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REFORMA PSIQUIATRICA

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Suzana Vasconcelos MEDXIII 
TUTORIAL 1 
OBJETIVOS: 
1. Entender a Reforma Psiquiátrica no Brasil (Lei 10.216). 
2. Panorama atual da assistência/desassistência psiquiátrica. 
3. Conhecer o modelo e a rede do atendimento psiquiátrico no 
Estado do Amapá. 
O NASCIMENTO DA PSIQUIATRIA NO BRASIL E AS 
POLÍTICAS DE SAÚDE 
O desenvolvimento da psiquiatria no Brasil encontra-se 
relacionado à vinda da família real em 1808. Com a família real 
vieram cerca de 15 mil pessoas. Junto à nova estrutura houve 
o crescimento de alguns setores da economia, como o 
comércio e a indústria. Esse fato contribuiu para o crescimento 
da população na cidade pois, atraídas pela presença da corte e 
pela possibilidade de crescimento financeiro, muitas pessoas 
se dirigiram para o Rio de Janeiro. 
Com o acentuado crescimento da população, a cidade passou 
a apresentar alguns problemas e, dentre eles, a presença dos 
loucos pelas ruas. O destino deles era a prisão ou a Santa Casa 
de Misericórdia, que era um local de assistência, de caridade, 
não um local de cura. Lá, os loucos recebiam um “tratamento” 
diferenciado dos outros internos. Os loucos ficavam 
amontoados em porões, sofrendo repressões físicas quando 
agitados, sem contar com assistência médica, expostos à 
contaminação por doenças infecciosas e subnutridos. Neste 
momento, o recolhimento do louco não possuía um caráter 
de tratamento, terapêutico mas, sim, de preservação da 
ordem pública. 
Pode-se dizer que a inauguração do Hospício de Pedro II em 
1852 foi o marco institucional da psiquiatria no Brasil. Sua 
criação foi o resultado da luta de um grupo de médicos que 
fazia parte da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro (SMRJ), 
que foi criada em 1829. Essa sociedade organizou uma 
Comissão de Salubridade visando à construção de um Código 
de Posturas → que fez um levamento, no qual foi constatado 
que os loucos viviam em precárias condições, tanto nos 
hospitais, como nas prisões e nas ruas. 
“Em vez das celas insalubres dos hospitais gerais e dos castigos 
corporais, os médicos advogam a necessidade de um asilo 
higiênico e arejado, onde os loucos pudessem ser tratados 
segundo os princípios do tratamento moral. Em outras 
palavras, o que se exigia era que os loucos, uma vez 
qualificados de doentes mentais, fossem tratados 
medicamente”. 
Em 1841, o decreto da fundação do Hospício Pedro II foi 
assinado pelo imperador de mesmo nome. Entretanto, 
passaram-se onze anos até a sua inauguração em 1852. 
Quando esta ocorreu, o hospício já contava com 144 alienados, 
tendo sua lotação atingida pouco depois de um ano do início 
de seu funcionamento. 
As críticas ao hospício também começaram a surgir pouco 
tempo após a inauguração e referiam-se à construção que 
deveria ter sido supervisionada por um médico, à falta de 
poder do médico sobre a instituição – a administração do 
hospício cabia a Santa Casa e o trabalho nas enfermarias era 
realizado pelas irmãs de caridade; à inexistência de uma 
nosologia psiquiátrica para classificar e separar os internados; 
à inexistência de critérios de seleção para a internação das 
pessoas; à falta de médicos; aos maus tratos aplicados aos 
alienados; à presença de órfãos nas enfermarias de adultos. 
À medida que o tempo passava, as críticas médicas ao hospício 
aumentavam e fortaleciam a reivindicação da classe médica, 
pois demonstravam que o hospício não era capaz de exercer 
seu objetivo, qual seja, a cura dos alienados. 
Após a instauração da República, em 1890, o Hospício de 
Pedro II se tornou Hospício Nacional de Alienados e foi 
desligado da Santa Casa, passando a ser administrado pelo 
Estado. Nesse mesmo ano, foram criadas a Assistência 
Médico Legal aos Alienados, as colônias de São Bento e de 
Conde de Mesquita na Ilha do Galeão (atual Ilha do 
Governador) e a colônia do Juqueri em São Paulo. 
Esta é uma das características da assistência psiquiátrica no 
Brasil: a constituição de colônias localizadas longe dos centros 
urbanos. Isso foi feito sob o pretexto de fornecer ao alienado 
o necessário afastamento das influências nocivas do meio 
ambiente e proporcionar as condições necessárias para sua 
reeducação moral – estratégia baseada nos princípios do 
isolamento e do trabalho da psiquiatria francesa de Pinel. 
A organização das políticas de saúde no Brasil pode ser 
distinguida em duas áreas de concentração, a Saúde Pública de 
cunho preventivo e coletivo, e a Assistência Médica, de caráter 
curativo e atrelada à Previdência Social. 
A psiquiatria passou a ser considerada especialidade médica a 
partir de 1912 e o número de estabelecimentos psiquiátricos 
sofreu um forte aumento. 
A partir da década de 1930, surgiram novas estratégias de 
tratamento com os choques insulínico e cardiazólico, com a 
eletroconvulsoterapia (ECT) e com a lobotomia. Algumas 
dessas novas técnicas foram bastante difundidas e utilizadas, 
como a eletroconvulsoterapia que ainda é praticada em alguns 
hospitais nos dias atuais. 
O período pós II Guerra Mundial trouxe importantes 
transformações para a psiquiatria no mundo ocidental. Houve 
o surgimento dos seguintes movimentos de reforma 
psiquiátrica: Comunidade Terapêutica, Psiquiatria de Setor, 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
Psiquiatria Comunitária, Antipsiquiatria e Psiquiatria 
Democrática Italiana. 
1. A Lei Federal de 1903: O DECRETO 1.132 
O Decreto Nº 1.132 de 22 de dezembro de 1903 que reorganiza 
a assistência a alienados foi a primeira lei nacional que 
abordou a questão dos alienados. Era composto por 23 artigos 
que tratavam dos motivos que determinam a internação e dos 
procedimentos necessários para a realização da mesma; da 
guarda dos bens dos alienados; da possibilidade de alta; da 
proibição em se manter alienados em cadeias públicas; da 
inspeção dos asilos feita por comissão a mando do ministro da 
justiça e negócios interiores; das condições necessárias para o 
funcionamento do asilo; do pagamento das diárias dos 
doentes; da composição dos trabalhadores do Hospício 
Nacional e das colônias de alienados; da penalidade pelo 
descumprimento da lei. 
O texto do decreto apresenta pontos bastante semelhantes à 
lei francesa de 1838, o que evidencia a influência desta lei. 
A preocupação inicial relaciona-se com o comprometimento 
da ordem pública e com a suposta condição de periculosidade 
do alienado, demonstradas através da manutenção da ordem 
pública e da segurança da sociedade. Desta forma, a 
autoridade pública adquiriu poder de recolher a pessoa para, 
posteriormente, avaliar sua condição de saúde e provar sua 
alienação. 
A internação era determinada por questões de segurança 
pública e não se relacionava com o bem-estar ou o cuidado 
para com o alienado. O exame médico apresentava papel 
secundário na determinação da internação e era realizado 
após a pessoa ter sido internada com o objetivo confirmar o 
quadro de alienação. 
Como na legislação francesa, a ordem pública e a segurança da 
sociedade são os fatores determinantes da realização da 
internação, estando a perícia médica em segundo plano neste 
procedimento. 
O artigo 2º aborda os procedimentos necessários para a 
internação. Em semelhança à lei francesa, este artigo declara 
que a internação pode ser solicitada por autoridade pública ou 
algum particular, mediante requisição ou requerimento. 
Enumera uma série de informações que devem ser fornecidas 
sobre a identificação da pessoa, sua descrição física, o motivo 
da internação e os fatos comprovantes da alienação que 
devem ser fornecidas. 
No caso da internação ser requerida por algum particular, a 
lei não menciona a necessidade de comprovação de 
parentesco ou outro tipo de relação. Desta forma, qualquer 
pessoa pode requerer a internação de alguém que seja 
suspeito de alienação ou que ameace a segurança da 
sociedade. 
As diferenças existentes entre essas duas formas de solicitação 
de internação– autoridade pública ou algum particular – 
podem ser percebidas na participação médica. Quando se trata 
de autoridade pública, a alienação é comprovada pela 
exposição de fatos e dos motivos que determinaram a 
detenção e o atestado médico é apresentado sempre que 
possível. Já no caso da requisição feita por algum particular, a 
lei determina que sejam apresentados dois pareceres médicos 
com até 15 dias entre o exame e a data do requerimento. 
O Decreto Nº 1.132 de 1903 vigorou até o ano de 1934 quando 
foi elaborado e promulgado o Decreto Nº 24.559 em 
substituição à legislação de 1903. 
Concluindo, essa lei indica a criação dos manicômios judiciários 
e regulamenta que a internação pode ser requerida pela 
ordem pública ou por algum particular, e essa ação é justificada 
pela necessidade de manutenção da ordem pública e da 
segurança da população e dos indivíduos. Isso reforça a visão 
de que o público-alvo da política de saúde mental seria 
perigoso e desordeiro, reforçando o estigma social de que 
esses indivíduos precisariam estar reclusos nos asilos e 
excluídos socialmente. Criou-se assim uma nova categoria 
política associada à doença mental, vinculando a identidade 
desses indivíduos a irracionalidade e anormalidade. 
