p. 162). Para se 
fazer romance proletário o artista tem que mostrar uma imagem fiel da pobreza. 
Proletário aqui é termo bem inclusivo, a abrigar os camponeses e até mesmo 
mendigos e vagabundos, ou seja, os pobres (BUENO, 2006, p. 163-164). Para Jorge 
Amado o romance proletário teria que se despreocupar da moral burguesa, 
eliminando aquilo que seria o “senso de imoralidade”. Isso no campo ideológico do 
que propriamente literário (BUENO, 2006, p. 164). 
 Vale ressaltar que “o intelectual que escreve o romance de 30 não vem das 
camadas mais baixas da população e, ao tratar da vida proletária sempre fala de 
outro” (BUENO, 2006, p. 244). 
Nos anos de 1930 surgiu um novo comportamento por parte dos escritores, 
pois nesse período não houve propostas e nem visões unificadas de Brasil, com isso 
os romancistas dessa época se ocuparam de mergulhar num aspecto específico do 
presente, além de se inspirarem em leituras acumulativas de autores que já não são 
conhecidos, com essa atitude houve uma “produção atomizada”. De acordo com 
Bueno esse é um dos maiores problemas para o estudo do romance de 1930. 
“Sendo uma produção atomizada e ancorada no presente, sujeita às exigências 
imediatas, acabou produzindo poucas obras que as gerações de críticos que a 
sucederam julgaram aptas a integrar nosso cânone literário” (BUENO, 2006, p. 79). 
 
2.3 Apontamentos Críticos sobre a Produção Literária de Jorge Amado 
 
Segundo o pesquisador literário Eduardo de Assis Duarte, Jorge Amado 
sofreu preconceito por parte das universidades brasileiras. Segundo ele há uma 
“ausência de estudos sistemáticos e abrangentes sobre a obra de Jorge Amado”, 
porém para o mesmo crítico Jorge Amado é o escritor mais lido dentro e fora do país 
(DUARTE, 1996, p. 11). O pesquisador admite que Jorge Amado é objeto de uma 
crítica polêmica e heterogênea, uma vez que as reações aos seus romances foram 
20 
 
diversas, circulando entre a adesão e o repúdio. O escritor foi ao mesmo tempo 
exaltado por seus dons de narrador e fustigado por reparos que vão do sectarismo à 
pornografia e à rendição ao formato best-seller (DUARTE, 1996, p. 17). 
Duarte justifica porque há poucos estudos relacionados às obras amadianas: 
 
[...] a crítica da obra amadiana tem-se caracterizado, com raras 
exceções, pela falta de abrangência e profundidade, por um 
preconceito estético que frequentemente mascara o preconceito 
ideológico e, principalmente, pelo despreparo teórico para 
compreender o real significado da obra, além do desconhecimento 
das matrizes populares que a alimentavam. (DUARTE, 1996, p. 11) 
 
Apesar das críticas diversas, e considerando a dimensão da obra do escritor 
baiano, Duarte defende que Jorge Amado merece análises mais atentas e objetivas 
– para além do elogio da circunstância ou do mero rebaixamento crítico (DUARTE, 
1996, p. 17). 
Eduardo de Assis Duarte identifica na recepção crítica da obra de Jorge 
Amado uma tendência à polarização em torno de uma “crítica dos defeitos” e de 
uma “crítica das belezas”, a qual, porém, acaba por eximir-se de fornecer uma visão 
global e compreensiva da obra do romancista. Segundo o estudioso: 
 
A crítica brasileira, salvo raras exceções, poucas vezes dedicou-se a 
uma leitura do romance amadiano que levasse em conta a natureza 
de seu projeto ou as convenções adotadas para sua concretização. 
Marcadas pelas balizas estéticas do modernismo, dedicou-se em 
grande parte ora a uma crítica dos defeitos, ora a uma crítica das 
belezas, para ficarmos com as expressões de Agripino Grieco. No 
primeiro caso, buscando ressaltar tão-somente as fragilidades; no 
segundo, apenas os méritos, e, em ambos, não conseguido uma 
compreensão mais profunda e global desses escritos. (DUARTE, 
1996, p. 32) 
 
 Segundo Duarte a crítica literária fez poucos estudos das obras de Jorge 
Amado. Álvaro Lins nos dar exemplos dessa “critica dos defeitos”, segundo ele: 
 
Jorge Amado simplesmente não era um “verdadeiro escritor”, mas 
sim um “instintivo”, um romancista de “fracos recursos”, que 
ostentava “pieguice e mau gosto” como se fossem “troféus”... Em 
seguida aponta o “primarismo”, a “miséria estilística” e a “poetização 
da desgraça”, entre outros, como elementos que, por si sós, 
condenariam a obra a não perdurar e a cair em rápido esquecimento. 
(DUARTE, 1996, p. 32) 
 
21 
 
 
 Para Bastide, pela primeira vez, o povo encontra “autonomia literária e 
expressão estética”, segundo ele isso só foi possível na obra de Jorge Amado. Essa 
autonomia acontece porque o escritor expressa com naturalidade a “língua 
brasileira” (apud DUARTE, 1996, p. 33). 
Segundo Duarte, a principal meta de Jorge Amado é “escrever para o povo”, 
os romances amadianas são marcados pela oralidade e pela coloquialidade. Essa 
característica tem como finalidade primordial recuperar os falares populares que não 
foram incorporados, ou foram excessivamente estilizados pelo romance brasileiro. 
 
