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ESCOLA SUPERIOR BATISTA DO AMAZONAS CURSO DE PSICOLOGIA MULHERES QUE CONVIVEM COM O HIV/AIDS: UM OLHAR PARA A DISCRIMINAÇÃO MANAUS 2018 SIMARA DA COSTA CORRÊA MULHERES QUE CONVIVEM COM O HIV/AIDS: UM OLHAR PARA A DISCRIMINAÇÃO Projeto do Curso de Psicologia da Escola Superior Batista do Amazonas, elaborado pela aluna: Simara da Costa Corrêa como requisito para obtenção da nota do Bimestre, sob a orientação do Prof. Me. Herbert Santana Garcia Oliveira. MANAUS 2018 FICHA CATALOGRÁFICA FOLHA DE APROVAÇÃO Foi apresentado o Trabalho de Conclusão de Curso como requisito para aquisição do grau de bacharel em Psicologia. O trabalho tem como título: MULHERES QUE CONVIVEM COM O HIV/AIDS: UM OLHAR PARA A DISCRIMINAÇÃO elaborada pela discente Simara da Costa Corrêa. Aprovado em -----/-----/------ ___________________________________________ Prof. Me. Herbert Santana Garcia de Oliveira Orientador ____________________________________________ Profª. Claudia de Brito Bidinoto 1º Membro ____________________________________________ Profª. Neise Bezerra do Nascimento 2° Membro A persistência é o caminho do êxito. -Charles Chaplin. https://www.pensador.com/autor/charles_chaplin/ AGRADECIMENTOS Quero agradecer a Deus por ter me ajudado a superar as dificuldades e a tornar possível a realização de um sonho muito importante para mim. Aos professores reconheço e agradeço profundamente a confiança e a orientação. Sem eles não teria conseguido. À minha família e amigos tenho um agradecimento muito especial porque acreditaram em mim desde o primeiro instante. Sou quem sou porque vocês, estiveram e estão sempre ao meu lado. Por fim, mas não menos importante, deixo uma palavra de gratidão a todas as pessoas que de alguma forma tocaram meu coração e transmitiram força e confiança em mim. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................ 10 JUSTIFICATIVA ............................................................................................. 12 Questões norteadoras: ................................................................................ 12 Objetivos: ...................................................................................................... 13 Geral: ........................................................................................................... 13 Específico: ................................................................................................... 13 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................. 14 MÉTODO ........................................................................................................ 36 Tipo da Pesquisa ......................................................................................... 36 Coleta de Dados .......................................................................................... 37 Critérios de Inclusão .................................................................................... 38 Análise de Dados ......................................................................................... 38 DISCUSSÃO................................................................................................... 41 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 48 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 52 APÊNDICE I ................................................................................................... 59 APÊNDICE II .................................................................................................. 59 RESUMO A pesquisa teve como tema mulheres que convivem com o HIV/AIDS: um olhar para a discriminação. O objetivo geral foi compreender o impacto psicossocial e seus fenômenos em mulheres nas produções acadêmicas que convivem com o HIV/AIDS no que diz respeito ao preconceito, discriminação e estigma. Os objetivos específicos foram: identificar nas produções acadêmicas os tipos de preconceitos, discriminação e estigmas que as mulheres que vivem com HIV/AIDS vivenciam; investigar aspectos psicossociais da vida de mulheres infectadas pelo HIV/AIDS e analisar a condição de mulher no combate ao preconceito, discriminação e estigma em relação ao HIV/AIDS. O referencial teórico foi composto por alguns tópicos que abordam a relação de preconceito e discriminação na questão do estigma; a feminização do HIV/AIDS no contexto da discriminação do uso do preservativo; a compreensão de mulheres estigmatizadas diante do diagnóstico positivo; representações sociais e aspectos psicossociais do HIV/AIDS; como essa mulher é vista no ambiente de trabalho e a questão de como essa mulher é inserida na sua relação familiar, trazendo ideias de Aroldo (2009), Garcia (2008), Paiva (1992), entre outros. O método de coleta de dados foi realizado através da análise de conteúdo trilhando a proposta de Bardin (1977) e Lakatos (2003), teve como tipo de pesquisa qualitativa em vista da pesquisa bibliográfica. O tratamento de dados foi realizado através de alguns fichamentos com dados extraídos de livros, artigos e sites utilizados nesta pesquisa. A partir de diversos dados do referencial teórico foram organizadas algumas categorias divididas em: 1) A vivência de mulheres com o HIV/AIDS: reflexões 2) A questão biopsicossocial do Ser mulher com HIV/AIDS e 3) O preconceito, a discriminação e o estigma junto a concepção de resiliência da mulher e o HIV/AIDS, desse modo a pesquisa serve como reflexo e discussão para que se olhe a mulher soropositiva de um modo pouco visto, um olhar mais humano, mais percebido tendo em vista o impacto que ocorre consigo (mulher) e com o meio social em que vive. Palavras-chave: HIV/AIDS. Condição de Mulher, Preconceito, Discriminação e Estigma. ABSTRACT The research focused on women living with HIV / AIDS: a look at discrimination. The general objective was to understand the psychosocial impact and its phenomena in women in academic productions that coexist with HIV / AIDS regarding prejudice, discrimination and stigma. The specific objectives were: to identify in academic productions the types of prejudices, discrimination and stigmas that women living with HIV / AIDS experience; to investigate the psychosocial aspects of the life of HIV / AIDS-infected women and to analyze the status of women in combating prejudice, discrimination and stigma in relation to HIV / AIDS. The theoretical framework was composed of some topics that address the relationship of prejudice and discrimination in the issue of stigma; the feminization of HIV / AIDS in the context of discrimination in condom use; the understanding of stigmatized women in the face of positive diagnosis; social representations and psychosocial aspects of HIV / AIDS; as this woman is seen in the work environment and the question of how this woman is inserted in her family relation, bringing ideas of Aroldo (2009), Garcia (2008), Paiva (1992), among others. The method of data collection was carried out through the analysis of content, following the proposal of Bardin (1977) and Lakatos (2003), had as qualitative research type in view of the bibliographic research. Data processing was done through some fileswith data extracted from books, articles and websites used in this research. Based on several data from the theoretical framework, some categories were divided into: 1) The experience of women with HIV/AIDS: reflections 2) The biopsychosocial question of being a woman with HIV/AIDS; 3) Prejudice, discrimination and stigma along with the conception of women's resilience and HIV / AIDS, so the research serves as a reflection and discussion to look at the HIV-positive woman in an unseen way, a more human, more perceived view in view of the impact that occurs with you (woman) and with the social environment in which you live. Keywords: HIV/AIDS. Condition of Woman, Prejudice, Discrimination and Stigma. 10 TEMA: Mulheres, HIV/AIDS e a discriminação. Delimitação do Tema: Mulher convivendo com HIV/AIDS e a questão da discriminação. INTRODUÇÃO A AIDS é um grande problema de saúde pública no Brasil. Segundo dados estatísticos atuais, por mais que ainda haja mais casos notificados em homens, a velocidade de crescimento da epidemia é maior entre mulheres, apesar disso, vem ganhando menos proporção com o tempo (SANTOS et al, 2002). É um aumento desse caso entre mulheres que pode ter em questão a razão de sexos (como o número de casos no sexo masculino dividido pelos casos no sexo feminino). Fazendo um comparativo dos anos 1989 com 2011, naquela época existia cerca de 6 casos da doença em homens para cada 1 caso em mulheres, e já recentemente o número é visado em 1,7 caso no sexo masculino para cada 1 em mulheres. Dados que revelam que nas mulheres houve 86,8% de casos registrados no ano de 2012 foram ocorridos em relações heterossexuais por meio de pessoas infectadas pelo HIV. E já entre os homens 43,5% foram casos por relações heterossexuais, 24,5% por meio de relações homossexuais e 7,7% por bissexuais e os demais foram por transmissões sanguíneas e verticais. A proporção de infecção entre homens e mulheres vem diminuindo ao longo da história da doença no país, e permanece estável, sendo que mais da metade dos infectados pelo vírus da AIDS no mundo já é constituída por mulheres e garotas (Franco & Figueiredo, 2004). Ainda assim, as mulheres soropositivas para o vírus da imunodeficiência humana (HIV) parecem ter menor visibilidade social por parte das organizações não-governamentais de AIDS. Mesmo nos serviços públicos de saúde, o diagnóstico e o acesso ao tratamento acontecem em estágios mais tardios