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13 14 Sumário Realismo .................................................... 4 Contexto histórico do Realismo ...................................................................... 7 Realismo na Europa ........................................................................................ 8 Realismo em Portugal .................................................................................... 11 Manifestações do Realismo em Portugal ........................................................ 12 Realismo no Brasil .......................................................................................... 16 Prosa realista brasileira ................................................................................... 17 A prosa machadiana ....................................................................................... 19 Naturalismo .............................................. 31 Contexto histórico do Naturalismo na Europa ................................................. 35 Literatura realista X literatura naturalista ....................................................... 36 Naturalismo no Brasil ..................................................................................... 38 Prosa naturalista brasileira ............................................................................. 39 Influências do Naturalismo na contemporaneidade ....................................... 41 Acesse o livro digital e conheça os objetos digitais e slides deste volume. Realismo Ponto de partida 1 1. A cena representa o mundo do trabalho, uma das temáticas frequentes da estética realista. Como os corpos dos trabalhadores estão retratados? 2. Outro aspecto que se pode notar nessa imagem é a ausência de detalhes do rosto das pessoas. Elabore uma hipótese que justifique essa escolha por parte do artista que produziu a obra. 3. Como você descreveria o espaço da fábrica em que se encontram os trabalhadores? Ele lembra as representa- ções da natureza segundo a estética clássica? Justifique sua resposta. 13 MENZEL, Adolph. Moinho de rolamento de ferro. 1875. 1 óleo sobre tela, color., 158 cm × 254 cm. Alte Nationalgalerie, Berlim. 4 Lendo a literatura 2 Orientações. anelavam: tinham formato de anel. crestada: queimada. cinzelador: aquele que utiliza um cinzel; escultor. compreender os fatores que influenciaram o surgimento da estética realista; conhecer os aspectos centrais que determinaram o Realismo europeu, mais especificamente o Realismo português; identificar as principais características do Realismo no Brasil; conhecer a obra literária de Machado de Assis. o surgimento da estética realista; naram o Realismo europeu, mais especificamente o Objetivos da unidade: Leia um trecho do romance Madame Bovary. Publicado em 1857, ele narra a história de uma jovem chamada Ema. Criada no campo, ela deseja viver uma vida burguesa, semelhante àquela dos livros que lia. Casa-se com um médico, Carlos, que não tinha grandes ambições na vida. Frustrada com a vida entediante que leva, Ema começa a ter relaciona- mentos extraconjugais como uma válvula de escape. No trecho, o narrador explora os sentimentos de rejeição nutridos por Ema em relação a seu marido em contraposição aos afetos sentidos por Rodolfo, seu amante. [...] Essa ternura, na verdade, aumentava dia a dia, com a repulsa pelo marido, e, quanto mais ela se dedicava a um, tanto mais detestava o outro. Carlos jamais lhe percebera tão desagradável, os dedos tão rudes, o espírito tão lerdo, as maneiras tão vulgares, como depois de seus encontros com Rodolfo, depois que haviam estado juntos. Então, mesmo fazendo-se de esposa virtuosa, inflamava-lhe à lembrança daquela cabeça cujos cabelos se anelavam na fronte crestada, daquele busto ao mesmo tempo robusto e elegante, daquele homem, afinal, que possuía tanta experiência na razão, tanto arrebatamento no desejo! Era para ele que limava as unhas com um cuidado de cinzelador, e por quem nunca achava estar com suficiente creme na pele, nem bastante per- fume nos lenços. Carregava-se de pulseiras, de anéis, de colares. [...] Em consequência de suas relações amorosas, a Sra. Bovary mudou de conduta. Seu olhar se fez mais ousado, mais livre as palavras. Foi inconveniente ao ponto de passear, com Rodolfo, cigarro na boca, “como a afrontar o mundo”. Afinal, os que ainda duvidavam deixaram de fazê-lo, quando a viram descer, um dia, da Andorinha, o busto apertado num colete, como um homem. E a mãe de Carlos, que viera refugiar-se na casa do filho, após uma cena terrível com o marido, não fi- cou menos escandalizada. Muitas outras coisas lhe desagradaram: em primeiro lugar, Carlos não tinha ouvido seus conselhos sobre a proibição dos roman- ces; depois eram os “costumes da casa” que desa- gradavam. Ousou fazer observações e zangaram-se, principalmente uma vez, a propósito de Felicidade. D KO E st ú d io . 2 01 5. D ig ita l. 5 [...] Em co mudou asas pala RoR dol oso qu vvira nunununnun D KO E st ú d io . 2 01 5. D ig ita l. agastou: irritou. exasperação: acirramento; desentendimento. Gustave Flaubert nasceu em Rouen, na França, em 1821. A maneira com que desenvolveu os elementos psicológicos de seus personagens provocou uma mudança importante no modo como os romances passaram a ser escritos. Morreu em 1880, em Croisset, na região da Normandia. A velha senhora, atravessando o corredor, na véspera à noite, surpreendera a criada na companhia de um homem de gravata parda, de uns quarenta anos, mais ou menos, que fugira depressa da cozinha, ao ruído de seus passos. Ema achou graça naquilo, mas a boa mulher se agastou e disse que deviam fiscalizar os criados, a menos que se quisesse rir dos bons costumes. — De que mundo é a senhora? — redarguiu a moça, com um olhar de tal forma impertinente, que a outra lhe perguntou se não estava defendendo a própria causa. Ema levantou-se de um salto: — Saia! — bradou. — Ema! Mamãe! — gritou Carlos, tentando apaziguá-las. Mas as duas se foram, no calor da exasperação. FLAUBERT, Gustave. Madame Bovary. São Paulo: Abril Cultural, 1971. p. 143, 146-147. 1. Identifique no texto elementos que revelem a insatisfa- ção da protagonista com seu casamento. A postura de Ema em relação a seu marido pode ser considerada uma indicação de sua insatisfação com o casamento: “Carlos jamais lhe percebera tão desagradável, os dedos tão rudes, o espírito tão lerdo, as maneiras tão vulgares”. 2. Ao comparar os modos de Carlos e Rodolfo, revelam- -se ao leitor dois personagens-tipo, representando, cada um deles, uma diferente origem econômica e so- cial. Quais são esses tipos? A comparação entre Carlos e Rodolfo revela dois personagens- -tipo: o primeiro, rude e sem modos; o outro, sofisticado. Do ponto de vista social, pode-se inferir que cada um deles representa um estereótipo que podia ser visto nas cidades: o rude, de origem pobre, e o rico, de origem aristocrata. 3. Leia as alternativas e selecione as que lhe parecerem corretas em se tratando do uso da linguagem no roman- ce. Justifique sua escolha. a) Detalhista, pois procura descrever os traços es- pecíficos de cada personagem, a fim de construir para o leitor uma imagem dos tipos sociais que existiam na França em meados do século XIX. b) Superficial, pois tenta rapidamente fornecer as informações que julga prioritárias sobre cada personagem para que o leitor possa tirar suas próprias conclusões sobre seus comportamentos. c) Objetiva, pois tenta descrever cada personagem de modo que não deixe dúvidas para o leitor sobre as características de cada um. Pessoal. Pode-se dizer que o trecho lido apresenta uma mistura dessas três formas de compor a linguagem literária. O importante nesta atividade é a justificativa que os alunos darão a respeito do modo como interpretaram o uso da linguagem, preferencialmente destacando e mencionando trechos presentes no fragmento. D anie l Kl ei n. 20 15 . D ig ita l. 6 Volume 7 Acontecia 4. Diz o narrador: “Em consequência de suas relações amorosas, a Sra. Bovary mudou de conduta”. O nar- rador não revela diretamente ao leitor como Ema era antes de conhecer Rodolfo. Entretanto, pode-se inferir o comportamento da personagem. Indique duas possí- veis características da conduta de Ema antes de envol- ver-se com Rodolfo e as justifique. Pelo que se pode depreender do texto, Ema era, antes de seu contato com Rodolfo, mais tímida, mais reservada em suas atitudes e menos “ousada” em enfrentar o mundo, ou seja, mais recatada em seus gestos, a fim de chamar menos a atenção para si. 5. Como se pode interpretar o conflito entre Ema e sua sogra? A diferença de comportamento entre Ema e a mãe de Carlos simboliza um choque entre gerações e suas diferentes visões de mundo. 