Não bastava trazer o povo, o proletário para o centro da ação 
romanesca; urgia fazê-lo falar da forma mais natural possível, numa 
linguagem tão “nova” quanto “verdadeira”, em que a dureza da 
“língua errada do povo” equivalesse de modo isônomo e verossímil, à 
igual dureza das situações retratadas, para atingir, assim, a 
representação na narrativa. Tudo isto decore da meta principal de 
escrever para o povo, abordando seus problemas a partir de suas 
próprias formas de expressão para assim tê-lo como leitor. Impunha-
se, pois, renovar profundamente a linguagem literária para que esta 
desse conta da meta revolucionária a que se propunha o romance. 
(DUARTE, 1996, p. 12) 
 
Duarte nos afirma ainda que Jorge Amado representou o oprimido de forma 
positiva, “não apenas na fala, mas quando cresce e afirma sua dignidade na 
resistência à opressão e na luta por sua superação” (DUARTE, 1996, p. 13). 
Com base nesse estilo os romancistas centravam nos enredos as tradições 
populares nos diversos gêneros textuais da época e incorporavam as aventuras e o 
heroísmo; tudo isso era combinado com as conquistas formais do modernismo e 
com a estética realista, voltada para as classes menos favorecidas da época. Nesse 
sentido, esse novo estilo superou o realismo tradicional, trazendo para o cenário o 
proletário como protagonista, e como narrador de suas próprias experiências. 
Estamos diante do “Romance Proletário”, segundo Duarte (1996, p. 13). 
 De acordo com Duarte os proletários amadianos são muitos diferentes: “estes 
pensam, discutem, procuram entender o processo em que estão envolvidos e 
imaginar saídas” (DUARTE, 1996, p. 13). 
O romance Capitães da Areia é um “romance de formação proletários”, 
segundo Duarte na ficção de Jorge Amado ocorre o que ele chama de “a 
circularidade romanesca”, ou seja, um romance nasce do outro. No caso da obra em 
22 
 
estudo, ela nasceu de Jubiabá. Com a história de PedroBala o escritor fechará um 
dos seus movimentos conhecido como “o do ciclo do proletário da ‘cidade da 
Bahia’.” (DUARTE, 1996, p. 114). O romance em questão irá abordar a infância 
abandonada e delinquente, que para o período em que veio a público, 1937, esses 
problemas eram considerados um escândalo. Porém, os conflitos que move o 
romance são os contrastes existentes entre ricos e pobres, fracos contra fortes e 
pequenos marginais contra a sociedade opressora. Isso tudo se materializara nos 
rostos angelicais de crianças (DUARTE, 1996, p. 114-115). 
Como afirma Duarte (2006): “Capitães da Areia concentra a força de seus 
méritos mais na denúncia candente da condição dos meninos de rua, única em toda 
a literatura dos anos 30, do que na construção cuidadosa das etapas ascensionais 
do Bildungsroman2 proletário.” (DUARTE, 1996, p. 119). Em “Capitães da Areia, 
Jorge Amado dedica-se a traçar os caminhos da formação do herói proletário no 
Brasil dos anos 30” (DUARTE, 1996, p. 121). Para tanto, o protagonismo da infância 
na narrativa amadiana destaca o universo desses sujeitos oprimidos pela sociedade 
e que foram levados a cometer delitos e violências. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2
 Bildungsroman é um termo que designa um tipo de romance, em que o processo de formação de 
uma personagem é apresentado durante a narrativa, detalhando o seu desenvolvimento físico, 
psicológico e ainda social, da fase infantil ou juvenil até chegar a uma maturidade, cuja etapa se dá 
quando o protagonista realiza um trajeto em que há um movimento de ascensão das classes 
subalternas. Ver a esse respeito, DUARTE, Eduardo de Assis. Jorge Amado: romance em tempo de 
utopia. Rio de Janeiro; São Paulo: 1996. 
23 
 
3 INFÂNCIA: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS PERTINENTES 
 
Ao falarmos de infância, podemos perceber que esta é uma fase da vida de 
suma importância para o ser humano, portanto não podemos nos referir a essa 
etapa da vida como uma abstração, mas sim como um conjunto de fatores que vão 
determinar o modo de pensar e viver essa infância. Desse modo, para que se haja 
infância, ela tem que ser composta por inúmeros fatores, que vai desde a família 
(pai, mãe e outros integrantes) e também pela instituição escolar, entre outros 
fatores. 
Philippe Ariès (1981), em seu livro História Social da Criança e da Família, 
comenta que, desde o século XII até o início do século XX, a sociedade vem criando 
conceitos e modelos para a infância, além de organismos que a valorizem, 
principalmente a infância pobre e desamparada, pois segundo o autor o sentimento 
de infância se deu em princípio nas camadas mais ilustres da sociedade, enquanto 
que as crianças pobres ficaram sem conhecer o verdadeiro significado da infância. 
Sendo assim, elas ficaram a mercê da própria sorte. Dessa maneira, como a infância 
é o tema central deste estudo, se faz necessário apresentar algumas considerações 
pertinentes acerca do assunto em questão. Vale ressaltar, ainda, que os 
personagens da narrativa Capitães da Areia são indivíduos desassistidos 
socialmente e que não vivenciam essa fase da vida humana. 
 
3.1 Conceituando Infância 
 
 O conceito de infância se deu em três períodos diferentes da história, 
segundo Ariès (1981). No primeiro período (Idade Média, por volta dos séculos XI e 
XII), a criança era vista como um adulto em miniatura, pois, nessa época não havia 
distinção entre o adulto e a criança, ou seja, a criança era desde pequena inserida 
no mundo dos adultos, muito embora não reconhecida como indivíduo que 
necessitasse de atenção e cuidados específicos. No segundo período (final do 
século XVII), de acordo com o teórico, ocorreu uma mudança na forma de ver a 
criança, cuja concepção foi modificada devido à constituição do modelo familiar 
burguês, propiciando, assim, o reconhecimento da infância. Nesse momento, a 
sociedade passa a se preocupar com a inocência da criança, pois a separa do 
mundo dos adultos e a coloca na escola sob a vigia dos professores. O terceiro e 
24 
 
último período (por volta do século XIX) é caracterizado pela firmação do conceito de 
infância. Ariès afirma que nesse período a criança passou a ocupar o lugar central 
no seio familiar, devido à ligação dela com a figura dos anjos que eram vistos como 
seres puros e divinos. Segundo Ariès (1981, p. 65): 
 
A descoberta da infância começou sem dúvida no século XIII, e sua 
evolução pode ser acompanhada na história da arte e na iconografia 
dos séculos XV e XVI. Mas os sinais de seu desenvolvimento 
tornaram-se particularmente numerosos e significativos a partir do 
final do século XVI e durante o século XVII. 
Esse fato é confirmado pelo gosto manifestado na época pelos 
hábitos e pelo jargão das crianças pequenas. 
 
