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- -1 Consumidor e fornecedor Introdução As relações de consumo são muito importantes para a geração de riqueza na sociedade. De um lado, os fornecedores e, de outro, os consumidores realizando transações o tempo todo. Quais as normas gerais que regulam essas transações? Existe algum conceito jurídico que defina o consumidor? Quais são as normas que tutelam essa relação e por qual motivo o Direito tem um olhar próprio para o consumo? Para responder essas perguntas, devemos compreender os conceitos de consumidor e fornecedor, nosso objeto de estudo neste tema. Ao final desta aula, você será capaz de: • identificar as figuras centrais da relação de consumo, analisando as suas características e responsabilidades legais. Princípios gerais que incidem nas relações de consumo As relações de consumo possuem regulação própria pelo Direito, cujas regras mais relevantes se encontram no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990), o qual representou um grande avanço e conquista para a sociedade brasileira à medida que concretizou as diretrizes constitucionais de subordinação da iniciativa econômica ao respeito aos consumidores (art. 170, V da CF/88). Figura 1 - Proteção ao consumidor como principal missão do CDC Fonte: Zoriana Zaitseva, Shutterstock, 2018. O Código de Defesa do Consumidor tem por objetivo concretizar a Política Nacional das Relações de Consumo, • - -2 O Código de Defesa do Consumidor tem por objetivo concretizar a Política Nacional das Relações de Consumo, buscando harmonia nas relações consumeristas, transparência, respeito às necessidades e direitos dos consumidores (art. 4º do CDC). Para tanto, o CDC estabelece um conjunto de princípios jurídicos que são os balizadores e norte de todas as práticas comerciais. Nesse sentido, conheça na tabela a seguir os princípios mais relevantes do CDC. Tabela 1 - Princípios do Código de Defesa do Consumidor Fonte: Elaborada pelo autor (2018). A interpretação e aplicabilidade de cada um desses princípios é uma das principais missões daquele que atua no mercado, sendo lesiva qualquer prática comercial que viole os princípios citados. Além disso, conforme Nunes (2012), o CDC é uma lei principiológica, o que significa dizer que se aplica a toda e qualquer relação jurídica de consumo, mesmo que o tema tenha legislação própria. Dessa forma, disposições e regras de uma lei infraconstitucional específica que conflitem com as normas e princípios do CDC perdem sua aplicabilidade, sujeitando-se ao Código do Consumidor (NUNES, 2012). Conceito de fornecedor A aplicabilidade dos princípios do Código de Defesa do Consumidor exige a compreensão dos conceitos de consumidor e fornecedor para a correta caracterização de uma relação de consumo. Nesse sentido, pode-se afirmar que é fornecedor, para fins de definição legal do CDC, qualquer pessoa que executa atividade de produção, montagem ou transformação de um produto que será distribuído ou comercializado, seja pessoa jurídica ou física, privada ou pública, nacional ou internacional (art. 3º do CDC). - -3 Figura 2 - Fornecedor é todo aquele que comercializa ou distribui um produto Fonte: Nestor Rizhniak, Shutterstock, 2018. Ademais, define-se como produto todo e qualquer bem que atende a uma necessidade do consumidor, seja bem material ou imaterial, móvel ou imóvel (art. 3º, § 1º do CDC). Portanto, todo aquele que atua como um agente econômico no mercado de consumo, seja de forma eventual ou habitual, entregando ao consumidor produto ou serviço que visa a atender uma necessidade específica desse consumidor, com a finalidade de auferir ganho financeiro ou possui interesse comercial, caracteriza-se como fornecedor para os fins legais (MIRAGEM, 2016). Conceito de consumidor Se, por um lado, o conceito de fornecedor não nos parece ter maior complexidade, por outro lado, o conceito de consumidor é bastante controverso e tem contornos menos definidos, a despeito da regulação do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, analisando as disposições do CDC, constata-se que consumidor é definido como toda pessoa que é destinatária final, seja pessoa física ou jurídica, de um produto/serviço adquirido ou utilizado (art. 2º do CDC). FIQUE ATENTO Quando utilizamos a expressão “produto” para qualquer discussão que envolve relações de consumo, nessa expressão está incluído também qualquer tipo de prestação de serviço, inclusive atividades bancárias, financeiras, de crédito e de seguro, com exceção apenas das atividades decorrentes de relação de emprego (art. 3º, § 2º do CDC). - -4 Figura 3 - Consumidor é o destinatário final de um produto ou serviço Fonte: Syda Productions, Shutterstock, 2018. A principal questão que surge na análise e interpretação dessa definição de consumidor reside na dificuldade de explicar o que significa ser “destinatário final”, questão esta que motiva um debate entre duas teorias, conhecidas como Teoria Finalista e Teoria Maximalista. Por essa razão, para uma compreensão precisa do conceito de consumidor, é necessário analisarmos cada uma dessas teorias. Acompanhe! Interpretação maximalista do conceito de consumidor A Teoria Maximalista aborda o conceito de consumidor de forma ampliada, entendendo que é consumidor todo aquele que adquire um produto/serviço, seja para finalidade privada ou econômica. Nesse