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S������ Capa Folha de rosto créditos Dedicatória Prefácio Introdução Senso de Continuidade Orientação para Resultados Intimidade com Deus Visão Espiritual Capacidade de Reação Governo Divino Poder de Absorção Conclusão kindle:embed:0005?mime=image/jpg L�������� A���� �� M���� uma vida de influência extraordiNária está ao seu alcance © 2020 D����� F������� Revisão Antônio Fernando Valente Mônica Rodrigues Figueira Capa e Diagramação Moysés Ribeiro de Moraes Produção ePub: Booknando Classificação Temática: 1. Liderança 2. Superação 3. Influência espiritual 4. Maturidade na fé S���� P�������� R�� N��� C���, 320 CEP 14.055-110 - I������� T��. 16 3966 3030 R������� P���� - SP �-����: �������@��������������.���.�� ���.��������������.���.�� https://www.selahproducoes.com.br/ I��������/F�������: �������������� Redes sociais do autor: F�������: ������.��������.1 T������: @D�����_F������� I��������: ������_�������� E • D���������� • nquanto eu esboçava as primeiras ideias deste livro, minha mãe, minha maior intercessora, partiu, deixando atrás de si um legado impagável e uma imensa saudade. Jane Cajazeira Figueira ouviu seu nome sendo chamado no Lar Celestial, no dia 6 de dezembro de 2018, tempo dos homens. Num daqueles espasmos de dor que a gente sente quando perde uma pessoa tão querida, dei-me conta de que aquelas imagens que voltavam à minha mente com um aperto no coração, na verdade, nunca desapareceriam, ainda que a tristeza que provocavam tendesse a diminuir com o tempo. No dia em que minha mãe se foi, chorando sobre uma foto em que ela aparecia com um sorriso tímido diante de um espelho, escrevi o seguinte texto, palavras que quero perpetuar aqui, em honra à sua memória: “Nunca vou esquecê-la... Qualquer espelho trará de volta você. Minha imagem é para sempre reflexo da sua, mãezinha querida. Seja na fragilidade corajosa, que sente o medo, mas o enfrenta, seja na ‘teimosia’ virtuosa, que sabe o que quer e descobre o caminho para conseguir, você estará em mim. No amor às Escrituras, no desejo de guardar a vida em papéis cheios de letras, na honra aos profetas, no controle remoto de quem se ama, na capacidade de manter amigos, um tanto de você seguirá vivendo em mim. Toda vez que eu me olhar no espelho, ainda que não faça de pronto a conexão, estarei novamente diante da sua face. Seu zelo pela família me acompanhará, assim como sua discrição respeitosa e sua capacidade de se sentar à mesa, sem destoar, seja com o nobre ou com o peão. Não, você não foi perfeita, assim como eu também não consigo ser. Nossa cólera me vence também, tantas vezes, assim como o ‘medo’ de rã que você me passou, e a vontade de dar aquela resposta bem dada a quem merece (e, às vezes, a quem não merece). Meus filhos dirão que, embora eu os tenha deixado crescer e ter suas próprias vidas, sigo eternamente querendo saber onde estão e quando chegarão de volta... Bem que eu deveria colocar a culpa em você, dizer-lhes que estou apenas refletindo o amor da mãe que, nem a três mil quilômetros de distância, admitia perder de vista o filho barbado. Cada vez que eu orar, estarei sendo você, minha linda. Quando eu achar de novo a palavra apropriada para o momento, será a sua sabedoria inspirando a minha. Cada vez que eu progredir na jornada, sua resiliência estará me empurrando. E se a vida, por capricho ou desígnio, obrigar-me a dar uns passos atrás, não me farei de rogado e, como você, esperarei o próximo capítulo para me ‘vingar’ ou mostrar que aprendi a lição. Você se foi e a dor é enorme dentro de mim! Só não é maior porque sei que Aquele que você via até ontem, de longe, como que pelos vidros embaçados de uma janela, agora vê face a face e isso fez de você a pessoa mais feliz do Universo. Quanto a mim, mãezinha querida, prometo nunca desonrar sua imagem nesta terra e me lembrar sempre, diante dos espelhos, que tudo o que eu sou começou em você.” L • P������� • iderança Acima da Média é um título ousado para um livro. Imediatamente ele suscita um questionamento: Quem é o autor? Alguém que se propõe a escrever sobre um tema assim, atrai um peso sobre si. Entretanto, no caso desta obra específica, saber quem a produziu me faz descansar. Eu conheço o autor e posso assegurar que se trata de um pastor, discipulador e líder que vive acima da média, mas não quer viver lá sozinho. Por isso, compartilhando verdades e princípios poderosos, decidiu contribuir para que seus leitores também acessem um novo nível de influência em suas vidas. Danilo Figueira é um mestre da Palavra. Como ele mesmo sentenciou: “Ninguém conquista o que não enxerga”. Recomendo esta obra verdadeira, prática, rica em base e princípios bíblicos, edificante do início ao fim. Você será muito enriquecido com a leitura deste livro, à medida em que entender que o chamado da vida cristã envolve liderar a partir da sua própria realidade, seja ela qual for. Independentemente se o faz através do ministério pastoral ou como empreendedor, professor, pregador, discipulador, mentor ou pai, todo seguidor de Cristo deve amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo – e esse amor sacrificial envolve servir, influenciar e desenvolver potenciais. Em outras palavras, envolve liderança! Em diferentes esferas e medidas, todos precisaremos responder pelo que Deus nos entregou a cultivar nesta vida passageira, tão breve. Muitos exercerão influência e liderarão, mas nem todos o farão em alto nível. Na realidade, não faz sentido viver a vida cristã de outra forma que não seja a excelência, desenvolvendo raízes profundas e frutos viçosos. Paulo escreveu numa de suas cartas: “Como prisioneiro no Senhor, rogo-lhes que vivam de maneira digna da vocação que receberam” (Efésios 4:1). Muitas pessoas tentam desenvolver a vocação cristã à sua própria maneira, mas não de forma digna. O resultado é que não apenas elas mesmas sofrem, mas também quem se coloca debaixo de sua liderança. Eis um dos motivos pelos quais considero este livro de Danilo Figueira tão relevante, num momento crucial do Reino de Jesus na Terra e, em especial, da Igreja brasileira. Estamos diante de oportunidades inéditas para levarmos pessoas a Jesus, formarmos extraordinários discípulos de Cristo, influenciarmos as áreas fundamentais da sociedade e levantarmos igrejas locais saudáveis e frutíferas. No entanto, nada disso será feito com líderes mesquinhos, medíocres, instáveis e com a mente dividida. Será preciso um exército de “Josés”, homens e mulheres que vençam adversidades, permaneçam fiéis frente aos testes da vida, sejam sensíveis espiritualmente e puros de coração. Líderes capazes de, por meio da sua influência, transformar poços e prisões em palácios, antes que tenham um anel de decisão para governar. Acompanhando a benção de um pai sobre o seu filho – porque a visão geracional e a paternidade espiritual estão no cerne de toda liderança saudável – você mergulhará nas próximas páginas em princípios e valores que podem transformar sua liderança, tanto no seu contexto atual, como aonde ela ainda chegará. A partir da vida de José, o “ramo frutífero”, filho de Jacó, um lindo tipo de Jesus, o autor traz fundamentos de vida cruciais para qualquer líder que queira viver plenamente o seu chamado, com visão, caráter, serviço e intimidade com o Pai. Um aspecto que abrilhanta ainda mais esta obra é a forma como os conflitos, pensamentos e dúvidas tão comuns na liderança – e que poucas vezes são discutidos abertamente – são tratados com sinceridade e sabedoria pelo autor. Certamente, você se identificará com as experiências e desafios compartilhados e correrá para aplicar em sua realidade os princípios de liderança expostos. Para ser um líder acima da média, sua mentalidade terá que romper a barreira do comum, da mesmice, do medo e da acomodação. Não será fácil, mas certamente é possível! O que você lerá nas próximas páginas não é sobre cargos, títulos ou reconhecimento público, porque evidência, significância e relevância são coisas completamente diferentes.Como meu amigo Danilo afirma com propriedade: “A liderança não tem a ver com posição, mas com propósito”. Você está aqui para quê? O que Deus tem confiado às suas mãos? É tempo de nos levantarmos de forma digna do chamado celestial em nossas vidas, para que cumpramos fielmente a vocação neste tempo de maravilhosas oportunidades. Como Jacó abençoou José, receba por meio da leitura desta obra a benção do autor sobre sua vida e ministério. Decida viver acima da média! Quem se conforma com o bom, nunca viverá o excelente. Quem se acomoda à mesmice, premia a mediocridade. Portanto, construa o melhor, nivele para cima, porque a excelência honra ao Senhor e inspira as pessoas. Este é o mapa! Boa leitura! Você irá enxergar “além dos seus muros”! Carlito Paes, Mestre em Teologia, pastor líder da Igreja da Cidade em São José dos Campos/SP e fundador da Rede de Igrejas da Cidade e da Rede Inspire de Igrejas, palestrante sobre liderança e autor de 27 livros. O • I��������� • ancião, já com os olhos embaçados e o corpo enfraquecido pelo tempo, convocou sua numerosa família para um encontro solene. O clima era de despedida. A intenção era colocar a mão sobre a cabeça de cada filho e impetrar uma bênção final antes de morrer, como ditava o costume. Assim, um após o outro, doze homens se curvaram diante do patriarca e ouviram palavras inspiradas por Deus, declarações proféticas que viajavam entre a história vivida e o futuro de cada um deles. Quando o décimo primeiro se curvou, um decreto soou forte e instigante naquele lugar: “As bênçãos de teu pai excederão as bênçãos de meus pais até ao cimo dos montes eternos; estejam elas sobre a cabeça de José e sobre o alto da cabeça do que foi distinguido entre seus irmãos.” (Gênesis 49:26) “Distinguido entre seus irmãos!” Dos doze filhos, um