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Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 2 5. Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 5.1.Introdução Dando sequência ao nosso curso, vamos estudar agora os carregamentos aos quais uma estrutura está submetida. Basicamente podemos dividir estas cargas em quatro grupos: o peso próprio, as instalações, a utilização e as intempéries. O peso próprio é a única categoria de carga que sempre irá atuar sobre qualquer elemento estrutural, pois é do peso do elemento que depende a sua existência. Naturalmente é dependente do material e, para estruturas em concreto armado, chega a representar mais de 60% do total de cargas de uma estrutura. Por sua vez, as cargas de instalações são causadas pelos elementos que compõem a estrutura funcional do edifício: paredes de alvenaria, forros, esquadrias, instalações elétricas, hidráulicas, pisos, entre outras. Apesar de estarem presentes quase que na totalidade da vida útil da estrutura, podem sofrer alterações à medida que se deseja alterar o tipo de utilização que o edifício terá. Já as cargas de utilização são compostas pelas ações de quem ocupa o edifício: pessoas, móveis, automóveis, equipamentos, entre outros. São carregamentos de alta variabilidade temporal e espacial. Por fim, temos as cargas de intempéries, que não são controladas por ação humana e variam de forma inconstante, como por exemplo ventos, chuvas, neve, sismos, incêndios, etc. Ainda podemos classificar um outro tipo de carregamento, chamado de excepcional, que trata basicamente de acidentes que a estrutura pode sofrer, sem a possibilidade de previsão, como explosões ou acidentes de trânsito. De forma a ser impossível mensurar este tipo de carregamento, ele não é considerado em projeto. A Figura 1 exemplifica a atuação das cargas em uma estrutura. Figura 1 - Esquema de atuação de cargas sobre estruturas Peso próprio Instalações Utilização Intempéries Estrutura Excepcionais ? Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 3 5.2.Variação de carregamentos para dimensionamento estrutural A consideração dos quatro grupos de carregamentos que atuam sobre uma estrutura sempre deve ser feita em forma de combinações de cargas, como já estudamos no tópico 3. Lembra-se de como era montada a equação de combinação normal última? Vamos recordá-la: 𝐹𝑑 = 𝛾𝑔𝐹𝑔𝑘 + 𝛾𝜀𝑔𝐹𝜀𝑔𝑘 + 𝛾𝑞 (𝐹𝑞1𝑘 +∑𝜓0𝑗𝐹𝑞𝑗𝑘) + 𝛾𝜀𝑞𝜓0𝜀𝐹𝜀𝑞𝑘 Note que a equação é composta pela soma de quatro termos: ações permanentes diretas, ações permanentes indiretas, ações variáveis diretas e ações variáveis indiretas. Isso deixa claro que há necessidade de tratamento diferenciado entre cargas permanentes e variáveis, justamente pelo fator de variabilidade de esforços. E dentre os quatro grupos de carregamentos apresentados, dois fazem parte de esforços considerados permanentes – peso próprio e instalações – e dois de variáveis – utilização e intempéries. Dentre os critérios de classificação, Fusco e Onishi (2018) resumem o fator variabilidade de ações no Quadro 1. Quadro 1 - Classificação de variabilidade de ações Critérios de classificação Tipo de ação Variação no tempo Ações permanentes Ações variáveis Ações excepcionais Variação no espaço Ações fixas Ações livres Variação na natureza mecânica Ações estáticas (sem acelerações) Ações dinâmicas (com acelerações) Fonte: Fusco e Onishi (2018) Ainda é importante salientar que há diferenças entre as cargas variáveis no que diz respeito a tempo de permanência sobre a estrutura e também na sua frequência de atuação. Esta classificação está diretamente relacionada ao comportamento da estrutura aos estados limites de serviço, pois são estes esforços que atuam na formação de fissuras, Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 4 vibrações e deformações. Quadro 2 - Combinações para ELS