A infância, de acordo com Ariès (1981), passou muitos séculos para se 
chegar ao conceito existente hoje, e foi possível acompanhar essa evolução através 
da arte icnográfica. É possível perceber também que a definição de criança é 
recente na história social da infância, datada do final do século XVI e XVII. Desse 
modo, foram necessários vários séculos para que se constituísse a infância que hoje 
conhecemos, a partir do reconhecimento de características específicas que 
distinguissem crianças de adolescentes e de adultos. Atualmente, a criança é 
reconhecida como um ser de direitos, pessoa sensível, dotada de história e que a 
seu modo, contribui com a sociedade, pertencendo, portanto, ao mesmo universo 
dos adultos e ocupando nele um grau apropriado de importância. 
A infância não acontece de forma repentina, mas sim, de forma lenta, onde 
tudo se concretiza no seu tempo. Desse modo, a família é a grande responsável por 
essa formação e esses acontecimentos variam de acordo com as práticas adotadas 
por cada família, ou seja, a forma de educar varia de família para família. Segundo 
Gomes (2005) a família serve como base para o bom desenvolvimento da criança. 
Sendo assim, essa instituição social pode apresentar-se, atualmente, de diversas 
formas, com componentes distintos do que foi padronizado por séculos pela 
sociedade, ou seja, a criança, a priori, necessita da família, ou pelo menos de uma 
composição que se possa chamar de família, para a sua formação social. 
Ambires (2010, p. 24-25, grifo do autor), em seu livro “Imagens da infância e 
da adolescência em Otto Lara Resende”, nos dá o seguinte conceito de infância: 
 
Devido a isto, é primeiramente um termo derivado do verbo latino 
fari, “falar”, cujo particípio presente é fans que significa “o que fala” 
25 
 
ou “o falante”. Contudo, por conta do prefixo negativo in, tem-se, a 
princípio, infans com o sentido de “o que não fala” ou “o não-falante”. 
Cabe, então, lembrar que, na situação, seria, assim, o período da 
vida que abarca todos “os que não falam” e requerem, por conta do 
fato, formação, educação, para deixarem o estágio de “não-falantes” 
ou, já em ampliação semântica do termo, deixarem o que é “infantil”. 
[...] a infância é indubitavelmente época de vida, mas, por 
conseguinte, episódio a ser superado por um que lhe é superior: a 
fase adulta que, em hipótese, é o período em que se fala e, por 
extensão, em alguns casos, se fala bem, pois o adulto (alguns ao 
menos) já recebeu formação, introjetou normas ou, noutros termos, 
transformou-se no modelo que lhe foi oferecido. [...] infância é 
também termo ligado a infante, designação sinônima de príncipe que 
é, em sua validade, a criança entre as crianças e aquele a quem, por 
isto, cabem as coisas principais. 
 
 A infância é um período da vida em que a criança não fala, e por 
consequência disso precisa de formação educacional, para deixar esse estágio de 
“não-falantes”. E para ampliar essa concepção, podemos depreender que infância 
também designa fase em que o indivíduo necessita de um suporte para o seu 
desenvolvimento, seja entre as relaçõesfamiliares, seja na interação com o adulto 
ou também com a sociedade, tornando-o um sujeito autônomo diante das situações 
que se apresentam para ele na vivência com seus pares. Portanto, é um período da 
vida que a criança está em fase de crescimento e de formação intelectual, fase essa 
que precisa de cuidados, atenção, carinho, ou seja, ela precisa de todos esses 
fatores para se tornar um adulto independente. 
 
3.2 História Social da Infância 
 
Segundo Ariès (1981), na Idade Média não havia lugar para a criança, pois 
ela era vista como adulto em miniatura, ou seja, havia uma “ausência do sentimento 
de infância” (ARIÈS, 1981, p. 14). Como afirma o autor: “De criancinha pequena, ela 
se transformava imediatamente em homem jovem, [...]” (ARIÈS, 1981, p. 10) “A 
passagem da criança pela família e pela sociedade era muito breve e muito 
insignificante para que tivesse tempo ou razão de forçar a memória e a tocar a 
sensibilidade” (ARIÈS, 1981, p. 10). A sensibilidade da criança ao mundo, que era 
apresentado a ela, era ignorada e posta de lado, em razão dos ideais de uma época 
que desrespeitava a criança. Portanto, Ariès (1981) afirma: 
 
26 
 
Contudo um sentimento superficial da criança – a que chamei 
“paparicação” – era reservado à criancinha em seus primeiros anos 
de vida, enquanto ela ainda era uma coisinha engraçadinha. As 
pessoas se divertiam com a criança pequena como com um 
animalzinho, um macaquinho impudico. Se ela morresse então, como 
muitas vezes acontecia, alguns podiam ficar desolados, mas a regra 
geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo a substituiria. 
A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato. (ARIÈS, 
1981, p. 10) 
 
Segundo Ariès (1981, p. 14), “A criança era, portanto diferente do homem, 
mas apenas no tamanho e na força, enquanto as outras características 
permaneciam iguais”. Até nas roupas da época essa característica era clara: “Nada, 
no traje medieval, separava a criança do adulto. Não seria possível imaginar atitudes 
mais diferentes com relação à infância” (ARIÈS, 1981, p. 70). Só foi a partir do 
século XVII que a criança nobre ou burguesa passou a ter seu próprio traje, pois 
este era particular à sua idade. 
Essas características eram típicas de uma sociedade em que a estrutura 
familiar era muito extensa, “composta de várias gerações ou vários grupos 
colaterais” (ARIÈS, 1981, p. 10). Nesse mesmo período, segundo Ariès (1981, p. 
11): 
 
As trocas afetivas e as comunicações sócias eram realizadas, 
portanto fora da família, num “meio” muito denso e quente, composto 
de vizinhos, amigos, amos e criados, crianças e velhos, mulheres e 
homens, em que a inclinação se podia manifestar mais livremente. 
As famílias conjugais se diluíam nesse meio. 
 
