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Fundamentos e Práticas para o Ensino do Futebol

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Fundamentos e práticas para o ensino e treino do futebol
Chapter · January 2013
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Representative learning design in football: Relationship between training task difficulty and complexity levels and players' skills level View project
Analysis of tactical-tecnhical performance in team handaball View project
Júlio Garganta
University of Porto
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José Guilherme
University of Porto
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Daniel Barreira
University of Porto
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João Brito
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1 
 
FUNDAMENTOS E PRÁTICAS PARA O ENSINO E 
TREINO DO FUTEBOL 
 
J. Garganta, J. Guilherme, D. Barreira, J. Brito & A. Rebelo 
 
Faculdade de Desporto da Universidade do Porto 
Centro de Investigação, Formação, Intervenção e Inovação em Desporto (CIFI2D) 
 
 
Referência para citação: 
Garganta, J., Guilherme, J., Barreira, D., Brito, J. & Rebelo, A. (2013). Fundamentos e práticas 
para o ensino e treino do futebol. In F. Tavares (Ed.), Jogos Desportivos Coletivos. Ensinar a 
jogar (pp. 199-263). Porto: Editora FADEUP. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2 
 
1. APRENDIZAGEM E TREINO DO FUTEBOL: RAZÕES E FINALIDADES 
 
 
Nada entorpece tanto o desenvolvimento 
pessoal como a ideia errada de que cada um 
é como é e não pode mudar. 
J.A. Marina 
 
Ao longo da existência humana, o Futebol tem vindo a suscitar uma crescente adesão 
de praticantes e de espectadores disseminados por todo o mundo, bem como um 
número cada vez mais expressivo de treinadores, árbitros, dirigentes e outros agentes 
desportivos. Tal facto vem correspondendo a uma significativa visibilidade deste jogo 
desportivo, o que justifica uma acrescida responsabilidade no que respeita ao 
imperativo de o Futebol se constituir como exemplo de boas práticas e de progresso 
do ser humano e das sociedades. 
Neste contexto, o processo de ensino e treino do Futebol assume um papel cada vez 
mais relevante, nomeadamente no que respeita à influência decisiva que exerce na 
formação dos praticantes e na preparação destes para lidarem com a competição 
desportiva. Deste modo, torna-se incontornável a racionalização de processos 
conducentes à eficácia da respetiva preparação e orientação (Garganta, 2008). 
O desenvolvimento das competências para jogar requer a criação e aplicação de 
situações de exercitação que promovam um elevado efeito de transferênciapara a 
competição e fomentem consideráveis níveis de autonomia e criatividade nos 
jogadores (Garganta, 2005). Todavia, constata-se que, com uma frequência pouco 
recomendável, persiste a ideia de que quem alcança o estatuto de “jogador de 
Futebol” nasce dotado de caraterísticas biomotoras que certificam e garantem a sua 
vocação para altos desempenhos desportivos. 
Ora, o pressuposto de que o talento natural determina o sucesso ou o fracasso conduz 
necessariamente à ideia de que o Futebol não se ensina, o que, quanto a nós, tem 
constituído um dos erros de perspetiva que mais negativamente têm condicionado a 
evolução dos jogadores e das equipas e, por inerência, mais têm embaraçado o 
progresso da própria modalidade. 
Aliás, o filósofo grego Aristóteles, no ano 300 a.C., dizia que somos o que fazemos 
repetidamente e que, portanto, a excelência é um hábito. Mais de dois milénios 
passados, Gladwell (2008) refere que à medida que os cientistas examinam as carreiras 
dos seres humanos mais proficientes, em várias atividades, menor parece ser o papel 
atribuído ao “talento inato” e mais significativo se afigura o contributo da 
aprendizagem e do treino. De facto, os executantes excecionais parecem ser 
beneficiários de “vantagens escondidas”, oportunidades extraordinárias e legados 
culturais que lhes permitem aprender e trabalhar bastante. 
Syed (2010) robustece esta asserção ao sustentar que mesmo os prodígios infantis, 
que podem parecer que chegaram ao topo em metade do tempo, na realidade 
concentraram quantidades significativas de prática no curto período entre o 
nascimento e a adolescência. Ou seja, em atividades de pendor cultural como por 
3 
 
exemplo a música e a prática dos jogos desportivos coletivos, o sucesso não parece 
depender tanto de condições genéticas, mas, sobretudo, de habilidades circunstanciais 
aprendidas. 
Tal sugere que para vir a ser executante de excelência é imprescindível acumular uma 
experiência de vivências relevantes, em quantidade e qualidade, e por isso o jogador 
só desponta verdadeiramente depois de exposto ao processo de treino e à competição 
(Garganta, 2009). 
Justifica-se assim uma cada vez maior sensibilização para o entendimento do processo 
de ensino e treino, na sua íntima relação com a competição, de modo a propiciar a 
exploração de cenários que permitam perceber a influência de certas competências e 
circunstâncias na otimização do desempenho e na formação pessoal dos praticantes. 
Dado que o processo de ensino e treino visa induzir alterações comportamentais e 
atitudinais nos praticantes, o problema central que se coloca é o de saber como 
viabilizar uma formação eficaz, baseada na compreensão e na harmonização das 
capacidades e habilidades para treinar e jogar, garantindo uma filiação emocional ao 
jogo e a tudo o que pode apurar. 
Portanto, compete aos treinadores formar e capacitar os jovens, no respeito pela 
tríade: saber, saber fazer, saber estar (Garganta, 2006). 
Considerando tal quadro de exigências, vimos enunciando algumas questões 
estruturantes que emergem quando nos detemos sobre a necessidade de guiar 
crianças e jovens no seu percurso formativo (Garganta, 2006): Que razões levam um 
jovem a envolver-se, e a manter-se, na prática do Futebol? Que tipo (s) de formação 
importa adotar, de modo a que crianças e jovens sejam praticantes dedicados, 
talentosos e realizados? 
Destas questões depreende-se que, para além dos níveis de desempenho dos 
praticantes, nos preocupa o potencial transformador do ato de educar e de formar 
pessoas através do Futebol. 
Como diz Marina (2010), educar é a atividade fundacional da espécie humana. A 
evolução biológica prolongou-se com a evolução cultural, cuja essência é a educação. 
O contributo maior que podemos dar para promover uma boa formação consiste em 
ajudar crianças e jovens a encontrarem uma área em que as suas faculdades possam 
ser plenamente desenvolvidas e aproveitadas, e na qual se sintam realizados e 
preparados. Deste modo, é nossa intenção que o presente texto a propósito do ensino 
e treino do Futebol seja, também, um discurso sobre as possibilidades de 
transformação de seres humanos através de diversas formas de aprender a jogar o 
jogo. 
 
 
 
 
4 
 
2. PRIMEIRO, BRINCAR AO JOGO; O TREINO PODE ESPERAR 
 
A laranja espremida ao máximo torna-se amarga. 
Baltazar Gracián 
 
Deveríamos investir menos tempo a avaliar e a 
catalogar as crianças e ajudá-las mais a 
identificarem e a cultivarem as suas habilidades. 
Howard Gardner 
 
A relação do praticante de Futebol com o ensino, o treino e a competição começa a ser 
construída cada vez mais cedo e portanto há que dedicar mais e melhor reflexão aos 
problemas relacionados com as implicações pedagógicas e didáticas da prática 
desportiva sistemática. Logo, o ensino e treino do Futebol é um assunto que requer 
um posicionamento claro quanto às conceções e formas de intervenção a adotar. 
O que todos os praticantes têm em comum é que eles jogam porque gostam e porque 
querem desfrutar das infinitas possibilidades que o jogo pode oferecer. Assim sendo, 
apesar do praticante aderir ao jogo com prazer e de o ato de jogar dificilmente se 
tornar enfadonho, o mesmo não se pode dizer relativamente ao modo como por vezes 
o futebol é ensinado e treinado (Garganta, 2006). 
De facto, a busca do prazer pelo jogo e do gosto pelo treino deve ser uma preocupação 
da qual não se deve abdicar, sob pena de se comprometer a eficácia e a continuidade 
da prática desportiva de crianças e jovens. 
Em idades baixas, pode constatar-se que os praticantes experimentam um prazer 
espontâneo pelo jogo. Trata-se, como refere Csikszentmihalyi (2000), de uma 
experiência autotélica, isto é, de uma prática em que o objetivo se preenche a si 
mesmo ou, por outras palavras, em que a atividade é a própria recompensa ou 
gratificação e não necessariamente o resultado que dela advém. Porém, apesar de se 
revelar necessário que brinquem, joguem e desfrutem, é igualmente importante que a 
prática desportiva decorra na observância de princípios orientadores e se norteie pela 
edificação de atitudes que conduzam ao gosto pelo esforço, pela superação e pelo 
aperfeiçoamento. E é no treino que tais atitudes se moldam. Portanto, o prazer de 
melhor jogar pode ajudar a forjar o prazer de mais e melhor aprender e treinar, e vice-
versa (Garganta, 2006). 
Obviamente, o desenvolvimento da capacidade para jogar envolve um 
aperfeiçoamento de competências situacionais, intimamente relacionadas com a 
capacidade para gerir as mudanças incessantes produzidas no contexto de jogo. Trata-
se de um processo durante o qual se procura estimular o desenvolvimento de uma 
inteligência corporal, uma inteligência em ato, promovendo a exercitação, a 
variabilidade e a adaptabilidade de comportamentos e atitudes. 
Quando nos referimos aos modos de ensinar e de aprender Futebol, reportamo-nos, 
fundamentalmente, à ideia nuclear de organização. 
5 
 
