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DIZERES EM IMAGENS COMPREENDENDO A CULTURA SURDA E O ENSINO DE SEGUNDA LINGUA

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International Congress of Critical Applied Linguistics 
Brasília, Brasil – 19-21 Outubro 2015 
 
576 
 
DIZERES EM IMAGENS: COMPREENDENDO A CULTURA SURDA E O 
ENSINO DE SEGUNDA LÍNGUA 
 
Eduardo BRASIL 
edu.bra.bra@gmail.com 
Universidade de Brasília (UnB) 
Orientadora: Profa. Dra. Janaína de Aquino Ferraz 
 
RESUMO 
O objetivo deste artigo é analisar os depoimentos de professores surdos de Libras com relação 
ao que se define como cultura surda e como ela é importante tanto para o ensino de português 
escrito como segunda língua para surdos quanto para o ensino de Libras para ouvintes. Os 
relatos serão gravados em vídeo e as transcrições das entrevistas constituirão o corpus da 
pesquisa. Para fins de registro em áudio das transcrições, o intermédio de um intérprete de 
Libras poderá ser necessário para a tradução dos relatos dos surdos não oralizados. Desde a 
aprovação da Lei de Libras (Lei 10.436/02, de 24 de abril de 2002), a língua de sinais é 
reconhecida com seu devido status de língua natural do surdo, resultado de lutas políticas e, 
portanto, ideológicas rumo à conquista de uma equidade social pelo exercício da cidadania, no 
sentido de garantir a eles o direito de ser surdo. De acordo com Gladis Perlin, em seu artigo 
intitulado “Identidades Surdas” (em SKLIAR, C. “A surdez: um olhar sobre as diferenças”), 
ser surdo é pertencer a um mundo de experiência visual e não auditiva. Isso significa ter a 
Língua de Sinais como língua natural, a qual promove a percepção visual do mundo e forja as 
bases do universo cultural do indivíduo. Sob uma perspectiva de ensino de línguas com base 
em uma construção visual de sentidos, que é o principal argumento de Perlim sobre a 
formação de identidades surdas, terei como base a Teoria da Multimodalidade (Kress e van 
Leeween) e as múltiplas identidades surdas definidas por Perlin: híbridas, de transição, 
incompletas e flutuantes. A Análise de Discurso Crítica (ADC) assume um papel importante 
na contribuição de categorias de análise para a amostra, uma vez que o texto, entidade viva da 
concretização do discurso, opera em termos de relações sociais, formação de sistemas de 
conhecimento, crenças e formação de identidades sociais. 
 
Palavras-chave: Multimodalidade; Surdez; Cultura. 
 
1) INTRODUÇÃO 
 
A motivação deste estudo vem da tentativa de delinear hipóteses para o 
pesquisador iniciante sobre o que é ou do que se constitui a cultura surda. A relevância 
de investigações desta natureza se dá devido à complexidade da educação tanto de 
surdos, que precisam aprender português como segunda língua, quanto para os 
ouvintes, que precisam aprender Libras para se comunicarem com o surdo. Entendo 
 
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este como sendo o ponto fulcral para qualquer discussão que envolva o ensino de 
segunda língua justamente por crer na indissociabilidade entre língua e cultura, 
especialmente quando se trata de línguas de modalidades distintas, sendo o português 
uma língua audiolingual e a Libras uma língua vísuo-espacial. Tais princípios são 
basilares para o fomento da real acessibilidade às práticas sociais, discursivas e de 
letramento da minoria surda, que se vê compelida a aderir à cultura ouvinte 
hegemônica, responsável por ditar a ordem do discurso vigente para o livre exercício 
da cidadania, já que as leis brasileiras discorrem sobre a equidade de direitos entre 
surdos e ouvintes e regulamentam a implementação de medidas legais de amparo ao 
surdo. 
Assim, defendo que discussões sobre cultura surda, ensino de português 
escrito como segunda língua, letramento de surdos, lei de Libras ou quaisquer outras 
questões que envolvam a formação do surdo como cidadão devem dar voz aos relatos 
dos próprios surdos. Portanto, os professores surdos da Apada1 foram os meus grandes 
colaboradores, pois são eles os modelos surdos que reforçam a valorização da língua 
de sinais e, consequentemente, da cultura surda. A base teórica encontra nas obras de 
Karin Strobel (2013) e Gládis Perlin (2015) as vozes de duas pesquisadoras surdas 
sobre questões teóricas de natureza cultural e identitária. De acordo com Perlin, ser 
surdo é pertencer a um mundo de experiência visual e não auditiva. Isso significa ter a 
Língua de Sinais como língua natural, a qual promove a percepção visual do mundo e 
forja as bases do universo cultural do indivíduo. Sob uma perspectiva de ensino de 
línguas com base em uma construção visual de sentidos, que é o principal argumento 
de Perlin sobre a formação de identidades surdas, terei como categorias de análise as 
múltiplas identidades surdas definidas por ela (identidades surdas, híbridas, de 
transição, incompletas e flutuantes), os artefatos culturais do povo surdo definidos por 
Strobel (experiência visual, desenvolvimento linguístico, família, vida social e 
política) e utilizarei a Teoria da Multimodalidade (Kress e van Leeween) para 
justificar o que dizem ambas autoras sobre o ser visual, que constitui o indivíduo 
 
1 A Apada (Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos) é uma organização sem fins lucrativos, 
cujos serviços prestados à comunidade surda vão de acompanhamento psicológico a cursos 
profissionalizantes, letramento de surdos, cursos de Libras para surdos, para suas famílias e para a 
comunidade em geral, cursos de interpretação e oficinas de pintura e desenho. Lá, iniciei meus estudos da 
língua de sinais. Todos os professores são surdos, formados em Letras – Libras e alguns já estão se 
preparando para ou já têm mestrado. 
 
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surdo. A Análise de Discurso Crítica (ADC) assume um papel importante na 
contribuição de categorias de análise para a amostra, uma vez que o texto, entidade 
viva da concretização do discurso, opera em termos de relações sociais, de formação 
de sistemas de conhecimento, crenças e também na construção de identidades sociais. 
Quanto aos métodos de pesquisa e coleta de dados, o paradigma adotado é o 
da pesquisa social qualitativa, já que não há experimentos nem análise de números e 
sim a interpretação e reinterpretação dos dados. De acordo com Bauer, 2014 (p. 20-
21): “A pesquisa social apoia-se em dados sociais – dados sobre o mundo social – 
que são o resultado, e são reconstruídos nos processos de comunicação. (...) Na 
pesquisa social, estamos interessados na maneira como as pessoas espontaneamente 
se expressam e falam sobre o que é importante para elas e como elas pensam sobre 
suas ações e a dos outros”. Utilizei entrevistas individuais semi-estruturadas, com um 
roteiro de nove questões, que me levariam a responder às seguintes perguntas de 
pesquisa: 
 
1) É possível encaixar os participantes nas categorias de identidades surdas propostas por 
Perlin? A que estereótipos sobre o surdo os professores se referem em seu discurso? 
2) Como o discurso dos professores define cultura surda? Quais artefatos culturais 
propostos por Strobel são predominantes? 
3) Como eles encaram as repercussões da Lei de Libras (Lei 10.436/02, de 24 de abril de 
2002) e decretos que regulamentam essa lei no que tange o ensino da língua de sinais 
como primeira e segunda língua e do português escrito como segunda língua para 
surdos? 
 
 
2) LITERATURA CASADA: PARES QUE SE COMPLETAM. 
 
2.1. CULTURA SURDA E ADC 
A cultura é um elemento indissociável de uma língua. Reitero essa afirmação 
para defender que a língua de sinais é o primeiro marco cultural da comunidade surda, 
com base no seguinte trecho, retirado de SACKS, 2010, p. 155: “O desenvolvimento de 
funções psicológicas superiores, para Vygotsky, não é algo que ocorre ‘naturalmente’, de um 
 
