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DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LOUCURA À REFORMA PSIQUIÁTRICA as sete vidas da agenda pública em saúde mental no brasi

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07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 1/24
Estudos de Sociologia, v. 1, n. 18 (2012)
DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA LOUCURA À
REFORMA PSIQUIÁTRICA: as sete vidas da
agenda pública em saúde mental no brasil
1
FROM INSTITUTIONALIZATION OF MADNESS
TO PSYCHIATRIC REFORM: THE SEVEN LIVES
OF THE PUBLIC AGENDA ON MENTAL HEALTH
IN BRAZIL
Eliane Maria Monteiro da Fonte
_______________________________________________________________________
Resumo
Este artigo tem por objetivo examinar, de forma sucinta,
a estruturação das políticas de saúde mental no Brasil,
desde os seus primórdios até o período atual. As
políticas de saúde mental são aqui consideradas como
um acordo político-jurídico que se estabelece numa
determinada sociedade sobre a concepção e respostas
aos problemas da loucura/doença mental. Com base
em fontes secundárias e em trabalhos de terceiros,
buscou-se esboçar as principais tendências na trajetória
das políticas para esse setor, que tem sua origem em
1830, com o projeto de medicalização da loucura e se
materializa com a criação dos primeiros hospícios para
alienados, no final da segunda metade do século XIX,
culminando no processo que se convencionou chamar
de reforma psiquiátrica, no final do século XX. Este
exercício sobre a história da agenda pública no cuidado
com a saúde mental no Brasil nos permitiu identificar
sete fases nessa trajetória, as quais são discutidas por
etapa desta evolução, apresentando ao final algumas
das principais tendências nas políticas de saúde mental
no Brasil na atualidade.
Palavras-chave
Loucura. Políticas de Saúde Mental. Instituição
Psiquiátrica. Reforma Psiquiátrica.
________________________________________________________________________
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 2/24
Abstract
This article aims to analyse, briefly, the structuring of
mental health policies in Brazil, from its beginnings to
the current period. The mental health policies are
considered here as a legal-political agreement that is
established in a particular society on the conception and
answers to the problems of madness/mental illness.
Based on secondary sources and other’s studies, we
attempted to outline the main trends in the trajectory of
policies for this sector, which has its origin in 1830, with
the project medicalization of madness and it is
materialized with the creation of the first hospices for
the insane, at the end of the second half of the
nineteenth century, culminating in what has been called
the psychiatric reform, in the late twentieth century. This
exercise on the history of the public agenda in mental
health care in Brazil allowed us to identify seven phases
in this trajectory, which are discussed by stages of this
evolution, presenting at the end some of the main
trends in mental health policies in Brazil today.
Keywords
Madness. Mental Health Policy. Psychiatric Institution.
Psychiatric Reform.
Introdução
A construção da loucura como doença mental e a
propagação de instituições asilares especialmente
destinadas aos alienados, assinalando “a formulação de
políticas públicas de tratamento e/ou repressão dos
doentes mentais, identificados com base nos limites
cada vez mais abrangentes da anormalidade”,
distingue-se como um processo desencadeado no Brasil
entre os anos 1830 e os anos 1920, marcado por
continuidades e descontinuidades (ENGEL, 2001, p.
330). Este artigo, de caráter exploratório, baseado em
fontes secundárias e em trabalhos de terceiros, tem por
objetivo examinar, de forma sucinta, a estruturação e
transformações das políticas de saúde mental no Brasil,
desde os seus primórdios até o período atual. As
políticas de saúde mental são aqui consideradas como
um acordo político-jurídico que se estabelece numa
determinada sociedade sobre a concepção e respostas
aos problemas da loucura/doença mental. O foco da
análise são as transformações da instituição psiquiátrica
no Brasil, constituída historicamente em seu modelo
asilar como o lugar de confinamento e tratamento
especialmente destinado aos loucos. O que se
convencionou denominar como “reforma psiquiátrica”,
que está em curso no país nos últimos 35 anos, poderia
deixar transparecer a ideia de reformas que
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 3/24
caracterizam os rearranjos institucionais sem
transformá-los em sua essência. Entretanto, este é um
processo multifacetado e muito mais complexo do que a
mera reorganização dos serviços de assistência em
saúde mental, extrapolando o campo da psiquiatria
enquanto um saber-fazer especializado (AMARANTE,
1998b). O caráter abrangente e radical que dá
significado a essa expressão se deve aos
desdobramentos que o processo de reforma psiquiátrica
adquire, a partir de 1978, como um movimento social
de base ao adotar o lema “Por uma sociedade sem
manicômios”,
[...] que significou abraçar a
bandeira da eliminação
progressiva dos hospitais
psiquiátricos e sua
substituição por outros tipos
de equipamentos
comunitários, territorialmente
circunscritos e voltados para
a inserção social dos
usuários, como passam a ser
chamados os “doentes
mentais”, no contexto de
recuperação de sua
cidadania, identidade e
condições de sujeitos
(PASSOS, 2009a, p. 159).
Não se pretende empreender aqui uma exaustiva
reconstituição histórica das práticas de cuidados à
loucura, entendida também como “um tipo especial de
existência-sofrimento, que faz apelo a saberes
especializados para seu alívio” 
2
, mas esboçar as
principais tendências na trajetória das políticas de saúde
mental no Brasil. Este exercício sobre a história da
agenda pública no cuidado com a saúde mental nos
permitiu identificar sete fases nessa trajetória, as quais
são discutidas a seguir, por etapa desta evolução. Na
seção final são apresentadas algumas das principais
tendências nas políticas de saúde mental no Brasil na
atualidade, apontando os progressos nos modelos de
cuidados que estão sendo criados, mas também as
dificuldades e obstáculos que ainda persistem.
1. A institucionalização da loucura no Brasil
A loucura só vem a ser objeto de intervenção por parte
do Estado no início do século XIX, com a chegada da
Família Real ao Brasil, depois de ter sido socialmente
ignorada por quase trezentos anos. Nesse período de
modernização e consolidação da nação brasileira como
um país independente, passa-se a ver os loucos como
“resíduos da sociedade e uma ameaça à ordem
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 4/24
pública”. Aos loucos que apresentassem
“comportamento agressivo não mais se permitia
continuar vagando nas ruas, principalmente quando sua
situação socioeconômica era desfavorável, e “seu
destino passou a ser os porões das Santas Casas de
Misericórdia, onde permaneciam amarrados e vivendo
sob péssimas condições de higiene e cuidado”
(PASSOS, 2009a, p. 104).
