Buscar

FICHAMENTO - PENAL II - GUNTHER, Klaus. O desafio naturalístico de um direito penal fundado na culpabilidade. Revista DireitoGV. 2019.

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 10 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

UNIFG 
DIREITO 
 
 
 
 
 
 
 
 ALAN VINICIUS DA SILVA RIBEIRO 
 BRUNO DE SOUSA RODRIGUES 
 BIANCA R. DOS SANTOS SILVA 
 SERGIO J. DOS SANTOS RIBEIRO 
 VILSON DA SILVA NUNES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FICHAMENTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Guanambi – BA 
2020 
 
 ALAN VINICIUS DA SILVA RIBEIRO 
 BRUNO DE SOUSA RODRIGUES 
 BIANCA R. DOS SANTOS SILVA 
 SERGIO J. DOS SANTOS RIBEIRO 
 VILSON DA SILVA NUNES 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
FICHAMENTO 
 
 
 
 
 
 
 
 
Fichamento apresentado ao curso 
de Direito do Centro Universitário 
UNIFG, como um dos pré-requisitos 
para avaliação da disciplina de 
Direito Penal II. 
 
Professor: Júlio Boa Sorte 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Guanambi – BA 
2020 
 
GUNTHER, Klaus. O desafio naturalístico de um direito penal fundado na culpabilidade. 
Revista DireitoGV. 2019. 
 
A atual transformação do direito penal em um direito de segurança* pós-
preventivo vem sendo acompanhada de um intenso debate sobre o princípio 
da culpabilidade. [...] o conceito jurídico--penal de culpabilidade é também 
objeto das atuais discussões sobre as possíveis implicações das mais 
recentes descobertas no campo da neurociência. [...] Wolf Singer, Gerhard 
Roth e Hans Markowitsch [...] vêm se posicionando contra o conceito de 
culpabilidade e contra qualquer pena sobre ele fundada [...] Wolf Singer 
chega [...] a sugerir a utilização de uma nova terminologia para o direito 
penal, [...] que façamos apenas um uso formal da palavra ‘responsabilidade’, 
sem que nos esqueçamos, contudo, de que, na verdade, estaríamos aqui 
tratando da ideia de ‘periculosidade’. (GUNTHER, 2019, p.1053). 
 
Nas páginas seguintes, analisarei criticamente o desafio naturalístico 
enfrentado por um direito penal fundado na ideia de culpabilidade, para, em 
seguida, adentrar nas relações pouco notadas que esse desafio mantém 
com a atual transformação sofrida pelo direito penal. (GUNTHER, 2019, 
p.1054). 
 
Quando colocados diante dos desafios postos pela neurociência, os 
penalistas acabam não reagindo de maneira uniforme. [...] o conceito jurídico 
de culpabilidade é [...] altamente controverso [...] Essa falta de consenso 
reflete-se no constante desenvolvimento de novas teorias – ora afirmando o 
livre-arbítrio, ora negando-o, ora mantendo sobre ele uma posição agnóstica 
[...] a culpabilidade penal, quando tomada em sentido amplo, pressupõe, 
entre outras coisas, a intencionalidade do agente – em regra definida 
positivamente pelas noções de dolo ou de culpa. [...] não estamos aqui diante 
de uma definição conclusiva [...] (GUNTHER, 2019, p.1055). 
 
Esse tipo de delimitação aplica-se com muita propriedade à determinação 
dos elementos que compõem o núcleo originário do conceito de 
culpabilidade, tal forma de delimitação pode ser claramente observada no 
plano do conceito jurídico-penal de culpabilidade em sentido estrito. 
(GUNTHER, 2019, p.1055). 
 
A vantagem de se utilizarem [...] definições negativas consiste no fato de que, 
[...] o legislador não precisa se vincular a um determinado conceito de 
culpabilidade, o que lhe evita ter de acatar uma resposta possivelmente 
problemática à questão do livre-arbí-trio. (GUNTHER, 2019, p.1056). 
 