havia vivido acima da média, protagonizando uma história de resultados tão extraordinários que merecia ser não apenas mencionada, mas dissecada para inspirar outras gerações. Há pessoas que passam pela vida sendo lembradas depois por sua maldade ou pelos danos que deixaram. Outras, maioria absoluta, acomodam-se à mediocridade, perdem-se na massa dos comuns, dos iguais. Desenvolvem sua história sem chamar a atenção, sem produzir impacto algum. Mesmo entre os filhos de Deus é assim. Não que sejam necessariamente inúteis ou improdutivos. Apenas não se descolam do nível limitado de influência no qual a maior parte das pessoas sobrevive. Este livro é, não apenas apelo a uma vida cristã acima da média, de influência e liderança decisivas nos contextos em que somos semeados por Deus, mas uma tentativa de demonstrar, se não todos, alguns dos principais fundamentos para desenvolvê-la. A inspiração central é José, aquele cujo pai, Jacó, reconheceu como “distinguido” ou “destacado” entre seus irmãos, em que pese a vida lhe ter sido mais difícil e desafiadora do que para os demais. Chamam-no popularmente de “José do Egito”, embora isso, a rigor, seja quase um acinte à sua real identidade. Se houve uma coisa que esse hebreu nunca negociou, foi a estirpe que trazia. Embora tenha passado a maior parte da vida na terra dos faraós e ali, depois de muito sofrimento, tenha triunfado, o conhecimento das promessas de Deus feitas a seus ancestrais, desde seu bisavô, Abraão, manteve nele a firme convicção de que o Egito era lugar de passagem e não de destino. Havia uma terra prometida, herança da qual não estava disposto a abrir mão, nem mesmo morto. Tanto que, já no fim da vida, fez um pedido aos seus familiares: “Disse José a seus irmãos: Eu morro; porém Deus certamente vos visitará e vos fará subir desta terra para a terra que jurou dar a Abraão, a Isaque e a Jacó. José fez jurar os filhos de Israel, dizendo: Certamente Deus vos visitará, e fareis transportar os meus ossos daqui. Morreu José da idade de cento e dez anos; embalsamaram-no e o puseram num caixão no Egito.” (Gênesis 50:24-26) Assim, mais de quatro séculos depois, quando Moisés conduziu pelo deserto a multidão de israelitas, do longo cativeiro egípcio para a terra de Canaã, entre as preciosidades levadas estavam os ossos de José, que viveu no Egito, sofreu no Egito, venceu no Egito, mas do Egito nunca aceitou ser. Feita esta correção quanto à forma popular como ficou conhecido, que se justifica pelo fato de aquele império ter sido o seu principal cenário, voltemos à declaração que seu pai, Jacó, fez antes de morrer. Leiamos o texto completo, pois ele será o nosso balizador e fonte de revelação pelos próximos capítulos: “José é um ramo frutífero, ramo frutífero junto à fonte; seus galhos se estendem sobre o muro. Os flecheiros lhe dão amargura, atiram contra ele e o aborrecem. O seu arco, porém, permanece firme, e os seus braços são feitos ativos pelas mãos do Poderoso de Jacó, sim, pelo Pastor e pela Pedra de Israel, pelo Deus de teu pai, o qual te ajudará, e pelo TodoPoderoso, o qual te abençoará com bênçãos dos altos céus, com bênçãos das profundezas, com bênçãos dos seios e da madre. As bênçãos de teu pai excederão as bênçãos de meus pais até ao cimo dos montes eternos; estejam elas sobre a cabeça de José e sobre o alto da cabeça do que foi distinguido entre seus irmãos.” (Gênesis 49:22-26) O que temos aqui, saindo da boca desse importante patriarca, não é apenas o reconhecimento de que um de seus filhos desenvolvera uma vida acima da média, mas a exposição dos fatores que o levaram a tal nível de significância. Em cada afirmação, às vezes em cada palavra, há um poderoso segredo espiritual que convido você a explorar. Vivemos num mundo de massificação e mediocridade. Há nos nossos dias uma gravíssima crise de liderança, um clamor desesperado por homens e mulheres de influência confiável. Onde estão as referências a serem seguidas, copiadas? Mesmo na igreja, lugar de onde se deveria distribuir inspiração para o mundo, a maior parte se acomoda a uma trajetória sem impacto e de poucos resultados. Se alguns conseguem chamar a atenção com certa performance, a superficialidade não lhes dá sustentação aos frutos e, assim, infelizmente, surgem e desaparecem com velocidade e inconsistência de estrelas cadentes. Tudo isso vai na contramão do que Deus nos propôs. Não fomos criados e nem redimidos para a irrelevância! Cada crente deveria entender o seu papel de protagonismo, não no sentido da mera evidência, mas da influência decisiva dentro do espaço em que é plantado. Quando Jesus nos identifica como “sal da terra” e “luz do mundo”, por exemplo, não está falando sobre pessoas que possam ficar escondidas na vala dos comuns. Aliás, Ele deixou isso bem claro: “Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa. Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus” (Mateus 5:13- 16). Você verá que, com frequência, eu abordarei o conceito de liderança como parte do chamado cristão. Eu realmente creio que, em tese, qualquer servo de Deus deva liderar. Isso não quer dizer, necessariamente, ocupar posições formais de comando, seja na igreja ou em outros espaços sociais. Não demanda nem mesmo “aparecer” mais do que os outros. Na minha percepção, o entendimento mais nobre de liderança é “influência positiva” e ela pode ser exercida até mesmo a partir dos bastidores, tendo como ferramenta principal o serviço. À medida que observarmos a vida de José, isso ficará muito claro. É bem comum se confundir relevância com espetacularidade. Há pessoas que já se excluem da possibilidade de se destacarem na vida porque não se sentem em condição de se tornarem performáticas. Entretanto, a performance que importa tem mais a ver com abençoar pessoas e ambientes do que com chamar a atenção para si. Um doshomens mais importantes na minha vida se chama Harry Scates. O impacto de sua presença tem influenciado não apenas o meu destino, mas o de milhares de pessoas no Brasil e nas nações. Ele tem sido meu pastor por quase três décadas e sempre digo desse missionário americano que se fez brasileiro: o mais espetacular de sua vida e ministério é que ele não é nada espetacular! Harry é uma daquelas pessoas que não levantam a voz, não têm uma eloquência impressionante, não fazem nenhum esforço no sentido de chamarem a atenção para si. Entretanto, a consistência dos seus valores, a coerência do seu testemunho e a profundidade da sua fé têm um poder de mobilização tão grande que é quase impossível alguém conviver com elas e permanecer indiferente. Ao mergulharmos nas palavras que Jacó proferiu sobre seu filho José, descobriremos o que pode fazer de um ser humano comum um propagador do bem, ao ponto de destacá-lo como referencial em seu tempo e até para outras gerações. O menino, que aparece com dezessete anos no capítulo 37 de Gênesis, vivendo sob certa predileção dos pais e tendo sonhos improváveis da parte de Deus, passaria por duros reveses até se tornar um dos homens mais poderosos do mundo. Invejado pelos irmãos, traído e vendido como escravo pelos mesmos a ismaelitas que o levariam ao Egito, teve que experimentar, longe de suas origens, difíceis e prolongadas provas até ver a vida fazer todo o sentido, com o cumprimento das promessas divinas. Foram mais de vinte anos numa terra estranha e longe de seu pai, vivendo um script confuso, mas que apenas o aperfeiçoou, evidenciando a consistência da sua fé. Ao propor, pela leitura deste livro, que você aceite o desafio da relevância, de ir além da mediocridade, não preciso conhecer a sua história. Ela pode ser absolutamente desfavorável, como foi a de José, mas se pela fé você tomar as decisões certas, provavelmente um dia alguém dará testemunho a seu respeito, dizendo algo do tipo: “Este aqui foi destacado entre seus irmãos, alguém que viveu acima da média.” Capítulo I Q S���� �� C����������� “José é ramo...” uando Jacó abriu a boca para abençoar seu filho José, na verdade fez um resumo da história e das virtudes que o levaram a ser o grande líder que foi, “destacado entre seus irmãos”. Cada palavra do ancião estava carregada de conteúdo, inspirada por uma sabedoria que não era humana. Com afirmações impressionantemente objetivas e de significado profundo, ele nos brinda não somente com um testemunho a respeito do filho, mas com um verdadeiro guia para que nos tornemos também pessoas extraordinárias. Ao descrever seu filho, o ancião começou usando uma figura bastante inteligente. Ele disse: “José é um ramo...” Apropriando-se de uma sugestiva imagem da Botânica, ilustrou uma das virtudes mais essenciais na vida de alguém que quer se destacar pelas vias corretas: o senso de continuidade. Como todos sabemos, uma planta é composta por várias partes: raízes, caule, folhas, frutos... Entre elas, estão os ramos ou galhos, que são derivações. Um ramo não nasce diretamente da terra e tampouco pode ser tratado como a planta inteira. Ele sempre brota de uma parte que se desenvolveu antes e que lhe fornece identidade, sustentação e nutrientes para seu crescimento. É fascinante o detalhe de que o vocábulo traduzido por “ramo” nessa passagem bíblica é a palavra hebraica “ben”, que também significa “filho”. Aliás, ela aparece como prefixo no nome de vários personagens citados na Bíblia. Como exemplo, Ben-Hadade é, literalmente, filho de Hadade; Ben-Hur, filho de Hur; Ben-Hanã, filho de Hanã e assim por diante. Segundo o Léxico de Strong, “ben” procede de “banah”, um verbo do Hebraico cujo sentido é “construir, fazer continuar”, ou ainda “edificar uma casa, estabelecer uma família”. Todas essas informações juntas nos remetem a uma ideia central: um dos segredos de José foi se assumir como um ramo, alguém cujo propósito não era começar nada, mas dar curso ao legado que vinha dos seus antepassados. Não