Pelas suas caraterísticas, o Futebol é um jogo que requer elevada versatilidade 
percetiva, decisional e motora, reclamando o recurso a habilidades de natureza aberta, 
o que significa que a execução das mesmas, mais do que estar dependente do 
executante, quando considerado isoladamente, se abre para os espaços e os tempos 
em que o jogo decorre. Como tal, o desempenho durante uma partida é condicionado, 
sobretudo, pela forma como os praticantes engendram e manejam múltiplos 
constrangimentos, tais como, o posicionamento e a movimentação dos colegas de 
equipa e dos adversários, a zona do terreno em que a ação decorre, a distância aos 
alvos a defender ou a atacar, a velocidade da bola e a sua trajetória, nas diferentes 
fases e momentos que o jogo atravessa. 
De facto, neste quadro importa desenvolver conhecimentos e competências que 
permitam saber organizar-se nas diferentes fases e momentos do jogo, em funçãodas 
possibilidades de ação que vão sendo criadas e das que vão emergindo. 
O holandês Rinus Michels (2001), considerado pela FIFA o treinador do século XX, 
refere que o futebol de rua é o modo de aprendizagem mais natural que se conhece. 
Pode constatar-se que é jogado sempre de forma competitiva, normalmente em 
grupos reduzidos e em pequenos espaços. Raramente se vê as crianças e os jovens 
praticarem habilidades técnicas ou lances táticos isolados. 
Apesar de ser verdade que a crescente especialização faz com que não se possa 
esperar que este tipo de prática espontânea resolva, por si só e de forma satisfatória, 
as questões da aprendizagem, o futebol de rua pode ser um bom ponto de partida 
para eleger algumas referências para ensinar e treinar (Garganta, 2006). 
Aliás, conforme é reportado por jogadores e treinadores (Fonseca & Garganta, 2008), 
bem como por vários pesquisadores (Barab & Plucker, 2002; Baker, 2003; Salmela & 
Moraes, 2003; Côté et al., 2007; Baker et al., 2009; Araújo et al., 2010), a prática 
informal e espontânea parece ter implicações positivas relevantes na posterior prática 
formal e sistemática. 
 
 
2.1. A ilusão da aprendizagem sem erros 
 
 
O bumerangue não foi inventado a partir da 
compreensão dos princípios da aerodinâmica. A 
bússola não envolveu a formulação dos princípios do 
magnetismo. Esses e outros mecanismos foram 
alcançados por tentativa e erro. 
Paul Davies 
 
A capacidade de aprender a partir da experiência é uma das facetas mais notáveis do 
comportamento humano. E a caraterística mais marcante dos indivíduos que se 
iniciam numa nova atividade é cometerem erros frequentes (Tani, 1981), não apenas 
6 
 
no domínio da execução propriamente dita, mas também ao nível da perceção e da 
tomada de decisão. 
De facto, a relação entre as competências e caraterísticas individuais de cada 
praticante e a dificuldade que cada situação lhe proporciona e impõe, conduz a 
discrepâncias entre as ações que pretendem realizar e aquelas que conseguem 
consumar. O que vulgarmente se designa por erro situa-se nesse hiato entre o objetivo 
que se pretende atingir através de determinada ação e o resultado realmente 
conseguido aquando da sua efetivação. 
Porém, em vez do erro ser tido em conta enquanto indicador da adequação do 
processo usado para se chegar a um determinado resultado, ele é recorrentemente 
perspetivado no seu conceito restrito de resultado da ação e, portanto, somente 
enquanto oposto do que é certo. Desse modo, a sua ocorrência tem uma conotação 
negativa, sendo identificada com algo que impede a aprendizagem, em vez de algo que 
a pode viabilizar. Por isso, muitos dos sistemas de ensino e aprendizagem visam 
encontrar estratégias para evitá-los e/ou eliminá-los, em vez de os considerarem como 
indícios importantes que podem ajudar à evolução dos aprendizes. 
Também no âmbito do processo de ensino e treino do Futebol, o desacerto ou erro 
tem sido frequentemente entendido como elemento a banir, quando as novas 
perspetivas sustentam que o mesmo seja considerado parte integrante e até 
estruturante da aprendizagem, por ser suscetível de constituir um indicador relevante 
dos fatores perturbadores do desempenho e assim poder ajudar a corrigi-los. 
Acresce que a repressão do erro desencoraja a tentativa, reduzindo a disposição do 
jogador para arriscar e para optar por caminhos diversos. Quem não tenta, com receio 
de falhar, não pode evoluir. Mais, a não identificação do erro inibe a evolução, porque 
os erros funcionam como ocorrências-contraste em relação aos comportamentos-alvo 
e como tal devem ser usados para ajustar e apurar o processo, momento a momento 
(Garganta, 2004). 
Torna-se assim necessário que o professor/treinador, em vez de punir os erros, esteja 
capacitado para os identificar, bem como aos enredos que estão na origem da 
respetiva ocorrência, e os aproveite para fazer progredir os praticantes (Garganta, 
2006). 
Ademais, Michels (2001) advoga que é a partir dos erros cometidos em situações de 
jogo que os jogadores aprendem. Inconscientes das qualidades técnicas, táticas, 
mentais e físicas, eles vão desenvolvendo as suas competências de jogo através do 
envolvimento competitivo proporcionado pelo jogo. Por sua vez, Cruyff (2002) refere 
que o melhor método para ensinar uma criança a jogar Futebol não é proibir, mas sim 
guiar. Guiar não no sentido de conduzir, mas de ensinar a aprender a pilotar o jogo. 
Também Williams, Horn e Hodges (2003) reforçam estas convicções ao chamarem a 
atenção para a importância do erro no processo de ensino e treino do Futebol, 
sustentando a necessidade de os jogadores serem estimulados a obter a solução para 
o problema colocado, por via do ensaio e erro. 
7 
 
Como refere Tani (1981), as “performances erradas” aumentam o reportório de 
experiências dos sujeitos, e por elas serem inerentes ao processo de aprendizagem, a 
sua frequência, por si só, não pode ser um verdadeiro problema. 
Deste modo, justifica-se atribuir uma importância capital ao modo como são 
perspetivados e administrados os erros no processo de ensino e treino do Futebol, 
sejam eles de feição individual, grupal ou coletiva. 
Longe de se esgotar na transmissão de saberes, afigura-se conveniente que o processo 
de ensino e treino seja conduzido de modo a promover uma autoconstrução e 
atualização permanente das competências para jogar (Garganta, 2006). Como tal, em 
oposição às abordagens mecanicistas e analíticas tradicionais, nas quais o aprendiz era 
um mero recetor passivo de indicações que deveria cumprir, as novas perspetivas 
destacam a importância dos principiantes desenvolverem o seu próprio mecanismo de 
deteção e correção de erros, devendo para isso o professor/treinador optar por utilizar 
metodologias de ensino ativas, baseadas no ensino através da procura, da autonomia 
e da descoberta. 
Como sustenta Christina (2002), é conveniente que o professor/treinador adote os 
estilos de resolução de problemas1 e de descoberta guiada2, formulando perguntas 
que levem o praticante a encontrar as causas dos seus erros e a descobrir a melhor 
solução para os debelar. 
Muitos destes argumentos ajudam a perspetivar o processo de ensino e treino, de 
modo a que as decisões e as execuções desacertadas dos praticantes sejam percebidas 
como desvios que constituem parte integrante, e até estruturante, da aprendizagem, 
em vez de se persistir na recorrente ilusão de uma aprendizagem sem erros. 
Neste âmbito, temos vindo a apontar alguns dos equívocos que, com maior frequência, 
sobrevêm no âmbito da formação de crianças e jovens praticantes de Futebol, a saber: 
 
 Recurso a métodos convencionais para ensinar as técnicas do Futebol, em 
detrimento do ensino do jogo baseado na sua compreensão; 
 Planificação da atividade realizada apenas em função das competições, sem ter em 
consideração o calendário escolar dos jovens (férias, períodos de testes, …); 
 Quadros competitivos desajustados, colocando em confronto adversários de nível 
muito desigual. Longas interrupções e ausência de atividade competitiva quanto às 
equipas que são eliminadas das competições; 
 Repetição exagerada de exercícios analíticos, tornando o treino monótono e 
desmotivante; 
 Especialização precoce de funções, sem que se atenda aos imperativos de uma 
formação integral; 
 
1
 Também denominado de Ensino Divergente. O aprendiz inicia a descoberta e a produção de opções em relação ao conteúdo. O 
professor propõe um problema e o praticante busca a solução. Qualquer opção que resolva o problema é válida (Mosston, 1988). 
 
2
 Estilo de Ensino que consiste numa sequência de perguntas do professor/treinador que podem levar a uma várias respostas do 
aprendiz/praticante. A cada questionamento do professor/treinador corresponde uma resposta correta encontrada pelo 
aprendiz/praticante. O efeitoacumulativo desta sequência – processo convergente – leva o praticante a descobrir o conceito, 
princípio ou ideia perseguidas (Mosston, 1988). 
8 
 
 Repressão do erro, desencorajando a tentativa e a descoberta; carecimento de 
correções atempadas e pertinentes, durante a execução dos exercícios. 
 