da doença quando comparados aos homens que chegam aos serviços (Santos et al, 2002). Em 1988, foi criada pela Constituição brasileira uma Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da AIDS, que visa garantir os direitos do indivíduo, entre eles, o de dignidade humana e livre 11 acesso à saúde pública que lhes cabe. Houve um aumento por parte das pessoas do sexo feminino em relação ao crescimento da infecção pelo HIV/AIDS, em que se mostra essencial a urgência no que diz respeito à qualidade do atendimento assistencial na questão psicossocial a mulheres que vivem com o HIV/AIDS. A observância no que tange esta pesquisa é o enfoque no que diz respeito ao preconceito e discriminação social e familiar vivenciada por mulheres na cidade de Manaus, vislumbrando o contexto psicológico, muito além dos aspectos patológicos da doença, e formas conscientizadoras e prevencionistas exploradas de forma intensa por organizações humanitárias e governamentais. Em contexto histórico e questões relacionadas à sexualidade, as mulheres sofreram alguns processos de discriminação e que ao longo dos séculos e anos foram superando essa tangente por meio de suas conquistas: trabalhistas, sociais, eleitorais e sexuais. Nessa dimensão da sexualidade e da saúde produtiva, as questões da mulher, por suas escolhas, eram muito limitadas: não podiam escolher seu companheiro, não podiam decidir sobre quantos filhos queriam ter, nem quando queriam ter, eram mal vistas se passassem por divórcios, e até nos tempos atuais sofrem discriminações caso se mostrem ativas sexualmente de diversos modos. Nesse ponto da mulher ativa sexualmente, entra a questão do HIV/AIDS, pois o pensamento pautado socialmente é o de que toda mulher que convive com essa situação foi colocada nela por motivos de que ou é/era promíscua, pecadora ou não teve pudor suficiente, ou seja, uma vida indigna. É importante discutir a relação entre mulher, HIV/AIDS, preconceito, discriminação e estigma, pois, a congestão social da desigualdade guia a ações ou exclusões que vão danificar ou negligenciar o acesso de procedimentos das pessoas a determinados serviços, caracterizando-se assim o estigma de modo efetivado no que diz respeito ao campo do direito, o não tratamento igualitária e justiça diante da pessoa passa a ser a discriminação, definida como “tratamento injusto” sobre determinado grupo específico (Maluwa, Aggleton, & Parker, 2002). Assim, toda discriminação ligada ao HIV/AIDS passa a ser a manifestação simbólica do estigma em fatores como: palavras, gestos etc. 12 JUSTIFICATIVA Foi ao longo de um trabalho em um hospital que atendia demanda de média e alta complexidade no hospital que comecei a pensar em como essas pessoas já portadoras são acompanhadas por psicólogos e que através de algumas pesquisas descobri que esse acompanhamento não é feito de forma adequada e foi aí que partiu a ideia do tema onde a temática abordada é resultado de uma inquietude a essa epidemia que se propaga gradativamente entre mulheres, onde o foco central é o controle dos sintomas físicos através de drogas/terapia antirretrovirais. Observa-se um temor exclusivo para o quadro de prevenção, com poucas ações de trabalho psicológico intervencionista, direcionados para mulheres com sofrimento psíquico em consequência do preconceito e da discriminação por serem portadoras do vírus HIV/AIDS. Em carácter social esta pesquisa preconiza cada vez mais o grau de importância do psicólogo nesse contexto, que vai muito além do cuidado dos sintomas fisiológicos. Analisar conflitos como medo, isolamento e negação, sentimentos vivenciados por essas mulheres no seu cotidiano, é abordar formas de enfrentamento eficazes para uma reconstrução de identidade e dignidade da pessoa que estão fragmentadas. Este trabalho implica também em mostrar que a Psicologia Social é importante para a compreensão das ações que se desvelam no comportamento humano. Servirá de contribuição da Psicologia dentro do campo da saúde, compreendido pelo profissional através de práticas que objetivam reduzir os danos na saúde física e mental, vislumbrando esse ser como um todo, e não meramente um vírus. No âmbito acadêmico é esperado que esta pesquisa, potencialize a importância do tratamento psíquico com métodos e técnicas adequadas no intuito de restabelecer a autoestima e, por conseguinte a inclusão social. O Problema da pesquisa: Como as Mulheres portadoras do vírus HIV/AIDS vivenciam o processo de enfrentamento do preconceito, da discriminação e do estigma? Questões norteadoras: - Como a resiliência pode ser desenvolvida nessas mulheres soropositivas? 13 - De que modo pode-se dar mais assistência em relação a prevenção, promoção e assistência as mulheres com HIV/AIDS gestantes ou com desejo de planejamento familiar? - De que forma o Ser mulher afeta o contexto social dessa mulher com HIV/AIDS? Objetivos: Geral: Compreender o impacto psicossocial e seus fenômenos em mulheres nas produções acadêmicas que convivem com o HIV/AIDS no que diz respeito ao preconceito, discriminação e estigma. Específico: Identificar nas produções acadêmicas os tipos de preconceitos, discriminação e estigmas que as mulheres que vivem com HIV/AIDS vivenciam. Investigar aspectos psicossociais da vida de mulheres infectadas pelo HIV/AIDS. Analisar a condição de mulher no combate ao preconceito, discriminação e estigma em relação ao HIV/AIDS. 14 REFERENCIAL TEÓRICO Nessa parte, serão relatados alguns tópicos referentes ao trabalho de pesquisa que aborda a relação de preconceito e discriminação na questão do estigma; a feminização do HIV/AIDS no contexto da discriminação do uso do preservativo; a compreensão de mulheres estigmatizadas diante do diagnóstico positivo; fatores que influenciam positivamente no enfrentamento da infecção; saúde sexual, reprodutiva e planejamento familiar; representações sociais e aspectos biopsicossociais do HIV/AIDS; como essa mulher é vista no ambiente de trabalho e a questão de como essa mulher é inserida na sua relação familiar. A relação de preconceito e discriminação na questão do estigma Segundo Aurélio (2009), o termo preconceito é definido como conceito ou opiniões criadas de modo antecipado, onde não é concebido ponderação, conhecimento dos fatos ocorridos ou pensamento preconcebido. Para coibir tal julgamento a Constituição Federal de 1988 consagrou em seu texto o princípio da isonomia, ao afirmar no caput de seu art. 5º que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”. Essa lei se estende ao portador do HIV/AIDS, em defesa de sua integridade. Toda pessoa com HIV e AIDS tem direito a continuação de sua vida civil, profissional, sexual e afetiva. Nenhuma ação poderá restringir seus direitos completos à cidadania (Artigo XI da Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do vírus HIV da AIDS, 1989). Por discriminação, a Lei 12.984, de 2 junho de 2014 define como crime a conduta de discriminar o portador do vírus HIV e o doente de AIDS em razão de sua condição de portador ou de doente, com pena de reclusão de um a quatro anos e multa. Se tratando da lei que guia os direitos grupais que estão em questões vulneráveis ao preconceito e à discriminação, o país tem uma legislação específica onde se preservam os direitos humanos dos portadores do HIV/AIDS, trazendo planos com ações e objetivos, como por exemplo, um plano de políticas públicas para procurar combater a epidemia. Contudo, 15 pesquisas mostram indícios de pouca concretividade se tratando da exalação para a exclusão social. No contexto apresentado pelo diretor-presidente da ABIA – Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS. Parker (2010, p.24), ele fez um comparativo em 2010, recordando que já haviam se passado aproximadamente dez anos desde o discurso de Jonathan Mann desde 1989, sinalizando o que para ele era o maior entrave à prevenção e ao controle da doença, o que denominou de rejeição social, que infelizmente apesar da crescente atenção, mais uma década se passará com pouco progresso. De 1989 do discurso do Dr. Jonathan Mann fundador do Programa Global de AIDS, na Assembleia Geral das Nações Unidas, da Organização Mundial de Saúde (OMS) para a realidade atual do portador do vírus, quebrar a barreira do preconceito social ainda é algo a ser conquistado, talvez este seja o sintoma mais avassalador da doença. Segundo Jonathan Mann, a epidemia é composta por três fases: A primeira é a epidemia da infecção pelo HIV que silenciosamente penetra na comunidade e passa muitas vezes despercebida. A segunda epidemia, que ocorre alguns anos depois da primeira, é a epidemia da própria AIDS: a síndrome de doenças infecciosas que se instalam em decorrência da imunodeficiência provocada pela infecção pelo HIV. Finalmente, a terceira (talvez, potencialmente, a mais explosiva) epidemia de reações sociais, culturais, econômicas e políticas à AIDS, reações que, nas palavras do Dr. Mann, são “tão fundamentais para o desafio global da AIDS quanto à própria doença" (Herbert; Parker, 1991, p.13). Os estudos revelam que mesmo diante do avanço da medicina e toda informação das formas de transmissão da doença, ainda assim, não se consegue erradicar o estigma que induz ao preconceito e, por conseguinte a discriminação que norteia grande parte da população soropositiva (Mann, 1989). O conceito de estigma é definido como uma marca ou mácula em alguém ou em um grupo de pessoas, que são encarados de forma negativa devido a características inerentes à sua pessoa, e por isso, são 16 frequentemente discriminadas. Como consequência desse fato, é comum que lhes sejam negados direitos básicos de todo