havia cogitação em seu coração de se descolar das raízes espirituais que construíam sua identidade. O pertencimento a uma família e o propósito de abrir caminho para que aquela linhagem não apenas sobrevivesse, mas prosperasse, cumprindo o propósito de Deus, foi uma grande âncora para sua alma. Mesmo tendo sido arrancado do convívio com seus pais e irmãos por longos anos, ele nunca perdeu ou negociou o DNA espiritual que vinha desde seu bisavô, Abraão, passando por seu avô, Isaque e por seu pai, Jacó. Quem despreza o passado encurta o alcance do seu futuro e apequena a própria história. Todo cristão, nascido de novo, deveria se enxergar como depositário do crédito das gerações que o antecederam. Parece ser essa a ideia que o escritor da carta aos Hebreus quis nos passar, apontando a carreira que nos está proposta a partir do background de uma imensa “nuvem de testemunhas”, gente que nos precedeu na fé. “Portanto, também nós, visto que temos a rodear-nos tão grande nuvem de testemunhas, desembaraçando-nos de todo peso e do pecado que tenazmente nos assedia, corramos, com perseverança, a carreira que nos está proposta, olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus.” (Hebreus 12:1-2) A “nuvem de testemunhas” mencionada no texto é uma grande lista de pessoas que venceram pela fé, gerações passadas sobre as quais se ocupa todo o capítulo anterior e que devemos considerar no cumprimento do nosso próprio chamado. Se o nosso alvo é Cristo e para Ele devemos olhar firmemente enquanto corremos, a fim de não nos desviarmos e nem desanimarmos, é necessário que uma lembrança nos acompanhe: outros se esforçaram antes de nós, cumprindo o seu papel na mesma corrida, deixando-nos numa posição avançada para superarmos a etapa que nos cabe. A vida cristã nunca é uma jornada solo. Nosso papel é levar adiante um bastão que recebemos de quem nos antecedeu. Infelizmente, vivemos numa época em que, talvez mais do que em qualquer outra, cultua-se o personalismo. Todo mundo é formatado para viver a sua própria vida, quebrando paradigmas e desconsiderando o que foi construído pelas gerações passadas. A necessidade de protagonismo pessoal é tão presente hoje que prestar reverência, mantendo fidelidade aos valores de quem atuou antes, é tido como sinal de fraqueza, retrocesso, subserviência. A proposta do Reino de Deus vai na contramão de tudo isso! Senso de continuidade é um conceito essencial porque tem a ver com honra e honra é um valor central na cultura do Céu. Quando eu honro aqueles que me antecederam na vida - e, especialmente, na fé - colocando-me como sucessor de seu legado, desato um fluxo sobrenatural de experiências, autoridade e conquistas, acumulado na história para abastecer o meu sucesso. Jogar essa riqueza fora pelo desejo soberbo de “ter a própria marca” é uma estupidez que tem seduzido muitos líderes, precipitando-os na aventura tola do “eu me basto”. Para contrapor esse modelo, olhe para o que fez Jesus. Ele será um exemplo mais contundente que qualquer outro! Se por essa Terra passou alguém que poderia se arvorar em sua própria suficiência, esse alguém foi Ele, o Unigênito do Pai! Entretanto, você já notou qual foi o primeiro gesto do Nazareno, ao se apresentar publicamente para cumprir o ministério? Ele desceu ao Jordão, onde João Batista ministrava, com o propósito de ser batizado por aquele profeta. “Por esse tempo, dirigiu-se Jesus da Galileia para o Jordão, a fim de que João o batizasse. Ele, porém, o dissuadia, dizendo: Eu é que preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim? Mas Jesus lhe respondeu: Deixa por enquanto, porque, assim, nos convém cumprir toda a justiça. Então, ele o admitiu. Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele. E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quemme comprazo.” (Mateus 3:13-17) Entenda o que aconteceu nesta cena! João era o precursor de Jesus, aquele que viera para lhe preparar o caminho, profeta reconhecido, manifestado imediatamente antes da revelação do Filho de Deus. Seu ministério foi, obviamente, muito menor do que seria o de seu primo nazareno. No entanto, antes de se apresentar ao mundo como enviado do Pai, Jesus desceu ao Jordão e se curvou diante de João, pedindo que este o batizasse. Aquilo fazia parte do cumprimento de “toda a justiça”, conforme suas próprias palavras. Estou convencido de que esse “protocolo espiritual” não se referia apenas ao fato de o Cristo se submeter ao batismo de arrependimento, identificando-se assim com o pecado da humanidade. O gesto também abrangia reconhecer, honrar e obter respaldo de uma autoridade espiritual precursora. Em outras palavras, Jesus desceu ao Jordão para “receber o bastão” de João e, então, seguir sua própria carreira pelo caminho que aquele profeta lhe abrira. Antes que os homens ouvissem a voz de Deus a seu respeito, dizendo: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” (conf. Mateus 3:17), foi a voz de João que o apresentou ao mundo: “No dia seguinte, viu João a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo! É este a favor de quem eu disse: após mim vem um varão que tem a primazia, porque já existia antes de mim. Eu mesmo não o conhecia, mas, a fim de que ele fosse manifestado a Israel, vim, por isso, batizando com água.” (João 1:29-31) A ÂNCORA DE UMA VISÃO GERACIONAL Paternidade e legado são conceitos fundamentais no Reino. A mente do Senhor nos concebeu a partir da perspectiva de gerações. Quando Ele, o Eterno, se apresenta como o “Deus de Abraão, de Isaque e de Jacó” (como fez diante de Moisés, por exemplo, em Êxodo 3:6), está demonstrando o caráter geracional do seu plano. Não é à toa que a Bíblia dá tanta importância às genealogias. Não se trata apenas de registro histórico, mas da identificação de linhagens espirituais e, portanto, legados espirituais. Voltando ao personagem central do nosso livro, José era ramo, filho e nunca admitiu deixar de ser. Esse foi um dos segredos que fizeram dele um líder acima da média. Mesmo longe da casa do seu pai, submetido por longos anos a uma cultura antagônica às suas origens, ele nunca perdeu a âncora da sua linhagem espiritual. Os sonhos que Deus lhe dera na adolescência abrangiam sua família, nasciam dela e apontavam para o dia em que seus pais e irmãos se curvariam diante dele, para serem abençoados. Esse era o verdadeiro sentido, embora a princípio fosse mal compreendido pelos de sua casa. “Teve José um sonho e o relatou a seus irmãos; por isso, o odiaram ainda mais. Pois lhes disse: Rogo-vos, ouvi este sonho que tive: Atávamos feixes no campo, e eis que o meu feixe se levantou e ficou em pé; e os vossos feixes o rodeavam e se inclinavam perante o meu… Teve ainda outro sonho e o referiu a seus irmãos, dizendo: Sonhei também que o sol, a lua e onze estrelas se inclinavam perante mim.” (Gênesis 37:5-7,9) Foi essa visão que manteve José na rota, durante o longo tempo de incoerências que precisou enfrentar no Egito. Ele tinha uma família e deveria viver na perspectiva de abençoá-la. Mesmo quando isso pareceu tão fora do seu horizonte, devido aos anos de completa separação, sua identidade não foi afetada. José continuava a se portar como herdeiro de uma linhagem, o filho de Jacó, ainda que nem mesmo pudesse ter certeza se o pai continuava vivo. Este homem poderia inaugurar o seu próprio script de vida. Depois de ser traído, vendido pelos irmãos e viver tanto tempo sem ao menos ter notícia de casa, ele deve ter sido tentado a desistir do legado e conceber um plano de voo particular, enterrando os vínculos com sua origem. Se o fizesse, talvez até conseguisse algum êxito humano, embora eu duvide, por entender que os milagres que Deus fez para alçá-lo da condição de escravo e prisioneiro à de governador do grande império da época, só aconteceram porque ele se manteve fiel ao propósito. Mas, ainda que tivesse algum sucesso pessoal, descolando- se da raiz, esse sucesso nada teria a ver com o plano de Deus e, portanto, seria efêmero. José escolheu manter-se como parte de um projeto maior do que ele mesmo, sendo elo entre uma geração e outra. Não somente quando sofreu, mas também quando foi coroado com honra e poder, manteve- se na missão de dar sequência a uma história que havia começado muito antes de seu nascimento. Essa perspectiva o ajudou a ver a vida de uma forma mais ampla e cheia de propósito. Tanto é verdade que, quando finalmente se reencontrou com os irmãos que o haviam traído, estando em condição de se vingar, ele não o fez. Ao invés disso, não apenas os perdoou, como se assumiu como um “missionário” que apenas havia chegado na frente, para lhes preparar caminho: “Disse José a seus irmãos: Chegai-vos a mim. E chegaramse. Então, disse: Eu sou José, vosso irmão, a quem vendestes para o Egito. Agora, pois, não vos entristeçais, nem vos irriteis contra vós mesmos por me haverdes vendido para aqui; porque, para conservação da vida, Deus me enviou adiante de vós.” (Gênesis 45:4-5) Infelizmente, a maioria dos cristãos não compreende o valor do que chamamos cobertura ou paternidade espiritual. Seja por ignorância, seja devido à institucionalização da igreja, que substituiu relacionamentos por estruturas, seja pela decepção com líderes indignos, ou ainda pelo mero desejo de independência, são muitos os que vivem a tragédia da orfandade espiritual. Eu não me surpreenderia se soubesse que algum leitor “engasgou” diante desta expressão. “Orfandade espiritual?!!” – diriam muitos – “Eu sou filho de Deus e isso me basta!” Parece bastante bíblico, não é mesmo? Entretanto, uma verdade bíblica enfatizada em detrimento de outra terá sempre uma dose de engano. A paternidade de Deus na vida daquele que crê é o nosso bem maior, não há dúvida sobre isso. Porém, ela não anula o fato de que fomos salvos para andar diante de preceptores de carne e osso, gente levantada