Em 1830, a recém-criada Sociedade de Medicina e
C irurgia lança uma nova palavra de ordem: “aos loucos
o hospício”. Para Machado (1978, p. 376), só é possível
compreender o nascimento da psiquiatria brasileira a
partir da medicina que incorpora a sociedade como
novo objeto e se impõe como instância de controle
social dos indivíduos e da população. O hospício,
considerado na época o principal instrumento
terapêutico da psiquiatria, aparece como exigência de
uma critica higiênica e disciplinar às instituições de
enclausuramento e ao perigo presente em uma
população que começa a ser percebida como desviante,
a partir de critérios que a própria medicina social
estabelece.
O projeto de medicalização da loucura, esboçadas nos
textos médicos deste período, que defendiam novos
parâmetros para a loucura e a necessidade de reclusão
dos loucos, começaria a ser concretizado a partir da
criação dos primeiros hospícios nas décadas seguintes.
Entretanto, as funções saneadoras dos primeiros
hospitais psiquiátricos fornecem às origensda
assistência psiquiátrica brasileira um caráter bastante
peculiar, que é “o da precedência da criação de
instituições destinadas especificamente para abrigar
loucos sobre o nascimento da psiquiatria3, enquanto
corpo de saber médico especializado” (RESENDE, 2007,
p. 39).
Pode-se situar o marco institucional da assistência
psiquiátrica brasileira com a fundação do primeiro
hospital psiquiátrico, o Hospício D. Pedro II,
explicitamente inspirado no modelo asilar francês
(elaborado por Pinel e Esquirol), que ocorreu em 1852,
no Rio de Janeiro. De acordo com Machado (1978, p.
431), o isolamento foi uma “característica básica do
regime médico e policial do Hospício Pedro II” e era o
próprio hospício, concebido como o lugar do exercício
da ação terapêutica, que deveria realizar a
transformação do alienado. Nesse primeiro momento, o
isolamento em relação à família é prioritário e
indispensável apenas para um tipo especifico de louco:
o caso do louco que vaga pela rua, pois a família pobre
não tem possibilidade alguma de garantir a segurança e
o tratamento. Para famílias ricas, que quisessem
manter junto dela o alienado, o internamento não
deveria ser imposto, pois, ainda que com limitações,
acreditava-se que ela poderia reproduzir um hospício no
interior de sua ampla residência.
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 5/24
Durante o Segundo Reinado (1840-1889), foram criadas
outras instituições, que se denominavam “exclusivas
para alienados” em São Paulo (1852), Pernambuco
(1864), Pará (1873), Bahia (1874), Rio Grande do Sul
(1884) e Ceará (1886).4 Conforme aponta Resende,
...as primeiras instituições
psiquiátricas surgiram em
meio a um contexto de
ameaça à ordem e à paz
social, em resposta aos
reclamos gerais contra o livre
trânsito de doidos pelas ruas
das cidades; acrescentem-se
os apelos de caráter
humanitário, as denúncias
contra os maus tratos que
sofriam os insanos. A recém-
criada Sociedade de Medicina
engrossa os protestos,
enfatizando a necessidade
dar-lhes tratamento
adequado, segundo as teorias
e técnicas já em prática na
Europa (RESENDE, 2007, p.
38).
Entretanto, a ênfase no caráter religioso e caritativo das
instituições criadas durante este período acabaria por
restringir o caráter medicalizado destes hospícios, onde,
até o fim do Império, não havia presença significativa
de médicos. Não só a nosologia psiquiátrica estava
ausente das instituições, como também eram leigos os
critérios de seleção dos pacientes, a juízo da autoridade
pública em geral. Os poucos médicos existentes nas
instituições tinham pouca influência nas questões
administrativas e, somente no início do século XX, os
médicos conseguiram desmontar as poderosas
administrações leigas das Santas Casas, bem como as
ordens religiosas que prestavam serviços nestes locais,
instalando-se na direção dessas instituições (ENGEL,
2001; ODA e DALGARRONDA, 2005).
[...] por mais parciais e
ambíguas que tenham sido as
primeiras conquistas dos
alienistas brasileiros, elas
estiveram pautadas, desde o
início, na ampliação do
significado da moléstia mental
que, ultrapassando em muito
os limites da loucura
associada ao delírio,
procurava legitimar a
reclusão de indivíduos que
manifestassem os mais
diversos comportamentos
considerados moral e/ou
socialmente perigosos, ao
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 6/24
mesmo tempo em que
viabilizava as perspectivas de
ampliação de poder do
alienista (ENGEL, 2001, p.
331).
Nas análises dos relatórios dos presidentes das
províncias estudadas, Oda e Dalgarronda (2005, p.
1005) identificam “uma clara contradição entre o
discurso que enunciava um projeto de assistência oficial
e moderno aos loucos e uma prática realmente
efetivada”. De fato tratava-se de pessoas pobres
submetidas a uma reclusão forçada e a péssimas
condições de vida. Nos documentos analisados por
estes autores há claras indicações da existência de
pressão para internação dos portadores de transtorno
mental, de sua retirada das ruas, ação operacionalizada
através das autoridades policiais. Para eles, o processo
de institucionalização dos alienados no Brasil foi
marcado pela construção de uma opinião pública
consensual quanto à necessidade e legitimidade de sua
reclusão em hospícios próprios.
2. A medicalização da loucura
Com o advento da República, em 1889, tem início um
período que se caracteriza pelo “redimensionamento
das políticas de controle social, cuja rigidez e
abrangência eram produzidas pelo reconhecimento e
pela legitimidade dos novos parâmetros definidores da
ordem, do progresso, da modernidade e da civilização”
(ENGEL, 2001, p. 331). Asilo de alienados, quartel de
polícia, hospital psiquiátrico, hospício, asilo de
mendicidade e casa de correção tinham como função
principal realizar a exclusão social do louco, garantindo
que ele não ficasse perambulando pela rua, à vista dos
passantes, o que era incompatível como nosso pretenso
grau de civilidade. Entretanto, se os arranjos realizados
nas distintas unidades da Federação foram
diferenciados, uma tendência geral serviu de pano de
fundo para todas as respostas distintas e práticas
diferenciadas no tratamento da loucura pelo poder
público: a exclusão em instituições asilares de milhares
de ‘homens livres’, “onde só aguardavam o dia de sua
morte, encarcerados nesses imensos cemitérios dos
vivos” (JABERT, 2005, p. 714).