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modo automático – requer mediação, cultura, um instrumento cultural. E o mais importante 
desses instrumentos culturais é a língua. Mas os instrumentos culturais e as línguas, explica 
Vygotsky, foram desenvolvidos para a pessoa ‘normal’, a pessoa que tem intactos todos os 
órgãos dos sentidos, todas as funções biológicas. O que, então, será melhor para o deficiente, 
para a pessoa diferente?2 A chave para seu desenvolvimento será a compensação – o uso de 
um instrumento cultural alternativo. Assim, Vygotsky chega à educação especial dos surdos: o 
instrumento cultural alternativo, para eles, é a língua de sinais – uma língua que foi criada 
para e por eles. A língua de sinais está voltada para as funções, as funções visuais, que ainda 
se encontram intactas; constitui o modo mais direto de atingir as crianças surdas, o meio 
mais simples de lhes permitir o desenvolvimento pleno, e o único que respeita sua diferença, 
sua singularidade.” 
No Brasil, a língua de sinais foi oficializada pela Lei Federal no. 10.436, de 24 
de abril de 2002 e regulamentada pelo Decreto Federal no. 5.626, de 22 de dezembro 
de 2005. A importância da Lei de Libras, primeiramente, se dá pela conquista 
alcançada após anos de luta por uma equidade lingüística entre ouvintes e surdos, 
fazendo com que ela se tornasse obrigatória nos cursos de formação de professores e 
intérpretes de Libras e embasou propostas de ensino bilíngue, nas quais a língua de 
sinais seria a língua de instrução e o português escrito seria ensinado como segunda 
língua. Entretanto, nossa sociedade ainda precisa de mais esclarecimentos sobre a 
comunidade surda, além de mais acesso a ela. Apesar das conquistas trazidas pela lei, 
há uma real escassez de profissionais especializados que entendam suas necessidades e 
sua língua. Isto posto, defendo que a eficácia tanto do ensino de português escrito 
como segunda língua para surdos quanto do ensino de Libras para ouvintes depende 
do quanto os docentes ensinam aos aprendentes o que venha a ser cultura surda, como 
as identidades surdas dão suporte aos vários artefatos culturais que constituem o ser 
surdo (em um patamar de discrepância e não de inferioridade em relação à cultura 
ouvinte), de forma a viabilizar um amplo intercâmbio lingüístico e cultural entre 
surdos e não surdos – o que pode ampliar o acesso à cidadania a todos – não somente 
para cumprir o que postula uma lei federal. 
Por conseguinte, recorro a Strobel (2013), pesquisadora surda, autora da 
importante obra “As imagens do outro sobre a cultura surda”, na qual este estudo se 
baseia. Segundo a autora, “cada teoria sobre cultura é o resultado de uma história 
 
2 Trecho sublinhado porque, no original, a fonte está em itálico. 
 
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particular que inclui os escritos de vários pesquisadores que tinham suas próprias 
ideias em relação às culturas diferenciadas. Desde o final do século XIX, os 
pesquisadores vêm elaborando inúmeros conceitos sobre cultura e, apesar de a cifra 
ter ultrapassado mais de 200 definições, ainda não chegaram a um acordo sobre o 
significado exato da terminologia.”3 Ela faz um apanhado de várias definições de 
cultura, levando em consideração as transformações dos conceitos ao longo da 
história, mostrando as mudanças nas relações da sociedade com a natureza e com os 
seus membros entre si: 
 
Tabela 1: conceitos de cultura apresentados por Strobel (2013) 
Conceito de cultura Autor e referências 
bibliográficas 
Visão de Strobel 
A cultura é a estrutura daquilo 
que é chamado de “hege- 
monia”, que molda os sujeitos 
humanos às necessida- 
des de um tipo de sociedade 
politicamente organiza- 
da, remodelando-os com base 
nos atuantes dóceis, mo- 
derados, de elevados princípios, 
pacíficos, conciliado- 
res. 
Frederick Schiller apud 
EAGLETON, Terry. 
“A ideia de cultura”. 
Tradução de Sandra 
Castello Branco. São Paulo: 
Editora 
UNESP, 2005. 
A ideia unitária de cultura está relacionada na 
sociedade com as ideologias 
hegemônicas, de padronização, de 
normalização, nas quais todos devem se 
 identificar com esta cultura única em um 
determinado espaço. Isso eviden- 
cia que esta sociedade gerou o desejo da 
necessidade de sermos perfeitos 
para pertencermos a ela, senão estaríamos 
excluídos. Alteridade e diferença 
são vistas como manchas para a sociedade. 
A cultura não possui forma 
unitária. A pluralização 
do termo cultura se faz 
necessária, já que há diferentes 
 culturas dentro de diferentes 
nações e períodos, bem 
como diferentes culturas sociais 
e econômicas dentro 
da própria nação. 
Joahann Herder apud 
EAGLETON, Terry. 
“A ideia de cultura”. 
Tradução de Sandra 
Castello Branco. São Paulo: 
Editora 
UNESP, 2005. 
Neste pensamento pós-moderno, a 
pluralidade encontra-se cruzada com a 
autoidentidade, em vez de se dissolver em 
identidades distintas. Considerar 
 a questão cultural no plural admite a 
multiplicidade de manifestações de 
grupos culturais das mais diversas naturezas, 
tornando o conceito de cultu- 
ra mais amplo. 
A cultura que temos determina 
uma forma de ver, de 
interpelar, de ser, de explicar e 
de compreender o 
mundo. 
 
HALL, Stuart. “A 
centralidade da cultura: 
notas 
sobre as revoluções 
culturais de nosso tempo”. 
 Educação e Realidade: 
Cultura, Mídia e Educa- 
ção, v. 22, n. 3, jul.-dez. 
1997. 
 
A cultura é uma ferramenta de 
transformação, de percepção, da forma de 
ver diferente, não mais de homogeneidade, 
mas de vida social constitutiva 
dos jeitos de ser, de fazer, de compreender e 
de explicar. Essa nova marca 
cultural transporta para uma sensação a 
cultura grupal, ou seja, como ela di- 
ferencia os grupos, no que faz emergir a 
“diferença”. 
 
Em latim, cultura significa o EAGLETON, Terry. “A Isso mostra que o cultivo da linguagem e da 
 
3 Strobel, 2013: página 20. 
 
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cuidado dispensado à ter- 
ra cultivada. O conceito de 
cultura é proveniente do de 
 natureza, sendo que um dos 
significados originais é 
“lavoura” ou “cultivo agrícola”. 
ideia de cultura”. Tra- 
dução de Sandra Castello 
Branco. São Paulo: 
Editora UNESP, 2005. 
identidade são, então, os ele- 
mentos fundamentais de uma cultura. Na 
cultura, a palavra natureza signifi- 
ca tanto o que está a nossa volta como o que 
está dentro de nós. Sem a na- 
tureza (sol, chuva, fertilizantes) uma semente 
não cresceria. 
A cultura permite ao homem não 
somente adaptar-se a 
seu meio, mas também adaptar 
esse meio ao próprio 
homem, a suas necessidades e 
seus projetos. Em suma, 
a cultura torna possível a 
transformação da natureza. 
CUCHE, Denys. “A noção 
de cultura nas ciên- 
cias sociais”. Bauru: 
EDUSC, 2002. 
 
Um ser humano, em contato com o seu 
espaço cultural, reage, cresce e de- 
senvolve sua identidade, o que significa que 
os cultivos que fazemos são co- 
letivos e não isolados. A cultura não vem 
pronta: daí a razão pela qual ela 
sempre se modifica e se atualiza, decorrente 
de desenvolvimento cultural 
experimentado pelas gerações passadas. 
 
Pela comparação das definições e os comentários de Strobel, é notável o 
enlace entre a cultura e a Análise de Discurso Crítica, doravante ADC. Tendo 
Fairclough (2001, p. 90-91) como um de seus mais notáveis autores, em sua teoria 
social do discurso, o uso da linguagem é visto como uma prática social, não como uma 
atividade puramente individual ou reflexo de variáveis situacionais. Assim, o uso da 
linguagem é fortemente construído em um alicerce de forças dialéticas, pois ao mesmo 
tempo em queo discurso molda a sociedade, ele é também moldado por ela. Numa 
concepção tridimensional do discurso, segundo Fairclough, é ele o responsável pela 
construção de identidades sociais, além de contribuir para a formação das relações 
sociais entre os sujeitos e dos sistemas de conhecimento e crenças. Portanto, a 
justificativa da ADC como uma das bases teóricas para o entendimento de cultura 
surda se dá pela inter e multidisciplinaridade das questões culturais, pela relação entre 
língua, cultura e sociedade e pelas relações de poder, dominação e desigualdade que 
marcam a comunidade surda, que também abarca o discurso de resistência à 
dominação ouvinte. 
Para encerrar este primeiro bloco teórico e, ao mesmo tempo, estabelecer um 
gancho com o próximo, faço uso de duas últimas citações que, a meu ver, são 
extremamente elucidativas para as questões que levanto. A primeira é Ferraz (2015, p. 
380): “o conceito de identidade, de acordo com Giddens, é construído 
linguisticamente, sendo esse o protótipo das relações sociais. Em outras palavras, a 
primeira identidade de um falante, para ele (2002, p. 39), é a língua, ou seja, essa é a 
 
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primeira matriz de identidade social do sujeito.” Consequentemente, faz-se urgente 
delimitar as dimensões da cultura surda que, segundo Strobel (2013, p. 29): “é o jeito 
de o sujeito surdo entender o mundo e modificá-lo a fim de torná-lo acessível e 
habitável, ajustando-o com as suas percepções visuais, que contribuem para a 
definição das identidades surdas, e das ‘almas’ das comunidades surdas. Isto significa 
que abrange a língua de sinais, as ideias, as crenças, os costumes e os hábitos do 
povo surdo.” 
 