[...] na medida em que a ausência de uma causa excludente de culpabilidade 
ou de uma causa de exculpação implica diretamente – e sem necessidade 
de qualquer fundamento extra – a aceitação de que o autor agiu 
culpavelmente, torna-se claro que, em direito penal, todo delinquente é 
tomado por culpável, a não ser que um déficit interno ou externo aponte na 
direção contrária. (GUNTHER, 2019, p.1056). 
 
“No processo penal, o acusado é tido sem mais como culpado, a não ser 
que circunstâncias específicas tornem questionável tal suposição.” (GUNTHER, 
2019, p.1056). 
 
[...] a culpabilidade penal é aquilo que, em certo sentido, ‘sobra’ quando 
nenhuma das exceções legais acima mencionadas estão presentes. Neste 
sentido é que Herbert L. A. Hart definiu a responsabilização no direito a partir 
do conceito de atribuição passível de refutação (anfechtbare Zuschreibung). 
(GUNTHER, 2019, p.1057). 
 
“Um agente é culpável sempre que não puder refutar, com base em circunstâncias 
excepcionais, a responsabilidade que prima facie lhe foi atribuída.” (GUNTHER, 2019, 
p.1057). 
 
“O direito penal e o sistema de justiça criminal operam com uma espécie de 
presunção de normalidade, que pode ser refutada recorrendo-se a circunstâncias 
excepcionantes.” (GUNTHER, 2019, p.1057). 
 
“Aquele que não sofre de um dos déficits já mencionados ou não se encontra em uma 
situação extremamente difícil no momento do ato é tomado como capaz de observar 
o direito e de evitar a lesão a um bem-jurídico.” (GUNTHER, 2019, p.1057). 
“[...] em regra tomamos a pessoa em questão como responsável por 
seus atos. Apenas quanto ela reage com um pedido de desculpas [...]” (GUNTHER, 
2019, p.1057). 
 
“[...] não se trata de um conjunto taxativo, que compreenderia todos os elementos 
cuja ausência implica uma atribuição de culpabilidade.” (GUNTHER, 2019, p.1058). 
 
“[...] a que a presunção de normalidade, até aqui, parece legitimar-se apenas com 
base em elementos empíricos. [...] Não obstante isso, essa presunção de 
normalidade possui também um sentido normativo [...]” (GUNTHER, 2019, p.1059). 
 
“[...] a constatação empírica de determinada deficiência ou de determinado distúrbio 
não é capaz de fornecer uma resposta suficiente para a pergunta acerca da 
imputabilidade de um autor.” (GUNTHER, 2019, p.1060). 
 
[...] sentido normativo da presunção de normalidade mostra-se também na 
aplicação do direito ao caso concreto. Do fato empírico de que determinadas 
capacidades são encontradas na maioria da população, nós extraímos 
implicitamente uma norma que exige do indivíduo um comportamento de 
acordo com esse padrão majoritário. (GUNTHER, 2019, p.1060-1061). 
[...] tanto o lado empírico quanto o lado normativo da presunção de 
normalidade deixam claro que esta não se sustenta apenas de maneira 
 
contrafática. Capacidade de compreensão e capacidade de autocontrole são 
qualidades encontradas na maioria dos destinatários das normas [...] 
(GUNTHER, 2019, p.1061). 
 
Quem pertence a essa maioria, dispondo dessas capacidades, e apesar 
disso viola bens jurí-dicos alheios, é tratado de acordo com tal condição – 
isto é, como uma pessoa cujas capacidades não foram usadas como se 
podia e se devia. Nisto funda-se a possibilidade de se imputar culpabilidade 
penal. (GUNTHER, 2019, p.1061). 
 
“No caso das chamadas causas de exclusão de culpabilidade (menoridade penal, 
inimputabilidade e erro de proibi-ção inevitável), o autor é retirado total ou 
parcialmente do grupo majoritário dos capazes [...]” (GUNTHER, 2019, p.1061). 
 