pelo Espírito para nos transmitir uma visão e nos projetar ao ministério - leia-se “serviço cristão”! “Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram... Obedecei aos vossos guias e sede submissos para com eles; pois velam por vossa alma, como quem deve prestar contas, para que façam isto com alegria e não gemendo; porque isto não vos aproveitaria.” (Hebreus 13:1,17) Quando Paulo ou João chamavam seus discípulos de “filhos”, não estavam usurpando o lugar de Deus, mas assumindo a responsabilidade e o prazer de formá-los, transmitindolhes um legado, a fim de que fossem bem-sucedidos. “A Timóteo, verdadeiro filho na fé, graça, misericórdia e paz, da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus, nosso Senhor.” (I Timóteo 1:2). “A Tito, verdadeiro filho, segundo a fé comum, graça e paz, da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus, nosso Salvador.” (Tito 1:4) “É bom ser sempre zeloso pelo bem e não apenas quando estou presente convosco, meus filhos, por quem, de novo, sofro as dores de parto, até ser Cristo formado em vós.” (Gálatas 4:18-19) “Não tenho maior alegria do que esta, a de ouvir que meus filhos andam na verdade.” (III João 1:4) Na contramão desta visão bíblica, cada vez mais pessoas se relacionam com a igreja como se fosse um clube social que frequentam enquanto lhes for prazeroso ou conveniente. Mesmo entre os que compreendem a importância de estar debaixo de pastoreamento, há quem rompa alianças com facilidade, desprezando o legado que há na vida de seus líderes. Por vezes, a apologia à independência vem de corações feridos, decepcionados com lideranças inaptas. Entretanto, sem querer diminuir o poder das decepções, preciso afirmar que sempre houve maus líderes, gente indigna do manto que recebeu de Deus e, apesar disso, as Escrituras Sagradas estão cheias de exemplos e conselhos que nos apontam o caminho da aliança e da submissão comorota para que prosperemos. Josué não teria se tornado quem se tornou, caso tivesse rompido com Moisés. Eliseu nunca seria o profeta da “porção dobrada”, se não insistisse em seguir e servir Elias até ao fim. A moabita Rute jamais seria inserida na história do povo de Deus, inclusive se tornando uma ascendente do Messias, caso não tivesse feito uma aliança com Noemi, um pacto de fidelidade até à sepultura. Eu posso dar outros exemplos: Davi e Samuel, os apóstolos e Jesus... Isso sem falar daqueles cujo legado foi, não apenas espiritual, mas também familiar, como é o caso do nosso personagem central, José. TROCANDO O LEGADO PELA ILUSÃO Há uma história bíblica que ilustra muito bem as consequências do desprezo pelo legado espiritual: a de Geazi. Conhecido como “o moço de Eliseu”, discípulo do profeta que havia herdado porção dobrada da unção de Elias, esse jovem teve a chance de receber uma riqueza profética imensurável. Ele viveu experiências fantásticas ao lado de seu líder, tendo nele um mentor disposto a transferir a unção. Geazi poderia, certamente, dar curso a um rio que fluíra de homens tremendos como Elias e Eliseu! Quando acompanhamos sua trajetória ao lado do profeta, vemos claramente um discípulo sendo formado. Entretanto, o que poderia ser uma herança em sua vida, tornou-se apenas uma saudosa história para contar. A última vez que temos uma referência a ele nos relatos bíblicos é no capítulo 8 de II Reis, longe de Eliseu, contando ao rei de Israel as antigas histórias do profeta com o qual andara. O que deveria ser uma experiência de continuidade tornou-se apenas uma memória distante. Ele havia jogado fora a oportunidade de sua vida! A crise que levou ao rompimento da aliança entre Geazi e seu discipulador está no contexto do que é narrado em II Reis 5. Valeria a pena ler este capítulo para conhecer ou rememorar o episódio. Por intervenção de Eliseu, um general siro havia sido milagrosamente curado da lepra que o consumia e, agradecido, quis dar uma oferta generosa ao profeta. Este, porém, por algum motivo que desconhecemos, não a aceitou. É aí que começa a derrocada de Geazi, que acompanhava tudo de perto... “Geazi, o moço de Eliseu, homem de Deus, disse consigo: Eis que meu senhor impediu a este siro Naamã que da sua mão se lhe desse alguma coisa do que trazia; porém, tão certo como vive o Senhor, hei de correr atrás dele e receberei dele alguma coisa. Então, foi Geazi em alcance de Naamã; Naamã, vendo que corria atrás dele, saltou do carro a encontrá-lo e perguntou: Vai tudo bem? Ele respondeu: Tudo vai bem; meu senhor me mandou dizer: Eis que, agora mesmo, vieram a mim dois jovens, dentre os discípulos dos profetas da região montanhosa de Efraim; dá-lhes, pois, um talento de prata e duas vestes festivais. Disse Naamã: Sê servido tomar dois talentos. Instou com ele e amarrou dois talentos de prata em dois sacos e duas vestes festivais; pô-los sobre dois dos seus moços, os quais os levaram adiante dele. Tendo ele chegado ao outeiro, tomou-os das suas mãos e os depositou na casa; e despediu aqueles homens, que se foram. Ele, porém, entrou e se pôs diante de seu senhor. Perguntou-lhe Eliseu: Donde vens, Geazi? Respondeu ele: Teu servo não foi a parte alguma. Porém ele lhe disse: Porventura, não fui contigo em espírito quando aquele homem voltou do seu carro, a encontrar-te? Era isto ocasião para tomares prata e para tomares vestes, olivais e vinhas, ovelhas e bois, servos e servas? Portanto, a lepra de Naamã se pegará a ti e à tua descendência para sempre. Então, saiu de diante dele leproso, branco como a neve.” (II Reis 5:20-27) Há detalhes que merecem ser destacados nessa história, por ilustrarem muito bem o que pode levar uma pessoa a perder o legado espiritual a que tem direito. O primeiro passo no terreno escorregadio onde aquele discípulo de profeta caiu, foi dado quando ele se permitiu desenvolver uma visão autônoma. Chama-me a atenção a frase: “Geazi, o moço de Eliseu, homem de Deus, disse consigo...” (vs. 20). Ela revela alguém que começava a ter ideias particulares, à revelia de seu líder, estabelecendo diálogos com a própria carne. Costuma ser assim o início de toda forma de rebelião ou quebra de aliança. Satanás sugere que ser independente para pensar por conta própria é um justo direito e o homem gosta da ideia. Dessa forma, quando alguém passa a conversar com sua alma num dialeto que não é o dos seus preceptores, uma semente de engano pode estar prestes a brotar. No caso de Geazi, ele não apenas questiona, como começa a reprovar as decisões de Eliseu. O processo de sedução diabólica que leva um homem para fora de sua cobertura transforma a admiração em crítica, a obediência em questionamento, a submissão em discordância. Até então, Eliseu era mentor de Geazi, digno de sua admiração e confiança, mas um “porém” se estabeleceu entre o seu coração e o dele. Quem conhece meu ensino e minha prática ministerial sabe que, nem de longe, eu confundo liderança com domínio sobre pessoas, aliança com escravidão, submissão com obediência cega. Não creio que a autoridade espiritual é dada para manter pessoas em prisão, impedidas de exercerem o seu arbítrio próprio. Reconheço que, em muitos casos, separar-se de um líder indigno, castrador ou míope é a coisa mais espiritual a se fazer. Entretanto, o rompimento é exceção e não regra no Reino de Deus. Ele só se justifica em circunstâncias muito particulares. Quando meras discordâncias ou o desejo de fazer do meu jeito é o argumento que tenho para romper com quem me precede na linhagem da fé, estou prestes a pisar no pântano da solidão, estancando o fluxo de um legado acumulado ao longo do tempo para me respaldar. Lembro-me com tristeza de alguns discípulos que escolheram este caminho. Estiveram comigo, sendo alvo de uma transferência espiritual dedicada, mas num determinado momento começaram a dar mais ouvidos ao apelo da autonomia do que ao legado que estava em minhas mãos. A liberdade de se aventurarem pelos próprios desejos os seduziu mais do que a segurança de continuarem ao meu lado e, assim, eles se foram... Hoje, com sincero pesar, constato que nenhum sequer se tornou expressão de sucesso e alguns, infelizmente, ainda tateiam, anos depois, em busca de um rumo na vida. Jogaram fora todos os mapas que lhes estavam preparados e se perderam na soberba de criar a sua própria rota. Geazi seguiu o mesmo script. Dando vazão a critérios que não estavam no coração de seu líder, correu atrás de Naamã e lhe contou uma mentira, a fim de obter dele o que Eliseu recusara. Embora seu coração já tivesse menosprezado o legado do profeta, ainda usava o seu crédito como respaldo, só que para conseguir o que era escuso. Falava em seu nome, embora não o honrasse mais. Com isso, conseguiu um prêmio enganoso: uma certa quantidade de prata e duas vestes festivais. Que escolha desastrosa! Ao optar pela independência, Geazi trocou o manto de um profeta pelas roupas luxuosas de um estranho. Acabou herdando a lepra de Naamã, abdicando do direito de seguir fluindo na unção de Eliseu. QUANDO O LEGADO PASSA POR LAÇOS DE SANGUE Senso de continuidade é mais importante do que costumamos pensar! Mantermo-nos na condição de filhos e, consequentemente, herdeiros, não deveria ser um direito colocado no rol das coisas negociáveis em nossa vida. No caso de José, a herança era acima de tudo espiritual, mas passava por laços de sangue também. Jacó, Isaque e Abraão eram não apenas homens de Deus que o precediam na fé, mas seu pai, avô e bisavô. Um legado familiar se misturava com o chamado divino e isso tornava tudo ainda mais precioso. Fazer essa constatação abre o leque para refletirmos sobre o conceito de “famílias sacerdotais”. Todos deveríamos investir no projeto de que, não apenas nossos filhos espirituais recebam o legado de fé que temos a passar, mas especialmente nossos descendentes naturais. Mais que isso, se fazemos parte de uma árvore