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Sociedade e cultura

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1 
 
 TEXTO 3B: SOCIEDADE E CULTURA INDO-EUROPEIAS 
Aléxia Teles Duchowny (Fale/UFMG) 
INTRODUÇÃO 
De onde vieram os indo-europeus? Há muitas teorias que tentam identificar o 
local de origem desses povos. A primeira região apontada como sua pátria foi a 
Índia. Em seguida, são sugeridas diversas outras áreas do globo: a Ásia, o Norte 
da Europa, os Bálcãs, a Hungria, o sul da Rússia..., mas a maioria delas são 
difíceis ou até mesmo impossíveis de serem” comprovadas. 
Atualmente, a “Teoria dos três estágios” divide o proto-indo-europeu em três 
camadas históricas, de acordo com Quiles e López-Menchero (2011): 
(i) O pré-proto-indo-europeu, ou pré-PIE, o estágio mais antigo que a linguística 
comparada pode reconstruir usando da reconstrução interna. Não há 
unanimidade, entretanto, sobre quando e onde teria sido falado; 
(ii) O PIE médio ou simplesmente proto-indo-europeu, identificado com culturas 
kurgans menos recentes, na Teoria Kurgan, explicada a seguir; 
(iii) O PIE tardio, datado de aproximadamente 3500 – 2500 a.E.C., usando 
modelos arqueológicos e/ou linguísticos. 
1 A Teoria Kurgan 
Apesar de as informações fornecidas pela reconstituição linguística serem 
limitadas, somos levados a crer que a origem dos indo-europeus estaria 
localizada em algum ponto da Europa do leste. Segundo Beekes (1995), o fato de 
não haver, em indo-europeu, palavras para “cipreste” e “jumento”, e haver a 
palavra “neve”, sugere um local de origem não muito ao sul. A palavra “cavalo” 
dá pistas muito úteis: áreas de estepe do sul da Rússia são o local de origem do 
cavalo selvagem e da sua primeira domesticação. Muitos autores acreditam que 
o cavalo deve ter sido muito importante para os indo-europeus, fornecendo 
comida, funcionando como moeda de troca e meio de transporte. 
Os estudos arqueológicos no sul da Rússia estão florescendo e esperamos 
conhecer mais e mais sobre a região e seu passado. Para Mallory (1989), a cultura 
dos Sredny Stog, datada de 4500-3500 a.E.C. e situada na bacia do rio Dniepr, que 
nasce na Rússia chegando até o Mar Negro, representaria com verossimilhança a 
 
2 
 
cultura indo-europeia. Esse povo sustentava-se com a criação de gado, a 
agricultura, a caça e a pesca. Tinha também cavalos, carneiros, bodes, porcos e 
cães. O uso de cobre ainda é raro. 
Em uma fase posterior, a cultura dos Yamnaya, datada de 3600 a.E.C. a 2200 
a.E.C., extende-se do rio Bug − que nasce na Polônia e se une ao Dniepr − até o 
rio Ural, que nasce na Rússia e vai até o mar Cáspio. O uso do cobre é mais 
comum; já foram encontradas carroças de duas e de quatro rodas, há armas e as 
sepulturas de seus mortos é coberta por um monte de terra. Daí a arqueóloga 
Marija Gimbutas chamá-los de “Kurgan”, “monte” em russo. Apesar de ser bem 
provável que já houvesse dialetalização, os Yamnaya seriam os representantes 
indo-europeus da fase final de união linguística. 
Entendamos melhor a Teoria Kurgan de Guimbutas. Essa autora combinou a 
arqueologia com a linguística, com o intuito de localizar as origens dos proto-
indo-europeus. Para ela, os falantes do PIE eram uma tribo nômade das estepes 
próximas ao Mar Cáspio, que vão da Ucrânia até o Cazaquistão, passando pela 
Rússia. Eles teriam expandido estágios de sua cultura em ondas sucessivas ao 
longo do terceiro milênio da Era Comum. Quiles e López-Menchero (2011, p. 68) 
expõem a teoria de Gimbutas da seguinte forma: 
QUADRO 1: 
A hipótese Kurgan e a Teoria dos três estágios 
Datação Hipótese Kurgan Teoria dos três estágios 
ca. 4000-
4500 a.E.C. 
Cultura Sredny Stog, 
entre outras, 
domesticação do cavalo. 
Proto-indo-hitita? 
ca. 4000-
3500 a.E.C. 
A cultura Yamnaya e os 
construtores kurgans 
surgem nas estepes; a 
cultura Maykop surge no 
norte do Cáucaso. 
Dialetos pré-indo-europeu tardio e 
pré-anatólicos evoluem em 
comunidades diferentes, mas há 
ainda contato no mesmo território. 
ca. 3500-
3000 a.E.C. 
Cultura Yamnaya em seu 
ápice: ídolos de pedra, 
protótipo de carroças de 
duas rodas, criação de 
animais, sedentarismo, 
agricultura e pesca, 
introdução de artefatos e 
armas em bronze. 
O proto-anatólico torna-se isolado 
(no sul do Cáucaso ou nos Bálcãs) e 
não tem mais contato com as 
inovações linguísticas do indo-
europeu tardio. O indo-europeu 
tardio transforma-se em dialetos. 
 