Outro fator importante foi que a escola substituiu a aprendizagem das 
crianças que era feita, a priori, pelos adultos. Com essa mudança a família passou a 
ocupar um lugar de afeição entre os cônjuges e entre pais e filhos, algo que não 
acontecia antes. “Essa afeição se exprimiu sobretudo através da importância que se 
passou a atribuir a educação” (ARIÈS, 1981, p. 11). Assim, foi necessário que a 
família limitasse o número de filhos para melhor cuidar deles. 
Portanto, Alain Besançon assinala que: 
 
[...] a criança não é apenas o traje, as brincadeiras, a escola, nem 
mesmo o sentimento da infância [ou seja, modalidades históricas, 
empiricamente perceptíveis]; ela é uma pessoa, um processo, uma 
história, que os psicólogos tentam reconstituir, um termo de 
comparação. (apud ARIÈS, 1981, p. 13) 
27 
 
Outra característica importante, evidenciada por Ariès (1981, p. 50), foi que 
“até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância ou não tentava 
representá-la”. Mas se a arte não as representava nessa época é porque, até o final 
do século XIII, não existiam crianças por sua expressão particular, pois elas eram 
retratadas como homens de tamanho reduzido. 
Só foi por volta do século XIII que a arte pictórica passaria a representar a 
criança. Essas representações eram próximas do sentimento moderno. No primeiro 
momento, a icnografia das cortes europeias passou a mostrar a criança na figura de 
anjos, “representado sob a aparência de um rapaz muito jovem” (ARIÈS, 1981, p. 
52). Depois passou a representar a criança na figura do menino Jesus. E o último 
tipo de criança foi a criancinha nua, esse tipo de criança apareceu na fase gótica 
(ARIÈS, 1981, p. 53). 
Com base nas informações supracitadas, podemos compreender que tudo na 
vida do ser humano muda, assim como a sua relação com a sociedade. Contudo, é 
importante observarmos que essas características lá da Idade Média não poderiam 
permanecer estáticas em uma sociedade que está em constante evolução. No 
entanto, a infância pode ser compreendida ou concebida de acordo com as 
representações e segundo a visão e opinião que cada um tem desse período inicial 
da vida do ser humano. 
 Segundo Ariès (1981), na Idade Média “As idades da vida” também passaram 
a ocupar um lugar importante nos tratados pseudocientíficos. E foi durante o século 
XVII que se generalizou o hábito de pintar nos objetos e na mobília uma data solene, 
e foi a partir daí que as idades passaram a ter importância. Ainda de acordo com 
Ariès (1981) nesse período existiam seis etapas da vida. A primeira idade é a 
infância, que vai do nascimento até os sete anos, nessa idade a pessoa não fala 
bem e não sabe formar perfeitamente suas próprias palavras porque não tem dentes 
bem ordenados. Logo após, vem à segunda idade que é chamada de pueritia, dura 
até os 14 anos, onde a criança ainda é considerada “como a menina do olho”; a 
terceira idade é chamada de adolescência, segundo Constantino dura até os 21 
anos, mas para Isidoro dura até os 28 anos, fase em que o autor francês considera 
que o indivíduo ainda está em desenvolvimento físico apropriado a sua natureza e 
ainda apto a procriar. Essas três etapas não eram valorizadas pela sociedade. Isso 
só se deu a partir da quarta idade, em que as pessoas começaram a ser 
reconhecidas socialmente. Essa idade era chamada de juventude e ia até os 45 
28 
 
anos. Ainda existia a quinta idade chamada de senectude, em que a pessoa não era 
velha, mas já tinha passado da juventude; e por fim, a sexta idade que é a velhice, 
com duração até os 70 anos ou até a morte. 
Vale ressaltar que as idades categorizadas por Ariès (1981) nos auxiliarão no 
momento da análise, que se dará posteriormente. 
Para o mesmo autor, “As idades da vida eram também uma das formas 
comuns de conceber a biologia humana, em relação com as correspondências 
secretas internaturais” (ARIÈS, 1981, p. 35). 
Segundo Ariès (1981, p. 39), na Idade Média, poucos homens tinham o 
privilégio de percorrer todas as idades da vida, pois nessa época havia um grande 
número de mortalidade. As idades da vida tornaram-se popular e foi um termo 
utilizado com frequência na icnografia profana. Mas só foi a partir do século XIV que 
a icnografia fixou seus traços essenciais, com isso seus traços permaneceram até o 
século XVIII com poucas alterações. Portanto, Ariès (1981, p. 39) nos mostra outro 
conceito das idades da vida: 
 
Primeiro, a idade dos brinquedos: as crianças brincam com um 
cavalo de pau, uma boneca, um pequeno moinho ou pássaros 
amarrados. Depois, a idade da escola: os meninos aprendem a ler ou 
seguram um livro e um estojo; as meninas aprendem a fiar. Em 
seguida, as idades do amor ou dos esportes da corte e da cavalaria: 
festas, passeios de rapazes e moças, corte de amor, as bodas ou a 
caçada do mês de maio dos calendários. Em seguida, as idades da 
guerra e da cavalaria: um homem armado. Finalmente, as idades 
sedentárias, dos homens da lei, da ciência ou do estudo: o velho 
sábio barbudo vestido segundo a moda antiga, diante de sua 
escrivaninha, perto da lareira. 
 
Foi possível observarmos que as idades da vida,mencionadas por Ariès, no 
século XIV permaneceram inalteradas até o século XXI, pois se formos fazer uma 
análise minuciosa todas essas fases continuam iguais à atualidade. Pois a primeira 
fase da vida (segundo ele, idades da vida) é a infância, depois a adolescência e, por 
fim, ficamos adultos. De acordo com Ariès (1981, p. 40): 
 
Esses atributos da arte do século XIV seriam encontrados, quase 
idênticos, em gravuras de natureza mais popular, mais familiar, que 
subsistiram do século XVI até o início do XIX, com pouquíssimas 
mudanças. Essas gravuras eram chamadas Degraus das idades, 
pois retratavam pessoas que representavam as idades justapostas 
29 
 
do nascimento até a morte, muitas vezes de pé, sobre degraus que 
subiam à esquerda e desciam à direita. 
 