genealógica santificada por gerações que serviram a Deus antes de nós, maior ainda se torna nosso privilégioe responsabilidade. Que terrível pecado seria desprezar uma história assim, rompendo uma sequência de gerações abençoadas! Eu sou um afortunado neste quesito. Tanto a minha família paterna quanto a materna têm professado a fé evangélica por gerações. Na linha genealógica da minha mãe, eu faço parte da quinta geração de verdadeiros cristãos. Meus filhos são sexta geração e meus netos serão a sétima! Já imaginou que acúmulo de bênçãos e que respaldo recebi quando, no exercício do meu livre arbítrio, eu disse “sim” ao chamado divino, dando fluxo a toda essa herança?! Enquanto eu escrevia as primeiras páginas deste livro, o Senhor recolheu minha mãe ao Lar Eterno. As palavras que escrevi na dedicatória desta obra dão uma noção do que “Da. Jane” sempre significará em minha vida. Entre outras coisas, foi a sua conversão a Cristo que abriu caminho para a minha. Naqueles dias de dor aguda, após o seu falecimento, um objeto encontrado entre os seus pertences trouxe profundo consolo ao meu coração: uma Bíblia! Bem, para ser honesto, Bíblias não deveriam me impressionar nas coisas deixadas por minha mãe. Ela tinha uma grande coleção, de todos os tipos, cores e traduções! Havia, entretanto, uma muito especial, um exemplar impresso em 1925 pela Sociedade Bíblica Britânica e que, antes de ter sido dela, pertencera à minha avó, Nélia, à minha bisavó, Delminda e, originalmente, a meu bisavô, Virgílio de Almeida. Escrito à caneta, na contracapa, pode-se ler o número 1889, provavelmente o ano de nascimento daquele homem, que por sua vez, também foi filho de um crente. Só a relíquia que aquele exemplar das Escrituras representa já faz dele um objeto muito precioso, mas uma declaração profética escrita à mão na sua contracapa, com a caligrafia de minha bisavó, tornou-a de um valor imensurável para mim. O texto, produzido na longínqua primeira metade do século passado, é impressionante: “Em nome do Senhor Jesus Cristo, declaro quebradas todas as maldições sobre a minha vida, a vida de meus filhos, netos, bisnetos, as famílias deles e toda a minha descendência. Declaro que não gerei filhos para a perdição. Minha descendência servirá ao meu Senhor e chegará ao Lar Celestial. Meu Senhor levantará pastores das minhas gerações, missionários, obreiros... Os meus olhos humanos não contemplarão isto, talvez, mas a Eternidade o revelará!” Que fantástica projeção de fé, não é mesmo? Se considerarmos que isso foi escrito ainda nas primeiras décadas do século XX, quando quebrar maldições e fazer decretos proféticos não eram práticas comuns entre os evangélicos, tudo se torna ainda mais especial! Como poderia eu desprezar uma história familiar que acumula riquezas desta magnitude? Seria um pecado imperdoável renegar essa herança e seguir na vida sem me comprometer com sua essência. Mais que isso, seria uma tolice desprezar o direito de usar, a meu favor, todo este respaldo de gerações fiéis a Deus! O conceito da fé que se transfere faz parte da cultura do Reino de Deus e deveria nortear as nossas aspirações. Receber e passar adiante o legado espiritual é um investimento prioritário, mais importante que qualquer outro. Transmitir os valores da Palavra, de geração a geração, faz parte das mais básicas instruções bíblicas: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força. Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.” (Deuteronômio 6:5-7) “O que ouvimos e aprendemos, o que nos contaram nossos pais, não o encobriremos a seus filhos; contaremos à vindoura geração os louvores do Senhor, e o seu poder, e as maravilhas que fez. Ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e instituiu uma lei em Israel, e ordenou a nossos pais que os transmitissem a seus filhos, a fim de que a nova geração os conhecesse, filhos que ainda hão de nascer se levantassem e por sua vez os referissem aos seus descendentes.” (Salmos 78:3-6) Quando este processo de transferência espiritual, baseado no senso de continuidade, acontece de forma adequada, sendo bem-sucedido, o que se tem como resultado é o avanço do propósito de Deus na linha do tempo. A geração corroborada por uma história familiar de fidelidade a Deus, tende a ser uma expressão potencializada da fé cristã. Paulo deu testemunho dessa riqueza, referindo-se a um dos seus principais discípulos, Timóteo, que além de estar recebendo a paternidade espiritual daquele grande homem de Deus, trazia de berço uma fé maravilhosamente autêntica. Escreveu o apóstolo: “Lembrado das tuas lágrimas, estou ansioso por ver-te, para que eu transborde de alegria pela recordação que guardo de tua fé sem fingimento, a mesma que, primeiramente, habitou em tua avó Loide e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também, em ti.” (II Timóteo 1:4-5) Que coisa linda! Um preceptor espiritual identificando na vida de seu discípulo a mesma qualidade de fé que conhecera em sua mãe e em sua avó! Um “ramo” fiel crescia no ministério, respaldado pela firmeza e pela riqueza de uma árvore genealógica que já se desenvolvia antes mesmo de ele brotar. Timóteo, assim como José, soube aproveitar a bênção de ser filho! O DESAFIO DE SER ELO ENTRE DUAS GERAÇÕES Senso de continuidade é um segredo dos líderes que vivem acima da média. Isso tem a ver com a honra que se presta às gerações passadas, mas também com o compromisso que se assume em relação às gerações futuras. Não se trata apenas de desfrutar de uma herança acumulada, mas também de ampliá-la e transferi-la adiante. No contexto cristão, o discipulado é o processo mais essencial para que essa continuidade geracional aconteça. Quando me refiro a “fazer discípulos”, para usar a expressão que Jesus usou, falo sobretudo do relacionamento pessoal que visa à formação de indivíduos para o cumprimento do ministério. No discipulado bíblico, há processo e propósito. O processo demanda proximidade, convivência, disposição de compartilhar a intimidade. O propósito é a preparação do discípulo para o desempenho pleno do seu chamado. Podemos ver isso exemplificado de forma clara, acompanhando o caminhar de Jesus com seus doze apóstolos. No começo do seu ministério, quando sua fama ainda não havia se espalhado e, portanto, as multidões não o buscavam, Ele chamou doze homens para fazerem parte do seu círculo íntimo, com o objetivo de moldá-los para a sucessão. A forma como Marcos descreveu esse momento é bastante objetiva: “Jesus subiu a um monte e chamou a si aqueles que ele quis, os quais vieram para junto dele. Escolheu doze, designando-os apóstolos, para que estivessem com ele, os enviasse a pregar e tivessem autoridade para expulsar demônios (Marcos 3:13-15) Preste atenção às expressões “para que estivessem com ele” e “os enviasse a pregar e tivessem autoridade”. Elas confirmam o que estou dizendo. A forma ou processo de transformação daqueles homens se baseava na convivência pessoal com eles. O alvo era levar cada um a se tornar um propagador eficaz da visão. O que levou Jesus a se concentrar num grupo específico de pessoas, dando-lhes prioridade no seu ministério, antes de se envolver com a carência e o apelo das multidões? Senso de continuidade! Se ele não o tivesse feito, possivelmente tocaria inúmeras vidas, como de fato tocou, mas não daria a nenhuma delas consistência suficiente para levar adiante o seu legado. Esse processo de transferência pelo discipulado estava claro na mente e na prática dos apóstolos que o sucederam. João confessou que a realização do seu ministério estava na firmeza da próxima geração: “Não tenho maior alegria do que esta, a de ouvir que meus filhos andam na verdade.” (III João 1:4) Paulo, apóstolo sobre quem a lupa das Escrituras mais se concentrou, discipulador por excelência, descreveu bem o processo que deveria continuar transmitindo o legado às gerações seguintes. Ressaltando o caráter de paternidade daquela relação, ele instruiu seu pupilo Timóteo nosseguintes termos: “Tu, pois, filho meu, fortifica-te na graça que está em Cristo Jesus. E o que de minha parte ouviste através de muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros.” (II Timóteo 2:1-2) A verdade é que um líder acima da média precisa preocupar-se em todo o tempo com a próxima geração. Não basta que ele seja uma pessoa de grandes realizações no seu tempo, nem que se torne um acervo de bons valores. Se não construir pontes para que tudo isso se converta em herança para outros, sua vida será apenas um “ponto final”, quando deveria ser uma “vírgula”. Um dos exemplos bíblicos mais deprimentes de miopia geracional é o que foi protagonizado por Ezequias, o décimo terceiro rei de Judá. Embora fosse um homem de fé, com grandes realizações espirituais durante os vinte e nove anos do seu reinado, quando foi provado no quesito “senso de continuidade”, revelou absoluta falta de visão. Ezequias, na parte final da vida, cometeu o erro de mostrar aos potenciais inimigos de Judá a intimidade de seu reino. Visitado por uma comitiva de babilônios, abriu as portas de sua casa e, além de aceitar presentes de quem se tornaria algoz do seu povo, revelou riquezas e segredos estratégicos que deveriam ser guardados a sete chaves. Diante da displicência do rei, o Senhor lhe enviou Isaías, com uma dura profecia: “Então, disse Isaías a Ezequias: Ouve a palavra do Senhor dos Exércitos: Eis que virão dias em que tudo quanto houver em tua casa, com o que entesouraram teus pais até ao dia de hoje, será levado para a Babilônia; não ficará coisa alguma, disse o Senhor. Dos teus próprios filhos, que tu gerares, tomarão, para que sejam eunucos no palácio do rei da Babilônia.” (Isaías 39:5-7) O mais surpreendente e lastimável é a reação daquele homem a um decreto divino tão terrível: “Então, disse Ezequias a Isaías: Boa é a palavra do Senhor