“[...] as pessoas dotadas de capacidades normais não seriam 
tão determinadas quanto as que delas não dispõem? [...]” (GUNTHER, 2019, p.1062). 
 
Von Liszt definia a imputabilidade como sendo o reflexo de uma espécie 
normal de determinação, fundada na percepção e em motivos para ação [...] 
‘imputável é todo ser humano mentalmente são e maduro, sem qualquer 
distúrbio de consciência. A essência da imputabilidade é formada, nestes 
termos, tanto por uma espécie normal de percepção quanto por uma 
motivação normal para o agir’ [...] portanto, o imputável é em seu 
comportamento tão determinado quanto o inimputável [...] a diferença entre 
eles consiste apenas no tipo e na forma de determinação incidente sobre o 
primeiro, que é tida comonormal, ao passo que a determinação que age 
sobre o último afasta-se sensivelmente do campo da normalidade. 
(GUNTHER, 2019, p.1062). 
 
“O imputável pertence à parcela dos homens capaz de ser determinada causalmente 
por valores, normas e ameaças de pena” (GUNTHER, 2019, p.1062). 
 
“O imputável pertence à parcela dos homens capaz de ser determinada causalmente 
por valores, normas e ameaças de pena seriam apenas um fruto do acaso.” 
(GUNTHER, 2019, p.1062-1063). 
 
No rumo [...] oposto ao tomado por Von Liszt, seguindo em direção a um 
indeterminismo, encontramos uma decisão do SuperiorTribunal de Justiça 
(Bundesgerichtshof– ‘BGH’) de 1952, versando sobre um caso de erro de 
proibição. Nela, sustenta-se que o fundamento para o juízo de culpabilidade 
estaria ‘na autodeterminação livre, responsável e moral de que dispõe o ser 
humano e que o torna capaz de se decidir a favor da legalidade e contra a 
ilegalidade’. (GUNTHER, 2019, p.1063). 
Esta tentativa do Superior Tribunal de definir positivamente o conceito 
jurídico-penal de culpabilidade, contudo, acabou não indo muito longe. Os 
juízes continuaram sem verificar se, em cada caso concreto, todos os 
elementos do conceito de culpabilidade postos na definição do Tribunal 
estavam ou não presentes no acusado. (GUNTHER, 2019, p.1063). 
 
“[...] com essa definição positiva também não é possível pôr fim à controvérsia 
científica em torno do conceito de culpabilidade e de sua relação com o livre-arbítrio.” 
(GUNTHER, 2019, p.1063). 
 
Diante desta contradição, muitos autores acabam adotando um 
posicionamento agnóstico [...] Roxin – que declaradamente se reconhece 
como agnóstico – sustenta que ‘a culpabilidade deve ser entendida como 
agir ilícito apesar da idoneidade do autor para ser destinatário de normas’ 
[...] não se quer dizer mais do que a capacidade psíquica de uma pessoa 
para se controlar, isto é, para reagir psiquicamente a normas de modo a 
incluí-las em seu mecanismo de ação [...] ‘um posicionamento normativo cujo 
valor social independe da problemática do livre-arbítrio, tanto a apresentada 
pela teoria do conhecimento como a posta pelas ciências naturais’ [...] 
(GUNTHER, 2019, p.1064). 
 
Esta linha argumentativa, contudo, permanece exposta a uma relevante 
objeção: para um determinista consequente, continua em aberto saber qual 
é a vantagem de se perceber o caráter normativo dessa decisão sobre a 
normalidade, no momento em que o livre-arbí-trio passa a ser visto pela 
neurociência como uma completa ilusão. (GUNTHER, 2019, p.1065). 
Como culpável, então, é tido todo delinquente cuja punição for necessária 
para se alcançar determinado fim socialmente desejado [...] Todo o sentido 
da responsabilização jurí-dico-penal ou da atribuição de culpa esgota-se 
neste contexto. [...] O reconhecimento de tal ‘erro de proibição’ como uma 
causa excludente de culpabilidade deriva, portanto, não de uma descoberta 
da neurociência, mas sim de uma consideração normativa, segundo a qual 
uma infra-ção assim cometida é inofensiva para o funcionamento de uma 
sociedade moderna [...] (GUNTHER, 2019, p.1065). 
 
