Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
CONTABILIDADE APLICADA AO SETOR PÚBLICO AULA 3 Prof. José Luis Modena 2 CONVERSA INICIAL Na última aula debatemos sobre a despesa pública, que é a parte das finanças que representam os dispêndios destinados ao atendimento do bem comum. Para fazer frente a esses gastos, o governo conta com as receitas públicas, que será o objeto do nosso estudo no decorrer dessa aula. Para tanto, traremos inicialmente os conceitos legais e doutrinários relacionados a receita pública. Em seguida veremos que para fins de registro e controle, essas entradas são segregadas em diferentes classificações. Conquanto, também mencionaremos sobre as etapas da receita pública, que de modo geral passa pelo processo de planejamento e execução. Falaremos ainda sobre as receitas públicas e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Por último traremos os impactos que essas receitas geram nos subsistemas patrimonial, orçamentário e de compensação. CONTEXTUALIZANDO As receitas públicas possibilitam a realização de ações governamentais. É através desses recursos que o governo tem amparo creditício para agir em programas educacionais; de segurança pública; saúde; bem como outras ações que vislumbre o bem comum. Nesse contexto, os tributos representam a maior fonte de receita do poder público. Para se ter uma ideia, em 2019 dados do portal da transparência evidenciam uma receita corrente pública, no âmbito da União, de R$ 1,69 trilhões. Desse montante, 82% possui origem tributária. Matias Pereira (2017) lembra que o Estado depende dessa fonte de recurso, sem a qual há uma impossibilidade de executar as atribuições que se espera do poder público. Obviamente que o governo conta com outras fontes de entradas financeiras. É o caso das receitas advindas das ações do estado como empresário; e as receitas de capital. De todo modo, é notória a importância da arrecadação pública para as ações do governo. É nesse contexto que a compreensão de algumas peculiaridades atinentes ao conceito e aplicação da receita no contexto público, se faz relevante. Seria o entendimento doutrinário da receita pública equivalente ao existe no ambiente corporativo? Como podemos classificar essas entradas financeiras nas contas públicas? E os registros, quais subsistemas são 3 impactados pelas ocorrências das receitas? No decorrer dessa nossa terceira aula, responderemos esses e outros questionamentos acerca da receita pública. TEMA 1 – CONCEITO No campo doutrinário, existem peculiaridades que diferenciam a aplicação do conceito da receita na esfera pública e privada. Conforme explicam Araújo e Arruda (2020), no âmbito privado, entende-se como receita, de modo simplificado, como as movimentações patrimoniais que geram variação positiva no patrimônio líquido da entidade, como venda de mercadoria, juros e aluguéis. Por outro lado, no setor público, são consideradas como receita, em um sentido amplo, todas as entradas de recursos ao governo, inclusive aquelas que transitam pelas contas públicas apenas em caráter transitório. Essa amplitude conceitual, para Kohama (2016), deriva do fato da contabilidade pública reconhecer a receita no enfoque orçamentário e patrimonial. Na esfera orçamentária é que a receita ganha uma extensão mais abrangente. Nesse caso, em observância aos preceitos contidos no art. 57 da Lei 4320/64, seriam considerados como receita orçamentária “todas as receitas arrecadadas, inclusive as provenientes de operações de crédito”. Com base nessa constatação, destaca-se primeiramente o fato de que no aspecto orçamentário, a receita deve ser reconhecida pelo regime de caixa, conforme mencionamos nas aulas precedentes. Não obstante, percebe-se ainda que até mesmo os valores advindos das operações de crédito também são tidos como receitas. Já no âmbito patrimonial, o conceito e reconhecimento da receita estão mais aderentes a doutrina aplicada no setor privado. Dessa forma, são reconhecidas como receitas somente os valores que geram uma variação patrimonial aumentativa. Além disso, conforme destaca Kohama (2016), essa valoração, para fins patrimoniais, independe do recebimento, ou seja, registra- se de acordo com o regime de competência. Vale destacar também, que a receita pública pode não estar vinculada a realização de algum tipo de despesa. Uma das principais fontes de arrecadação pública é de origem tributária, cuja cobrança deriva do poder coercitivo do governo, sendo que em alguns casos, como dos impostos, a lei não obriga uma contraprestação do estado para com o indivíduo que arcou com o ônus do tributo. 