Em 1890, o Hospício Pedro II é desvinculado da Santa
Casa, ficando subordinado à administração pública,
passando a denominar-se Hospício Nacional de
Alienados, primeira instituição pública de saúde
estabelecida pela República. Para Resende,
Pode-se estabelecer
grosseiramente o período
imediatamente posterior à
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 7/24
proclamação da república
como o marco divisório entre
a psiquiatria empírica do vice-
reinado e a psiquiátrica
científica, a laicização do
asilo, a ascensão dos
representantes da classe
médica ao controle das
instituições e ao papel de
porta-vozes legítimos do
Estado, que avocara a si as
atribuições da assistência ao
doente mental, em questões
de saúde e doença mental tal
como a gravidade da situação
exigia (RESENDE, 2007, p.
43).
Nesse período, a loucura é gradativamente
medicalizada e o tratamento psiquiátrico continua a ter
como principal fundamento o isolamento do louco da
vida social. “Os hospícios e as colônias agrícolas,
destinadas aos loucos curáveis, para tratamento
através da práxis ou da ergoterapia, foram surgindo e
se multiplicando pelos principais centros urbanos do
país como ícones de sua modernização” (PASSOS,
2009a, p. 107). Para Amarante (1998a, p. 76), “este
conjunto de medidas caracterizam a primeira reforma
psiquiátrica no Brasil, que tem como escopo a
implantação do modelo de colônias de assistência aos
doentes mentais” 
5
.
Nesta época, a maioria dos Estados brasileiros
incorpora colônias agrícolas à sua rede de oferta de
serviços, seja como complemento aos hospitais
psiquiátricos tradicionais, seja como opção única ou
predominante. De acordo com Resende (2007, p. 47), o
entusiasmo na adesão “à política de construção de
colônias agrícolas não se deu apenas por exclusão de
outras estratégias terapêuticas, de eficiência duvidosa,
mas por ter encontrado um ambiente político e
ideológico propícia ao seu florescimento”.
Como a prática psiquiátrica
não existe num vazio social,
era de se esperar que ela
assimilasse aos seus critérios
de diferenciação do normal e
do patológico os mesmos
valores da sociedade onde se
inseria, e se empenhasse em
devolver à comunidade
indivíduos tratados e curados,
aptos para o trabalho. O
trabalho passou a ser ao
mesmo tempo meio e fim do
tratamento (RESENDE, 2007,
p. 47).
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 8/24
Entretanto, apesar das intenções de recuperação dos
doentes mentais, nas propostas de seus criadores, as
colôniascontinuaram a manter na prática a mesma
função que caracterizava a assistência ao alienado no
Brasil desde a sua criação: a de excluir o louco de seu
convívio social e de escondê-lo dos olhos da sociedade.
Este período, que se encerra em 1920, mantém
“inalterada a destinação social do hospital psiquiátrico a
despeito da substituição da psiquiatria empírica pela
cientifica” (RESENDE, 2007, p. 52) e se destaca pela
ampliação do espaço asilar.
3. Da higiene mental à psiquiatria
comunitária
A década de 1920 é marcada pela “ampliação e o
aprofundamento da influência dos princípios eugênicos
no âmbito da psiquiatria brasileira, que sem romper
com os referenciais organicistas, passaria a
caracterizar-se, cada vez mais, pela presença de
perspectivas preventistas” (ENGEL, 2001, p. 175). Em
1923, com a fundação da Liga Brasileira de Higiene
Mental (LBHM), se cristaliza o movimento de higiene
mental, como um programa de intervenção no espaço
social com características marcadamente eugenistas,
xenofóbicas, antiliberais e racistas. A psiquiatria passa
também a pretender a recuperação das raças e a
constituição de coletividades sadias, colocando-se
definitivamente em defesa do Estado, levando-o a uma
ação rigorosa de controle social e reivindicando um
maior poder de intervenção (AMARANTE, 1998a, p. 78).
As palavras de ordem da Liga eram “controlar, tratar e
curar” e os fenômenos psíquicos eram vistos como
produtos da raça ou do meio, decorrentes de obscuros
fatores biológicos ou orgânicos. A visão da vertente
mais radical da Liga, liderada por Gustavo Riedel, seu
fundador, guiava-se por um princípio moralizador e
saneador dos comportamentos, pregando a pureza da
raça ainda que fosse à custa da esterilização dos
“tarados e degenerados”. A vertente higienista
propunha melhorias sanitárias e modificação dos
costumes e dos modos de vida da população como
forma de prevenir as doenças mentais, pois embora
tivessem origem em fatores individuais, as condições
sanitárias, tais como “o aumento do alcoolismo e da
sífilis”, eram consideradas como “fatores
desencadeantes” (COSTA, 1989 apud PASSOS, 2009a,
p. 108).
De acordo com Venâncio (2007), as ações político-
assistenciais para a área da psiquiatria, iniciadas na
década de 1940, foram organizadas no contexto de um
processo de modernização, centralização e
nacionalização da assistência mais ampla em saúde.
Esse processo foi iniciado em 1930, articulado a uma
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 9/24
reforma das políticas de saúde, com a criação de
serviços nacionais por doenças produzindo uma
verticalização das ações, atreladas a enfermidades
especificas. Em 1941, foi criado o Serviço Nacional de
Doenças Mentais (SNDM), vinculado ao Ministério da
Educação e Saúde6. Neste período predominavam os
hospitais públicos responsáveis por 80,7% dos hospitais
psiquiátricos no Brasil. Os famosos asilos, como o
Juqueri (em São Paulo), o Hospital de Alienados (no Rio
de Janeiro) e o São Pedro (em Porto Alegre), exerciam
um papel orientador da assistência psiquiátrica,
consolidando a política macro-hospitalar pública como o
principal instrumento de intervenção sobre a doença
mental. Embora existissem alguns hospitais privados e
ambulatórios, estes eram bastante incipientes diante do
vigor dos hospitais públicos (PAULIN e TURATO, 2004).
As décadas de 1940 e 1950 se caracterizam pela
expansão de hospitais públicos em vários estados
brasileiros, cujo crescimento foi propiciado pela
aprovação do decreto-lei 8.555, de 3 de janeiro de
1946, que autorizava o SNDM a realizar convênios com
os governos estaduais para a construção de hospitais
psiquiátricos.7 O Código Brasileiro de Saúde, publicado
em 1945, condenava as denominações ‘asilo’, ‘retiro’ ou
‘recolhimento’, reconhecendo a categoria ‘hospital’, se
afirmando o espaço de atuação do hospital psiquiátrico.