3 
 
ca. 3000-
2500 a.E.C. 
A cultura Yamnaya 
estende-se por toda a 
estepe Pôntica. A cultura 
correspondente aos mais 
tardios estágios da 
unidade indo-europeia 
estende-se do Rio Reno 
até o Volga. Culturas 
diferentes se 
desintegram, ainda com 
algum contato, 
permitindo a expansão 
da tecnologia. 
Comunidades dialetais começam a 
migrar, mantendo-se com algum 
tipo de contato, permitindo a 
expansão das inovações fonéticas e 
morfológicas em comum. Proto-
anatólico, falado na Ásia Menor, 
evolui para anatólico Comum. 
ca. 2500-
2000 a.E.C. 
A Era do Bronze alcança 
a Europa central com a 
cultura dos indo-
europeus. Os indo-
iranianos, e depois a 
cultura Andronova, 
assentam-se ao norte do 
Mar Cáspio. 
Completa-se a separação dos 
dialetos do sul do IE. O proto-
grego é falado nos Bálcãs, o proto-
indo-iraniano é falado na Ásia 
central, o IE do nordeste é falado 
no norte da Europa, os dialetos 
anatólicos são falados na Anatólia. 
ca. 2000-
1500 a.E.C. 
A carroça é inventada, 
levando à expansão dos 
iranianos e de outras 
culturas à Ásia Central, 
norte da Índia, Irã e 
Anatólia ocidental. O 
império hitita floresce. 
O indo-iraniano divide-se em dois 
principais dialetos, indo-iraniano e 
iraniano. proto-dialetos europeus 
como o pré-germânico, o pré-
céltico, o pré-itálico e o pré-balto-
eslavo diferenciam-se uns dos 
outros. As línguas anatólicas como 
o hitita e o luviano passam a ter 
escrita; o indo-iraniano tem 
atestação; fala-se o dialeto grego 
micênico. 
ca. 1500-
1000 a.E.C. 
A Idade do Bronze 
nórdica presencia o 
surgimento, na Europa 
Central, do início da 
Idade do Ferro. Povos 
itálicos movem-se para a 
Península Itálica. 
Declínio dos reinos 
hititas e da civilização 
micênica. 
O céltico, o itálico, o germânico, o 
báltico e o eslavo já são proto-
línguas diferentes, desenvolvendo-
se, por sua vez, em dialetos 
diferentes. O iraniano e outros 
dialetos do sul se expandem 
através de conquistas militares, e o 
indo-iraniano se espalha sob a 
forma de uma língua sagrada, o 
sânscrito. 
 