4 Em outras palavras, registra-se uma receita, sem necessariamente implicar em um reconhecimento concomitante de uma despesa TEMA 2 – CLASSIFICAÇÃO A receita, para fins de registro e controle, recebe uma classificação que irá distinguir as diferentes entradas nos cofres públicos. A primeira diferenciação desses recebimentos é com relação a previsão nas leis orçamentárias, dividindo-os em orçamentários e extraorçamentários. Para o MCASP (2018), as receitas orçamentárias ainda poderiam ser subdivididas por natureza; e indicador de resultado primário. A seguir, falaremos a respeito de cada uma dessas classificações. 2.1 Receita orçamentária e extraorçamentária As receitas orçamentárias, de modo geral, são previstas em dispositivos legais aprovados pelo poder legislativo. Conforme explicado pelo MCASP (2018), essa conjectura deriva do princípio da universalidade, cuja definição pressupõe que o orçamento irá prever todos as receitas e despesas públicas. Ocorre que algumas receitas, mesmo não previstas na LOA são tidas como orçamentárias. Squizzato (2013) lembra que a natureza da receita irá determinar se a mesma pode ser classificada como orçamentária, que é o caso de algum tipo de tributo não previsto no orçamento, mas que adentrou aos cofres públicos. Kohama (2016), de modo prático, menciona que se a entrada financeira pertence ao ente público de forma permanente, então estamos diante de uma receita orçamentária. Não obstante a isso, temos ainda as entradas extraorçamentárias. Seria as receitas que adentram as disponibilidades financeiras do ente público, apenas de modo temporário (MCASP, 2018). Em outras palavras, não representem acréscimos no patrimônio líquido da entidade pública. É o caso, de acordo com o parágrafo único do art. 3º da Lei 4320/64 da “operação de crédito por antecipação da receita, as emissões de papel-moeda e outras entradas compensatórias”. Nesses casos elencados, de modo geral, não servem para amparar a realização de despesas públicas orçamentárias. 2.2 Classificação em relação a natureza Assim como ocorre com as despesas, as receitas também podem ser classificadas por natureza. Em referência ao MCASP (2018), essa distinção das 5 entradas permitirá identificar a origem da receita; espécie; desdobramento dessa espécie; e o tipo. Cada um desses fragmentos empregados para discriminar as receitas recebe uma codificação numérica. Para ilustrarmos essa divisão e codificação, evidenciamos a seguir o exemplo utilizado pelo MTO (2020), onde evidencia-se receitas com imposto de renda pessoa física. Figura 1 – Classificação da despesa por natureza Fonte: MTO (2020) Na primeira classificação da receita, como é possível verificar na Figura 1, tem-se a divisão por categoria econômica, onde é permitido segregar as entradas orçamentárias em: receita corrente e de capital. Para fins de identificação numérica, emprega-se 1 para referir-se a receita corrente e 2 para as receitas de capital. As receitas correntes, de acordo com o MCASP (2018), seriam recursos que entram nas finanças públicas dentro do exercício financeiro, que alteram o patrimônio líquido da entidade. É o caso, de acordo com o art. 11 da Lei4320/64, das “receitas tributária, de contribuições, patrimonial, agropecuária, industrial, de serviços e outras”. Esses recursos também serviriam de amparo para realização das despesas correntes. Em relação as receitas de capital, o MCASP (2018) define como sendo o montante financeiro cuja entrada também ocorre ao longo do exercício financeiro, mas não altera o patrimônio líquido da entidade pública. Estariam contidas nessa categoria, em observância ao § 2º do art. 11 da Lei 4320/64, os “recursos financeiros oriundos de constituição de dívidas; de conversão, em espécie, de bens e direitos”. A norma também inclui nesse rol o superávit do orçamento corrente, que seria o montante positivo derivado do confronto entre receitas e despesas correntes. 