que disseste. Pois pensava: Haverá paz e segurança em meus dias.” (Isaías 39:8) O problema de Ezequias não era falta de fé. Ele já havia feito o Senhor revogar uma palavra, no capítulo anterior, quando clamou do meio de sua enfermidade mortal e conquistou mais quinze anos de vida para si. Mesmo antes disso, frente ao cerco intransponível de Senaqueribe e seu exército, havia sido capaz de entrar no templo, rasgar suas vestes e chorar diante de Deus, provocando-o a operar um livramento absolutamente sobrenatural. Agora, porém, diante da perspectiva de cativeiro que se apresentava para seus filhos, ele se mostra resignado, desde que em seus dias houvesse paz. O que faltava a este governante e pai era responsabilidade geracional. Líderes acima da média são diferentes! Eles vivem concentrados em abrir caminho para a próxima geração. Por se enxergarem como parte de um grande plano divino, um enredo que vai muito além de suas próprias vidas, não aceitam a ideia de sucesso sem sucessão. Foi nessa perspectiva que viveu José, especialmente nos seus longos anos de provação no Egito. Os sonhos que tivera na juventude, que lhe mostravam sua família curvada, recebendo dele a bênção para prosperar, não se apagaram de seu coração, mesmo quando a distância e o tempo queriam provar ser tudo aquilo uma ilusão. Quando, finalmente, o reencontro se deu, esse filho de Jacó mostrou por que era “distinguido entre seus irmãos”. Perdoou-os da traição que lhe haviam imposto, fazendo uma releitura dos fatos e assumindo ter sido enviado por Deus adiante deles para lhes preparar caminho, dando- lhes condição de sequência como família. Eis suas palavras: “Deus me enviou à frente de vocês para lhes preservar um remanescente nesta terra e para salvar-lhes a vida com grande livramento. Assim, não foram vocês que me mandaram para cá, mas sim o próprio Deus. Ele me tornou ministro do faraó, e me fez administrador de todo o palácio e governador de todo o Egito.” (Gênesis 45:7-8) Perceba que o compromisso de José não era apenas dar socorro a seu pai e irmãos num tempo difícil, mas garantir condição de que suas próximas gerações prosperassem. Não era beneficência que o movia, mas visão. Foi nessa perspectiva que usou de influência sobre o poderoso Faraó, para que fosse dado a seus familiares direito de viver em Gósen, a melhor região disponível. “José instalou seu pai e seus irmãos e deu-lhes propriedade na melhor parte das terras do Egito, na região de Ramessés, conforme a ordem do faraó. Providenciou também sustento para seu pai, para seus irmãos e para toda a sua família, de acordo com o número de filhos de cada um.” (Gênesis 47:11- 12) Quando lemos, no início do livro de Êxodo, que um punhado de pessoas se tornou, com o passar do tempo, uma nação numerosa, ao ponto de preocupar os egípcios, é preciso admitir que isso só se viabilizou devido ao senso de continuidade que guiava José. “Todas as pessoas, pois, que descenderam de Jacó foram setenta; José, porém, estava no Egito. Faleceu José, e todos os seus irmãos, e toda aquela geração. Mas os filhos de Israel foram fecundos, e aumentaram muito, e se multiplicaram, e grandemente se fortaleceram, de maneira que a terra se encheu deles.” (Êxodo 1:5-7) Homens de grandeza acima da média se assumem pequenos suficientemente para não se arrogarem como começo e nem fim de nada. Eles se apresentam como elos de uma grande corrente, conectando gerações passadas e futuras. Assumem sua própria importância, sem confundi-la com suficiência. Sabem receber as riquezas de quem os precedeu, granjear com elas, como talentos preciosos e transferi-las, multiplicadas, a uma próxima geração. Assim viveu José, o “ramo”, filho de Jacó, “destacado entre seus irmãos”. Capítulo II R O��������� ���� R��������� “José é ramo frutífero...” eferindo-se a seu filho mais bem-sucedido, Jacó o definiu não apenas como “ramo”, mas como “ramo frutífero”. Estava com isso ressaltando a verdade de que José se notabilizou, entre outras coisas, pelos resultados que deixou em todos os lugares por onde passou. A afirmação de que líderes acima da média são, necessariamente, pessoas produtivas não deve surpreender ninguém. Resultados serão sempre aferidores do sucesso. O que precisamos entender é que tipo de frutificação se busca no Reino de Deus e por quais vias se pode obtê-la. No caso de José, não é difícil perceber que sua presença provocou mudanças altamente positivas em todos os ambientes em que esteve. Excetuando-se o tempo em que vivia ainda na casa de seu pai - quando a própria imaturidade e a resistência dos irmãos o impediam de assumir maiores responsabilidades - desde que foi traído, levado ao Egito e vendido como escravo, em que pesem os ambientes desfavoráveis, o impacto de sua presença sempre gerou progresso a olhos vistos. Sua primeira etapa naquela nação, ainda estranha para ele, foi na casa de um militar influente chamado Potifar. A Bíblia resume esse tempo assim: “José foi levado ao Egito, e Potifar, oficial de Faraó, comandante da guarda, egípcio, comprou-o dos ismaelitas que o tinham levado para lá. O Senhor era com José, que veio a ser homem próspero; e estava na casa de seu senhor egípcio. Vendo Potifar que o Senhor era com ele e que tudo o que ele fazia o Senhor prosperava em suas mãos, logrou José mercê perante ele, a quem servia; e ele o pôs por mordomo de sua casa e lhe passou às mãos tudo o que tinha. E, desde que o fizera mordomo de sua casa e sobre tudo o que tinha, o Senhor abençoou a casa do egípcio por amor de José; a bênção do Senhor estava sobre tudo o que tinha, tanto em casa como no campo.” (Gênesis 39:1-5) O que temos aqui é uma síntese da trajetória desse jovem, no período em que conquistou espaço, servindo na casa do oficial egípcio que o havia comprado. Certos fatos na narrativa merecem ser sublinhados. Em primeiro lugar, o crescimento da influência de José naquele lugar estava diretamente ligado ao seu relacionamento com Deus. As frases “o Senhor era com ele”, “o Senhor prosperava”, “o Senhor abençoou” e “a bênção do Senhor estava sobre tudo”, não deixam dúvida sobre isso. Sobre a devoçãode José falaremos detidamente mais adiante, mas convém assinalar desde já que seu sucesso tinha um alicerce espiritual. Em segundo lugar, havia qualidade e frutos no que aquele moço realizava. Tudo prosperava em suas mãos. Aliás, ele mesmo é descrito como “homem próspero”. Creio que aqui uma definição de prosperidade se faz necessária. Num tempo em que parte da igreja está influenciada por uma teologia que superdimensiona as riquezas materiais e o glamour como resultados essenciais da bênção de Deus na vida humana, é preciso dizer que, considerando esse caso específico, o conceito é mais amplo. Não cabe confundir prosperidade com riqueza ou conforto, quando o personagem é um escravo que não possui nem direito à própria liberdade. A palavra hebraica traduzida como “próspero” nesse texto é “tsalach”. Conforme o Léxico de Strong, ela exprime o poder de “apressar, avançar, prosperar, progredir, obter sucesso, ser proveitoso, conduzir a um bom resultado”. Eu definiria, portanto, prosperidade como a capacidade de gerar progresso, de fazer as coisas funcionarem bem, de obter resultados positivos naquilo que se faz. Nesse sentido sim, José, mesmo na condição indesejável de escravo, mostrou-se um homem evidentemente próspero. Líderes acima da média fazem as coisas acontecer. Eles não são meros “termômetros”, medindo a temperatura ambiente, acomodados e reféns do status quo. Antes, funcionam como “termostatos”, elementos que determinam, com suas ações, mudanças positivas nos cenários onde estão plantados. Passividade, conformismo, desinteresse, descompromisso e coisas do gênero são posturas que não encontram lugar em suas vidas. A FUNDAMENTAL CONSTRUÇÃO DA CREDIBILIDADE Um terceiro aspecto que merece ser destacado no relato bíblico sobre o tempo em que José serviu a Potifar, é a sua credibilidade. Se aquele egípcio chegou ao ponto de entregar em suas mãos tudo o que possuía, não lhe vedando nada, foi porque viu nele, ao longo do tempo, mais do que capacidade administrativa, um caráter confiável. A lealdade é uma marca distintiva dos que vencem a mediocridade e se tornam fonte de influência, especialmente quando pensamos no Reino de Deus. A autoridade dessas pessoas é construída sempre em cima de confiança e não de esperteza. Aliás, eu costumo dizer que o mundo é dos espertos, enquanto o Reino é dos fiéis. Sem um compromisso inegociável com a honestidade e a verdade, qualquer “sucesso” será apenas a construção de uma plataforma para a queda. Quanto mais alto se sobe, maior o tombo final. Toda vez que dedicação, busca por excelência, compromisso com o propósito e integridade se juntam na vida de alguém que conta com a bênção de Deus, é natural que os resultados apareçam e sejam excepcionais. Qualquer projeto avança, quando conta com gente assim! José viveu essa realidade em todo o tempo. A lealdade era seu estilo de vida! Sua presença causou impacto, não apenas durante os anos em que serviu a Potifar, mas também depois, quando, por uma calúnia, terminou encarcerado injustamente. Embora o novo ambiente fosse ainda mais hostil que o anterior, sua forma de encarar os desafios não mudou, levando-o a ser um agente fundamental de transformação naquela prisão. “E o senhor de José o tomou e o lançou no cárcere, no lugar onde os presos do rei estavam encarcerados; ali ficou ele na prisão. O Senhor, porém, era com José, e lhe foi benigno, e lhe deu mercê perante o carcereiro; o qual confiou às mãos de José todos os presos que estavam no cárcere; e ele fazia tudo quanto se devia fazer ali. E nenhum cuidado tinha o carcereiro de todas as coisas que estavam nas mãos de José, porquanto o Senhor era com ele, e tudo o que ele fazia o Senhor prosperava.” (Gênesis 39:20-23) Aí estão