cidadão, como direito ao trabalho, à educação, moradia e acesso aos serviços de saúde. Além disso, indivíduos que possuem uma relação social de proximidade com os pacientes soropositivos também estão sujeitos à estigmatização, sendo família, amigos e cuidadores destes alvos frequentes de preconceito (ABIA, 2013). Pessoas que pertencem a grupos associados com os fatores de risco de contaminação com o vírus, como migrantes pobres, profissionais do sexo e homens que têm o hábito de praticar sexo com outros homens, podem enfrentar o estigma e a discriminação apenas por estarem inclusos nesses grupos. Além de existir a discriminação externa, que ocorre por reações preconceituosas da sociedade em relação ao indivíduo soropositivo, há também a possibilidade de as vítimas desse estigma internalizarem essa visão, acreditando desse modo que merecem ser discriminadas e maltratadas, ou que esses percalços são situações normais com as quais é preciso se habituar, trazendo assim, consequências graves à sua saúde mental (ABIA, 2013). Após ter sido diagnosticado, sofri vários tipos de estigma e discriminação e achei que não poderia viver daquela maneira nem deixar que as pessoas falassem mal de mim... Por isso decidi levantar a voz e dizer, desculpe-me, mas eu não sou assim e esta não é a vida que eu quero para mim‟ Musa Njota (citado em Daily News, África do Sul, 14 de julho de 2000). Existem várias maneiras que podem ser exploradas com o objetivo de diminuir o estigma social que cerca os portadores de HIV: Desenvolver os aspectos positivos em relação ao HIV, levando em conta o fato de que muitos indivíduos soropositivos relatam mudança de vida para melhor com o tratamento adequado, e mudanças de prioridades na vida, apesar das dificuldades financeiras, nas relações amorosas e na saúde; aumentando o acesso à informação sobre a doença na atenção primária, trazendo a conscientização de que o HIV afeta a todos os grupos - homens, mulheres e crianças - e enfatizando que com o apoio e tratamento adequados, as pessoas com HIV podem viver vidas positivas; reconhecendo a diversidade dos comportamentos sexuais e estimulando o respeito à opção e orientação sexual de cada pessoa, porquanto embora a maioria das sociedades considere o 17 comportamento sexual 'normal' como o sexo entre homem e mulher dentro do casamento, na realidade as pessoas praticam uma ampla gama de comportamentos sexuais, e isso deve ser respeitado por Lei, de acordo com a Constituição Brasileira. Os programas de prevenção visam reduzir a discriminação promovendo o acesso da população a informações sobre abordagens adequadas de sexo seguro entre diferentes grupos. Eles acabam se mostrando de extrema importância no sentido de empoderar os pacientes soropositivos e encorajar os grupos de apoio a pessoas infectadas, que os ajudam a desafiar o estigma e a discriminação crescentes. Também auxiliam diretamente na redução dos temores de membros da família e na orientação prática ao cuidado de pessoas com HIV, oferecendo aconselhamento com qualidade e resolução de dúvidas, e envolvendo ambos os parceiros sempre que possível em sessões antes e depois do teste. Se apenas um dos parceiros for testado, aconselhado e tratado, este pode ser considerado culpado de trazer o HIV para dentro do relacionamento (ABIA, 2013). Segundo Aroldo (2009), o preconceito carrega como base as crenças, onde há características pessoais que pode serdado a grupos ou determinada pessoa, chamado de estereótipos. Para os psicólogos sociais contemporâneos o estereótipo serve como base cognitiva do preconceito. Quando se trata de expressões verbais ruins ou condutas negativas diante de alguém, se vê a discriminação. O preconceito está ligado à agressividade que pode levar a discriminação que segundo Aroldo (2009) todos nós temos a nossa linha do preconceito, porém, cada um reage a ela de uma maneira diferente. Já Garcia (2008) relata que a maioria das consequências ruins da estigmatização de pessoas parte por conta da discriminação nos lugares públicos e instituições privadas que desse modo gera hostilidade, exclusão, dentre outras reações. De acordo com Garcia (2008) a estigmatização da AIDS se ligou aos primeiros casos da doença que aconteceram na década de 80, e assim a mídia alarmou a sociedade associando a doença a grupos populacionais específicos 18 como algo fatal e ruim. O estigma do HIV/AIDS continua de distintas formas de valor mundial quando se trata de campanhas públicas sobre o assunto. A feminização do HIV/AIDS no contexto da discriminação do uso do preservativo De acordo com o Departamento de IST, AIDS e Hepatites Virais, o HIV/AIDS, a princípio, surgiu com a prerrogativa de ter sua origem nas relações de grupo de risco como homossexuais, usuários de drogas que compartilhavam a mesma seringa e os hemofílicos. Na atualidade essa ideia foi desconstruída, se reformulando para comportamento de risco. O reflexo dessa reconstrução é o alto índice da epidemia entre heterossexuais, principalmente em mulheres, pois as relações são pautadas na resistência por parte do parceiro em usar o preservativo. De acordo com Paiva (1992), o preconceito se faz presente no uso de preservativo por parte das mulheres, pois, se faz uso é porque poderá estar tendo uma vida sexual aberta/ativa, podendo pensar até em infidelidade por parte dela ao seu parceiro. Mulheres que dependem financeiramente e emocionalmente dos parceiros são mais suscetíveis a aceitar essa condição de submissão no ato sexual, tornando-se alvo de uma possível contaminação. A crença social e historicamente construída é de que as mulheres consideradas promíscuas são as que aumentam os índices de infecção feminina pelo HIV/AIDS. Porém, segundo a vigilância epidemiológica, a infecção feminina é alta entre as mulheres casadas que têm relações sexuais exclusivamente com seus maridos. Isso acontece porque as que mais estão se infectando são justamente aquelas que se acreditam estar fora de qualquer risco, o que as torna mais vulneráveis (Carvalho & Piccinini, 2008). Já Franco & Figueiredo (2004) relatam que as mulheres chegam a reconhecer os fatores de vulnerabilidade em outras mulheres, mas não consideram a si próprias em risco para infecção, o que contribui para não prevenção e para demora no diagnóstico. Outro fator que contribui para que muitas vezes elas não se percebam sob risco é o papel arraigado à mulher de 19 “cuidadora” do lar, que faz com que sua prioridade seja a saúde dos outros membros da família. Em estudo sobre reprodução e sexualidade em mulheres HIV positivas, Santos (2002) descreve que a média de idade do primeiro intercurso sexual foi de 17,5 anos; 22% das mulheres foram vítimas de abuso pelo menos uma vez (abuso como realização de sexo sob coerção ou pelo uso de violência); 27% tiveram até dois parceiros durante a vida; 27%, até quatro parceiros; 24%, de cinco a dez parceiros; e 22% referiram mais de dez parceiros. A mediana do número de parceiros na vida foi quatro, e estes eram, quase sempre, parceiros fixos (Santos et al, 2002). Dados apresentados pela organização internacional Engener Health (2008) e a UNFAP - Fundo de População das Nações Unidas (2008), o índice de mulheres brasileiras adultas, adolescentes e jovens infectadas aumentou de forma significativa desde o seu surgimento. Por volta de 1980 e junho de 2007, houve notificações de 314.294 relacionado ao sexo masculino e 159.793 correlacionando para com o sexo feminino, onde o Brasil chegou a posição de país mais bem estruturado para controlar a epidemia, totalizando princípios do Sistema Único de Saúde (SUS): universalidade, equidade, integralidade, descentralização e participação social. Ligando com a criação de programas assistenciais e uniões com outras organizações não governamentais. Algumas suposições da Organização Mundial de Saúde trazem informações de que as mulheres são de duas a quatro vezes mais tendenciosas do que os homens sobre contrair a infecção de vírus da AIDS. Segundo pesquisas realizadas por órgãos específicos, isso seria ao fator vulnerabilidade biológica e socioeconômica. Grande parte de mulheres soropositivas fazem uso de preservativo no intuito de não engravidar e não necessariamente para proteção de uma possível reinfecção ou até mesmo de impedir a transmissão do HIV. Quando engravidam automaticamente interrompem o uso de preservativos, contudo, casais soropositivos também deverão fazer uso do mesmo para procurar evitar a reinfecção e até se proteger de um vírus de resistência mais forte que o seu (Kornfield, 2010). 