Naquela época a psiquiatria buscava se estabelecer
como especialidade médica e os instrumentos mais
avançados da psiquiatria biológica foram introduzidos
no país, como o choque cardiazólico, a psicocirurgia, a
insulinoterapia e a eletroconvulsoterapia (SAMPAIO,
1988; AMARANTE, 1998a).
A criação de novos hospitais não amenizou a situação
caótica dos hospitais públicos que, na década de 1950,
viviam em total abandono e apresentando excesso de
pacientes internados, continuando os hospitais
psiquiátricos a terem basicamente a função social de
exclusão. A assistência psiquiátrica pública apresentava
enorme lentidão em tomar conhecimento das
importantes transformações que ocorriam na prática
psiquiátrica na Europa e Estados Unidos no período pós-
segunda guerra e as drogas psicóticas, parcialmente
responsáveis por grandes transformações nas práticas
terapêuticas dos asilos, só fariam sua aparição no
mercado em 1955. Segundo Resende (2007, p. 56), o
descrédito que os hospitais públicos atingiram junto à
população, “expressada em marchinhas de carnaval,
anedotas e rótulos pejorativos atribuídos a
determinados hospitais”, seria utilizado posteriormente
como “evidência incontestável de sua incompetência e
um forte argumento em favor da excelência da
iniciativa privada”.
3. O surgimento da “indústria da loucura”
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 10/24
O tratamento asilar foi sendo modificado, questionado e
mesmo substituído desde o pós-guerra em vários
países. Neste período vários movimentos de
contestação ao saber e prática psiquiátrica instituída se
fizeram notar no cenário mundial, dos quais se
destacam os movimentos denominados Psiquiatria de
Setor, na França; as Comunidades Terapêuticas, na
Inglaterra; e a Psiquiatria Preventiva, nos EUA8. Esses
movimentos se caracterizaram por visar uma reforma
do modelo de atenção psiquiátrica, propondo rearranjos
técnico-científicos e administrativos da psiquiatria.
Apesar disso, observa-se uma grande expansão da
rede de hospitais psiquiátricos no Brasil a partir da
década de 1960.9
O período que se seguiu ao golpe militar de 1964 foi o
marco divisório entre uma assistência eminentemente
destinada ao doente mental indigente e uma nova fase,
a partir da qual se estendeu a cobertura à massa de
trabalhadores e seus dependentes. Foram os governos
militares que consolidaram a articulação entre
internação asilar e privatização da assistência, com a
crescente contratação de leitos nas clínicas e hospitais
psiquiátricos conveniados, que floresceram rapidamente
para atender a demanda. As internações passaram a
ser feitas não apenas em hospitais públicos (que, dadas
as suas precárias condições, permaneceram reservados
aos indivíduos sem vínculos com a previdência social),
mas em instituições privadas, que eram remuneradas
pelo setor público para isso.10 Na maioria das vezes, as
clínicas contratadas funcionavam totalmente as
expensas do Sistema Único de Saúde (SUS) – antes via
INPS (Instituto Nacional de Previdência Social). Sua
única fonte de receita era a internação psiquiátrica,
remunerada na forma de diária paga para cada dia de
internação de cada paciente.
Como na psiquiatria, ao contrário de outras
especialidades da medicina, a indicação de internação
nem sempre é clara ou indiscutível, a decisão, com
grande margem de escolha, fica a critério do médico ou
da família do paciente. Como o pressuposto
disseminado no meio especializado e na sociedade era
de que lugar de louco é no hospício, e diante da
inexistência de dispositivos de assistência intensiva
alternativos ao modelo asilar, o sistema impulsionava a
internação, mesmo onde havia boa fé (TENÓRIO, 2002:
34). O sistema e a mentalidade vigentes estavam
organizados em torno da internação (e da internação
prolongada), as empresas hospitalares auferiam
benefícios significativos com as internações (sua única
fonte de lucro), com total falta de controle pelo estado,
observando-se um verdadeiro empuxo a internação,
razão pela qual este sistema veio a ser chamado de
“indústria da loucura”.
A discussão acerca da necessidade dehumanização do
tratamento do doente mental teve início na década de
1970, momento em que diversos setores da sociedade
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 11/24
brasileira se mobilizaram em torno da redemocratização
do país. A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP),
em ações políticas para defender médicos que haviam
sido presos e torturados, revitalizou, no cotidiano
profissional, discussões éticas acerca dos direitos
humanos e da necessidade de ampliação dos direitos
individuais no país. Apelos para que "ninguém fosse
submetido à tortura, a tratamento ou castigo cruel,
desumano e degradante" e nem "arbitrariamente preso,
detido ou exilado" foram estendidos para a condição de
opressão do doente mental nos manicômios e sua
humilhação moral na sociedade em geral (FIRMINO,
1982, p. 35). Os hospitais psiquiátricos, centralizando a
assistência e sendo praticamente únicos na oferta de
serviços psiquiátricos no contexto nacional, tiveram as
condições internas de maus-tratos aos internados,
desnudadas e denunciadas no processo social brasileiro
de "abertura democrática". A discussão acerca da
violência, dos maus tratos e da tortura praticada nos
asilos brasileiros produziu, em grande parte, a
insatisfação que alimentou o Movimento Antimanicomial.
Entretanto, ainda não estava muito claro qual deveria
ser o modelo de cuidado e nem havia uma proposta
estruturada da intervenção clínica.
3. A deflagração da reforma psiquiátrica
A derrocada da denominada “indústria da loucura”,
capitaneada pelo Movimento de Trabalhadores em
Saúde Mental (MTSM), dá início a quinta fase, que se
inicia em 1978, identificada por Amarante e Torre
(2010: 119), como “fase de crítica institucional”, que
deflagra a reforma psiquiátrica. Segundo os autores
mencionados, foi neste ano que culminaram as
denúncias e a mobilização de atores sociais decisivos
para a transformação do sistema psiquiátrico vigente.