 
2.2. A imprescindível cumplicidade entre competências táticas e habilidades técnicas 
 
Quanto mais e melhor técnica tivermos, 
menos temos que nos preocupar com ela. 
Pablo Picasso 
 
Os problemas primordiais do jogo de Futebol situam-se no plano estratégico-tático, 
porque saber o que fazer e como fazer condicionam-se mutuamente, o que implica 
uma congruência elevada entre a perceção da informação relevante (i.e., das linhas-
de-força do jogo), a tomada de decisão e a execução propriamente dita (Garganta, 
2006; (Tavares, Greco & Garganta, 2006). Desta forma, o jovem praticante deverá 
aprender a resolver os problemas que lhe são colocados pela prática do jogo, 
constituindo-se a técnica tão-somente, mas não menos importante, como instrumento 
que permite materializar a tomada de decisão. 
Como sugerem Williams e Davids (1995), o conhecimento específico do jogo repousa 
em pressupostos cognitivos. Mas, por outro lado, o domínio dos pressupostos 
cognitivos para realizar as ações de jogo não implica automaticamente o domínio das 
condições motoras para as operacionalizar. Ou seja, saber quando e como executar 
não significa saber executar as ações em jogo, porquanto a capacidade de execução 
não se esgota na dimensão cognitiva, mas tem que ser viabilizada por outras 
dimensões, nomeadamente a energética e a coordenativa. Aliás, na perspetiva de 
Newell e Barclay (1982), as ações dos seres humanos são reguladas por indução 
percetiva e viabilizadas através das denominadas estruturas coordenativas. 
A verdadeira dimensão da técnica repousa, então, na sua utilidade para servir a 
inteligência e a capacidade de decisão tática dos jogadores e das equipas. Um bom 
executante é, antes de mais, um indivíduo capaz de eleger as técnicas mais adequadas, 
para responder às sucessivas configurações do jogo e para as condicionar em favor da 
sua equipa. Desse modo, não faz sentido que o ensino e o treino da técnica do Futebol 
sejam ditados por preceitos biomecânicos, isto é, centrados no “gesto”, devendo 
atender-se, sobretudo, às imposições da respetiva adaptação inteligente às situações 
de jogo. 
Seguindo esta perspetiva, parece mais importante saber gerir regras de 
funcionamento, ou princípios de ação, do que mobilizar habilidades estereotipadas ou 
esquemas táticos rígidos e predeterminados (Garganta, 2006). Trata-se, portanto, de 
“ecologizar” as habilidades técnicas, de modo a propiciar a sua conformidade às 
condições mutáveis do jogo. 
9 
 
Newell (1986) preconiza três tipos de constrangimentos que determinam as ações e 
que interagem para a produção de um padrão de coordenação, a saber: 1) os 
específicos do jogador; 2) os relativos à tarefa; e 3) os concernentes ao envolvimento. 
Diga-se, todavia, que no âmbito do Futebol, esta tipologia não enfatiza a importância 
da faceta coletiva enquanto totalidade organizada que procura afirmar a sua 
identidade e preservar a respetiva integridade funcional. Acresce que a perspetiva 
ecológica tem alertado para a necessidade de se enfatizar o papel das propriedades do 
envolvimento, pelo facto de estas constituírem um sistema de constrangimentos e de 
possibilidades de ação (as affordances de Gibson, 1979), com significativas implicações 
no condicionamento das respostas do jogador. Neste âmbito, o comportamento 
justifica-se mais pelas competências percetivas do indivíduo, do que pela sua 
capacidade de armazenar soluções padronizadas na memória. 
Deste modo, importa entender que o jogador precisa de perceber os sinais do 
envolvimento para agir de modo ajustado, mas que, paralelamente, o jogador 
necessita de se mover, para procurar e/ou gerar informação disponível (Gibson, 1979). 
Esta problemática torna-se ainda mais complexa quando se procura tratar 
simultaneamente as principais exigências da ação desportiva – “o que fazer” e “como e 
quando fazer” – na medida em que se sabe, por exemplo, que a capacidade para 
executar uma habilidade técnica influencia a tendência para a eleger como opção 
tática na situação de jogo (French et al., 1996). 
As habilidades técnicas deverão então ser equacionadas em interação com a 
organização tática. Contudo, por vezes tem-se hipertrofiado a dimensão técnica, ou 
reprodutiva, em detrimento da dimensão estratégico-tática ou compreensiva 
(Garganta, 2004) e essa tecnificação do ensino e do treino tem limitado a evolução dos 
praticantes, nomeadamente no que concerne à construção de um jogar inteligente. 
Não raramente, ouve-se dizer que a repetição é a “mãe da técnica”. Ora, estamos 
convictos que a repetição inteligente será, porventura, a “mãe da tática”, na medida 
em que pode proporcionar formas de jogar intencionais e coletivamente construtivas. 
Deste modo, qualquer forma de reduzir o Futebol, seja à dimensão tática ou à técnica, 
mais do que um facilitador constitui um estorvo à evolução dos praticantes na sua 
relação com o jogo. 
Garganta (1997) refere que o facto de no Futebol surgirem situações cuja frequência, 
ordem cronológica e complexidade não poderem ser previstas antecipadamente, exige 
dos jogadores um flexível espectro adaptativo. Deste modo, ainda que a repetição de 
uma técnica que especifica os detalhes microscópicos do movimento possa conduzir 
mais rapidamente à padronização do movimento (ordem), tornando a aprendizagem 
aparentemente mais eficiente, tal padronização pode corresponder também a uma 
perda proporcional de flexibilidade no movimento (Tani, 2005). Ou seja, pode resultar 
na aquisição de um padrão de movimento rígido, estereotipado, de baixa 
adaptabilidade e, portanto, pouco eficaz. 
Aliás, Go Tani (2002) advoga que se cada situação exige um movimento diferente, os 
conhecimentos produzidos pela cuidadosa análise de um padrão restrito de 
10 
 
movimento perdem a sua eficácia. Caso contrário, necessitar-se-ia de tantas análises 
quantas as possibilidades de movimento, o que se afigura inoperante e inviável. 
O Futebol é um jogo, e num jogo cada jogador pode fazer escolhas, tomar decisões e 
executar ações, de acordo com as restrições impostas pelo regulamento (Van Lingen, 
1997). A proficiência dos praticantes depende, em larga medida, da respetiva 
capacidade para reconhecerem as diversas situações que o jogo lhes proporciona e 
para lhes darem resposta cabal (Garganta, 2006). 
Para compreender o jogo, os jogadores devem ser capazes de organizar as ações em 
função do contexto. As competências de leitura do ambiente e a execução das 
habilidades dependem do entendimento que se tem do jogo, não se tratando, 
portanto, de um problema sensorial ou técnico, mas sobretudo de uma questão 
conceptual. Vemos e entendemos o jogo, sobretudo, a partir dos conceitos, dos 
significantes, o que quer dizer que os problemas se colocam, em larga medida, ao nível 
da organização da informação e, sobretudo, da capacidade para descodificar o 
significado dessa informação. 
Se observarmos um jogo de Futebol minimamente organizado, mesmo que ambas as 
equipas em confronto não se distingam pela cor ou padrão do equipamento, é 
possível, passado algum tempo, identificar os elementos constitutivos de cada uma 
delas. Esta possibilidade resulta do facto da referida relação de oposição/cooperação, 
para ser sustentável e eficaz, reclamar dos jogadores comportamentos congruentes 
com as sucessivas situações do jogo, de acordo com os respetivos objetivos de sinal 
contrário de cada uma das equipas (Garganta, 2006). 
Como a perceção e a ação são inseparáveis e especificamente acopladas, a exercitação 
deve ser específica, o que significa que os praticantes devem aprender durante o 
treino comoacoplar a informação ao movimento (Savelsbergh & Van der Kamp, 2005). 
Nesta conformidade, importa que os jogadores sejam levados a reconhecer os 
distintos cenários de prática, quando com eles confrontados, e por isso é que na 
construção dos exercícios para jogar, as analogias entre o treino e o jogo que se quer 
construir desempenham um papel fundamental. 
Porque os cenários do jogo de Futebol se desenvolvem em situações de participação 
simultânea e espaço comum, propiciando atividades férteis em acontecimentos cuja 
frequência, ordem cronológica e complexidade não podem ser antecipadas, torna-se 
importante desenvolver competências que transcendam a execução propriamente dita 
e valorizem as capacidades relacionadas com as estratégias que guiam a captação da 
informação, a tomada de decisão e a execução (Garganta, 2005). 
 