e suas propriedades quanto à cargas Combinação para ELS Tempo de permanência Variabilidade de frequência Tipo de ELS Quase permanentes Alto Baixo Deformações excessivas Formação de fissuras Frequentes Baixo Alto Vibrações excessivas Abertura de fissuras Raras Baixo Baixo Formação de fissuras Abertura de fissuras Pois bem, a diferença de tratamento entre ações permanentes e variáveis é justamente devido a esse fator de variabilidade. Enquanto para cargas permanentes temos a certeza do seu comportamento ao longo do tempo, as variáveis podem impor condições distintas à estrutura, como maiores concentrações em algumas áreas específicas, por exemplo. Agora, vamos estudar mais detalhadamente os tipos de esforços e apresentar como a norma técnica ABNT NBR 6120 (1980) as determina. 5.3.Esforços permanentes Para as ações permanentes, os valores característicos, Fgk, devem ser adotados iguais aos valores médios das respectivas distribuições de probabilidade, sejam valores característicos superiores ou inferiores. Fusco e Onishi (2018) caracterizam o valor característico superior corresponde ao quantil de 95% da distribuição associada à população de materiais semelhantes, enquanto que o valor característico inferior corresponde ao quantil de 5% desta distribuição. Como podemos ver, e como já estudamos no tópico 3, estes valores não são discretos, mas sim fazem parte de uma distribuição normal. A fim de simplificar processos de projetos, os pesos próprios de materiais de construções mais usuais foram estudados estatisticamente e normatizados, expressos na norma ABNT NBR 6120 (1980) através de valores representativos, com Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 5 alguns deles apresentados no Quadro 3. Quadro 3 - Peso próprio e massa específica de materiais de construção Material de construção Peso próprio (kN/m³) Massa específica (kg/m³) Bloco de argamassa 22 2.200 Lajotas cerâmicas 18 1.800 Blocos cerâmicos furados 13 1.300 Blocos cerâmicos maciços 18 1.800 Argamassa de cal, cimento e areia 19 1.900 Argamassa de cimento e areia 21 2.100 Concreto simples 24 2.400 Concreto armado 25 2.500 Fonte: ABNT (1980) Além dos pesos próprios de materiais de construção, empuxos de terra e esforços de protensão também são considerados permanentes. O empuxo ativo deve ser considerado como esforço desfavorável, no seu valor de dimensionamento máximo, enquanto que o passivo é considerado favorável e deve ser utilizado o seu mínimo valor. Figura 2 - Empuxos de terra ativo e passivo Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 6 5.4.Esforços variáveis Os valores característicos das ações variáveis (Fqk) estabelecidos por consenso e indicados em Normas Brasileiras específicas, correspondem a valores que têm de 25% a 35% de probabilidade de serem ultrapassados no sentido desfavorável, durante um período de 50 anos. A norma ABNT NBR 6120 (1980) classifica estes valores e alguns são apresentados no Quadro 4. Quadro 4 - Cargas variáveis de utilização Utilização Carga distribuída (kN/m²) Ginásio de esportes 5 Lojas 4 Restaurantes 3 Escritórios 2 Edifícios residenciais 1,5 Escadas com acesso ao público 3 Escadas sem acesso ao público 2,5 Fonte: ABNT (1980) Apesar de normatizados, cabe sempre ao projetista e ao proprietário da obra o estudo sobre os valores de carga a serem aplicados em projeto. No caso de lojas, há estabelecimentos que vendem produtos mais pesados que os valores que constam em norma, e isso deve ser levado em consideração. No caso de cargas variáveis de naturezas diferentes (que possuem baixa probabilidade de ocorrência em simultaneidade), deve ser aplicado o coeficiente f2, que permite a minoração dos valores representativos das cargas consideradas não principais. Por exemplo, a probabilidade de uma estrutura estar completamente carregada com suas