1. 2. A Lei Federal de 1934: O DECRETO 24.559 
O Decreto 24.559 entrou em vigor em 03 de julho de 1934 e 
dispunha sobre a profilaxia mental, a assistência e proteção à 
pessoa e aos bens dos psicopatas, a fiscalização dos serviços 
psiquiátricos e dá outras providências. O título da lei apresenta 
novos elementos que se referem à profilaxia e à assistência da 
pessoa então denominada psicopata e demonstra uma 
preocupação com a questão da proteção tanto da pessoa 
doente quanto dos seus bens. Convém esclarecer que, neste 
contexto, o termo psicopata se refere a portador de 
psicopatologia. 
O tratamento psiquiátrico e o controle sobre a “doença 
mental” se expandem pela população já que a lei atinge a 
pessoa antes, durante e depois da internação. 
De acordo com Tykanori (1987), o decreto de 1934 foi 
formulado por meio de justificativas tecnocientíficas segundo 
uma ideologia eugenista. Tinha como objetivo promover a 
purificação da raça brasileira e considerava a doença mental 
como uma degenerescência moral de algumas raças, 
principalmente negros e amarelos. O tratamento era 
fundamentado na correção moral e o controle social resultava 
do isolamento e da exclusão dos supostos inferiores. Desta 
forma, o tratamento supostamente considerado uma ação 
técnica pôde apresentar um outro lado que atuava na retirada 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
da liberdade e da igualdade do cidadão, promovendo a 
justificativa e a sanção de uma política de controle social. 
Já o Decreto nº 24.559, de 1934, foi o primeiro a tratar da 
curatela/tutela, bem como da internação de menores e 
indivíduos usuários de substâncias psicoativas. Introduz a 
noção de incapacidade civil, o que distancia ainda mais tais 
indivíduos da categoria de cidadãos, autônomos e racionais. 
Também substitui a denominação “alienados” por 
“psicopatas”, além de vincular o uso de substâncias psicoativas 
à política de saúde mental. Essas mudanças geraram um novo 
tipo de enquadramento na categoria da política que associava 
uma categoria previamente existente (da doença mental) com 
novos tipos de comportamento (uso de substâncias 
psicoativas) também sujeitos a estigmas sociais. Ou seja, há 
uma amplificação e diversificação dos sujeitos enquadrados na 
categoria de loucos. 
O PROCESSO DA REFORMA PSIQUIÁTRICA NO BRASIL 
O início do processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil é 
contemporâneo da eclosão do “movimento sanitário”, nos 
anos 70, em favor da mudança dos modelos de atenção e 
gestão nas práticas de saúde, defesa da saúde coletiva, 
eqüidade na oferta dos serviços, e protagonismo dos 
trabalhadores e usuários dos serviços de saúde nos processos 
de gestão e produção de tecnologias de cuidado. 
O processo de Reforma Psiquiátrica brasileira tem uma história 
própria, inscrita num contexto internacional de mudanças pela 
superação da violência asilar. Fundado, ao final dos anos 70, na 
crise do modelo de assistência centrado no hospital 
psiquiátrico, por um lado, e na eclosão, por outro, dos esforços 
dos movimentos sociais pelos direitos dos pacientes 
psiquiátricos, o processo da Reforma Psiquiátrica brasileira é 
maior do que a sanção de novas leis e normas e maior do que 
o conjunto de mudanças nas políticas governamentais e nos 
serviços de saúde. 
Compreendida como um conjunto de transformações de 
práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da 
vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais 
que o processo da Reforma Psiquiátrica avança, marcado por 
impasses, tensões, conflitos e desafios. 
Em 1978, na cidade do Rio de Janeiro, alguns médicos 
psiquiatras realizaram uma série de denúncias sobre as 
condições de uma unidade hospitalar e as irregularidades ali 
existentes. Esse acontecimento repercutiu fora do hospital em 
questão e recebeu apoio de entidades importantes no setor 
saúde como o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) e 
o Movimento de Renovação Médica (REME), que haviam sido 
criados em 1976. Assim, foi constituído o Movimento de 
Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM). 
O Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM), 
movimento plural formado por trabalhadores integrantes do 
movimento sanitário, associações de familiares, sindicalistas, 
membros de associações de profissionais e pessoas com longo 
histórico de internações psiquiátricas, surge neste ano. É 
sobretudo este Movimento, através de variados campos de 
luta, que passa a protagonizar e a construir a partir deste 
período a denúncia da violência dos manicômios, da 
mercantilização da loucura, da hegemonia de uma rede 
privada de assistência e a construir coletivamente uma crítica 
ao chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico 
na assistência às pessoas com transtornos mentais. A 
experiência italiana de desinstitucionalização em psiquiatria e 
sua crítica radical ao manicômio é inspiradora. 
Devido às denúncias, o Ministério da Saúde promoveu a 
demissão de 260 profissionais. Entretanto, esta medida 
provocou a ocorrência da “primeira greve no setor público no 
país após a instalação do regime de exceção política, num 
episódio que ficou conhecido como ‘crise da Dinsam’ (Divisão 
Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde)” 
Por meio desta mobilização e do apoio e participação do REME 
e do CEBES, houve a expansão do MTSM por diversas cidades 
brasileiras. Alguns Núcleos Estaduais do CEBES assim como 
alguns sindicatos passaram a contar com Comissões de Saúde 
Mental organizadas a partir do MTSM. 
Nesse mesmo ano foi realizado o V Congresso Brasileiro de 
Psiquiatria em Camboriú que, devido à participação dos grupos 
acima mencionados, adquiriu um caráter político que 
repercutiu além do campo psiquiátrico. A partir desses 
acontecimentos a sociedade conheceu uma realidade da 
loucura e da instituição hospitalar que fazia parte do cotidiano 
apenas dos que trabalhavam nos hospitais. 
“A loucura/doença mental deixava de ser objeto de interesse e 
discussão exclusiva dos técnicos e alcançava as principais 
entidades da sociedade civil (ABI, OAB, CNBB, CONTAG, FETAG, 
etc), e a grande imprensa, que noticiava, com destaque e 
ininterruptamente por cerca de quase um ano, as condições 
relativas aos hospitais psiquiátricos e às distorções da política 
nacional de assistência psiquiátrica: a ‘questão psiquiátrica’ 
tornara-se uma questão pública”. 
O processo de reforma psiquiátrica brasileira foi fortemente 
influenciado por experiências internacionais como a 
comunidade terapêutica, a psicoterapia institucional, a 
psiquiatria de setor, a antipsiquiatria e, principalmente, a 
reforma psiquiátrica italiana. 
Apresentaremosde forma resumida tais experiências: 
 • Comunidade Terapêutica (Inglaterra) e Psicoterapia 
Institucional (França). Ambas preocupavam-se em recuperar o 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
hospital psiquiátrico. Pode-se definir a Comunidade 
Terapêutica como um processo de reformas institucionais 
caracterizado pela adoção de medidas administrativas 
democráticas, participativas e coletivas, que têm como 
objetivo a transformação da dinâmica institucional asilar. 
Procurava chamar a atenção da sociedade para as péssimas 
condições dos internados nos hospitais psiquiátricos. A 
Psicoterapia Institucional considerava que a instituição 
hospitalar possuía características doentias que deveriam ser 
tratadas para que a mesma tivesse cunho terapêutico. 
• Psiquiatria de Setor (França) e Psiquiatria Comunitária 
(EUA). Estes movimentos deslocaram o ponto central do 
tratamento para a comunidade. A psiquiatria de setor é 
anterior à psicoterapia institucional e apresentou-se como um 
movimento de contestação da psiquiatria asilar, iniciado no 
período pós-guerra, na França. Foi considerado a matriz da 
política psiquiátrica francesa desde a década de 1960 e 
consistia na transferência do atendimento para a comunidade. 
A Psiquiatria Comunitária surgiu nos Estados Unidos em meio 
ao contexto da crise do organicismo mecanicista e encontrava-
se no cruzamento da psiquiatria de setor e da socioterapia 
inglesa. Representou a delimitação de um novo campo para a 
psiquiatria, no qual havia um novo objeto, a saúde mental. A 
psiquiatria preventiva acreditava ter encontrado uma 
estratégia de intervenção nas causas das doenças mentais, 
fazendo com que procurasse realizar a prevenção das doenças 
e a promoção da saúde mental. 
• A Antipsiquiatria (Inglaterra) e a Psiquiatria Democrática 
Italiana (Itália): Esses movimentos iniciaram a crítica à 
psiquiatria enquanto saber e enquanto prática. A 
Antipsiquiatria surgiu na Inglaterra na década de 1960 através 
de um grupo de psiquiatras dos quais destacam-se Ronald 
Laing e David Cooper. Possuía como referências culturais a 
Fenomenologia, o Existencialismo, a obra de Foucault, algumas 
correntes da sociologia e psiquiatria norte americanas, 
Psicanálise e Marxismo. Pretendia romper com modelo 
assistencial e destituir o valor do saber médico com relação à 
explicação, à compreensão e ao tratamento das doenças 
mentais. Isto promoveu a aparição de um novo projeto de 
comunidade terapêutica, no qual há o questionamento do 
saber psiquiátrico. A antipsiquiatria denuncia a cronificação do 
hospital psiquiátrico e procura um diálogo entre loucura e 
razão, colocando a loucura entre os homens e, não, dentro 
deles. Este movimento inicia um processo de ruptura com o 
saber psiquiátrico moderno. 