6. Para você, a personagem Ema conserva características de uma heroína romântica? Justifique sua resposta. Pessoal. É possível que os alunos defendam a ideia de Ema ser uma personagem ainda impregnada de elementos românticos, considerando, por exemplo, a forma liberal como lida com os criados ou como se veste. Nesse caso, vale a pena chamar a atenção para o fato de a traição de Ema ser algo moralmente repreensível segundo os padrões da época em que o romance foi publicado. Isso faz com que a personagem não seja uma mulher idealizada, como eram, em geral, as personagens femininas no Romantismo. Contexto histórico do Realismo Se, na primeira metade do século XIX, o Romantismo dominou a cena artística em boa parte do mundo ocidental, a partir da segunda parte desse mesmo século a estética romântica começou a mostrar sinais de esgotamento. A visão de mundo romântica vinculava-se à afirmação do modo de vida burguês, mas sempre em uma perspectiva dupla: de um lado, uma crítica ferrenha às ambições burguesas de tomada de poder e da afirmação de valores mercantis como absolutos e, de outro, as aspirações pelo ideal de liberdade e igualdade. Com o tempo, porém, um discurso racionalista começa a se firmar, influenciando a produção literária, artística, científica, filosófica e outras. Os desdobramentos da Revolução Industrial, como a urbanização crescente mas desordenada das cidades e os avanços técnico-científicos, demandavam um novo olhar para a realidade. Os leitores, que até então consumiam a literatura romântica ofertada pelos folhetins, passaram a se mostrar mais exigentes no que dizia respeito a com- preender as transformações que ocorriam. O deslocamento de uma grande massa de trabalhadores do campo para as cidades, em busca de empregos nas indústrias que surgiam, alterava o cenário urbano ao criar aglomerados de casas em espaços anteriormente desabitados. Além disso, as fábricas ofereciam péssimas condições aos trabalhadores, que cumpriam jornadas de trabalho de muitas horas e recebiam salários baixíssimos. As contradições do capitalismo se impunham dia- riamente: em um mundo em que o desenvolvimento era acelerado, a pobreza se multiplicava entre a maioria da população. Literatura 7 Sugestão de pesquisa.3 Olhar literário Por causa da publicação do romance Madame Bovary, Gustave Flaubert foi perseguido pela justiça. Logo que sur- giu, essa obra causou enorme interesse no público leitor. As autoridades, porém, acusavam o romance de ser um atenta- do à moralidade e à religião. Flaubert foi então indiciado, juntamente com Laurent Pichat, diretor da revista Revue de Paris, em que o texto foi publicado pela pri- meira vez, na forma de episódios. Esse escândalo provocou o interesse de mais e mais leitores, motivando uma vendagem enorme. A necessidade de entender as transformações pelas quais o mundo passava na época impulsionou uma forte onda cientificista, que determinou o surgimento de novas formas do pensar. As ciências naturais, incluindo-se aí a Medicina, apropriaram-se de discursos que tentavam desvendar os mecanismos mais profundos da realidade material. Algumas correntes da Filosofia passam a defender a ideia de que tudo que existe no Universo está submetido a leis imutáveis e necessárias. Surge a Sociologia como um campo do conhecimento voltado para o entendimento das dinâmicas e estratégias de convívio entre os homens. Três grandes correntes de pensamento surgiram nesse momento como principais maneiras de interpretar o homem e a realidade que o cerca: Positivismo – criado pelo filósofo e pai da Sociologia Auguste Comte, defendia que o único saber realmente válido é o cien- tífico e que tanto o homem quanto a realidade somente podem ser explicados pelo conhecimento das Leis Naturais. Esse conhecimento seguia um caminho metodológico formado por três etapas: observação, experiência e comparação. Darwinismo ou Evolucionismo – teve como figura proeminente o cientista Charles Darwin e baseava-se em conceitos como o de seleção natural e adaptabilidade do indivíduo/espécie ao meio (somente os mais aptos sobrevivem na disputa entre os seres pela sobrevivência). Determinismo – desenvolvido pelo intelectual francês Hippolyte Taine, partia da premissa de que o comportamento humano é determinado por três fatores: meio social, raça e momento histórico. Realismo na Europa O Realismo teve sua origem na Europa, em meados do século XIX. Estudio- sos apontam como marco dessa estética a publicação do romance Madame Bovary, em 1857, de autoria do francês Gustave Flaubert. Realismo foi o termo adotado por artistas, escritores e intelectuais para se referir a uma tendência que começou a surgir na literatura e nas artes no período final do Romantismo. Entre as décadas de 1850 e 1860, surgiu a preocupação em utilizar a arte e a literatura como meios para denunciar os problemas sociais, diferentemente das preocupações com uma literatura e arte nacionalistas do início do Romantismo e contrariamente ao pessimismo e ao egocentrismo que marcaram algumas obras do ultrarromantismo. O in- teresse pela vida real, representando personagens menos idealizados e mais próximos do modo de ser de pessoas que viviam dilemas sociais, constituiu-se progressivamente como uma das tarefas do exercício literário. Ao contrário do artista romântico, preocupado em expressar seu indivi- dualismo emocional, alguns escritores produzem narrativas em que a vida moderna das cidades se torna um dos eixos principais. Nas obras realistas, o autor não busca uma realidade sublime em que a força do amor e da pai- xão se transforma na condição de ultrapassar as dificuldades impostas pela 8 Volume 7 Orientações para a leitura da obra de Daumier.4 Sugestão de atividades: questões de 1 a 3 da seção Hora de estudo. realidade; ele busca descrever uma realidade, mesmo que ela seja brutal. Segundo a estética realista, fatos comuns e ordinários, acontecimentos vulgares, vida cotidiana vivida pelas pessoas simples são temas que devem ser registrados pela literatura e pelas artes. Dessa forma, a finalidade da arte no Realismo não é, necessariamente, a representação da beleza no sentido clás- sico. A arte realista deixa de lado o historicismo da primeira geração romântica, na medida em que se volta para a ob- servação do tempo presente, desafiando as normas estabelecidas pela tradição artística. A obra de arte realista busca uma representação objetiva da realidade, não se poupando de descrever os aspectos mais duros do comportamento humano. Seus temas incluem assuntos considerados vulgares ou mesmo tabus no período: adultério, exploração do homem pelo homem, instituições ligadas à Igreja, modo de vida burguês. A representação da realidade social e de suas mazelas passa a ser o foco da prosa (romances e contos), que domi- na a produção literária no Realismo. Nas artes plásticas, a caricatura assume um lugar de destaque, tornando-se uma espécie de registro dessa época. Veiculada por meio dos jornais, que vinham se popularizando desde o Romantismo, a caricaturaexpressa não somente as cenas da vida comum típicas da sociedade urbana, com seus tipos sociais diver- sificados, mas também assume um papel político ao sintetizar os acontecimentos relacionados às disputas de poder. A obra do pintor Honoré Daumier exemplifica o Realismo nas artes plásticas. É de Daumier a frase “um artista deve fazer parte do seu próprio tempo”. Para ele, a arte deve evidenciar um aspecto político e social. Em sua tela O vagão da terceira classe, o pintor elege como objeto de sua crítica à sociedade a vida difícil de parte da população que era considerada inferior às demais. Diferentemente de outros artistas plásticos, que procuram, nos detalhes e acabamentos, deixar a representação de pessoas e objetos semelhante a uma visão perfei- tamente acabada, Daumier somente esboça as figuras humanas, a ponto de retirar-lhes a própria identidade. Cada pessoa representada nessa pintura não passa de mais uma na enorme massa de trabalhadores que circula pela cidade. O vagão parece repleto, como se as pessoas ao fundo, apertadas umas contra as outras, estivessem em busca de uma posição confortável para realizar sua viagem. Em contraposição ao estilo presente nas pinturas do período romântico, não se distingue, ao fundo, senão uma massa humana, com rosto sem expressão. DAUMIER, Honoré. O vagão da terceira classe. 1862. 1 óleo sobre tela, color., 67 cm × 93 cm. Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque. © M et ro p ol ita n M u se u m o f A rt , N ew Y or k/ Fo tó g ra fo d es co n h ec id o Literatura 9 Atividades Sugestão de ampliação da atividade 5.5 1. Observe esta pintura realista. COURBET, Gustave. Os cortadores de pedra. 1849. 1 óleo sobre tela, color., 165 cm × 257 cm. Galerie Neue Meister, Dresden. Indique a afirmação que não corresponde a caracterís- ticas do Realismo. Em seguida, justifique sua escolha. ( ) Nessa pintura, é possível observar a preocupação em descrever uma ação humana voltada para o mundo do trabalho. Essa escolha temática diferen- cia essa obra daquelas elaboradas pelos pintores românticos, mais voltados para a pintura histórica ou para a representação de cenas exóticas. ( ) Um dos fatores que chama a atenção nessa pin- tura é a não representação do rosto das figuras humanas que se encontram executando a árdua tarefa de quebrar pedras. A ausência do rosto in- dica o caráter social da pintura realista, que não se fixa na representação de uma figura específica, mas, sim, na categoria geral dos trabalhadores que são explorados pelo sistema burguês. ( X ) A imagem do homem trabalhando representa, como uma de suas interpretações possíveis, a for- ça de transformação da natureza pela ação huma- na. Esse tema recorrente, que atravessa a cultura ocidental desde a mitologia clássica, é resgatado pelo Realismo como um aspecto positivo da rela- ção entre o homem e a realidade a seu redor. A estética realista não se vale de elementos originários da cultura clássica. 2. O cientificismo manifestou-se em uma série de ideias que se desenvolveram em várias frentes do saber no século XIX. Entre elas, destacam-se: I. O evolucionismo de Charles Darwin. II. O positivismo de Auguste Comte. III. O heliocentrismo de Copérnico. IV. O idealismo de Platão. Estão corretas as afirmações ( X ) I e II. ( ) IV e III. ( ) III e II. ( ) I e IV. ( ) Todas. 3. Indique, do ponto de vista do estilo, uma diferença en- tre a arte realista e a romântica. Pessoal. Sugestão: a objetividade realista X a subjetividade romântica. 4. Em que aspectos se pode considerar o Realismo como uma crítica à concepção romântica da realidade? O Realismo, diferentemente do Romantismo que o precedeu, não apresentava a realidade com base em uma visão idealizada. O projeto estético realista se baseava na proposta de “ver a vida como ela é”, sem minimizar seus problemas. 