20 Muitas mulheres não conseguem ter um diálogo apropriado com o seu parceiro em relação ao uso do preservativo. Ainda existem mitos tabus em cima da sexualidade, onde as relações amorosas não são construídas de respeito, igualdade, segurança afetiva e financeira, entre outros fatores pontos. O não uso do preservativo implica na ideia de negligência e subestimação dos riscos, onde a razão perde para a emoção. Pode-se dizer então que a emancipação feminina está longe de ser consolidada partindo do princípio de que é percebido nas oscilações dos graus de empoderamento que a implicam (Muhlen, Saldanha & Strey, 2014). Manaus conta com algumas unidades para assistência ambulatorial em IST/AIDS, e sua referência no país é a Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado FMT-HVD, prestando assistência a toda população do estado do Amazonas, por ações desenvolvidas através da Coordenação Estadual de IST e AIDS, com o atendimento ambulatorial médico e psicológico que atua em conjunto com as ONGs (Organizações não-governamentais) para dar sequência ao tratamento, como a Rede de Mulheres Positivas do Estado do Amazonas, que trabalha com ações sociais em prol das pessoas vivendo com HIV/AIDS, familiares e mulheres. O trabalho desenvolvido tanto por ações governamentais quanto em grupos sociais organizados, revelam que muito há de ser feito, em torno dos rótulos pejorativos e tratamento da doença, em especial o campo psicológico. Simonetti (2004) relata que diante da doença, o sujeito pode demonstrar suas subjetividades através de sentimentos, pensamentos, desejos e comportamentos, como também lembranças, crenças e o modo de adoecer, são conteúdos que surgem ao processo da doença. “De repente, eu fiquei gorda em cima e fina do quadril para baixo. Às vezes, ficava sem almoçar ou jantar para ver se perdia peso, mas nada disso resolve", desabafa a balconista Disney Diniz, 36 anos” (Extraído do - Departamento de IST, AIDS e Hepatites Virais). Na cidade de Manaus dados recentes do SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) sistema de notificação, revelam através dos 21 gráficos abaixo, gradativamente os índices de infecção do vírus HIV/AIDS, por mulheres. Para ilustrar melhor os dados vejamos a figura 1 e figura 2: Ainda no contexto apresentado pela organização Engener Health (2008), que define o Brasil como detentor da melhor resposta à epidemia em decorrência da elaboração e implementação dos programas governamentais; apesar das ações do governo e do esforço em promover a saúde, na sua totalidade há muitos desafios no que se refere ao atendimento dasnecessidades de mulheres adultas, adolescentes e jovens, enfatizando o impacto causado pelo diagnóstico da doença no cotidiano, seja pela revelação da sorologia diante da família, parceiros ou desconhecer as formas de controle clínico da doença. Fig. 01 – Gráfico de dados coletados pelo SINAM (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) casos de AIDS em Manaus ano 2009 a 2016. Fig. 02 – Gráfico de dados porcentagem 22 Os danos causados em mulheres infectadas pelo vírus HIV/AIDS comprometem não só o sistema imunológico como causa sofrimento psíquico. Reforçando a importância da presença do profissional psicólogo nessa área, através de ações práticas de investimentos com estruturas necessárias para o desempenho. O acolhimento na fase inicial do diagnóstico é essencial, dado este que reforça a importância da presença de equipe multidisciplinar para atender as demandas no intuito de reduzir o abandono do tratamento (Engener Health, (2008). Segundo Araújo (2005), “as formas de abordagem utilizadas na grande parte dos serviços de saúde não favorecem, estimulam ou contribuem para a efetiva participação dos clientes” (p. 149). Existe uma preocupação exacerbada por parte das campanhas governamentais de forma terrorista alertando a população que a morte é evidente, no entanto, informações direcionadas aos serviços de assistência pós-infecção é de certa forma negligenciada, o que chega a ser irônico. Mulher jovem (21 anos), vivendo com HIV e AIDS: Os jovens poderiam ter um espaço para se reunir [...]. Assim enquanto esperávamos para ser atendidos poderíamos falar sobre várias temáticas [...] poderia ter um acompanhamento de uns jovens mais informados sobre várias situações juntamente com o psicólogo [...]. Assim fica mais divertido falar sobre coisas que às vezes nos afligem. Nunca também superproteger e nem culpabilizar mais sim trocar experiências. (Extraído da Organização Engener Health, 2008). Portanto, existem diversas formas diferentes em relação as respostas individuais, fatores como: as expectativas por um suposto resultado positivo, o conhecimento que a pessoa tem sobre a infecção por HIV e AIDS, o pensamento prévio frente à doença e à morte lado a lado, seu estado de saúde, a personalidade daquele indivíduo e os apoios seguidos de pressões sociais junto aos familiares que ele possa ter, e segundo Bayés (1995) apud Remor (1999) ainda introduzindo a situação socioeconômica da pessoa. Compreensão de mulheres estigmatizadas diante do diagnóstico positivo 23 Para compreender o processo de enfrentamento negativo de mulheres diante do diagnóstico positivo, é preciso ressignificar seu contexto atual. Paula Treichler (1999) se refere ao HIV/AIDS como uma epidemia de uma doença sexualmente transmissível e como epidemia de significações, simultaneamente. Assim, o HIV/AIDS produz inúmeros significados baseados em crenças errôneas veiculadas as formas de contágio, construções sociais deturbadas, como homossexualismo, promiscuidade e marginalidade, são imagens simbólicas que se produzem na sociedade. Moscovici (1982) em sua teoria sobre representações sociais busca elucidar os eventos inerentes do homem e como estes influenciam e interagem entre si. São construções simbólicas que são emanadas do cotidiano no decorrer de suas relações no grupo. Parte-se do princípio de que o HIV/AIDS está associado a um conjunto de significados, que dão sentido a algo que desconhecem, na qual, identidades são construídas por meio da condição sorológica. Porém, para Goffman essa teoria preconiza que o estigma tem sua representação na sociedade por: signos ... especialmente efetivos para despertar a atenção sobre uma degradante discrepância de identidade que quebra o que poderia, de outra forma, ser um retrato global coerente, com uma redução consequente em nossa valorização do indivíduo (Goffman, 1980, p. 53). Segundo Jo Phelan, Bruce Linck e colegas apud PARKER (2010, p. 27) Existem três funções, para assim definir o preconceito e o estigma expressados como formas de reprimir e excluir as pessoas, que seria através da exploração e dominação, cumprimento de normas sociais e controle social e evitar a doença. Parker e Aggleton (2010, p. 27) postulam que o estigma e preconceito construídos por meio da exploração e dominação, podem não ser extintos sem que haja mudanças na hierarquia do poder, da mesma forma que baseados no cumprimento de normas podem ser difíceis de serem erradicados sem mudanças nas normas sociais. Em um estudo a respeito da estigmatização, Goffman (1963) fornece bases para a compreensão de atos de discriminação que acontecem na 24 sociedade. Ao definir estigma como um atributo que pode ter um caráter moral, relata que seu significado depreciativo dificulta o convívio social pleno da pessoa que o detém. De acordo com o autor, as pessoas consideradas normais desenvolvem ideias que desqualificam o portador de uma determinada condição, desse modo tornando-o alvo de um estigma, e isso consequentemente torna o sujeito mais desumano, sendo a ele atribuídos defeitos, a maioria de caráter moral, ampliando sua suposta imperfeição. O autor afirma que a normalidade de um em relação ao outro estabelece uma hierarquia, sendo a estigmatização um reflexo das relações sociais, já que a imperfeição de alguém ratifica a normalidade do outro, o que autoriza o indivíduo considerado normal discriminar o portador do defeito. Desse modo, a compreensão que a pessoa discriminada possui de si mesma é a de alguém vivendo à margem da sociedade, sem os mesmos direitos que os considerados socialmente normais, o que se reflete direta e negativamente na construção e manutenção de sua autoestima, e acarreta prejuízos ao seu desempenho social. Ao comentar sobre a importância da autoestima, Psico Croizet e Martinot (2003) afirmam que esta é uma necessidade fundamental para o bem-estar, manutenção de relacionamentos positivos e apoio social, discutindo como a estigmatização pode acarretar déficits na autoestima, ao desqualificar uma pessoa ou grupo. O desconhecimento generalizado sobre os sintomas da AIDS, sobre o vírus, sobre o tratamento, a prevenção e principalmente sobre as formas de transmissão pode acarretar preconceitos e atitudes desfavoráveis e ofensivas em relação àqueles que foram infectados pelo HIV. É comum que a pessoa soropositiva, devidamente diagnosticada, se veja sem apoio social, fragilizada pelo medo da discriminação e dos rótulos que cercam a vida de uma pessoa portadora do vírus, uma vez que o próprio diagnóstico se transforma, até para o paciente, na “mácula” que justifica sua exclusão. Desde o surgimento da AIDS - apesar de na época, o contexto social e de saúde ser completamente diferente do atual, no que se refere a métodos de tratamento da doença e aceitação social - sua representação possui caráter discriminatório e estigmatizante. Diante desse fato, pessoas soropositivas 25 frequentemente optam pela não-revelação de sua condição sorológica como uma forma de proteção, o que na realidade é um direito do portador. Algumas pessoas, independente do sexo, ao se defrontarem com o diagnóstico de uma doença que ainda não oferece cura através dos métodos da medicina tradicional, se desestruturam emocional e psicologicamente e ficam aniquiladas, perdendo qualquer esperança diante da expectativa de finitude prematura da sua existência. Particularmente no caso da mulher, a situação de HIV/AIDS desestrutura suas inserções mais imediatas, como na família, no trabalho, nos grupos de amigos, e paulatinamente estende-se a toda a sociedade. Tanto para conscientização da população e redução da discriminação, quanto para tratamento biopsicossocial adequado do portador da AIDS, deve-se concentrar atenção não apenas no HIV/AIDS, mas também no contexto mais amplo no quala AIDS está inserida e dar enfoque às respostas sociais mais abrangentes, que são responsáveis por uma mudança de comportamento em relação ao preconceito. Cabe-nos descobrir, apontar e abrir caminhos, além de construir estratégias para o enfrentamento do medo que incluam a mulher, promovendo-a