2.2. IDENTIDADE VISUAL E TEORIA DA MULTIMODALIDADE 
 
Tendo em vista as considerações sobre cultura, de forma geral, bem como 
sobre a cultura surda, é importante frisar que é errônea a noção de que todos os surdos 
compartilham da mesma cultura. Assim como há diferentes formas de se entender o 
mundo de um país para outro, de uma cidade para outra, de um indivíduo para outro, o 
mesmo ocorre com as diversas culturas e povos surdos. Contudo, mesmo concebendo 
uma ideia plural de cultura, entendo que há um denominador comum entre todas as 
culturas surdas: a experiência visual. “Quando pronunciamos ‘povo surdo’, estamos 
nos referindo aos sujeitos surdos que não habitam no mesmo local, mas que estão 
ligados por uma origem, por um código ético de formação visual4, independentemente 
do grau de evolução lingüística, tais como a língua de sinais, a cultura surda e 
quaisquer outros laços.” (Strobel, p. 38). Entendo esse referido código ético de 
formação visual como a substituição (total ou parcial, de acordo com o grau de surdez) 
dos sentidos ativados pela captação das ondas sonoras – por meio dos ouvidos – por 
todas as cores, formas, gestos, movimentos, dimensões, expressões faciais e demais 
ações, objetos ou seres captados na presença da luz, pelos olhos. 
Ben Barhan, escritor e professor surdo norte-americano, propõe que os surdos 
sejam chamados de pessoas visuais (Strobel, p. 45): “Usando essa palavra, eu me 
coloca na posição das coisas que eu posso fazer ao invés das que não posso fazer. 
Identificando-me como uma pessoa visual, isso explicaria tudo ao meu redor: os 
aparelho TDDs, os decodificadores, as campainhas luminosas, a leitura labial e a 
emergência de uma língua visual, a língua de sinais americana”. Interessante é o 
 
4 Grifo meu 
 
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reforço positivo da constituição de sua identidade surda, que utiliza a visão como 
forma de comunicação com o ambiente, de modo a codificar o mundo a sua volta por 
meio de significados visualmente transmitidos, ao invés de aceitar o discurso da 
deficiência, da falta de audição, da não-normalidade e menor-valia, que comprometem 
e dificultam a vida dos surdos, já que não ouvem apitos, megafones, buzinas, ligações 
telefônicas, filmes nacionais sem legenda, anúncios de aeroportos, rádio, programas de 
TV, vêem-se isolados em situações corriqueiras como passeios com guias turísticos, 
reuniões de trabalho, palestras, peças com fantoches, etc. Nada disso faz parte da 
cultura surda. 
É nesse sentido que a Teoria da Multimodalidade desempenha um papel 
fundamental na construção de sentidos já que, para ela, a palavra oral ou escrita não é 
o único modo de composição de um significado. Como afirmam Vieira e Silvestre, 
2015 (p. 95-96): “Hoje, a linguagem verbal, nos seus modos oral e escrito, continua a ter 
um papel central na vida das pessoas e o sistema educativo não é exceção a esta realidade. 
No âmbito da comunicação, como resultado da evolução das novas tecnologias, têm sido 
integrados outros modos de comunicar, para além da linguagem verbal. Embora a linguagem 
verbal, na sua forma impressa, se tenha tornado uma forma privilegiada de veicular o 
conhecimento através dos tempos, nas últimas décadas, juntamente com o modo visual, este 
modo tem se convertido em co-modo. A palavra impressa no jornal, na revista, articula-se 
com a imagem ou com a fotografia; o livro escolar ou acadêmico já não é apenas um texto 
constituído pela palavra escrita, mas um texto multimodal, em que a palavra escrita interage 
com gráficos, quadros, tabelas, desenhos, imagens, na construção de significados. Os 
produtores de texto fazem escolhas deliberadas relativamente ao uso dos modos de 
representação e a respectiva articulação de forma a construir os seus textos multimodais. No 
entanto, embora se verifique uma crescente coexistência dos diversos modos semióticos, os 
modos visuais continuam a ser ignorados como elementos constitutivos de significado. A 
leitura parcial de um texto multimodal apenas na sua vertente de linguagem verbal escrita 
revela-se insuficiente numa sociedade que se caracteriza pela emergência do modo visual.” 
Faço uso das palavras das autoras acima para justificar os dizeres em 
imagens, dos quais o título deste trabalho faz luz. Na modernidade atual, a imagem 
tem ganhado mais espaço na vida de todos nós como uma dimensão material, icônica e 
socialmente motivada na atividade de construir significados. Abriram-se novos 
caminhos no âmbito de trocas de experiências e de conhecimento. Dos widgets de 
 
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celulares (ícones, botões e menus, localizados na área de trabalho) aos emojis 
(ideogramas usados em mensagens, representando expressões faciais, configurações 
de mão, animais, ícones etc), dos anúncios de propaganda impressos aos comerciais de 
TV, do jornal impresso ao livro didático, do Facebook ao Instagram, palavras e 
imagens compõem um mosaico conceitual ora pela mescla entre si ora em substituição 
desta por aquela. Não objetivo, entretanto, ressaltar a dualidade entre textos verbais e 
não verbais, mas sim valorizar o visual como forma plena de comunicação, o que 
constitui os dizeres surdos, compostos por imagens produzidas pelo configuração e 
movimento das mãos, além de expressões faciais. 
 
3) CATEGORIAS DE ANÁLISE: IDENTIDADES SURDAS E ARTEFATOS 
CULTURAIS 
 
3.1. IDENTIDADES SURDAS 
 
Perlin (2015) estuda as identidades surdas através dos depoimentos de outros 
surdos. Ela enfatiza o não universalismo das questões identitárias (p. 52): “Entendo o 
conceito de identidades plurais, múltiplas; que se transformam, que não são fixas, 
imóveis, estáticas ou permanentes, que podem até mesmo ser contraditórias, que não 
são algo pronto”. Ela faz uma correlação entre identidades surdas e estereótipos, pois 
eles apontam impedimentos, que os indivíduos carregam consigo, para a aceitação de 
serem surdos, numa clarademonstração de incompatibilidade entre a representação da 
identidade surda com a ouvinte. Assim, ela elabora um divisão de cinco categorias de 
identidades surdas, que são: 
3.1.1. Identidades surdas: estão presentes no grupo pelo qual entram os surdos 
que fazem uso da experiência visual plena. O orgulho e a luta pelo direito de ser surdo 
é uma característica marcante desta identidade. 
3.1.2. Identidades surdas híbridas: são os surdos que nasceram ouvintes e, 
com o tempo, tornaram-se surdos. Conhecem a estrutura do português falado e usam-
no para codificar suas percepções visuais para logo em seguida expressarem-se em 
língua de sinais. 
 
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3.1.3. Identidades surdas de transição: surdos que foram mantidos reféns da 
experiência ouvinte por longos anos, a maioria por serem filhos de pais ouvintes. 
Posteriormente, juntam-se à comunidade surda por conta própria, quando já 
conseguem decidir por si mesmos. 
3.1.4. Identidade surda incompleta: surdos que são mantidos no cativeiro da 
hegemonia ouvinte. Neste caso, a família os privou do total acesso à comunidade 
surda e toda a sua educação e saber são fincadas em identidades ouvintes. A identidade 
surda é tida como incompleta porque ela foi evitada ou ridicularizada (ou marcada por 
estereótipos). 
3.1.5. Identidades surdas flutuantes: surdos que rejeitam a identidade surda. 
Querem ser oralizados, mas não se inserem na comunidade ouvinte (por falta de 
comunicação), tampouco na comunidade surda (por falta de sinais), por isso suas 
identidades são tidas como flutuantes. Alguns vivem nesses conformes porque se 
acomodaram a esta situação de identidade fragmentada, vítimas da hegemonia 
ouvintista. 
 
3.2. Artefatos Culturais 
 
Dada a amplitude dos conceitos de cultura, utilizo os artefatos culturais 
postulados por Strobel (2013) como elementos catalizadores que apontam traços 
culturais relevantes para o entendimento de cultura surda. Segundo a autora (p. 43): 
“O conceito “artefatos”não se refere apenas a materialismos culturais, mas àquilo 
que na cultura constitui produções do sujeito que tem seu próprio modo de ser, ver, 
entender e transformar o mundo. Traço comum em todos os sujeito humanos seria o 
fato de que somos todos artefatos culturais e, assim, os artefatos ilustram uma 
cultura.” Em suma, eles são: 
3.2.1. Artefato cultural: experiência visual 
É a total interação visual e não auditiva com o mundo. Compreende a língua 
de sinais, a necessidade do intérprete, de tecnologia de leitura, as expressões faciais e 
corporais. A autora conta estórias pessoais e de outros surdos, as quais ilustram a 
importância das experiências visuais, variando de relatos curiosos como o pânico que 
sentiu ao ver uma lagartixa pela primeira, achando que se tratava de um filhote de 
 