cargas de utilização sofrer ao mesmo tempo uma rajada de ventona sua intensidade máxima é muito baixa. Portanto podem ser feitas duas combinações, uma considerando a utilização como ação principal minorando o vento e outra considerando o vento como ação principal e minorando a utilização. Veja o exemplo a seguir: Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 7 Exemplo: Estabelecer as equações de cálculo das ações para a combinação última normal (Fd) de estruturas de edifícios comerciais onde os carregamentos são resultantes de combinações que só levam em consideração as ações permanentes diretas e ações variáveis diretas. Considerar o esgotamento da capacidade resistente para: • carregamentos gerais desfavoráveis; e • efeito favorável das cargas permanentes. Solução: Para a combinação última normal, deverão ser usados os coeficientes de ponderação apresentados no tópico 3. ▪ Fgk: Gk (valor característico da ação permanente direta) ▪ Fqk,acid: Qk (valor característico da ação variável direta - carga acidental) ▪ Fqk,vento: Wk (valor característico da ação variável direta - vento) ▪ g: 1,4 (combinação normal, ação permanente direta desfavorável) 1,0 (combinação normal, ação permanente direta favorável) ▪ q: 1,4 (combinação normal, ação variável direta desfavorável geral) 0,0 (combinação normal, ação variável direta favorável) ▪ 0: 0,7 (carga acidental de edifício comercial - desfavorável) 0,0 (carga acidental de edifício comercial - favorável) ▪ 0: 0,6 (vento - desfavorável) 0,0 (vento - favorável) a) Ação permanente direta desfavorável (g =1,4) 𝐹𝑑 = 𝛾𝑔𝐹𝑔𝑘 + 𝛾𝜀𝑔𝐹𝜀𝑔𝑘 + 𝛾𝑞 (𝐹𝑞1𝑘 +∑𝜓0𝑗𝐹𝑞𝑗𝑘) + 𝛾𝜀𝑞𝜓0𝜀𝐹𝜀𝑞𝑘 Fd = 1,4 Gk → Fd = 1,4 Gk Fd = 1,4 Gk + 1,4 (Qk + 0,0 Wk) → Fd = 1,4 Gk + 1,4 Qk Fd = 1,4 Gk + 1,4 (Qk + 0,6 Wk) → Fd = 1,4 Gk + 1,4 Qk + 0,84 Wk Fd = 1,4 Gk + 1,4 (Wk + 0,0 Qk) → Fd = 1,4 Gk + 1,4 Wk Fd = 1,4 Gk + 1,4 (Wk + 0,7 Qk) → Fd = 1,4 Gk + 1,4 Wk + 0,98 Qk b) Ação permanente direta favorável (g =1,0) Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 8 𝐹𝑑 = 𝛾𝑔𝐹𝑔𝑘 + 𝛾𝜀𝑔𝐹𝜀𝑔𝑘 + 𝛾𝑞 (𝐹𝑞1𝑘 +∑𝜓0𝑗𝐹𝑞𝑗𝑘) + 𝛾𝜀𝑞𝜓0𝜀𝐹𝜀𝑞𝑘 Fd = 1,0 Gk → Fd = 1,0 Gk Fd = 1,0 Gk + 1,4 (Qk + 0,0 Wk) → Fd = 1,0 Gk + 1,4 Qk Fd = 1,0 Gk + 1,4 (Qk + 0,6 Wk) → Fd = 1,0 Gk + 1,4 Qk + 0,84 Wk Fd = 1,0 Gk + 1,4 (Wk + 0,0 Qk) → Fd = 1,0 Gk + 1,4 Wk Fd = 1,0 Gk + 1,4 (Wk + 0,7 Qk) → Fd = 1,0 Gk + 1,4 Wk + 0,98 Qk Como pudemos ver no exemplo, uma simples situação de carregamento com uma carga de utilização, uma de intempérie e uma permanente gera 10 tipos diferentes de combinações. E todas as combinações devem ser testadas na estrutura para que ela seja dimensionada para a pior situação possível. Agora que compreendemos como montamos combinações de cargas, vamos estudar a associação desta teoria com os esforços solicitantes: momentos fletores, esforços normais e cortantes. 5.5.Esforços solicitantes e tensões de dimensionamento Os esforços decorrentes das ações atuantes em elementos estruturais podem ser classificados em solicitações normais, caracterizadas pelos momentos fletores (M) e forças normais de (N), que geram tensões normais () e solicitações de cisalhamento, caracterizadas pelos momentos torsores (T) e forças cortantes (V), que geram tensões tangenciais (). Como as ações a serem consideradas no projeto estrutural correspondem às ações de cálculo (ações combinadas), as solicitações e as tensões deverão, também, ser representadas pelos seus valores de cálculo. Exemplo Determinar, para a viga abaixo indicada, a envoltória do diagrama de momentos fletores solicitantes de cálculo (MSd), considerando ações diretas, estado-limite último, combinações últimas normais e peso próprio desprezível. Admitir: a. estrutura qualquer, onde as combinações das ações que consideram o efeito favorável das cargas permanentes (g = 1,0) precisam ser consideradas; e b. estrutura usual de edifício onde as