 
 
 
 
11 
 
3. AS COREOGRAFIAS DO COLETIVO 
3.1. Tecer a teia do jogo: em busca do comportamento coletivo organizado 
 
Os seres humanos têm uma tendência difícil de 
contrariar: querem organizar tudo. 
Bertrand & Guillemet 
 
Ao perseguir-se o entendimento da lógica do jogo e da atividade das equipas e dos 
jogadores à luz da abrangência estratégico-tática, reconhece-se que o modelo e a 
conceção de jogo3 funcionam como metaníveis diretores da organização do jogo, 
conferindo ou retirando coerência aos comportamentos. 
Considerando a elevada instabilidade situacional e a incerteza inerente aos eventos de 
jogo (Garganta, 1997, 2009; Wiemeyer, 2003), a compreensão dos desígnios da 
performance no Futebol requer, cada vez mais, ideias e conceitos inclusivos que 
permitam perceber o modo como os jogadores e as equipas tecem e coordenam os 
seus comportamentos, na sua relação com os cenários típicos das partidas. 
Como referem Lames e McGarry (2007), o comportamento produzido num jogo não é 
a expressão primária de propriedades estáveis dos praticantes tomados 
individualmente, dado que emerge das interações dinâmicas que ocorrem entre os 
sujeitos em confronto. Esta perspetiva não-linear e de final aberto, na qual os agentes 
coevoluem com outros agentes e sistemas, e criam, em parte, o que lhes acontece, 
opõe-se à perspetiva linear na qual os agentes unicamente se adaptam às mudanças 
externas (Stacey, 2001). 
Portanto, o jogo perfila-se como um evento que emerge do comportamento das 
equipas, resultando do modo como os jogadores interagem sob diferentes conjuntos 
de regras e diversos constrangimentos. Neste nexo de acontecimentos que se 
sucedem em cascata, as equipas coevoluem continuamente, codeterminando as 
respetivas adaptações. 
Diga-se, no entanto, que embora o comportamento dos jogadores não seja 
completamente previsível, também não é tão imponderável quanto o lançamento de 
dados. De facto, é possível detetar, conhecer e categorizar situações que podem, com 
maior probabilidade, conduzir à concretização de determinados objetivos do jogo. 
Contudo, convém estar ciente que se está em presença de um território de possíveis 
previsíveis, no qual não se afigura viável estandardizar e controlar as sequências de 
ação que fazem parte do jogo, dado que numa determinada situação as possibilidades 
de ação são inúmeras (Garganta, 2005). 
 
3
 O modelo de jogo, também designado por modelo de jogo ideal (Pinto & Garganta, 1989), consiste num conjunto de referências 
táticas transversais a várias culturas, que traduzem, em síntese, as tendências do futebol jogado ao mais alto nível. Por seu turno, 
a conceção de jogo, igualmente denominada de modelo de jogo adaptado, corresponde à forma de conceber um modo de jogar 
para uma equipa em concreto. Portanto, a conceção de jogo é influenciada pelo modelo de jogo ideal e, simultaneamente, 
condicionada por vários constrangimentos, tais como a cultura e a história do clube/cidade/país, as características e objetivos 
delineados para a equipa e para os jogadores, as condições materiais e humanas disponíveis e a política de contratações, entre 
outros. 
12 
 
Portanto, faz sentido que a apreensão da lógica do jogo seja efetuada da consequência 
para a causa, isto é, partindo do jogo para as habilidades e não das habilidades para o 
jogo. Tal permite conduzir a uma educação da atenção e do entendimento para jogar 
em ambientes de baixa previsibilidade, ao mesmo tempo que se aprende a eleger os 
meios técnicos mais adequados para dar respostas às situações-problema que vão 
sendo engendradas em interação com o envolvimento. 
A premência de gerir vários constrangimentos pouco previsíveis confere relevância à 
necessidade de as equipas desenvolverem uma “aprendizagem organizacional”, ou 
seja, um processo durante o qual grupos e indivíduos, rápida e criativamente 
aprendem a governar as alterações do envolvimento e a delas retirar proveito (Muller 
& Watts, 1993). Esta ideia de “organização que aprende” assenta em conceitos e 
práticas que promovem redes auto-otimizadoras e auto-organizadoras (Strauss et al., 
2001), que se tornam fundamentais para que os atores se sintonizem de modo a 
melhor lidarem com os constrangimentos inerentes à ação (Marsch et al., 2006). 
Neste quadro, as equipas, entendidas como organizações, adaptam-se a problemas e 
oportunidades que assomam no envolvimento, adequando estratégias, decisões e 
comportamentos. Das interações emerge um padrão total, estrutura ou organização 
que não é simplesmente uma agregação de ações individuais, mas um processo com 
caraterísticas únicas que os indivíduos isoladamente não possuem (Drazin & 
Sandelands, 1994). 
Por isso, a gestão da adaptação das equipas aos cenários de treino e de jogo é 
consubstanciada, em grande parte, pelo desenvolvimento de uma “cultura para jogar”, 
que se traduz num estado dinâmico de prontidão coletiva, com referência a princípios 
e regras de ação (Garganta, 2008). Tal faz com que o processo de ensino e treino 
adquira uma importância essencial, de modo a conduzir à construção de um projeto 
coletivo de jogo que afete positivamente as múltiplas dimensões e escalas de 
organização, sobrecondicionando a dinâmica do sistema e configurando a 
correspondente identidade. 
Na perspetiva de Duarte et al. (2012), a otimização da performance coletiva, no âmbito 
dos jogos desportivos, implica uma criteriosa divisão do trabalho entre os jogadores 
intervenientes (e.g., recuperação de bola por um jogador para imediatamente a seguir 
ser outro a iniciar o ataque), bem como a existência de canais de comunicação 
intragrupo (e.g., permite a circulação de bola, ou a troca defensiva quando o colega de 
equipa defesa lateral é ultrapassado). Para além disso, reclama uma cooperação 
altruísta (e.g., em situação de finalização, o portador da bola opta por passar para um 
colega melhor posicionado em detrimento de tentar o golo). 
Uma equipa de Futebol pode ser entendida como um superorganismo cujo 
comportamento emerge a partir das sinergias que ocorrem entre as partes 
constituintes, sendo que estas se orientam para finalidades convergentes que 
favorecem a identidade e a integridade do organismo como um todo. Trata-se, 
portanto, de um coletivo auto-organizado capaz de gerar uma identidade emergente e 
em que a relação entre a perceção e a ação dos seus constituintes, i.e., entre si e 
13 
 
destes com o envolvimento, dá origem a um organismo superior distinto e 
indecomponível (Moritz & Fuchs, 1998, cit. Haber, s/d; Rosen, 2000; Marsh et al., 
2006; Hölldobler & Wilson 2009). 
Katsikopoulos e King (2010) sustentam que, contrariamente a tentativas individuais e 
isoladas, a informação combinada entre os jogadores de uma equipa permite, através 
de processos de interação, encontrar soluções com maior eficácia para problemas que 
surgem no decorrer do jogo. Este mecanismo reflete uma inteligência coletiva que 
decorre de sinergias que tendem a originar uma entidade social única que propiciaao 
sistema-equipa a descoberta de novas soluções que permitam ultrapassar os 
constrangimentos em cada situação de jogo (Duarte et al., 2012). 
Uma equipa, entendida como superorganismo, carateriza-se pelo facto de as relações 
de cooperação entre os jogadores que a constituem tenderem a gerar harmonia nas 
decisões, agindo para evitar que o adversário provoque desvios no rumo que o sistema 
toma como prioritário. As equipas são assim organismos com funcionalidade de ordem 
superior que aprendem e se auto-organizam, governando-se por uma inteligência 
coletiva cujo desenvolvimento depende da diversidade do grupo e da especialização 
dos indivíduos que o compõem (Katsikopoulos & King, 2010). 
Portanto, apesar de as equipas possuírem anatomias e fisionomias que se vão 
metamorfoseando à medida que o jogo é urdido (Garganta, 2007), sob a influência de 
múltiplos constrangimentos elas tendem a adotar comportamentos preferenciais. 
Embora o jogo integre várias transições de fase entre estados de equilíbrio e quebras 
do equilíbrio tático, as respetivas fases e momentos (ataque, defesa, alternância de 
posse de bola) obedecem, por vezes, a um processo de mudança gradual cuja 
separação não é levada a cabo por linhas de demarcação súbitas ou bruscas, mas por 
se dissiparem ou diluírem uns nos outros, em gradações pouco percetíveis. Aliás, como 
refere Ball (2009), conquanto se associe a ordem e os padrões à simetria e a 
aleatoriedade à sua ausência, talvez a aleatoriedade tenha o seu próprio tipo de 
simetria. 
As equipas, enquanto sistemas complexos adaptáveis, revelam caraterísticas ou 
propriedades que importa conhecer, de modo a facultar o desenvolvimento de um 
processo de ensino e treino mais específico, e, portanto, mais ajustado às exigências 
da modalidade e às caraterísticas dos diferentes modelos de jogo e dos jogadores que 
os procuram interpretar. 
Três dessas propriedades têm claras implicações no mapeamento das ideias e na 
operacionalização das estratégias para jogar, condicionando a construção e aplicação 
de exercícios através dos quais se procura implementar uma cultura de jogo. São elas, 
a não-linearidade, a interdependência e a emergência (Garganta, 2005). 
A não-linearidade está relacionada com o facto da identidade dos sistemas em jogo 
não resultar de uma sobreposição de efeitos ou de comportamentos elementares. 
Por exemplo, não raramente subsiste a ideia de que para se conseguir eficácia do 
ponto de vista ofensivo no Futebol é aconselhável jogar-se rápida e diretamente a bola 
na direção da baliza adversária, tentando atingi-la o mais depressa possível. Contudo, 
14 
 