A Psiquiatria Democrática Italiana foi iniciada por Franco 
Basaglia e fez uma crítica radical ao paradigma psiquiátrico 
afirmando a urgência da revisão das relações a partir das quais 
o saber médico fundava sua práxis. Em 1971, Basaglia vai para 
Trieste onde inicia a demolição do aparato manicomial através 
da construção e constituição de novas formas de entender, 
lidar e tratar a loucura. Esta demolição significou a realização 
de uma análise crítica da sociedade e da forma pela qual se 
relaciona com o sofrimento e a diferença; não significou uma 
negação da instituição e da doença mental, mas relacionou-se 
a uma negação do “poder” que a sociedade entregava à 
psiquiatria para que esta isolasse, excluísse e anulasse aqueles 
que se encontravam fora dos limites da normalidade social. O 
trabalho realizado em Trieste demonstrou a possibilidade da 
constituição de uma rede de atenção capaz de oferecer e 
produzir novas formas de sociabilidade e subjetividade para os 
que utilizam a assistência psiquiátrica, assim como o 
oferecimento e a produção de cuidados. Essa experiência 
conduziu à destruição do manicômio, ao fim da violência e do 
aparelho da instituição psiquiátrica tradicional. 
O MTSM foi constituído no mesmo ano em que a Itália aprovou 
uma lei que colocava em xeque a instituição manicomial pois 
proibia a realização de internações nos manicômios, 
determinava o esvaziamento progressivo destes 
estabelecimentos, estabelecia a necessidade da criação de 
serviços substitutivos e extinguia o estatuto de periculosidade 
do louco. 
A partir do deslocamento da discussão acerca da loucura e do 
manicômio do campo técnico para a sociedade em geral, 
questões como cidadania e direitos dos loucos ganharam 
importância. Neste contexto, a reforma psiquiátrica definia-se 
como um processo constante de construção de reflexões e 
transformações nos campos que compõem a sociedade – 
assistencial, cultural, conceitual e jurídico. 
Desta forma, percebemos que a proposta do movimento da 
reforma psiquiátrica estava além das mudanças de caráter 
técnico-assistencial, assim, o principal objetivo do movimento: 
“seria poder transformar as relações que a sociedade, os 
sujeitos e as instituições estabeleceram com a loucura, com o 
louco e com a doença mental, conduzindo tais relações no 
sentido da superação do estigma, da segregação, da 
desqualificação dos sujeitos ou, ainda, no sentido de 
estabelecer com a loucura uma relação de co-existência, de 
troca, de solidariedade, de positividade e de cuidados” 
Inicialmente, as ações do movimento concentraram-se na 
exposição da realidade asilar através das denúncias para que a 
sociedade tomasse conhecimento deste fato e, então, pudesse 
junto ao movimento, lutar para alterar a realidade psiquiátrica. 
A princípio, tais mudanças eram buscadas por meio de duas 
fontes: inverter a política privatizante de saúde mental e 
constituir uma rede de serviços extra-hospitalares. 
A partir de meados da década de 80 foram realizados 
encontros e conferências na área da saúde mental dando 
continuidade ao processo iniciado pelo MTSM – I Encontro de 
Coordenadores de Saúde Mental da Região Sudeste (Vitória, 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
1985), I Encontro Estadual de Saúde Mental do Rio de Janeiro 
(1986), I Conferência Estadual de Saúde Mental do Rio de 
Janeiro (março/1987), II Encontro de Coordenadores de Saúde 
Mental da Região Sudeste (abril/1987). 
Em junho de 1987 houve a I Conferência Nacional de Saúde 
Mental. Em dezembro desse mesmo ano, na cidade de Bauru, 
foi realizado o II Congresso Nacional do MTSM que promoveu 
o surgimento do lema “Por uma sociedade sem manicômios” 
caracterizando uma importante ruptura na trajetória do 
movimento. A adoção deste lema possibilitou a retomada do 
projeto de desinstitucionalização baseado na experiência 
italiana. Nesse congresso foi proposta a criação do Dia 
Nacional da Luta Antimanicomial (18 de maio) que seria 
realizado anualmente e teria a participação de toda a 
sociedade. 
O primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) foi criado no 
ano de 1987, na cidade de São Paulo e apresentava-se como 
uma instituição intermediária entre o hospital e a comunidade. 
Em 1989, uma ação promovida pela prefeitura da cidade de 
Santos/SP pôde operacionalizar uma verdadeira 
transformação no âmbito psiquiátrico. A partir de denúncias 
de mortes de pacientes e de violências cometidas aos mesmos, 
houve uma intervenção numa clínica particular, a Casa de 
Saúde Anchieta. Este acontecimento permitiu colocar em 
prática uma experiência inédita e ousada na assistência em 
saúde mental brasileira. 
Com o fechamento do manicômio, a cidade de Santos pôde 
criar uma rede substitutiva ao hospital psiquiátrico que era 
composta por Núcleos de Assistência Psicossocial (NAPS), 
cooperativas sociais, associações e outras estratégias de 
cuidado e assistência que caracterizam uma rede territorial de 
atenção, em substituição ao modelo psiquiátrico tradicional 
pautado no manicômio. A experiência do município de Santos 
passa a ser um marco no processo de Reforma Psiquiátrica 
brasileira. Trata-seda primeira demonstração, com grande 
repercussão, de que a Reforma Psiquiátrica, não sendo apenas 
uma retórica, era possível e exequível. 
Neste mesmo ano o deputado Paulo Delgado apresentou na 
Câmara dos Deputados um Projeto de Lei (PL) baseado na 
“extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por 
outros recursos assistenciais” 
A partir do final da década de 80 e início de 90, foi marcado 
pela necessidade de haver mudanças estruturais no modelo 
assistencial vigente; preconizou-se a criação de novas formas 
de cuidar e a construção de uma rede de serviços substitutivos. 
Neste contexto foram criados e/ou implantados diversos 
serviços que tinham como base o modelo de serviço de 
atenção diária, como hospital-dia, Núcleos de Atenção 
Psicossocial (NAPS) e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), 
foi nesse momento que esses serviços tomaram a forma como 
são conhecidos hoje. O reconhecimento destas novas formas 
de assistência demonstrou a transformação do modelo 
hospitalocêntrico, que era predominantemente asilar, com 
hospitalização integral e isolamento. 
AS LEIS FEDERAIS 
2. O Projeto de Lei 3.657 de 1989. 
Em setembro de 1989 o deputado Paulo Delgado apresentou 
o Projeto de Lei 3.657 que dispunha sobre a extinção 
progressiva dos manicômios e sua substituição por outros 
recursos assistenciais e regulamentava a internação 
psiquiátrica compulsória. 
O PL 3.657/89 era composto por 5 artigos baseados em quatro 
temas principais (Delgado, 1992b): deter a expansão dos leitos 
manicomiais; promover um novo tipo de cuidado; criar uma 
nova rede de serviços; proporcionar o fim das internações 
anônimas. 
“As principais transformações no campo jurídico-politico 
tiveram início a partir deste Projeto de Lei, que provocou 
enorme polêmica na mídia nacional, ao mesmo tempo em que 
algumas associações de usuários e familiares foram 
constituídas em função dele. Umas contrárias, outras a favor, 
o resultado importante deste contexto foi que, de forma muito 
importante, os temas da loucura, da assistência psiquiátrica e 
dos manicômios invadiram boa parte do interesse nacional”. 
Embora tenha sido formado num momento em que havia 
condições propícias para a transformação do modelo 
psiquiátrico, o PL enfrentou várias dificuldades no percurso 
para a sua aprovação. Durante doze anos este projeto tramitou 
pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Na Câmara 
dos Deputados sua aprovação ocorreu em 1991 e no Senado 
Federal o substitutivo do senador Sebastião Rocha foi 
aprovado somente em 2001. 
A maior resistência ao projeto veio do setor empresarial ligado 
aos hospitais psiquiátricos que viam no PL uma ameaça de 
perda de seus rendimentos. 
 “Enfim, na prática, enquanto o PL não se tornava lei, a 
realidade ia sendo mudada pelos próprios portadores de 
transtorno mental, assim como pelos técnicos, familiares, 
voluntários, organizados em um amplo movimento de 
transformação das relações entre sociedade e loucura. Neste 
período foram extintos mais de 20 mil leitos psiquiátricos no 
Brasil, ao mesmo tempo em que foram criados cerca de 250 
serviços de atenção psicossocial e mais de mil leitos 
psiquiátricos em hospitais gerais” 
No decorrer dos anos de luta pela aprovação do PL houve a 
criação de diversos serviços extra-hospitalares e a 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
promulgação de portarias ministeriais dentre as quais convém 
destacar: 
• Portaria 189 de 19/11/1991 – alterou o financiamento das 
ações e serviços de saúde mental; 
• Portaria 224 de 19/01/92 – regulamentou o funcionamento 
de serviços de saúde mental; 
• Portaria 1077 de 24/08/99 – assegurou o fornecimento de 
medicamentos básicos de saúde mental nos “serviços 
ambulatoriais públicos de saúde que disponham de atenção 
em saúde mental”; 
 • Portaria 106 de 11/02/00 – criou e regulamentou o 
funcionamento dos serviços residenciais terapêuticos; 
• Portaria 799 de 19/06/00 – criou uma auditoria especial nos 
serviços de saúde mental com o objetivo de avaliar a 
assistência prestada, estabelecer mecanismos de supervisão 
permanente nos serviços e propor normas que possibilitem a 
continuidade do processo de transformação do modelo de 
atenção psiquiátrica. 
• Portaria 1220 de 7/11/2000 – determinou a avaliação da 
assistência em saúde mental prestada pelo SUS. 