Para eles, o acontecimento decisivo foi a “crise da
DINSAM”, órgão do Ministério da Saúde responsável
pela formulação das políticas de saúde do subsetor
saúde mental. Vários fatores, tais como, a precarização
das condições de trabalho, e as frequentes denúncias
de agressão, estupro, trabalho escravo e mortes não
esclarecidas, nas grandes instituições psiquiátricas
brasileiras, provocaram a união dos trabalhadores da
saúde mental para a luta pelas as mudanças
necessárias no sistema. A partir daí começam a ocorrer,
em diversos estados brasileiros, congressos e encontros
decisivos na militância do MTSM, dando origem à
trajetória da Reforma Psiquiátrica Brasileira (AMARANTE
e TORRE, 2010: 117-118).
A influência dos movimentos de crítica à psiquiatria
começou a se fazer sentir no contexto social brasileiro,
principalmente a partir da década de 1980, no ocaso da
ditadura militar e aguda crise econômica que
caracterizaram o período (OLIVEIRA e ALESSI, 2005). A
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 12/24
sociedade reencontrava as vias democráticas de
expressão e reivindicação e, neste contexto, as ideias
de Foucault (2005), Goffman (1996), Szasz (1961),
Laing (1969, 1982), Scheff (1966), Basaglia (1985) e
outros tiveram uma forte influência. A situação crítica
em que se encontrava a assistência psiquiátrica
brasileira era favorável à crítica proposta por esses
pensadores e por esses movimentos sociais.
Alguns grupos de técnicos de saúde, acadêmicos,
militantes sociais, organizações comunitárias e afins,
influenciados pela Psiquiatria Democrática Italiana –
especialmente o pensamento de Franco Basaglia -
começam a criar uma sistematização de pensamento
contra hegemônico na assistência em Saúde Mental. No
final da década de 1980, surgem os primeiros Centros
de Atenção Psicossocial – CAPS e fecham-se alguns
manicômios e se inicia um embate epistemológico,
político e técnico em prol de “uma sociedade sem
manicômios”. Em 1987 foi realizada, no Rio de Janeiro,
a I Conferência Nacional de Saúde Mental e, em 1989,
foi dada a entrada no Congresso Nacional do Projeto de
Lei do Deputado Paulo Delgado (PT/MG), que propunha
a regulamentação dos direitos da pessoa com
transtornos mentais e a extinção progressiva dos
manicômios no Brasil, marcando “o início das lutas do
movimento da Reforma Psiquiátrica nos campos
legislativo e normativo” (DELGADO et al, 2007, p. 41).
Entre os protagonistas desse movimento contra-
hegemônico surge o Movimento Nacional da Luta
Antimanicomial como um movimento social deveras
heterogêneo, mas com um importante consenso entre
seus integrantes: não é mais aceitável que o infortúnio
do acometimento de um transtorno mental leve
qualquer indivíduo ao encarceramento num manicômio
por décadas de sua vida, muitas vezes sem cuidados
integrais a sua saúde e com desrespeito a seus direitos
Humanos e civis.
3. A “institucionalização” da reforma
psiquiátrica
Em função do compromisso firmado pelo Brasil na
Declaração de Caracas11 e pela realização da II
Conferência Nacional de Saúde Mental, passaram a
entrar em vigor no país, a partir da década de 1990, as
primeiras normas federais regulamentando a
implantação dos serviços de atenção diária, fundadas
nas experiências dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-
dias. Também foram aprovadas as primeiras normas
para fiscalização e classificação dos hospitais
psiquiátricos. As macro mudanças legislativas, jurídicas
e administrativas foram, no período de
institucionalização da Reforma Psiquiátrica,
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 13/24
consideradas necessárias e, até mesmo, as garantias
de operacionalização de novas práticas terapêuticas.
Nesta fase a Reforma Psiquiátrica efetivamente
começou a se materializar em serviços extra-
hospitalares, sejam intermediários ou substitutivos ao
manicômio e os novos serviços de saúde mental são
normatizados, estabelecendo-se algumas definições
administrativas e operacionais. Se, por um lado, isso
assinala a inclusão da questão na agenda
governamental, definindo legalmente sua existência
como uma nova forma de assistência oficial, por outro
lado, há uma homogeneização dos serviços pela criação
de um modelo único, denominado nos documentos
como “NAPS/CAPS”, limitando “a criação de
experiências inovadoras, induzindo à criação de novas
formas de assistência estritamente sanitárias e
tecnologias de tratamento e organização de serviços
padronizados sob um modelo operacional” (AMARANTE
e TORRE, 2010, p. 122).
No contexto da reforma psiquiátrica, duas leis
solidificaram a direção da política de saúde mental no
Brasil, no sentido da desospitalização da assistência
psiquiátrica, atendimento na comunidade e respeito aos
direitos humanos do paciente: a Lei Federal nº. 10.216,
de abril de 2001, com base na famosa "Lei Paulo
Delgado", sobre a extinção dos manicômios, criação de
serviços substitutivos na comunidade e regulação da
internação psiquiátrica compulsória (aprovada no
Congresso após 12 anos de tramitação); e a Lei Federal
nº. 10.708, de julho de 2003, instituindo o Programa De
Volta para Casa (conhecida como "Bolsa-Auxílio"), que
assegura recursos financeiros que incentivam a saída
de pacientes com longo tempo de internação dos
hospícios para a família ou comunidade12. Outras
Portarias importantes foram também a nº 106, de 2000,
que dispõe sobre as residências terapêuticas e a
Portaria de nº 336, de 2002, que regulamenta os novos
serviços e o modelo assistencial, introduzindo as
modalidades CAPS I, II e III, CAPSi e CAPSad.
Entretanto, apesar do processo de expansão dos CAPS
e NAPS (que em 2002 já somavam 424 serviços em
todo o país), as normas para fiscalização e classificação
dos hospitais psiquiátricos não previam mecanismos
sistemáticos para a redução de leitos e cerca de 80%
dos recursos do Ministério da Saúde ainda eram
destinados aos hospitais psiquiátricos (BRASIL, 2007).
Nesse período merece destaque ainda a realização da
III Conferência Nacional de SaúdeMental, ao final de
2001, em Brasília, com ampla participação dos
movimentos sociais, de usuários e seus familiares que,
segundo Delgado et al (2007, p. 43) “consolida a
Reforma Psiquiátrica como política de governo, confere
aos CAPS o valor estratégico para a mudança do
modelo de assistência e estabelece o controle social
como garantia da reforma Psiquiátrica”, fornecendo “os
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 14/24
substratos políticos e teóricos para a [atual] política de
Saúde mental no Brasil”.