5. “Considerada, em primeiro lugar, em sua acepção mais antiga e mais comum, a palavra positivo designa o real em oposição ao quimé- rico [...]”. COMTE, Auguste. Discurso preliminar sobre o espírito positivo. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/ texto/cv000028.pdf>. Acesso em: 17 mar. 2015. Nessa frase, Auguste Comte opõe a ideia de positivo a quimérico (ideal). Do ponto de vista estético, o quimé- rico pode ser associado X a) ao Romantismo. b) ao determinismo. c) à Arte Clássica. d) ao Barroco. e) ao Realismo. 10 Volume 7 andersondino@hotmail.com Sticky Note tarefa paera 11 e 12/06 Olhar literário Na fotografia, da esquerda para a direita, estão: Eça de Queirós, Oliveira Martins, Antero de Quental, Ramalho Ortigão e Guerra Junqueiro Realismo em Portugal O surgimento do Realismo em Portugal pode ser associado a diversos fatores: há muito tempo, a nação portuguesa deixara de ser um dos centros da expansão mundial, envolvida com os fluxos marítimos que determinaram a coloniza- ção europeia da América, bem como a expansão comercial rumo ao Oriente. A sociedade portuguesa vivia um período de grande estagnação: se comparada a outros países europeus, em que a dinâmica do capitalismo impulsionava gran- des transformações econômicas e sociais, a sociedade lusitana mantinha-se vinculada a estruturas antigas, com um estado fortemente ligado à Igreja, com poucas indústrias e com uma produção agrícola atrelada a formas de produção superadas. A população, composta de mais ou menos 80% de analfabetos, encontrava-se distante das formas culturais e artísticas que circulavam pelo continente e, consequentemente, os avanços das ciências e das tecnologias pouco eram compartilhados entre os portugueses. Nesse contexto, a estética realista desempenhou um papel de crítica profunda aos acontecimentos ocorridos na sociedade portuguesa. Um grupo de jovens intelectuais, conhecidos como a Geração de 70, passou a defender a tran- sição da estética literária romântica para uma expressão focada na denúncia dos males da sociedade, sociedade esta que consideravam retrógrada, não apenas pela forte presença da estética romântica (que ainda idealizava as origens medievais do povo português e seu projeto de uma grande nação), mas também no intuito de entrar em sintonia com os centros mais avançados da Europa. No ano de 1865, um acontecimento foi decisivo para que se delineasse um limite entre um conjunto de escritores apegados aos modos de escrita próprios do Romantismo e um grupo de jovens que buscava novas formas de expres- são artística: a Questão Coimbrã, episódio em que uma polêmica literária dividiu opiniões. O poeta Antonio Feliciano Castilho, grande defensor da estética romântica, havia sido convidado para escrever o posfácio da obra Poema da moci- dade, produzida por um dos jovens escritores portugueses daquele momento, Pinheiro Chagas. Castilho, aproveitando a ocasião, critica frontalmente os jovens escritores de Coimbra, afirmando estarem se afastando da verdadeira poesia e de terem mau gosto e falta de bom senso em sua produção literária. A reação a esse ataque foi imediata. Antero de Quental, um dos novos escritores, publicou um texto no qual cha- mava Castilho de ultrapassado e criticava os escritores românticos, considerando-os alienados em relação às transfor- mações que ocorriam no mundo. Afirmou que os jovens escritores defendiam uma arte vinculada à realidade, uma arte combativa, voltada para a representação dos dilemas ideológicos que caracterizavam as questões sociais. Alguns dos mais importantes escritores portugueses pertenceram a essa geração: além de Antero de Quental, Teófilo Braga, Oliveira Mar- tins e Guerra Junqueiro estiveram entre eles. Contudo, foi o escritor e diplomata Eça de Queirós quem mais se destacou pela qualidade e importância social de sua obra. © 20 11 B ib lio te ca N ac io n al d e Po rt u g al /F ot óg ra fo d es co n h ec id o Literatura 11 Sugestão de atividades: questões de 4 a 11 da seção Horade estudo. Atividades cônego: padre. pároco: padre responsável por administrar uma paróquia. Manifestações do Realismo em Portugal A crítica literária e a produção jornalística tiveram grande importância no movimento realista português, mas é nos textos literários, em verso e em prosa, que se podem observar melhor tanto a distância dessa estética em relação ao Romantismo quanto os problemas sociais contra os quais os escritores realistas lutaram. Em linhas gerais, entre as principais características do Realismo português se destacam o permanente foco nas questões sociais e a tentativa de representar a realidade “como ela é”, evitando distorções e distanciando-se das idea- lizações e das observações subjetivas típicas do Romantismo. Por essa razão, a literatura realista ocupava-se da descri- ção de pessoas comuns, envolvidas em problemas e limitadas em suas atitudes, diferentemente dos grandes heróis românticos; a vida cotidiana, simples, mas carregada de falsos valores, passa a ser o alvo dos escritores que criticavam a moral que fazia com que as pessoas se sentissem oprimidas e preocupadas com a forma como seriam vistas pelo restante da sociedade. 1. Leia um trecho do romance O crime do padre Amaro, de Eça de Queirós. Essa narrativa, publicada em 1875, conta a história de Amaro, um jovem padre designado para exercer seu ofício em Leiria. Logo que chega a seu lugar de destino, Amaro se hospeda na casa da beata S. Joaneira, que tem uma bela filha de nome Amélia. Encantado com a moça, Amaro inicia um cuidadoso processo de sedução. O padre se apaixona perdidamente pela jovem, que se deixa envolver. Amaro, porém, não quer abandonar sua condição de líder espiritual daquela comunidade. Amélia passa então a ser manipulada por Amaro, até o momento que engravida. CAPÍTULO XIX — O senhor cônego? Quero-lhe falar. Depressa! A criada dos Dias indicou ao padre Amaro o escritório, e correu a cima contar a D. Josefa que o senhor pároco viera procurar o senhor cônego, e com uma cara tão transtornada que decerto tinha sucedido alguma desgraça! Várias obras de Eça de Queirós foram transpostas para ou- tros meios de expressão, como cinema, televisão (em mi- nisséries) e HQs, fato que mostra a atualidade das questões humanas e sociais presentes na literatura desse autor. © G lo b o Fi lm es , L er eb y Pr od u çõ es , M ira vi st a, T ot al E n te rt ai n m en t A poesia realista apresentava temática variada, abrangen- do: uma poesia do cotidiano, que tem como objeto a obser- vação da realidade das várias camadas sociais; uma poesia política, engajada, socialmente crítica e até certo ponto revo- lucionária; e uma poesia metafísica, que exprime questiona- mentos relacionados a Deus, à vida e à morte. A prosa realista também tem uma diversidade temática bastante perceptível. Seu ponto alto, porém, são os escritos que se voltavam contra os valores da burguesia, a falsa mora- lidade do clero, os costumes das classes sociais menos favo- recidas e a moralidade decadente da sociedade portuguesa. Um dos escritores de destaque na literatura portuguesa desse período é Eça de Queirós. 12 Volume 7 andersondino@hotmail.com Sticky Note tarefa para 11/06 e 12/06 QUEIRÓS, Eça de. O crime do padre Amaro. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/ texto/ph000226.pdf>. Acesso em: 11 maio 2015. Eça de Queirós nasceu em Póvoa de Varzim, Portugal, em 1845. Foi advogado, jorna- lista, funcionário público e cônsul. Considerado um dos mais importantes escritores da literatura portuguesa, esteve diretamente envolvido no movimento de renovação literária na passagem do Romantismo para o Realismo. Produziu romances e contos, além de vasta correspondência e escrita jornalística. Morreu em 1900. D an ie l K le in . 2 01 5. D ig ita l. repelão: modo rápido. olha que espiga!: veja que problema! cachaço: pescoço. cavo: vazio. abismo do tórax: peito. Amaro abrira abruptamente a porta do escritório, fechou-a de re- pelão, e sem mesmo dar os bons-dias ao colega, exclamou: — A rapariga está grávida! O cônego, que estava escrevendo, caiu como uma massa ful- minada para as costas da cadeira: — Que me diz você? — Grávida! E no silêncio que se fez o soalho gemia sob os passeios furiosos do pároco da janela para a estante. — Está você certo disso? perguntou enfim o cônego com pavor. — Certíssimo! A mulher já há dias andava desconfiada. Já não fazia senão chorar... Mas agora é certo... As mulheres conhecem, não se enganam. Há todas as provas... Que hei-de eu fazer, padre-mestre? — Olha que espiga! ponderou o cônego atordoado. — Imagine você o escândalo! A mãe, a vizinhança... E se suspeitam de mim?... Estou perdido... Eu não quero saber, eu fujo! O cônego coçava estupidamente o cachaço, com o beiço caído como uma tromba. Representavam-se-lhe já os gritos em casa, a noite do parto, a S. Joaneira eternamente em lágrimas, toda a sua tranquilidade extinta para sempre... — Mas diga alguma coisa! gritou-lhe Amaro desesperado. Que pensa você? Veja se tem alguma ideia... Eu não sei, eu estou idiota, estou de todo! — Aí estão as consequências, meu caro colega. — Vá para o inferno, homem! Não se trata de moral... Está claro que foi uma asneira... Adeus, está feita! — Mas então que quer você? disse o cônego. Não quer decerto que se dê uma droga à rapariga, que a arrase... Amaro encolheu os ombros, impaciente com aquela ideia insensata. O padre-mestre, positivamente, estava divagando... — Mas então que quer você? repetia o cônego num tom cavo, arrancando as palavras ao abismo do tórax. — Que quero! Quero que não haja escândalo! Que hei-de eu querer? — De quantos meses está ela? — De quantos meses? Está de agora, está dum mês... — Então é casá-la! exclamou o cônego com explosão. Então é casá-la com o escrevente! O padre Amaro deu um pulo: — Com os