A partir do ano de 1992, os movimentos sociais, inspirados 
pelo Projeto de Lei Paulo Delgado, conseguem aprovar em 
vários estados brasileiros as primeiras leis que determinam a 
substituição progressiva dos leitos psiquiátricos por uma rede 
integrada de atenção à saúde mental. É a partir deste período 
que a política do Ministério da Saúde para a saúde mental, 
acompanhando as diretrizes em construção da Reforma 
Psiquiátrica, começa a ganhar contornos mais definidos. É na 
década de 90, marcada pelo compromisso firmado pelo Brasil 
na assinatura da Declaração de Caracas e pela realização da II 
Conferência Nacional de Saúde Mental, que passam a entrar 
em vigor no país as primeiras normas federais regulamentando 
a implantação de serviços de atenção diária, fundadas nas 
experiências dos primeiros CAPS, NAPS e Hospitais-dia, e as 
primeiras normas para fiscalização e classificação dos hospitais 
psiquiátricos. 
As novas normatizações do Ministério da Saúde de 1992, 
embora regulamentassem os novos serviços de atenção diária, 
não instituíam uma linha específica de financiamento para os 
CAPS e NAPS. 
• É importante ressaltar que, no Brasil, até o início da década 
de 90, o Ministério da Saúde previa remuneração somente 
para internação psiquiátrica e consulta ambulatorial, 
dificultando a realização de outros procedimentos e outras 
atividades. 
As Portarias 189/91 e 224/92 representaram um importante 
avanço no processo de constituição de uma nova rede de 
serviços em detrimento ao hospital psiquiátrico, pois 
efetivaram o financiamento de estabelecimentos não 
manicomiais e permitiram o fechamento de instituições não 
qualificadas para a prestação de assistência. 
Em 1992 foi realizada a II Conferência Nacional de Saúde 
Mental que teve como temas principais: crise, democracia e 
reforma psiquiátrica; modelos de atenção em saúde mental; 
direitos e cidadania. Nesta conferência foram reafirmados os 
princípios da I CNSM e do Movimento dos Trabalhadores em 
Saúde Mental (MTSM) e incorporados os princípios da 
reforma sanitária e da desinstitucionalização. 
A desinstitucionalização é um conceito extremamente 
importante no processo de Reforma Psiquiátrica e é uma de 
suas principais estratégias para a transformação da assistência, 
pode ser entendida como: 
 • desospitalização – noção que não questiona o paradigma 
psiquiátrico tradicional e que procura fazer com que o saber e 
as técnicas psiquiátricas tenham uma melhor aplicação. Possui 
ênfase na prevenção e na reabilitação e procura substituir o 
hospital psiquiátrico por uma rede de serviços comunitários. A 
desospitalização é apenas um dos aspectos da 
desinstitucionalização. Este conceito foi utilizado na prática 
assistencial nos EUA. 
• desconstrução – conceito advindo da abordagem da 
psiquiatria democrática italiana, que tem como proposta 
repensar os saberes, as práticas e a própria psiquiatria. 
3. A Lei Federal 10.216 de 2001 
Convém destacar que, durante o período de tramitação do PL, 
alguns estados brasileiros aprovaram leis baseadas nas 
propostas do projeto do deputado Paulo Delgado. 
O movimento social para a aprovação da lei da Reforma 
Psiquiátrica, de acordo com o projeto do deputado Paulo 
Delgado, tinha como objetivo central a extinção progressiva 
dos manicômios, entendidos como instituições de internação 
psiquiátrica especializada. No entanto, no decorrer do 
processo, as negociações legislativas juntamente com o jogo 
de interesses e as forças políticas acabaram fazendo com que 
houvesse mudanças fundamentais no texto finalda lei. A 
principal mudança diz respeito ao ponto central do PL, a 
extinção dos manicômios que não foi mencionada no 
substitutivo do Senador Sebastião Rocha. 
O texto do Projeto de Lei 3.657/89 dispunha sobre a 92 
extinção progressiva dos manicômios e sua substituição por 
outros recursos assistenciais e regulamentava a internação 
psiquiátrica compulsória (grifos nossos), apresentando como 
proposta central a substituição do modelo manicomial. Esta 
marcante diferença entra as propostas do PL e do texto final da 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
lei demonstra o poder dos diversos interesses presentes na 
elaboração deste regimento legislativo. 
A Lei 10.216 de 06 de abril de 2001 dispõe sobre a proteção e 
os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e 
redireciona o modelo assistencial em saúde mental. O título 
da lei apresenta uma proposta de proteção da pessoa 
portadora de transtorno mental, estabelece os seus direitos 
e pretende redirecionar o modelo de assistência em saúde 
mental. 
A nova lei federal possui dois grandes eixos: a questão da 
proteção e o redirecionamento do modelo assistencial. 
Diferentemente do PL, a lei 10.216/01 mantém a estrutura 
hospitalar. O título da lei apresenta uma mudança inovadora 
no que se refere à nomenclatura utilizada para definir a pessoa 
que necessita de cuidados em saúde mental: o termo 
psicopata da legislação de 1934 é substituído pela expressão 
portador de transtorno mental, que é adotada atualmente pela 
psiquiatria. 
A lei é composta por 13 artigos assim divididos: 
• Art. 1º e 2º - apresentam os direitos das pessoas com 
transtorno mental; 
• Art. 3º - trata da responsabilidade do Estado no 
desenvolvimento da política de saúde mental, na assistência e 
na promoção de ações. 
• Art. 4º ao 10º - definem e regulamentam os tipos de 
internação; 
• Art. 11 - trata das pesquisas envolvendo pacientes; 
• Art. 12 - cria a Comissão Nacional para o acompanhamento da 
implementação da lei; 
• Art. 13 – vigora a lei a partir da data de sua publicação. 
O artigo 4º estabelece um limite para a ocorrência da 
internação: só deve ser indicada quando os recursos extra-
hospitalares se mostrarem insuficientes. Entretanto, não há 
uma definição para o que seja insuficiente. 
Os parágrafos do artigo regulamentam a internação e 
determinam que o tratamento deve primar pela reinserção 
social do paciente e oferecer assistência integral através de 
uma equipe multidisciplinar. 
VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos 
invasivos possíveis; 
IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários 
de saúde mental. 
Os tipos de internação são definidos: internação psiquiátrica 
voluntária (IPV), involuntária (IPI) e compulsória. 
I - Internação voluntária: aquela que se dá com o 
consentimento do usuário; 
II - Internação involuntária: aquela que se dá sem o 
consentimento do usuário e a pedido de terceiro; 
III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça. 
Resta, verificar como a IPV e seu término estão sendo 
realizados na prática diária dos hospitais. Embora a lei estipule 
este procedimento, não há referência para o que deve ser feito 
quando a pessoa não adquire sua alta, sobre as condições que 
impedem a cessação da IPV, nem sobre as conseqüências para 
o hospital que não cumpre a determinação da lei. 
A lei “dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas 
portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo 
assistencial em saúde mental”, entretanto, nenhum artigo 
aborda diretamente a questão do modelo assistencial nem 
menciona a constituição de serviços substitutivos em 
detrimento ao modelo asilar. Apenas determina que a 
internação ocorra em estrutura que contenha equipe 
multidisciplinar (art. 4º § 2º) e que a pessoa seja tratada, 
preferencialmente em serviços comunitários de saúde mental 
(art. 2º- IX). Não há definição do que seja um serviço 
comunitário e a lei mantém a permanência do modelo 
hospitalocêntrico. 
Embora possamos apresentar críticas ao texto desta nova lei 
federal, ela representa um avanço para o processo de reforma 
psiquiátrica e para a transformação do modelo de assistência 
em saúde mental: o portador de transtorno mental foi 
reconhecido em seus direitos que se tornaram explícitos na lei 
e as internações psiquiátricas foram diferenciadas e 
regulamentadas. 
O parágrafo 1º do artigo 10º tratava da função do Ministério 
Público no controle das internações involuntárias e 
autorizava a formação de uma equipe revisora 
multiprofissional de saúde mental para atuar na fiscalização 
dessas internações, determinando se as mesmas deveriam 
prosseguir ou serem terminadas. 
4. A Portaria 2.391/02 e seu papel na regulamentação das 
internações 
Com o objetivo de regulamentar a comunicação da internação 
psiquiátrica involuntária foi promulgada em 2002 a Portaria n° 
2.391/GM que “regulamenta o controle das internações 
psiquiátricas involuntárias (IPI) e voluntárias (IPV) de acordo 
com o disposto na Lei 10.216, de 6 de abril de 2001, e os 
procedimentos de notificação da Comunicação das IPI e IPV ao 
Ministério Público pelos estabelecimentos de saúde, 
integrantes ou não do SUS”. 
Como pontos principais da portaria, podem ser destacados: 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
• A internação psiquiátrica deve ser o último recurso escolhido 
como tratamento e durar o mínimo possível (Art. 2° − Contudo, 
o texto não define o que venha a ser o mínimo possível). 
• O estabelecimento de quatro modalidades de internação (a 
Lei 10.216/01 apresenta três modalidades): internação 
psiquiátrica involuntária, internação psiquiátrica voluntária, 
internação psiquiátrica voluntária que se torna involuntária 
(Art 3º § 3º - não prevista na Lei 10.216/01), internação 
psiquiátrica compulsória (Art.3°). 
• O estabelecimento das notificações das internações 
psiquiátricas involuntárias (Arts. 4º e 5°) e voluntárias que se 
tornam involuntárias (Art. 6º) ao Ministério Público Estadual 
num prazo de 72 horas; assim como a comunicação da alta 
hospitalar (quando relacionada à internação psiquiátrica 
involuntária) de acordo com o modelo de formulário fornecido 
pela Portaria (Art. 8°). 
• A constituição de uma Comissão Revisora das Internações 
Psiquiátricas Involuntárias (Art.10) que realizará a revisão das 
internações psiquiátricas involuntárias, podendo através de 
laudo, confirmar ou suspender tal tratamento (Art.12). 