“Com desvinculação da culpabilidade em relação à liberdade, atingimos um estado 
no qual aquela é sustentada apenas por seu ‘valor’ ou por sua função social.” 
(GUNTHER, 2019, p.1066). 
 
[...] Eduard Kohlrausch caracterizou essa forma de presunção generalizada 
de capacidade média para cada delinquente individual em uma famosa 
expressão, segundo a qual, ‘com isso, a capacidade individual torna-se uma 
ficção necessária ao Estado’. O fundamento dessa ficção residiria não mais 
na liberdade da pessoa, mas sim nos fins e nas exigências funcionais do 
Estado e da sociedade a serem alcançados e satisfeitos pela imputação de 
responsabilidade. [...] Kohlrausch, no entanto, deixou bem claro o que isso 
significa para o indivíduo delinquente: “[...] o autor torna-se vítima da 
coletividade, ele passa a ter de sofrer no interesse dela”. (GUNTHER, 2019, 
p.1066). 
 
[...] também nesta concepção a irresolúvel questão da liberdade parece 
ressurgir como visitante não convidada. E isso em pelo menos dois sentidos. 
Em primeiro lugar, a sociedade não pode a seu bel-prazer ‘tornar vítimas’ os 
seus delinquentes. [...] uma pena funcional deve ser capaz de manter uma 
relação de adequação com o fato e com o grau de culpabilidade do indivíduo. 
(GUNTHER, 2019, p.1066). 
 
 
“[...] a dependência do conceito de culpabilidade em relação a seu valor social deixa 
claro que a determinação do ‘se’ e do ‘como’ da culpa penal constitui uma decisão 
que requer fundamentação social [...] uma decisão que para o legislador é política.” 
(GUNTHER, 2019, p.1067). 
“Em 1898, von Liszt ainda podia afirmar: ‘[...] nós, a classe dominante, determinamos 
hoje quem deve ser apenado e quem não deve. Nós tomamos os deficientes mentais 
como penalmente inimputáveis’.” (GUNTHER, 2019, p.1067). 
 
“[...] percebe-se que no conceito de culpabilidade está refletida a própria 
autocompreensão normativa da sociedade.” (GUNTHER, 2019, p.1067). 
 
Em suma: tanto a presunção de normalidade de compreensão e de 
autocontrole, praticada na atribuição de culpabilidade, quanto a definição 
sobre as condições que a excepcionam e em que medida isso deve 
acontecer, são questões que apenas podem resultar de um processo de 
crítica e de legitimação públicas. (GUNTHER, 2019, p.1068). 
[...]um conceito de culpabilidade invariavelmente orientado pela ideia de 
liberdade não se deixa afastar nem por posições deterministas, nem 
por posições agnósticas. [...] restam para o direito penal e para a ciência 
jurídico--penal, fundamentalmente, três formas de lidar com os argumentos 
e as conclusões fortemente deterministas da neurociência. (GUNTHER, 
2019, p.1068). 
 
(1) O primeiro dos caminhos consiste em deixar tudo como está, 
procedendo-se apenas a uma revisão – com base nos atuais conhecimentos 
da neurociência e das demais ciências naturais – dos critérios constantes do 
§ 20 do Código Penal Alemão [...] Seguindo por este caminho, o direito penal 
não se desconecta da prática cotidiana de atribuição de liberdade e de 
responsabilidade, tal como inicialmente mencionada quando tratamos do 
modelo de “regra e exceção” presente em nossa sociedade. [...] Tomado 
nestes termos, o direito penal apenas elabora e formaliza os critérios de 
imputação e os procedimentos através dos quais se decide 
sobre a culpa do delinquente. Conta a favor deste caminho o fato de que ele 
coincide tanto com nossa autocompreensão socialmente praticada como 
com as estruturas, as instituições e os princípios básicos que constituem uma 
sociedade organizada [...] (GUNTHER, 2019, p.1068). 
 