6 A partir dessa primeira segregação da receita, podemos então identificar a sua origem, que é uma subdivisão da categoria econômica. Giacomoni (2017) menciona que essa discriminação da receita, além de representar uma forma mais analítica, também viabiliza o acompanhamento de cada tipo de entrada que foi preteritamente estimada na lei orçamentária. Para tanto, o MTO (2020), em observância as origens mencionadas no art. 11 da Lei 4320/64, salienta a possibilidade segregar a receita corrente e de capital, conforme elencado a seguir. a) Para as receitas correntes: 1 – Impostos taxas e Contribuições de Melhoria: nessa categoria, são inseridas as receitas de origem tributária, exceto aquelas que serão direcionadas para a divisão relatada a seguir. 2 – Contribuições: também de origem tributária, mas nesse caso, essa subdivisão é destinada para abarcar as receitas de contribuição social e econômica. De modo exemplificativo, temos o caso da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide). 3 - Receita patrimonial: são entradas provenientes da exploração do patrimônio público, como por exemplo o aluguel e as concessões. 4 - Receita Agropecuária: conforme mencionado pelo MCASP (2018), são receitas do Estado agindo como empresário, no ramo do agronegócio; 5 - Receita Industrial: envolve atividades industriais, incluindo a extração (inclusive mineral) da matéria prima e o seu beneficiamento. 6 - Receita de Serviços: receitas provenientes da cobrança de tarifa, onde o Estado presta serviço ao particular. 7 - Transferências Correntes: recebimento de receita pública de outro ente federado. Por exemplo, temos o caso do repasse dos estados, para os municípios, de parte da arrecadação com ICMS. 9 - Outras Receitas correntes: subdivisão destinada aos casos não amparados nas classificações precedentes. b) Para as receitas de capital: 1 – Operação de crédito: derivados da contratação de empréstimos 2 – Alienação de bens: receita oriunda da venda de bens públicos. 7 3 – Amortização de empréstimos: para os casos onde o ente público concedeu empréstimos. No momento do recebimento, o valor amortizado é reconhecimento como receita. 4 – Transferências de capital: valores recebidos de outras entidades públicas, classificado como receita de capital. 9 – Outras receitas de capital: classificação utilizada para as situações não enquadradas nos itens precedentes. Além dessa classificação por origem, ainda seria possível determinar a espécie da receita, dando maiores detalhes. No âmbito municipal, por exemplo, além de identificar que a receita é com impostos, teríamos a prerrogativa de visualizar se é com IPTU, ISS ou ITBI. Em outras palavras, representaria um desdobramento da origem da receita. 2.3 Classificação de acordo com o resultado primário De acordo com o MCASP (2018), a divisão da receita por resultado primário, foi uma inovação trazida no âmbito da União, não sendo de uso obrigatório para os demais entes públicos. Trata-se de uma segregação da receita em dois blocos: as primárias e as financeiras. As receitas primárias de acordo com o item 3.2.4 do MCASP (2018) inclui as receitas correntes, exceto aquelas advindas dos juros, bem como as receitas de capital provenientes de alienação de bens e transferências de capital. Por consequência, as receitas financeiras seriam as demais entradas correntes e de capital. Nas palavras do MCASP (pg. 49, 2018) seriam as receitas que “criam uma obrigação ou extingue um direito”. De modo exemplificativo, temos o caso das operações de crédito, que são tidas como receita de capital e criam para o Estado a obrigações de uma reposição financeira futura. Não obstante a isso, faz-se necessário retomarmos o assunto sobre despesa, na ótica da apuração do resultado primário. À vista disso, tem-se como esse tipo de despesa, aquelas empregadas para o custeio da máquina pública e realização de investimentos, exceto os montantes despendidos para pagamento da dívida pública e dos juros da mesma. Do confronto entre as receitas primárias e despesas primárias, o governo tem a possibilidade de apurar o que chamamos de resultado primário. Esse indicador é um dos parâmetros empregados para avaliar as contas públicas, compondo as metas fiscais contidas na Lei das Diretrizes Orçamentárias. 8 PARA SABER MAIS Assista uma explicação do Senado Federal sobre as receitas e despesas primárias no link que segue: https://www.youtube.com/watch?v=lB6ofoyonxc&t=188s TEMA 3 – ESTÁGIO DA RECEITA As receitas orçamentárias, para integrarem as disponibilidades financeiras do ente público passa, de modo geral, por duas etapas: o planejamento e a execução. A seguir veremos alguns detalhes sobre essas duas fases percorridas pela maior parte das receitas orçamentárias. 