O modelo de comunicação apresentado pela Portaria traz um 
ponto bastante pertinente que diz respeito à justificativa de 
involuntariedade. Quando ocorre uma internação é 
importante verificar a justificativa de necessidade de 
tratamento, a necessidade de tratamento em regime de 
internação e, se for involuntária, a necessidade de internação 
contra a vontade da pessoa. 
5. LEI No 10.708- DE 31 DE JULHO DE 2003 
Institui o auxílio-reabilitação psicossocial para pacientes 
acometidos de transtornos mentais egressos de internações. O 
auxílio é parte integrante de um programa de ressocialização 
de pacientes internados em hospitais ou unidades 
psiquiátricas, denominado "De Volta Para Casa", sob 
coordenação do Ministério da Saúde. 
§ 1º É fixado o valor do benefício de R$ 240,00 (duzentos e 
quarenta reais), podendo ser reajustado pelo Poder Executivo 
de acordo com a disponibilidade orçamentária. § 2º Os valores 
serão pagos diretamente aos beneficiários, mediante convênio 
com instituição financeira oficial, salvo na hipótese de 
incapacidade de exercer pessoalmente os atos da vida civil, 
quando serão pagos ao representante legal do paciente. 
§ 3º O benefício terá a duração de um ano, podendo ser 
renovado quando necessário aos propósitos da reintegração 
social do paciente. 
Art. 3º São requisitos cumulativos para a obtenção do 
benefício criado por esta Lei que: 
I - O paciente seja egresso de internação psiquiátricacuja 
duração tenha sido, comprovadamente, por um período igual 
ou superior a dois anos; 
 II - A situação clínica e social do paciente não justifique a 
permanência em ambiente hospitalar, indique tecnicamente a 
possibilidade de inclusão em programa de reintegração social 
e a necessidade de auxílio financeiro; 
III - haja expresso consentimento do paciente, ou de seu 
representante legal, em se submeter às regras do programa; 
IV - Seja garantida ao beneficiado a atenção continuada em 
saúde mental, na rede de saúde local ou regional. 
PANORAMA ATUAL DA ASSISTÊNCIA/DESASSISTÊNCIA 
PSIQUIÁTRICA. 
A REFORMA PSIQUIÁTRICA DEPOIS DA LEI NACIONAL 
A promulgação da lei 10.216 impõe novo impulso e novo ritmo 
para o processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil. É no 
contexto da promulgação da lei 10.216 e da realização da III 
Conferência Nacional de Saúde Mental, que a política de saúde 
mental do governo federal, alinhada com as diretrizes da 
Reforma Psiquiátrica, passa a consolidar-se, ganhando maior 
sustentação e visibilidade. 
Linhas específicas de financiamento são criadas pelo Ministério 
da Saúde para os serviços abertos e substitutivos ao hospital 
psiquiátrico e novos mecanismos são criados para a 
fiscalização, gestão e redução programada de leitos 
psiquiátricos no país. 
Neste mesmo período, o processo de desinstitucionalização de 
pessoas longamente internadas é impulsionado, com a criação 
do Programa “De Volta para Casa”. Uma política de recursos 
humanos para a Reforma Psiquiátrica é construída, e é traçada 
a política para a questão do álcool e de outras drogas, 
incorporando a estratégia de redução de danos. Realiza-se, em 
2004, o primeiro Congresso Brasileiro de Centros de Atenção 
Psicossocial, em São Paulo, reunindo dois mil trabalhadores e 
usuários de CAPS. 
É neste período que a Reforma Psiquiátrica se consolida como 
política oficial do governo federal. 
Merece destaque a realização, ao final do ano de 2001, em 
Brasília, da III Conferência Nacional de Saúde Mental 
convocada logo após a promulgação da lei 10.216. a III 
Conferência consolida a Reforma Psiquiátrica como política de 
governo, confere aos CAPS o valor estratégico para a mudança 
do modelo de assistência, defende a construção de uma 
política de saúde mental para os usuários de álcool e outras 
drogas, e estabelece o controle social como a garantia do 
avanço da Reforma Psiquiátrica no Brasil. É a III Conferência 
Nacional de Saúde Mental, com ampla participação dos 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
movimentos sociais, de usuários e de seus familiares, que 
fornece os substratos políticos e teóricos para a política de 
saúde mental no Brasil. 
O PROCESSO DE DESINSTITUCIONALIZAÇÃO E 
REESTRUTURAÇÃO DA ASSISTÊNCIA HOSPITALAR 
PSIQUIÁTRICA 
REDUÇÃO DOS LEITOS 
O processo de redução de leitos em hospitais psiquiátricos e 
de desinstitucionalização de pessoas com longo histórico de 
internação passa a tornar-se política pública no Brasil a partir 
dos anos 90, e ganha grande impulso em 2002 com uma série 
de normatizações do Ministério da Saúde. 
O Programa Nacional de Avaliação do Sistema 
Hospitalar/Psiquiatria (PNASH/Psiquiatria), o Programa Anual 
de Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica no 
SUS (PRH), assim como a instituição do Programa de Volta para 
Casa e a expansão de serviços como os Centros de Atenção 
Psicossocial e as Residências Terapêuticas, vem permitindo a 
redução de milhares de leitos psiquiátricos no país e o 
fechamento de vários hospitais psiquiátricos. Embora em 
ritmos diferenciados, a redução do número de leitos 
psiquiátricos vem se efetivando em todos os estados 
brasileiros. Entre os anos de 2003 e 2005 foram reduzidos 6227 
leitos. 
Entre os instrumentos de gestão que permitem as reduções e 
fechamentos de leitos de hospitais psiquiátricos de forma 
gradual, pactuada e planejada, está o Programa Nacional de 
Avaliação do Sistema Hospitalar/Psiquiatria 
(PNASH/Psiquiatria), instituído em 2002, por normatização do 
Ministério da Saúde. Essencialmente um instrumento de 
avaliação, o PNASH/Psiquiatria permite aos gestores um 
diagnóstico da qualidade da assistência dos hospitais 
psiquiátricos conveniados e públicos existentes em sua rede de 
saúde, ao mesmo tempo que indica aos prestadores critérios 
para uma assistência psiquiátrica hospitalar compatível com as 
normas do SUS, e descredencia aqueles hospitais sem qualquer 
qualidade na assistência prestada a sua população adscrita. 
A AVALIAÇÃO ANUAL DOS HOSPITAIS E SEU IMPACTO NA 
REFORMA 
É importante ressaltar que a tradição de controle e avaliação 
anterior ao PNASH-Psiquiatria ancorava-se em dois 
mecanismos: as supervisões hospitalares, realizadas por 
supervisores do SUS, de alcance limitado, e as fiscalizações ou 
auditorias que atendiam a denúncias de mau funcionamento 
das unidades. É a partir da instituição do PNASH/Psiquiatria 
que o processo de avaliação da rede hospitalar psiquiátrica 
pertencente ao Sistema Único de Saúde passa a ser sistemático 
e anual, e realizado por técnicos de três campos 
complementares: o técnico-clínico, a vigilância sanitária e o 
controle normativo. 
Este instrumento gera uma pontuação que, cruzada com o 
número de leitos do hospital, permite classificar os hospitais 
psiquiátricos em quatro grupos diferenciados: aqueles de boa 
qualidade de assistência; os de qualidade suficiente; aqueles 
que precisam de adequações e devem sofrer revistoria; e 
aqueles de baixa qualidade, encaminhados para o 
descredenciamento pelo Ministério da Saúde, com os cuidados 
necessários para evitar desassistência à população. 
AS RESIDÊNCIAS TERAPÊUTICAS 
A implementação e o financiamento de Serviços Residenciais 
Terapêuticos (SRT) surgem neste contexto como componentes 
decisivos da política de saúde mental do Ministério da Saúde 
para a concretização das diretrizes de superação do modelo de 
atenção centrado no hospital psiquiátrico. Assim, os Serviços 
Residenciais Terapêuticos, residências terapêuticas ou 
simplesmente moradias, são casas localizadas no espaço 
urbano, constituídas para responder às necessidades de 
moradia de pessoas portadoras de transtornos mentais graves, 
egressas de hospitais psiquiátricos ou não. 
Embora as residências terapêuticas se configurem como 
equipamentos da saúde, estas casas, implantadas na cidade, 
devem ser capazes em primeiro lugar de garantir o direito à 
moradia das pessoas egressas de hospitais psiquiátricos e de 
auxiliar o morador em seu processo – às vezes difícil – de 
reintegração na comunidade. Os direitos de morar e de circular 
nos espaços da cidade e da comunidade são, de fato, os mais 
fundamentais direitos que se reconstituem com a implantação 
nos municípios de Serviços Residenciais Terapêuticos. 
Uma Residência Terapêutica deve acolher, no máximo, oito 
moradores. De forma geral, um cuidador é designado para 
apoiar os moradores nas tarefas, dilemas e conflitos cotidianos 
do morar, do co-habitar e do circular na cidade, em busca da 
autonomia do usuário. Cada residência deve estar 
referenciada a um Centro de Atenção Psicossocial e operar 
junto à rede de atenção à saúde mental dentro da lógica do 
território. 
O PROGRAMA DE VOLTA PARA CASA 
O Programa de Volta para Casa é um dos instrumentos mais 
efetivos para a reintegração social das pessoas com longo 
histórico de hospitalização. Trata-se de uma das estratégias 
mais potencializadoras da emancipação de pessoas com 
transtornos mentais e dos processos de desinstitucionalização 
e redução de leitos nos estados e municípios. Criado pela lei 
federal 10.708, encaminhada pelo presidente Luís Inácio Lula 
da Silva ao Congresso, votada e sancionada em 2003, o 
Programa é a concretização de uma reivindicação histórica do 
movimento da Reforma Psiquiátrica Brasileira, tendo sido 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
formulado como proposta já à época daII Conferência 
Nacional de Saúde Mental, em 1992. 