no seu contexto, como mãe, profissional e cidadã (Garcia e Koyama, 2008). No caso das mulheres, a revelação do diagnóstico carrega uma imagem social negativa, pois infelizmente a doença ainda hoje está relacionada ao comportamento sexual promíscuo. Essa relação traz receio quanto ao julgamento moral que a cercará, e consequentemente um sofrimento emocional, que eventualmente pode causar deterioração crescente de seus relacionamentos, desvalorização social em vários âmbitos e a inibição de sua atividade sexual, acrescentando a possibilidade de instabilidade psicológica, além da física (Jimenes, Gotlieb, Hardy, & Zaneveld, 2001). Seguindo os princípios dos autores, quanto às formas de exclusão e repressão e as razões pelas quais são produzidas, denota-se que estão subjugadas pelas relações que envolvem crenças culturais e o poderio. Tais relações são estabelecidas entre os grupos que se formam na sociedade, influenciando no comportamento do indivíduo com relação ao HIV/AIDS. 26 Como essa mulher é vista no ambiente de trabalho Para preservar os direitos previdenciários e dignidade ao trabalho, o governo brasileiro sancionou a lei nº 12.984, de 2 de junho 2014 de acordo com Art. 1º que constitui crime punível com reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, condutas discriminatórias contra o portador do vírus HIV/AIDS. Ele tem o direito de manter preservado o sigilo quanto a sua sorologia no ambiente de trabalho, assim como não deve ser exposto à realização de exame de testagem em processos de exames ocupacionais como admissão, periódicos ou demissionais. A exigência desses exames por parte do empregador é ilegal e caracteriza discriminação, logo crime. No entanto, essa lei só se aplica a servidores públicos federais (Portaria Interministerial 869, de 11/08/92); Auxílio doença caso necessite de afastamento superior a quinze dias, ressaltando que em se tratando de trabalhador portador do HIV/AIDS ou com hepatopatia grave, é dispensado o cumprimento do prazo mínimo de contribuição de doze meses e que tenha a qualidade de segurado, se não se considerar apto para o retorno ao trabalho e for comprovado pela perícia médica do INSS pode ter o benefício prorrogado, ou em se tratando de invalidez definitiva poderá solicitar recurso para aposentadoria; Na questão de negar emprego ou trabalho; assim como exonerar ou demitir de seu cargo ou emprego ou ainda segregar no ambiente de trabalho ou escolar. Na lei brasileira não há determinação que obrigue o empregador a não demitir o portador do HIV/AIDS, uma vez que o direito ao trabalho de acordo com o artigo 6º caput se estende a todos os trabalhadores, exceto em casos de dispensa arbitrária e discriminatória, caso seja comprovado que o motivo da demissão foi aplicado em virtude da condição sorológica. A organização Internacional do Trabalho (OIT) em meados de 2010 em uma conferência, fortaleceu o quanto é importante a redução do trabalho informal caracterizando geração de mão-de-obra plausível e desenvolvimento sustentável. Partindo de que a desigualdade social e econômica trazem prejuízos significativos quando se trata da qualidade de vida dos portadores da 27 doença e ainda deixa claro a importância do empoderamento das mulheres no lugar da vulnerabilidade vivente, ligando a inferioridade nas suas relações sociais e profissionais, onde todos esses fatores influenciam de modo negativo para o aumento da doença. O artigo da OIT (Organização Internacional do Trabalho) discorre discriminação como: Qualquer outra distinção, exclusão ou preferência que tenha por efeito destruir ou alterar a igualdade de oportunidades ou tratamento em matéria de emprego ou profissão, que poderá ser especificada pelo Membro Interessado depois de consultadas as organizações representativas de empregadores e trabalhadores, quando estas existam, e outros organismos adequados (Convenção nº 111 da OIT). Com base nas pesquisas (Ferreira & Figueiredo, 2006; Ferreira, 2008) o ambiente de trabalho é apontado por pesquisas como sendo um dos motivos pelos quais o trabalhador se sente motivado para enfrentar a doença. Isso se deve ao fato da troca e interação que há entre determinado grupo social. Mas estes grupos de trabalhadores soropositivos ainda encontram dificuldade para a manutenção de seus empregos, pois se deparam com a discriminação, preconceitos dos colegas e chefes no ambiente de trabalho. Segundo Carvalho et al. (2007) as mulheres portadoras do vírus HIV/AIDS são as que mais sofrem preconceitos no local de trabalho, e são também as que mais possuem dificuldades de se manter no emprego. Pois, as reações às medicações são fortes e causam efeitos colaterais que são fatores determinantes para atrasos, faltas e que contribuem bastante para as demissões produzindo desemprego, dificuldades financeiras, isolamento social e falta de subsídios para a continuação do tratamento. Sendo, que a sorologia positiva para o vírus não acarreta prejuízo da capacidade laborativa a estas mulheres e que as mesmas são capazes de trabalhar e de conviver naturalmente dentro do ambiente de trabalho. O trabalho ocupa um lugar importante na sociedade, pois, além de propiciar condições materiais para a sobrevivência, proporciona um ambiente de relacionamento com outras pessoas, favorece o sentimento de vínculo e pertencimento e 28 de ter algo a fazer, e dá sentido à vida das pessoas (Morin, 2001). Com os avanços positivos no quadro clínico e com as melhorias nos tratamentos no uso da medicação, é possível possibilitar as mulheres com HIV/AIDS a dar continuidade a sua vida social. O trabalho, segundo Laurell e Noriega (1989), é o meio pelo qual a pessoa atribui sentido à própria vida, se esforçando para um ganho econômico e exercendo sua função e contribuição social, tendo assim, uma função útil e estruturante na vida das pessoas e na sua própria. Além disso, Almeida (2007) nos expõe aspectos de uma nova realidade social em que muitas mulheres trabalham para complementar a renda familiar, sendo, por vezes, a única provedora da família. Desta forma, a impossibilidade de fazê-lo gera mudanças significativas na vida familiar e socioeconômica da mulher, além de afetar as funções vinculadas aos papéis na sociedade. A impossibilidade do trabalho não advém da invalidez física adquirida pela doença, e sim pelos aspectos sociais discriminatórios e estigmas que cerceiam a AIDS. Cechim e Selli (2007) destacam que a entrada das mulheres no mercado de trabalho teve influência em um sentido maior de conquista de cidadania, além do sentimento de dignidade e de merecimento de pertencer à sociedade. O trabalho, seja formal ou informal, encontra-se associado à independência econômica que a mulher moderna, principalmente, visa adquirir para si, e ao sentimento de produtividade, contribuição e de possibilidade de sanar as necessidades da família. Além disso, Saldanha (2003), em seu estudo, refere que o fato da mulher se sentir ativa, produtiva, com capacidades para exercer atividades, tanto profissionais quanto atividades da vida diária, contribuem para o aumento e manutenção saudável da autoestima. Principalmente através de uma atividade remunerada, a mulher busca ser autônoma e responsável por sua vida, tendo um significado de poder de escolha e de decisão de extrema importância. A atividade laboral encontra-se intimamente relacionada à qualidade de vida e à saúde mental de qualquer indivíduo, sendo, portanto, de extrema importância se pensar sobre os sentidos produzidos no processo saúde-29 doença no contexto de trabalho destas mulheres (Cechim e Selli, 2007). Corroborando tal aspecto, Seidl (2005) concorda que o trabalho representa um aspecto significativo e tem papel fundamental na melhoria da qualidade de vida e no enfrentamento das dificuldades de pessoas que convivem com HIV/AIDS. No geral, as dificuldades trabalhistas que essas mulheres enfrentam têm influências da estigmatização e do preconceito que acompanham a doença, dificultando a manutenção do trabalho, bem como gerando um sentimento de exclusão e menos valia nestas mulheres. Muitas portadoras omitem o diagnóstico no ambiente de trabalho por medo da discriminação, bem como pelo temor de que sua condição sorológica possa prejudicar sua permanência (Ferreira & Figueiredo, 2006; Cechim & Selli, 2007), o que se tornaria mais uma perda em sua vida. O processo de adoecimento também acaba levando ao abandono do trabalho, tanto por limitações físicas quanto situações psíquicas geradas pela doença. Algumas mulheres preferem até abandonar seu trabalho por temerem a descoberta do diagnóstico, evitando assim possíveis situações de humilhação (Cechim & Selli, 2007). Analisando de uma maneira mais ampla e integrada, o ambiente de trabalho poderia ser um local em que estas mulheres poderiam se sentir acolhidas, aceitas e compreendidas em suas necessidades, já que, segundo Ferreira e Figueiredo (2006), as interações sociais com outros indivíduos tendem a aumentar o amor-próprio, a autovalorização e a autoconfiança de pessoas que vivem com HIV/AIDS, auxiliando, portanto, no convívio com a doença. Neste sentido, o trabalho para o portador de HIV tem muita importância como uma fonte de suporte social, no qual o indivíduo sente-se seguro, aceito e não julgado pelos colegas e, assim consegue viver socialmente saudável. A maior frequência da ocorrência do trabalho humanizado sem discriminações, serviria como um caminho para se pensar sobre a realidade de portadores de HIV além do ambiente de trabalho, possibilitando uma modificação gradual do estigma social da AIDS. Desta forma, é importante ressaltar que o trabalho