novamente reveladas todas as virtudes que o promoveram na casa de Potifar, agora numa condição mais desafiadora. Embora feito prisioneiro por uma falsa acusação, seu empenho, fidelidade e relacionamento com o Senhor recomendaram o jovem hebreu, ao ponto de levar o carcereiro, responsável pelo lugar, a também confiar tudo às suas mãos. Eu nem consigo imaginar o que seja uma cadeia próspera, mas foi nisso que se tornou aquele ambiente sombrio, pela presença proativa de um homem de Deus, abençoado e orientado para resultados! Os líderes excepcionais que o mundo precisa são assim! Independentemente das condições que lhes dão, fazem o seu melhor, sempre com o propósito de abençoar. Eles não se prendem a justificativas para não funcionar. Seu modo de vida é o serviço; sua natureza, a luz; sua motivação, o chamado. Para entendermos como se implantou esse caráter na vida de José, é apropriado voltar no tempo e acompanhar sua trajetória pelas páginas da Bíblia, desde antes, quando era ainda um adolescente. Naquela fase, em que pese sua imaturidade que, agravada pela predileção do pai, despertava ciúmes em seus irmãos, ele já aparecia sendo treinado para servir. O tratamento preferencial que Jacó lhe concedia passou longe de transformálo num garoto mimado ou num paxá. Ao contrário, fazia parte de suas atividades cotidianas servir a todos, desde muito novo. “Esta é a história de Jacó. Tendo José dezessete anos, apascentava os rebanhos com seus irmãos; sendo ainda jovem, acompanhava os filhos de Bila e os filhos de Zilpa, mulheres de seu pai; e trazia más notícias deles a seu pai.” (Gênesis 37:2) Não posso perder a oportunidade de fazer um comentário que confirma o que abordamos no capítulo anterior. A leitura desse versículo é muito sugestiva! Preste atenção! O texto começa assim: “Esta é a história de Jacó”. O que se deveria esperar, portanto, é que a narrativa seguisse sobre a vida do patriarca, também chamado de Israel. O que acontece, porém, é que a frase seguinte se refere ao filho que se tornou brilhante: “Tendo José dezessete anos...” A mensagem embutida é a de que a biografia do pai se misturaria e ganharia amplitude com a história do filho fiel... Divina continuidade! Feita essa observação, preciso que você perceba na narrativa o jovem de dezessete anos, filho mais novo da casa, servindo a seus irmãos e ajudando-os a cuidar dos rebanhos da família. Uma escola muito apropriada já lhe dava a base para o sucesso que seria obtido depois, ao longo da vida. Serviço e lealdade lhe estavam sendo cobrados desde cedo por Jacó, seu pai. A AUTORIDADE QUE NASCE DO SERVIÇO A lógica da liderança no Reino de Deus é completamente diferente da que se adota no mundo, em geral. Enquanto nos ambientes seculares a autoridade brota da imposição, dos cargos e títulos, do poder financeiro, intelectual ou institucional e até mesmo da intimidação, no Reino ela nasce do serviço que, por sua vez, alimenta- se do propósito. Líderes extraordinários são, antes de tudo, servos por natureza. Devemos admitir que parte da mediocridade que se vê, mesmo na igreja, é resultado de pessoas que querem protagonismo, poder e holofotes, mas se sentem diminuídas em servir. Jesus teve que trabalhar duro para mudar esse conceito na mente dos apóstolos que estava formando, durante seu ministério terreno. O processo demandou longas sessões de ensino, passou pela vivência do altruísmo diante deles e culminou numa encenação constrangedora, pouco antes da sua morte, quando o Filho de Deus se cingiu com uma toalha e lavou os pés dos seus discípulos. Tudo para implantar neles a mentalidade de que grandes líderes são, necessariamente, servos por excelência. “Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo; tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos.” (Mateus 20:25-28) Necessitamos desesperadamente desta “escola” em nossas casas e igrejas! Se não formarmos gente que se realize no serviço altruísta, estaremos abandonando a essência do Reino de Deus. Em grande medida,a mediocridade generalizada dos tempos modernos se explica numa geração mimada, formatada para receber tudo pronto, na mão, sem preço algum a pagar. Esse espírito que atua no mundo, penetrou na Casa de Deus, propondo a ilusão de um cristianismo sem cruz, vivido em função de necessidades e sonhos pessoais, algo muito distante do que Jesus veio trazer. Os resultados que um líder acima da média produz são alimentados pela disposição que ele tem de se dar pelos outros. Talento é importante, mas nem de longe concorre com benignidade na lista de virtudes que tiram uma pessoa do lugar comum para alçá-la à relevância. Viver para servir e não para ser servido é o diferencial dos crentes consistentemente produtivos. O José que, pela dedicação aos interesses alheios, produziu tanto fruto por onde passou, seja na casa de Potifar, no cárcere ou, finalmente, no palácio de Faraó, aprendeu esse caminho ainda menino, sob as ordens de seu pai. Enquanto ajudava seus irmãos no cuidado das ovelhas, era treinado a trabalhar em prol de um bem comum. Quando trazia a Jacó relatórios sobre o comportamento deles, muitas vezes reprovável, desenvolvia o senso de lealdade e aprendia que, para conquistar espaço legítimo, a fidelidade nunca negocia com a cumplicidade. Foi numa missão de serviço que a vida virou pelo avesso para aquele rapaz. A história está em Gênesis 37. Enquanto buscava notícias dos irmãos a mando de Israel, seu pai, foi traído por eles e vendido para longe. Já tinha, porém, impressas em seu caráter as virtudes que o fariam triunfar em terra estranha. Disposição de servir e lealdade mostrariam no Egito, para quem quisesse ver, que aquele não era um jovem qualquer. Pessoas orientadas para resultados se concentram no propósito e nele se realizam, não dependendo de outros estímulos para funcionarem. Não necessitam de títulos, prêmios ou posição, mas apenas de missão. Encontram na necessidade em aberto ou na responsabilidade que lhes é confiada, o impulso suficiente para seu empenho. Tenho pastoreado por mais de trinta anos, sempre em busca de pessoas em que eu possa investir para compartilhar o desafio da liderança. Muitas vezes, encontro gente impressionantemente talentosa, capaz de realizar certas funções com uma maestria de dar inveja. Apesar disso, muitas dessas pessoas dificilmente se tornarão confiáveis o suficiente para manterem o espaço que ganham com suas habilidades. O calcanhar de Aquiles de suas vidas é a motivação equivocada. Fazem o que devem fazer com excelência e, inclusive, com dedicação, mas se abastecem com o combustível errado. O que as impulsiona é o desejo de glória humana, o apelo da autopromoção. O avanço do Reino de Deus, na verdade, é sustentado pelos que querem se doar, crentes que estão acima do projeto medíocre de viverem para si. São esses os que se dispõem ao sacrifício, ainda que não colham imediatamente os benefícios pessoais do seu investimento. Veja o apóstolo Paulo, por exemplo. Sua paixão por Cristo e a revelação que detinha sobre a essência do chamado fizeram dele um dos líderes mais extraordinários que o mundo já viu! Basta ler alguns dos seus conselhos e testemunhos para entender que a abnegação foi uma das virtudes que o colocaram na galeria dos expoentes da fé cristã: “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz.” (Filipenses 2:5-8) “Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus.” (Atos 20:24) A liderança servil é, entre outras coisas, antídoto para um dos grandes males que enfraquecem a igreja: a competição, baseada na sede por poder. Pessoas abastecidas pelo desejo despojado de abençoar não buscam posição, dedicam-se pelo propósito e é justamente isso que as recomenda a ocuparem lugares de autoridade. O fato de não entenderem liderança como status ou argumento de superioridade, mas sim como ferramenta de serviço, faz delas as mais confiáveis e inspiradoras. Quem não está buscando um lugar ao sol para desfrutar, mas um ambiente carente para iluminar, não entra em concorrência. Há sempre espaço para aquele que quer apenas servir! O PODER DE NÃO SER O PRIMEIRO Um fato curioso na história de José é que, embora sempre tenha exercido grande influência por onde andou, nunca foi o “número um”, ou seja, nunca esteve no topo da cadeia de comando. Na casa de seu pai, era o irmão mais novo, que servia aos demais. Nos domínios de Potifar, embora tenha se tornado administrador de tudo, prestava contas e sujeição ao seu possessor. Quando encarcerado, tornou-se o centro das atenções, mas se reportava, obrigatoriamente, ao carcereiro, autoridade máxima naquele lugar. Por fim, quando Deus o colocou numa posição de grande poder, com a responsabilidade de governar o impressionante império egípcio, ele continuou sendo o segundo, prestando submissão a Faraó (conf. Gênesis 41:41-44). Um paradigma precisa ser quebrado na mente de muitos líderes, a partir de exemplos como esse. É possível ser influente, honrado e altamente frutífero, desenvolver um ministério extraordinário, mesmo ocupando espaços de coadjuvância. Em outras palavras, pessoas decisivas, que exercem uma liderança acima da média, não dependem, necessariamente, do protagonismo para fazê-lo. Do lugar onde estão, conscientes de sua identidade e missão, podem ser até mais essenciais para um projeto do que quem está acima delas, hierarquicamente falando ou em termos de visibilidade. O “privilégio de ser o segundo” só é reconhecido por pessoas seguras de seu próprio valor e conscientes dos limites que carregam. Ser um entre os demais não significa, necessariamente, ser comum ou irrelevante. Eu sei do que estou falando! Por muitos anos em nosso ministério, vivi algo que chega a escandalizar os reféns do “hierarquismo”. Depois de ter plantado uma igreja e ordenado os primeiros membros de nossa equipe pastoral, homens que, de fato, levantei