3. A consolidação da reforma psiquiátrica
A partir de 2003, na gestão presidencial do Governo
Lula, o processo de desinstitucionalização vem
avançando significativamente, graças à criação de
alguns mecanismos para a redução de leitos
psiquiátricos no país e a expansão de serviços
substitutivos como os Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS), levando ao fechamento de vários hospitais
psiquiátricos. A reflexão sobre essas medidas, que será
feita a seguir, apresenta um breve balanço da
implantação dos principais programas, dos novos
serviços e dos modelos assistenciais.
No que se refere à Atenção Psiquiátrica Hospitalar,
salienta-se o Programa Nacional de Avaliação do
Sistema Hospitalar/Psiquiatria (PNASH/Psiquiatria),
instituído em 2002, que é essencialmente um
instrumento de avaliação que permite aos gestores um
diagnóstico da qualidade da assistência dos hospitais
psiquiátricos conveniados e públicos existentes na rede
de saúde, descredenciando os hospitais considerados de
baixa qualidade. De fato trata-se da instauração do
primeiro processo avaliativo sistemático dos hospitais
psiquiátricos. O Programa Anual de Reestruturação da
Assistência Hospitalar Psiquiátrica no SUS (PRH),
aprovado em 2004 pelo Ministério da Saúde, tinha como
principal estratégia a redução progressiva e planejada
de leitos de macro-hospitais (acima de 600 leitos) e
hospitais de grande porte (240 a 600 leitos
psiquiátricos), evitando a falta de assistência. Para
tanto, foram definidos os limites máximos e mínimos de
redução anual de leitos para cada classe de hospitais
(definidos pelo número de leitos existentes, contratados
pelo SUS). Além disso, se deveria garantir que os
recursos que deixassem de ser utilizados nos hospitais,
com a progressiva redução dos leitos, fossem
redirecionadas para incremento das ações territoriais e
comunitárias de saúde mental (BRASIL, 2005). Dados
do Ministério da Saúde mostram, no final de 2011, uma
clara reversão dos recursos gastos com hospitais
psiquiátricos para os serviços extra-hospitalares,
quando mais de 70% dos recursos são destinados aos
gastos destes serviços (BRASIL, 2012).
Outro dado importante com relação à atenção hospitalar
é a mudança do perfil dos hospitais psiquiátricos que,
desde 2002, vem ficando menores. Com o
PNASH/Psiquiatria e o Programa de Reestruturação da
Assistência Psiquiátrica (PRH), observa‐se uma
mudança do perfil dos hospitais psiquiátricos a partir da
redução de leitos. Tal cenário foi reforçado com a
publicação da Portaria GM 2.644/09, de 28 de outubro
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 15/24
de 2009, que vem induzindo o sistema, a partir do
reagrupamento dos hospitais psiquiátricos em quatro
classes13, a remunerar melhor os hospitais de menor
porte, buscando-se a redução dos problemas presentes
nos macro hospitais e se configurando como uma
estratégia, em contextos mais difíceis de fechamento de
leitos. Dados de 2011 mostram que 49,53% dos leitos
psiquiátricos estão situados em hospitais de pequeno
porte (até 160 leitos), enquanto em 2002 apenas
24,11% estavam nestes hospitais. Os leitos em
hospitais de grande porte (acima de 400 leitos)
reduziram-se, no período 2002-2011, de 29,43% para
10,48% (BRASIL, 2012, p. 18). A expansão de leitos
psiquiátricos nos Hospitais Gerais é ainda um problema
para a rede de saúde mental, necessitando-se
investigar suas causas. Enquanto o número total de
leitos SUS em hospitais psiquiátricos, em 2011, era de
35.426 leitos, a estimativa de leitos habilitados de
psiquiatria em Hospitais Gerais era de apenas 3.910
leitos, distribuídos em 646 Hospitais Gerais, localizados
de forma muito desigual no território nacional (BRASIL,
2012, p. 20).
A implantação e o financiamento de Serviços
Residenciais Terapêuticos se constituem em
componentes decisivos para a concretização da
superação do modelo de atenção centrado no hospital
psiquiátrico. As Residências Terapêuticas são casas
localizadas no meio urbano, que devem ser utilizadas
para resolver o problema de moradia de pessoas com
transtornos mentais graves, preferencialmente as
egressas de hospitais psiquiátricos, devendo auxiliar o
morador em seu processo de construção progressiva de
autonomia, como também de reintegração na
comunidade. Para aquelas pessoas que passaram anos
de suas vidas hospitalizadas o significado de habitar
uma residência terapêutica não significaria apenas o
uso da casa, mas “um processo de (re)apropriação da
própria vida”, a passagem do lugar de “pacientes” para
o de “residentes” A metáfora “retorno para casa” pode
ser considerada “a primeira referência simbólica de um
rito de passagem que sinaliza uma nova vida, uma nova
identidade, uma nova referência” (ROEDER, 2010, p.
319). No final de 2011 existiam 779 residências em
funcionamento, com um total de 3.470 moradores, e
ainda 154 residências em implantação (BRASIL, 2012,
p. 11). Vale salientar que a cobertura deste serviço
ainda é muito baixa em relação às necessidades
existentes, e a oferta desses serviços no território
nacional também é muito desigual (até 2011 não
existiam residências terapêuticas em quatro dos
estados brasileiros).
O Programa de Volta para Casa tem como objetivo
contribuir para o processo de reinserção social e
resgate da cidadania das pessoas com longa história de
internações em hospitais psiquiátricos, através do
pagamento mensal de um auxílio-reabilitação pago aos
seus beneficiários. Entretanto, o programa tem
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 16/24
encontrado algumas dificuldades na sua implementação.
A grande maioria dos beneficiários, sendo egressos de
longas internações psiquiátricas, não possui a
documentação pessoal mínima para cadastramento no
programa. Muitos não possuem certidão de nascimento
ou carteira de identidade (BRASIL, 2005; DELGADO et
al, 2007). A inclusão de beneficiários no programa
depende de vários fatores, entre os quais se destacam
o ritmo efetivo da desinstitucionalização, da organização
de Residências Terapêuticas e da reinserção de
pacientes em suas famílias, o que explica a disparidade
no número de beneficiários por estado da federação.
Dados desagregados por estado mostravam que, em
2010, os estados do Sudeste, com um total de 2.347
beneficiários, concentravam 65,7% do total de
beneficiários, enquanto nos estados do Norte apenas
quatro pessoas recebiam o auxílio (BRASIL, 2010, p.
12).