sentido, uma empresa que compra computadores para sua atividade produtiva é entendida como consumidor (MIRAGEM, 2016). Interpretação finalista do conceito de consumidor A Teoria Finalista sustenta, ao contrário, que o destinatário final de um produto ou serviço é apenas o usuário que consome para atender uma finalidade própria e de cunho privado, não econômica, ou seja, não visa ao lucro com o produto/serviço; não sendo consumo uma atividade profissional, pois o produto/serviço não deve ser insumo de processo produtivo nem objeto de revenda (MIRAGEM, 2016). Logo, essa corrente de interpretação exclui a possibilidade de entender qualquer pessoa jurídica como consumidor, visto sua atividade de consumo sempre ter como objetivo a lucratividade. Contudo, essa interpretação, conhecida como Finalista Pura, tem sido revisitada pela jurisprudência do STJ, que tem desenvolvido a chamada Teoria Finalista Aprofundada, a qual considerada o porte do consumidor pessoa jurídica como um elemento relevante na análise quanto ao seu enquadramento no conceito de destinatário final, que passa a ser analisado caso a caso (MARQUES, 2006). - -5 Portanto, para a interpretação aprofundada da Teoria Finalista, se o comprador se encontra em situação de vulnerabilidade técnica, fática ou jurídica, também estamos diante de um consumidor para fins de aplicação do CDC, interpretação esta que tem sido a majoritária na doutrina e jurisprudência nacional. O consumidor equiparado O CDC amplia o conceito de consumidor criando a figura do consumidor equiparado, ao estabelecer que é consumidor a coletividade de pessoas, mesmo que indetermináveis, se impactadas pelas relações de consumo (art. 2º, único do CDC).§ Nesse sentido, todo aquele que for exposto às práticas comerciais e consumeristas pode ser entendido como consumidor, em sentido equiparado (art. 29 do CDC). Hipossuficiência do consumidor Como vimos, a vulnerabilidade é o elemento-chave que caracteriza o consumidor. Desse conceito decorre outro muito relevante: o conceito de hipossuficiência. A diferença entre vulnerabilidade e hipossuficiência reside no fato de que a última tem cunho processual e técnico, sendo o fundamento da inversão do ônus da prova (NUNES, 2012). FIQUE ATENTO O STJ, em julgamento realizado em 2013, afirmou que a jurisprudência da Corte tem mitigado os rigores da Teoria Finalista para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses em que a parte (pessoa física ou jurídica), embora não seja tecnicamente a destinatária final do produto ou serviço, está em situação de vulnerabilidade (STJ, AgRg Resp 1149195, 01/08/2013). EXEMPLO O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro considerou aplicável o conceito de consumidor porequiparação a situação de inclusão de nome do autor em cadastro de negativação de crédito, mesmo que este não tenha celebrado negócio com a recorrente, por ter sido impactado pela relação de consumo devido à falta de cuidado da recorrente (TJ-RJ, Apelação 200900133093, 10/07/2009). - -6 Nesse sentido, quando, em um caso concreto, é demonstrada a incapacidade de o consumidor se defender, por exemplo, no caso de questionar uma informação que só foi gravada pelo fornecedor no momento da oferta, o juiz estabelece a inversão do ônus da prova, por ser a alegação de incapacidade do consumidor verossímil e sem a inversão do ônus da prova ser impossível sua defesa (art. 6º, VIII do CDC). Fechamento Neste tema, vimos os princípios que orientam a intepretação jurídica de todas as relações de consumo, as definições jurídicas de fornecedor e consumidor, bem como entendemos o conceito-chave de hipossuficiência do consumidor. Nesta aula, você teve a oportunidade de: • identificar as figuras centrais da relação de consumo, analisando as suas características e responsabilidades legais. Referências BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < >. Acesso em: 23/06/2018.http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm ______. . Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: < >. Acesso em: 23/06/2018.http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8078.htm GIDI, A. Aspectos da inversão do ônus da prova no código do consumidor. ,Revista de Direito do Consumidor São Paulo, n. 13, 1995. MARQUES, C. L. . 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.Contratos no Código de Defesa do Consumidor MIRAGEM, B. . 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.Curso de direito do consumidor NUNES, R. . 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.Curso de Direito do Consumidor SAIBA MAIS A vulnerabilidade é um conceito absoluto, enquanto a hipossuficiência é relativa, devendo ser avaliada no caso concreto pelo julgador com base na demonstração de que o consumidor não tem capacidade técnica de comprovar os fatos alegados (art. 6º, VIII do CDC). Para saber mais, leia: “Aspectos da inversão do ônus da prova no código do consumidor”, de Gidi (1995). • http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8078.htm Introdução Princípios gerais que incidem nas relações de consumo Conceito de fornecedor Conceito de consumidor Interpretação maximalista do conceito de consumidor Interpretação finalista do conceito de consumidor O consumidor equiparado Hipossuficiência do consumidor Fechamento Referências
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