4 
 
ca. 1000-500 
a.E.C. 
A Europa do norte entra 
na Idade do Ferro pré-
romana. Reinos e 
impérios indo-europeus 
na Eurásia. Na Europa, a 
Antiguidade Clássica 
começa com o 
florescimento dos povos 
gregos. Fundação de 
Roma. 
Dialetos celtas espalham-se sobre a 
Europa ocidental, os germânicos 
sobre o sul da Jutlândia. Línguas 
itálicas na Península Itálica. 
Surgimento dos alfabetos grego e 
itálico antigo. Dialetos anatólicos 
antigos. Línguas palaeo-balcânicas 
nos Bálcãs. 
Fonte: Quiles e López-Menchero (2011, p. 69) 
2 A Paleontologia linguística 
A “Paleontologia linguística” pode dar evidência para elementos e para situações 
representadas pelas palavras reconstruídas. Originalmente, Paleontologia é a 
ciência que estuda animais e vegetais fósseis. Assim, um fóssil, para a nossa área 
do saber, seria qualquer vestígio ou “resto” preservado de uma palavra. Como 
afirma Beekes (1995, p.47): “se o proto-indo-europeu tem uma palavra para 
´cavalo´, podemos acreditar com segurança que os indo-europeus conheciam o 
cavalo.” O contrário nem sempre é verdadeiro: a ausência de uma palavra no 
indo-europeu, isto é, a impossibilidade de reconstruí-la, não implica 
necessariamente que não ela existiria na cultura indo-europeia. 
Nem sempre, tampouco, as palavras reconstruídas são aceitas com unanimidade 
por todos os linguistas: como as palavras podem mudar de significado ao longo 
do tempo, não se tem certeza de que, na épocados indo-europeus, o sentido era 
o mesmo de hoje. Além do mais, conhecemos muito pouco das línguas europeias 
antigas − com exceção do basco que não é língua indo-europeia −, ficando difícil 
afirmar com certeza que o indo-europeu teria surgido nesse continente. 
Villar (1971) exemplifica o problema: a palavra latina fagus (“faia”, um tipo de 
árvore que cresce no centro-sul da Europa) encontra-se também em antigo 
alemão (buohha), no gótico (boha), no curdo (buz) etc. A partir dessas formas, 
chega-se a *bhāgo-, que se supõe ter o sentido de faia. Entretanto, não temos 
garantia de que a palavra existiu em toda a área indo-europeia, já que há muitas 
línguas que não a apresentam. Tampouco temos certeza de que a palavra já 
existia na época do indo-europeu e que seu sentido foi sempre o mesmo. O termo 
poderia representar, por exemplo, outro tipo de árvore ou ser um nome genérico 
para árvore. Consequentemente, não sabemos se os indo-europeus viveriam em 
regiões com faias. 
 
5 
 
Existem, no vocabulário mais ou menos comum, palavras para desginar lobo, 
urso, castor, cervo e lebre, entre outros animais. Palavras para animais como leão, 
tigre, camelo são geralmente empréstimos de línguas não indo-europeias, já que 
esses animais não são nativos da Europa. Assim, para Villar (1971, p. 42), “daí 
pode-se deduzir que no mundo indo-europeu existia uma fauna mais 
setentrional [do norte] do que meridional [do sul].” 
3 Cultura indo-europeia 
Em geral, a Sociologia divide a cultura em dois tipos: a material e a não-material. 
A primeira refere-se a objetos concretos, recursos e a espaços usados para definir 
a cultura de um povo. Assim, casas, cidades, monumentos, ferramentas, 
máquinas colaboram para o entendimento do comportamento e das percepções 
humanas. Já a cultura não-material refere-se a ideias como símbolos, valores, 
crenças, regras, linguagens, religião, instituições. 
Vejamos, então, o que podemos saber sobre os indo-europeus a partir da 
reconstrução linguística, que você viu no Texto 6. 
3.1 Cultura material indo-europeia 
Beekes (1995), ao se referir à cultura material, apresenta dados muito úteis para 
o nosso melhor entendimento dessa cultura tão longínqua no tempo. 
Para ele, os indo-europeus não viviam em cidades, pois não havia palavra que 
represente esse local. A palavra *p(o)lH- (que deu origem a púr em sânscrito, pilìs 
em lituano e pólis em grego) aproxima-se do conceito de cidade. Entretanto, ela 
significaria, no início, apenas um espaço fechado onde as pessoas ficavam em 
tempos de perigo, equivalente a um abrigo. 
Deveriam viver em casas de madeira, com portas duplas: a palavra para casa era 
*dōm (tun em armênio e dõ em grego) da raiz *demH- “construir” (grego démō). 
Dessa mesma raiz, temos o verbo “trabalhar com madeira” timrjan, em gótico. A 
palavra para porta *dhuer- está geralmente no plural (tocariano B twere, grego 
thúrā, latim forēs), o que indicaria portas duplas. 
Quanto a utensílios domésticos, poucas palavras sobreviveram até as línguas 
conhecidas por nós e muitas delas são empréstimos de outras línguas. Temos o 
mesmo problema para ferramentas e armas, difíceis de ser reconstruídas. 
 