A substituição do modelo hospitalocêntrico tem se dado
através da criação e fortalecimento de uma rede de
serviços substitutivos, como os Centros de Atenção
Psicossocial (CAPS)
14
, Núcleos de Atenção Psicossocial
(NAPS), Hospitais-Dia, Centros de Convivência, Serviço
de Urgência e Emergência Psiquiátrica em Pronto-
Socorro Geral, etc. Compete aos CAPS o acolhimento e
a atenção às pessoas transtornos mentais graves e
persistentes, procurando preservar e fortalecer os laços
sociais em seu território. São serviços de saúde
municipais abertos, comunitários, que oferecem
atendimento diário, que buscam realizar “o
acompanhamento clínico e reinserção social” de seus
usuários “por meio de acesso ao trabalho, ao lazer,
exercício de dos direitos civis e fortalecimento dos laços
familiares e comunitários” (DELGADO et al, 2007: 59).
Embora os primeiros CAPS tenham surgido no país
desde meados da década de 1980, só a partir de 2002
passaram a receber uma linha específica de
financiamento do Ministérioda Saúde, quando se
observa uma grande expansão destes serviços. Com o
cadastramento de 122 novos CAPS em 2011, entre eles
cinco CAPSad 24h, a cobertura nacional em saúde
mental chegou a 72%, com 1.742 CAPS em
funcionamento (BRASIL, 2012). Apesar do crescimento
numérico extraordinário dessas unidades de serviço,
estes números ainda estão aquém do parâmetro
estabelecido pelo Ministério da Saúde, que é de um
CAPS para cada 100.000 habitantes. Além disso, a
distribuição espacial desses serviços no território
nacional também é bastante desigual (BRASIL, 2010).
Embora o perfil populacional seja um dos principais
critérios para o planejamento da rede de atenção à
saúde mental nas cidades, este é apenas um critério
orientador para o planejamento das ações.
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 17/24
Tendências atuais das políticas de saúde mental
no Brasil: começo de uma nova história?
Em uma rápida avaliação do processo aqui historiado,
pode-se perceber que a reforma psiquiátrica brasileira
tem se apresentado, de forma geral, bem sucedida e os
fatos e dados aqui apresentados demonstram que ela
vem alcançando alguns de seus objetivos,
especialmente no que tange à provisão de recursos
extra-hospitalares e redução da internação asilar. Um
dos êxitos da política de saúde mental atual foi ter
conseguido o redirecionamento do financiamento
público e um maior controle sobre o funcionamento dos
hospitais. Entretanto, os dados discutidos apontam
também para desigualdades regionais na inserção da
Reforma Psiquiátrica nos estados da federação.
Pode ser temerário afirmar que a era asilar tenha sido
suplantada no Brasil, considerando que, em muitos
casos, o internamento psiquiátrico como ato de
exclusão e isolamento ainda persiste em muitas
localidades. O que se pode afirmar é que a assistência à
saúde mental no Brasil apresenta uma clara tendência
para a perda de hegemonia institucional do hospital
psiquiátrico e aponta para uma nova convergência no
modelo assistencial. Mas, o fato de um serviço ser
externo não garante sua natureza não-manicomial e
sua qualidade. Uma das críticas mais contundentes da
Reforma Psiquiátrica diz respeito à identificação de
certo processo de “reinstitucionalização” nas políticas de
saúde mental, que é demonstrado pela configuração de
uma “CAPScização” do modelo assistencial, na forma
como os CAPS são colocados como “centro do sistema”
(AMARANTE e TORRE, 2010, p. 130).
Integra ainda o processo de reforma psiquiátrica
brasileira a disseminação do recurso dos psicofármacos
nos tratamentos terapêuticos, o que pode ser
corroborado pelo aumento vertiginoso nos gastos de
recursos federais destinados ao pagamento de
medicações “antipsicóticas atípicas”, que se amplia de
35.817 milhões, em 2002, para 263.440 milhões em
2009, valores excessivamente altos, se aproximando do
custeio federal para toda a rede CAPS no período
considerado (BRASIL, 2010, p. 23). Se não se pode
negar que os médicos são, de modo geral, levados a
receitar remédios (por uma série de fatores que não
cabe aqui discutir), é verdade também que grande
parte dos usuários dos serviços espera do médico
exatamente isso e, por vezes, identifica a boa consulta
ou o bom tratamento à prescrição de medicamentos.
Mas, mesmo considerando-se alguns possíveis exageros
nessa medicalização em massa dos usuários dos
serviços de saúde mental, deve-se reconhecer a
enorme importância dos psicofármacos como
instrumentos terapêuticos. Como afirma Perrusi (2010:
102-103), o uso de psicotrópicos produziu um processo
de diferenciação na clientela psiquiátrica, que não
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 18/24
precisa mais ser identificada como reclusa no asilo,
produzindo internamentos intermitentes (com duração
limitada) e possibilitando a boa parte dos pacientes o
uso de serviços extra-hospitalares. Atualmente no
Brasil, assim como em muitos outros países, os serviços
psiquiátricos e de atenção psicossocial são utilizados
voluntariamente pelos pacientes, identificados como
“usuários”, no papel de doentes, ou seja, “num papel
reconhecido e sancionado socialmente, como qualquer
outro serviço de saúde pública ou privada”, contribuindo
para minimizar o estigma da intervenção psiquiátrica.
Como resultado conjunto da reforma institucional
(hospitalização do asilo + instituições extra-
hospitalares), o portador do sofrimento psíquico pôde
deixar de ocupar uma linha biográfica, a carreira moral
de paciente psiquiátrico, cujo resultado era a
cronicidade do paciente, se transformando em usuário.
“Assim, os estados psicóticos
cronificados estão deixando
de povoar os hospitais
psiquiátricos e um bom
número de pacientes
reencontrou o meio social,
embora muitos sejam
dependentes de uma
assistência extra-hospitalar e
sofram de uma socialização
precária. Talvez, a
dependência dos serviços
extra-hospitalares e da ajuda
social seja a grande
contrapartida da reforma
psiquiátrica” (PERRUSI, 2010,
p. 103).
Atualmente, a visão do louco e da loucura como algo a
ser excluído do convívio social tem sido amplamente
questionado na medida em que a proposta de
desinstitucionalização vem sendo incorporada na
agenda pública. Mas, interessa saber também qual é a
visão dos profissionais de saúde, da população em geral
e dos familiares dos portadores de sofrimento psíquico
e como estes atuam neste processo.