pode constatar-se que em grande parte das vezes se consegue maior eficácia quando 
se opta por caminhos que, embora teoricamente mais demoradas, se tornam mais 
acessíveis por não apresentarem tantos, nem tão difíceis, obstáculos. O mais 
importante não é, portanto, a distância métrica, mas a dificuldade que se experimenta 
para vencê-la, até se chegar à baliza adversária. 
A interdependência é uma propriedade que faz com que qualquer comportamento de 
um dos elementos dos sistemas tenha repercussões no comportamento dos demais. 
Por exemplo, o tipo de organização defensiva adotado por uma equipa pode ser 
determinante para a forma como esta ataca a baliza adversária e para o resultado 
final. Uma das vantagens das equipas eficazes, quando não têm a posse da bola, é a 
permanência duma estrutura dinâmica, em equilíbrio, aspeto que garante a 
coordenação dos jogadores e o funcionamento em bloco. 
Conseguir uma defesa mais equilibrada, mais eficaz, que permita tirar melhor partido 
das mais-valias do conjunto, tem a ver com o facto de os jogadores não estarem 
focados em fazer a marcação a pontos físicos ou a jogadores tomados individualmente, 
mas na marcação de espaços e da bola. 
A emergência decorre da produção de propriedades coletivas qualitativamente 
diferentes das competências e atribuições de cada jogador. 
De acordo com os princípios de jogo, quando uma equipa perde a posse da bola deve 
procurar encurtar o espaço de jogo efetivo4, de modo a retirar espaço, tempo e 
iniciativa ao adversário; pelo contrário, a equipa adversária tende a ampliar o espaço 
de jogo e garantir fluidez, continuidade das ações, para poder circular a bola e criar 
espaços favoráveis para marcar golo. 
Assim sendo, a redução ou ampliação do campo de jogo é contingente e virtual, dado 
que não se processa através de uma manipulação efetiva das medidas físicas do 
terreno de jogo. Trata-se de artifícios usados à custa das movimentações e dos 
posicionamentos, ora buscando um aumento de densidade de jogadores nos espaços 
próximos da bola, aquando da fase defensiva, ora procurando um afastamento dos 
mesmos durante a fase ofensiva. 
Quer isto dizer que comportamentos aparentemente individuais podem induzir a 
realização de coberturas defensivas e o fechamento das linhas de passe mais 
importantes, o equilíbrio e a concentração espacial, criando-se uma dinâmica 
emergente que sirva os propósitos da organização coletiva. 
Por exemplo, um dos pressupostos para se jogar eficazmente está intimamente 
relacionado com o primeiro tempo defensivo, i.e., o momento imediatamente 
subsequente à perda da posse de bola. Neste caso, torna-se conveniente dispor de um 
ou dois jogadores que, estando mais próximos do local onde se perdeu a posse da 
bola, consigam uma reação forte à perda, sustendo o ataque do adversário e 
permitindo um reagrupamento dos colegas. 
 
 
4 Superfície poligonal configurada a partir das linhas que unem os jogadores que se encontram no interior do espaço de jogo 
regulamentar, situados, num instante t, na periferia do espaço ocupado pelas equipas que se defrontam, excluindo os guarda-
redes (Mérand, 1976; Buono & Jade, 1977). 
15 
 
3.2. Da identidade coletiva à identidade individual 
 
De início somos nós que fazemos os nossos hábitos. 
Depois, são os hábitos que nos fazem a nós. 
Robin Sharma 
 
No âmbito do ensino e treino do Futebol, preconiza-se que a exercitação dos jogadores 
e das equipas atenda aos constrangimentos diretamente relacionados com as 
exigências típicas do jogo, de modo a viabilizar a maior transferência possível das 
aquisições conseguidas no treino, para o contexto das partidas. Pretende-se, portanto, 
que a preparação seja coerente, isto é, induza adaptações que viabilizem uma eficácia 
superior de processos na competição (Garganta, 1999). 
No Futebol, a exercitação deve basear-se, em larga medida, na aquisição e aplicação 
de princípios de jogo. Advoga-se portanto que o objetivo fundamental do treino passe 
por dar condições aos jogadores para poderem estruturar as suas ações em jogo em 
função de um conjunto de regras que, por um lado, são transversais a quem joga 
(todas as equipas) e, por outro, são especificadoras de um modelo ou conceção de 
jogo que se pretende implementar. 
Um dos fundamentos do treino desportivo assenta na premissa de que a aplicação de 
um estímulo de treino provoca, sobre o organismo, respostas específicas diretamente 
relacionadas com a forma como esse exercício foi executado. Então, o treino, 
enquanto processo de preparação e desenvolvimento de competências, deve 
aproximar-se, o mais possível, das exigências específicas da competição. Dado que as 
adaptações são específicas às exigências impostas pelos estímulos de treino, é também 
importante que se atente que a obtenção de níveis adequados de aptidão requer que 
sejam garantidas a continuidade e a progressão do processo de preparação. 
Os trabalhos de Ericsson et al. (1993), no âmbito da excelência desportiva, fornecem 
informações relevantes para quem se ocupa da preparação de atletas. De acordo com 
o modelo proposto, o suposto talento inato parece desempenhar um papel reduzido 
no desenvolvimento da excelência. Na verdade, fortesevidências sugerem que altos 
níveis de desempenho estão, em grande parte, relacionados com o tempo de prática 
sistemática e acumulada numa atividade específica. Elevados níveis de motivação, 
empenhamento e trabalho árduo parecem ser também requisitos essenciais para que 
se obtenham desempenhos de excelência, mas a importância de ambientes de 
aprendizagem estimulante e tempo efetivo de prática dirigida de qualidade não 
podem ser descurados (Williams & Reilly, 2000). 
Assim, uma das tarefas primárias de quem orienta o processo de ensino e treino passa 
por conhecer o nível de desempenho dos sujeitos, de modo que possam ser definidos 
objetivos claros e concretizáveis, bem como todo o planeamento, periodização e 
estratégias de treino/preparação. 
Para quem assiste a uma partida de Futebol, o jogo afigura-se simples. Contudo, quem 
joga apercebe-se que está em presença de um fenómeno complexo, pelo facto de ter 
16 
 
que, a um tempo, referenciar a posição da bola, aferir a situação de colegas e 
adversários, em relação aos alvos a atacar e a defender, e agir num ambiente instável. 
Se a posição dos alvos é conhecida à partida, já a localização de colegas e oponentes 
muda continuamente em função da circulação do móbil de jogo (a bola), o que faz com 
que os espaços do campo de jogo devam ser diferentemente valorizados nos distintos 
momentos (Garganta, 2006). 
Torna-se então necessário entender o jogo de Futebol na sua complexidade, no 
antagonismo das equipas face ao concurso para um objetivo comum. Contudo, o 
termo complexidade carece de explicitação, sob pena de alimentar um discurso inane, 
traduzido numa manifesta impotência para aceder à essencialidade dos fenómenos, 
impondo-se, assim, a clarificação do seu alcance semântico e conceptual. 
A complexidade não é necessariamente uma propriedade de um sistema (seja natural 
ou artificial), mas uma propriedade da representação disponível desse sistema. É, 
portanto, inerente ao sujeito, na apreensão dos fenómenos, e deve-se: (i) à 
composição do sistema, ao número e às caraterísticas dos seus elementos e sobretudo 
das suas interações; (ii) à incerteza e aos acasos próprios do meio envolvente; (iii) à 
imprevisibilidade potencial de comportamentos; e (iv) às relações ambíguas entre 
determinismo e acaso aparente, entre ordem e desordem. 
As relações que compõem o sistema-equipa evidenciam situações de cooperação e de 
oposição entre os jogadores. Esta dimensão psicossocial (Bertrand & Guillemet, 1988) 
reduz os graus de liberdade na ação, induzindo constrangimentos aos 
comportamentos dos jogadores (Araújo, 2005), que limitam as possíveis configurações 
de um sistema e a obtenção de um estado permanente de organização. Por sua vez, a 
incerteza e a imprevisibilidade5 inerentes ao jogo de Futebol exigem do sistema-equipa 
respostas assertivas e coerentes. 
A noção de complexidade deve ser complementada pelas de circularidade e de 
reversibilidade, no sentido em que as partes agem em função do todo e este retroage 
sobre as partes, a partir da alternância de papéis e de funções de ataque e de defesa. 
Marsh et al. (2006) acrescentam que uma equipa enquanto entidade coletiva 
apresenta propriedades únicas e diferentes relativamente às das unidades individuais 
(jogadores), verificando-se ainda que os comportamentos dos jogadores se alteram em 
função da pertença a um coletivo. Ou seja, existe um equilíbrio entre as tensões das 
orientações individuais do jogador e a dinâmica da equipa. O jogador experimenta, 
assim, novas oportunidades para atuar optando por umas em detrimento de outras. E 
de tal modo o jogador e a equipa se fundem e transformam que resulta inviável 
perceber, de facto, aquilo que o jogador faz à equipa e aquilo que a equipa faz ao 
jogador. 
 
5 Taleb (2009) metaforiza a representação do imprevisível, isto é, de um acontecimento improvável, através da imagem do cisne 
negro. Refere o autor que o sujeito, pelo facto de estar programado para apreender o específico em detrimento das 
generalidades, o evidente em detrimento do menos evidente, se encontra impreparado para detetar o acontecimento causador 
de um impacto crítico. Consequentemente, apenas após a ocorrência do fenómeno menos previsível é que é arquitetada uma 
explicação que faz o cisne negro parecer menos aleatório e mais previsível. 
 