3.1 Planejamento Na Lei Orçamentária Anual, as receitas públicas são devidamente previstas, adentrando nas finanças públicas no contexto orçamentário. É nesse instrumento que a intenção arrecadatória da fazenda pública é exposta, como resultado da aplicação de critérios, com pressupostos básicos já previamente estabelecidas na Lei. De acordo com o art. 12 da Lei Complementar 101/200 (Lei de Responsabilidade Fiscal) as previsões da receita orçamentária: Considerarão os efeitos das alterações na legislação, a variação do índice de preços, do crescimento econômico ou de qualquer outro fator relevante e serão acompanhadas de demonstrativo de sua evolução nos últimos três anos, da projeção para os dois seguintes àquele a que se referirem, e da metodologia de cálculo e premissas utilizadas. Perceba que esse fragmento legislativo determina parâmetros mínimos que o ente público deverá observar para estimar as receitas, mas não impõe de forma arbitrária, nenhuma métrica de cálculo. No nível federal, o Manual de Demonstrativos Fiscais (2017), esclarece que as receitas futuras são projetadas com base no histórico de arrecadação; índice de preço; a variação macroeconômica dos segmentos atinentes a fonte arrecadatória; e as mudanças legislativas, como alteração da alíquota ou criação de novos tributos. Os demais entes têm a prerrogativa de aplicação de outros parâmetros, desde que obedeçam aos critérios mencionadas na Lei de Responsabilidade Fiscal. Cumpre ainda ressaltar que essa estimativa da receita é relevante para que ocorra embasamento legal das despesas. Conforme salientado por Araújo e Arruda (2020), essa previsão inicial permite que o governo projete as diferentes 9 aplicações financeiras, destinadas a atender as atividades de manutenção da máquina pública e também de investimento. 3.2 Execução A fase de execução da receita, tendo como base a Lei 4320/64, será representada pelo: lançamento, arrecadação e recolhimento. O lançamento, de acordo com o art. 52 da Lei 4320/64, é aplicado para receitas de origem tributária, ou para rendas, cujo vencimento já é determinado em lei ou contrato. Seria o caso, a título exemplificativo, dos impostos, lançadospela fazendo pública. Nessas situações, o ato administrativo de lançar teria como propósito a identificação do devedor; valor da receita; origem; e o vencimento. Ressalta-se ainda que essa fase também representa o momento da ocorrência do fato gerador da receita, para efeito de reconhecimento patrimonial. Ressalta-se ainda, conforme destacado por Araújo e Arruda (2020) que essa etapa de lançamento pode ocorrer de três maneiras: a) direto ou de ofício: quando o próprio ente público realiza o lançamento, que é o caso do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), cuja cobrança independe de alguma ação do particular; b) homologação: ocorre nas circunstâncias onde o particular realiza o pagamento antecipado do tributo, para que então a administração pública homologue o lançamento. Como exemplo, temos o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), em que o contribuinte apura mensalmente o valor a pagar, sem que exista necessidade de uma ação do poder público; c) declaração: situação onde há participação do contribuinte com o fornecimento de informações, que irão viabilizar a realização do lançamento pela Fazenda Pública. Quando esses valores, objeto do lançamento, são repassados ao agente responsável pela captação de recurso, temos a ocorrência da fase de arrecadação. Kohama (2016) lembra que há múltiplos agentes que possuem essa autorização para arrecadar receitas, como por exemplo os bancos, delegacias fiscais e alfandegas. No caso tributário, o agente de maior representatividade no recolhimento é sistema bancário, que ao receber as receitas públicas, dá liquidação a obrigação de pagar do contribuinte. De posse das receitas públicas os agentes arrecadadores repassarão os recursos para a conta do Tesouro, em um processo designado como 10 recolhimento. Para Giacomoni (2017), embora esse estágio pareça muito óbvio, ele se faz necessário para o atendimento do princípio da unidade de tesouraria, que possui previsão legal no art. 56 da Lei 4320/64. Essa