para estarem ao meu lado, passamos por uma fusão. Sim, duas comunidades cristãs de origens distintas se tornaram uma só! A história é bem interessante... Tudo começou com um grupo de pastores se reunindo semanalmente para orar e desenvolver relacionamentos. Embora estivéssemos à frente de igrejas distintas, havia muitos pontos em comum entre nós e uma admiração, que foi crescendo com aqueles despretensiosos encontros. De uma maneira mais intensa, os laços se estreitaram entre os pastores de duas das comunidades representadas naquele grupo, a que eu havia plantado e uma outra. Nós, da nossa parte, éramos organizados, empenhados na Palavra, bem estruturados, mas um tanto quanto teóricos no exercício do ministério. Eles, por sua vez, eram um povo de informalidade inquietante aos meus olhos, mas extremamente operosos no evangelismo, na beneficência, na oração e no discipulado. Viviam com excelência o cristianismo prático que eu conseguia pregar com razoável qualidade. As diferenças de ênfase, ao invés de entraves, despertaram admiração mútua. Sem perceber, começamos a copiar o que o outro tinha de melhor, fazendo com que as práticas e formas das duas igrejas se tornassem cada vez mais parecidas. Juntamente com esse processo subliminar que o Espírito conduzia, a confiança entre as lideranças se tornava maior a cada dia, até que um problema nos aproximou de vez... O prédio que a outra igreja alugava teve que ser entregue, a pedido do proprietário. Sem um lugar adequado para se reunirem, começaram a fazê-lo fora da cidade, numa chácara que lhes pertencia, mas com pouca estrutura e de acesso complicado. Vendo a dificuldade de montarem tudo o que era necessário a cada fim de semana e deslocarem seu povo para lá, eu ofereci aos pastores aopção de usarem o nosso prédio, que era próprio. Assim, uma igreja começou a se reunir aos sábados e a outra aos domingos, no mesmo endereço. Com o passar dos meses, os rebanhos começaram naturalmente a se misturar, sem que tivéssemos um plano de fomentar ou de impedir esse processo. Estávamos felizes em andar lado a lado e a confiança só crescia entre os dois presbitérios (era assim que nos referíamos às nossas equipes pastorais e continuamos a fazê-lo até hoje). Certo dia, eu fui o corajoso a perguntar aos demais pastores, nossos e da outra comunidade: “Por que somos duas igrejas? Temos as mesmas crenças, as mesmas práticas, confiamos uns nos outros e estamos no mesmo endereço. O que nos impede de sermos um só povo?” A questão surpreendeu, mas encontrou abertura no coração de todos. Decidimos, então, consultar nossos rebanhos para ver como reagiriam à possibilidade da fusão. O resultado foi uma festa! Parece que estavam todos esperando por aquele desfecho. Assim, depois de um ano de “noivado”, tempo em que fomos paulatinamente alinhando o necessário, nasceu a Comunidade Cristã de Ribeirão Preto e aquelas duas congregações iniciais deixaram de existir. Todo esse processo só foi possível porque nasceu no coração de Deus e encontrou líderes maduros para aceitá-lo. Não havia entre nós ninguém com fome de poder ou desejo de primazia. Tampouco havia gente desconfiada, temendo ser traída pela própria sombra. Éramos livres e queríamos ver o Reino de Deus prosperar. Só isso. O que vivemos a partir daí foi a ampliação do que já entendíamos antes. Por incrível que pareça, não tínhamos um líder formal naquela equipe pastoral. A figura do “presidente” era apenas para satisfazer a legislação e dar sustentabilidade jurídica à igreja, mas na prática do ministério decidimos nos submeter uns aos outros e buscar sempre o consenso para a tomada de decisões. Por quase dez anos fomos um grupo de cinco a sete homens comandando o ministério local, todos no mesmo nível de autoridade. E, se você quer saber, funcionou muito bem! Nunca sofremos uma divisão ou amargamos uma quebra de aliança nesse presbitério! Ser um entre os demais jamais diminuiu o meu valor ou de qualquer outro. Muito pelo contrário! Aquela estrutura conferia proteção e conforto a cada um de nós. Prestar contas e considerar o que os outros tinham a dizer se tornou o nosso estilo de vida, trazendo estabilidade e equilíbrio na condução do rebanho, além de blindar nossas vidas pessoais. Somente cerca de dez anos depois aquela estrutura de governo foi mudada, como demanda de um crescimento volumoso que estávamos experimentando. Já tínhamos chegado à casa dos milhares de ovelhas e com isso veio a necessidade de ampliar significativamente a equipe pastoral. Foi então que meu pastor, Harry Scates, que exercia autoridade apostólica sobre nosso ministério, chamou-me para uma conversa e disse: “Danilo, a igreja em Ribeirão Preto está crescendo muito e crescerá ainda mais. Vocês precisarão ampliar a quantidade de pastores e, talvez, algum dia ela chegue a dezenas, pessoas que terão níveis de maturidade e de experiência distintos. Por isso, é necessário que alguém assuma a presidência, não para mandar nos outros, mas para coordená-los e ser uma âncora de unidade.” Então, ele terminou aquela conversa, dizendo: “Eu acredito que você e Mônica, sua esposa, são as pessoas levantadas pelo Senhor para esta função”. Se você pensa que aquela direção nos deixou empolgados, engana- se. Ela nos desconfortou profundamente. Eu me sentia muito bem como estava. Minha mulher também. Vivíamos seguros do nosso valor, dos dons que carregávamos e éramos estimulados pelos demais a exercitá-los com liberdade. Não precisávamos de um título ou posição para nos sentirmos importantes. Além do mais, como iríamos ocupar a primazia? Mandaríamos os outros darem um passo atrás para se submeterem à nossa autoridade? Decidimos, então, que se tal direção vinha de Deus, Ele mesmo trataria de fazê-la acontecer, sem que movêssemos uma palha para aquilo. Descansamos também o coração na realidade de que, se o Senhor o fizesse, estar à frente não significaria ser maiores ou melhores que os demais. Seria, tão somente, uma nova forma de servi-los. Seguimos nossa vida naturalmente, mas não se passaram muitas semanas até que um dos membros na nossa equipe pastoral entrou no meu escritório e disse: “Dany, eu e minha esposa temos orado e sentimos a necessidade de que o presbitério de nossa igreja tenha um casal de líderes mais à frente. Isso nos ajudará a caminhar melhor! Você e Mônica, a nosso ver, são as pessoas adequadas e nos sentiríamos muito honrados em dar um passo para trás e seguir como seus discípulos, sendo orientados por vocês”. Aquela intervenção me surpreendeu, especialmente pelo fato de aqueles irmãos serem oriundos da igreja que se fundiu com a nossa. Se partisse de alguém que eu houvesse gerado e formado no ministério, talvez teria tratado com um desejo “suspeito”. Bem, o sentimento que aquele parceiro de ministério me expôs em particular foi colocado em questão por ele mesmo diante de toda a equipe, poucos dias depois. O resultado? Unanimemente, todos entenderam que aquela era uma direção do Espírito e, assim, eu e minha esposa, a pedido deles, assumimos a missão de coordená-los, liderá-los e, inclusive, discipulá-los no âmbito pessoal, tarefa que, até então, fazíamos apenas com alguns. Conto tudo isso para demonstrar que relevância não depende de posição. Qualquer um pode ser decisivo numa estrutura ou processo, mesmo que ocupe um lugar de sujeição em relação a outros. Estar em segundo plano não é sinônimo de ser menos importante. Na nossa experiência particular, não nos tornamos mais produtivos depois que fomos colocados à frente. Seguimos servindo da mesma maneira, só que, agora, com algumas responsabilidades a mais. José foi “destacado entre seus irmãos” porque decidiu ser “ramo frutífero”. Não importando onde estivesse e a quem precisasse se submeter, ele se orientava por resultados, entendia que seu chamado era para abençoar e, por isso, abençoava. Simples assim! Nunca disputou espaço com ninguém, nunca comprometeu o seu crédito pessoal com a deslealdade e nunca se sentiu diminuído por não ser o primeiro na cadeia de poder. Apenas colocava seus dons a serviço da excelência e os frutos naturalmente apareciam. Vivemos num tempo em que, perigosamente, o marketing está se tornando mais importante do que deveria na vida das pessoas. Na geração das “selfies”, das disputas por “likes” em redes sociais, da necessidade gritante de autopromoção, muitos estão se perdendo na fragilidade da aparência. A maior parte dos “influencers digitais” é tão medíocre quanto a multidão que a segue. Não há benefício algum no que fazem. Apenas dominaram certas técnicas de manipulação e, baseados nisso, produzem um grande movimento em torno do nada. Os líderes que Deus tenciona levantar, ao contrário, não precisam de marketing, assim como a chuva e o sol não precisam também. Sua notoriedade se apoia no fato de serem o que são e de provocarem vida onde estão. Seus frutos os recomendam e são resultado natural do tipo de missão que assumiram diante do Pai. “José é ramo frutífero”. O testemunho que Israel deu acerca do filho que se destacou entre seus irmãos, depois de vê-lo viver a vida de maneira tão produtiva, em que pese ter enfrentado circunstâncias hostis, deixa-nos um desafio: Não podemos aceitar ver o tempo passar diante de nós sem que estejamos abençoando decisivamente o nosso mundo, mesmo que, eventualmente, ele não nos ofereça mais espaço do que os corredores e celas de uma prisão. Não é, necessariamente, uma questão de amplitude, mas de impacto. Não se trata de iluminar o Universo inteiro, mas a casa onde eu vivo. Se, ao menos ali, a minha presença for positivamente decisiva e a minha ausência, um prejuízo, eu já estarei sendo um homem acima da média. SER PRODUTIVO É ABENÇOAR PESSOAS Não posso finalizar este capítulo sem asseverar que ser produtivo, do ponto de vista de Deus,
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