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jacaré, a relatos preocupantes que colocam em risco a vida de muitos, como quando 
ficou presa no banheiro do ônibus ao fazer uma viagem interestadual à noite (p. 51): 
“Como avisar ao motorista que estou presa? E se me chamarem? Como poderei 
ouvir? Como posso ‘ver’ se estão me ouvindo e se estão me chamando? E como vou 
explicar a eles se não posso ‘ver’ a resposta deles?” Tocantes são as narrativas de 
crianças, que não entendem o porquê de se sentirem isoladas das conversas e demais 
práticas sociais, num mundo onde até os animais são ouvintes. 
Há bastante ênfase à necessidade de se promover um maior contato entre 
crianças e adultos surdos a fim de se levar modelos culturais maduros a esses 
pequenos indivíduos em plena formação cultural, além de denunciar os perigos da falta 
de acessibilidade em aeroportos e bancos, que misturam sinais visuais e auditivos para 
dar orientações importantes aos seus usuários e frequentadores. 
3.2.2. Artefato cultural: desenvolvimento linguístico 
Aqui, é confirmada a aquisição da língua de sinais pelo indivíduo surdo como 
sendo sua língua natural, ficando claro que as línguas orais devem ser ensinadas como 
segunda língua, pois os surdos nunca conseguirão adquiri-las de forma natural e 
espontânea, mesmo aqueles que residem na zona rural e se comunicam por meio de 
“sinais emergentes” ou “sinais caseiros”. Relatos históricos sobre as línguas vísuo-
espaciais, assim como as pesquisas em escrita de sinais (Sign Writing) dão vigor ao 
status da Libras. 
 Mais uma vez, relatos pessoais tocam até os leitores menos sensíveis. Strobel 
revela que tinha um desconforto com as aulas de religião da escola e, ao ser 
questionada por sua mãe sobre o motivo para tanto, ela responde (através de gestos e 
vocabulários isolados) que não saberia como Deus a entenderia quando morresse 
porque não sabia falar. Fica claro o clamor por dar um senso de dignidade a qualquer 
ser humano, que anseia por se comunicar com outros seres humanos por meio da 
língua. 
Quanto mais cedo se faz a estimulação dos sinais em uma criança surda, mais 
ela crescerá com uma autoestima e identidade sadias. Os efeitos de se privar o surdo 
do contato com seus semelhantes, segundo a autora, são devastadores, pois ele irá atrás 
de uma identidade ouvinte que nunca alcançará. A formação de guetos torna-se natural 
quando surdos forasteiros desbravam uma nova cidade e, uma vez achados os seus 
 
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pares, agregam-se em seus pontos de encontro. O tom de protesto denuncia o 
extermínio de muitas línguas de sinais e o preconceito de que elas não são línguas 
plenas e sim sistemas rudimentares de gestos para comunicação. 
3.3.3. Artefato cultural: família 
Strobel enfatiza que a família é o primeiro núcleo da sociedade que enfatiza o 
discurso da medicalização da surdez porque, ao perceberem os mínimos indícios de 
que seus bebês são surdos, os pais os levam ao médico, que indicará ou o implante 
coclear ou a proibição dos sinais sob a ameaça de que assim eles sempre serão 
deficientes. Os questionamentos comuns são: será que meu filho surdo um dia ouvirá? 
Será que um dia ele falará igual a uma criança ouvinte? Será que um dia ele será mais 
bem aceito pela sociedade? Será que um dia o meu filho terá uma vida normal? A 
crítica que faz a tantos “serás” é que nunca há o questionamento: será que a inserção 
em uma comunidade surda ajudará na formação do meu filho como indivíduo pleno? 
Ao se desenvolver, a criança surda cresce carente de diálogo ao redor da mesa 
durante as refeições, celebrações de datas comemorativas, durante as novelas, etc. 
Seleciono meticulosamente os trechos que mais me chamaram atenção (p. 61, 62): 
“Em famílias ouvintes, as crianças surdas observam as conversas e discussões que 
não são direcionadas a elas”. “É o que se chama de isolamento mental. (...) Sente-se 
ansioso por um contato. Sufoca por dentro, mas não pode transmitir esse sentimento 
horrível a ninguém. (...) Não lhe é concedida sequer a ilusão de participação. (...) Há 
a solidão e a resistência, a sede de se comunicar e, algumas vezes, o ódio porque é 
sempre preciso pedir, puxar alguém pela manga ou pelo vestido para saber um pouco, 
um pouquinho daquilo que se passa a sua volta. Caso contrário, a vida é um filme 
mudo, sem legendas”. 
Exceções são os casos em que os membros da família aprendem língua de 
sinais e servem de intérpretes para seus parentes surdos, fazendo a ponto entre eles e 
os ouvintes. Nas famílias em que os membros surdos são maioria, a cultura surda é 
transmitida às gerações futuras com muita naturalidade, a ponto de levar as crianças 
surdas a acharem que os ouvintes são estranhos ou diferentes: “Um papagaio fazia 
parte da família. Eu ficava intrigada e imaginando por que todos falavam mais com o 
papagaio do que comigo. Neste período,começaram as dúvidas e mais dúvidas, sem 
imaginar que eu podia ser diferente. Não lembro se sabia os nomes das pessoas. 
 
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Demorei muito para entender que eu, as pessoas, as coisas tinham nomes”. 
(VILHALVA, 2001, p. 12 apud Strobel, 2013, p. 64). 
3.3.4. Artefato cultural: literatura surda 
Engloba todos os relatos e produções culturais que envolvam as experiências 
de indivíduos surdos ao longo dos anos, cujas narrativas tenham a língua de sinais e 
questões de cultura e identidade surdas. Contemplam também questões de militantes 
surdos, vitórias a opressões, vidas de grandes líderes, bem como a literatura que 
circula no meio acadêmico. São esses os registros que ficaram para que as próximas 
gerações de surdos possam ter acesso ao legado cultural de seus antepassados. 
Os gêneros textuais comuns são poesia, piadas, romances, fábulas, lendas e 
outras manifestações culturais. Os registros em língua de sinais são gravados em 
vídeo. Strobel ressalta, ainda, que a história do povo surdo data de tempos imemoriais 
e é marcada por complexidades. Os meios de comunicação vão além das línguas de 
sinais: as expressões corporais, faciais, desenhos e imagens visuais também colorem o 
mosaico da literatura surda. 
3.3.5. Artefato cultural: vida social e esportiva 
O que mais marca este artefato é a aglutinação da comunidade surda por meio 
das associações de surdos, da prática de esportes, da vida escolar e a frequência a 
eventos sociais que envolvem a promoção da cultura surda. Estão incluídos nesta 
categoria o batismo em língua de sinais, o bater palmas sem produzir sons (com as 
mãos levantadas girando no ar), as adaptações visuais com bandeiras coloridas em 
partidas de futebol (substituindo os apitos), etc. 
3.3.6. Artefato cultural: política 
A articulação política dos surdos surgiu das associações de surdos no século 
XVIII, dado o baixo padrão de vida na época e a necessidade de se ajudarem uns aos 
outros. Strobel cita a FENEIS (Federação Nacional de Educação e Integração dos 
Surdos), a Federação Mundial dos Surdos (WDF) e a Confederação Brasileira dos 
Desportos dos Surdos (CBDS). 
A pedagogia surda e o empoderamento do professor surdo são enfatizados no 
sentido de salientar a necessidade de adaptação curricular para o surdo aprendiz e o 
fortalecimento de modelos bem sucedidos para os jovens surdos. A Lei 10.436, de 24 
 
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de abril de 2002 é um marco da luta do povo surdo para o reconhecimento em nível 
nacional da Libras como a língua natural dos surdos. 
3.3.7. Artefato cultural: materiais 
Materiais englobam tudo aquilo que promove a acessibilidade visual do 
surdo. Dos aparelhos telefônicos TDDs às campainhas luminosas, as legendas em 
programas de televisão e os recursos de câmera do celular moderno. 
 
 
4) ANÁLISE DOS VÍDEOS 
 
As entrevistas foram conduzidas nas dependências da Apada, no Setor 
Comercial Sul, em Brasília, DF, com a autorização prévia da coordenação pedagógica 
desta instituição. Quatro professoras surdas se dispuseram a dar entrevistas. Com o 
intuito de manter suas identidades em sigilo, seus nomes fictícios são Adriana, Irene, 
Eva e Melissa. Os depoimentos foram gravados em vídeo nas datas de 29/6/2015, 
02/7/2015 e 07/7/2015, sendo que Adriana e Irene foram entrevistadas no mesmo dia 
(29/6), uma seguida da outra. Fato importante quanto às datas é que Eva e Melissa 
também gravaram suas participações no mesmo dia (02/7), mas Melissa teve somente 
um minuto e trinta segundos de seu primeiro depoimento registrado porque a bateria 
da câmera havia descarregado e somente percebi o problema após a conclusão da 
entrevista. Mesmo assim, ela gentilmente concordou em colaborar comigo num 
segundo momento, sendo a única entrevistada no dia 07/7. Na conclusão do artigo, 
discorrerei sobre a relevância que isso teve para a análise dos dados. 
Encontrei dificuldades no agendamento das entrevistas com a coordenação da 
Apada, de modo a explicar os objetivos do trabalho e conseguir as devidas 
autorizações, depois com os intérpretes e, por fim, com os próprios professores. Esses 
são dados importantes de pesquisa porque a incompatibilidade de agendas fez com que 
os professores me escolhessem, não o contrário. De forma a ilustrar este ponto, relato 
o primeiro dia de entrevistas. Eu havia perguntado para uma funcionária da Apada, no 
dia anterior ao primeiro contato com uma das professoras, se o dia e horário da 
primeira entrevista estavam confirmados. Nossa conversa se deu em língua de sinais e 
 