pode ser interpretado de formas diferentes pelas mulheres portadoras de HIV: para umas pode ser uma realização de projeto pessoal, carregado de sentimentos positivos e 30 mantenedor da autoestima, funcionando como uma fonte de equilíbrio e apoio; enquanto para outras pode ser fonte de sofrimento, seja atual ou futuro, de difícil convivência, relacionado a questões de preconceito e discriminação ainda muito presentes na sociedade e nesse caso, no trabalho. A questão de como essa mulher é inserida na sua relação familiar O medo, a culpa, a angústia e o desespero são os sentimentos mais experienciados pelas mulheres com HIV/AIDS, e quando o positivo se torna evidente, surge à árdua e difícil tarefa, revelar ou não revelar para família, o processo de enfrentamento é complexo. Mediante toda informação científica em torno da forma de contágio, a sociedade ainda permanece arraigada ao mito da infecção (Botti; Waidman; Marcon e Scochi, 2009). O medo da rejeição é mais propenso em mulheres que veem na doença uma sentença de morte. Assim, como segundo Maliska et al (2009), quando se anuncia o resultado positivo para família, é doloroso pois a eminência da possibilidade do isolamento e do abandono por aqueles que considera importante na sua vida, se torna em sua maioria explícito. As figuras parentais podem mostrar sentimentos confusos e ações conflitantes, reagindo de diferentes maneiras em relação ao soro positividade, variando desde preocupadas, protetoras, sem apoio, desconhecimento, até o abandono. A convivência com um dos membros da família acometido pela AIDS vai além das fronteiras e barreiras físicas que a doença impõe, pois, o estigma que paira sobre a AIDS faz a família direcionar-se a um mundo de possibilidades e desconstruções em relação ao portador, carregando assim representações criadas a partir de interpretações e julgamentos individuais da situação vivenciada. Esse olhar traz à tona impressões positivas ou negativas sobre o doente e sua família, fazendo com que tanto a sociedade quanto o indivíduo se movimentem respectivamente, em direção à sua aproximação ou seu afastamento. É perceptível que a capacidade de uma estrutura familiar se acostumar à realidade de uma notícia de soro positividade está ligada de modo direto a como essa mulher está se relacionando com essa família, pois, quanto mais 31 acessível for esse relacionamento, melhor será a compreensão de quando for revelado a notícia de um membro da sua família, onde o acolhimento e apoio dos demais é tudo o que esse indivíduo precisará no momento (Castanha et al., 2006). Contudo, variando as situações, em alguns casos o próprio indivíduo soropositivo faz omissão dessa notícia (Maliska et al., 2009). Segundo Castanha et al. (2006), a omissão é vista com bastante preocupação, pois, seu ciclo familiar e de amizades são papéis fundamentais para uma instigante rede de apoio ao soropositivo. E ainda, quanto mais o clima familiar for ruim, maior será a dificuldade da mulher em revelar tal condição para o resto da família, pois, aí entra a questão do estigma que o HIV vive em nossa sociedade, que faz com que famílias reconheçam de modo ativo o membro soropositivo como merecedor da condição que se encontra, não aceitando de modo algum praticar o acolhimento daquela mulher e deixando de lado a compreensão familiar que serviria de ajuda para sua melhor qualidade de vida. O estereótipo do início da epidemia parte de alguns familiares que possam vir a se manifestar, de acordo com Maliska et al. (2009), onde se mantém no pensamento dos sujeitos, fazendo assim com que pensem que o soropositivo é alguém que a qualquer momento pode vir a morrer. É interessante refletir que o fato de haver uma incapacidade em perceber a AIDS como uma doença comum que atinge a todos os tipos de indivíduos e grupos da sociedade, faz com que muitas pessoas neguem sua vulnerabilidade perante o vírus. De acordo Pádua (1986) esse tipo de comportamento gerado das pessoas e da família parte do estigma é da noção cultural do início da doença. Seguindo este mesmo caminho de discursão sobre o estigma, Hanna (1994) relata em suas pesquisas que o que colabora para o distanciamento das pessoas é ainda existir o receio do contágio, enraizado na descrição do HIV/AIDS, que faz da doença ter esse caráter de contagiosidade. Desse modo as pessoas acabam procurando identificar o doente por sinais corporais, como perda de peso e manchas na pele. 32 Desse modo, a atitude da família, ou melhor, a expressão singular de cada um, carrega uma intensa ligação com a dinâmica social. Nessa mesma ideia, a construção feita sobre a doença deriva da conduta social. Aquela história de que a doença não existe, o não diálogo sobre a mesma, o ocultamento dela, que muitos sujeitos verbalizam em suas falas, deixam claro o muro que a família cria para continuar vivendo de uma maneira “normal”. As pessoas que estão passando por essa situação da doença emitem formas de fuga, criam mecanismos de defesa diante dela. A doença ganha um posto particular, onde os familiares e até mesmo a própria pessoa não a socializam, pois, carregam medo em relação à sociedade, de como ela vai ser vista e encarada por pela mesma (Sousa, 2008). A apresentação da AIDS no ciclo familiar atua como um recurso que trabalha a movimentação de quem está envolvido e assim direcionando a pluralidade de emoções que vem à tona, externalizando os medos e angústias que a doença carrega. A família acaba sendo influenciada tanto pelo contexto social criando em cima da doença quanto pela história construída internamente por ela. A partir disso, podem ser criadas várias significações do seu integrante portador e de simesma e desse modo acabar surgindo conflitos entre o grupo familiar. Por fim temos a ideia de que ter um portador do HIV/AIDS na família serve como referencial para um “problema”, quando na verdade, é uma pessoa que tem sentimentos e suas próprias vivências antes de qualquer coisa. (Sousa, 2008). Representações sociais e estereótipos sobre AIDS e como as mulheres convivem com isso Com a descoberta dos primeiros indícios dos casos de AIDS, os modos de infecção do vírus já eram vistos e portados em pontos de moralidade. A percepção que prevaleceu de imoralidade e transgressão foi “cuspida” pela mídia e absorvida pela população, estabelecendo desse modo uma representação social sobre as pessoas, e no caso, as mulheres que vivem com o HIV/AIDS (Jodelet, 2001; Labra, 2013; Seidl, Ribeiro, & Galinkin, 2010). Foi no século XX que a AIDS passou a ser enquadrada como uma doença e não como algo sem volta, que desse modo fez com que as representações sociais 33 das pessoas portadoras pudessem obter uma reflexão mais humanizada (Labra, 2013). As representações fazem parte da dinâmica e da comunicação de um grupo social, envolvendo fenômenos específicos que estão ligados de modo pessoal em compreender a realidade do outro e a comunicação com os demais. (Moscovici, 2012; Vala, 2006). Uma representação é social quando envolve um conjunto de sujeitos e grupalmente produzida, assim sendo consequência da atividade cognitiva de um grupo social. Serve como guia na forma de definir e nomear os vários aspectos da realidade, interpretando, impondo, se posicionando, criando uma identidade perante eles (Vala, 2006). Nos relatos de Abric (2003), as representações sociais são compreendidas da seguinte maneira: como um conjunto de interpretações da realidade, juntamente de suas crenças, ideias, atitudes, perante um propósito social. São divididas em prol de um duplo sistema: o núcleo central que envolve o afinamento social que vai definir a homogeneidade do grupo, e o sistema periférico, que leva em conta as experiências do cotidiano vividas pela pessoa. Esse núcleo central tem como dever ser avaliativo e pragmático por ter conteúdos normativos e funcionais, partindo dos valores dos indivíduos. Os elementos periféricos já são constituídos de elementos associados a representação, pois, concedem flexibilidade e expressão de modo individual das representações sociais. A teoria das representações sociais busca entender os fenômenos que são tanto psicológicos quanto sociais e suas relações, como as comunicações de massa, as influências sociais e os conhecimentos que são socialmente formulados e compartilhados (Moscovici, 2012). Esse conhecimento é conhecido como senso comum, e costuma ser transmitido através das relações sociais, da mídia, meios de comunicação em massa em geral, e principalmente pelas comunicações interpessoais, e é construído por meio dessas trocas, que têm sua base na moral e na cultura, já que a assimilação dessas informações orienta as práticas sociais (Jodelet, 2013). 