diabos, tem você razão! É de mestre! O cônego afirmou gravemente com a cabeça que era “de mestre”. — Casá-la já! Enquanto é tempo! Pater est quem nuptiae demonstrant... Quem é marido é que é pai. DK O Es tú di o. 20 15 . D ig ita l. Literatura 13 desdita: infelicidade; desgraça. abria-lhe cavernas: feria-lhe os pulmões. rebate: abatimento. infortúnio: azar. atônito: espantado. degredo: exílio. a) A notícia de que Amélia estava grávida provocou que reação em Amaro? Amaro sente-se acuado, com medo de que a história venha à tona e ele seja responsabilizado, além do escândalo que isso provocaria. b) Aponte a hipótese interpretativa incorreta referente ao trecho do romance que você acabou de ler. A se- guir, justifique sua escolha. ( ) Amaro imagina que a gravidez de Amélia, por ele indesejada, poderia envolvê-lo em um es- cândalo. ( X ) A atitude do velho cônego Dias demonstra o grande desgosto que sentiu ao saber que Amaro havia quebrado seu voto de castidade. ( ) Em nenhum momento, Amaro parece se preo- cupar com as angústias que Amélia poderia estar sofrendo ao se descobrir grávida de um pároco. O cônego Dias, mesmo não gostando da situação de ver Amaro envolvido com a filha de S. Joaneira, é solidário ao rapaz e procura ajudá-lo. c) O Realismo, estilo literário ao qual pertence a obra de Eça de Queirós, apresenta uma série de caracte- rísticas específicas. Qual delas melhor se adapta ao trecho do romance O crime do padre Amaro? Das características típicas do Realismo, a que melhor explica o trecho lido é a crítica às instituições, no caso a Igreja Católica. 2. A respeito do comportamento de Amaro, é correto afir- mar que a) representa de modo contundente a hipocrisia que perpassa a classe política portuguesa na segunda metade do século XIX. b) pode ser interpretado como um desvio moral das classes abastadas da sociedade portuguesa. c) é somente um exemplo da incapacidade que algu- mas pessoas têm de se encaixar nos princípios mo- rais da religião. X d) é resultante de atitudes distorcidasde um jovem que, na visão do autor, representa a decadência dos valores morais da sociedade portuguesa. e) trata-se de uma atitude perfeitamente possível, se observados os valores sociais que caracterizam a sociedade portuguesa do século XIX. 3. Leia o poema de autoria do escritor português Cesário Verde. Nós [...] III Tínhamos nós voltado à capital maldita, Eu vinha de polir isto tranquilamente, Quando nos sucedeu uma cruel desdita, Pois um de nós caiu, de súbito, doente. Uma tuberculose abria-lhe cavernas! Dá-me rebate ainda o seu tossir profundo! E eu sempre lembrarei, triste, as palavras ternas, Com que se despediu de todos e do mundo! Pobre rapaz robusto e cheio de futuro! Não sei d’um infortúnio imenso como o seu! Vi o seu fim chegar como um medonho muro, E, sem querer, aflito e atônito, morreu! De tal maneira que hoje, eu desgostoso e azedo Como tanta crueldade e tantas injustiças, Se inda trabalho é como os presos no degredo, Com planos de vingança e ideias insubmissas. E agora, de tal modo a minha vida é dura, Tenho momentos maus, tão tristes, tão perversos, Que sinto só desdém pela literatura, E até desprezo e esqueço os meus amados versos! VERDE, Cesário. O livro de Cesário Verde. Disponível em: <http:// www.dominiopublico.gov.br/download/texto/gu000010.pdf>. Acesso em: 12 mar. 2015. 14 Volume 7 a) O poema trata de um acontecimento que marcou profundamente a vida do eu lírico. Que aconteci- mento foi esse? A morte de uma pessoa próxima do eu lírico que ficara doente quando da chegada deles à capital. b) O tema da morte foi bastante trabalhado pela poesia romântica. A abordagem desse tema pela poesia de Cesário Verde, porém, apresenta uma perspectiva diferente. Que perspectiva é essa? A morte não é representada como uma fuga da realidade ou um desejo típico do escapismo romântico, ou seja, não é vista de modo idealista ou sublime. A morte, nesse poema de Cesário Verde, é abordada como uma fatalidade que deixa marcas profundas na vida daqueles que ficam. c) No que diz respeito ao estilo, destaque três marcas do Realismo literário presentes no poema. Pode-se notar uma abordagem objetiva do fato central do poema (a morte), assim como uma representação desse acontecimento ocorrido com uma pessoa comum (sem nome) e a utilização de uma linguagem direta. d) Que visão da existência humana é possível depreen- der do verso “Vi o seu fim chegar como um medo- nho muro”? De que modo essa visão característica do Realismo pode ser entendida como um ques- tionamento à crença da Igreja de uma vida após a morte? A imagem do momento final da vida do amigo como um “medonho muro” permite que se possa interpretar a existência, tal qual o poema a expressa, como um fim definitivo, sem algo ou outra vida que se prolongue. O choque contra o dogma da vida eterna difundido pela Igreja Católica é atacado de frente nesse poema, pois a morte é tida aqui como um fim, uma chegada a um ponto-final. e) Classifique esse poema de Cesário Verde de acordo com os três grandes tipos de poesia realista propos- tos anteriormente: poesia do cotidiano, política ou metafísica. Justifique sua escolha. Poesia metafísica, pois trata da questão da morte. Cesário Verde nasceu em Lisboa, em 1855. Em 1873, matriculou-se no Curso Superior de Letras, mas frequentou as aulas somente por alguns meses. Passou seu tempo divi- dido entre as atividades de comércio herdadas do pai e a escrita de poesia. Foi um dos poetas do século XIX que mais exerceu influência nas gerações de escritores surgidos no começo do século XX. Morreu em 1886. D an ie l K le in . 2 01 5. D ig ita l. Orientações para a atividade.6 Literatura 15 Olhar literário Por volta de 1870, no interior da Faculdade de Direito do Recife (inaugurada, em 1827, por D. Pedro I), desenvolveu- -se um movimento de reflexão sociológica e cultural intitulado Escola de Recife, que foi um dos polos de recepção, no Brasil, das ideias que circulavam na Europa (materialismo, positivismo, determinismo, evolucionismo). Uma geração de intelectuais, como Tobias Barreto, Capistrano de Abreu, Clóvis Beviláqua, Silvio Romero e Graça Aranha, deu início à discussão de temas fundamentais para o pensamento brasileiro, em especial a mestiçagem e o caráter nacional. Realismo no Brasil A segunda metade do século XIX, no Brasil, foi marcada por uma série de eventos que determinaram mudanças significativas no perfil da nação. A Guerra do Paraguai, que teve início em dezembro de 1864 e se prolongou até 1870, ganhou enormes proporções, principalmente por ocorrer na sequência de outro conflito armado, que foi o embate entre Brasil e Uruguai. Foram enviados para o front de batalha cerca de 150 mil homens, fato que causou um grave impacto, já que 50 mil não retornaram para casa. Somado a isso, o Brasil integrava-se cada vez mais na lógica do capitalismo mundial, ocupando um papel de expor- tador de produtos primários e consumidor de produtos industrializados. As áreas de infraestrutura passaram a receber forte investimento na construção de estradas de ferro e na constituição de uma estrutura econômica por meio da aber- tura de casas financeiras. A sensação de progresso social, porém, ligava-se cada vez mais a um processo de concentra- ção de renda que enriquecia alguns em detrimento de uma parcela considerável da população que permanecia pobre. O término da escravidão, em 1888, e o aumento da chegada de imigrantes europeus para trabalhar nas lavouras em diversas partes do país geraram problemas sociais que se prolongam até os dias atuais: a mão de obra composta de antigos escravizados, agora libertos, não era integrada ao sistema de produção, o que fez com que contingentes de pessoas sem trabalho começassem a se concentrar nos limites periféricos das grandes cidades. A Proclamação da República, em 1889, redefiniu o conceito de pertencimento pátrio, pois transformava o antigo súdito do Império em cidadão, com direitos e deveres para com a sociedade, mas ainda refletindo uma condição de desigualdade social que dividia pobres e ricos em extremos da sociedade. Além disso, as diferenças entre as cidades que se de- senvolviam e os pontos mais afastados do interior do país mostravam-se difíceis de se integrarem em um único projeto de nação. A mentalidade associada ao positivismo e ao de- terminismo vindos da Europa, assim como os avanços das ciências e das tecnologias, passou a fazer parte do modo de ver a realidade da classe social mais abastada por meio da divulgação de ideias em jornais que circula- vam nas cidades. Mesmo que os modos de produção de bens no Brasil desse período se mantivessem atrelados a estruturas arcaicas, parte da elite econômica e intelectual passava a se identificar com “o que de mais novo” chegava por aqui vindo do continente europeu. FERREZ, Marc. Rua Primeiro de Março. 