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entendi que a professora Giselda5 me atenderia no dia seguinte, pela manhã, às 10h, 
em seu horário de intervalo. Haveria intérpretes disponíveis, então eu poderia me 
despreocupar. No dia seguinte, ao chegar na Apada, descubro que a professora teve 
um problema pessoal e não foi trabalhar. Não havia nenhum intérprete disponível 
também. Percebendo minha expressão de agonia, isolado na recepção (e desolado 
também), a professora Irene, acreditando que eu era um aluno surdo deslocado, se 
apresentou a mim em Libras e ofereceu sua ajuda. Com bastante dificuldade de me 
expressar em Libras, pude esclarecer o que se passava e ela gentilmente se 
disponibilizou para dar entrevista. Aceitei sem hesitar e pedi a um colaborador da 
Apada, que não é intérprete, para fazer a tradução simultânea da entrevista. Nesse 
meio tempo, a coordenação então sugeriu que eu entrevistasse a professora Adriana, 
que é oralizada, então eu não precisaria de intérpretes, ou seja: eu passei de zero a duas 
entrevistadas num picar de olhos. 
A questão linguística se apresenta como um fator de peso. Das quatro 
entrevistadas, somente Irene é surda não oralizada e a voz de seu discurso ficou por 
conta de alguém que não é intérprete profissional. Suponho que muitas informações 
acabaram se perdendo na tradução – o que, de início, foi muito frustrante. Contudo, 
como estamos tratando de pesquisa qualitativa, a interpretação desse dado corrobora o 
agravamento da barreira lingüística e comunicacional imposta pela surdez e, 
consequentemente, pelo meu parco conhecimento de Libras, ao buscar dar voz ao 
surdo nesta pesquisa. Esta é a prova de que, de fato, a ponte entre o universo surdo e o 
universo ouvinte é o intercâmbio linguístico. 
Outro dado interessante é que, mesmo sendo oralizadas, Adriana, Eva e 
Melissa não compreenderam algumas das perguntas. De início, o meu reflexo natural 
de ouvinte foi o de aumentar o volume da voz, mas percebi que não se tratava de 
nenhuma falha ao captar a língua falada. Como a recorrência do não entendimento se 
deu de maneira quase sistemática, procurei investigar as razões para tais 
desentendimentos e encontrei a seguinte passagem do livro “Vendo Vozes”: “Fazer 
perguntas a crianças [surdas] sobre o que acabaram de ler mostrou-me que muitas delas 
podem apresentar notável deficiência linguística. Elas não possuem o recurso linguístico 
proporcionado pelas formas interrogativas. Não é que não saibam a resposta para a 
 
5 Nome fictício 
 
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pergunta, e sim que não entendem a pergunta. [...] Indaguei certa vez a um menino: ‘Quem 
mora na sua casa?’ (A pergunta foi traduzida para ele por seu professor na língua de sinais.) 
O menino mostrava, pela expressão do rosto, que não estava entendendo. Notei então que o 
professor modificou a questão, transformando-a numa série de sentenças declarativas: ‘Na 
sua casa, você, sua mãe [...]’. Uma expressão de compreensão surgiu-lhe no rosto,e ele me 
fez um desenho de sua casa com todos os membros da família, incluindo o cachorro. [...] 
Notei vezes sem conta que os professores tendem hesitar em fazer perguntas a seus alunos, e 
com freqüência expressam as indagações na forma de sentenças incompletas para que as 
crianças surdas possam preencher lacunas.” (RAPIN, Isabelle. Apud SACKS, 2010, p. 55) 
Infelizmente, a elucidação dessa problemática só chegou em minhas mãos 
após o término da coleta dos dados. Como, em português, a entonação é a marca que 
diferencia uma sentença afirmativa de uma interrogativa, é razoável aceitar que haja 
certa dificuldade de compreender perguntas. Ainda assim, permanece intrigante o fato 
de que a questão em que peço a definição de cultura surda trouxe muitas dúvidas e 
hesitações para as entrevistadas, a despeito das paráfrases que utilizei para clarear a 
pergunta. Inicialmente, cheguei a acreditar que não conseguiria responder à primeira 
pergunta de pesquisa (Como os professores surdos definem cultura surda e qual é o 
reflexo disso em sua identidade?). Todavia, reitero que analiso em todo o discurso das 
professoras entrevistadas elementos que reforçam os conceitos de cultura surda, 
marcados pelos artefatos culturais, de Karin Strobel, não somente a resposta isolada de 
cada pergunta. São esses os elementos-chave que me ajudaram a desenhar conclusões 
de como cada participante entende a cultura surda e, consequentemente, definem suas 
identidades surdas. 
 
4.1. Adriana 
Adriana nasceu ouvinte e perdeu a audição à medida que chegou à fase 
adulta. Surpreendi-me com sua eloquência, espontaneidade e conforto com a língua 
oral. Ela começou a sinalizar quando fiz a primeira pergunta, mas logo prosseguiu com 
a entrevista somente em português. Começou a estudar Libras com dezoito anos, num 
curso para ouvintes e, na convivência com os surdos que trabalhavam com ela nos 
correios, em Goiânia, foi se desenvolvendo. Viu que a carência por profissionais 
qualificados para ensinar Libras é grande, então procurou uma formação específica. 
 
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Seleciono alguns trechos de seu discurso que apontam quais sistemas de conhecimento 
e crenças sobre cultura e identidade surdas ela utiliza: 
 
Tabela 2: trechos transcritos da entrevista com a professora Adriana 
 Sobre as leis que protegem os direitos dos surdos 
 “(Houve) muuuuita mudança. Nossa! A lei deu um aparato legal pra contratações, pra formação geral. Foi por meio 
da lei que foi possível se fazer respeitar, 
 se fazer prova adaptada, se contratar profissionais. Por mais que tem que ir no Ministério Público às vezes, mas é por 
meio da lei que isso é possível. Pela lei 
 que... que é possível.. que hoje a universidade tem muito intérpretes, que as escolas também. Então é por meio da lei. 
Se não existisse a lei que dissesse que a 
língua (de sinais) é a segunda língua oficial, não tinha esse pessoal todo disponível pra... pra.. entrar na sociedade, 
né, e pra amparar o surdo.” 
 Sobre a cultura surda Sobre a identidade surda 
“A importância de ensinar Libras, qual é? Nós queremos 
inclusão social e é por 
 meio da língua que ela vai acontecer. Então só uma 
língua refinada, aprimorada, 
uma língua estudada, né, que isso é possível. Então acho 
que o ensino é o caminho.” 
 
“Esse negócio de cultura é muito complexo, né, mas 
enfim... O quê que é cultura 
 surda? É o jeito surdo de ser: a língua, é... a maneira 
com que ele percebe o mun- 
do, é... as adaptações em acessibilidade pra entender a 
língua oral, pra aprender 
português e pra se comunicar com o ouvinte.” 
 
 “Não é o professor ouvinte que manda na língua oral, na 
língua escrita? A língua 
 não é dele? Então é ele quem vai ensinar para o surdo.” 
 
“Eu vi uma palestra do Falk (renomado professor surdo) 
e ele exemplificou isso de 
 um jeito muito bacana. Ele colocou lá uma frase no 
quadro assim: ele estava pela 
 primeira vez numa associação de surdos e recebeu um 
bilhetinho de uma paquera...” 
 
 
 
“Na minha família tem outras pessoas com surdez. Se 
nasce com audição normal 
 e com o decorrer dos anos, 5, 6, 7 anos, já começa a 
perder a audição. O canal 
do ouvido vai estreitando. Então a minha primeira 
língua foi a língua oral, foi a 
língua portuguesa escrita, a língua oral. Depois, com... 
com 15 anos, quando eu 
fiz a primeira audiometria, eu já tinha metade da 
audição normal, metade da au- 
 dição de um ouvido. Aí já é indicado o uso da prótese, 
né, porque é isso que mé- 
dico sabe fazer. E depois a audição foi sumindo muito 
rápido. Com 20 anos eu já 
 não percebia nada sem aparelho, eu era dependente 
demais do aparelho porque 
 eu já tinha a língua oral e já tinha a memória auditiva. 
Hoje não me vejo sem a- 
parelho. Se eu andar na rua sem aparelho, tenho a 
impressão que o carro vai ba- 
ter em mim porque não tô vendo de onde eles tão 
vindo.” 
 
“Português não sei até hoje. Escrevo o projeto de 
mestrado e volta vinte vezes.” 
 
“O que é ser bilíngue? Os profissionais que estão 
envolvidos nisso sabem o que é 
 ser bilíngue? Então primeiro é aprender o que é ser 
bilíngue do ponto de vista 
linguístico e depois entender o que é ser bilíngue do 
ponto de vista do surdo.” 
 
“Eu não trabalho com segunda língua. Minha primeira 
língua é a Língua de Si- 
 
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nais porque eu acho que eu não sei português. Eu não 
sei. Eu não domino a lín- 
gua portuguesa. Se um dia eu dominar a língua 
portuguesa escrita, enfim... Vai 
demorar muito, mas nós tamo trabalhando pra isso.” 
 