regra representa, em outras palavras, a existência de um único caixa do ente público, para o devido gerenciamento das entradas. Acentua-se, por oportuno, a existência de exceção ao recolhimento em conta única. No art. 43 da Lei de Responsabilidade Fiscal, há menção aos valores arrecadados a título de previdência dos servidores públicos, os quais serão direcionados para um conta separada. TEMA 4 – RECEITA E A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL (LRF) A receita pública, devido sua importância, também ganhou notoriedades na Lei de Responsabilidade Fiscal. O capítulo III da referida norma foi destinado a esse assunto, sobretudo no quesito de previsão da receita e renúncia da mesma. No que tange as previsões, adicionalmente aos critérios de cálculo evidenciados no item 3.1 dessa aula, cumpre ainda mencionar algumas limitações impostas pelo legislador em relação a possíveis reestimativas. De acordo com o § 1º do art. 12 da Lei de Responsabilidade Fiscal, o poder legislativo somente poderia realizar esse tipo de alteração, caso fosse comprovado erro ou omissão. Com essa limitação, acaba evitando que uma vez aprovada, a previsão da receita venha a ser modificada. Contudo, como trata-se somente de uma previsão, a lei prevê um acompanhamento rotineiro dessas entradas. Em obediência ao texto legal contido no art. 13 da mesma norma, após a aprovação da LOA, o poder executivo deverá desdobrar a projeção de entradas em metas bimestrais, elencando inclusive as ações que serão realizadas a título de inibição de evasão fiscal. Dessa forma, viabiliza-se um controle maior da arrecadação, possibilitando inclusive reajustes nos gastos públicos, em função de eventuais frustrações nas previsões de arrecadação. Em relação a renúncia da receita, cumpre primeiramente frisar que nas finanças públicas, representa um ato de dispensar o recebimento de algum tipo de arrecadação. De modo exemplificativo, o § 1º do art. 14 da LRF, cita as hipóteses de anistia, que é o perdão das infrações tributárias; remissão, que representa o perdão do crédito tributário; alteração da alíquota; e isenções. Essa 11 renúncia de receita, em observância ao § 6º do art. 150 da Constituição Federal de 1988, deverá ser realizada por lei específica, autorizando que o poder público deixe de receber créditos que já possuíam amparo legal para cobrança. Não obstante a isso, a LRF também determina que essa abdicação de ganhos também seja acompanhada de previsões acerca dos impactos gerados. No art. 14 da referida norma, essas estimativas deverão abarcar o período em que a norma que dá legalidade a renúncia da receita começa a produzir efeitos, bem como para os próximos dois exercícios subsequentes. Além disso, os incisos I e II do mesmo artigo, exigem a apresentação dos seguintes relatórios: a) Evidenciação de que a renúncia não afetará as metas fiscais previstas na LDO; b) Medidas compensatórias, como por exemplo a elevação da alíquota de um tributo existente, ou até mesmo a criação de novos tributos, de maneira que supra os recursos que já não entrarão nos cofres públicos. Squizzato (2013) destaca que essa regra não se aplica para alterações na alíquota dos tributos que possuem limites para que o próprio poder executivo realize mudanças. Seria o caso do imposto de importação (II); impostos sobre operações financeiras (IOF); imposto sobre produtos industrializados (IPI); e o imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro (IOF). Nesses casos, mesmo que exista uma redução na alíquota e um impacto na arrecadação, não será necessário seguir os ditames previstos para renúncia da receita. Sobre o aspecto de registro nos subsistemas, o MCASP (2018) cita a necessidade de escrituração, desde que exista a possibilidade de uma mensuração confiável. O detalhamento desse impacto está descrito no próximo tópico da nossa aula. TEMA 5 – LANÇAMENTO CONTÁBIL DA DESPESA PÚBLICA Desde o momento em que a receita é aprovada na Lei Orçamentária Anual, já existe a possibilidade de registrar a informação no Subsistema Orçamentário. Na medida em que esses ingressos vão se movimentando nas diferentes etapas, expostas no item 3 dessa aula, outros registros se fazem necessários, impactando nos Subsistemas Orçamentário; Patrimonial; e de Compensação. A seguir demonstraremos como essa movimentação é registrada, de acordo com as etapas da receita. 