34 As práticas sociais discriminatórias e preconceitos decorrentes do estigma que compõe a ideia da AIDS são consequências da concepção que perpetua as representações estereotipadas sobre a doença, cujo método de infecção denota práticas de transgressão às regras sociais. O preconceito é construído a partir de um pré-juízo ou pré-conceito de valor negativo que é elaborado sobre indivíduos e grupos. Um dos efeitos do preconceito é a discriminação, que se constitui na efetivação de um ato em forma de relacionamento desigual, desfavorável e ofensivo, dirigido a um grupo e/ou aos seus membros (Allport, 1979). Os preconceitos sociais são estruturas psicológicas complexas, porquanto dependem de determinada visão cultural e moral que constrói e molda estereótipos, e por isso têm sua base em crenças a respeito de comportamentos esperados e características pessoais ou de um grupo de pessoas que sejam aceitos ou não socialmente (Tajfel, 1982). A função dos estereótipos é introduzir simplicidade e ordem onde existe complexidade, através da abordagem de conjunto de semelhanças de pessoas e grupos em determinadas categorias, que são consideradas então, representativas dos estereótipos, características principais de cada grupo. (Allport, 1979). Os conceitos de estereótipo e representação social estão diretamente interligados, ambos se referindo às imagens que a sociedade constrói dos outros. Portanto, as representações sociais estereotipadas podem sustentar práticas de discriminação social (Moliner & Vidal, 2003). Apesar de terem havido mudanças em relação às representações sociais da AIDS, preconceitos e estereótipos relacionados aos portadores ainda continuam presentes na sociedade atual (Labra, 2013). A intervenção psicológica na descoberta da soropositividade A intervenção psicológica como parte do tratamento é necessária tanto durante o período de descoberta da soropositividade, quanto durante o período de adaptação à nova condição, sendo de extrema importância, uma vez que esse diagnóstico é, muitas vezes - devido ao estigma que carrega e à conhecida virulência mortal do vírus - percebido como traumático do ponto de 35 vista orgânico, psicológico e social. O processo de aceitação da realidade pode ser potencialmente mais difícil quando a infecção acontece em uma condição na qual o sujeito se identifica como hígido, sem vulnerabilidade (Selli e Cechin, 2007). Quando a infecção pelo HIV acontece por parceiro um em união estável, é colocado em jogo muito mais do que a suposta infidelidade, abalando a relação através de dúvidas, falta de confiança e frustrações em relação às expectativas depositadas em tal parceiro (Zampieri, 2004). Em relação ao cuidado psicológico que se tem com as mulheres infectadas, e principalmente, com aquelas que se consideravam imunes ao vírus pelo fato de estarem inseridas em uma união estável, observam-se duas reações opostas: as que realmente precisam de ajuda para lidar com a mudança que a notícia trouxe para a sua vida por estarem em péssima condição psicológica, e as que estão, mesmo que lentamente, conseguindo aceitar a doença, com um prognóstico relativamente mais favorável. É recomendado o acompanhamento psicológico periódico para as pacientes que apresentam emoções não bem administradas advindas do diagnóstico e do tratamento da soropositividade ao HIV, para que sejam capazes de informar- se, prevenir-se de outras doenças, combater a discriminação e adaptar-se e aceitar o tratamento. Para que o andamento seja o mais pertinente possível, é ideal que se identifique em quais casos há necessidade da presença de um profissional para acompanhamento desde o início do processo, podendo oferecer um apoio e escuta especializada aos anseios, aos medos e às incertezas dessas mulheres, propiciando, assim, suporte e entendimento. Quanto à percepção de aceitação da doença por parte de algumas mulheres, existem duas formas: conseguindo administrá-la psiquicamente do modo mais pertinente possível, ou submetendo-se a questões culturais e reprimindo aspectos de sua subjetividade. Então, é evidente que são necessários estudos sobre essa temática, com o objetivo de compreender os diferentes processos psíquicos que envolvem a doença, desde o diagnóstico até o viver com HIV/AIDS (Wagner, 2013). 36 MÉTODO Tipo da Pesquisa A atual pesquisa teve como enfoque a pesquisa qualitativa, onde é analisada a partir da visão dos sujeitos e também onde as definições evoluem a partir do estudo realizado. Denzin e Lincoln (2006) mencionam que a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem interpretativa do mundo, onde seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários naturais, tentando entender os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem. Seguindo essalinha de raciocínio, Vieira e Zouain (2005) afirmam que a pesquisa qualitativa atribui importância fundamental aos depoimentos dos atores sociais envolvidos, aos discursos e aos significados transmitidos por eles que nesse sentido, esse tipo de pesquisa preza pela descrição detalhada dos fenômenos e dos elementos que o envolvem. Interligando essa linda de pensamento, Richardson (1999, p. 102) põe em destaque que “o objetivo fundamental da pesquisa qualitativa não reside na produção de opiniões representativas e objetivamente mensuráveis de um grupo; está no aprofundamento da compreensão de um fenômeno social por meio de entrevistas em profundidade e análises qualitativas da consciência articulada dos atores envolvidos no fenômeno”. Por conseguinte, essa pesquisa é validada não pela mensura do que se trabalha na pesquisa quantitativa, mas por meios mais minuciosos em como o estudo é concretizado. Nesse mesmo sentido de ideia, Trivinõs (2008) reforça que na pesquisa qualitativa algumas opções de recursos aleatórios podem ser manuseados para concretizar a amostra. Desse modo, tem-se como alternativas ao decidir intencionalmente a mensura do que se expõe, levando em conta diversas condições exemplificando sujeitos que partem de uma condição essencial para explicar o assunto que está em foco, de acordo com o que está sendo 37 proposto, em vista do investigador, facilitando a localização da pessoa, a marcação do tempo das pessoas para a entrevista e assim sucessivamente. Coleta de Dados Na coleta de dados da pesquisa teremos como seguimento a pesquisa bibliográfica que faz uso de todo tipo de bibliografia já existente, como: jornais, revistas, livros, teses, monografias etc., assim como também meios de comunicações orais: rádios, gravações até filmes e televisão. É uma pesquisa que faz com o que o pesquisador fique em contato direto com tudo o que foi colocado em prática sobre determinado assunto (Lakatos, 2003). Na pesquisa foram levantadas algumas buscas das bases de dados por meio de artigos, livros e revistas como PEPSIC, SCIELO e BDTD, onde foram selecionadas algumas palavras chaves para serem desenvolvidas: mulheres, discriminação, estigma, HIV/AIDS, preconceito, vulnerabilidade. Segundo Manzo (1971:32), a bibliografia em si oferece meios para definir, resolver, não somente problemas já conhecidos, como também explorar novas áreas onde os problemas não se cristalizaram suficientemente e que acaba tendo como ponto principal ceder ao pesquisador “o reforço paralelo na análise, de suas pesquisas ou manipulação de suas informações” (Trujilli, 1974:230). Assim, a pesquisa bibliográfica não pode ser vista apenas por conteúdos já ditos ou escritos em relação a certo assunto, mas sim algo mais amplo, dispondo de novas ideias e conclusões que podem acarretar resultados surpreendentes. Tem como objetivo colocar o pesquisador em contato direto com todo o material já escrito sobre o assunto da pesquisa onde é importante que o pesquisador verifique a veracidade dos dados obtidos, observando as possíveis incoerências ou contradições que as obras possam apresentar. A pesquisa bibliográfica foi escolhida como procedimento para esta pesquisa por confirmar a importância que existe de esclarecer e de colocar em evidência o método e as formas metodológicas como o tipo de pesquisa, coleta de dados etc. Pois, servirão para a sua execução que será detalhada desde as 38 fontes, para que sirva de modo a apresentar os passos que guiaram todo o procedimento da pesquisa. Critérios de Inclusão Produções acadêmicas nas bases de dados SciELO, PEPSIC e BDTD referentes à temática HIV/AIDS, MULHERES, PRECONCEITO, DISCRIMINAÇÃO E ESTIGMA. Produção foi: artigos científicos, teses, dissertação e livros técnicos. Análise de Dados Foi empregada a análise de conteúdo que segundo Bardin (1977/2010) é composta por regras lógicas de organização, categorização e tratamento de dados quantitativos/qualitativos. Na primeira observação da análise de conteúdo relaciona-se à pré-análise onde são determinados os documentos e papeladas a serem analisados, são verificados as hipóteses e os objetivos que terão critérios de análise que servirão de relevância a pesquisa. No segundo instante vem a chamada codificação, que será a transformação do dado bruto. A análise de conteúdo é definida por Bardin pelo seguinte contexto: “não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações” (Bardin, 1995: 31). A partir desta pesquisa foi possível analisar o conteúdo de cada ideia dos autores, colocando o pesquisador em contato direto com os dados. Bardin construiu como âmbito epistemológico duas comunicações: De maneira grosseira, arrogamo-nos o direito de dizer que representacional significa que o ponto importante no que diz respeito à comunicação é o revelado pelo conteúdo dos itens léxicos nela presentes, isto é, que algo nas palavras da mensagem permite ter indicadores válidos sem que se considerem as circunstâncias, sendo a mensagem o que o analista observa. Grosso modo, „instrumental‟ significa que o 39 fundamental não é aquilo que a mensagem diz à primeira vista, mas o que ela veicula, dados o seu contexto e as suas circunstâncias” (Bardin, 1995: 20-1). Segundo Lakatos (2003), a partir do momento que os dados são manuseados e que se obtém os resultados, o passo a seguir passa-se a ser a análise e interpretação deles, são formadas no núcleo central da pesquisa. Quando se fala em análise o pesquisador trabalha com mais detalhes em relação aos dados referentes do trabalho estatístico, no intuito de obter respostas aos seus questionamentos, e assim tratará em estabelecer os vínculos necessários entre os dados coletados e as hipóteses formuladas. Onde são comprovadas ou retrucadas, conforme a análise. Portanto, mesmo com dados válidos, é