17 
 
Aplicada ao Futebol, a noção de sistema exprime o fluxo do jogo, permitindo 
enquadrar as opções táticas dos jogadores e das equipas. Afigura-se como uma 
construção ativa, na medida em que o seu desenvolvimento decorre da afirmação e 
atualização das escolhas e decisões dos jogadores, realizadas num ambiente de 
diversos constrangimentos e possibilidades. Face a uma situação de jogo, cada jogador 
privilegia determinadas ações em detrimento de outras, estabelecendo uma hierarquia 
de relações de exclusão e de preferência. 
Durante um jogo de Futebol, enquanto atividade coletiva que integra sistemas com 
distintos níveis de organização, são criadas e alimentadas redes de interações 
complexas a partir do comportamento dos jogadores (de cooperação e de oposição), 
de acordo com o modo como as equipas passam por vários estadios de equilíbrio e 
não-equilíbrio, regulados pelos princípios de jogo. O jogo tende a integrar cadeias de 
acontecimentos descontínuos e imprevistos, mas implicitamente relacionados com os 
eventos antecedentes e com as probabilidades de ocorrência de acontecimentos 
subsequentes. 
Como tal, o enfoque do jogo de Futebol segundo a perspetiva de abordagem dos 
sistemas dinâmicos afigura-se como uma estratégia a privilegiar. Porque se centra no 
estudo de múltiplas variáveis interdependentes, parece revelar-se mais consentânea 
com a natureza do fenómeno em causa. Deste modo, oferece a possibilidade de 
identificar e regular interações nas sequências de jogo que se afiguram representativas 
da dinâmica das partidas, bem como de organizar e sintetizar os conhecimentos para 
induzir uma superior eficácia na ação (Garganta, 2005). Dado que atuam num contexto 
em que se estabelecem relações de dependência e de interdependência, as equipas de 
Futebol podem ser consideradas sistemas hierarquizados, especializados e fortemente 
dominados pelas competências estratégicas e heurísticas (Garganta, 1997). 
O desempenho tático, porquanto permite apreender o carácter organizacional e 
sequencial das ações, representa uma instância funcional nuclear no âmbito do ensino 
e treino dos diferentes modos de jogar Futebol. 
O entendimento do jogo de Futebol enquanto sistema valoriza o seu carácter 
organizacional e sequencial, sendo que é a organização que produz a unidade global 
do sistema, transformando, produzindo, relacionando e mantendo o sistema e 
concedendo características próprias ao coletivo (Garganta, 2005). Não se trata, 
portanto, de reduzir o jogo a uma noção abstrata de sistema, mas de procurar 
configurar princípios que orientem o comportamento e definam a organização dos 
sistemas implicados. 
O comportamento coletivo de um sistema complexo não pode ser explicado pelo 
comportamento das suas partes constituintes (McGarry et al., 2002), e mais do que 
reduzido às propriedades dos elementos inerentes, o sistema deve ser entendido na 
sua inteireza (Kelso & Tuller, 1984). A consideração das partes, sem olhar ao todo, e 
vice-versa, tornar-se-á assim numa rua sem saída, pois são as interações, como 
invariante, que conferem nexo e sentido ao sistema-equipa e que, portanto, lhe dão 
corpo. Como a ação de um jogador desemboca forçosamente na interação dos demais 
18 
 
elementos em jogo, percebe-se que a performance desejável de uma equipa pode ser 
caraterizada pelo princípio que preconiza que o todo é superior à soma das partes. 
A organização das interações dos elementos da equipa nas diferentes dimensões, 
baseada num conhecimento coletivoexpresso num saber fazer tático convergente, 
traduz-se nos comportamentos assumidos pelos jogadores nos episódios do jogo, seja 
uma disposição no terreno de jogo mais ou menos adiantada, uma ação em posse de 
bola mais em largura ou mais em profundidade, uma forma mais expectante ou mais 
ativa quando não têm a bola, e atitudes nos fragmentos constantes do jogo, entre 
outros comportamentos que refletem uma identidade coletiva. 
De acordo com Conradt e Roper (2005), em sistemas auto-organizados existem 
elementos que apesar de optarem por caminhos diferentes dos da maioria, se filiam e 
orientam pelas regras do coletivo, participando nas decisões de forma consensual, 
embora possam até desviar, ligeira e pontualmente, o rumo do sistema. 
Apesar da extrema sensibilidade às condições iniciais, pode reconhecer-se a identidade 
de uma equipa em momentos distintos do jogo, pela semelhança particular que 
decorre da organização das suas partes e das respetivas interações. Portanto, torna-se 
conveniente que as equipas de Futebol procurem um equilíbrio entre as tendências de 
especialização funcional derivadas da variabilidade de cada jogador, e a integração das 
mesmas no projeto coletivo (Duarte et al. 2012). 
Então, a eficácia de uma equipa de Futebol depende, em larga medida, da 
possibilidade de cada jogador se assumir como um estratego capacitado para integrar 
as suas soluções táticas individuais no projeto coletivo e vice-versa (Garganta & 
Oliveira, 1996). Portanto, não se pretende sustentar a necessidade de uma total 
subordinação das ações individuais às coletivas, em que cada jogador se veja impedido 
de encontrar o espaço necessário para afirmar a sua personalidade, bem como para 
improvisar e criar. 
O importante é que mesmo as iniciativas individuais sirvam, em última instância, os 
propósitos maiores do coletivo. 
 
 
4. TREINAR PARA MELHOR JOGAR 
4.1. Aprender a (re)organizar os saber-fazer 
Um perito é alguém que não tem que 
pensar, porque já sabe! 
Frank Loyd Wright 
 
O ensino e o treino do Futebol encerram uma longa história que convoca jogadores 
com os seus próprios recursos e uma intervenção externa materializada pela 
intervenção do treinador e pela influência do meio ambiente (Garganta, 2006). Através 
deste processo procura-se transmitir e fazer assimilar, ativamente, uma cultura de 
19 
 
jogo, materializada num conjunto de regras de ação e princípios de gestão em relação 
com os diferentes cenários e respetivas probabilidades de evolução (Garganta, 2005). 
Considerando que o confronto desportivo ocorre em contextos de participação 
simultânea e de espaço comum, qualquer comportamento é fortemente condicionado 
do ponto de vista estratégico-tático, com claras implicações no domínio cognitivo. 
Portanto, admite-se que o entendimento da lógica e, nomeadamente, dos desígnios 
que governam o jogo, tenha implicações relevantes nos domínios do treino e do 
controlo da prestação desportiva e influa na conceção e na escolha dos procedimentos 
metodológicos adequados para otimizar a performance (Garganta, 2007). 
Admitimos que, no âmbito do jogo de Futebol, cada equipa partilha uma “gramática da 
ação”, uma linguagem que faz com que um conjunto de jogadores forme um coletivo 
organizado em função de princípios, intenções e significados. Essa linguagem, que 
deverá permitir conciliar consistência e versatilidade, padronização e variabilidade, é 
expressão de uma identidade. Nesta linha de entendimento, não se afigura 
conveniente que o ensino e treino acarretem a uniformização de métodos nem a 
padronização da forma de jogar dos jogadores ou das equipas. Pelo contrário, importa 
fomentar a diversidade e o desenvolvimento, tendo em conta as caraterísticas 
atualizáveis dos intérpretes desportivos, através do recurso a conhecimentos que 
possam disponibilizar informação importante para melhor treinar e jogar. 
A transformação positiva dos níveis de jogo requer a alteração dos conhecimentos e 
das competências dos jogadores. E é para isso que servem a aprendizagem e o treino. 
Contudo, não raramente, as situações de ensino e treino contêm demasiados 
conceitos e objetivos, alguns dos quais confundem o pensamento e estorvam a ação. 
De facto, ninguém consegue movimentar-se devidamente quando leva bagagem em 
excesso. 
O que se pretende é que a transferência entre o efeito de ensino e treino e as 
competências para jogar seja a mais ajustada possível e, por isso, há que buscar 
situações-problema que reproduzam as variáveis características dos cenários de jogo. 
Trata-se, portanto, de amplificar a aplicação e o efeito das denominadas variáveis 
especificadoras. 
No quadro do ensino e treino do Futebol, a literatura sugere que grande destaque 
deve ser dado à expertise cognitiva, na sua relação estreita com os skills tático-
decisionais (para referências, ver Williams & Hodges, 2005 e Garganta, 2006). 
Note-se que o comportamento complexo não implica, forçosamente, estratégias 
mentais complexas por parte dos jogadores (Gigerenzer, 2007; Leher, 2009). Apesar de 
ser conveniente que os jogadores tenham consciência dos seus recursos, visto que a 
ideia que têm de si mesmos influencia a sua capacidade de agir, os saber-fazer 
relativos ao jogo são aprendidos, em grande parte, como se de uma linguagem se 
tratasse. Sendo, sobretudo, um conhecimento tácito, não é de esperar que os 
jogadores consigam explicar as suas decisões nem descrever o capital de soluções 
técnicas e táticas que possuem, tanto mais que as suas soluções e ações emergem a 
partir da interação com os cenários que o jogo propicia. 
20 
 
Como tal, quando nos reportamos à “inteligência de jogo” e à “tomada de decisão”, 
não pretendemos invocar, forçosamente, aptidões conscientes e deliberadas, nem 
tampouco abstratas ou invariáveis. Referimo-nos, sobretudo, a capacidades suscetíveis 
de modificação através de ajustamentos dinâmicos específicos, ou seja, a uma 
“inteligência corporal” dinâmica e atualizável (Garganta, 2007). 
A inteligência para jogar pode ser entendida como a habilidade dos jogadores/equipas 
para reconhecerem os estímulos mais significativos do envolvimento, de modo a se 
adaptarem às diversas situações e agirem em benefício da sua equipa, sobre os 
diferentes ambientes de jogo. Portanto, o jogo propriamente dito decorre do modo 
como se harmonizam os princípios que guiam a organização individual, grupal e 
coletiva, em relação com as ideias ou conceitos que conferem sentido à estratégia e à 
ação tática. 
No Futebol, as situações de oposição são um constrangimento determinante das ações 
dos jogadores, pelo que o jogo deve ser analisado e compreendido em termos de 
relação de forças entre duas equipas (Bayer, 1994). Deste modo, a noção de oposição, 
entre jogadores e equipas, torna-se capital para o entendimento do jogo e para a 
elaboração do modo como o mesmo pode ser ensinado, aprendido e treinado (Figura 
1). 
 