(2) O segundo caminho consiste em se engajar nas controvérsias travadas 
entre a neurociência e a filosofia em torno do indeterminismo e do 
determinismo, com o objetivo de, eventualmente, revisarmos o conceito de 
culpabilidade. Neste plano, os conceitos dogmá-tico-penais de problemática 
interpretação no âmbito da presunção de normalidade mostram-se como 
reflexo de debates filosóficos envolvendo o livre-arbítrio. (GUNTHER, 2019, 
p.1069). 
 
[...] o caminho mais promissor parece ser seguido por aqueles que não 
negam que nós vivemos em um mundo determinado e causalmente cerrado, 
mas que descrevem o tipo e os termos dessa determinação do ser humano 
por sua própria mente, de forma mais ambiciosa e complexa do que o fazem 
os neurocientistas. (GUNTHER, 2019, p.1070). 
 
Fundamentalmente, trata-se aqui da tese segundo a qual o agir livre é 
determinado por razões que, é verdade, surgem no âmbito de uma cadeia 
de causa e efeito, mas que, por outro lado, não se resumem completamente 
a esta, nem constituem seu mero epifenômeno – estando, portanto, para as 
relações causais assim como a fumaça está para o fogo. (GUNTHER, 2019, 
p.1070). 
 
Outras propostas chamam ainda a atenção para os diferentes contextos em 
que fazemos uso, por um lado, de explicações naturalísticas com base em 
leiscausais e, por outro, de atribuição de responsabilidade a pessoas 
atuantes; esses jogos de linguagem poderiam conviver sem conflitos 
apenas porque cada um deles desempenharia uma função distinta. 
(GUNTHER, 2019, p.1070-1071). 
 
[...] possivelmente, os cérebros precisem ser programados culturalmente 
para responder a razões; contudo, não devemos esquecer que as pessoas 
se movimentam no plano das razões de modo diverso aos cérebros em suas 
relações de causa e efeito. (GUNTHER, 2019, p.1071). 
 
As consequências dessa tese para o conceito jurídico-penal de 
culpabilidade são algo ainda indefinido; no entanto, provavelmente não 
derivaria daí nenhuma revisão fundamental. (GUNTHER, 2019, p.1071). 
 
(3) O terceiro e último caminho consiste em extrair das teses fortemente 
deterministas formuladas pela neurociência a consequência radical de abolir 
do direito penal o conceito de culpabilidade, substituí-lo por categorias 
neurocientíficas, e pôr fim também à pena, de modo que, em seu lugar, 
intervenham sobre os indivíduos perigosos medidas de proteção da 
sociedade. (GUNTHER, 2019, p.1071). 
 
As implicações decorrentes de se seguir por este terceiro caminho são [...] 
temidas por grande parte dos neurocientistas. [...] Partilhar de um juízo 
de culpabilidade centrado na ideia de livre-arbítrio seria, neste sentido, tão 
equivocado quanto acreditar que determinadas pessoas são dotadas de 
poderes malignos ou tomadas por maldições capazes de espalhar o mal no 
mundo. (GUNTHER, 2019, p.1071-1072). 
 
Não é por acaso que a neurociência da atualidade vem acompanhada de 
uma polí-tica criminal que busca as causas e os motivos da criminalidade 
exclusivamente no delinquente, voltando-se contra qualquer explicação 
sociológica ou psicológica desse fenômeno. (GUNTHER, 2019, p.1072). 
 
 
“[...] o humanismo esclarecido dos neurocientistas vai, contudo, mais além: o que se 
questiona é a própria possibilidade de formular uma justificação.” (GUNTHER, 2019, 
p.1073). 
 