1890. Instituto Moreira Sales. Rio de Janeiro. Ruas pavimentadas, iluminação pública e bondes para o transporte coletivo passaram a se confundir com carroças nas ruas das grandes cidades 16 Volume 7 andersondino@hotmail.com Highlight Sugestão de atividades: questões 12 e 13 da seção Hora de estudo. Atividades Prosa realista brasileira A literatura realista no Brasil apresenta algumas diferenças em relação à produção literária ocorrida na Euro- pa. Uma delas está na exclusividade da produção em prosa no Realismo brasileiro, ou seja, não houve poesia realista no Brasil, enquanto em Portugal ocorreu uma importante escrita realista na forma de poemas. Outra está na importância que a narrativa curta (especialmente o conto) adquiriu na literatura brasileira do período, dado o papel que teve na formação do leitor brasileiro, o que, no Realismo europeu, não teve a mesma rele- vância. A prosa realista brasileira apresenta uma série de marcas que destacam sua diferença em relação à prosa romântica, entre elas, a utilização de umalinguagem direta e objetiva, por meio da qual eram feitas descrições cuidadosas dos ambientes e do universo interior dos personagens, com riqueza de detalhes. A exploração dos ambientes sociais, quase sempre envolvendo cenários urbanos, representa a preocupação em focar o momento presente da época, distante, portanto, do desejo dos escritores românticos de resgatar poeticamente um pas- sado glorioso que simbolizasse o surgimento da própria pátria. O escritor realista procurava construir um retrato da sociedade tal qual ela se configurava no momento, revelando os conflitos morais e as incoerências dessa sociedade. A análise psicológica passou a ser uma das estratégias textuais por meio da qual o escritor pôde revelar um mundo em que as aparências sociais não correspondiam aos valores e às ambições individuais dos personagens. Diferentemente dos escritores românticos, os quais apresentavam perso- nagens que viviam e morriam por acreditarem em ideais que não se ajustavam ao mundo em que se encontravam, os escritores realistas optaram pela representação de pessoas comuns como personagens centrais, desprovidas de idealização e muitas vezes sem grandes projetos de vida. Mas, por trás da suposta superficialidade dos personagens, os realistas se propunham a investigar os mecanismos de determinação social, isto é, denunciar as formas pelas quais as estruturas sociais oprimem pessoas. Por essa razão, na literatura realista há uma crítica ferrenha a instituições como a Igreja e o casamento, que subjaz a temas como adultério, por exemplo. Um caráter antiburguês, que também existiu no Romantismo, ganha, no Realismo, um novo sentido: não se trata mais de observar na narrativa a luta entre o herói romântico contra a sociedade burguesa, mas, sim, fazer uma descrição do modo de vida burguês revelado naquilo que há de pior (exploração do homem pelo homem; aspecto financeiro como parâmetro para julgar o valor das pessoas; diferenças entre as classes sociais; questão do mando dos “fortes” sobre os “fracos”; exploração do trabalho, etc.). Entre os escritores realistas brasileiros, dois merecem destaque: Raul Pompeia, autor do romance intitulado O Ateneu, e Machado de Assis, considerado um dos mais importantes escritores brasileiros de todos os tempos. Vale também citar a produção teatral de autores como França Junior e Artur de Azevedo, que escreveram, respectiva- mente, as peças Como se fazia um deputado e A capital federal, entre outras. 1. O romance O Ateneu, escrito por Raul Pompeia, é um dos grandes romances produzidos no Brasil na segunda metade do século XIX. Narrado em primeira pessoa, Sérgio, já adulto, conta sua passagem pelo internato chamado Ateneu, instituição localizada no bairro do Rio Comprido, Rio de Janeiro. O diretor do colégio, Dr. Aristarco, considerado um dos mais proeminentes pedagogos de seu tempo, conduzia a vida dos alunos com mãos de ferro. A narrativa vai revelando ao leitor uma realidade bastante diferente daquela apregoada por Aristarco: o colégio interno era uma reprodução piorada da sociedade decadente em que ele se inseria. Sugestão de atividade.7 Literatura 17 andersondino@hotmail.com Sticky Note começar aqui dia 18 atochando: enchendo; atulhando. esbaforido: apressado. concurso: chegada. cartonados: encadernados em cartão. esfaimados: esfomeados. benemérito: digno. coroa: realeza. pedraria: conjunto ou coleção de pedras preciosas. opulentando: ostentando, mostrando. honoríficos: honrados. berloques: pequenas joias. couraça: revestimento. excelso: sublime. silabários: livros voltados para ensinar as crianças a ler; cartilhas. hierática: como a de sacerdotes em rituais litúrgicos. crispação: contração. escanhoado: barbeado. côvados: unidade de medida de comprimento. No texto, refere-se ao tamanho. Golias: personagem mitológico judaico que foi morto em batalha por Davi. volutas: espirais. torneadas: contornadas. afluência: aglomeração. Leia uma das passagens desse romance em que a figura de Aristarco é descrita pelo narrador. Finalizada a leitura, responda às questões que seguem. O Dr. Aristarco Argolo de Ramos, da conhecida família do Visconde de Ramos, do Norte, enchia o Império com o seu renome de pedagogo. Eram boletins de propaganda pelas Províncias, conferências em diversos pontos da cidade, a pedidos, à sustância, atochando a imprensa dos lugarejos, caixões, sobretudo, de livros elementares, fabricados às pressas com o ofegante e esbaforido concurso de profes- sores prudentemente anônimos, caixões e mais caixões de volumes cartonados em Leipzig, inundando as escolas públicas de toda a parte com a sua invasão de capas azuis, róseas, amarelas, em que o nome de Aristarco, inteiro e sonoro, oferecia-se ao pasmo venerador dos esfaimados de alfabeto dos confins da Pátria. Os lugares que os não procuravam eram um belo dia surpreendidos pela enchente, gratuita, espontânea, irresistível! E não havia senão aceitar a farinha daquela marca para o pão do espírito. E en- gordavam as letras, à força, daquele pão. Um benemérito. Não admira que em dias de gala, íntima ou nacional, festas do colégio ou recepções da coroa, o largo peito do grande educador desaparecesse sob constelações de pedraria, opulentando a nobreza de todos os honoríficos berloques. Nas ocasiões de aparato é que se podia tomar o pulso ao homem. Não só as condecorações gritavam- -lhe do peito como uma couraça de grilos: Ateneu! Ateneu! Aristarco todo era um anúncio. Os gestos, calmos, soberanos, eram de um rei – o autocrata excelso dos silabários; a pausa hierática do andar deixava sentir o esforço, a cada passo, que ele fazia para levar adiante, de empurrão, o progresso do en- sino público; o olhar fulgurante, sob a crispação áspera dos supercílios de monstro japonês, penetrando de luz as almas circunstantes – era a educação da inteligência; o queixo, severamente escanhoado, de orelha a orelha, lembrava a lisura das consciências limpas – era a educação moral. A própria estatura, na imobilidade do gesto, na mudez do vulto, a simples estatura dizia dele: aqui está um grande homem... não veem os côvados de Golias?!... Retorça- -se sobre tudo isto um par de bigodes, volutas maciças de fios alvos, torneadas a capricho, cobrindo os lábios, fecho de prata sobre o silêncio de ouro, que tão belamen- te impunha como o retraimento fecundo do seu espírito, – teremos esboçado, moralmente, materialmente, o perfil do ilustre diretor. Em suma, um personagem que, ao pri- meiro exame, produzia-nos a impressão de um enfermo, desta enfermidade atroz e estranha: a obsessão da própria estátua. Como tardasse a estátua, Aristarco interinamente satisfazia-se com a afluência dos estudantes ricos para o seu instituto. De fato, os educandos do Ateneu significa- vam a fina flor da mocidade brasileira. POMPEIA, Raul. O Ateneu. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov. br/download/texto/bn000005.pdf>. Acesso em: 12 maio 2015. ncia; o rava A D KO E st ú d io . 2 01 5. D ig ita l. 18 Volume 7Volume 7 Raul Pompeia nasceu em 1863. Desde cedo, ganhou fama por ser um aluno e um caricaturista de talento. Estudou Direito em São Paulo, mas concluiu seu curso na Escola de Direito de Recife. Nesse período de sua vida, entrou em contato com as tendências filosóficas e cientificistas que estavam em voga na Europa. Participou da campanha para o fim da escravidão. Morreu em 1895, no Rio de Janeiro. Olhar literário c) A postura de Aristarco retrata, para o narrador-per- sonagem, alguém vaidoso, que vive da divulgação de sua própria imagem como um ser superior aos outros. Você concorda com essa definição do perso- nagem Aristarco? Justifique sua resposta. Pessoal. Espera-se que os alunos reconheçam na narração algumas indicações da vaidade do personagem e do modo como ele promove sua própria imagem para tirar vantagens para si e para sua escola. d) A escolha vocabular preciosista e retórica (exagera-da e esvaziada) nessa passagem do romance pode ser associada ao personagem que está em foco no trecho? Justifique sua resposta. Pessoal. Espera-se que os alunos notem que há uma ligação entre o modo artificial e pretensioso da escolha das palavras por parte do narrador-personagem e a figura falsa e interesseira de Aristarco. A prosa machadiana A obra de Machado de Assis pode ser entendida não apenas como a mais importante no contexto do Realismo brasileiro, mas também como um dos pontos altos da literatura de seu tempo. A trajetória pessoal do autor, por si só, merece destaque. Filho de pai descendente de escravizados e mãe de ori- gem portuguesa, Machado teve uma infância pobre. Projetando-se para além das condições socioeconômicas que lhe serviram de ponto de partida, o escritor conseguiu, por conta própria, acumular um saber notório, fato que possibilitou a ele frequentar espaços onde boa parte da intelectualidade carioca circulava em meados do século XIX. Quando era jovem, conheceu uma senhora francesa em São Cristóvão que lhe deu aulas de francês, permitindo que tivesse aces- so a um conjunto da cultura europeia que era exclusivo de determinada parcela das classes sociais mais abastadas. Quanto à língua inglesa, cuja literatura foi decisiva para sua formação, Machado iniciou os primeiros contatos por meio de sua amizade com José de Alencar. Aprendeu latim em seu contato com a Igreja, ainda jovem. Por fim, seu interesse pelo teatro o fez estudar grego, em especial para poder ler o teatro clássico e a obra de alguns filósofos, entre os quais, Platão. a) “Aristarco todo era um anúncio.” Qual é o sentido dessa frase no contexto do trecho do romance lido anteriormente? Essa frase indica que toda a postura de Aristarco era planejada para colocar sua escola e seu projeto pedagógico em evidência. b) Para você, a maneira como o narrador descreve a figura de Aristarco pode ser entendida como ( ) cômica. ( ) trágica. ( ) satírica. ( ) reflexiva. ( X ) irônica. D an ie l K le in . 