o poder da análise e da interpretação que medirá o valor da pesquisa, pois, apesar de serem distintas, estão bastante relacionadas. A análise de dados foi feita através de planilhas no Excel 2017, separadas em Apêndice I e II, onde a primeira apresenta a quantidade de artigos selecionados com cores diferentes e ditadas como: artigos, livros, revistas, dissertações, jornais e websites, com o total de cada uma e no geral também. Logo ao lado uma outra tabela de palavras-chave utilizadas com algumas das combinações referidas e encontradas nas bases de dados. O Apêndice II foi constituído de uma tabela com os principais artigos utilizados, foi repartido em: artigos, livros, revistas, dissertações, jornais e websites com dois conteúdos, de cada, logo após foi feito fichamentos desses conteúdos e então inseridos ao texto. Sendo assim o material coletado foi em torno de pesquisas em livros, sites vinculados a artigos acadêmicos, teses, onde foram lidos, feito fichamentos para analisar os pontos mais importantes da visão dos autores. As categorias foram criadas a partir das ideias citadas no referencial teórico onde foram divididos tópicos para serem trabalhados e daí partiram as seguintes categorias: 1) A vivência de mulheres com o HIV/AIDS: reflexões; 2) A questão biopsicossocial do Ser mulher com HIV/AIDS e 3) O preconceito, a discriminação e o estigma junto a concepção de resiliência da mulher e o HIV/AIDS. 40 No seguinte capítulo apresentaremos e discutiremos as categorias que foram citadas aqui. As categorias seguirão uma ordem de ideias dos autores em forma de uma discussão construtiva e comentários da pesquisadora finalizando com o diálogo referido ao referencial teórico. 41 DISCUSSÃO Nesta parte serão comentadas algumas discussões da pesquisa, abordando as categoriascriadas ao longo de toda a pesquisa, trazendo conteúdos gerais. Desse modo as categorias apresentam-se assim: 1) A VIVÊNCIA DE MULHERES COM O HIV/AIDS: REFLEXÕES. As reflexões podem ser feitas a partir de vários fatores que são vivenciados por mulheres com o HIV/AIDS, desde o seu ciclo familiar até o seu meio social externo tratando-se de um ambiente de trabalho, escolar, entre outros. Silva Waidman e Marcon (2009) explicam que dado o resultado reagente a mulher, sua vida dá início a um novo caminho onde exigirá mudanças em seus hábitos e atitudes. Há também a adesão ao tratamento que requer compromisso no uso dos antirretrovirais, assim causando alguns efeitos em seu organismo. O descobrimento do estado sorológico para várias mulheres, se dá na realização do pré-natal, na demonstração de doenças oportunistas e também quando o parceiro fica doente (Melo, 2013). A identificação da doença traz muitas implicações como a desconfiança de infidelidade do outro, a sensação de culpa por ter contraído a doença e o temor do preconceito, fatores que podem ser trabalhados por equipes multidisciplinares diante do acompanhamento da portadora. O exercício da sexualidade da mulher sofre mudanças que Santos et al. (2002) descreve a partir do momento que o diagnóstico é revelado e o fator da rejeição por sua condição sorológica vem à tona. Desse modo, cabe aos profissionais da saúde estarem atentos a essas questões e assim as praticarem no atendimento, pois a mulher encontra-se em uma vulnerabilidade constante e se essas questões forem bem trabalhadas com as mesmas poderá haver uma melhora na sua alta estima e em seu empoderamento. Apesar do Artigo XI da Declaração dos direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do vírus HIV/AIDS (1989), a lei 12.984 que ampara a portadora do vírus não exclui a possibilidade dela sofrer algum tipo de discriminação ou 42 preconceito por parte das pessoas ao seu redor, assim como a mulher soropositiva pode internalizar essa visão do estigma, tomando para si que merece essa discriminação e viver dessa maneira (Desafiando o estigma e a discriminação, 2013). É aí que mora o perigo relacionado a sua saúde mental, pois ela não precisa dessa influência negativa diante do que tem, e sim de pessoas e caminhos que lhe mostrem que pode viver de uma maneira saudável e feliz. De acordo com o IBGE, no Censo Demográfico 2010, 37,3% das famílias brasileiras eram dirigidas por mulheres, o que inclui a tarefa de educar os filhos sendo responsáveis pela renda familiar, assim como pelas atividades domésticas, dentre outras. É importante entender que a mulher que vive com HIV/AIDS carrega de forma pesada a realidade do cotidiano, com dificuldades de mantê-lo e de se inserir no mercado devido à baixa escolaridade. Para completar, sente-se em meio à degradação, tendo que lidar com o isolamento social, o estigma que acompanha a doença, a falta de conhecimento sobre a doença e acesso aos serviços, sem o importante apoio familiar que é preciso. Como um todo, as reflexões que ficam da vivência da mulher com o HIV/AIDS são do modo como se portam diante da sociedade e de si mesma, acaba sendo um desafio diário dela como mulher, como mãe, como esposa e como cidadã. Um desafio que se dá desde o momento que ela recebe a notícia do diagnóstico e de como vai viver em meio ao seu ciclo familiar e social. A importância do tratamento, de acompanhamento, do apoio familiar, e dos demais serviços que possam fazer com que a mulher tenha uma qualidade de vida prolongada. 2) A QUESTÃO BIOPSICOSSOCIAL DO SER MULHER COM O HIV/AIDS. De acordo com Castanha. et al (2006), em relação às consequências biopsicossociais da AIDS, pode-se verificar consequências em basicamente três categorias: físico-orgânicas, psicoafetivas e comportamentais. 2.1 Físico-orgânicas Dentro dessa categoria, as alterações físicas e orgânicas dividem-se em 3 pontos: Perturbações fisiológicas 43 A diarreia e a insônia estão entre os sintomas mais comuns da AIDS, mas a fadiga e a insônia podem ser confundidas com perturbações fisiológicas em pacientes assintomáticos, quando na verdade estão relacionados a distúrbios psíquicos, como a depressão maior (Malbergier, 2000). Capacidade física Como discutido, uma das consequências da doença é a perda progressiva da capacidade laborativa e com isso, é perdida também a credibilidade conquistada perante à sociedade capitalista como um ser produtivo, que é determinada pelo trabalho. Este, de acordo com Laurell e Noriega (1989), faz emergir os papeis sociais de utilidade, positividade, capacidade e força, que desse modo possibilitam as condições de sobrevivência própria e da família. Esse impedimento, então, significa a não correspondência das suas expectativas, da família e da sociedade, culminando na frustração e interrupção de um projeto de vida pessoal, familiar e profissional. Efeitos colaterais do medicamento Esses efeitos chegam a prejudicar a adesão das mulheres aos cuidados de saúde, porque as consequências da doença e os efeitos colaterais do coquetel, (como a importante lipodistrofia nas mulheres) podem estar estigmatizados, segundo Tunala (2000), o fato destas acharem que os outros percebem sua condição através da aparência se dá principalmente devido à vinculação de estereótipos físicos aos doentes de AIDS, como magreza ou deficiência física. 2.2 Psicoafetivas As consequências psicoafetivas mais comuns são decorrentes do preconceito, da depressão e da autoestima e auto percepção. Preconceito Como descrito, pessoas com HIV/AIDS são ainda discriminadas, isoladas do convívio com outras pessoas e até na própria família, apesar de todo o conhecimento que se tem atualmente acerca das formas de transmissão, o que representa um prejuízo a toda a rede de apoio. Segundo Tura (1998), a doença causa nojo, distância, medo de ser contaminado, e isso ocorre mais intensamente com a AIDS por deixar sinais tão visíveis e impotências tão declaradas. Moriya (1992) aponta alguns dos 44 aspectos associados à AIDS, como o medo irracional, aspectos psicossociais desfavoráveis evidenciados por desinformações, discriminações e atitudes negativas. O preconceito atinge profundamente os indivíduos, influenciando-os na percepção de sua doença e no comportamento de outras pessoas frente a ela. Depressão A AIDS, juntamente com sua repercussão social, em sua evolução é muito associada a transtornos psiquiátricos, e o mais comum destes é a depressão. Observa-se uma porcentagem de 11% a 30% de prevalência de transtornos depressivos (Rodin, Craven e Littlefield, 1991). No contexto da soro positividade, a depressão influencia diretamente na adesão ao tratamento, pois há uma menor aderência de pessoas com quadros depressivos e ansiedade: segundo Melchior (2000) e Malbergier (2001) um paciente deprimido tende a não tomar as medicações prescritas e a não aceitar as orientações médicas, além do risco aumentado de suicídio. O paciente soropositivo experimenta sentimentos de raiva, culpa, auto piedade e ansiedade. A baixa autoestima e o abandono por parte dos familiares e amigos podem levar a tentativas de suicídio. Desse modo, é notório que a depressão e o sentimento/pensamento de morte são comuns, porém de um lado está o alto índice de prevalência da depressão, e do outro, o baixo número de casos diagnosticados, o que torna o fato altamente preocupante. Autoestima e auto percepção Levando em conta resiliência do indivíduo, ambiente e rede de apoio, podem ser relatadas, além das alterações negativas na autoestima - na qual estão presentes a auto depreciação e suas consequências -, as positivas. Relacionadas ao enfrentamento da AIDS e aos ganhos decorrentes da experiência, nas consequências positivas da infecção para o indivíduo, Franco FG & Figueiredo
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