12 5.1 Reconhecimento da receita nos diferentes estágios Para evidenciarmos as movimentações contábeis nos diferentes subsistemas, imagine o seguinte caso hipotético: determinado munícipio, em consonância às regras da Lei de Responsabilidade Fiscal, realiza uma estimativa inicial R$ 1 milhão de receitas correntes e R$ 500 mil de receitas de capital. Com base nessa previsão, teríamos que realizar a seguinte movimentação no Subsistema Orçamentário: Tabela 1 – Previsão da receita Débito Crédito Previsão Inicial Receita corrente Receita de capital Receitas a realizar Receita correntes Receita de capital 1.000.000 500.000 1.000.000 500.000 Subsistema patrimonial: não há registro Subsistema de compensação: não há registro. Após esse primeiro registro, seguindo a ordem elencada no item 3 dessa aula, teríamos a fase da execução da receita, cujo primeiro passo consiste no lançamento dela. Dando sequência ao nosso caso, considere agora que o município realize o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU), no valor de R$ 150 mil. Com base nessa constatação, teríamos a ocorrência do fato gerador da receita para fins de registro, acarretando a necessidade de escrituração no Subsistema patrimonial, conforme segue: Tabela 2 – Lançamento da receita Débito Crédito Ativo Crédito tributário a receber Variação patrimonial aumentativa IPTU150.000 150.000 Como as receitas, no âmbito orçamentário, são reconhecidas pelo regime de caixa, não há que se falar em registro no subsistema orçamentário. Também não constará movimentação no subsistema de compensação. Partindo dessas considerações, considere agora que o ente municipal obteve a arrecadação e recolhimento de R$ 20.000 a título de receita tributária com IPTU. Para esse fato, teríamos somente o reconhecimento da fase de recolhimento, gerando a seguinte movimentação: a) Subsistema patrimonial 13 Tabela 3 – Recolhimento da receita - SP Débito Crédito Ativo Caixa e equivalente de caixa Ativo Crédito tributário a receber 20.000 20.000 b) Subsistema orçamentário Tabela 4 – Recolhimento da receita Débito Crédito Receita a realizar Receitas correntes Receita realizada Receita correntes 20.000 20.000 c) Subsistema de compensação Tabela 5 – Recolhimento da receita Débito Crédito Controle de disponibilidade de recursos recebidos Disponibilidade por Destinação de Recursos a Utilizar 20.000 20.000 Por meio desses registros de recolhimento da receita pública, tem-se o encerramento do reconhecimento patrimonial, orçamentário e compensação da receita pública. 5.1 Reconhecimento da renúncia da receita Conforme relatado no tópico 4 dessa aula, existem situações em que o poder público, por meio de lei, abdica do recebimento de receitas, por vezes já reconhecidas nos demonstrativos contábeis. Para descrevemos as movimentações, daremos continuidade ao exemplo exposto anteriormente, mas nesse caso, consideraremos que o município concedeu uma redução na alíquota de 10%, no momento da ocorrência do fato gerador da receita. Portanto, supondo que existisse uma previsão de R$ 20 mil, o valor que efetivamente produziu efeitos nas contas públicas foi de apenas R$ 18 mil. Nesse caso hipotético, seria necessário registrar a renúncia da receita no subsistema orçamentário, conforme segue. Tabela 6 – Recolhimento da renúncia da receita Débito Crédito Receita realizada Dedução da Receitas correntes Receita realizada Receita correntes 2.000 2.000 14 Os demais lançamentos seguem o mesmo esquema apresentado no item anterior. O que necessita de ajuste é justamente as previsões orçamentárias, que por estarem com os montantes defasados, necessitam da contabilização mencionada na tabela 6, evidenciada anteriormente. TROCANDO IDEIAS Uma das necessidades inerentes a gestão orçamentária é o acompanhamento das receitas públicas. À vista dessa realidade, os governos necessitam constantemente confrontar as previsões com as respectivas realizações, afim de garantir o atingimento das metas fiscais, bem como para realizar os gastos públicos. No âmbito federal, esse acompanhamento pode ser observado no link a seguir: http://www.portaldatransparencia.gov.br/receitas. Procure explorar as informações disponibilizadas nesse portal do governo federal, bem como os dados orçamentários da receita do seu estado e município, objetivando trazer subsídios para uma discussão em nosso