2 01 5. D ig ita l. • Justifique sua resposta. A ironia pode ser percebida pela forma como a descrição das características do personagem sempre tendem ao exagero. Literatura 19 Sugestão de atividades: questões de 14 a 18 da seção Hora de estudo. Ao que tudo indica, evitou frequentar os espaços da periferia, lançando-se com coragem para a região central do Rio de Janeiro. Inicialmente, arrumou um emprego como tipógrafo, em seguida, em uma livraria, chegando à redação do jornal Diário do Rio de Janeiro. Aos poucos, sua grande habilidade como escritor fez com que pudes- se participar de modo mais ativo na produção de textos jornalísticos. Em 1867, tornou-se funcionário público. Sua dedicação fez com que subisse na carreira da burocracia governamental, atividade profissional que lhe permitia, paralelamente, produzir sua literatura. Machado escreveu romances, peças de teatro, poesia, contos e crônicas, ao que se somam textos de crítica lite- rária e teatral. Suas primeiras obras de ficção apresenta- vam uma concepção estética tipicamente romântica. As tramas de suas histórias exploravam, como era comum em uma parcela da prosa romântica brasileira, intrigas amorosas associadas a disputas entre os personagens por um espaço de prestígio em meio às classes altas. O modelo dessas ficções era o romance europeu, em particular o francês e o inglês, como havia ocorrido com Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar. Entretanto, já se via na primeira escrita em prosa de Machado um conjunto de elementos de estilos diferenciados se comparados aos de outros escritores brasileiros que publicavam seus livros no período de popularização das narrativas por meio dos folhetins. Apesar de seguir a “receita” do romance romântico, que explora o tema amoroso como fio condutor da trama, os personagens de Machado têm uma complexidade que se opõe ao modo superficial característico das narrativas românticas escritas no Brasil. A sondagem psicológica, uma das grandes marcas da prosa realista, já surge, ainda que tímida, nos romances “românticos” de Machado: Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878). A grande mudança na literatura machadiana, contudo, ocorreu a partir de Memórias póstumas de Brás Cubas, obra de 1881, marco inicial do Realismo literário no Brasil. Escrita com base em uma perspectiva inovadora no contexto da literatura brasileira, essa obra representa um salto em comparação a outros escritos literários, não somente em relação ao que o próprio Machado de Assis escrevia, mas também ao que outros escritores produziam nesse período. O rompimento com a linearidade da narração (a história deixa de ser contada cronologicamente), a utilização da ironia como uma estratégia para sugerir ambiguidades, o distanciamento consciente do narrador diante dos fatos narrados, a crítica contundente aos valores sociais, o ritmo fragmentado da narração, as digressões e o diálogo constante do narrador com seu leitor são algumas das transformações realizadas por Machado que estabeleceram um novo patamar de qualidade na produção literária em prosa no Brasil. Em diferentes graus e estruturadas de maneiras espe- cíficas, essas marcas se manifestam nos romances da fase realista do escritor: Memórias póstumas de Brás Cubas, Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1899), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires (1908). Outro gênero em que Machado de Assis foi mestre é o conto. Leia o que a crítica Nádia Gotlib escreveu: [...] os contos de Machado traduzem perspi- cazes compreensões da natureza humana, desde as mais sádicas às mais benévolas, porém nunca ingênuas. Aparecem motivadas por um interesse próprio, mais ou menos sórdido, mais ou menos culpável. Mas é sempre um comportamento du- vidoso, que nunca é totalmente desvendado nos seus recônditos segredos e intenções... O modo pelo qual o contista Machado repre- senta a realidade traz consigo a sutileza em rela- ção ao não dito, que abre para as ambiguidades, em que vários sentidos dialogam entre si. Portan- to, nos seus contos, paralelamente ao que aconte- ce, há sempre o que parece estar acontecendo. E disto nunca chegamos a ter certeza. GOTLIB, Nádia. Teoria do conto. São Paulo: Ática, 1990. p. 77-78. Se os contos de Machado de Assis têm como caracterís- ticas as sutilezas e as ambiguidades, desde a publicação de seu primeiro livro de contos, Contos fluminenses, de 1870, até Relíquias da casa velha, de 1906, sua produção teatral pode ser entendida como uma atividade que tinha por objetivo representar cenas da vida cotidiana e seus pro- blemas para analisá-los posteriormente. De acordo com o crítico Quintino Bocaiuva, os textos teatrais escritos por Machado eram mais para serem lidos do que encenados. A escrita teatral machadiana, portanto, dialogava constan- temente com o restante de sua obra evidenciando, de um modo muitas vezes mais direto e contundente, uma inten- ção profunda da obra completa de Machado de Assis que apontava para a denúncia social. 8 Sugestão de leitura. 20 Volume 7 Atividades vergalho: chicote. conjeturas: suposições, hipóteses. torvo: terrível, pavoroso. gaiato: travesso, maroto. desagrilhoado: libertado, livre. 1. Este capítulo é um dos mais importantes da obra Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. Nele, o protagonista, Brás Cubas, reencontra na rua um ex-escravizado dele, Prudêncio, açoitando um escravizado que comprara após obter sua liberdade. Observe como se dá a conversa entre eles e as reflexões do narrador. CAPÍTULO LXVIII / O vergalho Tais eram as reflexões que eu vinha fazendo, por aquele Valongo fora, logo depois de ver e ajustar a casa. Interrompeu-mas um ajuntamento; era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: — “Não, perdão,meu senhor; meu senhor, perdão!” Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova. — Toma, diabo! dizia ele; toma mais perdão, bêbado! — Meu senhor! gemia o outro. — Cala a boca, besta! replicava o vergalho. Parei, olhei... justos céus! Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio, — o que meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me; ele deteve-se logo e pediu-me a bênção; perguntei-lhe se aquele preto era escravo dele. — É, sim, nhonhô. — Fez-te alguma coisa? — É um vadio e um bêbado muito grande. Ainda hoje deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber. — Está bom, perdoa-lhe, disse eu. — Pois não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra para casa, bêbado! Saí do grupo, que me olhava espantado e cochichava as suas conjeturas. Segui caminho, a desfiar uma infinidade de reflexões, que sinto haver inteiramente perdido; aliás, seria matéria para um bom capítulo, e talvez alegre. Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco. Exteriormente, era torvo o epi- sódio do Valongo; mas só exteriormente. Logo que meti mais dentro a faca do raciocínio achei-lhe um miolo gaiato, fino, e até profundo. Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, – transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe um freio na boca, e desan- cava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. Agora, porém, que era livre, dispunha de si mesmo, dos bra- ços, das pernas, podia trabalhar, folgar, dormir, desagrilhoado da antiga condição, agora é que ele se desbancava: comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto! ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. Disponível em: <http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/ romance/marm05.pdf>. Acesso em: 15 maio 2015. a) Como Prudêncio justifica sua ação contra o escravizado? Ele afirma que, na sua ausência, o escravizado deixara de trabalhar e ficara bebendo na venda. b) Como Brás Cubas procede diante dessa cena? Ele se incomoda com ela e pede a Prudêncio que interrompa o castigo. Literatura 21 outrossim: igualmente. botica: caixa com remédios. andaço: epidemia. estipêndio: salário. c) De que modo a resposta de Prudêncio a Brás Cubas denuncia sua antiga condição de escravizado? Ao responder “Nhonhô manda, não pede”, Prudêncio denuncia sua antiga condição servil, de escravizado, em que obedecer é a única alternativa. d) Ao refletir sobre a cena, Brás Cubas a associa a outra, anterior. Segundo ele, de que modo as duas cenas estariam relacionadas? Para Brás, Prudêncio sofrera com a escravidão: fora tratado como brinquedo por ele, que lhe pusera arreio e o açoitara. Prudêncio sofrera calado e, posteriormente, homem livre, transferia a outro as dores e as humilhações por que passara. e) Uma das marcas centrais da prosa machadiana é a ironia. Transcreva e explique uma das ironias presentes na fala do narrador. Pessoal. Sugestão: “Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco”. Não há nada de alegre no capítulo, ele é profundamente perverso, com um ex-escravizado, alienado de sua antiga condição, açoitando um escravizado. Trata-se, portanto, de uma afirmação irônica. f) Outra marca importante da escrita de Machado é a metalinguagem, isto é, o narrador faz menção à própria ativi- dade da escrita. De que forma ela se dá nesse capítulo? 