O objetivo do Programa é contribuir efetivamente para o 
processo de inserção social das pessoas com longa história de 
internações em hospitais psiquiátricos, através do pagamento 
mensal de um auxílio-reabilitação, no valor de R$240,00 
(duzentos e quarenta reais, aproximadamente 110 dólares) 
aos seus beneficiários. Para receber o auxílio reabilitação do 
Programa De Volta para Casa, a pessoa deve ser egressa de 
Hospital Psiquiátrico ou de Hospital de Custódia e Tratamento 
Psiquiátrico, e ter indicação para inclusão em programa 
municipal de reintegração social. 
Cada beneficiário do Programa recebe um cartão magnético, 
com o qual pode sacar e movimentar mensalmente estes 
recursos. O município de residência do beneficiário deve, para 
habilitar-se ao Programa, ter assegurada uma estratégia de 
acompanhamento dos beneficiários e uma rede de atenção à 
saúde mental capaz de dar uma resposta efetiva às demandas 
de saúde mental. A cada ano o benefício pode ser renovado, 
caso o beneficiário e a equipe de saúde que o acompanha 
entendam ser esta uma estratégia ainda necessária para o 
processo de reabilitação. 
Além do esperado desafio da mudança efetiva do modelo de 
atenção à saúde mental nos estados e municípios, o Programa 
de Volta para Casa enfrenta uma situação paradigmática, 
produzida por um longo processo de exclusão social. A grande 
maioria dos potenciais beneficiários, sendo egressos de longas 
internações em hospitais psiquiátricos, não possuem a 
documentação pessoal mínima para o cadastramento no 
Programa. Muitos não possuem certidão de nascimento ou 
carteira de identidade O longo e secular processo de exclusão 
e isolamento dessas pessoas, além dos modos de 
funcionamento típicos das instituições totais, implicam muitas 
vezes na ausência de instrumentos mínimos para o exercício 
da cidadania. 
Este é ainda um desafio para a consolidação do Programa, que 
vem sendo enfrentado através da parceria entre o Ministério 
da Saúde, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do 
Ministério Público Federal e a Secretaria Especial de Direitos 
Humanos da Presidência da República, para restituir o direito 
fundamental de identificação e garantir o direito destas 
pessoas ao auxílio-reabilitação do Programa de Volta para 
Casa. Desta forma, verdadeiros “mutirões da cidadania” vêm 
se estruturando nos municípios para garantir a identificação 
tardia destas pessoas, num processo fundamental de inclusão 
social e garantia dos direitos fundamentais das pessoas com 
transtornos mentais, desafio primeiro da Reforma Psiquiátrica 
Brasileira. 
A ESTRATÉGIA DE REDUÇÃO PROGRESSIVA A PARTIR DOS 
HOSPITAIS DE GRANDE PORTE 
O Ministério da Saúde aprova em 2004 o Programa Anual de 
Reestruturação da Assistência Hospitalar no SUS (PRH). A 
principal estratégia do Programa é promover a redução 
progressiva e pactuada de leitos a partir dos macro hospitais 
(acima de 600 leitos, muitas vezes hospitais-cidade, com mais 
de mil leitos) e hospitais de grande porte (com 240 a 600 leitos 
psiquiátricos). Assim, são componentes fundamentais do 
programa a redução do peso assistencial dos hospitais de 
maior porte, e a pactuação entre os gestores do SUS – os 
hospitais e as instâncias de controle social – da redução 
planejada de leitos, evitando a desassistência. 
Para tanto, são definidos no Programa os limites máximos e 
mínimos de redução anual de leitos para cada classe de 
hospitais (definidas pelo número de leitos existentes, 
contratados pelo SUS). Assim, todos os hospitais com mais de 
200 leitos devem reduzir no mínimo, a cada ano, 40 leitos. Os 
hospitais entre 320 e 440 leitos podem chegar a reduzir 80 
leitos ao ano (mínimo: 40), e os hospitais com mais de 440 
leitos podem chegar a reduzir, no máximo, 120 leitos ao ano. 
Desta forma, busca-se a redução progressiva do porte 
hospitalar, de modo a situarem-se os hospitais, ao longo do 
tempo, em classes de menor porte (idealmente, até 160 leitos). 
Ao mesmo tempo, garante-se que as reduções de leitos se 
efetivem de forma planejada, de modo a não provocar 
desassistência nas regiões onde o hospital psiquiátrico ainda 
tem grande peso na assistência às pessoas com transtornos 
mentais. Este processo, com ritmo pactuado entre os gestores 
do município e do estado, hospitais e controle social, deve 
incluir o aumento progressivo dos equipamentos e das ações 
para a desinstitucionalização, tais como CAPS, Residências 
Terapêuticas, Centros de Convivência e a habilitação do 
município no Programa de Volta para Casa. 
Na mesma direção estratégica, o Programa recompõe as 
diárias hospitalares em psiquiatria. Assim, a partir do 
Programa, passam a vigorar diárias hospitalares compostas e 
diferenciadas para os hospitais, levando-se em conta o seu 
porte (classe), a qualidade do atendimento avaliada 
anualmente pelo PNASH/Psiquiatria e a redução de leitos 
efetivada. Desta forma, recebem incentivos financeiros, 
através de novos valores de diárias hospitalares, aqueles 
hospitais que efetivam a redução de leitos, reduzindo o seu 
porte, e qualificam o atendimento prestado, verificado pelo 
PNASH/Psiquiatria. Assim, passam a ser melhor remunerados 
pelo SUS todos os hospitais que reduzem leitos e que 
melhoram a qualidade de atendimento, aferida pelo 
PNASH/Psiquiatria. A partir do Programa, a recomposição das 
diárias hospitalares passa a ser uma ferramenta da política de 
redução racional dos leitos e qualificação do atendimento em 
psiquiatria no SUS. 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
O Programa também busca garantir que os recursos que 
deixem de ser utilizados nos hospitais, com a progressiva 
redução de leitos, permaneçam no campo das ações de saúde 
mental e sejam direcionados para os equipamentos da 
Reforma Psiquiátrica. 
MANICÔMIOS JUDICIÁRIOS: UM DESAFIO PARA A REFORMA 
Estes hospitais, não sendo geridos pelo Sistema Único de 
Saúde, mas por órgãos da Justiça, não estão submetidos às 
normas gerais de funcionamento do SUS, ao 
PNASH/Psiquiatria (com única exceção dos Hospitais de 
Custódia do Rio de Janeiro), ou ao Programa Anual de 
Reestruturação da Assistência Hospitalar Psiquiátrica. São 
frequentes as denúncias de maus tratos e os óbitos nestes 
estabelecimentos. 
No ordenamento jurídico brasileiro, as pessoas com 
transtornos mentais que cometem crimes são consideradas 
inimputáveis, isto é, isentas de pena. Estas pessoas são 
submetidas, no entanto, à medida de segurança, espécie de 
tratamento compulsório, cuja principal consequência é a 
segregação perpétua ou por longo período, através da 
internação, da pessoa acometida de transtornos mentais que 
cometeu um crime ou uma infração. A publicação da lei 
10.216, assim como as resoluções da III Conferência Nacional 
de Saúde Mental, vêm fomentando, no entanto, de forma 
inequívoca, a mudança das práticas na assistência ao louco 
infrator. 
O Ministério da Saúde desde então vem apoiando experiências 
interinstitucionais extremamente bem sucedidas, que buscam 
tratar o louco infrator fora do manicômio judiciário, na rede 
SUS extra-hospitalar de atenção à saúde mental, 
especialmente nos Centros de Atenção Psicossocial. 
PROGRAMA DE INCLUSÃO SOCIAL PELO TRABALHO 
Um dos principais desafios da Reforma Psiquiátrica - processo 
amplo de inclusão social e promoção da cidadania das pessoas 
com transtornos mentais - é a potencialização do trabalho 
como instrumento de inclusão social dos usuários dos serviços. 
Embora os diversos serviços da rede de atenção à saúde 
mental fomentem a criação de cooperativas e associações e 
realizem oficinas de geração de renda, estas experiências, 
mesmo que com ótimos resultados, caracterizam-se ainda por 
sua frágil sustentação institucional e financeira. 
Neste contexto, o marco da Economia Solidária, como 
movimento de luta contra a exclusão social e econômica,surge 
como parceiro natural para a discussão da exclusão das 
pessoas com transtornos mentais do mercado de trabalho. De 
fato, os movimentos da Reforma Psiquiátrica e da Economia 
Solidária compartilham princípios fundamentais quando fazem 
a opção ética, política e ideológica por uma sociedade marcada 
pela solidariedade. É somente no ano de 2004, no entanto, que 
estes movimentos passam a se encontrar, a se reconhecer e a 
dialogar, iniciando uma colaboração permanente entre estes 
campos e entre os integrantes dos movimentos sociais 
correspondentes, tendo como desafio a reinserção social de 
egressos de manicômios por meio da construção de 
empreendimentos solidários e autogestionários. 
A Economia Solidária, hoje política oficial do Ministério do 
Trabalho e Emprego, é um movimento organizado de resposta 
à exclusão por gênero, raça, idade, estilo de vida e instrução, 
entre outros fatores, das pessoas do campo do trabalho. É 
através de um diálogo permanente entre os campos da saúde 
mental e da economia solidária que o Programa de Inclusão 
Social pelo Trabalho das pessoas com transtornos mentais e 
transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas 
começa a ser delineado. 