6 
 
Os indo-europeistas conseguiram reconstituir os verbos comer (*hled- > latim edō), 
beber (*peh3(i)- > latim pō-culum, “copo”), cozinhar (*pekw- > grego péssō, latim coquō) 
e talvez assar (*bh(o)Hģ > grego phógó, antigo inglês bacan), indicando que essas 
ações faziam parte do cotidiano dos indo-europeus. Provavelmente consumiam 
mel (*méli > grego méli), glande de carvalho (*gwlh2-(e)n- > grego bálanos), carne 
(vermelha) (*mēms- > sânscrito māmsá-), peixe (*dģhuH- > grego ikhthũs), sal 
(*seh2l- > latim sāl) e alguns tipos de cereais (como *ģrHno- > antigo irlandês grán, 
gótico kaurn “grão”). A única fruta conhecida é maçã (*h2ebōl > antigo eslavônico 
jábloko, antigo alto alemão apful). Se havia consumo de bebida alcoolica, esta 
deveria ser à base de mel (*medhu > sânscrito mádhu, lituano medùs). Há muita 
polêmica em torno da palavra vinho: seria ela ou não de origem indo-europeia? 
Mas não se chegou, até então, a conclusão alguma. 
Algumas palavras reconstituídas nos levam a crer que os indo-europeus tinham 
conhecimentos agropecuários: semear (*sehl- > eslavônico antigo sejǫ, gótico saian), 
arar (*h2erh3- > latim arō, armênio arawr), campo (grego ároura, latim arvum), acre 
(que significaria “pasto”: *h2eģros > latim ager, gótico akrs), cevada (*gh(e)rsdh- > 
antigo alto alemão gersta, latim hordeum). 
O animal doméstico mais importante era a vaca (*gweh3us > tocariano A ko, antigo 
inglês cú), mas o carneiro (*h3euis > latim ovis) e o cordeiro (h2egwnos > latim agnus) 
também devem ser levados em consideração. Sabemos também que o gado 
(*péku) serviria como dinheiro, já que em latim a palavra pecūnia, que significa 
“dinheiro”, vem da raiz *péku. Há também palavras para cachorro (*kuon > inglês 
hound, grego kúōn), cavalo (*hlekuos > sânscrito ásva, latim equus), rato (*muHs > 
sânscrito mús-, inglês mouse) e porco (*suHs > avéstico hūš, antigo inlgês swīn). 
Coelhos, galinhas e jumentos não deveriam ser conhecidos. 
Os indo-europeus não andavam nus, necessariamente, porque foi possível 
reconstituir os termos vestir-se (*ues- > latim vestire, gótico wasjan), tecer (*hluebh- > 
grego huphaínō, antigo inglês wefan) e costurar (*siuH- > hitita suēl, gótico siujan). 
Vestiriam algum tipo de indumentária, cinta ou tapa-sexo feito de lã (*HulHn- > 
latim lāna) e praticariam um tipo qualquer de tecelagem, confirmado pela raiz 
*snei-. 
Haveria apenas uma palavra para metal (*h2éios > sânscrito áyas, inglês ore), que 
poderia representar, não sabemos com certeza, bronze ou cobre. Ouro 
(*ģh(o)(H)- > avéstico zaranya-, antigo eslavônico zlato) e prata (*h2(e)rģ-nt- > latim 
argentum, antigo irlandês argat) também deveriam ser conhecidos, ao contrário 
 