4.2. Irene 
Irene foi a única professora a conceder a entrevista usando Libras do começo 
ao fim. O colaborador da Apada que serviu de intérprete ajudou-me com boa vontade, 
mas não é profissional e nota-se um discurso quebrado, difícil de ser compreendido 
quando transformado em língua escrita. Saliento que, comparativamente, as 
transcrições desta entrevista se apresentam em menor volume, dada a barreira que se 
ergueu entre mim e a entrevistada pela falta de proficiência (de ambos) na língua do 
interlocutor. 
 
Tabela 3: trechos transcritos da entrevista com a professora Irene 
 Sobre as leis que protegem os direitos dos surdos 
 “A lei foi um grande acontecimento para a Língua de Sinais, pro Brasil foi um marco. Eu acho que faltou também 
muita coisa, é claro. Está nítido na questão de espe- 
cificar advogado, médico, muitos serviços a gente encontra muitas barreiras. Agora, só legalizar foi bom, tem que 
respeitar. Se a gente olhar pra trás, tem muita coisa 
 que melhorar. Então continua ruim ainda.” 
 Sobre a cultura surda Sobre a identidade surda 
“O foco tem que ser ensinar o surdo porque isso faz parte do 
contexto de vida, para ele se desen- 
volver, ampliar os conceitos, expandir o conhecimento. Então é 
importante que ele saiba a Lín- 
gua de Sinais (...). O ouvinte também precisa conhecer Libras para 
ele estar pronto para seguir 
 igual ao indivíduo surdo.” 
 
“Os ouvintes, né, no geral, querem se comunicar, outros ficaram 
pensando: ‘Pôxa, é... como será 
 essa Língua de sinais, né? Será que é uma língua mesmo, né? Mas 
aí eles acabam entendendo 
 que é uma língua. Não é uma coisa frágil, é uma coisa muito rica, 
né. Eles conseguem entender 
 essa cultura surda. Também o ouvinte tem a língua dele, né, a 
língua dele é uma língua rica. 
Tem suas influências, assim como outras línguas, né. E a Libras a 
gente acaba trazendo para o 
mesmo patamar. (...) Antes a comunidade ouvinte não era muito de 
saber. Hoje tem essa curiosi- 
dade de descobrir a línguade sinais. Por exemplo, a pessoa vê o 
“Tem um pequeno problema: para o surdo, o 
português é muito di- 
fícil. Para o ouvinte, não tem dificuldade a 
questão do visual. O sur- 
do é muito visual. Essa obrigatoriedade de ele 
ter que ler português 
escrito pode despertar interesse ou não. Isso 
tudo fica mais fácil 
quando se tem um intérprete ou um professor 
para se dedicar e en- 
sinar isso... o português... usando a língua de 
sinais.” 
 
“Tem que ser estimulado o visual. Esse é o 
melhor modelo (de edu- 
cação), mas tem que começar quando a 
criança nasce.” 
 
 
 
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surdo sinalizando e acha que 
 aquela comunicação não é equivalente a um português, ou ao 
inglês. Acham que é só gestos né. 
 E acabam trazendo a ideia de superioridade. A partir do 
conhecimento, ela começa a ter uma 
 ideia de que as coisas são importantes.” 
 
“(Cultura surda) é uma coisa minha, importante pra mim e pra 
todos os surdos, né. É... como se 
 fosse... o nosso valor... que pode até ser julgado como subjetivo, 
mas é um valor do nosso povo. 
É uma expressão, o jeito da gente ir e vir, ter nosso espaço. Então é 
como se fosse um orgulho 
também. Acho que está associado a isso: é o que eu sou, a forma 
como me expresso, sinto. Toda 
 comunidade tem isso. O exemplo do ouvinte é igual: eles têm a 
cultura deles e isso é parte deles 
 de verdade Nós somos uma minoria, mas temos nossa língua e 
cultura. Está dentro de nós.” 
 
“O modelo (da Escola Bilíngue) é bom. Talvez o importante é 
começar desde bebê. A família tem 
 também que fazer cursos. Se a família não se apressar, a criança 
pode perder uns 50% e crescer 
sem aprender Libras.” 
 
4.3. Eva 
Eva expressa-se com clareza em português, embora tenha dificuldade com a 
pronúncia das palavras. Nasceu ouvinte, mas perdeu a audição antes dos 7 anos. Ela 
sinalizou ao mesmo tempo em que utilizou-se da língua oral durante toda a entrevista. 
Fez Letras Libras porque percebeu que no Brasil e no mundo há uma real necessidade 
de se ensinar língua de sinais para ter contato com o surdo, já que muitos não 
conseguem ser oralizados. Ela enfatiza bastante a necessidade de ouvintes aprenderem 
Libras, especialmente ao narrar as dificuldades que teve na escola, aprendendo junto 
com ouvintes e sendo forçada a oralizar e sinalizar ao mesmo tempo, culpando a 
sociedade por não enxergar o esforço que o surdo faz. Também fala sobre a 
necessidade urgente de intérpretes nas escolas e o baixo quórum de professores surdos 
no mercado. Demonstra ter um conhecimento sobre a história de seu povo e valoriza 
as lutas do povo surdo pela conquista de seus direitos. 
 
Tabela 4: trechos transcritos da entrevista com a professora Eva 
 
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 Sobre as leis que protegem os direitos dos surdos 
 “A luta foi muito grande desde 2002 porque mostra que a Língua de Sinais é uma língua porque hoje em dia acham 
que não é. É uma língua mesmo. Aí a gente sofre 
muito porque a Língua de Sinais sempre é destruída, sempre volta e não tem nada de registro da Libras do passado. 
Então ontem eu tava estudando sobre o calvário 
do surdo (...) Achava que o surdo é anormal: ele é surdo e não pode pensar. Aí matava. Aí com o tempo... Isso porque 
destruíram os sinais. Aí surgiram outros surdos 
com outra língua de sinais. Aí não tem registro passado. Aí teve integração porque ajudava ele a oralizar: se quisesse 
usar as mãos, impedia, botava implante, botava 
aparelho. É uma integração. Então a luta foi muito grande e hoje em dia mostra que é uma língua, não é qualquer um. 
Aí tem a Lei de Libras, né e tem Decreto também 
de 2005 para ser obrigatório Língua de Sinais na universidade, faculdade, curso básico pra professor surdo 
principalmente, né, porque a língua é dele mesmo, pra ele 
ensinar. O intérprete é muito importante, né, porque tem pouco professor surdo. O intérprete pode traduzir as aulas 
das outras matérias, também palestras. E é a lei da 
 gente. A gente tem que ter. Mas tem gente acha que o decreto da Escola Bilíngue é falso porque ainda tá integração. 
Tem (só) uma escola bilíngue em Taguatinga. Nas 
 outras escolas não tem. Aí tá integrado então fica difícil adaptar pro surdo (...) então a gente tá lutando pra conseguir 
uma lei de verdade. Aí na faculdade de Letras 
 Libras explica só lei, lei, lei. (...) A Escola Bilíngue é única, né. Mas o governo tava tentando fechar. (...) Lá é bilíngue 
pra ele (o surdo), né. Então a luta é grande por- 
que nas outras escolas não tem. Aí a pessoa fala que é uma lei falsa. Tá na lei, tá na Constituição: ok, é uma língua, 
mas língua oficial não tem ainda.” 
 Sobre a cultura surda Sobre a identidade surda 
“É importante fazer curso de Libras. É mais fácil ter 
contato pra apoiar o surdo. 
Pra alguns é obrigatório fazer o curso por causa da 
faculdade porque é a segunda 
 língua oficial no Brasil. Então pra fono, pedagogia, 
quando lida com criança surda 
 tem que saber comunicar. Mas o surdo tá lutando pra os 
outros aprenderem no 
banco, no hospital, na delegacia. Vai que a polícia aponta 
a arma e o surdo não sa- 
be, aí prende ele e ele é inocente. Aí precisa saber se 
comunicar com a língua de si- 
nais. No hospital é coisa privada, no banco também, não 
quer saber quanto dinheiro 
 que ele tem. É obrigatório porque o Brasil tá lutando por 
isso. (...) Às vezes tem procuração e ele assina sem saber. 
Aí é necessário uma pessoa que sabe Libras.” 
 
“Minha irmã me acompanhou na escola. A primeira 
educação dela foi em Libras e 
 hoje ela é uma pessoa fluente, é intérprete geral. Ela me 
ensinava aos poucos e ho- 
je eu sei, né. Eu leio, entendo, comunicação entendo. Mas 
pra escrever é muito difí- 
cil pra gente porque a gente não consegue colocar 
preposição, artigo, são pala- 
vras-chave. Então hoje a gente tá com uma luta muito 
“Se tiver alguém que sabe Libras, vai ajudar muito 
então eu decidiajudar os ou- 
tros e fazer curso de Letras Libras pra ensinar.” 
 
“Foi muito difícil pra mim na sala de aula. Não tinha 
intérprete na época. Tinha 
 uma escola com Comunicação Total. A gente oralizava 
e sinalizava ao mesmo 
 tempo como eu tô falando agora. Mas isso não é legal. 
Precisa separar. Tem que 
 ser uma escola bilíngue, né. Aí estuda só português e 
depois estuda só Libras.” 
 