Para Ariès (1981, p. 39-41), “As idades da vida não correspondiam apenas a 
etapas biológicas, mas a funções sociais”. Segundo ele existiam homens jovens na 
lei, porém o estudo era uma ocupação dos mais velhos. Entretanto, foi somente a 
partir do século XIX que a preocupação com as idades se tornaria fundamental 
(ARIÈS, 1981, p. 166). 
Outra ausência nítida do sentimento de infância evidenciada por Ariès (1981) 
é que as famílias associavam as crianças nas brincadeiras e práticas sexuais, 
segundo ele essas práticas não chocavam as pessoas da época, pois isso era 
normal. No século XVI, “O respeito devido às crianças era então algo totalmente 
ignorado. Os adultos se permitiam tudo diante delas: linguagem grosseira, ações e 
situações escabrosas; elas ouviam e viam tudo”. [...] “esse hábito de associá-las a 
brincadeira que girava em torno de temas sexuais para nós é surpreendente”. No 
entanto, “atitudes diante da sexualidade, e sem dúvida a própria sexualidade, variam 
de acordo com o meio, e, por conseguinte, segundo as épocas e as mentalidades” 
(ARIÈS, 1981, p. 128-129). 
 Outro surgimento importante na sociedade foi o sentimento da família, que 
segundo Ariès (1981, p. 207) esse sentimento emergiu nos séculos XVI-XVII: “em 
meados do século XVI, os artistas começaram a representar a família em torno de 
uma mesa coberta de frutas”. É importante ressaltarmos que esse sentimento veio 
acompanhado do sentimento de infância. 
Nessa época a família não podia alimentar um sentimento profundo entre pais 
e filhos, porque a realidade existente dentro da família era mais moral e social do 
que sentimental. “Nos meios mais ricos, a família se confundia com a prosperidade 
do patrimônio, a honra do nome”. Já entre os pobres esse sentimento quase não 
existia. Porém, quando havia riqueza e ambição esse sentimento era provocado 
pelas antigas relações de linhagem. Só foi a partir do século XV que o sentimento e 
as realidades da família se transformaram (ARIÈS, 1981, p. 231). 
No final da Idade Média e nos séculos XVI e XVII, Ariès nos mostra que a 
criança havia conquistado seu espaço dentro da família: 
 
Essa volta das crianças ao lar foi um grande acontecimento: ela deu 
à família do século XVII sua principal característica, que a distinguiu 
30 
 
das famílias medievais. A criança tornou-se um elemento 
indispensável da vida cotidiana, e os adultos passaram a se 
preocupar com sua educação, carreira e futuro. Ela não era ainda o 
pivô de todo o sistema, mas tornara-se uma personagem muito mais 
consistente. Essa família do século XVII, entretanto, não era a família 
moderna: distinguia-se desta pela enorme massa de sociabilidade 
que conservava. Onde ela existia, ou seja, nas grandes casas, ela 
era um centro de relações sociais, a capital de uma pequena 
sociedade complexa e hierarquizada, comandada pelo chefe de 
família. (ARIÈS, 1981, p. 270) 
 
A família também passou a se preocupar com a saúde e a higiene das 
crianças, aliás, tudo que envolvia a criança e a família era digno de atenção. “Não 
apenas o futuro da criança, mas também sua simples presença e existência eram 
dignas de preocupação” (ARIÈS, 1981, p. 164). Assim, podemos concluir o quanto, a 
partir de então, a criança assume sua posição na composição da família, sendo 
reconhecida e ganhando destaque entre os seus parentes e à sociedade, de um 
modo geral. 
Segundo Santos (1969, p. 149), a família é importante na sociedade e pode 
ser formada da seguinte maneira, como menciona o autor: 
 
A família é uma instituição de direito natural que precede o Estado e 
a própria sociedade civil, pois esta nada mais é do que uma reunião 
de famílias. Ela se constitui pelo matrimônio, que é a reunião do 
homem e da mulher, firmando uma comunidade de vida, cujo fim é a 
procriação e a educação dos filhos, bem como assistência física 
mútua. 
 
Desse modo, percebe-se que a família surge de forma espontânea e que 
essa família é composta por um homem e uma mulher, e que ao longo dos anos 
essa família se expandira com o surgimento dos filhos e que, a partir desse 
surgimento, a família passara a ter mais responsabilidades. Responsabilidades 
estas que inclui educação, criação e proteção dessa criança. 
Para Antunes (2001), a família constitui-se do casal de pais, em que ambos 
os sexos seguem os padrões tradicionais da sociedade. 
Para ressaltarmos ainda sobre a importância da família para a criança, a 
Constituição Federal, que é a lei maior de nosso país em seu art. 227, nos diz que: 
 
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à 
criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o 
direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à 
31 
 
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à 
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de 
toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, 
crueldade e opressão. (VADE MECUM SARAIVA, 2011, p. 79) 
 
Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) em seu Art. 19, diz que: 
“Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua 
família e, excepcionalmente, em família substituta.” (VADE MECUM SARAIVA, 2011, 
p. 1080). 
Gomes (2005, p. 27) ressalta que: “É interessante perceber que este elenco 
normativo não só se refere à proteção da criança e do adolescente, como também à 
assistência e à proteção da família, quando do exercício de suas funções.” É notório, 
também, que não só a família é responsável pela criança, mas a sociedade e o 
Estado devem contribuir juntos para que todos esses direitos sejam garantidos a 
elas. E que a família tem o dever de educá-las, sendo esta família consanguínea ou 
não. 
Percebe-se que ao longo dos anos ocorreram mudanças significativas na 
família e na forma de ver as crianças. Hoje, o infante tornou-se sujeito das 
preocupações e cuidados dos adultos. Na atualidade, a família preocupa-se com o 
que elas vão vestir, quais brincadeiras e brinquedos podem brincar, com a saúde e 
educação delas. A criança também é vista como um ser social, com fases de idades 
que devem se respeitadas. 
Como afirma Piaget (2010, p. 138): “a infância é uma etapa biologicamente 
útil, cujo significado é o de uma adaptação progressiva ao meio físico e social”. 
Desse modo, a infância é uma etapa em que o indivíduo está em desenvolvimento, 
implicando a necessidade de uma série de demandas que atenderão à sua 
formação enquanto ser social, como por exemplo, a educação. 
Portanto, foi possível chegarmos à conclusão de que a infância é um 
fenômeno histórico, e com o passar dos anos foram se multiplicando as ações e 
propostas dirigidas a essa fase inicial da vida, cujas propostas estão na educação, 
na saúde e nas políticas públicas, enfim nas diversas esferas da sociedade 
contemporânea. 
Segundo Ariès (1981, p. 163), 
 
As crianças são plantas jovens que é preciso cultivar e regar com 
frequência: alguns conselhos dados na hora certa, algumas 
32 
 
demonstrações de ternura e amizade feitas de tempos em tempos as 
comovem e as conquistam. Algumas carícias, alguns presentinhos, 
algumas palavrasde confiança e cordialidade impressionam seu 
espírito, e poucas são as que resistem a esses meios doces e fáceis 
de transformá-las em pessoas honradas e probas. A preocupação 
era sempre a de fazer dessas crianças pessoas honradas e probas e 
homens racionais. 
 
Portanto, a maneira como a infância é vista atualmente é consequência das 
constantes transformações pelas quais passamos, e é importante nos darmos conta 
dessas transformações, para que possamos compreender a dimensão que a 
infância ocupa no mundo contemporâneo. 
 
3.3 Uma Infância à Margem 
 
Sob uma perspectiva sociológica, podemos iniciar esta seção reiterando o 
que muitos estudiosos pensam sobre a infância, convergindo para um alinhamento 
de um assunto delicado e que requer permanente atenção de instituições e 
indivíduos, que podem contribuir com a manutenção das garantias dos direitos 
conquistados para essa parcela de pessoas. Para tanto, Dimenstein (1995) 
comenta: 
 
A criança é o elo mais fraco e exposto da cadeia social. Se um país é 
uma árvore, a criança é um fruto. E está para o progresso social e 
econômico, como a semente para a plantação. Nenhuma nação 
conseguiu progredir sem investir na educação, o que significa investir 
na infância. Por um motivo bem simples: ninguém planta nada se não 
tiver uma semente. (DIMENSTEIN, 1995, p. 8) 
 
Esse pensamento do autor confirma a permanente condição ascensional que 
temos que proporcionar às crianças, em que sua atuação na sociedade pode 
decorrer das melhorias que oferecemos a elas, especialmente às marginalizadas. 
Diante desse contexto, esperamos que a criança deixe essa posição periférica na 
sociedade, cujas consequências podem causar efeitos negativos na sua maturação, 
enquanto ser biológico e social. 
Numa visão mais ampliada, citamos Pauletti (2012) que diz: 
 
A infância é uma fase muito importante no desenvolvimento da 
criança, principalmente em relação à família, quando se constroem 
vínculos afetivos e direcionamento moral, que influenciam na 
33 
 
formação do caráter, preparando-as para a adolescência, que é o 
período de profundas modificações físicas, psicológicas e sociais. 
Essa etapa, entretanto, exige acompanhamento familiar, 
educacional, social e religioso. Mas, infelizmente, a problemática da 
infância e da adolescência continua presente a cada dia e se tornou 
um problema constante no mundo contemporâneo e um assunto 
bastante tratado por escritores, sociólogos, psicólogos etc. 
(PAULETTI, 2012, p. 39) 
 
Nesse sentido, a autora afirma que a família é o alicerce para o bom 
desenvolvimento da criança no convívio em sociedade, pois nesse estágio o 
indivíduo está em constante transformação e, naturalmente, carece de uma 
formação que atenda às suas demandas existenciais. 
A criança marginal, no sentido de estar excluída (à margem) ou de cometer 
delitos na sociedade, representada na dimensão literária nos dá um certo retrato do 
painel social das condições de vida a que ela é submetida. 
 Muitos fatores contribuem para a marginalização das crianças, como a falta 
de um apoio familiar, as desigualdades sociais entre ricos e pobres, bem como a 
desassistência por parte do governo para esses sujeitos (PAULETTI, 2012, p. 62). 
 Em se tratando de marginalização de crianças e adolescentes, de acordo com 
Mello (2006) há alguns fatores que identificam a condição de marginal e 
marginalizado, segundo a autora esses fatores estão ligados à condição de pobreza 
no meio urbano. Assim, são as pessoas que estão à margem, localizadas nas 
favelas e subúrbio das grandes metrópoles, as famílias de baixa renda, 
desempregados e os migrantes rurais, ou seja, são todos aqueles que incomodam e 
são considerados como problemas para os ricos. 
 Segundo Mello (2006, p. 12), “[...] a questão da marginalidade social 
configura-se como um desajuste, uma disfunção corrigível do sistema sem a 
necessidade de transformá-lo.” Portanto, as alterações possíveis para uma condição 
mais favorável de vida social ao indivíduo são pertinentes, considerando as 
peculiaridades de cada estrato social, sejam crianças ou adultos. 
 A propósito Mello (2006) ainda nos diz que: 
 
Podemos apontar que a marginalização não se constitui em um 
problema de integração em uma sociedade considerada harmônica, 
mas é decorrente de contradições fundamentais, iminentes ao 
desenvolvimento brasileiro, capitalista e dependente, que pode ser 
compreendida no contexto histórico de uma estrutura social forjada 
34 
 
através do conflito com contradições que se expressam de várias 
formas e em diversos níveis. (MELLO, 2006, p. 12) 
 