7 
 
do ferro, que aparecerá muito mais tarde. Mas é bem possível que os indo-
europeus não conhecessem a técnica de tratamento dos metais. 
Quanto aos transportes, usariam carroças, apesar de não ter sido possível 
reconstituir essa palavra, o que demonstra o verbo carregar/dirigir (*ueģh- < 
sânscrito váhati, latim vehō) e o substantivo roda (*Hrot-h2 > lituano rãtas, latim 
rota). Tais carroças teriam sido puxadas por bois e depois por cavalos. Também 
utilizariam algum tipo de embarcação (*neh2us > antigo irlandês nau, antigo 
islandês nōr) a remo (“remar” seria *hlrehl- (> latim rēmus, antigo islandês róa). 
Não sabemos com certeza se navegavam no mar ou em rios. 
Há palavras para comprar e similares, tanto objetos quanto animais e humanos 
escravos − não tendo sido possível reconstituir o termo escravo −, sendo uma delas 
*kwrih2- (> antigo irlandês crenim, grego príasthai). 
3.2 Cultura imaterial indo-europeia 
Em relação à família, e ainda conforme Beekes (1995), conhecemos os termos pai, 
mãe, irmão, irmã, filho e filha, entre vários outros. Mas todos se referem à família 
do marido, o que indica que a mulher, ao se casar, passaria a viver com essa 
família. O pai pode ser chamado também de “senhor” ou de “dono da casa”. 
Assim, podemos inferir que a instituição familiar tem grande importância para 
os indo-europeus, integrantes de uma sociedade patriarcal. 
Pouco podemos inferir em relação à organização social acima da família. Existe a 
palavra para povo (*teutā > osco touto, lituano tautà) e também rei (*h3rēģ-s > antigo 
irlandês rí, latim rex), que poderia ser o equivalente a um chefe tribal (Villar 
(1971) não acredita nessa possibilidade). Um homem livre era *uiHró- (sânscrito 
vīrá-, gótico wair) ou *h2nér (> armênio ayr, umbro ner). 
Quanto à lei, roubar e ladrão puderam ser reconstruídos: *(s)teh2- > hitita tayezzi, 
antigo irlandês táid. 
A guerra pode ter tido notável importância na sociedade indo-europeia. Segundo 
Villar (1971), a partir da verificação de quena onomástica1 sejam frequentes as 
palavras que indicam qualidades guerreiras. 
Benveniste (1995, p. 268) afirma que, em relação aos indo-europeus, “tudo está 
imbuído de religião, tudo indica um signo, um jogo ou um reflexo das forças 
 
 
 
 
8 
 
divinas.” Assim, “não se tem necessidade de um termo específico aplicado ao 
conjunto de cultos e crenças, e é por isso que, para denominar “religião”, 
encontramos apenas termos que resultam de uma criação independente.” 
Conhecemos apenas um deus indo-europeu, Zeus, e é difícil saber se haveria 
outros e quais seriam. A palavra Diéus *ph2tér (> grego Zeùs patér, latim Iuppiter) 
está relacionada a dia, a céu claro. Os deuses eram, evidentemente, imortais 
(*nmrtós > sânscrito ámrta-, grego ámbrotos). Há também várias palavras que 
remetem a rezar (*gwhedh-, *prek-, *meld-). 
Para Meillet (1948), os povos indo-europeus conheceram a escrita muito tarde. 
Apenas o sânscrito, o iraniano, o grego e os dialetos itálicos são atestados antes 
da Era Comum. As outras línguas apresentam escrita apenas a partir do século 4 
E.C. “É impossível, então, fazer história antiga das religiões para os povos das 
línguas indo-europeias” (p. 323), porque esta demanda textos escritos. Mesmo 
assim, chega-se a algumas conclusões a partir do vocabulário reconstituído do 
indo-europeu. O autor estabelece a existência de um termo para a ideia de 
“divindade”, *deiwos (> sânscrito devah, lituano dëvas, antigo prussiano deiws, 
latim deus, etc). O termo é de uso generalizado em todo o grupo indo-europeu e 
podemos precisar o caráter do deus indo-europeu: 
é um fato natural ou social ao qual se dá uma importância específica; o deus não 
tem um nome distinto do fato. O deus não é uma pessoa com nome próprio; é o 
próprio fato, é a sua essência, sua força íntima. [...] O culto indo-europeu não se 
direciona a seres autônomos, mas às próprias forças naturais e sociais (MEILLET, 
1948, p. 334). 
Há muitas teorias sobre a sociedade indo-europeia, sendo difícil chegar a 
conclusões precisas. A teoria de Dumésil (1985), aceita por Benveniste (1995), por 
exemplo, de que essa sociedade seria dividida em três classes − sacerdotes, 
guerreiros e agricultores − é muito pouco provável, na opinião de Beekes (1995). 
As poucas certezas que temos em relação à origem, cultura e sociedade indo-
europeias devem servir para nos estimular a continuar a busca por respostas. 
Como afirma Mallory (1973, p. 21), “a localização da terra de origem e a descrição 
de como as línguas indo-europeias se expandiram é central para qualquer 
explicação de como a Europa se tornou europeia. Em uma visão mais abrangente, 
é a busca das origens da civilização ocidental.” 
 