“Quando eu estudei foi muito complicado porque o 
professor escreve no quadro e 
 dá as costas e eu não consigo ouvir e não consigo 
leitura labial também. Aí man- 
 
da atividade em casa, eu leio e não entendo. Tinha 
intérprete na sala de aula que 
 só acompanhava o português palavra por palavra, ela 
não adaptou pra Libras aí 
 tive muita dificuldade. Então muito surdo teve nota 
fraca. Aí parece que o sur- 
do não sabe, é burro ou preguiçoso, mas não é.” 
 
 
 
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grande e tem que ter o portu- 
guês porque é língua oficial do Brasil.” 
 
“Precisa mostrar muita imagem, principalmente vídeo 
porque conhece variação dos 
 professores porque muita gente reclama: ‘Ah, ele me 
ensinou assim e você me ensi- 
nou assim..’ Aí eu falo: ‘É variação. É igual o ouvinte 
fala no nordeste macaxeira 
ou aipim e pra outros é mandioca.’ Precisa aprender 
variação” 
 
 
 
 
4.4. Melissa 
Melissa me concedeu duas entrevistas. Na primeira, mostrou que sabe utilizar 
o português falado (perfeitamente) e sinalizou ao mesmo tempo. Na segunda, só usou 
o português oral. Creio, baseando-me nos relatos, que isso se deve pelo fato de que 
muitos pensam que usar Libras e português ao mesmo tempo enfraquece o status da 
línguade sinais como língua plena ou que isso compromete a formação de uma 
identidade surda sadia. Os dados que puderam ser resgatados do primeiro relato são as 
minhas notas de campo, que não serão usadas no quadro de transcrições, mas são aqui 
expostos: ela me relatou que fez vestibular acreditando que se tratava de um concurso 
público, já que leu a palavra “Libras” no edital. Não achava que iria passar e se 
surpreendeu ao descobrir que o curso que faria era de 4 anos e não 6 meses. Pensou 
em desistir, mas chegou a se formar. Para ela, o surdo só não escuta, mas é uma pessoa 
normal, não deficiente. Os problemas começam a surgir na família porque o não 
conhecimento da língua de sinais faz com que os pais deleguem a educação de seus 
filhos para estranhos. 
Ela também me confidenciou que se sente incomodada com o aparelho 
auditivo, que ganhou do governo, porque seu uso acarreta em fortes dores de cabeça. 
Com isso, criticou o estereótipo de que o surdo é agressivo ou rude pois, afinal, quem 
é simpático quando sente dor? Também criticou os médicos, que prescrevem o 
implante coclear como medida de normalizar o surdo e, assim, enchem seus bolsos de 
dinheiro. Ambos aparelho e implante limitam a liberdade de ir à praia, fazer esporte, 
brincar na escola, ou seja, levar uma vida normal. 
Defende que todo surdo tem que aprender português para não ser vítima de 
um analfabetismo funcional. Ao pegar um ônibus voltando para casa ou assinar um 
 
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documento no banco, o surdo precisa dominar a língua portuguesa em sua modalidade 
escrita. Quanto à cultura surda, ela se diz distante disso. Não socializa com outros 
surdos com frequência a ponto de ser estigmatizada por eles como sendo ouvinte. Ela 
disse que resiste a isso e se recusa a ajudá-los em situações de emergência que 
precisam do uso da língua oral como, por exemplo, em restaurantes, caso alguém 
precise resolver um problema com a conta. Nestes episódios, ela usa língua de sinais 
com os garçons, mesmo que não a compreendam. Ela insiste que assim o faz para que 
os demais surdos também entendam que a identidade surda dela é tão válida quanto a 
deles. 
Quanto ao benefício das leis, mostrou-se pouco satisfeita. Ela não concorda, por 
exemplo, com o fato de que, por ser surda, ela concorre em pé de igualdade com um 
candidato cadeirante a uma vaga de concurso porque ele escuta e aprende palavras 
novas todos os dias. Já ela, por ser surda, não consegue dominar a língua escrita e 
acaba tirando notas muito baixas nas redações. Algumas dessas crenças foram 
recorrentes na segunda entrevista, como mostra o quadro analítico abaixo. Há, todavia, 
uma sutil diferença quanto à visão que tem das leis quando comparadas as duas 
entrevistas. 
 
Tabela 5: trechos transcritos da segunda entrevista com a professora Melissa 
 Sobre as leis que protegem os direitos dos surdos 
 “Muita coisa (avançou depois da lei). Nossa, antes não tinha nada. Melhor alguma coisa do que nada, né. Então muita 
coisa avançou, né, mesmo sendo devagar. Com 
 toda dificuldade, a gente tá caminhando bem, a gente tá indo no caminho certo. Tem que lutar mais. (...) Muita coisa 
precisa mudar: tem nem como explicar, né, porque 
 é, assim, muito detalhe na Lei de Libras. Não só da Lei de Libras, mas como dos deficientes, né. (...) Agora eu acho que 
deveria haver uma participação de cada tipo de 
 pessoa com deficiência no meio dessas decisões. Você escolher pra mim é muito fácil. Eu posso escolher por você? 
Não, né. Então eu acho que eu tinha que participar 
 mais também. (...) Tem que ter alguém que dê opinião de cada tipo de deficiência. Assim a coisa pode avançar. Agora o 
ouvinte escolher pro deficiente e ele não saber 
como é a deficiência, não resolve.” 
 Sobre a cultura surda Sobre a identidade surda 
“Por exemplo, pra falar no telefone sempre tenho que estar 
pedindo a alguém pra li- 
gar pra mim, ir pra médico ou pra resolver algum 
problema, então eu fico limitada a 
 certos tipos de coisas. E a dificuldade é grande. Por 
exemplo, tem aquele telefone pra 
 deficiente auditivo... Não é todo mundo que tem. Como eu 
“Então ele (o surdo) precisa aprender o português. Não 
que eu seja a favor de português... ã-ã, nada disso. É só 
pela comunicação.” 
 
“O meu contato com o surdo é aquele grupinho, assim, 
de fim de semana (...) En- 
tão eu não tenho, assim, aquela cultura de, por 
 
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vou falar com você se você 
 não tem? Você tem na sua casa? Não tem. Isso não é 
acessibilidade. (...) Por isso que 
 o meio de comunicação é o celular, né. As mensagens, as 
imagens na webcam, o 
Skype, que é um programa que o surdo fala ao vivo 
também...” 
 
“Quando você tem um problema pra resolver na escola do 
seu filho você não precisa 
 ir lá, você liga. A gente não. Precisa se locomover, sair do 
trabalho, pro chefe enten- 
der é difícil porque ele acha que você ta inventando 
desculpa, então é complicado 
 nessa parte.” 
 
“Esse não é o problema porque nem todo mundo tem 
paciência pra falar com o surdo. 
 E isso é a realidade, inclusive dentro da família. Tem dias 
que todo mundo tá mara- 
vilhoso, agora tem dias que ninguém... entendeu? Aí, assim, 
com o tempo você vai só acumulando aquela coisa dentro 
de você e a realidade não é o que a gente vê, né.” 
 
“É igual à lei que foi vetada. Assim, às vezes, com essas 
leis, o deficiente já não tinha muito acesso a muita coisa. 
Alguns conseguem. Não são todos, né. E muita coisa foi 
tirada. 
Então, quer dizer, em vez da gente conseguir, a gente ta, 
né... Igual eu falei pra você 
o negócio do concurso. Da outra vez eu falei pra você do 
concurso público: ah, sou 
surda. Tudo bem: eu falo, conheço, mas ‘ah, é falta de 
esforço’. Ah, tá. (...)mas vamo 
 botar nós dois juntos. O seu conhecimento é 
completamente diferente do meu, né. 
Então, assim, você vai aprender muito mais rápido do que 
eu (...) no dia da prova do concurso tem palavras (...) até 
pro ouvinte mesmo é difícil – imagina pro surdo que 
não conhece, nunca viu aquela palavra, não sabe nem o 
significado dela. (...) Você 
 entende? Então é difícil. E as pessoas acham: ‘ah, 
coitadinho’. Não é coitadinho. 
É porque, infelizmente, a educação não ensina aquilo que 
você tem que aprender des- 
de o começo, desde pequenininho. Você vai aprender de 
grande. É muita coisa. E fal- 
ta um pouco o acesso pro surdo a isso.” 
 
“A outra dificuldade é porque não tem profissionais 
qualificados pra ensinar. Não 
tem. E quando tem, os profissionais podem ser 
exemplo, ah, vou no cinema com o 
 surdo, vamos pro teatro... (...) A minha cultura não é 
essa, né. É meia... assim... 
não é qualquer... eu não pratico esporte com o surdo. 
Tem surdo que pratica es- 
porte, que vai na academia, um grupo de surdos mesmo, 
né, que se reúne. (...) 
Não é todo fim de semana, né. Apesar de que eu já tive 
muitas oportunidades e 
acabei optando por outras coisas que me fez eu me 
afastar.” 
 
“Por eu falar, ninguém acredita que minha surdez é 
profunda. (...) Então, assim, 
 é difícil mas por mais que eu fale, por mais que eu 
escute pouco, é difícil o aces- 
so a muita coisa, principalmente para resolver (algo 
que não consigo entender 
bem) em médico, de escola.” 
 