 Nesse sentido, a condição de marginalização é resultado de alguns 
problemas de ordem estruturante e sistemática da vida social, numa perspectiva 
sociohistórica. Segundo Mello (2006, p. 12), “[...] o homem não é um ser 
marginalizado porque não participa e não porque seja um desajustado, mas porque 
existem relações na sociedade que determinam sua exclusão e sua própria condição 
de ‘marginal’”. 
Mello (2006) afirma ainda que: 
 
[...] o conceito de marginalidade social indica a situação de amplas 
camadas da população que vive em condições desiguais e 
desumanas, tanto no que se refere à repartição desigual dos bens de 
consumo gerados pela economia de mercado, quanto pela esfera de 
produção. A marginalidade social exprime, portanto, uma relação de 
dominação, que envolve a vida no seu conjunto. (MELLO, 2006, p. 
12) 
 
Percebe-se que, através do conceito de marginalização social, não existe 
apenas um tipo de pessoa marginalizada, mas vários tipos de marginalização social, 
pessoas essas que vivem em condições desiguais e desumanas na sociedade. E 
essas desigualdades estão ligadas à má distribuição de renda e de produção. Nesse 
sentido, o meio social é que cria formas de exclusão. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
35 
 
4 A INFÂNCIA EM CAPITÃES DA AREIA 
 
Antes de falarmos das representações da infância na narrativa de Jorge 
Amado, é importante discorremos também, ainda que brevemente, o que vem a ser 
essas representações. Tomaremos como base a ideia apresentada por Anderson 
Luís Nunes da Mata (2010) na sua dissertação de mestrado, intitulada “O silêncio 
das crianças: representações da infância na narrativa brasileira contemporânea”. 
Segundo o autor “o termo representação é utilizado em várias línguas, para 
designar diversos processos: a ação do ator em cena, a configuração de elementos 
ficcionais num enredo e a relação entre eleitores e eleitos no processo político.” 
(MATA, 2010, p. 12). De acordo com Mata (2010), esses três casos mencionados, 
“pretendem falar em nome de alguém, seja o autor com relação ao seu personagem, 
seja o escritor com o seu entrecho ou o agente político com seu eleitor” (MATA, 
2010, p. 12). No caso deste estudo, o que vai nos interessar é a configuração de 
elementos ficcionais no enredo de Capitães da Areia, especialmente as 
personagens e o narrador. 
 Ainda de acordo com o autor supracitado “[...] essa representação não ocorre 
sem modificações, sem uma operação configuracional” (MATA, 2010, p. 12). Pois 
como ele afirma que: “A perspectiva da infância apresentada na literatura não se 
mostra falando em nome próprio”. (MATA, 2010, p. 12). Segundo ele “a criança não 
é reconhecida como escritor”, pois é um papel do autor representar a criança e dar a 
ela a voz de um adulto dentro da literatura e também mostrar pontos de vista 
diferentes sobre ela. 
Anderson da Mata (2010, p. 17) assinala que: 
 
A infância foi explorada por gerações de escritores, realistas e 
modernistas, como tempo de passagem para a vida adulta, tema 
frequentemente trazido à tona de modo simbólico e, ele mesmo, 
símbolo que condensa tensões, traumas e contradições com vistas a 
uma condição humana de feição mais adulta que infantil. 
 
A propósito, a infância esteve presente em muitas narrativas da literatura 
brasileira, como em: Infância,de Graciliano Ramos; Menino de Engenho, de José 
Lins do Rego e os Cavalinhos de Platiplanto e Sombras de reis barbudos, de José J. 
Veiga (MATA, 2010, p. 19). E na narrativa do escritor Jorge Amado a criança 
também ganha destaque a respeito da sua condição social. Na obra Capitães da 
36 
 
Areia que será analisada neste capítulo, iremos mostrar alguns aspectos que 
julgamos terem levado essas crianças à marginalização. Como afirma Pauletti 
(2012): 
 
Jorge Amado dedicou-se aos marginalizados, como os menores 
abandonados, o povo oprimido e injustiçado das classes mais pobres 
e populares e registrou em suas obras experiências que ele mesmo 
vivenciou. Em Capitães da Areia, ele ressalta a oposição entre ricos 
e pobres, entre a burguesia e as crianças abandonadas, mas 
também mostra as diferenças no plano da religião e dos direitos 
humanos, deixando-nos a certeza de que seus personagens são 
frutos do meio em que vivem, refletindo em seus atos a própria 
realidade. (PAULETTI, 2012, p. 63) 
 
A seguir, apresentaremos o resumo da narrativa selecionada para esta 
pesquisa, evidenciando, naturalmente, a presença da infância relacionada à 
marginalização da criança, como fora citado. 
 
4.1 Infância e Marginalização 
 
 Capitães da Areia é um romance que trata da problemática do menor 
abandonado e das suas consequências: a violência, a criminalidade, a discriminação 
e a prostituição. A narrativa inicia-se com uma sequência de Cartas à Redação do 
Jornal da Tarde: Carta do Secretário do Chefe de Polícia; Carta do doutor Juiz de 
Menores; Carta de uma Mãe Costureira; Carta do Padre José Pedro; Carta do 
Diretor do Reformatório. Todas essas cartas tinham a intenção de debater sobre as 
questões referentes a essas crianças que vivem do furto e que infestavam a cidade. 
 A narrativa divide-se em três partes: a primeira “Sob a lua num velho trapiche 
abandonado”, a segunda “Noite da grande paz, da grande paz dos teus olhos” e a 
terceira “Canção da Bahia, Canção da liberdade”. 
Na primeira parte, há a apresentação do ambiente familiar dos capitães da 
areia, local onde todas as ações do grupo acontece, um lugar que no passado foi 
movimento, mas que se tornou um ambiente sujo e infestado de ratos. Esse capítulo 
além de apresentar o trapiche (armazém abandonado) também caracteriza o bando 
dos capitães da areia chefiados por Pedro Bala, um menino de quinze anos, que 
ganhou o direito de liderança, após uma “briga de foice”. Loiro com uma cicatriz no 
rosto passou a ser uma espécie de pai para os garotos. Ele tinha a autoridade 
37 
 