Neste momento separam-se os caminhos da neurociência e da ciência 
jurídico-penal crí-tica. Se o próprio paradigma de homem livre é renegado, 
então realmente ninguém mais pode ser penalizado. E se a pena não pode 
mais se fundar sobre um juízo de culpabilidade, então restaria como fim da 
sanção somente a proteção da coletividade. (GUNTHER, 2019, p.1073). 
 
Essas exigências de proteção da coletividade poderiam, ainda, variar 
fortemente, a depender das condições sociais e do clima político do 
momento. Dependendo de quão ameaçada a coletividade se sentisse diante 
de um infrator, a pena poderia ser maior ou menor. (GUNTHER, 2019, 
p.1073). 
 
Apesar dos mencionados esforços de revisão do atual paradigma de homem livre, 
provavelmente os recentes desafios postos por uma neurociência marcada pelo 
determinismo não alterarão substantivamente nem o direito penal nem a práxis do 
sistema de justiça criminal. (GUNTHER, 2019, p.1074). 
 
O combate legislativo à criminalidade organizada e à criminalidade 
econômica, bem como a luta contra graves delitos sexuais e contra o 
terrorismo internacional, acabou deslocando o equilíbrio existente entre 
liberdade e segurança, típico de um Estado de direito, dando clara 
preponderância a este último lado da balança (GUNTHER, 2019, p.1074). 
Esse direito penal pós-preventivo retira os delinquentes 
da práxis cotidiana de presunção de capacidades de compreensão e 
autocontrole, capaz de ser refutada em casos excepcionais. A determinação 
diferencial entre o comportamento normal e o anormal torna-se obsoleta, 
pois o combate a perigos intervém muito antes de que ela possa ser feita. 
(GUNTHER, 2019, p.1075). 
Quando os seres humanos são tomados somente como potenciais 
fontes de perigo sujeitas à vigilância estatal, interessam apenas aquelas 
circunstâncias determinadoras de comportamento, das quais podemos 
extrair algum prognóstico acerca de potenciais danos. É esta a lógica da 
prisão preventiva. (GUNTHER, 2019, p.1076). 
O indivíduo perigoso é tomado, assim, como mero complexo de conexões 
perigosas, no qual o Estado intervém por meio de contrafatores causais, 
quando não por meio do simples encarceramento em nome da proteção da 
coletividade contra futuros atos criminosos. (GUNTHER, 2019, p.1076). 
 
“Jakobs chamou essa despersonalização dos delinquentes (potenciais) de “direito 
penal do inimigo” [...] Jakobs chamou essa despersonalização dos delinquentes 
(potenciais) de “direito penal do inimigo”.” (GUNTHER, 2019, p.1076). 
 
Estes são, em resumo, os componentes fáticos e normativos da presunção 
de normalidade, já acima mencionados, e que estão na base do conceito 
jurídico-penal de culpabilidade. Ao inimigo são negados tais componentes, 
posto que ele não é reconhecido como pessoa livre (GUNTHER, 2019, 
p.1076-1077). 
 
Ao final deste percurso, pode parecer surpresa o fato de que os 
neurocientistas, com suas exigências político-criminais de abolição do 
conceito de culpabilidade, acabaram dando suporte para a transformação de 
um direito penal do cidadão em um direito penal do inimigo.47 Cada qual a 
partir de uma perspectiva diferente, tanto a revisão neurocientífica do 
paradigma de homem livre quanto a moderna política criminal de segurança 
acabaram chegando ao mesmo resultado: o delinquente não deveria mais 
ser tomado como uma pessoa dotada de liberdade e de capacidade de 
compreensão e autocontrole, mas sim deveria ser visto como um feixe de 
causas e efeitos sobre o qual o próprio Estado deveria intervir causalmente, 
em vista de alcançar determinados fins. Diante do exposto, constitui uma 
trágica ironia, pouco explorada pela neurociência, o fato de que seus 
representantes aceitem de forma tão submissa este resultado e o defendam 
em nome de uma forma mais humana de lidar com aqueles que cometeram 
uma infração penal. (GUNTHER, 2019, p.1077).

Continue navegando