 
 
9 
 
Referências 
BEEKES, Robert S. P. Comparative Indo-European Linguistics. Amsterdam/Philadelphia: John 
Benjamin, 1995. 
BENVENISTE, Émile. O vocabulário das instituições indo-européias. 2 v. Campinas: Editora 
Unicamp, 1995. 
DUMÉSIL, Georges. Heure et malheur du guerrier. Paris: PUF, 1985. 
MALLORY, James Patrick. A short story of the Indo-European problem. Journal of Indo-European 
studies, n. 1, 1973, p. 21-65. 
MALLORY, James Patrick. In search of the Indo-Europeans. Londres: Thames & Hudson, 1989. 
MEILLET, Antoine. Linguistique historique et linguistique générale. Paris : Champion, 1948. 
QUILES, Carlos; LÓPEZ-MENCHERO, Fernando. A grammar of Modern Indo-European. 2011. 
Disponível em: <http://dnghu.org/en/indo-european-language-grammar/>. Acesso em: 19 jun. 2011. 
VILLAR LIÉBANA, Francisco. Lenguas y pueblos indoeuropeos. Madrid: Istmo, 1971. 
LEITURA COMPLEMENTAR 
Literatura em proto-indo-europeu? 
Em 1868, A. Schleicher publicou o poema “O carneiro e os cavalos”, escrito em 
PIE. Assim, ele queria demonstrar que, a partir das palavras reconstruídas do 
PIE, era possível elaborar um texto real, concreto. A sua tradução é a seguinte: 
A ovelha e os cavalos 
[Em uma colina], uma ovelha sem lã avistou cavalos, um deles puxando uma carroça 
pesada, um carregando uma grande carga e outro carregando, rapidamente, um homem. 
A ovelha disse aos cavalos: "Meu coração me faz sofrer, vendo um homem guiando 
cavalos". Os cavalos disseram: "Ouça, ovelha, nossos corações nos fazem sofrer quando 
nós vemos isto: um homem, o mestre, fazer da lã da ovelha um vestuário para se aquecer, 
enquanto a ovelha está sem lã.". Ao ouvir isso, a ovelha fugiu para as planícies. 
Posteriormente, outros autores, tendo como base o texto de Shleicher, 
compuseram novas versões da fábula. Afinal, se toda língua evolui, o PIE 
também o faz! Veja a versão de Schleicher e as demais em: 
http://tinyurl.com/43nalsm 
Outro texto curioso é “Diálogo entre um rei e um deus”, também escrito em PIE 
por vários indo-europeístas, já no século 20. A versão original e outras que a 
seguem também podem ser encontradas mesmo site acima. 
http://dnghu.org/en/indo-european-language-grammar/
http://tinyurl.com/43nalsm
 
10 
 
O rei e o deus Werunos 
Era uma vez um rei que não tinha filhos, mas que desejava um filho. Ele perguntou para 
o seu sacerdote: "Que um filho nasça para mim!". O sacerdote disse para o rei: "Ore para 
o deus Werunos". O rei aproximou-se do deus Werunos para, então, rezar para ele. 
"Escute-me, pai Werunos!". O deus Werunos desceu do paraíso: "O que você deseja?" 
"Eu quero um filho". "Que assim o seja!", disse o iluminado deus Werunos. A esposa do 
rei gerou um filho.

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