“Agora, assim, em relação ao trabalho, não me empata 
de trabalhar, não me em- 
pata de me relacionar com outra pessoa.” 
 
“Então é difícil. (...) E eu morria de vergonha (...) e eu 
tinha vergonha de falar 
(para os professores da escola que ela não ouvia) 
porque era só eu na época. 
Surda. Então no 2o grau eu repeti duas ou três vezes até 
que, quando o professor 
 veio de novo(...) eu cheguei na diretora na época e 
falei ‘olha, é isso, isso e isso’ 
 e foi a partir daí que eu descobri que eu tinha direito, 
que eu era deficiente. E 
até então eu não sabia e eu já tinha 20, mais de 20 
anos, né. Foi aí que eu come- 
cei a estudar os meus direitos.” 
 
 
 
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qualificados, mas não pra ensinar pro 
 surdo. (...) Mas também deveria ter professores intérpretes 
qualificados pra isso. Se 
não tiver, não adianta.” 
 
 
 
5) CONCLUSÕES 
 
Os dados relevantes podem ser compilados no quadro abaixo, como ponto de 
partida para o encaminhamento de minhas conclusões, desenvolvidas a partir das 
perguntas de pesquisa. 
 
Tabela 6: quadro comparativo das quatro entrevistas 
Professora Identidade Surda e 
(estereótipos 
mencionados) 
Artefatos culturais 
mencionados 
Opinião sobre as leis 
Adriana Híbrida 
(Médico só sabe fazer 
implante) 
-Literatura (líder surdo: Falk); 
-Vida social (aprender português 
facilita a inclusão); 
- Política (ouvinte é dono da 
língua oral). 
Positiva: a lei deu um suporte de 
pessoal para amparar o surdo e 
 deu respeito e status à Libras 
Irene Surda 
(Libras é uma língua 
pobre) 
-Experiência visual (surdo é 
visual e português é difícil); 
-Desenvolvimento linguístico 
(Libras para que 
todos caminhem igualmente); 
- Família (tem de saber Libras e 
ensiná-la desde bebê); 
- Política (lei). 
Ambivalente: foi um grande marco 
para o país, porém falta mui- 
ta coisa como ampliar a 
obrigatoriedade para advogados, 
médi- 
cos e outros profissionais estudarem 
Libras na graduação. 
Eva Transição 
(Surdo é fechado, 
burro e preguiçoso) 
-Desenvolvimento linguístico 
(importante ensinar 
Libras aos surdos, português é 
difícil, Libras é lingua e 
tem variação); 
- Família (irmã virou intérprete); 
- Literatura (calvário do surdo); 
- Vida social (batismo); 
- Política (lei, militância, 
professor surdo). 
Ambivalente: a lei reconhece a Libras 
como língua, ressalta a 
importância de se obrigar as 
faculdades a incluí-la no currículo, 
 mas acha o decreto da Escola 
Bilíngue falso (inclusão X integra- 
ção) 
Melissa Incompleta / Flutuante 
(Surdo é agressivo, 
coitadinho, deficien- 
te, não se esforça) 
-Desenvolvimento linguístico 
(guetos, variação); 
- Família (isolamento); 
- Vida social e esportiva 
(preconceito de outros surdos); 
- Política (lei, militância, 
Ambivalente: na 1a entrevista, disse 
que houve pouco avanço por 
conta da falta de equidade em 
concursos. Na 2a entrevista, disse 
 que a lei ajudou muito porque antes 
não tinha nada. Criticou o 
 
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professor especialista 
em surdos) 
- Materiais (falta acessibilidade) 
 
estatuto do deficiente e disse que falta 
mais representação ativa 
 nas tomadas políticas de decisão por 
parte dos surdos. 
 
1) É possível encaixar os participantes nas categorias de identidades surdas propostas por 
Perlin? A que estereótipos sobre o surdo os professores se referem em seu discurso? 
 
Sim. O tempo que leva para que o surdo entre em contato com a comunidade 
surda determina em qual mapeamento identitário ele se encontra, com relação às 
categorias propostas por Perlin. Esse encaixe, contudo, realmente não é uma tarefa 
fácil de se fazer, pois estamos tratando de indivíduos, pessoas que têm suas 
complexidades, idiossincrasias, medos, valores, família, identidade próprias, mas não 
são estáticas nem imutáveis. Portanto, uma determinação monolítica de identidades 
surdas só é possível dentro de um recorte temporal específico. Os estereótipos a que as 
entrevistadas se referem nos mostram quais são suas lutas internas na busca de reverter 
a imagem que o ouvinte tem sobre os surdos. 
 
2) Como o discurso das professoras define cultura surda? Quais artefatos culturais 
propostos por Strobel são predominantes? 
 
Inicialmente, definem a cultura surda como sendo fortemente marcada por 
lutas políticas, pela militância, pelo direito a participar das tomadas de decisão que os 
afetam e, principalmente, pela consciência da letra das leis que resguardam seus 
direitos enquanto surdos. Depois vêm as questões de ordem social que marcam a 
comunidade surda, como a família e o papel importante que ela desempenha no 
desenvolvimento da criança surda, as dificuldades de socialização e o 
desenvolvimento linguístico, com ênfase na importância de se aprender português 
como segunda língua, sendo a língua de sinais o instrumento de maior peso 
constituinte do indivíduo surdo. A falta de registros sobre o passado e história sofrida 
de seu povo, marcada por lutas que continuam até hoje, vêm logo em seguida, 
sobressaindo questões de (falta de) acessibilidade. 
 
 
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3) Como eles encaram as repercussões da Lei de Libras (Lei 10.436/02, de 24 de abril de 
2002) e decretos que regulamentam essa lei no que tange o ensino da língua de sinais 
como primeira e segunda língua e do português escrito como segunda língua para 
surdos? 
 
O maior ganho é a obrigatoriedade do ensino de Libras no ensino superior 
para cursos de fonoaudiologia, licenciaturas e pedagogia. No ensino fundamental e 
médio, a contratação de intérpretes tem um peso relevante. Porém, mesmo com o 
reconhecimento de Libras como língua, governo e sociedade não abraçaram a causa 
por inteiro, já que demais profissionais como médicos, policiais, advogados, 
atendentes de banco, assistentes sociais e outros não são obrigados a ter contato com a 
língua de sinais em seus cursos de formação. 
Por fim, me parece estranho que a experiência visual não tenha sido tão 
relevantemente marcada no discurso das professoras, o que me leva a crer que, como 3 
das 4 entrevistadas são oralizadas, ainda há uma confluência robusta de experiências 
auditivas que não se sobressaem às visuais. Na discrepância de opiniões sobre as leis, 
emitidas pela professora Melissa, houve um marco importante no intervalo de uma 
semana pra outra, que foram os sete vetos da presidenta Dilma ao texto do Estatuto do 
Deficiente. Dentre estes, estão a contratação de pessoas com deficiência por empresas 
que têm entre 50 e 99 funcionários e a reserva de 10% das vagas nos processos 
seletivos para cursos de nível técnico, tecnológico e superior de instituições federais 
públicas e privadas. Apesar dos vetos, sua opinião se mostrou ser mais positiva quanto 
às legislações na segunda entrevista. Porém, a crítica que fez aos próprios deficientes, 
no sentido de buscarem mais representação política nessas tomadas de decisão, é 
contundente. Afinal, o direito à cidadania requer que tomemos posse da habilidade 
discursiva em defesa de interesses próprios. O preço de outorgar essa responsabilidade 
a outrem é deveras caro. 
 
 REFERÊNCIAS 
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manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 12a edição, Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. 
 
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FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Coord. da trad. Izabel Magalhães. Brasília: 
Editora Universidade de Brasília, 2001. 
FERNANDES, S. Educação de surdos. 2a edição – atual. Curitiba: IBPEX, 2011. 
FERRAZ, J. A. A formação identitária do brasileiro: um enfoque multimodal. In: VIEIRA, J. 
A e BENTO, A. L. (Org). Discurso, identidade e gênero. Editora Movimento, Brasília, p. 363-
449, 2015. 
PEDRO, E. R. Análise crítica do discurso: aspectos teóricos, metodológicos e analíticos. Em: 
Análise crítica do discurso – uma perspectiva sociopolítica e funcional. Coleção Universitária,Série Lingüística. Dirigida por Maria Raquel Delgado Martins. Editorial Caminho, Lisboa, 
1997. 
PERLIN, G. T. T. Identidades surdas. In: SKLIAR, C (Org). A surdez: um olhar sobre as 
diferenças. Editora Mediação, 7a edição, Porto Alegre, p. 51-73, 2015. 
SACKS, O. W. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Tradução: Laura Teixeira 
Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. 
STROBEL, K. As imagens do outro sobre a cultura surda. 3a edição. Florianópolis: Editora da 
UFSC, 2013. 
VIEIRA, J; SILVESTRE, C. Introdução à multimodalidade: contribuições da Gramática 
Sistêmico-Funcional, Análise de Discurso Crítica, Semiótica Social. Brasília, DF: 2015.

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