A realização do Encontro Nacional de Centros de Atenção 
Psicossocial e a promoção conjunta, pelos Ministérios da 
Saúde e do Trabalho e Emprego, da primeira Oficina Nacional 
de Experiências de Geração de Renda de Usuários de Saúde 
Mental, ainda em 2004, possibilitou o primeiro contato com 
iniciativas de geração de renda em todo o país, e a construção 
das bases para um diálogo produtivo entre as políticas de 
saúde mental e economia solidária. 
É no ano de 2005, no entanto, que a criação de um Grupo de 
Trabalho composto pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho 
e Emprego, gestores do SUS, representantes das iniciativas de 
geração de renda e representantes de usuários, possibilita uma 
discussão mais sistematizada, ainda em andamento, em torno 
dos temas da saúde mental e da economia solidária e a 
inclusão destes temas nas agendas sociais do governo federal, 
dos estados e dos municípios. Em julho de 2005, o Ministério 
da Saúde implementa uma linha específica de incentivo 
financeiro para os municípios que desenvolvem atividades de 
inclusão social pelo trabalho para pessoas com transtornos 
mentais ou com transtornos decorrentes do uso de álcool e 
outras drogas. Pela primeira vez, estas iniciativas passam a 
receber recursos federais. 
REDE DE CUIDADOS 
A rede de atenção à saúde mental, composta por Centros de 
Atenção Psicossocial (CAPS), Serviços Residenciais 
Terapêuticos (SRT), Centros de Convivência, Ambulatórios de 
Saúde Mental e Hospitais Gerais, caracteriza-se por ser 
essencialmente pública, de base municipal e com um controle 
social fiscalizador e gestor no processo de consolidação da 
Reforma Psiquiátrica. O papel dos Conselhos Municipais, 
Estaduais e Nacional de Saúde, assim como das Conferências 
de Saúde Mental, é por excelência garantir a participação dos 
trabalhadores, usuários de saúde mental e seus familiares nos 
processos de gestão do SUS, favorecendo assim o 
protagonismo dos usuários na construção de uma rede de 
atenção à saúde mental. De fato, são as Conferências 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
Nacionais de Saúde Mental, e em especial a III Conferência 
Nacional de Saúde Mental, realizada em 2001, que consolidam 
a Reforma Psiquiátrica como política oficial do SUS e propõem 
a conformação de uma rede articulada e comunitária de 
cuidados para as pessoas com transtornos mentais. 
O papel estratégico dos CAPS 
Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), entre todos os 
dispositivos de atenção à saúde mental, têm valor estratégico 
para a Reforma Psiquiátrica Brasileira. É o surgimento destes 
serviços que passa a demonstrar a possibilidade de 
organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico 
no país. É função dos CAPS prestar atendimento clínico em 
regime de atenção diária, evitando assim as internações em 
hospitais psiquiátricos; promover a inserção social das pessoas 
com transtornos mentais através de ações intersetoriais; 
regular a porta de entrada da rede de assistência em saúde 
mental na sua área de atuação e dar suporte à atenção à saúde 
mental na rede básica. É função, portanto, e por excelência, 
dos CAPS organizar a rede de atenção às pessoas com 
transtornos mentais nos municípios. 
Os CAPS devem ser substitutivos, e não complementares ao 
hospital psiquiátrico. Cabe aos CAPS o acolhimento e a atenção 
às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes, 
procurando preservar e fortalecer os laços sociais do usuário 
em seu território. 
Os Centros de Atenção Psicossocial começaram a surgir nas 
cidades brasileiras na década de 80 e passaram a receber uma 
linha específica de financiamento do Ministério da Saúde a 
partir do ano de 2002, momento no qual estes serviços 
experimentam grande expansão. São serviços de saúde 
municipais, abertos, comunitários, que oferecem atendimento 
diário às pessoas com transtornos mentais severos e 
persistentes, realizando o acompanhamento clínico e a 
reinserção social destas pessoas através do acesso ao trabalho, 
lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços 
familiares e comunitários. 
Os CAPS se diferenciam pelo porte, capacidade de 
atendimento, clientela atendida e organizam-se no país de 
acordo com o perfil populacional dos municípios brasileiros. 
Assim, estes serviços diferenciam-se como CAPS I, CAPS II, 
CAPS III, CAPSi e CAPSad 
• Os CAPS I são os Centros de Atenção Psicossocial de menor 
porte, capazes de oferecer uma resposta efetiva às demandas 
de saúde mental em municípios com população entre 20.000 e 
50.000 habitantes. Estes serviços têm equipe mínima de 9 
profissionais, entre profissionais de nível médio e nível 
superior, e têm como clientela adultos com transtornos 
mentais severos e persistentes e transtornos decorrentes do 
uso de álcool e outras drogas. Funcionam durante os cinco dias 
úteis da semana, e têm capacidade para o acompanhamento 
de cerca de 240 pessoas por mês. 
• Os CAPS II são serviços de médio porte, e dão cobertura a 
municípios com mais de 50.000 habitantes. A clientela típica 
destes serviços é de adultos com transtornos mentais severos 
e persistentes. Os CAPS II têm equipe mínima de 12 
profissionais, entre profissionais de nível médio e nível 
superior, e capacidade para o acompanhamento de cerca de 
360 pessoas por mês. Funcionam durante os cinco dias úteis da 
semana. 
• Os CAPS III são os serviços de maior porte da rede CAPS. 
Previstos para dar cobertura aos municípios com mais de 
200.000 habitantes. Os CAPS III são serviços de grande 
complexidade, uma vez que funcionam durante 24 horas em 
todos os dias da semana e em feriados. Com no máximo cinco 
leitos, o CAPS III realiza, quando necessário, acolhimento 
noturno (internações curtas, de algumas horas a no máximo 7 
dias). A equipe mínima para estes serviços deve contar com 16 
profissionais, entre os profissionais de nível médio e superior, 
além de equipe noturna e de final de semana. Estes serviços 
têm capacidade para realizar o acompanhamento de cerca de 
450 pessoas por mês. 
• Os CAPSi, especializados no atendimento de crianças e 
adolescentes com transtornos mentais, são equipamentos 
geralmente necessários para dar resposta à demanda em 
saúde mental em municípios com mais de 200.000 habitantes. 
Funcionam durante os cinco dias úteis da semana, e têm 
capacidade para realizar o acompanhamento de cerca de 180 
crianças e adolescentes por mês. A equipe mínima para estes 
serviços é de 11 profissionais de nível médio e superior. 
 • Os CAPSad, especializados no atendimento de pessoas que 
fazem uso prejudicial de álcool e outras drogas, são 
equipamentos previstos para cidades com mais de 200.000 
habitantes, ou cidades que, por sua localizaçãogeográfica 
(municípios de fronteira, ou parte de rota de tráfico de drogas) 
ou cenários epidemiológicos importantes, necessitem deste 
serviço para dar resposta efetiva às demandas de saúde 
mental. Funcionam durante os cinco dias úteis da semana, e 
têm capacidade para realizar o acompanhamento de cerca de 
240 pessoas por mês. A equipe mínima prevista para os 
CAPSad é composta por 13 profissionais de nível médio e 
superior. 
O perfil populacional dos municípios é sem dúvida um dos 
principais critérios para o planejamento da rede de atenção à 
saúde mental nas cidades, e para a implantação de Centros de 
Atenção Psicossocial. O critério populacional, no entanto, deve 
ser compreendido apenas como um orientador para o 
planejamento das ações de saúde. 
Saúde Mental na atenção primária: articulação com o 
programa de saúde da família 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
Por sua proximidade com famílias e comunidades, as equipes 
da Atenção Básica se apresentam como um recurso estratégico 
para o enfrentamento de importantes problemas de saúde 
pública, como os agravos vinculados ao uso abusivo de álcool, 
drogas e diversas outras formas de sofrimento psíquico. Existe 
um componente de sofrimento subjetivo associado a toda e 
qualquer doença, às vezes atuando como entrave à adesão a 
práticas preventivas ou de vida mais saudáveis. Poderíamos 
dizer que todo problema de saúde é também – e sempre – de 
saúde mental, e que toda saúde mental é também – e sempre 
– produção de saúde. Nesse sentido, será sempre importante 
e necessária a articulação da saúde mental com a Atenção 
Básica. 
Contudo, nem sempre a Atenção Básica apresenta condições 
para dar conta desta importante tarefa. Por esta razão, o 
Ministério da Saúde vem estimulando ativamente, nas 
políticas de expansão, formulação e avaliação da Atenção 
Básica, diretrizes que incluam a dimensão subjetiva dos 
usuários e os problemas mais frequentes de saúde mental. 
Afinal, grande parte das pessoas com transtornos mentais 
leves ou severos está sendo efetivamente atendida pelas 
equipes de Atenção Básica nos grandes e pequenos 
municípios. Assumir este compromisso é uma forma de 
responsabilização em relação à produção da saúde, à busca da 
eficácia das práticas e à promoção de equidade, da 
integralidade e da cidadania num sentido mais amplo, 
especialmente em relação aos pequenos municípios (grande 
maioria dos municípios brasileiros), onde não é necessária a 
implantação de Centros de Atenção Psicossocial. 
Assim, o Ministério da Saúde vem construindo nos últimos 
anos as diretrizes e condições para que nos municípios com 
menos de 20.000 habitantes a rede de cuidados em saúde 
mental estruture-se a partir da Atenção Básica. Nestes 
municípios, pequenas equipes de saúde mental, que podem 
estar lotadas em ambulatórios (ou CAPS de municípios 
vizinhos), por exemplo, passam a dar apoio matricial às 
equipes de Atenção Básica. 