necessária para liderar o grupo, agilidade e, acima de tudo, tornou-se um exemplo 
para aqueles meninos (mais tarde sabe-se que Bala era filho de sindicalista 
importante que morreu lutando pelos direitos de toda a classe dos trabalhadores 
iguais a ele). João José (Professor) era uma espécie de intelectual do grupo, o 
único, dentre eles, que sabe ler, tem pilhas de livros roubados das bibliotecas, que 
são o seu tesouro, e, apesar de não ter estudado, mostra uma visão profunda sobre 
a miséria em que vivem os meninos, e ao decorrer da obra, faz reflexões sobre os 
momentos passados por eles, mostra uma sensibilidade profunda, mesmo sendo um 
garoto de quatorze anos. Gato era um malandro, usava sua esperteza para 
conseguir “se dar bem na vida”, apesar de sua pouca idade, é o galanteador das 
prostitutas. Sem-pernas era o ódio em pessoa. Desde pequeno aprendera a odiar a 
tudo e a todos, até mesmo quando amava. Fingia-se de órfão desamparado e se 
aproveitava de suas vítimas para roubá-las. João Grande era o “negro bom” como 
dizia Pedro Bala. Tinha esse nome por causa de sua estatura que era maior do que 
a de todos. Pirulito também se destaca pelo seu infinito amor pela religião, por Deus 
e Jesus Cristo. Boa-Vida, malandro nato, que vive de enganar trouxas nas apostas 
de baralho; e Volta Seca, sertanejo com um grande amor às suas origens, que vive 
na espera de um dia ir embora do grupo para fazer parte do bando de Lampião, seu 
padrinho. 
Na segunda parte do romance, o autor conta a história amorosa entre o chefe 
dos capitães da areia (Pedro Bala) e Dora, a única figura feminina a se unir ao 
bando e que despertou em Pedro Bala um dos mais lindos sentimentos, o amor. Em 
seus delírios ela era a “estrela” que o guiava e o conduzia ao mais profundo lugar do 
seu coração, ela lhe trazia muita paz, mesmo com duração de poucos segundos; o 
amor dos dois fez com que professor conhecesse um sentimento não correspondido, 
pois o mesmo a amava. Dora também é retratada como símbolo materno, pois, era 
nas carícias dela que o Sem-Pernas sonhava com o calor de sua mãe. No final do 
segundo capítulo, Dora morre, após uma linda noite de amor com Pedro Bala. Ela 
estava muito doente, tinha pego alastrim (bexiga negra), um tipo de doença da 
época. 
“Canção da Bahia, Canção da Liberdade” é o desfecho do romance, nesta 
parte é narrada à separação dos capitães da areia. Cada um tem um destino 
diferente. Boa-vida continua sendo malandro, e tocando samba nos bares; Pirulito 
como era religioso foi para o seminário e se tonou padre; Gato continua na vida 
38 
 
sendo um explorador de mulheres; Sem-Pernas morre, fugindo da polícia; e Volta- 
Seca se alia ao grupo de Lampião, os demais se tornam revolucionários. Como é o 
caso de Pedro Bala, que seguiu seu destino como organizador de greves e João 
José, o Professor, que vai embora para o Rio de Janeiro e se tona um pintor famoso. 
A infância na obra de Jorge Amado configura-se em diversos aspectos, como: 
a relação criança/família, a relação criança/adulto e a relação criança/rua. Esses 
aspectos podem ser apontados na obra Capitães da Areia, evidenciando-se nos 
componentes estruturais da narrativa: personagem e narrador, como veremos a 
seguir. 
 
4.1.1 A construção das personagens 
 
O romance Capitães da Areia traz em sua narrativa vários aspectos de cunho 
social, vivenciados pelas personagens do enredo, porém só serão abordados os três 
aspectos citados anteriormente que julgamos relevantes para esta pesquisa. 
O primeiro aspecto que será analisado é a relação criança/família, no caso 
mais específico a ausência desta na vida das personagens crianças. É possível 
observarmos que a família tradicional, composta pelo pai e pela mãe, é de suma 
importância na vida da criança e do adolescente, pois ela se caracteriza como sendo 
a base para o bom desenvolvimento das etapas da vida do ser humano, conforme 
atesta Ariès (1981) anteriormente. Vale salientar que é nessa fase da vida que a 
criança está formando seu caráter. 
No romance Capitães da Areia existia a ausência de uma família tradicional, 
pois em razão dessa ausência as crianças sentiam falta de amor, carinho e de um 
colo maternal. Essa falta de afeto e de uma mãe fica evidente no seguinte trecho: 
 
[...] – Está chorando, meu filho? – e desapareceu da janela para vir 
para junto dele. 
Só então o Sem-Pernas viu que estava mesmo chorando, limpou as 
lágrimas, mordeu a mão. Dona Ester chegava para junto dele: 
– Está chorando, Augusto? Aconteceu alguma coisa? 
– Não, senhora. Não estou chorando, não... 
– Não minta, meu filho. Bem que eu vejo... O que passou? Está se 
lembrando da sua mãe? 
E o trouxe para junto de si, sentou-se no banco, encostou a cabeça 
do Sem-Pernas no seu seio maternal. 
– Não chore por sua mãe. Agora você tem outra mãezinha que lhe 
quer bem e fará tudo para substituir a que você perdeu... (... e ele 
39 
 
faria tudo para substituir o filho que ela perdera, ouviu o Sem-Pernas 
dentro de si). 
Dona Ester o beijou na face onde as lágrimas corriam: 
– Não chore, que sua mãezinha fica triste. 
Então os lábios do Sem-Pernas se descerraram e ele soluçou, 
chorou muito encostado ao peito de sua mãe. E enquanto a abraçava 
e se deixava beijar, soluçava porque a ia abandonar e, mais que 
isso, a ia roubar. E ela talvez nunca soubesse

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