combinações das ações que consideram o efeito favorável das cargas permanentes (g = 1,0) não precisam ser Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 9 consideradas. Solução: Deverão ser usados, para a combinação normal última, os seguintes valores para as ações e coeficientes: 𝐹𝑑 = 𝛾𝑔𝐹𝑔𝑘 + 𝛾𝜀𝑔𝐹𝜀𝑔𝑘 + 𝛾𝑞 (𝐹𝑞1𝑘 +∑𝜓0𝑗𝐹𝑞𝑗𝑘) + 𝛾𝜀𝑞𝜓0𝜀𝐹𝜀𝑞𝑘 • Fgk = Gk = 10 kN (valor característico - ação permanente direta) • Fq1k = Qk = 5 kN (valor característico - ação variável direta principal) • g = 1,4 (combinação normal - ação permanente direta desfavorável) • g = 1,0 (combinação normal - ação permanente direta favorável) • q = 1,4 (combinação normal - ação variável direta desfavorável) • q = 0,0 (combinação normal - ação variável direta favorável) Para o caso a, deverão ser consideradas as seguintes combinações: • Fd = 1,4 Gk + 0,0 Qk (permanente desfavorável + variável favorável) • Fd = 1,4 Gk + 1,4 Qk (permanente desfavorável + variável desfavorável) • Fd = 1,0 Gk + 0,0 Qk (permanente favorável + variável favorável) • Fd = 1,0 Gk + 1,4 Qk (permanente favorável + variável desfavorável) Para o caso b, deverão ser consideradas as seguintes combinações: • Fd = 1,4 Gk + 0,0 Qk (permanente desfavorável + variável favorável) • Fd = 1,4 Gk + 1,4 Qk (permanente desfavorável + variável desfavorável) a) Consideração do efeito favorável da ação permanente: a.1) Fd = 1,4 Gk + 0,0 Qk Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 10 a.2) Fd = 1,4 Gk + 1,4 Qk a.3) Fd = 1,0 Gk + 0,0 Qk a.4) Fd = 1,0 Gk + 1,4 Qk Resolvendo os quatro diagramas de momento fletor, obtemos a seguinte envoltória: Caso não consideremos os efeitos favoráveis da carga permanente, teríamos a seguinte envoltória, oriundos apenas dos diagramas a.1 e a.2: Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 11 É importante salientar que a não consideração dos efeitos favoráveis em determinadas situações, como neste caso de estrutura em balanço, pode mascarar a existência de momentos fletores positivos. Para finalizar o tópico, vamos estudar agora como devem ser considerados os esforços estruturais ao descarregarem nas estruturas de fundações. 5.6.Esforços em fundações A capacidade de carga de fundações, sejam elas superficiais ou profundas, são definidas por tensões ou cargas admissíveis em função do solo que compõe o terreno. Essas tensões ou cargas admissíveis incluem coeficientes de segurança que minoram as resistências dos elementos de fundação e são normatizados pela ABNT NBR 6122 (2019). Os valores das solicitações correspondentes às reações de apoio a serem suportadas por elementos de fundação, decorrentes das combinações de ações, consideram coeficientes de ponderação baseados no método das tensões admissíveis, utilizando um único coeficiente de segurança global, tanto para as ações quanto para as resistências dos materiais. Portanto, para que não ocorra confronto entre critérios de segurança, as cargas de dimensionamento de fundações devem ser apresentadas sem considerar coeficientes de majoração de estados limite, apenas os coeficientes de minoração por simultaneidade de ações variáveis. 5.7.Encerramento Muito bem, você concluiu mais um tópico da disciplina. Após a avaliação do que você aprendeu nesta etapa, vamos iniciar os estudos de dimensionamento de peças de concreto Cargas para o cálculo de estruturas de edificações 12 armado à flexão. Referências ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6118: Projeto de estruturas de concreto - Procedimento. Rio de Janeiro, 2014. ABNT – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6120: Cargas para o cálculo de estruturas de edificações. Rio de Janeiro, 1980. FUSCO, P. B.; ONISHI, M. Introdução à engenharia de estruturas de concreto. 1ª. Ed. São Paulo: Cengage Learning, 2018.
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