A responsabilização compartilhada dos casos exclui a lógica do 
encaminhamento, pois visa aumentar a capacidade resolutiva 
de problemas de saúde pela equipe local. No caso de 
municípios maiores, onde estão implantados CAPS ou outros 
equipamentos da rede de atenção à saúde mental, a lógica do 
apoio matricial é a mesma: a equipe do CAPS, juntamente com 
membros das equipes dos outros equipamentos, apóiam as 
diferentes equipes de Atenção Básica através de ações de 
supervisão, atendimento conjunto e específico e capacitação. 
Em todos os cenários, as equipes matriciais de saúde mental e 
da Atenção Básica compartilham os casos e constroem 
coletivamente as estratégias para a abordagem de problemas 
vinculados à violência, ao abuso de álcool e outras drogas, as 
estratégias para redução de danos, o fomento de ações para a 
diminuição da segregação pela loucura e combate ao estigma, 
e o desenvolvimento de ações de mobilização dos recursos 
comunitários para a reabilitação psicossocial. 
A partir de 2011, a portaria 3088/2011 institui a Rede de 
Atenção Psicossocial (RAPS) que reorienta o cuidado em 
diferentes níveis de assistência. Na Atenção Básica, propõe o 
atendimento a partir dos serviços na Unidade Básica em saúde, 
Equipes de Saúde da Família, Consultório na Rua, Serviços de 
Atenção Residencial de Caráter Transitório e seus serviços de 
apoio, Centros de Convivência e Cultura. Já em Atenção 
Secundária temos os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) 
em suas diferentes modalidades. Compõem a Atenção de 
Urgência e Emergência: Serviço de Atendimento Móvel de 
Urgência (SAMU), Sala de estabilização, Unidade de Pronto 
Atendimento (UPA), que funciona 24 horas, hospitais gerais 
com leitos. O tripé composto pelos Serviços de residenciais 
terapêuticos (SRT), pelo Programa de volta para Casa (PVC) e 
pelo Programa de Redução de Leitos Hospitalares de Longa 
Permanência articula a desinstitucionalização de pacientes 
longamente internados. Finalmente, Iniciativas de Trabalho e 
Renda com empreendimentos solidários e cooperativas sociais 
são previstas na Portaria 1169/2005. Embora a portaria 
3088/2011 habilite todos os níveis de atenção do SUS a atuar 
em saúde mental, situa apenas o Consultório na Rua, a Atenção 
Residencial de Caráter Transitório e os Centros de Convivência 
como serviços voltados à saúde mental na atenção básica, 
sendo os dois primeiros mais direcionados à população 
residente na rua. Na atenção secundária, a portaria 3088/2011 
institui apenas os CAPS como serviço especializado, omitindo 
outros dispositivos voltados à população em sofrimento 
existencial grave, porém sem crise aguda, tais como hospitais 
dia, acompanhantes terapêuticos, serviços de readaptação 
laboral e dispositivos de atendimento comunitário intensivo. 
Assim, usuários que não se adaptem à proposta institucional, 
ao ambiente relacional ou aos serviços oferecidos no CAPS de 
sua região têm dificuldades de acolhimento nesse nível de 
atenção. 
OS PRINCIPAIS DESAFIOS DA REFORMA PSIQUIÁTRICA 
Algumas considerações devem ser feitas a respeito destes dois 
desafios cruciais da Reforma, que são também os desafios do 
SUS. 
• Estima-se que 3% da população necessitam cuidados 
contínuos em saúde mental, em função de transtornos severos 
e persistentes (psicoses, neuroses graves, transtornos de 
humor graves, deficiência mental com grave dificuldade de 
adaptação). A magnitude do problema (no Brasil, cerca de 5 
milhões de pessoas) exige uma rede de cuidados densa, 
diversificada e efetiva. 
• Cerca de 10 a 12% da população não sofrem transtornos 
severos, mas precisam de cuidados em saúde mental, na forma 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
de consulta médico-psicológica, aconselhamento, grupos de 
orientação e outras formas de abordagem. 
• O modelo hospitalocêntrico (e também o dos ambulatórios 
de especialidades), por ser concentrador de recursos e de 
baixa cobertura, é incompatível com a garantia da 
acessibilidade. 
• Sem a potencialização da rede básica ou atenção primária de 
saúde, para a abordagem das situações de saúde mental, não 
é possível desenhar respostas efetivas para o desafio da 
acessibilidade. 
• Transtornos graves associados ao consumo de álcool e outras 
drogas (exceto tabaco) atingem pelo 12% da população acima 
de 12 anos, sendo o impacto do álcool dez vezes maior que o 
do conjunto das drogas ilícitas. A criminalização do consumo 
agrava a vulnerabilidade dos usuários de drogas, exigindo uma 
articulação efetiva e inventiva entre a rede de cuidados e 
outras políticas setoriais, como justiça, segurança pública, 
trabalho, educação, ação social. Sem esta articulação e 
cooperação intersetorial, um acesso efetivo à prevenção e ao 
tratamento não está assegurado. 
• A qualidade do atendimento deve ser garantida em todas as 
regiões do país, mesmo as mais carentes e distantes dos 
centros universitários, e pode ser assegurada através de um 
forte programa de capacitação,supervisão e formação de 
multiplicadores. O distanciamento entre as instituições de 
formação e pesquisa e a saúde pública, no Brasil, agrava as 
carências de formação e qualificação de profissionais. 
Formação de Recursos Humanos 
 Um dos principais desafios para o processo de consolidação da 
Reforma Psiquiátrica Brasileira é a formação de recursos 
humanos capazes de superar o paradigma da tutela do louco e 
da loucura. O processo da Reforma psiquiátrica exige cada vez 
mais da formação técnica e teórica dos trabalhadores, muitas 
vezes desmotivados por baixas remunerações ou contratos 
precários de trabalho. Ainda, várias localidades do país têm 
muitas dificuldades para o recrutamento de determinadas 
categorias profissionais, geralmente formadas e residentes nos 
grandes centros urbanos. Por esta razão, desde o ano de 2002 
o Ministério da Saúde desenvolve o Programa Permanente de 
Formação de Recursos Humanos para a Reforma Psiquiátrica, 
que incentiva, apóia e financia a implantação de núcleos de 
formação em saúde mental para a Reforma Psiquiátrica, 
através de convênios estabelecidos com a participação de 
instituições formadoras ( especialmente universidades 
federais ), municípios e estados. 
A partir de 2003, o Ministério instituiu uma estrutura 
organizativa mais ampla, a Secretaria Nacional de Gestão do 
Trabalho em Saúde (SGESTES), para enfrentar as necessidades 
qualitativas e quantitativas de recursos humanos para o SUS. 
No campo da saúde mental, existem hoje 21 núcleos regionais 
em funcionamento, realizando cursos de especialização e 
atualização para trabalhadores da atenção básica e dos CAPS, 
e beneficiando profissionais de 15 estados. 
CONHECER O MODELO E A REDE DO ATENDIMENTO 
PSIQUIÁTRICO NO ESTADO DO AMAPÁ. 
Nos casos de pacientes em crise ou surto, o primeiro 
atendimento acontece no Hospital de Emergência (HE), em 
Macapá, que oferta 24 horas serviços de atendimento 
psicológico para casos de urgência e emergência, como crises 
de ansiedade, depressão, abuso ou qualquer tipo de violência 
e traumas psicológicos, além de tentativas de suicídio. 
O paciente pode ficar internado na unidade por até 72 horas 
ou até ser estabilizado. Caso ele necessite continuar internado 
ele será encaminhado para a Enfermaria Psiquiátrica do 
complexo do Hospital de Clinicas Alberto Lima (HCAL). 
Cada paciente recebe um plano de cuidados individualizado de 
acordo com o seu histórico clínico e psiquiátrico, que pode 
incluir a participação em atividades de terapia ocupacional, 
pintura, dança, música, desportivas, recreativas e jogos de 
inteligência. 
 Durante sua permanência, os familiares são acompanhados 
pelo serviço social e recebem acompanhamento psicológico, 
uma vez que o transtorno afeta também fortemente os 
familiares. Além destes cuidados, os pacientes são 
acompanhados por odontólogos, clínicos gerais, nutricionista, 
equipe de enfermagem entre outros profissionais. 
No complexo do Hcal funciona ainda o Ambulatório de Saúde 
Mental, serviço especializado que acompanha de forma 
ambulatorial o tratamento de pessoas com transtornos metais 
e de humor como depressão, ansiedade, síndrome do pânico, 
estresse, de comportamento e personalidade, sono e 
alimentares. 
Atualmente o Ambulatório possui quase 16 mil usuários 
cadastrados, o que o torna, dentro da rede de atenção em 
saúde mental, o dispositivo de maior demanda dos usuários no 
estado. 
O paciente também pode ser inserido nas redes de serviço 
como os Centros de Apoio Psíquico Social (Caps), onde poderá 
receber maior suporte para o tratamento de possíveis 
transtornos psicológicos. 
O Caps Casa da Gentileza (CAPS III) é a referência no 
atendimento e tratamento à pessoa com sofrimento mental 
severo e persistente. O trabalho é voltado para estimular a 
Suzana Vasconcelos MEDXIII 
integração social e familiar através de atendimento médico e 
psicossocial. 
O Caps Álcool e Drogas (AD) é destinado ao atendimento diário 
à população adulta com transtornos decorrentes do uso e 
dependência de substâncias psicoativas, como álcool e outras 
drogas. 
Também existe o CAPS Infantojuvenil (IJ) no município de 
Santana, para crianças e jovens até 17 anos que apresentam 
transtornos mentais ou decorrentes do uso de drogas.

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