Perrusi (2010, p. 103) salienta que o portador de
transtorno mental, mesmo deixando de ser um recluso
no asilo, pode perseverar num estado de invalidez
permanente ou sucumbir a uma exclusão social “aberta”
ou outras formas de exclusão, e até sofrer um processo
de mendigação. Um dos maiores desafios da reforma
psiquiátrica parecer ser ainda a superação do estigma
do “louco” como pessoa perigosa ou incapaz no
imaginário social. A permanência do estigma em
relação ao portador de sofrimento psíquico pode
colaborar na perpetuação da exclusão social, na
dificuldade de inserção no mercado de trabalho e na
comunidade, na construção de relações afetivas e no
isolamento, muitas vezes levado a efeito pela própria
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 19/24
família, na intenção de proteger seus membros do risco
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1Texto produzido no âmbito de um projeto de
investigação financiado pelo CNPq (A reforma
psiquiátrica no Brasil: o papel das redes sociais e os
desafios nas novas práticas de cuidados na saúde
mental - Edital MCT/CNPq/MEC/CAPES Nº 02/2010).
Constitui-se em versão revisada e ampliada de
Comunicação apresentada no XXVIII Congresso
Internacional da Associação Latino-Americana de
Sociologia (ALAS), Recife, setembro de 2011.
* Universidade Federal de Pernambuco, Brasil.
2Segundo Passos (2009b, p. 35) essa é a expressão
utilizada pelos praticantes da desinstitucionalização
italiana, como forma de renomear a doença mental
por criticar o seu conteúdo médico-patológico original
e estrito.
3Segundo Machado (1978, p. 382), em meados do
século XIX surgem no Brasil os primeiros trabalhos
teóricos sobre alienação mental, entretanto, a
teorização psiquiátrica não reflete qualquer
articulação com a prática, se constituindo em “um
exercício de cunho universitário, escolar e
burocrático”. Apenas em 1881 é que seria criada a
cadeira de Psiquiatria na Faculdade de Medicina do
Rio de Janeiro.
4Conforme informações de Moreira (1905) e Medeiros
(1977, apud ODA E DALGARRONDA, 2005).
5No âmbito da assistência foram criadas as Colônias de
São Bento e de Conde Mesquita (para tratamento de
alienados indigentes do sexo masculino) na cidade
do Rio de Janeiro, as duas primeiras colônias de
alienados do Brasil e da América Latina. Logo depois
foram criadas as Colônias de Juqueri, em São Paulo,
e a de Vargem Alegre, no interior do Rio de Janeiro.
Em 1911, foi criada a Colônia de Alienadas de
Engenho de Dentro (para mulheres indigentes) e, em
1920, são iniciadas as obras da Colônia de Alienados
de Jacarepaguá e as obras do manicômio Judiciário
(AMARANTE, 1998a, p. 76).
6O SNDM mais tarde se constituiu na Divisão Nacional de
Saúde Mental (DINSAM) e hoje é a Coordenadoria
Geral de Saúde Mental do Ministério da Saúde.
7Entre 1841 e 1954 foram criadas 56 instituições
psiquiátricas, concentradas principalmente na região
Sudeste (predominantemente no Rio de janeiro e
São Paulo), Nordeste e Norte (PASSOS, 2009a,
p.107).
8Para um mapeamento dos movimentos reformistas da
psiquiatria na contemporaneidade consultar Amarante
07/10/2020 Fonte
https://periodicos.ufpe.br/revistas/revsocio/rt/printerFriendly/235235/28258 24/24
(1998b).
9Em 1961 existiam 140 hospitais psiquiátricos no Brasil,
dos quais 54 pertenciam à esfera pública e 86 à
esfera privada. Dez anos depois, quando se deu a
mais ampla privatização de serviços de saúde da
história do país, 340 hospitais distribuíam-se pelo
território nacional, sendo 277 privados e 63 públicos.
Em 1981, a rede hospitalar privada havia crescido
ainda mais, alcançando 425 hospitais. Nenhum
hospital público foi aberto entre 1971 e 1981
(MESSAS, 2008, p. 93).
10O direcionamento do financiamento público para a
esfera privada durante o regime militar pode ser
percebida no fato de que entre 1965 e 1970 a
população internada em hospitaispúblicos
permaneceu inalterada, enquanto a clientela das
instituições privadas remuneradas pelo setor público
saltou de 14 mil para 30 mil, chegando a uma
proporção de 80% de leitos contratados junto ao
setor privado e 20% diretamente públicos (TENÓRIO,
2002, p. 34).
11O principal documento norteador das políticas adotadas
pelo governo brasileiro nesta área foi a declaração de
Caracas, aprovada em 1990. Este documento
estabeleceu a diretriz da saúde mental, centrando-a
na comunidade e dentro de sua rede social. Os
recursos, cuidados e tratamentos devem
salvaguardar a dignidade pessoal, direitos civis e
humanos, propiciando a permanência do doente em
seu meio comunitário. O principal efeito nocivo do
sistema asilar era diagnosticado como o isolamento,
a desintegração social e a exclusão do portador de
transtorno mental (DUNKER e KYRILLOS NETO, 2004,
p. 119) .
12O período 1990-2003 concentra a máxima intensidade
política e normativa do que chamamos, no Brasil, de
Reforma Psiquiátrica. Para uma visão do conjunto de
normativo no período, ver publicação do Ministério da
Saúde (BRASIL, 2004a), que se constitui em uma
antologia de documentos legais, capaz de ajudar na
compreensão do esforço de construção da agenda de
saúde mental do SUS.
13Macro hospitais (acima de 600 leitos); hospitais de
grande porte (240 a 600 leitos psiquiátricos);
hospitais de médio porte (161 a 240 leitos) e
hospitais de pequeno porte (até 160 leitos).
14Os CAPS estão estabelecidos em três níveis: CAPS I e
CAPS II (para atendimento diário de adultos) e CAPS
III (para atendimento diário e noturno de adultos),
definidos por ordem crescente de porte,
complexidade e abrangência populacional. Os CAPSi
são destinados ao tratamento de crianças e
adolescentes com transtornos mentais e os CAPSad
são destinados à população dependente de álcool e
outras drogas. Os CAPSad III ou CAPSad 24h, que
começaram a ser implantados em 2012, são serviços
destinados ao cuidado de pessoas que fazem uso
abusivo do álcool e outras drogas, que funcionam 24
horas, nos sete dias da semana, inclusive finais de
semana e feriados.

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