2. Leia o capítulo “O agregado”, que faz parte do romance Dom Casmurro. Preste atenção especialmente na descrição do personagem para responder às questões propostas. O AGREGADO Nem sempre ia naquele passo vagaroso e rígido. Também se descompunha em acionados, era muita vez rápido e lépido nos movimentos, tão natural nesta como naquela maneira. Outrossim, ria largo, se era preciso, de um grande riso sem vontade, mas comunicativo, a tal ponto as bochechas, os dentes, os olhos, toda a cara, toda a pessoa, todo o mundo pareciam rir nele. Nos lances graves, gravíssimo. Era nosso agregado desde muitos anos; meu pai ainda estava na antiga fazenda de Itaguaí, e eu acabava de nascer. Um dia apareceu ali vendendo-se por médico homeopata; levava um Manual e uma botica. Havia então um andaço de febres; José Dias curou o feitor e uma escrava, e não quis receber nenhuma remuneração. Então meu pai propôs-lhe ficar ali vivendo, com pequeno ordenado. José Dias recusou, dizendo que era justo levar a saúde à casa de sapé do pobre. — Quem lhe impede que vá a outras partes? Vá aonde quiser, mas fique morando conosco. — Voltarei daqui a três meses. Voltou dali a duas semanas, aceitou casa e comida sem outro estipêndio, salvo o que quisessem dar por festas. Quando meu pai foi eleito deputado e veio para o Rio de Janeiro com a família, ele veio também, e teve o seu quarto ao fundo da chácara. Um dia, reinando outra vez febres em Itaguaí, dis- se-lhe meu pai que fosse ver a nossa escravatura. José Dias deixou-se estar calado, suspirou e acabou confessando que não era médico. Tomara este título para ajudar a propaganda da nova escola, e não o fez sem estudar muito e muito; mas a consciência não lhe permitia aceitar mais doentes. — Mas, você curou das outras vezes. — Creio que sim; o mais acertado, porém, é dizer que foram os remédios indicados nos livros. Eles, sim, eles, abaixo de Deus. Eu era um charlatão... Não negue; os motivos do meu procedimento podiam ser e eram dignos; a homeopatia é a verdade, e, para servir à verdade, menti; mas é tempo de restabelecer tudo. No trecho: “Segui caminho, a desfiar uma infinidade de reflexões, que sinto haver inteiramente perdido; aliás, seria matéria para um bom capítulo, e talvez alegre. Eu gosto dos capítulos alegres; é o meu fraco” ocorre a metalinguagem. O narrador indica que esse acontecimento poderia ser usado como inspiração para a escrita de um capítulo. 22 Volume 7 enxovalham: sujam, mancham. Não foi despedido, como pedia então; meu pai já não podia dispensá-lo. Tinha o dom de se fazer aceito e necessário; dava-se por falta dele, como de pessoa da família. Quando meu pai morreu, a dor que o pungiu foi enorme, disseram-me; não me lembra. Minha mãe ficou-lhe muito grata, e não con- sentiu que ele deixasse o quarto da chácara; ao sétimo dia. Depois da missa, ele foi despedir-se dela. — Fique, José Dias. — Obedeço, minha senhora. Teve um pequeno legado no testamento, uma apólice e quatro palavras de louvor. Copiou as pa- lavras, encaixilhou-as e pendurou-as no quarto, por cima da cama. “Esta é a melhor apólice”, dizia ele muita vez. Com o tempo, adquiriu certa autoridade na família, certa audiência, ao menos; não abusava, e sabia opinar obedecendo. Ao cabo, era amigo, não direi ótimo, mas nem tudo é ótimo neste mundo. E não lhe suponhas alma subalterna; as cortesias que fizesse vinham antes do cálculo que da índole. A roupa durava-lhe muito; ao contrário das pessoas que enxovalham depressa o vestido novo, ele trazia o velho escovado e liso, cerzido, abotoado, de uma elegância pobre e modesta. Era lido, posto que de atropelo, o bastante para divertir ao serão e à sobremesa, ou explicar algum fenômeno, falar dos efeitos do calor e do frio, dos polos e de Robespierre. Contava muita vez uma viagem que fizera à Europa, e confessava que a não sermos nós, já teria voltado para lá; tinha amigos em Lisboa, mas a nossa família, dizia ele, abaixo de Deus, era tudo. — Abaixo ou acima? perguntou-lhe tio Cosme um dia. — Abaixo, repetiu José Dias cheio de veneração. E minha mãe, que era religiosa, gostou de ver que ele punha Deus no devido lugar, e sorriu aprovando. José Dias agradeceu de cabeça. Minha mãe dava-lhe de quando em quando alguns cobres. Tio Cosme, que era advogado, confiava-lhe a cópia de papéis de autos. ASSIS, Joaquim Maria Machado de. Dom Casmurro. Disponível em: <http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/romance/marm08.pdf>. Acesso em: 18maio 2015. a) Como José Dias chega à casa do pai do narrador? Ele oferece seus serviços como médico homeopata e agrada ao pai do narrador, que o convida para morar com a família. b) Por que José Dias confessa a verdade de sua condi- ção ao pai do narrador? O pai do narrador pede a ele que cure os escravizados de uma febre e ele, temeroso de não conseguir fazê-lo, confessa que não é homeopata de verdade. c) Por que o pai decide mantê-lo na casa mesmo após a confissão? Todos já haviam se habituado a ele, que teria o dom de se fazer acolhido e necessário, era como uma pessoa da família. d) Os agregados podem ser definidos como aqueles que vivem com uma família como se fossem paren- tes. No século XIX, em função do escravismo, era comum que alguns homens e mulheres pobres e livres se tornassem agregados de famílias de elite, vivendo de favor na casa delas e ajudando no que podiam, fazendo-se necessários para que perma- necessem sob a proteção dessas famílias. Assinale os itens que confirmam a condição de agregado de José Dias. ( X ) Aproximou-se da família e se fez necessário, mesmo após a morte do pai do narrador. ( ) Enganou a família se dizendo médico homeopa- ta com o objetivo de passar-lhes um golpe. ( X ) Conhecendo sua condição de agregado, esfor- çava-se por agradar e, mesmo quando expunha sua opinião, fazia-o como se obedecesse. ( ) Tinha interesse em deixar a casa, por isso jun- tava o dinheiro que ganhava mensalmente. ( ) Recebia salário regular da família. Literatura 23 Organize as ideias Orientações para a atividade.9 A proposta de síntese dos conceitos estudados neste capítulo será o levantamento das principais informações que compõem o conteúdo da unidade e a hierarquização dessas informações no que diz respeito à sua importância. Todo texto contém ideias, conceitos e informações com diferentes níveis de importância. A cada uma das informa- ções principais, há outras, diretamente relacionadas, de importância secundária. O texto que você vai produzir será um quadro com as informações principais e secundárias correspondentes. Acompanhe os passos para a elaboração desse texto. 1. Releia os textos conceituais e literários que fazem parte desta unidade. Essa é uma tarefa das mais importantes para elaborar sua síntese. A qualidade do que você vai produzir depende muito da qualidade da leitura que vai realizar. Por isso, se necessário, leia o material mais de uma vez. Durante a leitura, é possível ir fazendo anotações ou então grifar o texto para identificar as informações principais e as secundárias. 2. Em seguida, monte um quadro, conforme exemplo a seguir, preenchendo-o com as informações identificadas em sua leitura. Evite copiar literalmente o texto de seu livro; prefira escrever as informações com suas próprias palavras. Identificar a página do livro onde está a informação pode ser interessante, pois quando você for estu- dar posteriormente, utilizando o quadro, podem surgir dúvidas e você encontrará mais facilmente a informação original. Página Informação principal Informações secundárias relacionadas 7 A partir da segunda metade do século XIX, o Romantismo começou a mostrar sinais de esgotamento. • No século XIX, o Romantismo dominou a cena artística em boa parte do mundo ocidental. • A visão de mundo romântica estava relacionada ao modo de vida burguês. • O Romantismo criticava as ambições burguesas de tomada de poder e da afirmação de valores mercantis. • O Romantismo compactuava com as aspirações pelos ideais de liberdade e de igualdade. • Com o passar do tempo, um discurso racionalista começa a se firmar, influenciando a produção literária, artística, científica, filosófica e outras. 3. Por fim, algumas dicas: • Faça um rascunho – geralmente a primeira versão de um texto requer alterações e melhorias, portanto, para o texto ficar bom, você provavelmente terá de reescrevê-lo. • Todo texto deve ter uma conclusão – como se trata de uma resenha crítica, sua reflexão deve ser concluída. • Faça a revisão do texto – tente se colocar no lugar de um leitor que esteja lendo seu texto pela primeira vez e verifi- que a clareza em suas colocações. • Não se desfaça do texto que você produziu – guarde-o para estudos no futuro. Você também poderá emprestá-lo para outros alunos que estejam precisando estudar esse conteúdo, ou seja: valorize seu próprio trabalho! © Shutterstock/Diego Cervo 24 Volume 7 Hora de estudo 10 Gabaritos. 1. Assinale V para verdadeiro e F para falso. O Realismo pode ser considerado ( V ) uma reação ao sentimentalismo romântico. ( F ) uma estética que teve como uma de suas princi- pais marcas uma reação contra o Absolutismo. ( F ) uma das tendências que ocorreu em paralelo à segunda geração do Romantismo. ( V ) uma concepção estética que pode ser associada aos avanços das ciências que se desenvolveram no século XIX. ( F ) uma manifestação que abordava a sociedade com base em um viés idealista. ( F ) uma negação da arte romântica, mais especifi- camente do subjetivismo, do historicismo e do objetivismo que imperaram na arte ao longo do século XIX. 2. De que modo se pode associar a perspectiva crítica da estética realista aos avanços do desenvolvimento urbano no século XIX? 3. Leia esta afirmação: Os realistas tinham como objetivo principal de sua arte o compromisso em representar a vida, os problemas do dia a dia e os comportamentos das camadas média e baixa que se acumulavam nas cidades grandes em busca de trabalho. Para os realistas, as pessoas não viviam mais com os mesmos padrões do mundo anti- go, daí a necessidade de uma nova arte que pudesse representar essa mudança. De acordo com o conteúdo estudado, essa afirmação pode ser considerada verdadeira ou não? Crie argu- mentos que a confirmem ou a desqualifiquem. 