Figura 1. Variáveis que condicionam a organização tática 
(redesenhado de Gréhaigne & Wallian, 2007). 
 
 
4.2. Regras de ação e princípios de gestão da organização do jogo 
 
O jogo de Futebol, porque decorre da natureza do confronto entre dois sistemas 
dinâmicos complexos – as equipas – carateriza-se pela sucessiva alternância de 
estados de ordem e desordem, estabilidade e instabilidade, uniformidade e variedade. 
No domínio das modalidades desportivas situacionais ou estratégicas, as ações dos 
praticantes são realizadas tendo em conta diversos constrangimentos, tais como a 
posição e trajetória da bola, a posição e os deslocamentos dos companheiros e dos 
adversários e as possibilidades de ação do jogador. As habilidades percetivo-cognitivas, 
tais como a antecipação e a tomada de decisão, são cruciais para se alcançar um 
OPOSIÇÃO 
ordem/desordem 
Rutura 
Continuidade 
Recuo 
Avanço 
Risco 
Segurança 
Equilíbrio 
Desequilíbrio 
21 
 
desempenho eficazem ambientes de treino e de competição (Williams, Davids & 
Williams, 1999; Williams, 2002; (Tavares, Greco & Garganta, 2006). 
Trata-se de contextos de elevada incidência estratégico-tática em que as capacidades 
se desenvolvem a partir de blocos de informação integrados, conhecimentos tácitos 
que o jogador percebe como conjuntos de possibilidades. Quando se diz que os 
jogadores têm "sentido da jogada", têm "capacidade de antecipação", está a invocar-
se um conjunto de “habilidades” que, como refere Marina (1995), mais não são do que 
modos eficazes de lidar com grandes blocos de informação. 
Cada sujeito percebe o jogo, as suas configurações, em função das aquisições 
anteriores e do estado presente. Perante o fenómeno jogo, o observador constrói uma 
paisagem de observação, entendida como um conjunto de estímulos organizados face 
ao ponto de vista que ele possui sobre o fenómeno. Ou seja, retém o que se lhe afigura 
pertinente, interpreta os dados dispersos e organiza-os conferindo-lhes um sentido 
próprio, o que quer dizer que o sentido do jogo é construído e depende de um modelo 
de referência (Garganta, 1997). 
Pode dizer-se que a essencialidade do jogo de Futebol decorre de um quadro de 
referências que contempla: (i) o tipo e relação de força entre os efetivos que se 
defrontam; (ii) a variabilidade e a aleatoriedade do contexto em que as ações ocorrem; 
(iii) as caraterísticas das habilidades motoras, para agir em contextos específicos 
(Garganta, 2005). Deste modo, a compreensão dos cenários de jogo e a construção de 
situações para o aprender e exercitar dependem de um entendimento que viabilize a 
representação do respetivo conteúdo, a partir dos constrangimentos típicos inerentes 
às diferentes fases e momentos do jogo. 
Dado que os jogadores e as equipas se confrontam com distintos ambientes de jogo, 
torna-se oportuno que disponham de competências6 para gerirem, em proveito 
próprio, o ataque, a defesa e as mudanças de posse de bola, isto é, as transições. 
Assim, desde os primeiros momentos de aprendizagem, os praticantes deverão 
assimilar princípios que vão desde o modo como cada um se relaciona com a bola, até 
à forma de comunicar com os companheiros e de contra comunicar com os 
adversários. 
No Futebol de alto rendimento, as intervenções sobre a bola por parte dos jogadores 
tendem a apresentar uma estabilidade e uma organização coesa, coerente e 
homogénea (Castelo, 1994). 
As situações de oposição são de tal forma evidentes que o jogo de Futebol pode ser 
perspetivado como uma sequência contingente de fases7 (ofensiva e defensiva) e 
momentos8 (transições ataque-defesa e defesa-ataque). 
As fases do jogo pressupõem, por parte dos jogadores e das equipas, objetivos 
antagónicos: a fase de ataque carateriza-se pelo facto de a equipa ter a bola e procurar 
 
6 Competência – conjunto de conhecimentos, atitudes, procedimentos e habilidades necessários para responder às exigências 
complexas de uma situação (Marina, 2010). 
7 Fase (etapa, estádio) – período com caraterísticas bem definidas. Cada uma das modificações sucessivas que as sequências de 
jogo apresentam. 
8 Momento (ápice, instante) – espaço de tempo muito breve que ocorre entre as fases de jogo. 
 
22 
 
manter a sua posse, no sentido de criar situações de finalização; por outro lado, a fase 
de defesa distingue-se da anterior pelo facto de a equipa não possuir a bola, 
procurando apoderar-se dela, mantendo o equilíbrio coletivo de forma a impedir que 
equipa adversária crie situações de finalização (Bayer, 1994; Garganta & Pinto, 1994). 
O facto de se estar, ou não, em situação de posse de bola condiciona, como nenhum 
outro aspeto do jogo, o comportamento dos jogadores, pois origina que a equipa em 
posse de bola ataque a baliza adversária, ao passo que a equipa que não tem a bola 
deve defender a própria baliza (Hughes, 1990). Atendendo a esta relação antagónica 
entre ataque e defesa, Teodorescu (1984) define as fases de jogo como as etapas 
percorridas no desenvolvimento quer do ataque, quer da defesa, desde o seu início até 
à sua conclusão. O desenvolvimento do ataque e da defesa decorre, então, a partir de 
um conjunto de etapas complementares que devem ser encaradas num contexto de 
relação de forças. 
Ataque e defesa, apesar de se constituírem sob uma verdadeira oposição lógica, 
pressupõem processos complementares; a identificação, nomeação e classificação de 
cada uma das etapas inerentes a uma fase permite a identificação da etapa de sinal 
que lhe corresponde (Castelo, 1994). No entanto, não é estritamente necessário que 
durante a fase ofensiva ou defensiva os jogadores e as equipas tenham de completar 
todas as etapas subjacentes às fases de jogo. Se, por exemplo, um jogador conquista a 
posse de bola perto da baliza defendida pela equipa adversária, encontrando-se num 
situação favorável à marcação de golo, deve obviamente procurar de imediato a 
finalização do ataque. De igual modo, se um jogador perde a posse de bola no seu 
setor defensivo, a equipa deve ter como primeira preocupação defender a baliza, 
impedindo a finalização por parte da equipa adversária. 
Assim, é a alteração da posse de bola que define o momento de passagem da defesa 
para o ataque e do ataque para a defesa. Tendo em conta que ataque e defesa 
pressupõem objetivos diferentes, que se consubstanciam em comportamentos e 
processos distintos, os momentos de mudança da posse de bola, isto é, as transições, 
afiguram-se ocasião ocasiões privilegiadas para se surpreender o adversário. 
Deste modo, para além das fases de jogo – ofensiva e defensiva – é possível identificar 
dois momentos distintos na estrutura do jogo de Futebol: o momento de transição 
defesa-ataque, que se carateriza pelos comportamentos que os jogadores e a equipa 
devem assumir nos instantes imediatos à recuperação da posse de bola; e o momento 
de transição ataque-defesa, caraterizado pelo conjunto de comportamentos 
individuais e coletivos a adotar nos instantes após a perda da posse de bola. 
Adicionalmente, pela sua especificidade e influência no desfecho dos jogos, importa 
também considerar os fragmentos fixos de jogo, comummente designados de lances 
de bola parada. 
 