fórum. Buscaremos desenvolver uma exposição de dados, afim de comparar as principais fontes de arrecadação no âmbito da União, estado e munícipio, assim como a proximidade daquilo que foi estimado, com a sua respectiva realização. Participe dessa discussão e conheça as diversidades arrecadatórias existentes nas diferentes partes do Brasil. NA PRÁTICA Para colocarmos em prática o conteúdo abordado em nossa aula, considere a seguinte situação hipotética: o município de Guardião do Estudante, no primeiro bimestre de 2020, apresentou as seguintes informações: - receita com IPTU – R$ 100.000,00 - receita com ISS – R$ 257.000,00 - operação de crédito de longo prazo – R$ 1.000.000,00 - receita com contribuição de melhorias – R$ 50.000,00 - depósito recebido a título de caução – R$ 200.000,00 - despesa primária – R$ 300.000,00 Com base unicamente nesses dados, classifique as receitas de acordo com sua previsão no orçamento; categoria econômica e origem. Por fim, apure o resultado primário do município. http://www.portaldatransparencia.gov.br/receitas 15 FINALIZANDO Iniciamos a nossa aula trazendo conceitos atinentes a receita no âmbito público. Vimos com isso, que na literatura consta uma intepretação tanto no sentido amplo como no estrito. De posse desses preceitos iniciais, partimos para uma verificação da classificação das receitas públicas. Para tanto, apresentamos as possibilidades de segregar as entradas de acordo com a previsibilidade orçamentária; natureza; e resultado primário. Não obstante a isso, descrevemos as etapas das receitas que passa pelo processo de planejamento e execução. De acordo com a Lei 4320/64, a etapa de execução ainda se divide em lançamento, arrecadação e recolhimento. Também relatamos a as regras contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal, pertinentes a receita. Percebemos que a norma dita preceitos tanto para previsão das entradas, como no caso da sua renúncia. Por último, descrevemos as movimentações contábeis necessárias para o devido reconhecimento da receita no subsistema orçamentário, patrimonial e de compensação. REFERÊNCIAS ARAÚJO, Inaldo; ARRUDA, Daniel. Contabilidade Pública da Teoria a Prática. 3 ed. São Paulo, Saraiva, 2020. BRASIL. Lei n. 4320, de 17 de março de 1964. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 17 mar. 1964. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm> Acesso em 5 jun. 2020. BRASIL. Lei n. 101, de 04 de maio de 2000. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 04 mai. 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp101.htm> Acesso em 6 jul. 2020. MCASP – Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público. 8 ed. Ministério da Fazenda, 2018. Disponível em: < https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:31484 >. Acesso em 06 jun. 2020. MTO – Manual Técnico do Orçamento. 14 ed. Ministério da Economia, 2020. Disponível em: <https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/lib/exe/fetch.php/mto2020:mto202 0-versao14.pdf>. Acesso em 08 jun. 2020. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:31484 https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:31484 https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/lib/exe/fetch.php/mto2020:mto2020-versao14.pdf https://www1.siop.planejamento.gov.br/mto/lib/exe/fetch.php/mto2020:mto2020-versao14.pdf 16 GIACOMONI, James. Orçamento Público. 17 ed. São Paulo, Atlas, 2017. KOHAMA, HEILIO. Contabilidade Pública – Teoria e Prática. 15 ed. São Paulo, Atlas, 2016. SQUIZZATO, Ana Carolina. Direito Financeiro e Econômico. 1 ed. São Paulo, Método, 2013. GABARITO Com base nas informações apresentadas no exercício, teríamos a seguinte classificação da receita: Tabela 7 – Classificação da receita Previsão orçamentária Categoria econômica Origem Receita Orçamentária Corrente Impostos taxas e contribuição de melhorias IPTU – 100.000 ISS – 257.000 Contribuição – 50.000 Patrimoniais Aluguel – 4.000 Capital Operação de crédito Empréstimo – 200.000 Extraorçamentária Depósito – 200.000 No que tange ao resultado primário, conforme vimos no item 2.3 da nossa aula, seria o confronto das receitas correntes, exceto as provenientes de juros, com as despesas primárias. Dessa forma teríamos: 100.000 + 257.000 + 50.000 – 300.000 = 107.000 Portando, o resultado primário do ente público, perfaz R$ 107.000,00.
Compartilhar