4. Podem ser consideradas marcas da linguagem no Realismo: X a) a clareza e a preocupação com a descrição; b) a subjetividade e a dimensão política; c) a denúncia e o resgate histórico; d) o jogo de palavras e a religiosidade; e) o simbolismo e o cientificismo. Texto para as questões de 5 a 9. O melro veio com efeito às três horas. Luísa estava na sala, ao piano. — Está ali o sujeito do costume – foi dizer Juliana. Luísa voltou-se corada, escandalizada da ex- pressão: — Ah! meu primo Basílio? Mande entrar. E chamando-a: — Ouça, se vier o Sr. Sebastião, ou alguém, que entre. Era o primo! O sujeito, as suas visitas perde- ram de repente para ela todo o interesse picante. A sua malícia cheia, enfunada até aí, caiu, enge- lhou-se como uma vela a que falta o vento. Ora, adeus! Era o primo! Subiu à cozinha, devagar, – lograda. — Temos grande novidade, Sra. Joana! O tal peralta é primo. Diz que é o primo Basílio. E com um risinho: — É o Basílio! Ora o Basílio! Sai-nos primo à última hora! O diabo tem graça! — Então que havia de o homem ser se não parente? – observou Joana. Juliana não respondeu. Quis saber se estava o ferro pronto, que tinha uma carga de roupa para passar! E sentou-se à janela, esperando. O céu baixo e pardo pesava, carregado de eletricidade; às vezes uma aragem súbita e fina punha nas fo- lhagens dos quintais um arrepio trêmulo. — É o primo! – refletia ela. E só vem então quando o marido se vai. Boa! E fica-se toda no ar quando ele sai; e é roupa-branca e mais roupa- -branca, e roupão novo, e tipoia para o passeio, e suspiros e olheiras! Boa bêbeda! Tudo fica na família! Os olhos luziam-lhe. Já se não sentia tão lo- grada. Havia ali muito “para ver e para escutar”. E o ferro estava pronto? Mas a campainha, embaixo, tocou. (Eça de Queirós. O primo Basílio, 1993.) A resolução das questões discursivas desta seção deve ser feita no caderno. Literatura 25 c) do narrador, em terceira pessoa, distanciado, por- tanto, do ponto de vista de Juliana. d) do narrador, em primeira pessoa, próximo, portanto, do ponto de vistade Juliana. e) da personagem Luísa, em discurso indireto, inde- pendente da voz do narrador. 8. (UNIFESP) A leitura do antepenúltimo parágrafo do texto permite concluir que as reflexões de Juliana são pautadas X a) pelo inconformismo com os encontros, que lhe re- presentam mais afazeres. b) pela falta de interesse que tem de se ocupar dos afazeres domésticos. c) pelo ressentimento que experimenta, por não rece- ber a atenção desejada. d) pela insatisfação de contemplar o bem-estar da família. e) pelo descaso que revela ter em relação a Luísa e aos seus familiares. 9. (UNIFESP) A leitura do trecho de O primo Basílio, em seu conjunto, permite concluir corretamente que essa obra a) expõe a sociedade portuguesa da época para recupe- rar a tradição e os vínculos sociais. b) traz as relações humanas de forma idealista, ainda que recupere a ideologia vigente. c) retrata a sociedade portuguesa da época de forma romântica e idealizada. d) faz explicitamente a defesa das instituições sociais, como a família. X e) faz um retrato crítico da sociedade portuguesa da época, exibindo os seus costumes. Texto para as questões 10 e 11. NUM ÁLBUM I És uma tentadora: o seu olhar amável Contém perfeitamente um poço de maldade, E o colo que te ondula, o colo inexorável Não sabe o que é paixão, e ignora o que é bondade. 5. (UNIFESP) Quando é avisada de que Basílio estava em sua casa, Luísa escandaliza-se com a forma de expressão de sua criada Juliana. A reação de Luísa decorre a) da linguagem descuidada com que a criada se re- fere a seu primo Basílio, rapaz cortês e de família aristocrática. b) da intimidade que a criada revela ter com o Basílio, o que deixa a patroa enciumada com o comentário. c) do comentário malicioso que a criada faz à presença de Basílio, sugerindo à patroa que deveria envolver- -se com o rapaz. d) da indiscrição da criada ao referir-se ao rapaz, o qual, apesar do vínculo familiar, não era visita fre- quente na casa da patroa. X e) da ambiguidade que se pode entrever nas palavras da criada, referindo-se com ironia às frequentes vi- sitas de Basílio à patroa. 6. (UNIFESP) Considere o antepenúltimo parágrafo do texto. Nas reflexões de Juliana, está sugerido o que acaba por ser o tema gerador desse romance de Eça de Quei- rós, a saber: a) o amor impossível, em nome do qual Luísa abando- na o marido. b) a vingança, em que Luísa vitima seu amante Basílio. X c) o triângulo amoroso, em que Basílio ocupa o lugar de amante. d) o casamento por interesse, mediante a compra do amor de Basílio. e) o casamento por conveniência, no qual Luísa foi lograda. 7. (UNIFESP) Observe as passagens do texto: – Ora, adeus! Era o primo! (7º. parágrafo) – E o ferro estava pronto? (penúltimo pa- rágrafo) Nessas passagens, é correto afirmar que se expressa o ponto de vista a) da personagem Juliana, em discurso direto, inde- pendente da voz do narrador. X b) da personagem Juliana, sendo que sua voz mescla- -se à voz do narrador. 26 Volume 7 caráter ferozmente honrado. Eu mesmo fui in- justo com ele durante os anos que se seguiram ao inventário de meu pai. Reconheço que era um modelo. Arguiam-no de avareza, e cuido que tinham razão; mas a avareza é apenas a exage- ração de uma virtude, e as virtudes devem ser como os orçamentos: melhor é o saldo que o déficit. Como era muito seco de maneiras, tinha inimigos que chegavam a acusá-lo de bárbaro. O único fato alegado neste particular era o de mandar com frequência escravos ao calabouço, donde eles desciam a escorrer sangue; mas, além de que ele só mandava os perversos e os fujões, ocorre que, tendo longamente contrabandeado em escravos, habituara-se de certo modo ao trato um pouco mais duro que esse gênero de negócio requeria, e não se pode honestamente atribuir à índole original de um homem o que é puro efeito de relações sociais. A prova de que o Cotrim ti- nha sentimentos pios encontrava-se no seu amor aos filhos, e na dor que padeceu quando morreu Sara, dali a alguns meses; prova irrefutável, acho eu, e não única. Era tesoureiro de uma confraria, e irmão de várias irmandades, e até irmão remi- do de uma destas, o que não se coaduna muito com a reputação da avareza; verdade é que o be- nefício não caíra no chão: a irmandade (de que ele fora juiz) mandara-lhe tirar o retrato a óleo. ASSIS, José Maria Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1992. Obra que inaugura o Realismo na literatura brasileira, Memórias póstumas de Brás Cubas condensa uma ex- pressividade que caracterizaria o estilo machadiano: a ironia. Descrevendo a moral de seu cunhado, Cotrim, o narrador-personagem Brás Cubas refina a percepção irônica ao a) acusar o cunhado de ser avarento para confessar-se injustiçado na divisão da herança paterna. X b) atribuir a “efeito de relações sociais” a naturalidade, com que Cotrim prendia e torturava os escravos. c) considerar os “sentimentos pios” demonstrados pelo personagem quando da perda da filha Sara. d) menosprezar Cotrim por ser tesoureiro de uma con- fraria e membro remido de várias irmandades. e) insinuar que o cunhado era um homem vaidoso e egocêntrico, contemplado com um retrato a óleo. II Quando me julgas preso a eróticas cadeias Radia-te na fronte o céu das alvoradas, E quando choro então é quando garganteias As óperas de Verdi e as árias estimadas. III Mas eu hei de afinal seguir-te a toda a parte, E um dia quando eu for a sombra dos teus passos, Tantos crimes terás, que eu hei de processar-te, E enfim hás de morrer na forca dos meus braços. VERDE, Cesário. O livro de Cesário Verde. Disponível em: <http:// www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000070.pdf>. Acesso em: 18 maio 2015. 10. Compare a visão da figura feminina presente no poema com o ideal de beleza romântico. 11. O poema aborda um processo de conquista da pes- soa amada. Partindo dessa hipótese de leitura, qual é o sentido expresso no último verso do poema “E enfim hás de morrer na forca dos meus braços”? Texto para as questões 12 e 13. Assim, do Romantismo ao Realismo, houve uma passagem do vago ao típico, do idealizante ao factual. Quanto à composição, os narradores realistas brasileiros também procuraram alcançar maior coerência no esquema dos episódios, que passaram a ser regidos não mais por aquela sara- banda de caprichos que faziam das obras de um Macedo verdadeiras caixas de surpresa, mas por necessidades objetivas dos ambiente (cf. O Mis- sionário) ou da estrutura moral das personagens (cf. Dom Casmurro). BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1885. p. 193. 12. Explique a afirmação do crítico Alfredo Bosi segundo a qual “do Romantismo ao Realismo, houve uma passa- gem do vago ao típico, do idealizante ao factual”. 13. Bosi também comenta que a transição da prosa român- tica para a realista pode ser notada com a mudança na composição do próprio romance. Explique com suas pa- lavras quais foram essas mudanças. 14. (ENEM) Talvez pareça excessivo o escrúpulo do Co- trim, a quem não souber que ele possuía um Literatura 27 15. (PUC-Rio – RJ) Leia. As crônicas da vila de Itaguaí dizem que em tempos remotos vivera ali um certo médico, o Dr. Simão Bacamarte, filho da nobreza da terra e o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Es- panhas. Estudara em Coimbra e Pádua. Aos trinta e quatro anos regressou ao Brasil, não podendo el-rei alcançar dele que ficasse em Coimbra, regendo a universidade, ou em Lisboa, expedindo os negócios da monarquia. — A ciência, disse ele a Sua Majestade, é o meu emprego único; Itaguaí é o meu universo. Dito isto, meteu-se em Itaguaí, e entregou-se de corpo e alma ao estudo da ciência, alternando as curas com as leituras, e demonstrando os teoremas com cataplasmas. Aos quarenta anos casou com D. Evarista da Costa e Mascarenhas, senhora de vinte e cinco anos, viúva
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