 
 
 
23 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Figura 2. Fases e momentos do jogo de futebol 
 
4.3. Princípios transversais e princípios especificadores do modelo e da conceção de 
jogo 
No Futebol, o êxito individual e coletivo depende de princípios de jogo, isto é, de um 
conjunto de regras de ação e de gestão do jogo que definem as propriedades 
invariáveis sobre as quais se estrutura o desenvolvimento dos acontecimentos do jogo 
(Bayer, 1994; Gréhaigne, 1992). Tais referências orientam o comportamento dos 
jogadores na procura de soluções mais eficazes nas diferentes fases e momentos do 
jogo (Garganta & Pinto, 1994), pelo que quanto mais ajustada e qualificada for a 
aplicação dos princípios táticos durante o jogo, melhor poderá ser o desempenho da 
equipa ou do jogador na partida (Costa, Silva, Greco & Mesquita, 2009). 
Como tal, afigura-se pertinente perspetivar a hierarquização dos princípios de jogo em 
função do seu grau de especificidade. Seguindo esta lógica, as ações dos jogadores 
podem ser estruturadas em função de princípios fundamentais e específicos: 
 Os princípios fundamentais reportam-se à relação numérica entre os jogadores da 
própria equipa e os adversários no centro do jogo, ou seja, onde está a bola. 
Podem ser resumidos da seguinte forma: nas zonas de disputa da bola, uma equipa 
deve procurar criar situações de superioridade numérica, evitar situações de 
igualdade numérica e rejeitar a condição de inferioridade numérica. (Hainaut & 
Benoit, 1979; Queiroz, 1983; Garganta & Pinto, 1994); 
 Os princípios específicos representam um conjunto de regras de base que orientam 
as açõesdos jogadores e da equipa ao longo das fases e dos momentos do jogo – 
defesa, ataque e transições – com o objetivo de criar desequilíbrios na organização 
da equipa adversária, estabilizar a organização da própria equipa e proporcionar 
aos jogadores uma intervenção ajustada no jogo. Estes princípios ocorrem de 
acordo com uma lógica de luta de opostos, isto é, para cada um dos quatro 
princípios do ataque (penetração, cobertura ofensiva, mobilidade, espaço) existem 
Ataque Defesa 
Transição Ataque-Defesa 
Transição Defesa-Ataque 
Recuperação da posse de bola 
Perda da posse de bola 
24 
 
outros tantos da defesa (contenção, cobertura defensiva, equilíbrio, concentração) 
que visam dar resposta a objetivos antagónicos (Queiroz, 1983; Garganta & Pinto, 
1994). 
 
Quadro 1. Princípios transversais (fundamentais e específicos) do jogo de futebol (adaptado de 
Worthington, 1974; Hainaut & Benoit, 1979; Queiroz, 1983; Garganta & Pinto, 1994; Costa et al., 2009) 
 Ataque 
(em posse de bola) 
Defesa 
(sem posse de bola) 
P
ri
n
c
íp
io
s
 
F
u
n
d
a
m
e
n
ta
is
 
Procurar criar superioridade numérica 
Evitar a igualdade numérica 
Recusar a inferioridade numérica 
P
ri
n
c
íp
io
s
 
E
s
p
e
c
íf
ic
o
s
 
Penetração 
 
Atacar diretamente o adversário ou a 
baliza; 
Desequilibrar a organização defensiva 
adversária; 
Criar situações vantajosas para o ataque 
em termos numéricos e espaciais. 
Contenção 
 
Parar ou atrasar o ataque adversário; 
Propiciar tempo para a organização defensiva; 
Diminuir o espaço de ação do portador da 
bola; 
Orientar a progressão do portador da bola; 
Restringir opções de passe para um 
adversário; 
Impedir a finalização. 
 
Cobertura ofensiva 
 
Garantir a manutenção da posse de bola. 
Dar apoio ao portador da bola, oferecendo-
lhe opções para dar sequência ao jogo; 
Diminuir a pressão adversária ao portador 
da bola; 
Criar superioridade numérica; 
Induzir desequilíbrio na organização 
defensiva adversária; 
 
Cobertura defensiva 
 
Servir de novo obstáculo ao portador da bola, 
caso este ultrapasse o jogador que fazia 
contenção; 
Transmitir segurança e confiança ao jogador 
de contenção, para que se afoite na disputa 
pela bola. 
Mobilidade 
 
Criar ações de rotura na organização 
defensiva adversária; 
Aparecer em zonas propícias para a 
obtenção de golo; 
Criar linhas de passe em profundidade. 
Equilíbrio 
 
Assegurar a estabilidade defensiva nas zonas 
de disputa pela bola; 
Apoiar os companheiros que executam as 
ações de contenção e cobertura defensiva; 
Cobrir eventuais linhas de passe; 
Marcar jogadores que podem receber a bola 
 
Espaço 
 
Ampliar o espaço de jogo efetivo; 
Expandir as distâncias entre os 
adversários; 
Dificultar as marcações defensivas da 
equipa adversária; 
Facilitar as ações ofensivas da própria 
equipa; 
Dar sequência ao jogo, procurando opções 
seguras para a manutenção da posse de 
bola. 
Concentração 
 
Aumentar a proteção à baliza; 
Orientar o jogo ofensivo adversário para zonas 
de menor risco no espaço de jogo; 
Propiciar o aumento da pressão sobre a zona 
de disputa da bola. 
 
 
25 
 
Convém no entanto realçar que o cumprimento destes princípios transversais, ou seja, 
os, fundamentais e os específicos, apenas assegura os pressupostos básicos da 
organização coletiva e individual, tal como o cumprimento das regras de trânsito pode 
levar a uma circulação mais segura e adequada aos interesses de cada condutor. 
Todavia, assim como o conhecimento e a observância do código da estrada não coage 
os automobilistas a obedecerem a um mesmo estilo de condução nem os impele a 
dirigirem-se todos para o mesmo destino, também a obediência aos princípios de jogo 
não compromete as equipas nem os jogadores quanto às formas de jogar que 
entendam mais convenientes para levarem a cabo os seus planos de ação. Pelo 
contrário, trata-se de garantir condições essenciais para operacionalização eficaz de 
uma determinada forma de jogar, independentemente do modelo e conceção que 
cada equipa entenda adotar. 
Portanto, tais princípios assumem uma centralidade quanto à adoção de boas práticas 
para o ensino e o treino do jogo. Neste âmbito, torna-se conveniente que equipas e 
jogadores tenham ideias claras sobre os modos como devem gerir as diferentes fases e 
momentos, de acordo com a cascata de objetivos que vai sucedendo à medida que o 
jogo acontece. Ou seja, do ponto de vista ofensivo: construir ações ofensivas, criar 
situações de finalização e finalizar; e do ponto de vista defensivo: recuperar a posse da 
bola, reduzir o espaço de jogo do adversário, anular as situações de finalização e 
proteger a baliza. 
 
5. DOS JOGOS AO JOGO 
Quando alguma coisa é alguma coisa, 
deixa logo de ser as outras todas, e isso é uma pena. 
O que é preciso é ser tudo ao mesmo tempo 
Agostinho da Silva 
 
5.1. Construção de cenários de treino: (Gr+4)x(4+Gr), uma estrutura a privilegiar 
 
A complexidade do jogo de Futebol, originada, entre outras coisas, pelas relações de 
cooperação e de oposição entre os jogadores, pela extensão do espaço de jogo e pela 
aleatoriedade dos acontecimentos (Dunning, 1994; Garganta, 1997; Garganta & Cunha 
e Silva, 2000), coloca um conjunto de problemas que devem ser equacionados de 
modo a apontar os caminhos mais racionais para o desenvolvimento do processo de 
ensino e aprendizagem dos jovens jogadores. 
Do ponto de vista didático, existe convergência quanto às perspetivas que salientam 
que o ensino do jogo deve contemplar um progressivo aumento da complexidade dos 
conteúdos (Queiroz, 1986, Garganta & Pinto, 1994; Rink, French & Tjeerdsma, 1996). 
Assentam neste pressuposto as etapas de aprendizagem de referência, assim 
designadas: eu-bola, eu-bola-adversário, eu-bola-colega-adversário, eu-bola-colegas-
adversários e eu-bola-equipa-adversários. 
26 
 
Estas diferentes etapas de aprendizagem colocam ênfase no ensino do jogo a partir do 
(Gr+1)x(1+Gr), (Gr+2)x(2+Gr), (Gr+3)x(3+Gr), passando pelas diferentes estruturas 
funcionais9 subsequentes, até se chegar ao (Gr+10)x(10+Gr). 
Se nos detivermos nos conteúdos abordados nestes diferentes níveis de complexidade, 
poderemos concordar com esta opção didática, embora nos devamos manter abertos 
às adaptações que se justificarem ao longo do processo de ensino. Contudo, neste 
aumento progressivo de complexidade, importa enquadrar os níveis de dificuldade 
inerentes. Queremos com isto dizer que no ensino do jogo de Futebol, no que diz 
respeito às estruturas funcionais, nível de complexidade e grau de dificuldade não são 
noções equivalentes. 
O aumento da complexidade decorre, entre outros constrangimentos, do maior 
número de intervenientes em jogo e consequentemente das interações que daí podem 
advir. À medida que a quantidade de interações aumenta, também a complexidade 
funcional pode aumentar, se a qualidade dos intervenientes e a dinâmica criada assim 
o permitirem. 
Porém, a aptidão para jogar em determinada estrutura funcional está também 
intimamente relacionada com as capacidades técnicas e o nível de entendimento do 
jogo que os jogadores evidenciam. Isto é, os défices técnicos e táticos que os 
principiantes manifestam, obstam à fluência do próprio jogo, mesmo que a sua 
complexidade estrutural seja reduzida. Queremos com isto salientar que estruturas 
funcionais pouco complexas, mas que requisitem permanentes e ajustadas 
intervenções técnicas dos jogadores para garantirem a continuidade do jogo, podem, 
paradoxalmente, apresentar maior grau de dificuldade do que organizações estruturais 
mais complexas, que não estejam tão dependentes da proficiência técnica dos 
praticantes. 
A estrutura (Gr+1)x(1+Gr), teoricamente a estrutura menos complexa que os exercícios 
competitivos do jogo de futebol podem assumir, é um bom exemplo do que acabamos 
de referir. Nesta situação, solicita-se ao atacante que progrida para marcar golo,

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